O Ensino de Filosofia na Educação de nível médio em Teresina – PI

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O Ensino de Filosofia na Educação de nível médio em Teresina – PI:
relação entre formação inicial e prática pedagógica do(a) professor(a) de
filosofia.
Edna Maria Magalhães do Nascimento
O objeto de estudo dessa pesquisa foi o Ensino de Filosofia na
educação de nível médio, com vista à análise da relação entre a formação
inicial e a prática pedagógica do docente de filosofia em Teresina (PI). No
desenvolvimento do trabalho, constatou-se que a realidade da formação inicial
em Filosofia e a prática docente exigem um diálogo permanente desses dois
momentos, uma vez que, uma dimensão tem implicação direta na outra.
Reafirmou-se, nessa investigação, a necessidade de uma política acadêmica
de estudos e pesquisas, fortalecendo a iniciativa do NEFI – Núcleo de Estudos
sobre Ensino de Filosofia, para acompanhar a experiência do ensino de
Filosofia tanto na formação inicial, adquirida em curso superior de Licenciatura
quanto no âmbito das escolas, na prática docente, com possibilidades de
construção de uma base de conhecimentos sobre essa realidade.
O estudo bibliográfico procedeu a uma análise sobre a Filosofia,
optando, em priorizar muito mais as tarefas e finalidades desse saber e elencar
suas principais características, que se mantêm vivas desde o seu surgimento
na Grécia clássica, do que promover uma discussão formalista do seu conceito.
Não que esta opção fosse dispensável. Não se quis fugir do conceito, tentou-se
fazê-lo a partir da atividade filosófica ou da temporalidade histórica, uma vez
que é preciso “trazer o conceito para o tempo”, sem, necessariamente, impor
um determinismo histórico na produção filosófica. Ao discutir suas tarefas
enquanto saber intelectual que interroga e investiga a si mesma e a realidade
através do rigor metodológico, da perspectiva de totalidade e da sua peculiar
radicalidade, busca-se, especialmente, discutir as tarefas que a filosofia tem
em seu ensino nas escolas de nível médio.
Uma discussão sobre o caráter de ensinabilidade da Filosofia cumpriu
o papel de articular
a atividade filosófica como sendo uma prática
eminentemente pedagógica.
Desse modo, compreendeu-se que o tema
“filosofia e ensino” não pertence a uma ordem de questões puramente
didáticas, mas também filosóficas, ou seja, a fundamentação desse saber na
formação escolar é uma questão que tem sido discutida como um problema
filosófico e deve ser assumido, também, pelos Departamentos de Filosofia e
não apenas no campo da educação. Segundo Von Zuben (1992), a
apropriação do filosofar é uma questão filosófica. Esta afirmação surge no
sentido de provocar as instâncias departamentais das universidades para a
necessidade de assumirem uma reflexão filosófica sobre o caráter de ensino
que esse saber ocupa, sobretudo, nas escolas de nível médio, quando oferece
a possibilidade de uma atividade de diálogo com a juventude sobre as
questões do seu tempo: questões éticas e políticas, o aprendizado do ser e do
conviver, ou seja, da democracia. Eis um locus para fazer “operacionalizar” a
Filosofia, pois conforme pensava Dewey (1985) é esta a sua utilidade – ensinar
o uso crítico da razão.
Uma análise sobre a profissionalização do docente de Filosofia ajudou
a compor alguns consensos sobre a Filosofia na educação básica e indicar a
possibilidade da construção de um projeto de ensino de Filosofia, que observe,
dentre outros aspectos: a pluralidade de temas do campo da Filosofia e a
capacidade que os docentes devem ter para selecionar aqueles conteúdos que
atendam aos objetivos da disciplina nesse nível escolar, ou seja, uma iniciação
dos estudantes na reflexão filosófica; a pesquisa também revelou a
necessidade de articular os temas filosóficos às referências da tradição
filosófica, sem contudo, fazer necessariamente, uma opção apenas por temas
filosóficos sem a referência histórica, muito menos, que se apresente aos
estudantes o percorrer enfadonho dos sistemas e doutrinas sem a natureza da
Filosofia que é a sua atividade problematizadora; a profissionalização do
docente deve contemplar os conhecimentos da prática escolar e das ciências
da educação e dotar este profissional de habilidades para realizar a atividade
pedagógica de educar filosoficamente.
Além das competências citadas, Giannoti (1999) diz que é preciso
desenvolver no trabalho filosófico uma espécie de philia, uma alteridade
recíproca. Nesse sentido o exercício do filosofar exige que se observe a
etimologia da palavra: uma amizade pelo saber, mas uma amizade, acima de
tudo, por aquele que sabe e que conhece e não pelo saber em si. E mais, pela
possibilidade que esse saber seja compartilhado. A atividade filosófica desde o
seu nascedouro surge como uma prática coletiva, dialógica, realizada numa
comunidade de pensamento: “Firma-se entre nós, mestres, colegas, e alunos,
um vínculo sui generis, muito íntimo. Trata-se de uma espécie de philia sem
que se possa dizer que o outro seja eu mesmo, embora a alteridade recíproca
se desenhe por meio dos processos de identificação e diferenciação” ( p.7).
Compreender a Filosofia enquanto uma atividade teórica e uma prática
de ensino requereu uma análise da trajetória histórica da Filosofia no Brasil,
condição para explicitar as dificuldades que tem esse saber em afirmar-se
enquanto um conhecimento curricular consolidado nas escolas. As conclusões
do estudo apontam a dificuldade da disciplina Filosofia ocupar o seu devido
espaço na organização da estrutura curricular das escolas brasileiras. A não
consolidação curricular da Filosofia e a sua história permeada por avanços e
retrocessos marcam uma prática pedagógica fundada na incerteza e na
intranqüilidade, transformando o professor de Filosofia num militante em defesa
de sua causa: a filosofia e a manutenção do seu espaço de trabalho.
Este ensino assumiu, historicamente, um caminho distinto da sua
natureza crítica e indagadora sobre o mundo. Ao ser introduzido na cultura
brasileira, veio através da imposição ideológica do pensamento religioso cristão
e teve a sua presença permitida por situar-se como demonstradora lógica das
verdades da Revelação. Posteriormente, o legado filosófico associou-se ao
novo paradigma dominante que foi o pensamento positivista. Mas, mais uma
vez, teve uma existência contingente, ou seja, a ciência marcou a sua
hegemonia prescindindo da Filosofia. Por outro lado, a tradição erudita e
escolástica, mesmo numa conjuntura de um pensar laico, garantiu a presença
da Filosofia, nos breves espaços em que foi permitida, como um ensino
intelectualista e erudito, dirigido às elites.
Com o predomínio da orientação técno-burocrática instituída durante o
Regime Militar, a legislação educacional então em vigor, a lei 5.692/71, tratou
de excluir o ensino de filosofia das escolas e substituí-lo por um saber
doutrinário – veículo da ideologia do poder hegemônico. Após a promulgação
da lei 9.394/96 e seu discurso estabelecedor de uma educação humanista,
crítica, preparadora da cidadania, a Filosofia volta a ser objeto de discussão,
especialmente, mediante a possibilidade de tornar-se, de fato, uma
experiência, no contexto da escolas de nível médio. Agora, mesmo estando
requerida na LDB, a polêmica sobre a sua obrigatoriedade se mantém, ou seja,
os técnicos do MEC – Ministério da Educação, elaboram uma leitura conforme
seus interesses, isto é, afirmam que a Filosofia é “apenas” uma orientação
pedagógica da transversalidade curricular e não uma disciplina obrigatória.
No entanto, o argumento de que a Filosofia é um tema transversal,
esconde os verdadeiros propósitos da reforma do ensino, pois o que se pode
constatar é uma reedição de uma educação instrumental e técnica e uma
compreensão da qualidade como investimento na lógica do “mercado” e não na
qualidade educacional e social.
Desse modo, o governo assumiu a defesa da não obrigatoriedade da
Filosofia, culminando com o veto do Presidente da República, Fernando
Henrique Cardoso, em 08 de outubro de 2001 ao Projeto de Lei do Deputado
Pe. Roque Zimemerman, que foi elaborado para dirimir quaisquer dúvidas
sobre a obrigatoriedade das disciplinas Filosofia e Sociologia, alterando a LDB
nesse sentido.
No nível político, aponta-se a necessidade da organização dos
profissionais da área da filosofia em suas entidades sindicais, acadêmicas,
científicas, partidárias, para pôr fim a imposição ideológica daqueles que
proíbem, numa época democrática, o exercício do aprendizado do pensar livre.
E, no nível acadêmico, deve-se fortalecer as instâncias de estudos e pesquisas
para
defender
concepções
históricas
de
formação
do
educador,
fundamentalmente, contra o rumo que o capital quer impor ao conhecimento
produzido nas universidades.
A pesquisa demonstrou haver muitas contradições entre os argumentos
que advogam a não obrigatoriedade da Filosofia, destacando que a legislação
educacional vigente, a Lei 9.394/96, estabelece como uma das finalidades do
Ensino Médio a formação crítica e cidadã adquirida através dos conhecimentos
de Filosofia e Sociologia. Do mesmo modo, os Parâmetros Curriculares
Nacionais do Ensino Médio sistematizam o conhecimento filosófico para esse
nível escolar e indicam as competências e habilidades a serem desenvolvidas
com os alunos do Ensino Médio. Quer dizer, as possibilidades que o ensino de
Filosofia oferece, no que diz respeito, à análise, interpretação, síntese de textos
filosóficos e não filosóficos, a curiosidade intelectual, a sensibilidade estética e
uma formação ética, são diretrizes determinadas pelos próprios documentos
regulamentadores da LDB.
As contradições também estão presentes no âmbito da formação inicial,
pois na medida em que o MEC, através da Câmara de Ensino Superior,
estabelece as Diretrizes para a graduação em Filosofia na modalidade
Licenciatura e Bacharelado, orientando os currículos de graduação a
observarem estas prescrições, e dentre elas, a de que o curso de Licenciatura
em Filosofia deve oferecer uma sólida preparação intelectual e uma formação
pedagógica para os profissionais que vão assumir a docência no ensino médio,
está, certamente, garantindo a preparação de profissionais de Filosofia para a
educação básica, portanto, não pode estar, ao mesmo tempo, definindo essa
formação no Ensino Superior e negando o exercício profissional da mesma
atividade.
Os sujeitos entrevistados mencionaram que a própria UFPI, que
mantém um curso de Graduação em Filosofia e, semestralmente, forma
dezenas de professores de Filosofia não assegurou no PSIU – Programa
Seriado de Ingresso na UFPI, os conhecimentos filosóficos. O que demonstra
que a Universidade precisa compreender o conhecimento que produz e
manter-se em defesa do profissional que está formando. A organização de um
programa tendo em vista o estabelecimento dos conteúdos a serem exigidos
aos alunos de escolas básicas para o ingresso seriado no ensino superior,
deve ser estruturado através de um processo de diálogo com as coordenações
de cursos de graduação da UFPI. A pesquisa constatou que esse ato de
desconsiderar a Filosofia como conhecimento exigido pelo PSIU está trazendo
conseqüências desfavoráveis, desobrigando algumas escolas particulares de
Teresina em manterem a disciplina no currículo do ensino médio, conforme
manifestação dos sujeitos da pesquisa.
Entretanto, para desconstruir o discurso dominante da não
obrigatoriedade da filosofia, no âmbito das escolas públicas da rede estadual
de ensino, há uma nova matriz curricular, vigente a partir de 2000, definida
pelos Parâmetros Curriculares Nacionais, cuja estrutura disciplinar situa a
Filosofia como matéria obrigatória do Núcleo Comum Nacional, inserida no
campo dos conhecimentos Humanos e suas Tecnologias. Do mesmo modo, as
escolas particulares ainda asseguraram em seus currículos a presença da
disciplina, mesmo em meio a essa conjuntura.
Com relação ao ementário e a bibliografia disponibilizada pela
Secretária Estadual de Educação para a Filosofia no ensino médio, percebeuse ser preciso uma discussão conjunta com a UFPI/DEFI sobre os temas a
serem definidos no ementário, bem como, a necessidade de melhor estruturar
uma bibliografia para os docentes e discentes, pois constam apenas dois livros
didáticos da educação básica, da autora Maria Lúcia de Arruda Aranha, cujos
títulos são “Temas de Filosofia” e “Filosofando”.
No tocante ao saber dos professores de Filosofia a pesquisa constatou
que, os docentes de Filosofia devem ter um perfil profissional com
competências e habilidades para compreender e transmitir os principais temas,
problemas e sistemas filosóficos, bem como que possuam a capacidade de
análise e reflexão crítica da realidade social; que tenham condições de
enfrentar com sucesso os desafios da prática docente, a fim de despertarem os
jovens para o universo da filosofia e que possam dialogar com os alunos do
ensino médio, a partir do legado da tradição e do pensamento inovador e
criativo. Tais domínios, como os dos conhecimentos dos sistemas e da história
da filosofia e o embasamento sobre os conhecimentos para o ensino de
Filosofia no nível médio, expressos, especificamente, na sistematização do
Parecer CES 492/2001, foram mencionados pelos sujeitos da pesquisa,
sobretudo, a indicação dos entrevistados que a formação inicial tem
secundarizado a formação pedagógica, e que, na graduação em Filosofia não
há uma política acadêmica para despertar o estudante, futuro professor de
Filosofia, para o campo da sua profissionalização.
É possível inferir que as instâncias responsáveis pela formação do
professor de Filosofia não vêm mantendo uma relação de diálogo em vista do
acompanhamento da formação acadêmica para que se atenda os objetivos da
Licenciatura em Filosofia. Não é possível cindir a formação teórica relativa aos
domínios dos conteúdos filosóficos com a formação profissional, que é a de
docente. Do mesmo modo, oferecer uma formação pedagógica, generalista,
onde o licenciando não se reconhece na sua área específica, no seu campo
epistemológico, forja uma situação burocrática em que os futuros professores
cumprem a formação pedagógica para “fechar” a quantidade de créditos a
cumprir no seu curso. Desse modo, o fator apontado pelos sujeitos como
determinante dos problemas da formação inicial, foi a falta de articulação entre
formação específica e formação pedagógica, comprometendo o exercício
profissional da disciplina Filosofia no ensino médio.
Muito já se tem falado o quão é difícil fechar essa equação: formação
específica e formação pedagógica. Entretanto, pode-se inferir que as saídas só
serão encontradas mediante o estabelecimento de uma nova ordenação que
possa conjugar essas duas instâncias. Se, de um lado, os sujeitos afirmaram,
na pesquisa, que o curso de Filosofia não prepara o professor de Filosofia e
sim, o especialista em Filosofia, identificou-se, também, que no âmbito da
formação pedagógica, prepara-se um professor, mas, um professor sem “cara”,
ou seja, um docente no sentido lato do termo. Portanto, essa generalidade é
um obstáculo, por não assegurar o sentimento de “pertença”, isto é, o
graduando não se reconhece como professor da área específica, pois ela é
ignorada, não traz o conteúdo dessa atividade, a história desse ensino ou a
experiência acumulada como condições do aprendizado desse saber.
Considera-se, também, que não é possível esperar dos estudantes ou
dos profissionais egressos da licenciatura em Filosofia que eles por si só,
façam as sínteses entre esses dois campos da formação, isto é, do conteúdo
específico e da formação pedagógica. Trata-se de uma questão estrutural que
deve ser enfrentada, especialmente, porque há um acúmulo de conhecimentos
e pesquisas nessa área apontado a necessidade dessa integração. As novas
Diretrizes Curriculares para a Formação de Professores em Nível Superior do
Conselho Nacional de Educação, já esboçam, mesmo que timidamente, uma
orientação dos aspectos teóricos e práticos da formação visando o
equacionamento dessa realidade.
A mediação entre as duas realidades – instituição formadora e
instituições escolares – só foi possível ser realizada por meio de uma análise
qualitativa, considerando os numerosos aspectos que a questão sugere, por
isso, as conclusões desse estudo foram elaboradas mediante o recurso do
repertório de conhecimentos que os sujeitos internalizam sobre as suas
vivências com a realidade da prática da Filosofia. Os sujeitos se manifestaram
sobre as competências e saberes que os docentes de Filosofia devem
desenvolver, concordando que deve haver um equilíbrio entre formação
específica e formação pedagógica.
No entanto, em algumas falas, em posição minoritária, ainda
predomina a compreensão que no curso de Filosofia basta uma formação
intelectual, como se o professor nascesse pronto, isto é, não existisse uma
ciência da educação, um conhecimento pedagógico garantindo-lhe a sua
preparação. Esta postura decorre do tratamento secundário que as
universidades, ainda, tem dado à formação de professores, bem como, às
representações de professores e alunos marcadas por estereótipos como este:
“quem sabe, sabe ensinar”(Gatti, 1997)
As referências teóricas sobre os saberes dos docentes colocou a
pesquisadora em contato com várias sistematizações que apontam a
necessidade de compreender os saberes que compõem o exercício da prática
docente, possibilitando a articulação com o campo da Filosofia. Portanto, os
saberes disciplinares – relativos aos conteúdos de ensino; os saberes
curriculares – conhecimentos que permitem a estruturação e formulação dos
programas de ensino; os saberes pedagógicos – o saber das ciências da
educação e o saber da experiência – aquele testado e tornado público, foram
observados e traduzidos nas manifestações dos entrevistados na tentativa de
compor o repertório de saberes dos docentes de Filosofia.
Com relação ao professor de filosofia no ensino médio, as falas
destacaram a importância do saber da formação, mesmo revelando
dificuldades em articular teoria e prática pedagógica, mas também foi
ressaltado o saber da experiência vivida como docentes de filosofia,
especialmente, as habilidades que os mesmos devem ter para administrar um
cotidiano escolar desfavorável à prática do ensino de filosofia, seja pela
marginalização da disciplina, seja pela incompreensão do seu papel, bem como
pelas as condições de trabalho: turmas numerosas em escolas públicas e
particulares e carga horária super reduzida, a falta de apoio das direções
escolares e a situação sócio econômica dos docentes, dificuldades de leituras
e, principalmente, a falta de material didático em escolas públicas.
A situação descrita pelos docentes coloca a pesquisadora diante da
“face real da escola” não enfrentada na formação acadêmica, sobretudo, pela
forma idealizada na graduação que não traduz a realidade das escolas de nível
básico. Concluiu-se que os professores desenvolvem toda uma sorte de
estratégias para fazer com que a Filosofia possa ser ministrada. Alguns
afirmaram que é preciso disfarçar-se para apresentar a Filosofia aos alunos. De
forma que pode-se dizer não basta, somente, uma preparação intelectual sólida
para o sucesso com a disciplina nas escolas, é preciso, também, uma
formação pedagógica capaz de proporcionar ao professor condições de
planejamento da sua atividade, conhecimento da realidade em que vai
trabalhar, domínio de métodos de ensino para proporcionar o ensino de
Filosofia, e condições de selecionar a partir da pluralidade de temas do campo
da Filosofia conteúdos de ensino que atendam às finalidades dessa prática no
ensino médio.
O fato de o licenciando entrar em contato com as escolas somente ao
término do curso, através da Prática de Ensino, tem contribuído para reforçar a
separação em teoria e prática. Essa realidade, felizmente, está sendo
reformulada, pois, conforme os estudos sobre formação de professores, o
conceito de Prática de Ensino tem sido ampliado para prática escolar, prática
de pesquisa nas escolas e prática profissional. De maneira que, com a nova
LDB, a carga horária de Prática de Ensino passou para 300 horas. E, conforme
as Diretrizes da Formação Inicial de professores, a prática educativa
representa hoje 800 horas de atividade a ser trabalhada. Isto indica que o
estudante de Licenciatura ao ingressar na universidade deve receber uma
preparação que já lhe coloque desde o primeiro período em contato com a
realidade da escola. Ademais, o trabalho de conclusão de curso é uma prática
de pesquisa a ser contada nessa carga-horária. Esta regulamentação deve
orientar as novas propostas de formação de professores em curso de nível
superior.
A opção por um estudo que analisasse o âmbito da formação e o
espaço da atuação efetiva dos professores de Filosofia nas escolas de nível
médio, através de um diálogo entre a formação acadêmica e o fazer do
docente, do profissional egresso da instituição UFPI, pode indicar que estão em
curso ações assumidas pelo curso de Filosofia como, por exemplo, a sua
reformulação curricular, inclusive ampliando os conhecimentos relativos ao
ensino de Filosofia na educação de nível médio e as disciplinas do campo do
conhecimento das ciências da educação. Com isto se espera que a identidade
do professor de Filosofia possa ir sendo construída. Entretanto, é preciso que a
reformulação curricular seja assumida como um processo envolvendo toda a
comunidade da Filosofia, especialmente todas as instâncias responsáveis pela
formação do licenciado em Filosofia na UFPI.
Pode-se inferir que o viés que priorizou a formação do filósofo
especialista e secundarizou a preparação do professor de Filosofia é resultado
de uma conjuntura histórica, pois, embora, o curso de Filosofia venha,
historicamente, formando professores de Filosofia para o ensino médio, esse
campo de trabalho era anteriormente quase que inexistente, fazendo com que
os egressos, assumissem outras funções ou pleiteassem a docência em cursos
de magistério de nível médio ou no magistério superior. Nos últimos dez anos
essa realidade se alterou profundamente em função do retorno da disciplina na
educação de nível médio e pela implantação da Filosofia, também, no ensino
fundamental, tanto nas séries finais do ensino fundamental, quanto na
experiência pedagógica através do método “Filosofia para Crianças”. A partir
da nova conjuntura, a presença da Filosofia nas escolas
públicas e
particulares, exige um programa de formação inicial que dê conta dessas
demandas e um projeto de formação continuada que capacite o professor de
Filosofia para o exercício qualificado da sua atividade.
O estudo exigiu um momento para a organização dos documentos
regulamentadores da Filosofia no âmbito da formação e no âmbito da sua
configuração curricular nas escolas de nível médio. Esse estudo provocou uma
análise sobre os programas de Prática de Ensino de Filosofia da UFPI, sendo
identificada algumas imprecisões que precisam ser corrigidas no tocante à
definição do objeto da Prática de Ensino de Filosofia. Sistematizou, também,
um arrazoado normativo da legislação educacional vigente, para registar as
contradições expressas na ação do governo brasileiro em vetar o ensino de
Filosofia.
A pesquisa indicou que a disciplina Prática de Ensino, conforme a
estruturação do seu plano didático, não está observando os objetivos da
formação do docente de Filosofia. O programa de ensino dessa disciplina, tal
como está documentado, dirige-se à formação para as disciplinas de
Fundamentos da Educação, representando um equívoco significativo em
relação às disciplinas que o professor de Filosofia pode atuar conforme Parecer
do CFE de 1982, ou seja, além da própria Filosofia, as disciplinas Psicologia e
Sociologia para o ensino secundário.
É salutar o desenvolvimento de futuras pesquisas a respeito da Prática
de Ensino de Filosofia, uma vez que não foi objeto desse estudo acompanhar
mais detidamente esta experiência, é preciso observar a Prática de Ensino na
sua efetivação, pois, pelos programas dos últimos anos, identificou-se um
conflito de atribuição entre uma Prática de Fundamentos da Educação e a
Prática de Ensino de Filosofia, além de uma bibliografia generalista que não
conta com o objeto específico da atividade.
Amparada nas respostas obtidas pelos sujeitos, nos documentos
definidores das diretrizes para a sistematização dos cursos de graduação em
Filosofia, bem como nos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio e
no estudo bibliográfico sobre ensino de Filosofia e saberes docentes,
desenvolveu-se uma discussão sobre as competências e habilidades que o
professor de Filosofia precisa construir para desenvolver de modo satisfatório o
seu trabalho com a Filosofia no ensino médio.
Nesse sentido, foi objeto dessa investigação, compreender o tipo de
formação considerado adequado pelos sujeitos investigados, para habilitar o
docente ao exercício da Filosofia no ensino médio. Esta perspectiva indicava a
necessidade de tomar a realidade do curso de Filosofia da UFPI como
possibilidade de ser revelada, de maneira que o resultado colocou uma
discussão muito rica entre formação específica e formação pedagógica. Foi o
tema mais recorrente nas análises.
Partiu-se da premissa da importância do ensino de Filosofia para o
desenvolvimento das habilidades de pensar dos estudantes e das condições
que a Filosofia oferece, enquanto estudo crítico da realidade em vista da
formação de uma cidadania crítica e participativa, da forma como prescreve a
LDB. Dessa compreensão, a pesquisa procurou argüir os professores do
ensino médio sobre os aspectos da sua prática pedagógica com o ensino de
filosofia, sendo caracterizada essa experiência mediante as falas dos sujeitos.
A pesquisa trabalhou com os discursos dos sujeitos envolvidos com o
ensino de filosofia e quis possibilitar uma conversa em que 14 pessoas –
professores, estudantes universitários e professores do ensino médio –
falassem das suas experiências. As discussões organizadas na análise através
de uma circularidade interpretativa, apontaram que, da parte dos docentes da
UFPI do curso de Filosofia há uma disposição para mudar a situação da
formação possibilitando o equacionamento entre os saberes filosóficos e os
saberes docentes. O projeto em andamento de reformulação do curso de
Filosofia deve possibilitar a formação de licenciados e também de bacharéis
em Filosofia, uma antiga reivindicação da comunidade docente e discente para
corrigir as imprecisões e dar uma identidade ao curso de Filosofia da UFPI.
As falas das estudantes entrevistadas demonstraram muita ansiedade
e expectativa com a docência de Filosofia, realizaram observações sobre as
posturas teóricas dos docentes do curso, que, na visão das entrevistadas não
fazem as sínteses entre o saber específico e o saber docente, desenvolvendo
um conhecimento eminentemente acadêmico. Ao falarem sobre as habilidades
e competências que o docente de Filosofia deve possuir demonstram muito
mais disposições pessoais que categorias conceituais. Destacou-se as
referências à coragem, ao medo, à insegurança, ao gostar de ser professor, ao
gostar da Filosofia, revelando apropriações muito mais subjetivas. Esses
aspectos
devem
sugerir
investigações
sobre
a
subjetividade
da
profissionalização do docente de Filosofia, ou seja, além da dimensão do eu
profissional, também, procurar compreender a dimensão do eu pessoal (Nóvoa,
2000).
Os professores do Ensino Médio revelaram com propriedade os
conhecimentos que os mesmos acham que o docente de Filosofia deve
construir, inclusive as falas coincidiam com a discussão teórica formulada no
plano conceitual. Revelaram, no entanto, uma vivência sofrida, marcada por
muitos obstáculos, frutos das deficiências da formação e da convivência com o
preconceito relativo ao ensino de Filosofia, da incerteza com relação ao futuro
dessa atividade, mas revelaram uma enorme disposição para assumir esta
atividade, embora se verifique as limitações apresentadas. Há uma auto-estima
considerável revelada pelos professores de Filosofia no ensino médio, o que
lhes permitem prosseguir diante de tanta adversidade. Assumem que a
recompensa é o resultado do trabalho na escola, pois, os estudantes, embora
iniciem as aulas de Filosofia com muitas reservas conseguem participar,
compreender as finalidades da Filosofia e a ter, portanto, uma recepção
positiva para com essa prática.
Predominou nas falas dos sujeitos – estudantes e professores do
Ensino Médio –uma forte convicção do papel social do filósofo, demonstrando
uma compreensão que a Filosofia ajuda a entender a realidade e, portanto, a
transformá-la.
Considera-se, no entanto,
que
se essa dimensão for
hipertrofiada, a filosofia deixa o seu caráter revolucionário e transforma-se em
credo, então, é preciso equacionar bem essa tarefa, aliás, uma tarefa de todos
os educadores, mas que pela natureza da filosofia torna-se mais exigida.
Nos depoimentos dos professores do ensino médio foram observadas
algumas dificuldades para expressarem-se acerca da sistematização da sua
atividade docente, inclusive não se percebeu o domínio de um vocabulário das
áreas da Filosofia que lhes permitissem situar-se nos campos do conhecimento
filosófico. Ao falarem sobre os programas de ensino, não chegam a
estruturarem
os
conteúdos
em
áreas
da
Filosofia.
Observa-se
o
acompanhamento do sumário dos livros como programa de ensino e uma
enorme dificuldade em construir um programa visto que os livros didáticos não
vêm com uma seriação.
Por último, foi possível inferir um conceito e uma concepção de ensino
de Filosofia que estavam subjacentes às demais respostas, sendo extraídos
para comparar o conhecimento docente com o saber sistematizado na literatura
disponível, oportunidade em que os sujeitos conceituaram e refletiram sobre o
que fazem.
Todos os sujeitos se manifestaram pela compreensão que a Filosofia é
uma disciplina que possibilita o desenvolvimento da capacidade de raciocínio
crítico e que oferece condições para formar uma consciência atenta e curiosa
acerca da realidade, permitindo, outrossim, aos homens e mulheres
indagarem-se sobre si mesmo, sobre os outros e sobre o meio, como
participantes da realidade.
Desse modo, compreende-se que para se atingir os objetivos da
Filosofia, enquanto ensino, é preciso antes de mais nada reconhecer os fatores
determinantes dessa prática, mas, dentre esses fatores, prioritariamente,
apostar numa preparação do profissional com a habilidade teórica e
pedagógica de realizar a tarefa de ensinar Filosofia nas escolas básicas como
possibilidade
de
provocar
na
juventude
o
gosto
pelo
debate,
pela
argumentação e o seu compromisso social e político. Enfim, a pesquisa
concluiu que a dimensão da formação inicial não pode estar desvinculada da
experiência da prática pedagógica do ensino de Filosofia e, ao mesmo tempo,
das redes de ensino responsáveis pela educação de nível médio. Devem sim,
manter um diálogo permanente, universidade e sistemas de ensino, em vista
da qualidade educacional oferecida por essa prática escolar.
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