FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA: sua relevância no contexto da Educação Matemática e aspectos históricos Raimundo Portela Filho' Cannem Almeida Portela' RESUMO Abordagem da Filosofia da Educação Matemática entendida como um pensar reflexivo, crítico e sistemático concernente à prática pedagógica da Matemática e ao contexto sociocultural no qual ocorrem situações de ensino-aprendizagem da Matemática. Ela é constituída por aspectos da Filosofia, Filosofia da Educação e Filosofia da Matemática. Este artigo inicia-se com uma caracterização da Filosofia da Educação Matemática. Apresenta-se a seguir, um histórico da mesma no contexto da Educação Matemática internacional e brasileira. Por fim, tecem-se algumas conclusões baseadas na exposição formulada. Palavras-chave: Filosofia; Educação; Matemática; Educação Matemática; Filosofia da Educação; Filosofia da Matemática; Filosofia da Educação Matemática. ABSTRACT Approach of Philosophy of Mathematics Education understood as a reflexive, critica I and systematical thought concerning to pedagogical practice ofMathematics and to sociocultural context in which situations ofteaching and leaming ofMathematics occur. It is constituted by aspects of Philosophy, Philosophy of Education and Philosophy of Mathematics. This paper begins with a characterization ofPhilosophy ofMathematics Education. Professor do Departamento Professora' do Departamento 46 de Filosofia de Filosofia da UFMA. da UFMA. Cad. Pesq., São Luís, v. 14, n. 1, p.46-68,jan./jun. 2.003 Then it is presented a historical of the latter in the context of international and Brazilian Mathematics Education. Ultimately, some conclusions are made based on the formulated exposure. Keywords: Philosophy; Education; Mathematics; Mathematics Education; Philosophy ofEducation; Philosophy ofMathematics; Philosophy of Mathematics Education. 1 INTRODUÇÃO Pode-se sustentar, segundo Vianna (2003, p. 48), que se a Matemática não existisse, então não haveria Educação Matemática, ou seja, esta só é possível porque, existindo a Matemática, as pessoas precisam trocar experiências matemáticas entre si. Contudo, não é suficiente que a Matemática exista. Ela deve ser instituída como uma prática social relevante e é tal relevância e tal modo de instituição que estabelecerão a necessidade de uma Educação Matemática. Miguel (2003, p. 26) distingue entre a Educação Matemática entendida como uma prática social de investigação e a Educação Matemática concebida como uma prática social de ação pedagógica em qualquer época, nível ou contexto. Ele afirma que quando fala em Educação Matemática está aludindo a essas duas práticas sociais, sendo que ele conceitua prática social do seguinte modo: Chamo prática social a toda ação ou conjunto intencional e organizado de ações físicoafetivo-intelectuais realizadas, em um tempo e espaço determinados, por um conjunto de indivíduos, sobre o mundo material e/ou humano e/ou institucional e/ou cultural, ações essas que, por serem sempre, em certa medida e por um certo período de tempo, valorizadas por determinados segmentos sociais, adquirem uma certa estabilidade e realizam-se com certa regularidade. (MIGUEL, 2003, p. 27). Nota-se que a área da Educação Matemática tem passado por um processo de amadurecimento, de modo que há matemáticos, pedagogos, psicólogos, sociólogos e outros profissionais que têm estudado e apresentado ex- Cad. Pesq., São Luís, v. 14, n. 1, p.46-68,jan./jun. 2003 47 plicações e propostas concernentes, entre outros assuntos, ao ensino e à aprendizagem da Matemática, à cognição , aos processos cognitivos que explicam a produção do conhecimento, aos fundamentos desse conhecimento, à linguagem matemática e a suas características simbólicas. Diversas questões já requerem uma atenção maior que a dedicada às primeiras idéias surgidas ou a um contexto no qual essas idéias adquirem significado, demandando, com efeito, um aprofundamento de estudos e ampliação de aplicações. Não é mais admissívelum discurso que se refira às várias faces da Educação Matemática, tratando, por exemplo, de concepções e teorias de modo apressado com relação aos fins da Educação, às características da realidade dos objetos matemáticos, à linguagem matemática e a uma epistemologia que aborde a produção do conhecimentomatemático. É necessário que essas questões sejam fonriuladas na perspectiva das disciplinas específicas que delas se ocupam, contudo do ponto de vista pedagógico. Além disso, visto que tais questões têm 48 fundo filosófico e matemático, assim como devem ser examinadas no âmbito da educação, tomamse adequadas à abordagem da Filosofia da Educação Matemática. A partir de uma pesquisa bibliográfica, inicia-se com uma caracterização da Filosofia da Educação Matemática. Levanta-se, em seguida,um delineamento histórico da mesma no contexto da Educação Matemática, ressaltando-se aqui os Congressos Internacionais de Educação Matemática bem como algumas Entidades e alguns Grupos de Estudo e de Pesquisa em Educação Matemática surgidos no Brasil. Por fim, tecem-se algumas considerações finais alicerçadas no conteúdo exposto, sem que se tenha a pretensão de haver apresentado um estudo exaustivo da problemática em tela. 2 CARACTERIZAÇÃO DA FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA No entender de Kilpatrick (1996), a área da Educação Matemática possui aspectos acadêmicos e profissionais. Na pers- Cad. Pesq., São Luis, v. /4, n. l,p.46-68,jan./jun. 2003 pectiva acadêmica, o problema do que é considerado pesquisa está em processo de debate. De acordo com esse autor, a pesquisa em Educação Matemática vem deixando em grande parte de ter como modelo as ciências naturais e está adotando cada vez mais métodos usados nas ciências sociais. Embora alguns pesquisadores ainda empreguem uma abordagem positivista, usada por fisicos e químicos, a maioria tem seguido outros pesquisadores em educação, que tomaram de empréstimo estruturas e técnicas teóricas a partir das ciências sociais.Abordagens fenomenológicas, hermenêuticas, construtivistas sociais, etnográficas têm sido bastante empregadas pelos pesquisadores em Educação Matemática. Às vezes alguns desses pesquisadores falam como se houvesse apenas um único caminho para fazer pesquisa, qual seja, aquele caminho seguido por eles agora. Kilpatrick explicita que isso é razoável com relação a um determinado pesquisador, mas não para o campo todo aderir a um e somente um paradigma de pesquisa. E para esclarecer melhor ele apresenta uma analogia, a saber: assim como uma diversidade ge- nética auxilia a garantir a saúde de populações futuras, também a diversidade no modo como a pesquisa é realizada ajuda a manter o campo ativo e em crescimento. Com efeito, para ele, a Educação Matemática precisa de perspectivas múltiplasque diferentesabordagens trazem para o estudo do ensino e da aprendizagem da Matemática. Por sua vez, na perspectiva profissional, a Educação Matemática deve-se preocupar com a aplicação do conhecimento especializado, com o propósito de auxiliar os estudantes e os professores que são seus clientes ou usuários. Para Kilpatrick, a função maior da Educação Matemática prossegue sendo a formação de professores paralelamente à busca de conhecimento consistente para ser aplicado. Ele defende a tese segundo a qual os educadores matemáticosuniversitáriosprecisam trabalhar conjuntamente com matemáticos e com professores em sala de aula no desenvolvimento da teoria e da prática. Conforme Bicudo e Garnica (2001,p.31): Cad. Pesq., São Luís, v. 14, n. 1, p.46-68,jan./jun. A um primeiro olhar lançado da e na zona densa que é aquela da Educação Matemática pode 2003 49 parecer que Filosofia da Educação Matemática e Educação Matemática se superpõem de tal modo que se identificam. Porém, à medida que a densidade de conceitos, procedimentos, intervenções vão se clareando mediante constantes investigações sobre Educação Matemática, vão se delineando regiões com especificidades importantes para a própria Educação Matemática como, por exemplo, a etnomatemática e a sociologia da Educação Matemática. Ainda no entenderde Bicudo e Garnica (2003, p. 13), à primeira vista e de uma maneira ingênua, visto que conseqüência de uma postura não questionadora, acrítica, pode parecer que ao se abordar a região ou área de investigação denominada Filosofia da Educação Matemática, que está sendo esboçada e adquirindo características próprias, se está forçando um nome novo, acrescentando-se, seja devido a um jogo de palavras, seja por vontade de se criar irresponsavelmente uma nova especialização - Matemática à Filosofia da Educação ou Filosofia à Educação Matemática. Todavia, não é isso que ocorre. 50 A Filosofia da Educação Matemática possui uma natureza multifacetada. Ela move-se na interface entre a Filosofia, a Filosofia da Educação e a Filosofia da Matemática, sendo, entretanto, uma área própria de investigação e de procedimentos. Ela busca construirsua maneira de argumentar, de correlacionar idéias, de pesquisar, de atuar na realidade educacional, de exprimir seu pensamento, por intermédio de uma linguagem adequada ao seu universo de questionamento. Ela não pretende ser fechada e completa, trazendo em sua lacunaridade o convite ao debate, a partir de questões geradoras desse modo de pensar a Educação Matemática e seus temas decorrentes. Ela preserva da Filosofia as características de um pensar: l-analítico, que procura decompor um todo complexo para compreender as suas partes; Cad. Pesq., São Luís, 2-reflexivo, no qual ocorre a volta ou o dobrar-se da consciência sobre si mesma para conhecer-se enquanto capacidade para o conhecimento, o sentimento e a ação; v. 14, n. 1, p.46-68,jan./jun. 2003 3- crítico, que examina, duvida, questiona; 4-sistemático, cujos elementos são interdependentes, articulados entre SI; 5-metódico, de acordo com um certo planejamento e procedimentos que garantam a coerência e o exercício da critica; 6-universal ou totalizante, que busca uma compreensão abrangente, global; não parcial ou não fragmentária daquilo que está sendo investigado. A Filosofia da Educação Matemática é estimulada, outrossim, ainda no campo da Filosofia, pelas questões de caráter ontológico, referentes ao que existe; pelas perguntas de caráter epistemológico,atinentesao como se conhece o que existe e o que é o conhecimento; e pelas questões de caráter axiológico, que dizem respeito aos valores, ao que vale. Desse modo, de acordo com Bicudo e Garnica (2003, p. 18): Constitui-se a filosofia da Educação Matemática com tal pensamento reflexivo, crítico e sis- temático, analítico e abran-gente, ressignificando - redirecionando, recontextualizando - as questões essenciais postas pela filosofia, pela filosofia da educação e pela filosofia da matemática. Constitui-se em trajetória, com pensamento próprio, com viço original, mesmo sendo tecida nessas ressignificações de questionamentos de outras esferas do pensamento filosófico. Foram expostas acima algumas caracteristicas fundamentais da Filosofia que são preservadas pela Filosofia da Educação Matemática. No tocante à Filosofia da Educação, esta dirige-se para questões que abordam o como fazer educação, os aspectos básicos da ação educativa, como é o caso do ensino, da aprendizagem, as propostas político-pedagógicas, o local onde a educação ocorre e, de modo sistemático e abrangente, analisa-as, amplia seu significado para o mundo e para o homem. É relevante salientar que a educação não necessita das Filosofia da Educação enquanto ação educadora que acontece no nível dos relacionamentos sociais, assim como as ciências da educação também podem prescindir do Cad. Pesq., São Luís, v. 14, n. 1, p. 46-68, jan.rjun. 2003 51 pensar filosófico se ficarem no nível do como fazer, isto é, se sua preocupação se limitar, por exemplo, na busca de conhecer como a aprendizagem OCOlTe, como se resolvem problemas, como se aprende a ler a a escrever, como se ensina a contar de maneira eficaz' etc. (Cf. BICUDO e GARNICA, 2003, p. 19). As questões que são centrais para a Filosofia, como: O que existe? Como se conhece o que existe? O que é valor?, são também tratadas pela Filosofia da Educação, de modo que, por exemplo, a interrogação 'o que existe?' que indaga sobre a realidade, assume na Filosofia da Educação formas e conteúdos diversos, tais como: o que é a educação? O que constitui a educação? A interrogação acerca do que é conhecimento assume, na Filosofia da Educação, matizes a respeito do significado de conhecimento, gerando indagações do tipo: que respostas a Filosofia apresenta a essa pergunta e como cada uma delas influencia nas práticas educativas examinadas de um ponto de vista ético? As respostas à questão. sobre o que é o conhecimento, devido ao fato de serem críticas e 52 abrangentes, terão que considerar estudos psicológicos, sociológicos, antropológicos, históricos e outros pertinentes. A Filosofia da Educação assume tais estudos numa postura critica e reflexiva, efetivando uma ampla análise concemente aos pressupostos científicos e respectivas conseqüências, tomadas no contexto educacional. A interrogação filosófica sobre o que vale volta-se, na Filosofia da Educação, a questões educacionais tais como: Bem, virtude e justiça podem ser ensinados? São tais valores passíveis de serem aprendidos? É justo estabelecer metas educacionais? Em que sentido é válida a expressão 'educação para todos'? Ela significa educação igual para todos em todos os contextos? Quem é responsável pela educação: a família ou o Estado? Por quê? Por sua vez, a Filosofia da Educação Matemática apreende da Filosofia da Educação, para mencionar alguns exemplos, as análises e reflexões acerca da educação, ensino, aprendizagem, escolarização, avaliação, políticas públicas de educação, assim como os procedimentos empregados para abordar esses temas, e os enfoca do ponto de vista de Cad. Pesq .. São Luís. v. 14. n. 1. p.46-68. jan./jun. 2003 quem está voltado para a educação do outro que, no caso da escola, é o aluno ou estudante e, em especial, está interessada pelo significado que a Matemática adquire através de seu ensino e de sua aprendizagem. Devido ao fato de examinar a Matemática no contexto da Educação, a Filosofia da Educação Matemática também se questiona sobre o conteúdo a ser ensinado e a ser aprendido e, por conseguinte, precisa das análises e reflexões da Filosofia da Matemática no tocante à natureza dos objetos matemáticos, à verdade do conhecimento matemático e ao valor da Matemática. Com efeito, a Filosofia da Matemática trabalha as questões básicas da filosofia: O que existe? O que é conhecimento? O que vale? -abordando especificamente os objetos matemáticos, desdobrando as indagações acima na seguintes: Qual é a realidade dos objetos matemáticos? Como são conhecidos os objetos matemáticos e quais os critérios que apóiam a verdade das assertivas matemáticas? As leis e os objetos matemáticos são descobertos, inventados ou construídos? A abordagem dessas questões é importante para a autocompreensão das Matemática bem como se faz necessária para o estabelecimento de propostas curriculares, pois possibilita estabelecer, por exemplo, escolhas de conteúdos, atitudes de ensino, expectativas de aprendizagem e indicadores de avaliação. Podem-se distinguir duas grandes correntes na Filosofia da Matemática, a saber: a absolutista e a da mudança concei tual. As filosofias absolutistas da Matemática sustentam que esta constitui um corpo de conhecimento absoluto e certo, que se apoiasobre os fundamentos sólidos da lógica dedutiva. Elas estão voltadas para o projeto epistemológico de fornecer sistemas rigorosos para garantir o conhecimento matemático de maneira absoluta. Muitas das assertivas do absolutismo em suas várias formas são uma decorrência de sua identificação com estruturas lógicas rígidas introduzi das para esses propósitos epistemológicos. Desse modo, segundo o absolutismo, o conhecimento maternático é eterno, embora possam-se descobrir novas teorias e verda- Cad. Pesq., São Luís, v. 14, n. 1, p. 46-68, jan./jun. 2003 53 des para se acrescentarem ao já conhecido; é super humano e ahistórico, pois a história da matemática é tida como irrelevante para a natureza ejustificação do conhecimento matemático; este é considerado um conhecimento puro e isolado, que se toma útil por causa de sua validade universal e por esta mesma razão é tido como livre de valor e livre de cultura. Conseqüentemente, formase uma imagem da Matemática apoiada filosoficamente em uma concepção absolutista da mesma e que a concebe como rígida, fixa, lógica, absoluta, fria, objetiva, pura, abstrata, remota e ultra-racional. Não é por acaso que esta imagem coincide com a imagem pública muito difundida da Matemática como sendo difícil, fria, abstrata, teórica, ultra-racional, porém importante. A Matemática também possui a imagem de ser remota e acessível somente a alguns seres extremamente inteligentes com "mentes matemáticas". Uma concepção absolutista pode ser comunicada na escola na medida em que se passam tarefas matemáticas de rotina desarticuladas entre si, que envolvem 54 a aplicação de procedimentos aprendidos e enfatiza-se que cada tarefa possui uma resposta certa, única, fixa e estabelecida objetivamente,juntamente com a desaprovação e a crítica a qualquer fracasso em atingir esta resposta Isto pode não ser o que o filósofo reconheça como uma Filosofia da Matemática ou o matemático reconheça como Matemática, mas resulta numa concepção absolutista do assunto. Em alguns casos ocorre até mesmo a "matefobia", ou seja, aversão à Matemática (Cr BUXTON, 1981). Contrastando com as filosofias absolutistas da Matemática surgiram as filosofias da mudança conceitual ou filosofias falibilistas da matemática que asseveram que a Matemática é corrigível, falível e um produto social em mudança Esta segunda corrente ressalta a prática da Matemática, o seu lado humano, concebendo a Matemática como o resultado de processos sociais. O conhecimento matemático é entendido como falível e sempre aberto a revisões, tanto de suas provas ou demonstrações como de seus conceitos (Cf LAKATOS, 1976). Portanto, essa concepção abrange como Cad. Pesq., São Luís, v. 14, n. 1, p.46-68,jan./jun. 2003 preocupações filosóficaslegítimas as práticas dos matemáticos, a história e as aplicações da Matemática, o lugar da Matemática na cultura humana, bem como questões axiológicas e de educação (Cf. DAVIS e HERSH, 1980). De acordo com Ernest (1996, p.2), coincide pelo menos em parte com a filosofia falibilista da Matemática a imagem vital da Matemática veiculada em muitas escolas e faculdades progressistas. Nestas a Matemática é experienciada de uma maneira quente,humana, pessoal, intuitiva, ativa, colaborativa, criativa, investigativa, cultural, histórica, viva, relacionada com situações humanas agradáveis. Tendo sido delineada, em linhas gerais, a Filosofia da Educação Matemática como articulação entre Filosofia, Filosofia da Educação e Filosofia da Matemática, passa-se a tratar de algumas características relevantes daquela. Constitui tarefaprimordial da Filosofia da Educação Matemática a análise crítica e reflexiva das propostas e ações educacionais concementes ao ensino e à aprendizagem da Matemática nos diversos contextos em que ocorrem. Assim, a Filosofia da Educação Matemática tem o objetivo central de analisar criticamente os pressupostos ou idéias fundamentais que interrelacionamo currículo ou a proposta pedagógica, tentando esclarecer suas assertivas e a concordância entre as ações visadas. Nesse sentido, a Filosofia da Educação Matemática elabora e procura responder a questões tais como: 1- Será que há consistência entre a concepção de educação, de ensino, de aprendizagem, de conteúdo matemático transmitido e concepções de matemática e de conhecimento matemático, entre atividades propostas e desenvolvidas, entre avaliação proposta e efetuada na realidade escolar ou educacional? 2 A partir da análise realizada, que ações podem ser sinalizadas e com que propósito ou em nome de qual política? Tal objetivo, porém, pode ser concretizado de diversas maneiras, segundo a postura filosófica ou os pressupostos filosóficos admitidos. Para exemplificar,considerese a corrente perenealista da Filosofia da Educação e o logicismo I da Filosofia da Matemática. O Cad. Pesq., São Luís, v. 14, n. I, p.46-68,jan./jun. 2003 55 currículo nelas fundamentado possui como eixo de trabalho a essência e, desse modo, um ideal de homem que oriente atividades educacionais que levam à percepção do que é assumido como humano bem como valores duradouros e verdades indubitáveis. No campo da matemática essas ações devem convergir com concepções de objetos matemáticos tidos como existentes de modo absoluto, possíveis de serem conhecidos por intermédio de um trabalho árduo, disciplinado, que ressalte processos lógicos de inferência ou dedução. Neste caso, a escola é assumida como o ambiente adequado para a consecução de valores que busquem sempre a melhoria do existente em direção à perfeição. Podem-se realizar exercícios e projeções similares ao exemplo acima tendo-se em vista outras correntes da Filosofia da Educação tais como o progressivismo, o construtivismo e a fenomenologia, articuladas com as várias linhas da Filosofia da Matemática Na Filosofia da Educação Matemática há duas maneiras de proceder no que tange à relação 56 teoria/prática Um delas foi exposta acima e consiste em tomar como ponto de partida a teoria, as diferentes correntes da Filosofia da Educação e da Filosofia da Matemática, analisar criticamente suas afirmações, procurando concordância entre elas e dirigir-se para a prática educacional, ti da aqui como as atividades educacionais propostas. A outra forma de proceder consiste em operar com a articulação teoria/prática na própriarealidade na qual é realizada ou colocada em ação, que é a da sala de aula de Matemática, onde se encontram no evento aula, o professor, o aluno, o conteúdo pedagógico e matemático em ação. Tal ação, delimitada no contexto no qual ocorre, tem uma base perceptível e, por conseguinte, espacial, temporal e histórica, onde se desencadeiam e se concretizam as atitudes educacionais, a proposta pedagógica, a concepção do objeto e do conhecimento matemáticos. Tal procedimento ou postura da Filosofia da Educação Matemática envolve quatro traços característicos a serem ressaltados, a saber: 1- requer familiaridade com as áreas de pesquisa da Cad. Pesq., São Luís, v. /4, n. /, p.46-68,jan./jun. 2003 Filosofia, da Filosofia da Educação e da Filosofia da Matemática; 2- mostra-se relevante quando o objetivo é a intervenção na realidade baseada na ação/ reflexão/ ação; 3- é eficaz para a autoavaliação dos agentes do processo; 4- é pertinente para que sejam elaboradas diretrizes desejáveis para o projeto pedagógico em andamento, voltando-se a atenção para as justificativas que esclareçam por que se pretende o que se diz pretender, em nome de uma ação educadora que é sempre pública. 3 ESBOÇO HISTÓRICO Kilpatrick (1996) argumenta que enquanto um campo de atividade a Educação Matemática é antiga, pois a Matemática tem sido ensinada desde que ele tem existência. No entanto, como um campo acadêmico, as raízes da Educação Matemática têm pouco mais de um século. Isto porque, embora por volta do século XVIII, cadeiras de educação já estivessem sendo ministradas em diversas universidades européias, a Educação Matemática teve um processo lento, de modo que so- mente próximo do [mal do século XIX, quando a formação de professores secundários se tomou uma função crescentemente importante das universidades, é que a Educação Matemática começou a ser reconhecida como uma matéria universitária. A pesquisa em Educação Matemática em todo o mundo expandiu-se enormemente da metade dos anos 1950 até metade dos anos 1970. O movimento da "Matemática Moderna", que influenciou muitos países, inclusive o Brasil, estimulou novos periódicos, novas organizações profissionais, novos institutos de pesquisa para a Educação Matemática e vários novos pesquisadores. Em cada instituição ou país, sustenta Kilpatrick, a Educação Matemática é influenciada por sua história naquele contexto. O seu desenvolvimento e a sua capacidade de influenciar professores e alunos de modo positivo depende bastante daqueles que fazem a política educacional, se eles podem encontrar maneiras de reconhecer, institucionalizar e apoiar a Educação Matemática. Com ~feito, esta tem-se desenvolvido fortemente em países onde as estru- Ca(L Pesq., São Luís, v. 14, n. 1, p.46-68, jan.ljun. 2003 57 turas institucionais a favorecem como um campo acadêmico identificável. A Filosofia da Educação Matemática, no contexto da Educação Matemática, é uma área de investigação e de significação que vem se construindo, se constituindo no decurso da História da Educação Ocidental, contudo tem surgido com essa denominação muito recentemente. Somente na década de 80 do século XX o termo aparece em inglês como título da tese de doutorado "Philosophy of Mathematics Education" (Filosofia da Educação Matemática), de autoria de Eric Blaire, defendida em janeiro de 1981, no Instituto de Educação da Universidade de Londres. Essa tese é constituída de três partes. Na primeira, trata de questões relacionadas Filosofia da Matemática, descrevendo as três correntes tradicionais, a saber: logicismo, formalismo e intuicionismo. Procura, ademais, construir uma quarta, denominada pelo autor de "hipotética", reunindo concepções de Peirce e de Lakatos. Na segunda parte expõe maneiras de ensinar Matemática e apresenta articulações entre estas e as correntes mateà 58 máticas descritas na primeira parte. E na terceira parte trabalha o conceito de educação, os objetivos e fins da educação, assim como sugere o que é essencial ser abordado em cursos de formação de professores de Matemática. Blaire trata a Filosofia da Educação Matemática como junção da Filosofia da Matemática com a Filosofia da Educação. De 1982 a 1992 surgem, em nível internacional, trabalhos que abordam temas de Filosofia da Educação Matemática, apesar de não a mencionarem explicitamente. Em 1983 é publicado o importante livro de Hans Freudenthal intitulado "Didactical Phenomenology of Mathematics Structures"(FenomenologiaDidática das Estruturas Matemáticas). Em 1991, decorridos dez anos do trabalho de Blaire, é publicado o livro"The Philosophy of Mathematics Education" (A Filosofia da Educação Matemática), de autoria de Paul Ernest, professor da Universidade de Exeter, no Reino Unido. Emestestruturaesse trabalho em duas partes, perfazendo treze capítulos. Na primeira parte, denominada "A Filosofia da Matemática", elabora cinco capítulos' a saber: 1- Uma Critica das Ca{L Pesq., São Luís, v. 14, n. 1, p. 46-68, jan.rjun. 2003 Filosofias Absolutistas da Matemática; 2 - A Filosofia da Matemática Reconceitualizada; 3 Construtivismo Social Como uma Filosofia da Matemática; 4 Construtivismo Social e Conhecimento Subjetivo; 5 - Os Paralelos do Construtivismo Social. Na segunda parte, intitulada "A Filosofia da Educação Matemática", ele constróimais oito capítulos, ou seja: 6 - Objetivos e Ideologias da Educação Matemática; 7 Grupos Com Ideologias Utilitárias; 8 - Grupos Com Ideologias Puristas; 9 - A Ideologia da Mudança Social dos Educadores Públicos; 1O - Revisão Crítica de Cockcroft e o Currículo Nacional; ll-HierarquianaMatemática,Aprendizagem,Habilidade e Sociedade; 12 - Matemática, Valores e Oportunidades Iguais; 13 - Investigação, Solução de Problemas e Pedagogia. Ernest sustenta nesta obra que a Filosofia da Educação Matemática deve estar preocupada principalmente em refletir sobre cinco áreas, quais sejam: 1 - natureza(filosofia) da matemática; 2 - natureza da aprendizagem da matemática; 3 - objetivos de ensino da matemática e da Educação Matemática; 4 - natureza do ensino da matemática; 5 - o contexto social da Educação Matemática e a inter-relação de todos esses fatores como um sistema social. Cada uma dessas cinco áreas de interesse dá origem a um conjunto característico de problemas filosóficos e de questões pertencentes à Educação Matemática. Dois anos após a publicação da obra supra mencionada de Ernest, é publicado em 1993 o livro "Towards a Philosophy of Critical Mathematics Education" (para uma Filosofia da Educação Matemática Crítica), do dinamarquês Ole Skovsmose, que é uma obra bastante importante para a comunidade internacional de Educação Matemática. 3.1 Congressos Internacionais de Educação Matemática O International Congress on Mathematics Education, abreviado pelas iniciais ICME, é o Congresso Internacional de Educação Matemática, realizado quadrienalmente sob o patrocínio da International Comission on Mathematical Instruction (ICMI Comissão Internacional de Instrução Matemática ). Apresenta- se a seguir o ano e o local (cidade e país) de Cad. Pesq., São Luís, v. 14, n. 1, p. 46-68, jan./jun. 2003 59 todos os ICME's já realizados, acrescentando-se somente o próximo, que terá lugar em Copenhague, Dinamarca, no período de 04 a 11de julho de 2004: ICME1, 1968, Lyon, França; ICME-2, 1972, Exeter, Reino Unido; ICME-3, 1976, Karlsruhe, Alemanha; ICME-4, 1980, Berkeley, EUA; ICME-5, 1984, Adelaide, Austrália; ICME-6, 1988, Budapeste, Hungria; ICME-7, 1992, Quebec, Canadá; ICME-8, 1996, Sevilha, Espanha; ICME-9, 2000, Tóquio, Japão; ICME-I0, 2004, Copenhague, Dinamarca No ICME-6, de 1988, tra.balhos significativos foram reunidos em um tópico intitulado "Teoria da Educação Matemática". No ICME-7, de 1992, houve um grupo de trabalho que tratou explicitamente do tema "The Philosophy ofMathematics Education" (A Filosofia da Educação Matemática), tendo sido formuladas questões nucleares para a Filosofia da Educação Matemática. Houve duas sessões com esse grupo de trabalho. A primeira foi denominada "Filosofia da Matemática e Suas Implicações Educacionais", enquanto a segunda foi intitulada "Questões Filosóficas na Educação Matemá60 tica". Foram levantadas questões primordiais nessas sessões sobre, por exemplo, o que é a Filosofia da Educação Matemática, a relevância da Filosofia da Matemática para a Educação, as crenças dos professores, o uso de metáforas na Matemática, o simbolismo matemático, a Educação Matemática Crítica, uma perspectiva crítica do currículo de Matemática, as ideologias da Educação Matemática, a relação entre a colocação e a solução de problemas, as suposições implícitas que diferentes teorias e filosofiascontêm. No ICME-8, de 1996, foram apresentadas duas conferências com títulos e conteúdos próprios da Filosofia da Educação Matemática. Uma delas foi proferida por Paul Emest e intitulada "Social Constructivism as a Philosophy ofMathematics" (O Construtivismo Social Como uma Filosofia da Matemática); a outra foi proferida por Maria Aparecida Viggiani Bicudo e denominada "Philosophy of Mathematics Education: a phenomenological approach" (FiIosofia da.Educação Matemática: uma abordagem fenomenológica). No ICME-l O, a ser realizado de 04 a 11 de julho de 2004 Cad. Pesq., São Luís, v. 14, n. 1, p.46-68,jan./jun. 2003 em Copenhague, Dinamarca, está prevista a apresentação de um grupo de discussão com o tema "Filosofia da Educação Matemática", no qual pretende-se debater questões tais como: qual é o significado da Filosofia da Educação Matemática? Em que medida as autoridades da Educação Matemática estão implícita ou explicitamente influenciadas por Filosofias da Educação Matemática reconhecíveis? Quais são as relações entre Filosofia da Educação Matemática e outros tipos de filosofias tais como a Filosofia da Educação, a Filosofia da Matemática, a Filosofia Social,etc.? De que maneira diferentes Filosofias da Educação Matemática influenciam sua teoria e prática? 3.2 Algumas entidades, grupos de estudo e de pesquisa em Educação Matemática no Brasil 3.2.1 Sociedade Brasileira de Educação Matemática (SBEM) A Sociedade Brasileira de Educação Matemática, denomina- da abreviadamente pela sigla SBEM, foi fundada em 27 de janeiro de 1988, é uma entidade civil de caráter educacional, científico e cultural, sem fins lucrativos, de direito privado, de âmbito nacional e sem qualquer vinculação político-partidária ou religiosa, com sede na cidade de São Paulo e foro na cidade de Maringá, Paraná. Há atualmente doze Grupos de Trabalho (GT's) na SBEM com temas bem estabelecidos, a saber: GT1 Educação Matemática nas Séries Iniciais; GT2 Educação Matemática nas Séries Finais do Ensino Fundamental; GT3 Educação Matemática no Ensino Médio; GT4 Educação Matemática no Ensino Superior; GT5 História da Matemática e Cultura; GT6 Educação Matemática: novas tecnologias e ensino à distânera; GT7 Formação de Professores que Ensinam Matemática; GT8 Avaliação em Educação Matemática; GT9 Processos Cognitivos e Cad. Pesq., São Luís, v. 14, n. 1, p. 46-68, jan./jun. 2003 61 Lingüísticos em Educação Matemática; GTI0 Modelagem Matemática; GT 11 Filosofia da Educação Matemática (grifo nosso); GT12 Ensino de Probabilidade e Estatística. A SBEM publica a revista "A Educação Matemática em Revista" e promove trienalmente o Encontro Nacional de Educação Matemática (ENEM), que congrega um grande número de educadores matemáticos do Brasil, tendo ocorrido o último Encontro, o VII ENEM, em 2001, no Rio de Janeiro. 3.2.2 Círculo de Estudos, Memória e Pesquisa em Educação Matemática (CEMPEM) o CEMPEM é um órgão de apoio ao ensino, pesquisa e extensão na área de Educação Matemática do Departamento de Metodologia do Ensino da Faculdade de Educação da UNICAMP (Universidade Estadual de Campinas)/ SP, tendo sido fundado em março de 1989, possuindo dois subgrupos de pesqui62 sa, a saber: "Prática Pedagógica em Matemática" (PRAPEM) e "História, Filosofia e Educação Matemática"(HIFEM). O CEMPEM publica semestralmente a Revista de Educação Matemática denominada Zetetiké. 3.2.3 Grupo de Pesquisa-Ação em Educação Matemática (GPA) Fundado em 25 de setembro de 1993, o GPAda UNESP/ Rio Claro tem o objetivo imediato de integrar graduação, pós-graduação assim como redes pública e particular através da pesquisa sobre a sala de aula e na sala de aula. O seu objetivo mediato, por sua vez, é a formação continuada de professores e a produção de material didático. 3.2.4 Grupo de Pesquisa em História da Matemática e/ ou suas Relações com a Educação Matemática (GPHM) O GPHM realiza suas atividades no Departamento de Coei Pesq., São Luís, v. 14, n. 1, p. 46-68, jan.ljun. 2003 Matemática da UNESPI Rio Claro. Foi formado em 1995 e é constituído por professores do aludido Departamento assim como por alunos da graduação em Matemática e Pós-Graduação em Educação Matemática. O objetivo principal do GPHM é o desenvolvimento teórico de assuntos ligados à pesquisa em História da Matemática bem como a relação entre História da Matemática e Educação Matemática. VmculadoàUNESP,é publicado desde 1985o Boletimde Educação Matemática (BOLEMA). 3.2.5 Grupo de Pesquisa em Informática, Outras Mídias e Educação Matemática (GPIMEM) o GPIMEM é composto por docentes, técnicos e estudantes de graduação e pós-graduação da UNESPI Rio Claro e desenvolve suas atividades no Laboratório de Informática do Departamento de Matemática da . UNESP/RioClaro. O Grupo estuda a relevância do computador, das cal- culadoras gráficas ou de outros tipos de mídia na Educação Matemática, sendo que mais recentemente tem pesquisado questões que envolvem o uso de vídeo, análise de softwares e de educação à distância incluindo o uso da Internet. 3.2.6 Grupos de Pesquisa vinculados ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação Matemática da Pontifícia Universidade Católica de São PauloPUCSP Estão constituídos quatro grupos de pesquisa ligados ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação Matemática da PUCSP, a saber: Grupo 1- A Matemática na organização curricular:histórico e perspectivas atuais; Grupo 2- Álgebra e Análise: especi:ficidades,inter-relações e relações com outros domínios da Matemática nos diversos níveis de ensino; Grupo 3- Educação Matemática em Ambientes Informatizados (EMAI); Grupo 4Conceitos: Formação e Evolução (COFE). Cad. Pesq., São Luís, v. 14, n. 1, p.???,jan.ljun. 2003 63 3.2.7 Educação MatemáticaEpistemologia e Didática da Matemática Este Grupo do Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo (IME/ USP) empreende investigações em Heurística, Argumentação, Análise do Discurso, Negociação Didática e História da Matemática. 3.2.8 Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação Matemática (NEPEM) Este grupo foi criado em abril de 2002, está localizado no Instituto de Ciências Exatas da Universidade Católica de Salvador (UCSal) e reúne educadores matemáticos dessa instituição e de outras do estado da Bahia. Apresentamos aqui so-mente uma amostra dos grupos de estudos e de pesquisa em Educação Matemática no Brasil". Há outros grupos espalhados pelas universidades brasileiras. 64 4 CONCLUSÃO Com base na perspectiva aqui adotada, a Filosofia da Educação Matemática não se constitui uma fornecedora de fundamentos teóricos a partir da qual a prática poderá realizar-se linearmente. Filosofia da Educação Matemática é um quase-sinônimo de Educação Matemática caso ela seja encarada sob um ponto de vista teórico-prático que, em princípio, deve ser o traço característico da Educação Matemática (Cf. BICUDO e GARNICA, 2001, p. 39). A Filosofia da Educação Matemática busca esclarecer os· elementos constitutivos da Educação Matemática. Esta será expressão vaga se não for entendida como preenchendo-se reflexiva e continuamente dos significados que vêm da prática. A Educação Matemática ocorre como uma reflexão-na-ação, sendo que a ação dá-se num contexto no qual vivemos com o outro compartilhando vivências. Toma-se então necessário que aqueles que investigam essa área do conhecimento procurem conviver com a perspectiva do outro, exercitando Cad. PeSlJ., São Luís, v. /4, n. 1, p. 46-68, jan./jun. 2003 dialogicamente o respeito aos trabalhos coletivos. Podem-se considerar três questões centrais nas quais a Filosofia da Educação Matemática deve estar centrada: 1- O que é a Matemática? Ou seja, a questão sobre a natureza ou a concepção do que seja a Matemática. 2- Por que deveríamos aprender ou ensinar Matemática? Tal questão refere-se tanto aos valores em Matemática quanto aos objetivos da Educação Matemática. 3Como deveríamos aprender e ensinar Matemática? Esta questão envolve o estudo epistemológico sobre a natureza da aprendizagem e do ensino de Matemática. Por conseguinte, a Filosofia da Educação Matemática caracteriza-se por se constituir um pensar reflexivo, sistemático e crítico acerca da prática pedagógica da Matemática e sobre o contexto sociocultural no qual têm lugar situações de ensino e de aprendizagem de Matemática. No tocante ao Brasil, a Educação Matemática e, mais especialmente a pesquisa nesta área de conhecimento, incluindo-se aqui mais recentemente a Filosofia da Educação Matemática, vem bus- cando estabelecer sua identidade e definir os limites de seu campo, com o objetivo de tomar-se um corpo organizado de conhecimentos. Nesse sentido, por exemplo, o Instituto de Geociências e Ciências Exatas (IGCE) da UNESP/ Rio Claro foi pioneiro ao oferecer em 1984 um Programa de Mestrado em Educação Matemática e estendido em 1993 ao Doutorado. Este Programajá titulou mais de uma centena de pesquisadores que estão atuando em diversos estados brasileiros e também no exterior. Tal resultado manifesta uma enorme atividade de pesquisa tanto da parte docente como da discente, sendo que os pesquisadores- orientadores e orientandos- enfocam problemas relevantes para a área e para o contexto educacional brasileiro. Assim, o surgimento, a partir da década de 1980, de programas específicos de pás-graduação strictu sensu na área de Educação Matemática, a realização de diversos Encontros e Congressos Nacionais e Regionais, a criação de Entidades como a Sociedade Brasileira de Educação Matemática (SBEM) e suas regionais estaduais, assim como a for- . Cad. Pesq., São Luís, v. 14, n. 1,p.46-68,jan./jun. 2003 65 mação e funcionamento de Grupos de Estudo e de Pesquisa nes--sa área, espalhados em várias universidades brasileiras, constituem o reflexo e a mola propulsora desse processo de consolidação da Educação Matemática no país. BUXTON, L. Do you panic about maths? London: Heinemann, 1981. CÍRCULO DE ESTUDOS, MEMÓRIA E PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÀTICA (CEMPEM). Disponível em: <http:// www.cempem.fae.unicamp.br/>. Acesso em: 16 out. 2001 . REFERÊNCIAS . BICUDO, M. A. V. (Org.) Pesquisa em Educação Matemática: concepções e perspectivas. São Paulo: Ed. UNESP, 1999. DA COSTA, N.C.A. 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