RELATO DE EXPERIÊNCIA: as intervenções terapêuticas da equoterapia em pessoas com deficiência Helyne Quirino de Oliveira1; Neiza de Lourdes Frederico Fumes2; Valdênia Alves Dias Moura3 Eixo Temático: Práticas Educativas e Inclusão RESUMO Relatar as intervenções terapêuticas da equoterapia é de suma importância para o conhecimento das diversas atividades que podem ser realizadas com o cavalo no tratamento e reabilitação de pessoas com deficiência e/ou com necessidades especiais. O presente estudo tem como objetivo relatar a experiência das intervenções terapêuticas na equoterapia em pessoas com deficiência, durante o estágio de observação realizado enquanto graduanda do curso de Educação Física. Relataremos as experiências vivenciadas nas sessões de equoterapia, acompanhadas durante o estágio de observação de uma disciplina do curso de Educação Física e orientadas por um psicopedagogo e um educador físico. Foram escolhidos para fazer parte do estudo, dois pacientes atendidos pela instituição, sendo um paciente com autismo e uma com paralisia cerebral. na terapia com os praticantes autistas eram feitas atividades que proporcionavam melhorias no equilíbrio, na postura, atenção e habilidades motoras. Também eram utilizados alguns recursos para tais fins, como bastão, com o objetivo de melhorar a postura, argolas e cones para o equilíbrio, concentração e atenção do paciente. A paciente com PC que pratica equoterapia monta a cavalo acompanhada do terapeuta, onde recebe o suporte necessário e adequado para realizar as sessões com total segurança. A equoterapia é uma atividade que proporciona à pessoa com deficiência vários benefícios, devido ao estímulo da passada tridimensional do cavalo; estes benefícios estão relacionados tanto ao aspecto motor, como ao aspecto cognitivo e psicológico. Palavras-chave: Equoterapia; Pessoas com Deficiência; Autismo; Paralisia Cerebral. INTRODUÇÃO A equoterapia é um método terapêutico caracterizado por todas as práticas que utilizam o cavalo para diversas atividades no tratamento e reabilitação de pessoas com deficiência e/ou com necessidades especiais. Nesta prática, deve haver uma abordagem interdisciplinar nas áreas de saúde, educação e equitação, as quais buscam desenvolvimento 1 Universidade Federal de Alagoas – UFAL. E-mail: [email protected] Universidade Federal de Alagoas – UFAL. E-mail: [email protected] 3 Associação de Equoterapia de Alagoas – AEA. E-mail: [email protected] 2 biopsicossocial dessas pessoas, modo pelo qual o praticante de equoterapia é visto, ou seja, um ser indissociável. “O trabalho em equipe possibilita uma troca mais rica de informações e conhecimento entre as áreas, podendo assim ser traçado um plano terapêutico em que o praticante seja visto como um todo, um ser dotado de capacidades e com potencial a ser desenvolvido, desabrochando para a vida num contexto maior, o social” (BARROS; AZEVÊDO, 2006, p.177). Segundo Barros e Azevêdo (2006, p.172) “a prática dessa modalidade terapêutica é recomendada para quase todas as Pessoas Portadoras de Deficiência (PPD) e Pessoas Portadoras de Necessidades Especiais (PPNE), exceto os casos graves, como cardiopatias graves, escolioses muito acentuadas e crises convulsivas incontroladas”. O estágio foi realizado em um centro de equoterapia da cidade de Maceió que atendia um público bastante diversificado, como por exemplo, crianças, a partir de dois anos e meio, adolescentes e jovens adultos, com deficiência intelectual, autismo, síndrome de Asperger, síndrome de Down, paralisia cerebral e pessoas que sofreram acidente e ficaram com sequelas. Para este público, são oferecidas as seguintes terapias: equoterapia, psicopedagogia, pedagogia e atividades terapêuticas na piscina. Para dar início às sessões de terapias, os pacientes são encaminhados pelo médico que os acompanham durante o tratamento. Na instituição em foco, os participantes eram avaliados pelo médico, e por fim, encaminhados às terapias oferecidas, escolhidas pelos pais ou responsáveis. Para Albuquerque (1993) apud Barros e Azevêdo (2006, p.172), “a equoterapia baseiase na harmonia do movimento proporcionado por dois seres vivos: praticante e cavalo. Toda essa intervenção faz com que o cavalo produza os mais variados efeitos no praticante”. Com esses efeitos, a equoterapia proporciona ao praticante sinergias funcionais, as quais melhoram o equilíbrio, postura e coordenação motora, auto-estima, autoconfiança, e estímulo dos sentidos, melhorando assim a qualidade de vida da pessoa com deficiência. “Efeito funcional: o trabalho com o cavalo baseia-se no movimento tridimensional, repetindo fielmente o andar humano. O cavalo nunca está imóvel, por isso, para manter-se em cima do animal o praticante deve apresentar um ajuste corporal” (BARROS; AZEVÊDO, 2006, p.172). “Efeito fisiológico: o peristaltismo do estômago e intestino é estimulado pelo movimento. A temperatura do corpo do cavalo é mais elevada que a do homem, o que provoca um relaxamento da musculatura que está em contato com o animal” (BARROS; AZEVÊDO, 2006, p.172). “Efeitos psicológicos: melhora da autoestima, confiança, concentração, atenção e integração do grupo” (BARROS; AZEVÊDO, 2006, p.173). “Efeito sensorial: o movimento, a mudança de velocidade, direção, posição e da cabeça do cavalo proporcionam ao praticante informações que provêm das regiões articulares, musculares e tendinares” (BARROS; AZEVÊDO, 2006, p.173). Diante do exposto, o presente estudo tem como objetivo relatar a experiência das intervenções terapêuticas na equoterapia em pessoas com deficiência, durante o estágio de observação realizado enquanto graduanda do curso de Educação Física. METODOLOGIA Relataremos as experiências vivenciadas nas sessões de equoterapia, acompanhadas durante o estágio de observação de uma disciplina do curso de Educação Física e orientadas por um psicopedagogo e um educador físico. A observação foi dirigida por um roteiro de observação, sendo que a técnica da observação direta intensiva. O método utilizado foi o indutivo, em que as inferências são feitas a partir de constatações particulares dos pesquisadores até às informações existentes na literatura acerca do tema estudado. Foram escolhidos para fazer parte do estudo, dois pacientes atendidos pela instituição, sendo um paciente com autismo e uma com paralisia cerebral. Nos relatos apresentaremos algumas intervenções realizadas com o paciente e para isso utilizaremos o registro fotográfico. Para isso, os pais ou os responsáveis assinaram um termo de autorização. RESULTADOS E DISCUSSÃO A Equoterapia é realizada em amplo espaço físico, onde o profissional de saúde e os estagiários saem caminhando com o paciente montado ao cavalo e este guiado por uma pessoa habilitada para tal função. Cada paciente fica em torno de trinta minutos montado no cavalo; no decorrer do percurso, este sempre é alternado, com o objetivo de desenvolver diversas reações ao paciente. Em alguns momentos do percurso, o paciente é estimulado com alguns recursos pedagógicos, como argolas e cones, onde o mesmo deverá colocar as argolas de diferentes tamanhos, cores e texturas dentro do cone, de ambos os lados laterais do corpo, direito e esquerdo, além do cavalo, o qual já é tido como um meio terapêutico, cada qual voltado para a deficiência de cada paciente, além do estágio de doença em que o mesmo se encontra. Dentre as patologias mais comuns tratadas na instituição encontra-se o autismo, que caracteriza-se por déficits persistentes na comunicação social e interação social em múltiplos contextos, incluindo déficits na reciprocidade social, em comportamentos não-verbais de comunicação usados para interação social e em habilidades para desenvolver, manter e compreender relacionamentos. Além dos déficits na comunicação social, o diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista requer a presença de padrões restritos e repetitivos, de comportamento, interesses ou atividades (Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais - DSM-V, 2014, p.75). S.W.S.S., 07 anos, tem autismo, diagnóstico dado aos três anos. Faz equoterapia há cinco meses, uma vez por semana; outras terapias também complementam o tratamento do mesmo, como a fisioterapia, fonoaudiologia, terapia ocupacional e terapia com cães; frequenta ainda a ASSISTA e a AAPPE, instituições que fazem tratamento com pessoas deficientes, além das sessões com psicóloga e psicopedagoga. As ações realizadas com o paciente autista nas sessões de equoterapia possuem vários objetivos e os mesmos dependem do terapeuta que está acompanhando o paciente e das características clínicas individuais de cada paciente. Em relação à Educação Física, na terapia com os praticantes autistas eram feitas atividades que proporcionavam melhorias no equilíbrio, na postura, atenção e habilidades motoras. Também eram utilizados alguns recursos para tais fins, como bastão, com o objetivo de melhorar a postura, argolas e cones para o equilíbrio, concentração e atenção do paciente. “Através de sessões lúdicas equoterápicas pode-se conferir que os praticantes preferem uma aula diferenciada, baseada em jogos e brincadeiras em que é possível perceber o prazer e a diversão deles” (BARROS; AZEVÊDO, 2006, p.181). Neste sentido, é a partir das atividades lúdicas que as crianças aprendem e experimentam seus erros, acertos, desejos, necessidades, histórias e observações ao longo das sessões de equoterapia, assim como melhoram sua capacidade de se relacionar com as pessoas ao seu redor e com o meio em que vivem. Segundo Loovis (2004, p.172): O professor de educação física deve oferecer atividades desenvolvimentistas apropriadas. Deve-se dar ênfase a condicionamento físico, equilíbrio e movimentos básicos. O desenvolvimento de movimentos fundamentais locomotores e nãolocomotores também requer atenção. Além disso, pode ser necessário enfatizar as atividades perceptivo-motoras. Como afirma Barros e Azevêdo (2006, p.180): “a equoterapia, os estímulos provocados pela passada tridimensional do cavalo possibilitam ganhos enormes nos aspectos cognitivos e psicológicos”. Ao longo do percurso, algumas posturas diferentes daquela tradicional também eram impostas ao praticante: montado de costas, de lado e deitado sobre o cavalo eram algumas delas, as quais provocavam diferentes sensações e reações a quem estava montado. Nessas posturas, vale ressaltar a importância da confiança do praticante para com o terapeuta. Outra praticante da terapia acompanhada pela instituição possui paralisia cerebral (PC). I.A.B.J. tem 05 anos, faz equoterapia há três meses, uma vez por semana; as terapias complementares que ela faz são fisioterapia, terapia ocupacional, fonoaudiologia e estimulação visual. Segundo Porretta (2004, p.208): A PC é um grupo de sintomas incapacitantes permanentes, resultantes de danos às áreas do cérebro responsáveis pelo controle motor. É um problema não-progressivo, que pode ter origem antes, durante ou logo após o nascimento e se manifesta na perda ou no comprometimento do controle sobre a musculatura voluntária. A paciente com PC que pratica equoterapia monta a cavalo acompanhada do terapeuta, onde recebe o suporte necessário e adequado para realizar as sessões com total segurança, Porretta (2004, p.217) explica que “todos os programas devem ser realizados num ambiente seguro – no qual os alunos estejam livres para explorar as capacidades do próprio corpo e interagir com o ambiente ao seu redor -, que irá auxiliar o seu desenvolvimento físico e motor”. Nesta situação, vale ressaltar que é de suma importância o correto posicionamento do praticante pelo terapeuta, pois uma postura inadequada e “a falta de profissionais especializados e o uso indevido do método poderão produzir danos irreversíveis ao praticante” (BARROS; AZEVÊDO, 2006, p.174). Segundo os mesmos autores, o correto posicionamento “trabalha no encefalopata o controle postural adequado, por meio da geração de diferentes impulsos de percepção como velocidade, força centrífuga e ritmo”. Levitt (2001), apud Barros e Azevedo (2006, p.179), identificou três aspectos em comum nos sistemas de tratamento para a PC: “os mecanismos posturais, o movimento voluntário e a função perceptomotora”. Neste sentido: A equoterapia pode ser inserida neste rol de tratamentos, não só por trabalhar esses três aspectos, mas também por apresentar como princípios gerais de tratamento a intervenção precoce, o trabalho em equipe, a repetição de uma atividade motora, o treinamento dos pais, e, como princípios específicos, o treinamento do desenvolvimento, o tratamento do tônus anormal, o treinamento dos padrões de movimento, o uso de estímulos aferentes, de movimentos ativos e a prevenção de deformidades (BARROS; AZEVÊDO, 2006, p.179-180). Tais princípios, tanto gerais como específicos, podem e devem ser utilizados por todos os profissionais que fazem parte do tratamento da pessoa com deficiência na sessão de equoterapia, pois são princípios que buscam o desenvolvimento biopsicossocial da pessoa com deficiência. CONCLUSÃO A equoterapia é uma atividade que proporciona à pessoa com deficiência vários benefícios, devido ao estímulo da passada tridimensional do cavalo; estes benefícios estão relacionados tanto ao aspecto motor, como ao aspecto cognitivo e psicológico. No aspecto motor pode-se identificar melhorias na postura, equilíbrio e coordenação motora; no cognitivo, melhora da memória e concentração, e por fim, beneficio psicológico com a superação de fobias e aumento da autoconfiança e autoestima. O professor de Educação Física tem diferentes papeis frente às diversas deficiências na aquisição de habilidades motoras, postura e equilíbrio, dando também atenção na utilização de recursos lúdicos para potencializar os resultados obtidos nas sessões de equoterapia. REFERÊNCIAS BARROS, J. F.; AZEVÊDO, P.H. A Equoterapia como Atividade Motora Adaptada. In: RODRIGUES, D. (Org.). Atividade Motora Adaptada: a alegria do corpo. São Paulo: Artes Médicas, 2006. LOOVIS, E. M. Distúrbios Comportamentais. In: Educação Física e Esportes Adaptados. Tradução: Fernando Augusto Lopes. Barueri: Manole, 2004. Cap. 10, p. 163-180. MANUAL DIAGNÓSTICO E ESTATÍSTICO DE TRANSTORNOS MENTAIS – DSM-V. Tradução: Maria Inês Correia Nascimento et al. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014. PORRETTA, D. L. Paralisia Cerebral, Acidente Vascular Cerebral (AVC) e Traumatismo Crânio-Encefálico (TCE). In. Educação Física e Esportes Adaptados. Tradução: Fernando Augusto Lopes. Barueri: Manole, 2004. Cap. 12, p. 207-227.