A TEORIA DA CORRESPONDÊNCIA COMO MEIO DE SE CHEGAR À VERDADE (2012) 1 SIQUEIRA, Grégori Lopes2; SILVA, Mitieli Seixas da3 1 Trabalho de Pesquisa _UNIFRA. Acadêmico do Curso de Filosofia do Centro Universitário Franciscano (UNIFRA), Santa Maria, RS. 3 Professora orientadora do Curso de Filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, RS, Brasil. E-mail: [email protected]; [email protected]. 2 RESUMO Importa salientar a diferença entre o que significa a definição da verdade e o que seria um critério para a verdade. Ao definir alguma coisa dá-se o significado da palavra verdadeiro, enquanto que um critério fornece um teste por meio do qual se diz se uma sentença é verdadeira ou falsa. Para se chegar ao ato de conhecer alguma coisa verdadeiramente é necessário passar pelo crivo da comprovação. A isto se dá o nome de teorias da verdade. Uma das teorias da verdade existentes é a teoria da correspondência que tem procedência em Aristóteles, mas que se fundamenta com Russell e Wittgenstein, e mais tarde é reformulada ou reinterpretada por Austin. Mesmo tendo em vista que qualquer teoria da verdade tem limitações quanto a afirmar se algo é verdadeiro ou falso, elas constituem um método de comprovação que a lógica e a filosofia da linguagem investiga. Palavras-chave: Filosofia da linguagem; Teoria da correspondência; Teorias da verdade. 1. INTRODUÇÃO A partir do texto de Susan Haack, esta abordagem tem por objetivo investigar sobre o que se entende por definição de uma verdade e a distinção quanto ao que fornece um critério para a verdade. No sentido de definir-se alguma coisa estar-se-á dando o “significado da palavra verdadeiro” (HAACK, 2002, p.130), enquanto que “um critério fornece um teste por meio do qual se diz se uma sentença (ou o que quer que seja) é verdadeira ou falsa” (HAACK, 2002, p.130), para assim chegar ao ato de conhecer alguma coisa verdadeiramente. A importância do conceito de verdade e de definir algo como comprovadamente verdadeiro é fundamental tanto “para a epistemologia quanto para a filosofia da lógica (HAACK, 2002, p.133). A busca pela verdade é algo inerente no homem que pretende conhecer e ter certeza a respeito do mundo. Nesse sentido, surgem as teorias de verdade que para Murcho (2004) têm por objetivo esclarecer a natureza dos fenômenos a partir de questões como: o que faz uma sentença ser verdadeira? Que propriedade é esta que se fala quando se infere a verdade a uma afirmação? Um dos primeiro filósofos a formular uma teoria de verdade foi Aristóteles ao dizer 1 que verdadeiro é “dizer do que é que ele é, ou do que não é que ele não é” (HAACK, 2002, p.129). Desta teoria aristotélica se desmembraram ao longo da história diversas outras, como as teorias da coerência, pragmática, da correspondência, semântica e da redundância. A pretensão aqui será investigar a teoria da correspondência como meio de se chegar à verdade. A teoria da correspondência diz que X é verdadeiro se e somente se X corresponde a algo, ou seja, “a verdade de uma proposição consiste não em suas relações com outras proposições, mas em relação com o mundo” (HAACK, 2002, p.127). Assim, parte-se da ideia de que a verdade de uma proposição é sua correspondência com alguma coisa palpável e existente. Ou, ainda, pode ser dito como Simor (2009) que a verdade é uma propriedade do enunciado ou de nossas crenças sobre o mundo, por isso ela é correspondente. 2. DESENVOLVIMENTO Enquanto Hegel defendia uma lógica monista, onde a aparente multiplicidade do mundo consiste meramente em fases e divisões irreais de uma só realidade indivisível (absoluta), Russell e mais tarde Wittgenstein defenderam o atomismo lógico, onde o mundo aparece como uma multiplicidade infinita de elementos separados, que são denominados de átomos lógicos, não físicos. O atomismo lógico pretendia ser uma filosofia emergente da simbiose entre um empirismo radical e uma lógica perspicaz. A lógica oferece as formaspadrão do raciocínio correto e o empirismo oferece premissas, que são proposições atômicas ou proposições complexas, construídas a partir das primeiras. (REALE, 2005, p.297) Para Wittgenstein, “a realidade consta de fatos que se resumem em fatos atômicos [...]” (REALE, p.309-310). O atomismo lógico de Russell e Wittgenstein deu definições de verdade como correspondência de uma proposição com um fato. Tal correspondência tratase de um isomorfismo estrutural conforme descreve Haack (2002), onde as proposições moleculares (Fa v Gb) são compostos funcionais capazes de se verificar a partir das suas proposições atômicas (Fa) e (Gb). Reale (2005) exemplifica ao afirmar que a proposição “Sócrates é ateniense” (As) é uma proposição atômica, pois descreve apenas um fato atômico, a saber, que Sócrates é um cidadão ateniense; já a proposição “Sócrates é ateniense e mestre de Platão” (As ^ Msp) é uma proposição molecular, pois descreve dois fatos atômicos, e para ser considerado válido deve ser analisado pelas menores entidades 2 lingüísticas, ou seja, suas proposições atômicas. Simor (2009) apresenta três requisitos fundamentais para se chegar à verdade pela teoria correspondentista de Russell, que são: a verdade oposta à falsidade, a verdade e a falsidade como propriedades de crenças ou enunciados e a verdade e a falsidade dependentes de algo externo à crença. Assim, a partir do terceiro requisito acima, pode-se dizer que o que torna a sentença verdadeira ou falsa é sua correspondência com algo no mundo. Algumas implicações lógicas são possíveis de se verificar na teoria da correspondência, conforme Haack (2002), como: “- p” será verdadeiro apenas no caso de “p” não ser, ou “p ∨ q” será verdadeiro apenas no caso de “p” ser verdadeiro ou de “q” ser verdadeiro. Haack (2002) expõe que os dados dos sentidos para Russell são os objetos do conhecimento direto, de forma que este conhecimento é possível por direta familiaridade. É, no entanto, a significatividade de uma proposição que é derivada da composição de nomes de objetos, os quais são conhecidos por familiaridade. Russell reconheceu “as dificuldades para considerar todas as proposições moleculares, em especial proposições de crenças e proposições quantificadas, como funções de verdade de proposições atômicas” (HAACK, 2002, p.134). Russell admite fatos tanto negativos como positivos, conforme Haack (2002), e isto acarreta que dizer a verdade da negação de “p” consiste em correspondência com o fato de que não “p” ou da falha de “p”, o que gera certa ambigüidade. É o caso da afirmação “não há um urso nesta sala”, pois isto implica dizer apenas a não existência do urso na sala, mas não responde ao fato do que há na sala (GHIRALDELLI, 2001). Porém, isso geraria uma ambigüidade pelo fato da proposição ser negativa, o que destruiria o fundamento da teoria correspondentista. Críticos da teoria da correspondência disseram que falta clareza na verificação da proposição com os fatos correspondentes, como no caso “o gato está à esquerda do homem” (HAACK, 2002, p.135), pois o fato tem dois componentes (gato e homem), mas a proposição tem pelo mesmos três componentes (gato, esquerda e homem). Mais difícil ainda seria investigar uma proposição molecular do tipo: “a é vermelho; a é casado com b” (HAACK, 2002, p.135), pois é praticamente impossível interpretar tal proposição como um isomorfismo que o atomismo lógico de Russell prescreve. Para Russell, a verdade de “p” consiste em sua correspondência com o fato de que “p”, mas o problema aqui é que a relação entre “p” e o fato de que “p” está próxima demais, pois “não poderia deixar de corresponder a este fato” (HAACK, 2002, p.136). Como no caso da proposição o gato (p) está no tapete (q), que pela experiência se consegue provar a correspondência da relação entre p e q. Por isto, a verdade como correspondência não 3 necessariamente provaria a verdade, mas apenas diria algo que é óbvio e redundante, passível apenas à empiria lógica, e neste sentido torna-se uma teoria inoperante quanto a questões mais complexas como a existência de Deus ou infinitude do universo que transcendem nossa capacidade e possibilidade empírica.. Mais tarde, conforme Haack (2002), Austin reinterpreta a teoria da correspondência, não mais pelo isomorfismo estrutural, mas pela convenção entre palavras e o mundo, a partir da junção das convenções descritivas e demonstrativas. As convenções descritivas consistem nas palavras se correlacionarem com “tipos de situação”. Como no exemplo dado por Haack (2002): “estou com pressa” (s em t), onde para ser verdadeiro deve haver correlação entre as palavras desta proposição com as situações referente a alguém que está com pressa (s em t). As convenções demonstrativas consistem na correlação das palavras com situações específicas, como no exemplo acima, as palavras da proposição “(eu) estou com pressa” com o estado de “s em t”. Assim, conforme Haack (2002), para ser verdadeiro, o enunciado tem de se correlacionar entre as duas convenções. Uma limitação da teoria de Austin é nas convenções demonstrativas que se referem a situações diferentes, como no caso: “Júlio Cezar era calvo” ou “Todas as mulas são estéreis” (HAACK, 2002, p. 136), pois parece não ser possível fazer a convenção sem poder verificar a calvície de Júlio Cezar (no passado) e todas as mulas do universo. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS Pelo que se inferiu acima, pode-se dizer que a teoria da correspondência serve no sentido de explicar determinadas proposições quanto à veracidade ou falsidade em alguns casos, porém apresenta falhas em outros. Mesmo assim, esta teoria tem a pretensão de definir alguns critérios para a verdade e assim poder definir o que é uma proposição verdadeira ou falsa, que fora nosso problema levantado. As contribuições de Russel, Wittgenstein e Austin para a filosofia da linguagem e para a lógica se referem principalmente ao fato de a teoria da correspondência ser mais uma teoria que busca desvendar a verdade, mas que muito embora não consiga abarcar o todo, é inegável que é capaz de contribuir para se chegar à veracidade e a constatação do falso, pelo menos naqueles casos onde temos possibilidade de verificação. REFERÊNCIAS GHIRALDELLI, Paulo Jr. Teorias de Verdade – brevíssima introdução. 24 abr. 2001. Disponível em: 4 <http://www.consciencia.net/filosofia/verdade1.html>. Acesso em: 21 jun. 2012. HAACK, Susan. Teorias da verdade. In: Filosofia das lógicas. Tradução de Cezar Augusto Mortari e Luis Henrique de Araújo Dutra. São Paulo: UNESP, 2002. p.127-184. MURCHO, Desidério. Lógica e teorias da verdade. 10 abr. 2004. Disponível em: <http://criticanarede.com/log_logverdade.html>. Acesso em 21 jun. 2012. REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da filosofia: de Nietzsche à Escola de Frankfurt. v.6. Tradução de Ivo Storniolo. São Paulo: Paulus, 2005. SIMOR, Fabiano Lima. Teoria da correspondência em B. Russell. 10 set. 2009. Disponível em: <http://lifephilosophic.blogspot.com.br/2009/09/teoria-da-correspondencia-em-b-russell. html>. Acesso em: 21 jun. 2012. 5