FABÍOLA PEREIRA CARDOSO DISFONIA PSICOGÊNICA E OS MECANISMOS SUBJACENTES Monografia apresentada ao CEFAC - Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica para a obtenção do Certificado de Conclusão do Curso de Especialização em Voz PORTO ALEGRE, RS 1999 CARDOSO, Fabíola Pereira. Disfonia Psicogênica e os mecanismos subjacentes. Porto Alegre. RS, 34 p. 30 cm. Monografia Curso de Especialização em Voz – Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica - CEFAC Distúrbios da Voz - NLMC – w500 CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO ÁREA DE CONCENTRAÇÃO:VOZ COORDENADORA: Profª Drª. Sílvia Maria Rebelo Pinho Mestre e doutora pela UNIFESP – Escola Paulista de Medicina – Especialista em Voz e Coordenadora do curso de Especialização em Voz do CEFAC - Orientadora metodológica: Profª Maria Helena Untura Caetano Mestre pela UNIFESP Escola Paulista de Medicina, especialista em Audiologia e Doutouranda em Ciências na área de Fisiopatologia Experimental da Faculdade de Medicina da USP. AGRADECIMENTOS Aos familiares, que compreenderam a ausência, valorizando e respeitando um ideal profissional. Ao marido que contribuiu para a execução deste trabalho. Ao filho que cedeu seu tempo com a mãe, porque de sua maneira acreditou na importância deste momento para ela. Aos professores que acreditaram no espírito científico da fonoaudiologia e que dedicaram-se na transmissão de seus conhecimentos e experiências. À coordenadora do curso de especialização em Voz, Sílvia Rebelo Pinho, mestre e doutora pela UNIFESP – Escola Paulista de medicina, Especialista em Voz pelo CEFAC por sua sabedoria não só como profissional, mas como ser humano. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................................07 2 LITERATURA .....................................................................................................................08 3 DISCUSSÃO ........................................................................................................................13 3.1 Definição ..........................................................................................................................13 3.2 Terminologia ....................................................................................................................14 3.3 Início ................................................................................................................................14 3.4 Incidência .........................................................................................................................15 3.5 Prevalência .......................................................................................................................15 3.6 Classificação ....................................................................................................................15 3.7 Psicodinâmica da Disfonia Psicogênica ..........................................................................19 3.7.1 Reação de Conversão ............................................................................................22 3.8 Avaliação Fonoaudiológica .............................................................................................24 3.9 Achados Laringológicos ..................................................................................................25 3.10 Terapia Fonoaudiológica ...............................................................................................25 4 CONCLUSÃO ......................................................................................................................28 5 RESUMO ..............................................................................................................................30 6 SUMMARY ..........................................................................................................................32 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .....................................................................................33 1 INTRODUÇÃO O componente psicogênico transpassa todos os tipos de disfonias. As pesquisas cada vez mais minuciosas em relação às bases fisiológicas do mecanismo de produção vocal, permite ao fonoaudiólogo o domínio de técnicas terapêuticas mais eficazes nas disfonias. No entanto, o fonoaudiólogo deve manter uma visão holística de seu paciente, considerando a integridade voz – personalidade. A voz é expressão emocional e ultrapassa o significado da própria palavra. Os fatores psicogênicos podem constituir-se em causas e/ou co-ocorrências das disfonias, podendo perpetuá-las caso não forem devidamente abordados. A questão de como explicar a desordem de voz que, visivelmente, não é causada por anormalidade estrutural é explorada neste estudo. Ainda existem mistérios envolvendo o simbolismo do sintoma vocal para o indivíduo. Por outro lado, o controle que este mecanismo simbólico exerce sobre o aparato vocal é difícil de ser analisado. No entanto, causas conhecidas, desconhecidas ou motivações inconscientes interferem na volição normal da voz. O fonoaudiólogo deve questionar-se nos casos de disfonias psicogênicas se a terapia concentrada nas características da voz é prioridade. Ou, se ajudar o paciente a identificar e trabalhar o problema básico é o melhor caminho. A combinação entre os dois enfoques também é uma possibilidade. 2 LITERATURA MOSES, Paul (1954) referiu que o homem que tem medo mostra através da sua voz, postura, jeito de andar, nos gestos e no que ele diz. Afirmou que a voz é a expressão primária do indivíduo, e através da voz pode-se descobrir uma patologia neurótica. Todos os sintomas da ansiedade neurótica envolvem o mecanismo vocal. O autor mencionou o sentimento de “nó na garganta”, choro incontrolável, tensão e fadiga. Revelou que os processos respiratórios são especialmente sensíveis ao medo e à ansiedade, assim como as cordas vocais que são músculos voluntários. Considerou a afonia e o mutismo como expressões vocais de tal estado emocional. A voz pode ser usada para criar um sintoma de protesto. Quando explanou a respeito da reação de conversão mencionou que a escolha do órgão que o paciente faz do órgão apto a desenvolver sintomas, é altamente significativa revelando profundos problemas. BRODNITZ, Friedrich S. (1970) argumentou que o paciente consulta o laringologista porque está convencido do que alguma desordem orgânica afetou a produção de sua voz. Em geral, ele não tem “insight” para a dinâmica psicossomática de sua doença. Antes de proceder em relação à questão emocional subjacente à doença, é importante demonstrar ao paciente que suas pregas vocais são perfeitamente capazes de produzir som. O autor salientou que, em muitas instâncias, se a afonia já persiste por um longo tempo, o conflito psicológico que a produziu pode perder a validade. ZIEGLER, Frederick (1970) atribuiu características repressivas ao paciente com sintomas de reação de conversão. Definiu traços repressivos como tendências para reprimir e negar os distúrbios do humor, transtornos emocionais e conflitos e a aparente habilidade de estar inconsciente dos problemas. Complementou que o paciente simula inconscientemente a doença que em nossa sociedade é uma razão aceitável para não adequação em várias ocupações e outros papéis sociais. Quando o indivíduo sente-se incapacitado para manejar sua demanda social ou necessidades, pode reagir desenvolvendo sintomas de conversão histérica. GONZÀLES (1981) postulou que a voz na disfonia psicogênica era, do ponto de vista acústico, geralmente parética. Outras vezes pode ser acusticamente espasmódica. Acrescentou que o paciente pode apresentar outros sintomas como anorexia, sede, ciclo sexual alterado e dificuldade para dormir. O autor salientou que toda somatização leva um selo pessoal, que pode ser entendido através da história do paciente. BRODNITZ, FRIEDRICHS (1981) enfatizou que é fácil perder a visão de totalidade da função corporal na reabilitação vocal. Os detalhes técnicos da produção da voz sendo demasiadamente enfocados impedem o restabelecimento da função vocal total. KOUFMAN, James A. & BLALOCK, David P. (1982) estabeleceram uma classificação para as desordens funcionais de voz na qual enfocou o mecanismo subjacente e a apresentação clínica. Nesta classificação diferenciou claramente uma rouquidão habitual pósviral da qual ocorre por verdadeira reação de conversão histérica. Nas reações de conversão a afonia é inconscientemente selecionada e é de significado simbólico. Na rouquidão habitual pós-viral, por outro lado, o paciente faz uma adaptação crônica para uma disfunção aguda. Freqüentemente com algum ganho secundário. RAMMAGE, L. A, NICHOL, H. e MORRISON, M. D. (1987) atribuíram à disfonia psicogênica uma combinação complexa de fatores psicológicos, orgânicos e sociais que podem ser agentes predisponentes, precipitantes ou perpetuantes. Referiram que o sintoma psicogênico de disfonia, enquanto desagradável em si mesmo, constitui para o paciente menor mal do que o problema pessoal do qual surgiu. BLEICHMAR, Emilce Dio (1988) concebeu vários mecanismos de produção de um sintoma por reação de conversão: por simbolização, em que uma parte do corpo expressa, pela alteração da função, um pensamento reprimido e simultaneamente o mecanismo de defesa. Por identificação com o outro em que o sintoma se emprega para obter uma equiparação de ser a ser. Por identificação com o recurso do outro, ao benefício secundário, aprendendo de que através da doença provoca efeitos interpessoais. ARONSON, Arnold (1990) registrou um aumento da freqüência fundamental da voz relacionado diretamente ao incremento da tensão emocional. No caso de tensão músculoesqueletal o paciente sentirá desconforto ou dor quando o espaço tíreo-hioídeo for manipulado lateralmente, estando a laringe e o osso hióide elevados no pescoço. Quanto ao abuso vocal em crianças, referiu que este é um elo intermediário na cadeia de causas que começa com um ímpeto determinado emocionalmente para vocalizar agressivamente. Enfatizou que nem todas as crianças são vociferantes de acordo com o estereótipo popular. Encontrou, tanto em crianças, como adultos, a presença de abuso vocal concomitante com períodos de tensão emocional. O autor descreveu, também, as desordens vocais de conversão, sendo que a mais incapacitante delas é o mutismo, no qual o paciente nem sussurra, nem articula. Na afonia de conversão o paciente sussura. Na disfonia de conversão a qualidade vocal é extremamente variável. MILUTINOVIC, Zoran (1991) mencionou que mudanças orgânicas na laringe, faringe e nariz, em certas condições, facilitam o aparecimento de desordem de voz psicogênica, pois são a somatização direta de um conflito psicodinâmico. CARVAJAL, C; SANFUENTES, M. T.; WVA, P.; JARA e STEPKE, F. L. (1992) concluíram através do estudo com pacientes com disfonia funcional que incluíram no diagnóstico a classificação dos traços de personalidade, todas as pacientes tem, ao menos, dois diagnósticos. Um dado pelo sintoma disfonia e o outro correspondente à personalidade. Nenhum paciente (das 15 analisadas) apresentou personalidade normal, o que leva a crer numa vulnerabilidade para patologia psiquiátrica ou, inclusive, somática (uma personalidade vulnerável atrasa a evolução de qualquer doença). BUTCHER, P.; ELIAS, A e RAVEN, R. (1993) inferiram que a perda da voz não necessita ser um impedimento inconsciente ou simbólico da expressão. Constataram que geralmente a tensão músculo-esquelética conduziu à disfonia, podendo produzir afonia. A técnica vocal inadequada em vez de ser a causa, pode ser a conseqüência na tentativa de compensar a perda da voz, onde já existe um aumento de tensão músculo-esqueletal. Recomendaram que o patologista da fala deveria ajudar o paciente a ter “insights” quanto aos fatores precipitantes e perpetuantes da desordem de voz para que ele possa atenuar a causa do problema ou modificar sua resposta a ele. STASSEN, H. H & KUNY ST. (1993), em sua análise sobre os aspectos psicopatológicos da depressão, encontraram que o paciente em recuperação muda seu comportamento, em média, de um baixo monotom para uma voz normal e, de uma fala lenta e hesitante, para uma mais fluente. HUCHE, François Le & ALLALI, A. (1994) caracterizaram a afonia completa que se apresenta com voz cochichada, a afonia incompleta em que existem momentos de aparição da voz, principalmente quando a pessoa diz algo sem importância. Incluíram ainda o equivalente disfônico da afonia que trata-se de uma rouquidão severa, podendo ser bitonal. Outras vezes, de uma intensa nasalização; e por último, de uma voz fraca e aguda. BOONE, Daniel R & MC FARLANE, Stephen C. (1994) reconheceram que os pacientes afônicos raramente evitam situações de comunicação. Para isso, usam expressões faciais, mãos e fala sussurrada inteligível. É como se o paciente tivesse perdido o “ambiente” para vocalização. BEHLAU M. & PONTES P. (1995) propuseram que a disfonia psicogênica é uma desordem funcional, pois o processo que levou ao aparecimento e à instalação da voz disfônica tem um simbolismo direto com a função fonação da laringe. CASE, James L. (1996) declarou que a vulnerabilidade da laringe às emoções é um excelente barômetro da estabilidade mental e psicológica do indivíduo. Acrescentou que o estado emocional dos seres humanos é dependente das regulações do sistema nervoso e de interações endócrinas. KIESE-HIMMEL, Christiane & KRUSE, Eberhard (1996) concluíram que não é possível imaginar um tipo de personalidade para um tipo de distúrbio de voz. CARVAJAL, C. e col (1996) mencionaram que situações de conflito emocional podem distorcer ou limitar a mobilidade corporal, propiciando mudança no tônus muscular. A respiração, a postura, a atividade secretora das mucosas refletem fielmente as perturbações das emoções. Qualquer destes fatores podem alterar as características da voz. ANDERSSON, K. & SHALÉN, L. (1998) em seu modelo terapêutico dirigiram atenção para todo corpo do indivíduo como instrumento para a expressão das emoções, evocando sentimentos positivos por ritmo e movimentos corporais lúdicos. BEHLAU, M.; PONTES, P. e GÜNTERT, A. E. V. (1998) comentaram que as disfonias por alteração psicoemocional representam um importante contingente na área dos distúrbios da voz. Os autores reforçaram que qualquer alteração orgânica pode coexistir na presença de sintomas de conversão. O que não exclui o diagnóstico de uma disfonia psicogênica. 3 DISCUSSÃO 3.1 Definição Todos os autores pesquisados concordaram que na Disfonia Psicogênica não há uma base física ou estrutural que justifique os sintomas vocais. ANDERSSON, K. & SCHALÉN, L. (1998) propuseram que a Desordem Psicogênica de Voz poderia ser considerada como um distúrbio de um aspecto particular da comunicação, da capacidade de expressão verbal emocional. Foi interpretada como uma reação somática a problemas emocionais, mas cujos processos patogênicos necessitam de melhor entendimento. GONZÁLEZ (1981) afirmou que esta somatização da problemática emocional era dirigida para o nível laríngeo. MOSES (1954) considerou que há um simbolismo entre o processo que desencadeou a disfonia e a função fonação. BEHLAU & PONTES (1995) reafirmaram tal ponto de vista. Em contrapartida, BUTCHER e col. (1993) concluíram que a perda da voz não é necessariamente um impedimento inconsciente ou simbólico da expressão. No sentido psicodinâmico estes autores inferiram que a disfonia psicogênica é uma dificuldade involuntária conectada com altos níveis de ansiedade e stress, que são associados com relações interpessoais problemáticas e inibição relacionada à expressão verbal. CASE (1996) referiu que a Disfonia Psicogênica ocorre quando o controle vocal sobre pitch, loudness, qualidade ou ressonância é rompido por causa de um desequilíbrio psicológico, impedindo a comunicação efetiva. ARONSON (1990), de forma semelhante postulou que a desordem era uma manifestação de um ou mais tipos de desequilíbrio psicológico, que interferia no controle volitivo normal da fonação. 3.2 Terminologia Os termos “funcional”, “psicogênico”, “psicossomático”, “histérico” e “não-orgânico” foram usados na literatura e na clínica como sinônimos e se referiam a um grupo de desordens de voz que existem na ausência da patologia laríngea orgânica. ARONSON (1990) fez objeção ao termo “funcional” devido a sua ambigüidade e falta de precisão, falhando em especificar a causa subjacente. Por isso, optou pelo termo “psicogênico”, que carrega em si mesmo uma especificação causal. MOSES (1954) mencionou a dificuldade para traçar o limite entre o funcional e o orgânico. Para BUTCHER e col (1993) o termo psicossomático carrega uma convicção popular desagradável de que todos os sintomas físicos são imaginários e não reais. A maioria dos autores que mencionou a denominação histérico, esclareceu que implica num único mecanismo psicológico que não necessariamente esteja operando. 3.3 Início Os autores mencionaram com maior freqüência o início súbito da disfonia/afonia psicogênica. Para HUCHE, Le (1994) o início da primeira crise era brusco na metade dos casos e, habitualmente aparecem recidivas. Nestes casos, a voz alterava-se gradativamente. ARONSON (1990) acreditou que a desordem vocal iniciava subitamente com uma rouquidão que podia se transformar em afonia. BEHLAU & PONTES (1995) afirmavam que, freqüentemente, o paciente sabia indicar a data do início da afonia, descrevendo o momento com detalhes. BRODNITZ (1970) salientou que a perda súbita da voz é uma manifestação do passado e que atualmente é comum uma forma mista de afonia que oscila entre períodos de aus~encia de voz e voz hipofuncional muito fraca. 3.4 Incidência A incidência de disfonia/afonia psicogênica é em média de 5 % do total das disfonias funcionais e entre 1,7 e 3,8 % do total das disfonias, segundo os autores que indicaram este dado. 3.5 Prevalência A desordem vocal psicogênica é uma patologia predominantemente feminina. HUCHE Le (1994) observou que a freqüência máxima era na faixa de idade dos 30 aos 39 anos e BRODNITZ (1970) dos 40 aos 50 anos, fase da menopausa que geralmente envolve perturbações emocionais. Este autor identificou uma exceção em soldados com afonia nas duas guerras mundiais que apresentaram choque de batalha. Os registros de casos em crianças são raros. BRODNITZ (1970) citou um caso de uma menina de 10 anos com afonia funcional. BEHLAU & PONTES (1995) apontaram um menino de 12 anos com afonia de conversão transitória. ARONSON (1990) incluiu abuso vocal em crianças nas disfonias psicogênicas. 3.6 Classificação ARONSON (1990) considerou quatro categorias principais de desordem de voz psicogênica: 1 – Tensão Músculo – esquelética, que inclui abuso vocal, nódulos vocais, úlceras de contato e disfonia ventricular; 2 – Desordens de voz de conversão que abrangem mutismo e afonia de conversão, disfonia de conversão e disfonia espástica adutora psicogênica; 3 – Falsete Mutacional (puberfonia); 4 – Fala Infantil em adultos. BUTCHER e col (1987) concordaram com a inclusão das desordens de voz por tensão músculo-esquelética na classificação de disfonia psicogênica porque acreditaram que os músculos laríngeos extrínsecos e intrínsecos são sensíveis à tensão emocional. A hipercontração deles é o denominador comum em virtualmente todas as disfonias psicogênicas. Em contrapartida, BOONE & Mc FARLANE (1988) classificaram separadamente disfonias hipercinéticas, embora reconheceram que fatores poderiam causar parcialmente ou perpetuar estas desordens psicogênicos de voz. Já CASE (1996), considerou que incluir abuso vocal nas desordens de voz confunde os aspectos da natureza das desordens. CARVAJAL e col (1992) incluíram a disfonia psicogênica na Classificação dos Transtornos de Comportamento da CID-10 na F4s que são os transtornos somatoformes. Estes transtornos caracterizam-se pela apresentação repetida de sintomas físicos juntamente com solicitações persistentes de investigações médicas, apesar de repetidos achados negativos e de reasseguramentos pelos médicos de que os sintomas não tem base física. Se quaisquer transtornos físicos estão presentes, eles não explicam a natureza e a extensão dos sintomas ou a angústia e a preocupação do paciente. Mesmo assim, ele resiste às tentativas de discutir a possibilidade de causação psicológica. BEHLAU & PONTES (1995) classificaram quadros típicos de disfonia psicogênica em cinco tipos: - Afonia de conversão: com fala articulada ou com fala sussurrada. A emisssão glótica nas funções vegetativas está preservada. - Uso divergente de registros: é uma forma bizarra de disfonia psicogênica. Caracteriza-se pela emissão alternada em dois tipos diferentes de registro (peito e cabeça, peito e falsete, basal e peito). Geralmente não tem relação com o discurso e sem a consciência do paciente de seu desvio fonatório. - Falsete de conversão: emissão habitual em registro de falsete, com grande fluxo de ar e qualidade vocal soprosa/áspera. O paciente fala com esforço e os tempos de emissão estão reduzidos. - Sonoridade intermitente: manifesta-se com alternância surdo-sonoro em pequenas unidades de fala ou em trechos áfonos e sonoros, durante a conversação. Além destas quatro categorias definidas, podem aparecer quadros de tremor vocal psicogênico ou ainda numerosas manifestações monossintomáticas com desvios na ressonância, altura e intensidade. KOUFMAN & BLALOCK (1982) apresentaram uma classificação enfatizando o mecanismo subjacente e a apresentação clínica das disfonias funcionais: Tipo 1 – Afonia/ Disfonia Histérica 1 – Início: súbito 2 – Laringoscopia indireta: normal 3 – Freqüentemente associado com discreto evento precipitante 4 – Sem história prévia de laringite 5 – Sintomas associados: nenhum 6 – Qualidade vocal: afonia ou sussurro, pitch restrito (se alguma voz presente), a disfunção estável (não intermitente ou flutuante). O autor concluiu que afonia histérica era um sintoma de uma dissociação mental moderada e que tinha bom prognóstico. Tipo 2 – Rouquidão habitual 1 – Início : rouquidão persistente (por meses ou anos), geralmente seguindo um episódio agudo de laringite. 2 – Laringoscopia Indireta: normal (exceto por participação ocasional de prega ventricular). 3 – Sintomas associados: nenhum 4 – Não é associada com evento precipitante mas freqüentemente com ganho secundário. 5 – Qualidade vocal: soprosa, aspereza, diplofonia, prega ventricular (ou uma combinação), pitch restrito, disfunção estável. Tipo 3 – Falsete: incomum mas facilmente reconhecido 1 – Início: desenvolvimento súbito 2 – Laringoscopia indireta: normal 3 – Sintomas associados: nenhum 4 – Qualidade vocal: pitch anormalmente elevado, disfunção estável. Os três tipos anteriores estão relacionados ao mau uso vocal. Tipo 4 – Abuso Vocal 1 – Início: a longo prazo, disfonia intermitente ou flutuante 2 – Abuso vocal resultante de: uso exagerado, pitch baixo, tensão muscular na laringe e pescoço 3 – Laringoscopia indireta: normal ou associada com nódulos vocais, pólipos, úlceras ou granuloma. Tipo 5 – Disfonia Pós-operatória 1 – Início: disfonia severa secundária ao abuso vocal pós-operatório 2 – Laringoscopia indireta: normal com a participaçãp de pregas ventriculares, úlceras ou granulomas 3 – Sintomas associados: dor de garganta coincidente com disfonia 4 – Qualidade vocal: a) Disfonia variável b) Ataque glótico brusco c) Sem restrição na variação de pitch d) Participação freqüente de pregas ventriculares. Ocorre em pacientes que não foram devidamente preparados no pré-operatório ou não cumprem com as recomendações no pós-operatório. 3.7 Psicodinâmica da Disfonia Psicogênica RAMMAGE e col (1986), ARONSON (1990), BUTCHER e col (1993) e CASE (1996) convergiram para a idéia de que a musculatura, tanto extrínseca como intrínseca da laringe, é sensível à tensão emocional e a hipercontração muscular é um fator comum a todas as disfonias psicogênicas. Também MOSES (1954) já afirmava que as pregas vocais são músculos voluntários sujeitos à reação de medo. Segundo os autores, fatores como medo, raiva, depressão, ansiedade e reação a conversão podem causar tensão músculo-esquelética. KIESE-HIMMEL & KRUSE (1997) analisaram 128 indivíduos com disfonia funcional e constataram grande dificuldade de classificá-los psicologicamente em um quadro clínico. No entanto, ressaltaram que o medo em situações de contato interpessoal e a mudança de estilo de vida eram os principais fatores desencadeantes das disfonias. Os indivíduos também demonstraram baixa auto-estima. BRODNITZ (1970) referiu que a afonia funcional pode representar uma fuga de um conflito emocional e que os problemas conjugais são os mais comuns. CARVAJAL (1996) realizou pesquisa com 77 mulheres (idade média de 41,3 anos no Hospital do Trabalhador em Santiago (Chile) que foram encaminhadas à fonoterapia por disfonia funcional. Constatou que nesta amostra os conflitos psicológicos mais freqüentes foram os de tipo laboral. ANDERSSON & SCHALÉN (1998) reafirmaram este dado, acrescentando a ele os conflitos relacionados à família. BUTCHER e col. (1993) citaram, ainda, como possíveis causas da disfonia psicogênica, os conflitos para expressar sentimentos e opiniões pessoais, o excesso de compromissos e desamparo relacionados às mulheres. BRODNITZ (1970) mencionou que o medo do câncer e procedimentos cirúrgicos na laringe, sem a devida orientação pré-operatória, podem desencadear a afonia. De forma semelhante, RAMMAGE e col. (1986) afirmaram que se o indivíduo é excessivamente ansioso em relação à sua saúde ou voz, uma alteração orgânica pequena pode levar ao abuso vocal, podendo evoluir para uma afonia. Inversamente, o abuso vocal induzido por fatores psicológicos e sociais pode levar a problemas orgânicos secundários. Similarmente, HUCHE, F. Le & ALLALI (1994) destacaram os casos de indivíduos que apresentaram problemas laringológicos banais e que usavam a voz profissionalmente e que o medo de perder a voz era quase uma obsessão. Esta preocupação torna seu comportamento vocal artificial podendo chegar à afonia que, as vezes, é influenciado por excessiva recomendação de repouso vocal. ARONSON (1990), ANDERSSON & SCHALÉN (1998) e CASE (1996) citaram as infecções respiratórias superiores, gripe, condição alérgica severa como fatores ativadores das disfonias e afonias de conversão. Mesmo após a recuperação física, permanece a disfonia que pode evoluir para afonia. Na mesma linha, MILUTINOVIC (1991) enfatizou a coincidência entre reações inflamatórias da mucosa das vias aéreas superiores e desordem de voz psicogênica. Neste sentido, o stress crônico ou agudo provoca uma instabilidade psicológica e os sintomas são produzidos no local de menor resistência física. MOSES (1954) afirmou que a energia potencial de um indivíduo baixava durante ou após uma doença aguda localizada que poderia provocar uma dificuldade temporária no funcionamento da laringe. Assim, o indivíduo desenvolvia o hábito de uso ineficiente da voz, mesmo que a condição aguda tenha desaparecido. O sintoma vocal, geralmente, era resistente à fonoterapia e podia remeter ao simbolismo que representa. FREEMAN, M (1986) considerou que a combinação de variáveis psicológicas, orgânicas, psicossociais e comportamentais pode causar a desordem de voz. Quando se trata de disfonia e afonia por reação de conversão, FREEMAN (1986), BUTCHER e col. (1993), BEHLAU & PONTES (1995) e CASE (1996) evidenciaram nos pacientes uma condição de tranqüilidade incomum considerando a severidade da sintomatologia denominada de “la bèlle indifferènce”. ZIEGLER (1970), ao contrário, não associou “la bèlle indifferénce” com as reações de conversão, mas que depende da eficiência do funcionamento da personalidade repressiva, que pode ser completa, mas é mais comumente incompleta. ARONSON (1990) e CASE (1996) abordaram o falsete mutacional entre as disfonias psicogênicas. O falsete mutacional geralmente ocorre em meninos que fracassaram para mudar a voz com pitch alto do pré-adolescente para a voz com pitch mais baixo do adolescente. Este pitch alto tipo falsete é fraco, soproso, rouco e mono pitch passando a impressão de imaturidade, efeminidade e passividade. CASE (1996) considerou que as mudanças rápidas no corpo e o aumento das responsabilidades podiam tornar difícil a transição de menino para homem. Já ARONSON (1990) relacionou o falsete mutacional no menino à maior auto-identificação com a figura feminina. Também associou com a necessidade neurótica para resistir à transição normal para a vida adulta. Referiu que pode ocorrer no homem adulto. A imaturidade psicológica não é a única causa desta desordem. RAMMAGE e col. (1986) argumentou que a função do sintoma da disfonia psicogênica varia de paciente para paciente. Empregaram o termo “ganho primário” para se referir à redução da ansiedade e tensão do indivíduo através de vários mecanismos de defesa do ego que produz o sintoma psicogênico. O termo “ganho secundário” remete ao benefício que o indivíduo obtém do meio ambiente externo como simpatia, atenção e satisfação das necessidades e dependência. Pode servir para reforçar a disfonia e perpetuá-la. BRODNITZ (1981) salientou que o fonoaudiólogo enfrenta a resistência do paciente para aceitar e usar uma voz normal. Esta característica é uma reação freqüente no indivíduo neurótico que resiste ao tratamento porque está obtendo ganho secundário. O paciente pode ter sintomas superficiais, expressando disposição para livrar-se deles, mas apóia-se profundamente neles. Se o fonoaudiólogo não superar a resistência do paciente, reforçando sua motivação, o tratamento está destinado ao fracasso. CARVAJAL (1996) destacou que a maioria dos pacientes com disfonia psicogênica pode ser catalogada em algum transtorno psiquiátrico, predominando de tipo reativo. Contrariaram neste ponto de vista BUTCHER e col. (1993), BEHLAU & PONTES (1995) e ARONSON (1990). Consideraram que os distúrbios psiquiátricos nestes pacientes eram raros e se ocorreram estavam relacionados ao quadro de histeria. STASSEN & KUNY (1993) constataram que existiam associações claras entre as características sonoras dos pacientes de voz e virtualmente todas as síndromes psicopatológicas. 3.7.1 Reação da Conversão ZIEGLER (1970) definiu a reação de conversão histérica como sintomas físicos específicos, relativamente persistentes que existem na ausência de suficiente patologia fisiológica. Constituem uma simulação inconsciente de doença pelos pacientes, que estão convencidos de sua origem somática. Permitem que os pacientes permaneçam parcialmente inconscientes dos conflitos, stress ou inabilidades, que do contrário, poderiam ser emocionalmente doença. prejudiciais. Os pacientes estão convencidos da natureza física de sua MOSES (1954) reconheceu a laringe como um órgão sexual secundário e empresta a si mesma prontamente como um desvio para conflitos de natureza sexual. Referiu que neuroses podem ocorrer tanto em órgãos normais como organicamente doentes ou em órgãos que foram doentes no passado. As influências ambientais, mudanças na posição social determinavam a escolha do órgão com disposição para desenvolver sintomas. Acrescentou que filogenia e ontogeneticamente a produção da voz é um atividade autoerótica antes de ser comunicação. A criança sente prazer na fonação como uma atividade oral. Segundo a teoria psicanalítica, conforme com este autor, inferiu aquelas partes da sexualidade infantil que não são integradas à vida sexual adulta são transformadas em traços característicos. Ganância, gula, inquietação, impaciência, ambição são considerados traços de caráter oral. Grande parte da atividade oral libidinosa da infância precoce é absorvida virtualmente inalterada na sexualidade madura, mas outra parte está retida de forma original em cada prazer como comer, falar e cantar. Assim, exemplificou que indivíduos dependentes, exigentes estão fixados numa etapa infantil precoce e um falante neurótico ao extremo pode ser resultado da insatisfação de sugar. Para ARONSON (1990) uma reação de conversão é qualquer perda do controle voluntário sobre o músculo estriado ou sobre as sensações gerais ou especiais, como conseqüência de tensão ambiental ou conflitos interpessoais. Os critérios que o autor estipulou para uma reação de conversão são: 1 – Sintomas físicos específicos ou síndromes que não podem ser acompanhados por doença anatômica ou fisiológica. 2 – Simulações inconscientes de doença, da qual o paciente está convencido de sua origem orgânica. 3 – Atendem a uma finalidade psicológica permitindo que o paciente evite a consciência do conflito emocional, stress ou fracasso pessoal que seria emocionalmente intolerável se enfrentado diretamente. 4 – Podem acontecer em qualquer sistema sensório-motor ou voluntário. Muitos autores utilizaram reação de conversão e histeria como termos sinônimos e intercambiáveis. ARONSON (1990) estabeleceu uma diferenciação entre eles. Segundo este autor, conversão se refere à somatização de um conflito emocional elaborado previamente. Histeria está associada a um tipo de personalidade ou padrão de comportamento. Neste sentido o indivíduo histérico é imaturo, egocêntrico, com propensão para desenvolver queixas subjetivas em várias partes do corpo. Destaca sua própria sexualidade, revelando insegurança, nesta área. Pode ser ainda sugestionável, dependente, superficial, dramático e lábil afetivamente. Muitos indivíduos satisfazem um ou mais destes critérios mas não têm uma reação de conversão. Reciprocamente, muitos com uso de reação de conversão não apresentam características histéricas. BLEICHMAR (1988) também discutiu a correspondência entre histeria e conversão. Para ela, a conversão guarda uma relação simbólica precisa com a história de sujeito e com esta particularidade se distinguiria de outros processos de formação de sintonia. A Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento da CID-10 na categoria F44 referiu que os transtornos dissociativos ou conversivos estão intimamente associados no tempo a eventos traumáticos, problemas insolúveis e intoleráveis ou relacionamentos perturbados. Esses transtornos foram anteriormente classificados como tipos diversos de “histeria de conversão”, mas agora parece melhor evitar o termo “histeria” tanto quanto possível, devido a seus muitos e variados significados. 3.8 Avaliação Fonoaudiológica CASE (1996) recomendou que o paciente devia ser avaliado pelo médico otorrinolarringologista ou de outra especialidade, e exemplificou o neurologista, pois existem doenças neurogênicas que produzem sintomas vocais semelhantes à disfonia psicogênica. Quando a possibilidade de organicidade foi descartada o fonoaudiólogo começaria a avaliação fazendo um levantamento da história do paciente, estilo de vida, fontes de tensão e conflito, relações familiares, matrimoniais, atitudes sobre auto-estima e auto-confiança. Para isso, comentou o autor, é essencial uma atitude de encorajamento à comunicação por parte do terapeuta. Constatou que o fonoaudiólogo, em geral, é o primeiro profissional a ver o paciente com desordem de voz psicogênica. Sendo assim, julgou importante que ele investigasse a área psicológica, para então encaminhar ao serviço de psicologia ou psiquiatria se necessário. Através da história do paciente o fonoaudiólogo teria dados para saber se este encaminhamento deve ser feito imediatamente ou se a terapia vocal sintomática pode ser efetiva. BUTCHER e col (1993), de forma análoga salientaram a entrevista inicial com o paciente através de um questionário sensível e bem planejado. Nele constariam dados sobre a história médica e de voz, sobre influências pessoais e ambientais relacionados ao início e duração da desordem vocal. Referiram também a observação da postura e comportamento do paciente na clínica, com atenção para os sinais de tensão. Não pretenderam fornecer um modelo específico de entrevista psicológica e talvez o terapeuta ficaria restrito na interpretação dos fatos. FREEMAN (1986) enfatizou o conceito que o próprio paciente tem da causa de sua disfonia. Em interseção com os autores anteriores, considerou relevante a história prévia do paciente, as circunstâncias e como a voz sofre mudanças. BEHLAU & PONTES (1995) revelaram como é surpreendente a comparação entre a pobreza dos achados do exame otorrinolaringológico e a riqueza dos dados de anamnese e avaliação fonoaudiológica dos pacientes. De acordo com estes autores, esta avaliação expressa alterações até nos parâmetros vocais de mais fácil avaliação, como os tempos máximos de fonação e a relação S/Z, um dos mais fiéis parâmetros da eficiência das pregas vocais no controle e sonorização da saída de ar dos pulmões. 3.9 Achados Laringológicos Os achados laringológicos mais comuns foram: pregas vocais normais ou com leve edema. Aronson (1990), Case (1996), Le Huche (1994) e Brodnitz (1970) , Boone e Mc Farlane (1994)Behlau & Pontes (1995); mudanças teciduais na mucosa das ppvv, tal como nódulos, pólipos, úlceras de contato, Aronson (1990), Butcher e col (1993), L. Ramnage e col (1987), Huche Le (1994), Boone & Mc Farlane (1994); graus diferentes de adução de bandas ventriculares (Rammage e col. (1987) Huche Le (1994), Aronson (1990), Boone & Mc Farlane; hipoadução de pregas vocais Aronson (1990), Case (1996) Rammage e col (1987), Le Huche (1994) e Boone & Mc Farlane (1994); fenda posterior Rammage e col. (1987); fenda triangular ântero-posterior, Behlau & Pontes (1995); hiperadução Aronson (1990), Boone & McFarlane (1994). 3.10 Terapia Fonoaudiólógica BUTCHER e col (1993) atribuíram ao fonoaudiólogo a função de ajudar o paciente a ter “insights” quanto aos fatores precipitantes e perpetuantes da disfonia, permitindo-lhe fazer ajustamentos para atenuar a causa da desordem ou modificar sua resposta a ela. Declararam que resolvendo as causas subjacentes à disfonia, a voz pode melhor. As técnicas de tratamento sugeridas foram principalmente relaxação, exercícios vocais, sessões em grupo e aconselhamento, que se baseia nos estilo de Rogers. Nesta linha, afirmaram os autores, o terapeuta é atencioso, solidário e um ouvinte que não julga. Alegaram que se os probemas psicológicos forem mais complexos, talvez esta abordagem não seja suficiente e o fonoaudiólogo não tenha preparo para atender esta demanda. Como alternativa, citaram a linha cognitivo-comportamental, que preocupa-se mais com a identificação das causas precipitantes da desordem vocal e menos com a classificação médica ou psicanalista. À semelhança, ARONSON (1990) defendeu a discussão com o paciente sobre a possiblidade de causa psicogência, o que HUCHE, Le reafirmou abordando com o paciente o significado da disfonia. ANDERSSON & SCHALEN (1998) ressaltaram que o principal objetivo do tratamento era obter um comportamento vocal normal possibilitando a consciência da conexão entre disfunção vocal e fatores psicossociais. Após a recuperação da voz o paciente tornava-se capaz de identificar comunicação. A terapia emoções e treinar habilidade para consistiu de exercícios vocais tradicionais, exercícios de comunicação e discursos terapêuticos interativos. Durante os exercícios de comunicação a atenção do paciente era dirigida para o corpo como instrumento comunicativo para interação emocional. O discurso terapêutico interativo era usado para mapear o contexto social do paciente, levando-o a reconhecer e nomear emoções, e a falar e agir de acordo com seu estado emocional. Aludiram à terapia cognitivo comportamental como menos satisfatória. BRODNITZ (1970) declarou que nas desordens psicossomáticas da comunicação as soluções nunca são simples. Reconheceu que em geral o paciente não tem insight para a dinâmica psicossomática de sua doença. Ele consultou o laringologista porque estava convencido que alguma desordem orgânica afetava a produção de sua voz. Então concluiu que antes de interferir na questão emocional subjacente à doença, é importante recuperar a voz. Mesmo assim, o fonoaudiólogo pode hesitar em lidar com o entendimento do conflito emocional. Se não tiver conhecimento de psicologia não poderá ajudar o paciente, podendo até prejudicá-lo. Já em 1981, BRODNITZ assegurou que as tentativas para normalizar a voz precisavam ser suplementadas por um entendimento profundo da dinâmica psicológica. Este conhecimento contribuiria para o manejo da reabilitação. Por outro lado, o terapeuta poderia entrar num território perigoso, consciente de não assumir a competência de um psicoterapeuta treinado. Alertou que os problemas emocionais não fixam-se em um órgão, necessariamente. Esclareceu que, o psicossomático percorre um caminho de duas vias: melhorando a função física através do treinamento vocal, indiretamente realiza-se um tipo de psicoterapia. Com uma voz melhor, os pacientes são capazes de lidar com seus problemas emocionais com confiança e segurança. BRODNITZ sugeriu que a terapia deveria se dirigir à restauração da totalidade da função corporal. CASE (1996) propôs a terapia vocal sintomática sem muita atenção às disfunções psicológicas. Salientou que independente da técnica, o importante é que o terapeuta conduza o paciente rapidamente ao uso da voz normal. Quando a voz adquirir estabilidade, indicou que é o momento de fazer o encaminhamento para o psicólogo ou psiquiatra. GONZÀLEZ (1981) preconizou a psicoterapia como tratamento essencial e básico. Acreditou que se as causas não são aprofundadas, o paciente persiste manejando com os sintomas, mesmo que em outro nível do organismo. Por este autor, o trabalho fonoaudiológico deve ser entendido como uma parte do tratamento e não sua totalidade. BOONE & Mc FARLANE (1994) também optaram pela remoção dos sintomas vocais, mas por isso, o paciente deveria estar motivado a melhorar a qualidade de sua voz. Admitiu que o terapeuta oferecesse apoio psicológico. 4 CONCLUSÃO O levantamento bibliográfico propiciou um entendimento do intrincado processo de produção de sintomas vocais psicogênicos. Mas ainda há muito para ser investigado em relação ao simbolismo que eles têm para o indivíduo. Considerou-se que a voz é parte integrante da história pregressa do indivíduo, resultado de fatores internos e externos que a afetam continuamente. Não pode ser vista apenas como produção sonora. Ela transmite significados que exigem do ouvinte uma escuta sensível. O paciente com disfunção psicogênica que procurou o fonoaudiólogo revela o desejo de reconquistar sua voz. Neste momento tinha sua atenção voltada para sua expressão vocal. Se fosse realizado encaminhamento para o psicólogo imediatamente, o paciente podia ser surpreendido, não mostrando receptividade a este tipo de intervenção. Em geral, o fonoaudiólogo quando trata de disfonias orgânicas busca naturalmente conhecimentos e embasamentos científicos. Mas parece que, freqüentemente, ainda tem receio de lidar com as questões da subjetividade. Cabe ao fonoaudiólogo também buscar fundamentação científica na psicologia e atuar em caráter interdisciplinar. Por outro lado, necessita ter auto-crítica para perceber a complexidade de determinados casos e conscientizar-se de seus limites. Se a abordagem terapêutica eleita foi a remoção sintomática apenas, ou se a terapia contribuiu para a compreensão das causas subjacentes à disfonia, depende da análise individual do caso. O essencial é que o paciente resgatou uma parte de si mesmo, tornando-se um ser humano mais integrado, “indivisível”, termo que corresponde à palavra de origem latina indivíduo. 5 RESUMO A plasticidade da voz é demonstrada nas diferenças individuais como integrante da identidade do indivíduo. A voz evidencia características físicas, sociais e psicológicas do falante e manifesta sensivelmente qualquer ruptura do equilíbrio nestas áreas. Quando um desequilíbrio psicológico acontece, seja por medo, raiva, depressão, conflito nas relações interpessoais ou reação de conversão, o indivíduo inconscientemente pode transformá-lo num sintoma vocal. Como foi exposto pelos autores neste estudo, a dicotomia funcional-orgânico não é tão simplista. Estes fatores se interpenetram. Mas quando não há uma base física ou estrutural que justifique a desordem vocal do indivíduo e a sua história revela conflitos psíquicos subjacentes então podemos pensar em disfonia psicogênica. Esta desordem vocal apresenta formas variadas de manifestação desde o mutismo de conversão até uma disfonia com grande variabilidade nas características sonoras. Os autores referiram que as relações entre o sintoma vocal é o simbolismo que ele representa ainda necessita de mais profundas investigações. Na avaliação do paciente com disfonia psicogênica os autores destacaram a entrevista inicial, como meio de conhecer a história do paciente e levantar possíveis causas. Quanto à terapia vocal divergiram quanto ao tipo de abordagem mais adequada. A terapia vocal sintomática atua sobre o mecanismo vocal, procurando restabelecer uma voz melhor. Por outro lado, o fonoaudiólogo pode discutir com o paciente a respeito das causas da disfonia. Quanto ao encaminhamento ao psicólogo ou psiquiatra, poucos autores mencionaram como procedimento imediato, outros como um tratamento paralelo ou como uma intervenção a ser feita após a remoção do sintoma vocal. 6 SUMMARY Voice plasticity is showed in the individual differences as within the individual identity. The voice evinces the speaker’s physical, social, and psychological traits, and clearly manifests any lack of balance in these areas. When a psychological unbalance occurs, whether by fear, anger, depression, conflict in interpersonal relations, or conversion response, the individual may unconsciously change it into a vocal symptom. As the authors in this study have showed the functional-organic dichotomy is not simple. These factors interweave. But when there is no physical or structural basis that justifies the individual’s voice disorder, and his/her history reveals underlying psychic conflicts then we may think of psychogenic dysphonia. This voice disorder provides various types of manifestation from conversion mutism to dysphonia with major voice variability. The authors have mentioned that the relations between voice symptom and the symbolism which it represents require deeper investigations. In the appreciation of the subject with psychogenic dysphonia the authors have highlighted the first interview as a way to know the subject’s history, and raise possible causes. Concerning the voice therapy they disagreed as for the most adequate type of approach. The symptomatic voice therapy acts on the voice mechanism, seeking to restore the voice. On the other hand, the speechlanguage pathologist may discuss with the subject on the dysphonia causes. Concerning deliverance to the psychologist or psychiatrist few authors have mentioned it as immediate procedure, other few as parallel treatment or as intervention to be performed after the voice symptom removal. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDERSSON, K. & SCHALÉN, l. – Etiology and treatment of psychogenic voice disorder: results of a follow-up study of thirty patients. L. Voice, 12 n 1: 96-106 ARONSON, A. Psychogenic Voice York, Thieme, 1990. Disorders. In: Clinical Voice Disorders. 3. Ed. New BEHLAU, M & PONTES, P. – Disfonias Psicogênicas. In: FERREIRA, L. P., org – Um pouco de nós sobre voz. 4. Ed. São Paulo, Pró-fono, 1995, p. 61-86. BEHLAU, M; PONTES, P.; GÜNTERT, A. E. 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