- Macroplan

Propaganda
Cinco Cenários
para o Brasil
2001 – 2003
Incluindo os desdobramentos da
crise energética brasileira e dos
ataques terroristas aos Estados
Unidos
Claudio Porto, Elimar Nascimento e
Sérgio C. Buarque
Outubro de 2001
0
Apresentação e Resumo Executivo
O ano 2001 começa com o Brasil apresentando sinais de forte crescimento
econômico. E é possível que, após duas décadas de quase estagnação econômica, o
país esteja no limiar de um novo período de crescimento econômico prolongado.
A possibilidade de retomada do crescimento predomina como expectativa entre os
atores sociais. Mas não se pode descartar alternativas negativas. Afinal, elas estão
presentes nas entranhas de nossa sociedade. Tanto a permanência de baixo
crescimento com risco de inflação, quanto o retorno a índices próximos aos
dominantes na década de 70 são possíveis.
O objetivo da construção de cenários é justamente o de reduzir as incertezas a um
conjunto restrito de alternativas mais prováveis: estabelecer futuros plausíveis e
coerentes, a partir de hipóteses consistentes. Fundamentais para orientar decisões
de empresários, governantes e dirigentes em geral, na sociedade e no governo, na
economia e na política.
Fugindo da previsões determinísticas, que geralmente desenham um único futuro a
partir de uma mera extrapolação de fenômenos do passado recente e do presente,
os cenários trabalham com o futuro de uma forma mais plural e qualitativa.
A exemplo do que fez em 1999 e 2000, uma equipe da Macroplan construiu novos
cenários plausíveis para o Brasil em um horizonte de curto prazo. Só que agora
ampliou o horizonte de prospecção para os próximos três anos para considerar duas
incertezas que são críticas para o país nos anos 2001 a 2003:
como evoluirá o contexto internacional no que interessa ao Brasil?
Nos será favorável, problemático ou desfavorável ?
quem vencerá as eleições de 2002 e como será o primeiro ano do país
com os novos governantes ?
Os cenários resultantes da avaliação destas incertezas, e que serão objeto de
monitoramento sistemático pela Macroplan, ao longo do ano, como temos feito
desde 1999, são os seguintes:
1
Cenário A – O Vôo da Fênix: o Brasil entra ‘com o pé direito’ no século 21,
superando as expectativas mais otimistas e, numa articulação de diversos fatores
favoráveis, experimenta três anos sucessivos de crescimento forte, inflação em
declínio, continuidade política e evidências de que o quadro de exclusão social
começa a ser revertido. Continuidade é a idéia-força deste cenário.
Cenário B1 – Nas asas do Tuiuiú: o Brasil começa ganhando no século 21, confirma
expectativas positivas e, apesar de algumas dificuldades externas e internas,
experimenta três anos sucessivos de crescimento econômico e inflação em declínio,
com reconfiguração parcial do bloco político hegemônico (para incorporar políticas
sociais mais ativas) e algumas evidências de que o quadro de exclusão começa a ser
revertido. Ajuste de rota é a idéia-força deste cenário.
Cenário B2 – Seguindo as Arribaçãs: o Brasil começa mudando no início do século
21: dentro de um contexto internacional desfavorável, que compromete a retomada
do crescimento, e de dificuldades internas, um novo bloco político assume o poder
reorientando focos e prioridades políticas para enfatizar a responsabilidade social do
governo. Mudança de rumo é a idéia-força deste cenário.
Cenário C1 – Do jeito do Caramujo: o Brasil começa dando uma ‘guinada’ no início
do século 21: um novo bloco político social-reformista e nacionalista assume o
poder diante de dificuldades externas e internas, em um contexto de queda do
crescimento econômico e moderado aumento da inflação, e começa, com
dificuldades e resistências, a implantar políticas que priorizam a distribuição de
renda, o combate à exclusão social e a reafirmação do sentimento nacional.
Resistência é a idéia-força deste cenário.
Cenário C2 – A Síndrome da Vaca Louca: o Brasil mais uma vez surpreende, desta
vez para pior: face a um contexto externo desfavorável, combinado com um quadro
político interno complicado, ingressa no século 21 com uma séria crise econômica,
social e de governabilidade, com inflação e desemprego em franca elevação. Crise é
a idéia-força deste cenário.
Uma observação inicial é relevante e oportuna para que os cenários Macroplan
sejam adequadamente analisados e utilizados: as quantificações apresentadas no
texto a seguir não são estimativas precisas, e sim indicações ‘exemplificativas’ para
ajudar a avaliar as tendências mapeadas qualitativamente.
2
Sumário
Apresentação e Resumo Executivo....................................................................................... 0
O Brasil no Ano 2000............................................................................................................ 5
1.1 Economia: retomada do crescimento com inflação em queda............................................. 5
1.2 Política: renovação municipal e responsabilidade fiscal........................................................ 7
1.3 Quadro social: pequena melhoria, novas esperanças........................................................... 9
2. O Contexto Internacional................................................................................................ 11
3. Condicionantes e Incertezas Críticas para 2001-2003...................................................... 14
3.1 Incertezas críticas mundiais: estabilidade do mercado de capitais e crescimento
econômico......................................................................................................................... 14
3.2 Incertezas críticas nacionais: macroeconomia e eleições de 2002...................................... 15
4.Cenário A: O Vôo da Fênix............................................................................................... 18
4.1.Cena 1: 2001-2002.............................................................................................................. 18
4.2. Cena 2: 2003 – continuidade e otimismo........................................................................... 24
4.3. Conclusão: fênix voa em ‘céu de brigadeiro’..................................................................... 25
5. Cenário B1: Nas Asas do Tuiuiú....................................................................................... 27
5.1.Cena 1: 2001-2002.............................................................................................................. 27
5.2. Cena 2: 2003 – o ajuste da rota......................................................................................... 33
5.3. Conclusão: agora quem voa é o Tuiuiú............................................................................... 34
6. Cenário B2: Seguindo as Arribaçãs.................................................................................. 36
6.1. Cena 1: 2001-2002............................................................................................................. 36
6.2. Cena 2: 2003 – a mudança de rumo....................................................................................42
3
6.3.Conclusão: o Brasil está de mudança.................................................................................. 43
7.Cenário C1: Do jeito do Caramujo.................................................................................... 45
7.1.Cena 1: 2001-2002.............................................................................................................. 45
7.2.Cena 2: 2003 – igual a um caramujo, o Brasil “se fecha” para resistir............................... 51
7.3.Conclusão: a esperança está dentro de casa....................................................................... 52
8. Cenário C2: A Síndrome da Vaca Louca........................................................................... 54
8.1. Cena 1: 2001-2002............................................................................................................. 55
8.2. Cena 2: 2003 – a crise continua......................................................................................... 61
8.3. Conclusão: o país perde o rumo como uma ‘vaca louca’................................................... 62
9. Análise Comparativa e Plausibilidade dos Cenários....................................................... 64
Anexo 1 - Números do Brasil 1994-2000............................................................................. 67
Anexo 2 - Sobre a Macroplan e Seus Cenários.....................................................................68
4
1. O Brasil no Ano 2000
O Brasil chegou ao fim do século apresentando um quadro contraditório de relativa
estabilidade econômica e recuperação da crise cambial, combinado ao desgaste das
instituições e do governo federal e à ascensão política das forças de oposição,
lideradas pelo Partido dos Trabalhadores. O país continua passando por um processo
relativamente rápido de reestruturação produtiva e modernização econômica com
mudança nos padrões de desenvolvimento e redefinição do papel do Estado, apesar
da desaceleração das reformas.
No entanto, ainda exibe uma grande vulnerabilidade externa e estrangulamentos
financeiros e estruturais, expressos na dívida pública e no déficit em conta corrente.
Ambos ameaçam a estabilidade e a recuperação econômica a cada turbulência no
sistema financeiro internacional. No terreno político, consolida-se a democracia
brasileira, convivendo com fatores de instabilidade política e conflitos sociais.
Assim, o futuro do Brasil está sendo construído a partir de tendências e processos
que estão amadurecendo internamente, tanto no terreno econômico e social, quanto
político, influenciado pelos fatores externos.
1.1 Economia: retomada do crescimento com inflação em queda
Depois de dois anos de fortes turbulências geradas pela instabilidade do sistema
financeiro mundial, o Brasil superou as adversidades do ataque especulativo à
economia nacional. Conteve as pressões inflacionárias e reequilibrou os fluxos
internacionais de capital. Desde o início de 1999, o governo vem implementando um
rigoroso e bem sucedido plano de estabilização e reformulação, com fortes cortes nas
despesas, elevadas taxas de juros – embora bastante declinantes neste ano aumento de impostos e aceleração das negociações para a reforma da Previdência. O
custo deste sucesso foi a revisão da política cambial, principal instrumento do Plano
Real, a recessão econômica, com o crescimento do desemprego, o crescente
endividamento público e a dependência de abundantes recursos externos.
Contudo, apesar dos estrangulamentos econômico-financeiros e da vulnerabilidade
externa, do desemprego e do crescimento da violência urbana, os agentes
econômicos internos demonstram confiança no processo de recuperação da
economia e retomam planos de investimentos, estimulados pela entrada maciça de
capital externo no País.
5
O ano de 2000 confirmou as expectativas de retomada de crescimento, com o PIB
exibindo um índice de 4,2%, superando as previsões mais otimistas. As taxas de juros
caíram ao longo do ano, principalmente no primeiro semestre, estimulando os
investimentos produtivos. O desempenho econômico foi facilitado pela persistência
do crescimento da economia mundial, influenciada pela economia norte-americana e
a recuperação da União Européia. Por outro lado, o fluxo de capital externo se
manteve, graças ao bom desempenho da economia internacional mas, sobretudo, à
manutenção da credibilidade do governo federal e do enorme potencial do país.
Esse crescimento refletiu-se na taxa de
O ano de 2000 confirmou as
desemprego, que estancou e, em seguida, caiu. O
expectativas de retomada
terciário foi o setor que mais contribuiu na criação
de crescimento, com o PIB
de novos postos de trabalho, mas a indústria
exibindo um índice de 4,2%,
superando as previsões mais
também mostrou saldo positivo. A inflação
otimistas.
permanece no patamar esperado, pouco abaixo de
6%, mais baixa do que no ano passado, apesar das
tensões de agosto e setembro, provocadas pelos aumentos decorrentes dos preços
administrados e do petróleo.
Entretanto, a balança comercial é a grande fragilidade da economia e o mais visível
insucesso da política de estabilização do governo. O déficit verificado (US$ 691
milhões) apesar de ter sido bem menor do que o de 1999 (cerca de US$ 1,2 bilhão)
ficou muito além das expectativas mais pessimistas. O Brasil não consegue vencer as
restrições estruturais que tornam seus produtos
O balanço econômico do ano
pouco competitivos. Além disso, os grandes países
2000 é positivo: o Brasil
não colaboram, criando obstáculos e proteções de
parece ter ingressado em um
todas as ordens. Embora, em termos físicos,
ciclo de crescimento
sustentável com inflação em
tenham aumentando bastante as exportações nos
queda, apesar da
dois últimos anos, continuaram em queda os
vulnerabilidade às
preços relativos dos produtos brasileiros,
turbulências externas. Mas
principalmente, as commodities.
revela também, que no
panorama doméstico, os
Quanto à inserção na ‘nova economia’, há mais
ventos são favoráveis para
resultados positivos do que negativos no período.
que o País acelere o seu
No segmento telecomunicações, as metas da
ritmo de crescimento em
Anatel para expansão da telefonia fixa e celular
2001.
foram ultrapassadas e, no segmento Internet,
ocorreu, por um lado, expansão significativa de domínios comerciais (‘com.br’) mas,
por outro lado, houve forte contração no número de provedores de Internet no
Brasil1 . O País chega, ao final do ano 2000, com cerca de 7 milhões de usuários da
Internet (40% do total da América Latina).
1
MCT, ‘Programa Sociedade da Informação’, http://www.mct.gov.br/Temas/Socinfo/Default.htm. Acessado em 10.12.00.
6
Nos aspectos estruturais é importante ressaltar que o processo de privatização das
empresas brasileiras entrou em recesso, apesar das pressões internacionais e da
necessidade das finanças públicas. As críticas ao modelo no setor elétrico são
crescentes, na mesma medida em que aumenta o risco de um estrangulamento com
a possibilidade de expansão econômica nos próximos anos.
1.2 Política: renovação municipal e responsabilidade fiscal
O ano de 2000 registra uma nítida melhora da imagem do governo federal, mas em
patamares ainda baixos (pouco acima de 25% de aprovação). Consequência da
sucessão de escândalos, que conduziram à cassação de um senador, fato inédito na
História do Brasil, e de erros de condução política por parte do governo federal diante
dos movimentos sociais e de sua base parlamentar. Em contradição com o relativo
sucesso da política econômica, acentuam-se as tensões políticas na base
governamental, no choque de figuras proeminentes do PFL com o PSDB, ou entre
Poderes Constitucionais. Fenômenos distintos, mas todos no âmbito da esfera do
Governo Federal.
Mas um dos fatos mais relevantes da vida política nacional em 2000 foi a vitória do PT
nas eleições municipais. As esquerdas tiveram um
crescimento eleitoral nas grandes cidades e
Na esfera política, 2000
conquistaram a administração de muitos
terminou com uma melhoria de
municípios de peso econômico e político, com
imagem do governo federal,
2
apesar dos escândalos e das
destaque para São Paulo . Por sua vez, a base
tensões na sua base de apoio.
governamental conservou a sua força, avançando
Mas que não ofusca a vitória
para os municípios do interior. Em termos
eleitoral da esquerda,
especialmente do PT, nas
percentuais, o PPS teve o maior crescimento,
grandes cidades em um pleito
mesmo porque parte de uma base muito pequena
onde o fator ético parece ter
e teve o estímulo do seu provável candidato à
sido o grande divisor de águas.
Presidência da República, Ciro Gomes.
Observando o movimento eleitoral desde 1988, o crescimento do PT é contínuo,
saindo de 38 prefeituras para 187, superado apenas pelo PSDB, que salta de 18 para
990, com a vantagem de ser o partido do Presidente. O PFL praticamente se mantém,
sempre em torno de 1.000 prefeituras sob seu controle, mas o PMDB tem uma perda
contínua: de 1.606 para 1.257. Mantendo-se, porém, como o partido que mais
prefeituras controla.
2
Para diversos observadores, esta vitória pode não resultar numa grande capitalização política para o PT: o fato da Prefeitura de
São Paulo estar completamente falida dificulta muito a produção de resultados significativos no município até as eleições de
2002.
7
Contudo, o aspecto que parece carregado de maior relevância como resultado das
eleições refere-se à população que estará sob a administração de cada partido: o PT
terá sob sua administração o contingente de 27 milhões de pessoas; o PMDB, 25
milhões; o PSDB, 24 milhões; o PFL, 21 milhões; o PTB, 13 milhões e o PPB, 10
milhões.
Os efeitos das eleições municipais sobre 2002 são discutíveis. O fator ético parece ter
sido um grande divisor de águas, favorecendo o PT como o partido ‘sem máculas’, ou
seja, sem envolvimentos nos escândalos que têm dominado a política brasileira.3 O
sucesso administrativo nos municípios também pode fortalecer suas pretensões. Por
outro lado, reduz o ciclo ascendente do candidato
O fato mais significativo e
do PPS, Ciro Gomes, e coloca os partidos
portador de futuro das
governamentais em situação de ameaça.
mudanças institucionais, neste
final de século, foi a aprovação
Movimentos já se iniciam de reorganização de
da Lei da Responsabilidade
alianças, cujos rumos vão depender basicamente
Fiscal
do comportamento da economia e da recuperação
da imagem do governo junto à opinião pública.
Paralelamente, o discurso e a prática do governo federal começaram a mudar,
traduzido em iniciativas para evidenciar preocupação social do governo. O Presidente
interveio para controlar a alta dos combustíveis, lançou, ainda antes das eleições, o
Programa Alvorada e agora procura capitalizar a proposta de aumento do Salário
Mínimo. Além disso, os programas classificados como ‘sociais’ foram os de melhor
execução orçamentária no ano 2000.
Mas o fato mais significativo e portador de futuro das mudanças institucionais neste
final de século foi a aprovação da Lei da Responsabilidade Fiscal. Esta lei define
parâmetros bastante rigorosos de gestão pública em todos os níveis, especialmente
no que se refere aos gastos, e representa um importante estímulo de mudança da
cultura governamental brasileira, especialmente para os novos gestores municipais,
com regras que obrigam a um rigor na seriedade e competência da gestão pública.
Com esta Lei, “o bolso coletivo passa a ter dono: a sociedade4”. Embora alguns
céticos ressaltem que, por excesso de rigor, a Lei de Responsabilidade Fiscal corre o
risco de tornar-se uma daquelas ‘leis que não pegam’. Todavia, combinada com a
postura ativa do Ministério Público, pode transformar-se em forte instrumento de
seriedade administrativa. Este fato parece evidenciar que está em curso um processo
de formação de uma nova geração de gestores públicos, já presentes em alguns
governos estaduais, beneficiados pela legislação que pune os incautos e
irresponsáveis.
3
As denuncias de práticas fisiologistas em algumas prefeituras foram rapidamente enfrentadas pelo Partido.
4
Marcelo Neri – “Censo e contra-censo”, in Valor Econômico, 06-02-2001.
8
1.3 Quadro social: pequena melhoria, novas esperanças
A recuperação econômica ao longo do ano foi acompanhada de perto pela
recuperação do mercado de trabalho. Em dezembro, a taxa de desemprego caiu para
4,8% - a menor desde 1997. No balanço do ano, a taxa média do desemprego aberto
ficou em 7,1% (em 1999, a taxa média foi 7,6%) e ocorreu queda no desemprego nas
6 regiões metropolitanas pesquisadas pelo IBGE. Nos primeiros 11 meses de 2000, o
emprego formal cresceu 4,3%, “representando um recorde histórico, largamente
superior ao maior crescimento verificado anteriormente (1,93% em 1994)”.5
Na saúde infantil também houve progresso. De acordo com o Índice de
Desenvolvimento Infantil, apresentado pela Unicef em dezembro, a taxa de
mortalidade infantil vem caindo no Brasil, as campanhas de vacinação são quase
universais e 95% das famílias brasileiras tem acesso ao sal iodado.6 Em contrapartida,
6% dos menores de cinco anos sofrem de desnutrição moderada ou severa – situação
inaceitável.
A educação é, dentre os campos de políticas sociais, o que apresenta os mais
consistentes avanços quantitativos, com reflexos profundos, no médio prazo, na
consolidação da capacidade competitiva nacional. Os dados do censo do MEC
mostram que o número de matrículas no ensino médio cresceu 5,4% em 2000 em
relação ao ano anterior. Há, no entanto, muito a ser feito em relação à qualidade do
ensino,
capacitação
e
remuneração
dos
De um modo geral, a evolução
professores, além da infra-estrutura das escolas
dos indicadores sociais no
públicas no país.
Brasil, de 1983 a 1999, mostra
uma tendência persistente de
melhora, sendo acelerada a
partir de 1999.
Numa perspectiva mais ampla, de um modo geral a
evolução dos indicadores sociais no Brasil, de 1983
a 1999, mostra uma tendência persistente de
melhora e, a partir de 1999, uma aceleração nítida dessa evolução7. Estes indicadores
revelam:
5
IBGE, ‘Taxa de Desemprego em dezembro foi de 4,8%’, http://www.ibge.gov.br/ibge/presidencia/noticias/2501pme.shtm. E
MTb, ‘Análise do Mercado Formal de Trabalho’, CAGED, novembro, 2000.
http://www.mtb.gov.br/sppe/caged/infv/2000/infl100/semp.htm. Acessados em 28.01.01.
6
Unicef (2000). ‘The State of the World’s Children.’ http://www.unicef.org/sowc01. Acessado em 10.12.00
7
Melo Filho, Paulo Guilherme e Fausto, Sérgio (2000) ‘Evolução dos Indicadores Sociais no Brasil’, Secretaria de Política
Econômica, dezembro. Pesquisa baseada em dados processados pelo IPEA, sob a coordenação de Ricardo Paes de Barros.
9
•
rápida expansão da cobertura escolar, com reflexos positivos sobre a taxa
de escolarização;
•
ampliação dos serviços de atendimento básico à saúde da mulher e do
recém-nascido, com repercussões positivas sobre a taxa de mortalidade
infantil;
•
queda drástica do trabalho infantil;
•
aceleração do incremento da renda familiar per capita, levando à redução
da proporção de pobres e indigentes, após a estabilização monetária;
•
continuidade na expansão da infra-estrutura de saneamento básico.
A análise da evolução desses indicadores traz à tona uma realidade distinta da
percepção difundida na sociedade de que o país não tem conseguido progredir no
objetivo de melhorar as condições de vida da maioria de sua população.
Mesmo diante de algumas melhorias no quadro
social, é importante registrar que chegamos ao
final do milênio com cerca de 15% da população
brasileira vivendo em situação de extrema pobreza
(sobrevivem com menos de US$ 1,00 por dia) e
com um número absoluto de pobres próximo dos
53 milhões de pessoas.8 Os avanços na área social
são tímidos se compararmos com as carências
existentes.
Os avanços nos indicadores
sociais ainda são tímidos
quando confrontados com as
carências sociais,
especialmente no que diz
respeito à (má) qualidade de
vida e à insegurança e violência
nas grandes cidades.
Carências que são refletidas no crescimento significativo da violência - principalmente
urbana. Segundo dados do Ministério da Justiça, a taxa de crimes contra a vida ficou
em torno dos 36 por cem mil habitantes (em 1999), deixando o Brasil à frente de
países como Bolívia (23,2) e México (20,2). Não há indícios de que o quadro tenha se
revertido em 2000 e ainda é cedo para avaliar os potenciais resultados do Programa
Nacional de Segurança Pública, lançado em junho de 2000.
8
IPEAdata. http://www.ipea.org.br
10
2. O Contexto Internacional
A economia internacional registrou, no ano de 2000 o ritmo de crescimento mais
veloz desde 1986 - superando 4%. Este ritmo foi puxado pela exuberância econômica
norte-americana, combinado a uma intensa inovação tecnológica. Nos Estados
Unidos predominou o ajuste econômico gradativo, com resultados positivos na
contenção da ‘exuberância irracional’, reduzindo o crescimento a patamares mais
realistas. Mas a instabilidade das bolsas de valores persistiu, refletindo a inquietação
e volatilidade do sistema financeiro internacional, particularmente na chamada ‘nova
economia’. Assim, ainda persistem fatores de instabilidade e riscos que podem
comprometer a pilotagem do Banco Central norte-americano.
Ao mesmo tempo em que a economia norte-americana mostra um grande
dinamismo, o Japão continua marcando passo e amargando a recessão. A Europa, por
sua vez, depois de um leve movimento de
O ano de 2000 foi de
recuperação
econômica,
apresenta
novos
crescimento econômico
problemas, refletidos na importante desvalorização
mundial - superando 4% - o
do Euro.
ritmo mais veloz desde 1986.
Mas o crescimento econômico mundial em 2000 foi
confirmado. Dos 40 países avaliados pela The
Economist, apenas 4 tiveram produção industrial
negativa na comparação com o ano anterior
(Argentina, Espanha, Grécia e Hong Kong). E todos
os países ‘baleia’ (Rússia, China, Índia, Indonésia e
Brasil) exibiram crescimento econômico elevado.
Dos 40 países avaliados pela
The Economist, apenas 4
tiveram produção industrial
negativa na comparação com o
ano anterior (Argentina,
Espanha, Grécia e Hong Kong).
E todos os países ‘baleia’
(Rússia, China, Índia, Indonésia
e Brasil) exibiram crescimento
econômico elevado.
O bom desempenho econômico dos ‘países baleia’
foi acompanhado por um desempenho político também positivo. Na Rússia, o
primeiro ano de mandato de Vladimir Putin focalizou principalmente questões
políticas internas, como o combate às oligarquias. Já a China e a Índia se esforçaram
para avançar sua projeção internacional. O primeiro, assinando acordos com os EUA e
a UE para ingresso na Organização Mundial do Comércio, e o segundo, intensificando
o diálogo com os EUA. A Indonésia constitui uma exceção, apesar do forte
crescimento econômico continua enfrentando uma série de questões éticas, políticas
e sociais que minam a estabilidade do país.
Enquanto isso, na América Latina, dois fatores de instabilidade tendem a constituir
importantes alavancas de mudança, de curto e médio prazos, para o Brasil. O
primeiro, e mais diretamente impactante, é a crise política e econômica da
Argentina, que constitui uma efetiva ameaça à política de estabilização brasileira,
11
dificultando a consolidação do MERCOSUL. O outro, é a operação antidroga e antiguerrilha na Colômbia, com seus prováveis efeitos de irradiação na região
amazônica. Estima-se que o Brasil terá que investir nos próximos dez anos algo em
torno de US$ 10 bilhões de modo a não permitir que o conflito Colombiano
ultrapasse as fronteiras. Com certeza, esses recursos terão que ser financiados pelo
contribuinte brasileiro.
A grande novidade do segundo semestre de 2000 foi a elevação significativa dos
preços do petróleo que, embora não constitua uma ameaça similar a da década de
70, ainda é a principal fonte de energia do planeta. Para o conjunto da economia
mundial e para alguns países altamente dependentes dos combustíveis fósseis, como
a Europa e o Japão, este aumento pode gerar grandes pressões inflacionárias,
levando ao esfriamento do ritmo de crescimento econômico. De um modo geral, a
OPEP faz valer seus interesses, aumentando suas margens de lucro e procurando
recuperar o valor real em dólar dos preços da commodity. Apesar dos estoques
mundiais e das alternativas que têm sido criadas desde a década de 70, o fantasma
da crise energética tem um grande impacto psicológico e político, especialmente com
a proximidade do inverno nos países
O desaquecimento
desenvolvidos. Para o Brasil, particularmente, a
administrado nos EUA e o forte
subida dos preços do petróleo representa uma
apoio internacional dado à
ameaça para o equilíbrio das contas externas,
Argentina também
contribuiriam para o bom
contrastando com os baixos termos de trocas das
desfecho do ano. Ano que
outras commodities que fazem parte da pauta de
também marcou um forte
exportações brasileira.
crescimento dos movimentos
anti-globalização e nos traz
Na dimensão da política internacional, um fato
novas preocupações com as
que ocupa a cena mundial e pode influenciar
operações anti-droga na
Colômbia – com prováveis
fortemente no futuro é o crescimento e
irradiações para a região
intensificação dos movimentos de contestação ao
amazônica – e novas tensões
processo de globalização. Estes refletem as
nas disputas comerciais do
Brasil com o Canadá. No
grandes inquietações geradas com as incertezas e
entanto, apesar das
as implicações de um processo acelerado de
turbulências na reta da
mudança, sem o paralelo desenvolvimento de
chegada, tivemos bons motivos
para comemorar.
mecanismos de regulação da economia e do
sistema financeiro internacional. Em parte, esta
inquietação tem sido manifestada por diferentes lideranças políticas e vem
influenciando o discurso das organizações internacionais mais tradicionais (FMI e
BID). Particularmente no que se refere ao aumento da desigualdade social e dos
bolsões de pobreza no mundo.
Já no terreno da integração econômica regional, os países do hemisfério sul
continuam resistindo às pressões dos Estados Unidos em favor da ALCA, sob
liderança do Brasil. Novas tensões surgiram no relacionamento comercial Brasil x
12
Canadá, por conta da disputa Embraer x Bombardier, agora ‘contaminada pela vaca
louca’, e que podem acrescentar dificuldades e complicações a este processo.
Ao mesmo tempo, na nossa fronteira Oeste e trans-andinal, surgem diferentes
elementos de instabilidade e conflito que, no médio prazo, podem tornar-se
explosivos e envolver todo o sub-continente, em particular a crise institucional do
Peru.
13
3. Condicionantes e Incertezas Críticas para 2001-2003
Os cenários futuros do Brasil dependem da forma em que se combinem no tempo as
incertezas críticas do contexto mundial com aquelas que amadurecem internamente.
De forma esquemática podem ser definidas duas grandes incertezas mundiais e duas
incertezas nacionais:
3.1 Incertezas críticas mundiais: estabilidade do mercado de capitais e
crescimento econômico
Os fatores internacionais que influenciam fortemente o futuro do Brasil no horizonte
2001-2003 podem ser reunidos em duas incertezas síntese, que refletem as condições
econômico-financeiras externas e o ritmo de crescimento da economia mundial. Estas
levam a três hipóteses que se traduzem numa cesta de condições favoráveis ou
desfavoráveis para a evolução do nosso país:
9
Contexto favorável: estabilidade e crescimento – A economia mundial mantém
uma taxa elevada de crescimento, em torno de 4%, e com relativa estabilidade. A
economia norte-americana consegue realizar um ‘pouso suave’; a Europa cresce
mais depressa que os EUA; e a recuperação do Japão finalmente começa a
acontecer. Também melhoram os termos de troca das principais commodities que
fazem parte da pauta de exportações brasileiras.
Contexto desafiante ou ‘problemático’: turbulências localizadas - A economia
mundial mantém uma taxa razoável de crescimento, entre 3,0 e 3,5%, e com
relativa estabilidade. Mas a economia norte-americana tem algumas dificuldades
em realizar um ‘pouso suave’; e a recuperação do Japão demora a acontecer,
embora a Europa continue sua trajetória de crescimento. Os termos de troca das
principais commodities que fazem parte da pauta de exportações brasileiras têm
apenas uma pequena melhora9.
Contexto desfavorável: instabilidade e crescimento baixo – A economia norteamericana não consegue realizar o chamado ‘pouso suave’, ingressando em um
acidentado desaquecimento com intensas quedas da bolsa de valores. A
recuperação do Japão também não acontece e a Europa arrefece sua trajetória de
crescimento. Isto tudo sinaliza que uma forte recessão está a caminho. Há um
significativo aumento das incertezas em nível mundial e os termos de troca das
Seria um contexto semelhante ao do ano 2000, talvez um pouco piorado.
14
principais commodities que fazem parte da pauta de exportações brasileiras
continuam se deteriorando.
3.2 Incertezas críticas nacionais: macroeconomia e eleições de 2002
No Brasil estão amadurecendo vários processos que podem ser agrupados em dois
grandes conjuntos relativamente independentes, que estruturam e condicionam
vários outros fatores de mudança:
1.
Condições macroeconômicas em 2001 e 2002 – embora bastante suscetível às
condições externas, o desempenho e a estabilidade da nossa economia também
dependem da capacidade do governo federal operar políticas sólidas e
consistentes de gestão dos estrangulamentos. Neste campo as principais
hipóteses são as seguintes:
a) crescimento alto com inflação declinante;
b) crescimento médio e inflação estável; e
c) crescimento baixo com inflação ascendente.
2.
10
Composição do bloco hegemônico nas eleições de 2002 – mesmo sendo
influenciadas pelas condições econômicas internas, as alternativas de aliança e
formação de blocos políticos dominantes têm relativa autonomia e não
respondem de forma linear e ‘direta’ à conjuntura econômica e ao resultado das
políticas governamentais atuais. Embora com certa rigidez no curto prazo (até as
eleições de 2002), podem ser definidas quatro grandes hipóteses para a
hegemonia nacional (com leves nuances nos primeiros dois anos):
a)
Consolidação do bloco liberal – o desempenho positivo da economia
brasileira (estabilidade, controle da inflação e redução dos
estrangulamentos) levam ao fortalecimento da estrutura de poder
interno. Satisfeita com o quadro econômico, a sociedade brasileira tende
a apostar em um governo de continuidade10.
b)
Leve reorientação do modelo econômico com enfoque social e
desenvolvimentista – apesar do desempenho positivo da economia
brasileira e, até por conta disto, tende a registrar-se uma mudança na
orientação política nacional, incorporando políticas sociais e
desenvolvimentistas. Mesmo relativamente satisfeita com o
comportamento da economia, a sociedade demanda avanços na área
social e ajuste nas estratégias de desenvolvimento.
As eleições de 2002 são o evento que melhor expressa a continuidade, reconfiguração ou mudança do bloco hegemônico.
15
c)
Mudança para uma hegemonia social-reformista – seja como
aprofundamento das mudanças em um quadro de estabilidade
econômica e retomada do crescimento, seja como resposta à crise e
instabilidade econômica mundial e nacional, assume a condução política
no Brasil uma aliança com forte preocupação social e nacional.
Insatisfeita com a situação econômica, a sociedade aposta em mudanças
mais profundas e respostas políticas e econômicas diferentes diante das
dificuldades existentes.
d)
Desorganização do poder – as dificuldades econômicas nacionais e
mundiais não encontram no Brasil forças políticas com capacidade de
organização e condução do processo, levando a uma desorganização do
poder e a uma crise de governabilidade.
Da combinação das incertezas nacionais e mundiais e suas diversas hipóteses
podem ser geradas cinco combinações consistentes, que constituem as bases
para os cenários nacionais para o horizonte 2001-2003:
Cenários Plausíveis
Brasil 2001/2003
Contexto
Internacional
2001-2002
Favorável
Favorável
(Céu
(Céu de
de Brigadeiro)
Brigadeiro)
Desafiante
Desafiante
(Algumas
(Algumas
Turbulências)
Turbulências)
Desfavorável
Desfavorável
(Tempestade)
(Tempestade)
Condições
Macroeconômicas
2001-2002
Crescimento
Crescimento
Alto
Alto
Inflação
Inflação Declinante
Declinante
Crescimento
Crescimento
Médio
Médio
Inflação
Inflação Estável
Estável
Crescimento
Crescimento
Baixo
Baixo
Inflação
Inflação Ascendente
Ascendente
Percepção social
da qualidade de
vida em 2001-2002
Positiva
Positiva
(melhorou)
(melhorou)
Difusa
Difusa
(não
(não melhorou)
melhorou)
Negativa
Negativa
(piorou)
(piorou)
Eleições 2002
(Bloco Hegemônico)
Cenários 2001/2003
Consolidação
Consolidação do
do
Bloco
Bloco Liberal
Liberal
FÊNIX
FÊNIX
(Continuidade)
(Continuidade)
Reconfiguração
Reconfiguração do
do
Bloco
Bloco Dominante
Dominante
(social-desenv.)
(social-desenv.)
TUIUIÚ
TUIUIÚ
(Ajuste)
(Ajuste)
Mudança
Mudança de
de Bloco
Bloco
(social-reformista)
(social-reformista)
ARRIBAÇÃ
ARRIBAÇÃ
(Mudança)
(Mudança)
CARAMUJO
CARAMUJO
(Resistência)
(Resistência)
Fragmentação
Fragmentação
Política
Política
VACA
VACA LOUCA
LOUCA
(Crise)
(Crise)
O esquema acima indica grandes arquétipos11 que combinam fatores internos
e externos para configurar os cinco cenários.
No entanto, a introdução de um componente temporal nos leva a apenas três
cenários em 2001 e 2002, dos quais se desdobrariam cinco cenários para
2003 como indica o diagrama abaixo:
11
Na verdade, cenários são antes de tudo arquétipos organizadores de alternativas e decisões.
16
Cenários nas duas Cenas
A
2001/2002
A
2003
Instabilidade
Instabilidade
econômica
econômica ee dificuldades
dificuldades
de
de governança
governança com
com
contexto
contexto desfavorável
desfavorável
Relativa
Relativa Instabilidade
Instabilidade
ee Dificuldades
Dificuldades Internas
Internas
com
com Contexto
Contexto Desafiante
Desafiante
B1
Continuidade
Continuidade
C
B
Estabilidade
Estabilidade ee
Governança
Governança combinada
combinada
com
com oo contexto
contexto
favorável
favorável
Ajuste
Ajuste de
de Rota
Rota
B2
Mudança
Mudança de
de Rota
Rota
C1
C2
Resistência
Resistência
As principais características de cada um destes cenários estão descritas a seguir.
17
Crise
Crise
4. Cenário A: O Vôo da Fênix
FÊNIX: ave fabulosa que,
segundo a tradição egípcia,
durava muitos séculos e,
queimada, revivia das próprias
cinzas. Este cenário representa o
prolongamento dos cenários ‘A
Fênix
Reformada’
que
descrevemos em fevereiro de
1999; e ‘A Decolagem da Fênix’,
de março de 2000.
O Brasil entra ‘com o pé direito’ no século 21, superando as expectativas mais
otimistas e, numa articulação de diversos fatores favoráveis, experimenta três anos
sucessivos de crescimento forte, inflação em declínio, continuidade política e
evidências de que o quadro de exclusão social começa a ser revertido.
Continuidade é a idéia-força deste cenário.
4.1.Cena 1: 2001-2002
Contexto internacional: ‘tempo bom’
O panorama internacional é favorável ao Brasil.
A economia mundial mantém uma taxa
elevada de crescimento, em torno de 4%, e
com relativa estabilidade. A economia norteamericana consegue realizar um ‘pouso
suave’; a Europa cresce mais depressa que
os EUA; e a recuperação do Japão
finalmente começa a acontecer.
O preço do petróleo estabiliza em
patamares médios (em torno US$ 22 o
barril), melhoram os termos de troca das
principais commodities que fazem parte da
18
•
•
•
•
•
•
•
Panorama externo favorável
Preço do petróleo em patamares
médios
Queda dos juros americanos
Melhoria dos termos de troca dos
produtos brasileiros de
exportação
Argentina é bem sucedida no
ajuste econômico
Brasil melhora desempenho nas
disputas comerciais
O risco Brasil continua em queda
pauta de exportações brasileiras e a taxa de juros americanos cai em comparação à
média de 2000.
Ao mesmo tempo, a Argentina controla os desequilíbrios que ameaçam o seu sistema
cambial e implementa com sucesso as medidas de ajuste econômico e retomada do
crescimento, conservando as relações comerciais no MERCOSUL. O processo de
aproximação com o Chile continua progredindo e o bloco assume uma postura mais
pró-ativa e empreendedora em relação à ALCA. E o Brasil, finalmente, começa a ter
melhores resultados em suas pendências na OMC e nas disputas comerciais externas
de um modo geral, particularmente em relação ao Canadá.
A sucessão de êxitos econômicos internos, especialmente a partir de 2000, melhora
substancialmente a posição e a imagem brasileira no cenário externo.
Consequentemente, os índices de risco de aplicação no Brasil seguem diminuindo, e
os investidores estrangeiros ampliam suas aplicações e investimentos diretos no país.
Panorama econômico12: crescimento forte com inflação em queda
No plano interno, a condução do ajuste econômico é competente e eficaz e, ao longo
de 2001 e 2002, a trajetória da maioria dos indicadores econômicos mostra uma
sucessão de boas notícias.
Mantida a política fiscal e preservada a tendência declinante da inflação, acelera-se a
queda das taxas de juros estimulando a retomada dos investimentos e a expansão do
consumo. No bojo de um quadro internacional favorável, com a consolidação de uma
imagem positiva do Brasil no exterior, ampliam-se os investimentos externos no País.
Ao mesmo tempo, a ‘rolagem’ das dívidas externa e interna é feita a custos
decrescentes, com melhora na situação da balança de pagamentos. Como resultado,
o Brasil vai equacionando os seus principais estrangulamentos econômicofinanceiros, principalmente a dívida interna e a vulnerabilidade externa.
A balança comercial finalmente apresenta superávits consistentes, embora modestos,
alcançando US$ 1,5 e 2,5 bilhões em 2001 e 2002, respectivamente. Os juros internos
declinam até chegar aos 13% e 11% em dezembro destes dois anos. E, neste mesmo
período, o câmbio (real/dólar) mantém-se relativamente estável, em torno de R$
2,08 e 2,13.
12
Este panorama é semelhante ao traçado por Joelmir Beting in ‘Economia 2001’, O Globo 02.01.01 e por Fábio Giambiagi, O
Globo, 15.02.01.
19
A inflação anual, por sua vez, não chega aos
4% ao final de 2001 e é inferior a 3% em 2002.
Austeridade fiscal e inflação em
declínio
Elevados investimentos externos e
internos
Rolagem das dívidas externa e
interna com custos decrescentes
Balança comercial superavitária
Crescimento do PIB supera os 5%
ao ano
Os investimentos alcançam cerca de 21% do PIB em 2001 e, 22% em 2002, com destaque
para
os
setores
de
infra-estrutura:
telecomunicações, energia, transportes e saneamento, e também para a expansão da capacidade instalada da indústria (bens semiduráveis e de consumo de massa) e do setor serviços (com ênfase em educação,
saúde, informática, serviços financeiros e turismo).
O país também acelera o passo rumo à ‘nova economia13’. Há uma substancial
ampliação do acesso às telecomunicações. O número de telefones fixos aumenta de
36 milhões em 2000 para quase 48 milhões em 2002; e o de telefones celulares passa
de 22 para 37 milhões. A quantidade de usuários da Internet cresce de 7 para quase
12 milhões (2002) e a base instalada de computadores salta de 9 para 14,4 milhões
de unidades no mesmo período. O comércio eletrônico (B2B, principalmente) e o
volume de transações financeiras bancárias exibem crescimento exponencial. O
mesmo ocorre na informatização da administração pública em todos os níveis,
melhorando a eficiência e sobretudo ampliando o acesso dos cidadãos ao Estado e a
seus serviços.
O efeito conjunto destes fatores favoráveis é uma trajetória de aceleração do
crescimento do PIB, que alcança ou mesmo supera os 5% em 2001 e 2002.
A situação social e a ação dos governos: sinais positivos
O quadro social do Brasil também apresenta
sinais positivos: com a intensificação do
crescimento econômico e os aumentos reais nos
salários mínimo e médio em 2001 e 2002, começa
a ser revertida a tendência de deterioração e
exclusão social, predominantes nos últimos anos.
Desemprego em queda
Pressões da mídia e da
sociedade por resultados
sociais
Intensificação e melhoria das
ações dos governos e dos
indicadores de educação e
saúde
Redução do número absoluto
de pobres e aumento da renda
familiar
Redução pouco expressiva da
violência urbana
A taxa média anual de desemprego aberto cai dos 7,1% em 2000 para um pouco mais de 6% ao final
do ano 2001 e 5% em 2002. Mais importante ainda: sai da linha de pobreza um grupo
significativo de pessoas. E a mobilidade social que
parecia cristalizada dá sinais de retomada, embora estes ainda sejam muito frágeis.
13
A idéia de ‘cenarizar’ a inserção do Brasil na nova economia nos foi dada pela Professora Emi Saft, da Unisinos.
20
Estes avanços, ainda modestos mas promissores, não são decorrência exclusiva do
crescimento econômico, mas também de uma melhoria significativa da qualidade da
governança e do desempenho operacional do Governo Federal e da maioria dos
Governos Estaduais e Municipais, a partir de 2001.
Para tanto, contribuem vários fatores: a fiscalização da mídia, a pressão da sociedade
por mais resultados, um ambiente político mais competitivo (todos procurando
‘mostrar serviço’ diante da proximidade das eleições de 2002), o aumento da
arrecadação e também a aprendizagem acumulada nos vários níveis de governo.
É assim que o ‘Projeto Alvorada’ sai do papel, os programas de renda mínima e bolsa
escola são intensificados, os serviços públicos de educação e saúde experimentam
novas expansões e melhorias. E até as ações no campo da segurança pública ganham
alguma eficácia. Ou seja: mais recursos e ações públicas de impacto social começam a
chegar mais efetivamente aos verdadeiros necessitados
Consequentemente, há uma redução do número absoluto de pobres (de 53 milhões
em 2000 para menos de 49 em 2002) e aumento na renda familiar per capita e no
consumo de bens duráveis.
Na área da saúde ocorrem melhorias substanciais como a queda da taxa de
mortalidade infantil (de 34,6 em 2000, para 30 por mil nascidos vivos, em 2002); a
expansão do número de domicílios atendidos com redes de abastecimento de água e
esgotos; e a ampliação da cobertura dos planos de saúde (de 24% da população em
2000 para 30% em 2002).
A educação é, dentre os campos de políticas sociais, o que apresenta os mais
consistentes avanços, como a consolidação da tendência de universalização do ensino
fundamental e um forte crescimento da taxa de escolarização do ensino médio, que
passa dos 33% em 2000 para 37% em 2002.
Já no que se refere à questão da violência urbana, o cenário não oferece melhorias
expressivas. As taxas de redução do crime geral14 só apresentam uma pequena
redução (dentro das metas previstas no PPA), passando de cerca de 1.400 em 1999,
para 1.350 em 2002, índices que não são suficientes para tranqüilizar a sociedade.
As mudanças ocorridas em 2001 e 2002, é claro, ainda representam muito pouco face
ao enorme déficit social do país. A violência, a insegurança e o desconforto nas
cidades mantém-se em níveis muito elevados; a forte concentração de renda não se
altera, a exclusão ainda é forte, e o passivo de problemas ambientais significativo.
14
Número total de crimes ocorridos/100.000 habitantes
21
Quadro político: tranqüilidade e continuidade
O quadro econômico positivo e a melhoria da situação social do País coincidem com
um cenário de relativa tranqüilidade política apesar da aproximação das eleições de
2002.
No nível federal, mesmo com alguns traumas e pequenas rachaduras na base política
de sustentação do governo federal, conseqüência das eleições para as mesas do
Senado e da Câmara dos Deputados, é mantida a aliança que tem como núcleo o
PSDB-PMDB-PFL. Uma reforma ministerial acomoda as forças em disputa e o instinto
de sobrevivência, com a união de forças, fala mais alto.
Na maioria dos Estados, coexistem dois esforços simultâneos, às vezes contraditórios:
a busca pelo enquadramento nos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal e, ao
mesmo tempo, a intensificação das obras e serviços públicos. Este último movimento
se acentua na medida em que se aproximam as eleições. E apesar das limitações
financeiras e orçamentárias, o saldo de realizações estaduais é bastante positivo.
Nas cidades e municípios, é ainda maior o esforço
para enquadramento na Lei de Responsabilidade
Fiscal. Boa parte dos novos prefeitos tem que
priorizar o saneamento financeiro e aprender a
operar com poucos recursos face a muitas
necessidades, do que resulta um quadro de
realizações pouco expressivo. E o Partido dos
Trabalhadores, agora à frente de grandes
Prefeituras, experimenta algumas dificuldades em
atender à enorme expectativa popular que
suscitou com suas vitórias eleitorais em 2000,
frustrando boa parcela do eleitorado.
Quadro político
relativamente tranquilo
Intensificação de obras e
serviços nos Estados
Prefeitos ‘da esquerda’
frustram boa parcela do
eleitorado
Ausência de escândalos e
problemas políticos de
maior vulto
População satisfeita e
otimista
Presidente com
popularidade alta
Ao contrário dos anos anteriores, o cenário político pré-sucessão é marcado por uma
surpreendente tranqüilidade: não há novos escândalos significativos e os
movimentos sociais, mesmo os liderados pelos ‘Sem Terra’, são geralmente
localizados, menos freqüentes e com pequena repercussão pública.
Neste cenário, a percepção da opinião pública em relação ao futuro e à qualidade de
vida é positiva e cresce sistematicamente. A
Não se mexe em time que está
expectativa da população de que a sua situação
ganhando. A aliança liberal
econômica individual está melhorando e vai
ganha, de novo, a presidência
e também a maioria dos
melhorar ultrapassa os 50% em dezembro de
governos estaduais.
2001, e os 60% em junho de 2002. Esta mesma
expectativa positiva se revela também quanto à
22
situação do País, evoluindo de 24% (dez 2000) para 32% (dez 2001) e em seguida para
40% (jun 2002).
A popularidade do Presidente Fernando Henrique, por sua vez, também apresenta
trajetória fortemente ascendente, repetindo a mesma performance do período
setembro de 1998 a outubro de 199915, de modo que ele chega em outubro de 2002
no mesmo patamar de popularidade que exibia quando foi reeleito. Ou seja, é o
grande eleitor.
As eleições de 2002: vitória das forças liberais
Neste contexto, o jogo dos atores políticos reproduz uma configuração muito
parecida com a de 1998: de um lado, o bloco hegemônico (PSDB, PMDB, PFL, PPB,
PTB) unido em torno de uma candidatura comprometida com a continuidade do
projeto vitorioso em 1994; e de outro lado as oposições fragmentadas em pelo
menos três candidaturas. Quadro semelhante se reproduz na maioria dos Estados da
Federação.
Com a economia em crescimento e a popularidade em alta, a candidatura de situação
é competitiva e explora com sucesso a idéia de que ‘não se mexe em time que está
ganhando’. As oposições, por sua vez, fragmentadas e com um discurso
essencialmente contestatório e/ou com proposições difusas, não conseguem se
apresentar como alternativa válida para a maioria do eleitorado.
Deste modo, o resultado das eleições aponta uma clara vitória do bloco hegemônico
liberal nas eleições presidenciais e na maioria dos governos estaduais, inclusive com a
recuperação em alguns Estados de grande importância nacional. O único ganho
relevante da esquerda é o aumento de sua representação na Câmara dos Deputados
e nas Assembléias Estaduais, sem, no entanto, por em risco a maioria governista.
15
Neste período, segundo o Data Folha a soma das avaliações bom + ótimo cresceu 10 pontos (de 13% para 23%). Mantido este
ritmo, FHC chegaria às vésperas das próximas eleições com uma aprovação (bom + ótimo) de 43%, semelhante à que tinha
quando foi reeleito.
23
4.2.Cena 2: 2003 – continuidade e otimismo
O ano de 2003 é uma reprodução do cenário dos dois anos anteriores.
O contexto internacional continua favorável ao país, e a postura dos investidores
externos e internos é de tranqüilidade, confiança e otimismo, o que justifica novas
reduções no chamado ‘risco Brasil’ e expressivo ingresso de capitais estrangeiros no
país.
No Governo Federal, apesar da troca de alguns
atores e operadores, a rota traçada continua a
mesma: manutenção da essência da política
econômica (na qual a estabilidade monetária e o
equilíbrio fiscal são os valores supremos), políticas
sociais amplas em educação e saúde e pontuais
(soft) nas demais áreas. A política externa é
bastante ativa tendo em vista a inserção do
MERCOSUL na ALCA.
2003 repete anos
anteriores
Cenário externo favorável
Governo Federal: ‘troca de
tripulação’ - não altera a
rota, nem a rotina
Investimento em alta,
inflação em queda
Crescimento do PIB chega
aos 6%
A balança comercial alcança um superávit de US$ 4 bilhões. Os juros internos
continuam caindo e chegam aos 9% dezembro. O câmbio (real/dólar) oscila entre R$
2,13 e 2,17. E a inflação anual cai para o patamar dos 2%.
Os investimentos alcançam 23% do PIB, com destaque para os setores de infraestrutura - telecomunicações, energia, transportes, saneamento, e a inserção do
Brasil na nova economia mantém o ritmo dos anos anteriores. Como conseqüência, o
PIB alcança uma taxa de crescimento de 6% no ano.
O quadro social do Brasil também segue trajetória positiva com aumentos reais nos
salários mínimo e médio; queda do desemprego formal (para cerca de 4,5% no ano –
o mesmo de 1995); melhoria em quase todos os indicadores sociais e maior
mobilidade social.
No entanto, apesar dos bons resultados econômicos e sociais colhidos nos últimos
anos, os déficits e injustiças sociais do país ainda são colossais e representam um
passivo cuja eliminação ainda irá requerer muito tempo, trabalho e até um pouco de
sorte para ser eliminado.
24
4.3.Conclusão: fênix voa em ‘céu de brigadeiro’
Em dezembro de 2003, tanto para a comunidade internacional como para a maior
parcela da sua população, o Brasil está ‘em pleno vôo de Fênix, em céu de
brigadeiro’: ressurgindo de uma grave crise em 1999 e, surpreendendo até os mais
otimistas segue uma trajetória bem sucedida de crescimento econômico forte,
inflação em declínio, continuidade e normalidade política e uma pequena mas
expressiva reversão do quadro de exclusão social.
Neste cenário, no começo do século XXI, o Brasil desponta não só como um país
viável e promissor, mas também como um dos favoritos para se tornar uma das mais
relevantes nações do mundo globalizado.
25
Cenário ‘FÊNIX’
Principais Indicadores - 2001-2003
Indicador
2000
2001
2002
2003
Agregados Macroeconômicos
Balança Comercial (US$ bi)
-0,69
1,50
2,50
4,00
Taxa de Investimento (% PIB)
20,0
21,00
22,00
23,00
Câmbio (R$/US$ 1,00)
1,96
2,08
2,13
2,17
15,75
13,00
11,00
9,00
Inflação anual (%)
5,97
3,80
2,70
2,00
Crescimento anual do PIB (%)
4,20
5,00
5,00
6,00
Juros (% - dez)
O Brasil na Nova Economia
Base Instalada de Computadores (milhões)
9,00
11,70
15,21
19,77
Usuários da Internet (milhões de pessoas)
7,00
9,10
11,83
15,38
36,00
41,40
47,61
54,75
No. de Telefones Fixos (milhões)
Indicadores Sociais
Desemprego formal (% - média anual)
7,10
6,10
5,00
4,50
Número absoluto de pobres (milhões)
53,00
50,88
48,84
46,89
Taxa de mortalidade infantil
34,60
32,00
30,00
27,00
Cobertura de planos de saúde (% população)
24,00
27,00
30,00
34,00
Taxa escolarização ensino médio (% pop)
33,00
35,00
37,00
40,00
Crimes por 100.000 habitantes
1.400
1.400
1.350
1.300
Indicadores Políticos
Avaliação Plano Real (% Bom+Ótimo) - Out
39
56
65
70
Popularidade Presidente (% Bom+Ótimo) - Out
23
33
43
50
Expectativa positiva situação individual (%)
44
54
64
74
Expectativa positiva situação do país (%)
24
32
40
50
Intenção votos candidatos oposição (%)
66
50
40
-
Elaboração: Macroplan Prospectiva & Estratégia. As quantificações acima apresentadas não são estimativas precisas, e sim
indicações ‘exemplificativas’ para ajudar a avaliar as tendências mapeadas qualitativamente no cenário
26
5. Cenário B1: Nas Asas do Tuiuiú
TUIUIÚ: ave de grande porte,
como o Brasil e símbolo do
Pantanal.
Tem
postura
majestosa e mais de 2 metros de
envergadura.
Apesar
da
‘decolagem’
um
tanto
desajeitada, é um excelente
voador, que pode passar horas
planando no céu. É inspirado em
um cenário de longo prazo que
fizemos para o Mato Grosso do
Sul (‘O vôo do Tuiuiú’) em 1999.
Simboliza uma mudança não
radical na trajetória atual do
País, na qual os desafios sociais
internos ganham relevância.
O Brasil começa ganhando no século 21, confirma expectativas positivas e, apesar
de algumas dificuldades externas e internas, experimenta três anos sucessivos de
crescimento econômico e inflação em declínio, com reconfiguração parcial do bloco
político hegemônico (para incorporar políticas sociais mais ativas) e algumas
evidências de que o quadro de exclusão social começa a ser revertido.
AJUSTE DE ROTA é a idéia-força deste cenário.
5.1.Cena 1: 2001-2002
Contexto internacional: ‘turbulências eventuais e localizadas’
O panorama internacional é desafiante para o Brasil.
A economia mundial mantém uma taxa razoável de crescimento, em torno de 3,5%, e
com relativa estabilidade. Mas a economia norte-americana tem dificuldades de
realizar um ‘pouso suave’ e a recuperação do Japão demora a acontecer, embora a
Europa continue sua trajetória de crescimento.
27
O preço do petróleo oscila em torno dos US$ 28/ barril16, e os termos de troca das
principais commodities que fazem parte da pauta de exportações brasileiras têm uma
pequena melhora. A taxa de juros americanos cai em comparação à média de 2000,
mas não o suficiente para evitar uma recessão neste país.
Ao mesmo tempo, a Argentina só consegue superar alguns dos desequilíbrios que
ameaçam o seu sistema cambial e implementa com
Panorama externo
sucesso parcial as medidas de ajuste econômico e
desafiante
Preço do petróleo em
retomada do crescimento.
As relações comerciais no âmbito MERCOSUL são
preservadas com dificuldades pontuais. O processo
de aproximação com o Chile progride a passos
lentos e o bloco assume uma postura mais próativa e empreendedora em relação à ALCA. No
entanto, o Brasil continua enfrentando dificuldades
com alguns revezes na OMC e em disputas
comerciais externas, inclusive com o Canadá.
patamar semelhante ao de
2000
Queda dos juros
americanos
Pequena melhoria dos
termos de troca dos
produtos brasileiros de
exportação
Argentina tem sucesso
parcial no ajuste
econômico
Brasil continua com
dificuldades nas disputas
comerciais externas
Os êxitos econômicos internos, especialmente a
partir de 2000, melhoram a posição e a imagem
brasileira no cenário externo. No entanto, com a ‘Risco Brasil’ diminui, mas
pouco
expectativa de eleições muito disputadas em 2002,
os índices de risco de aplicação no Brasil só diminuem moderadamente, e os
investidores estrangeiros relutam em ampliar suas aplicações e investimentos diretos
de longo prazo no país.
Panorama econômico: crescimento médio com estabilidade monetária
16
No plano interno, a condução do ajuste econômico
é competente e eficaz.
São preservadas a política fiscal e a tendência
declinante da inflação, mesmo com algumas
pressões nos preços sobretudo no 1º semestre de
2001.
Também é mantida a política de redução gradual
das taxas de juros em ‘sintonia fina’ com o cenário
externo, o que estimula novos investimentos e
mantém os níveis de consumo. E, mesmo com um
Preço médio semelhante ao do ano 2000.
28
Austeridade fiscal
Inflação com pequeno
declínio
Taxa de investimentos em
torno de 20% do PIB
Rolagem das dívidas
externa e interna com
custos ligeiramente
decrescentes
Balança comercial com
pequeno superávit em
2002
Crescimento do PIB entre
3,5% e 4% ao ano
quadro internacional parcialmente problemático, a consolidação da imagem positiva
do Brasil no exterior estimula a realização de montante expressivo de investimentos
externos no País embora em níveis inferiores aos do ano 2000. Neste cenário, a
rolagem das dívidas externa e interna é feita a custos ligeiramente decrescentes, com
pequena melhora na situação da balança de pagamentos. Deste modo, o Brasil
consegue ir convivendo com os seus principais estrangulamentos econômicofinanceiros, principalmente a dívida interna e a vulnerabilidade externa.
Mas, mesmo enfrentando turbulências localizadas, a trajetória da maioria dos
indicadores econômicos é positiva.
A balança comercial alcança o equilíbrio em 2001 e finalmente apresenta superávit,
embora modesto, de US$ 1,5 bilhão em 2002. Os juros internos declinam até chegar
aos 14% e 13% em dezembro destes dois anos. O câmbio (real/dólar) apresenta
pequenas elevações, oscilando na faixa dos R$ 2,10 a 2,20.
A inflação anual, por sua vez, mantém-se dentro das metas estabelecidas pelo Banco
Central: 4,5% ao final de 2001 e 3,5% em 2002.
Os investimentos mantêm-se em torno dos 20% do PIB, com destaque para os
setores de telecomunicações, energia, transportes e saneamento, e também para a
expansão da capacidade instalada da indústria (bens semi-duráveis e de consumo de
massa) e do setor serviços (com ênfase em educação, saúde, informática, serviços
financeiros e turismo).
O País também cresce no rumo da ‘nova economia’. Há uma expressiva ampliação do
acesso às telecomunicações (o número de telefones fixos aumenta de 36 milhões em
2000 para 43 milhões em 2002; e o de telefones celulares passa de 22 para 34
milhões); o número de usuários da Internet cresce de 7 para quase 11 milhões (2002);
a base instalada de computadores salta de 9 para pouco mais de 14 milhões de
unidades no mesmo período. O comércio eletrônico (B2B, principalmente) e o
volume de transações financeiras bancárias on line têm grande crescimento, o
mesmo ocorrendo com a informatização da administração pública em todos os níveis.
O efeito conjunto destes fatores em um contexto de algumas dificuldades externas e
internas, é uma trajetória de manutenção do crescimento do PIB, que alcança os 4%
ao final de 2001 e um nível um pouco menor, de 3,5% em 2002.
Situação social e a ação dos governos: modestos sinais positivos
O quadro social do Brasil também apresenta alguns sinais positivos, entre eles
pequenos aumentos reais nos salários mínimo e médio e uma modesta reversão da
tendência de deterioração e exclusão social, predominantes nos últimos anos.
29
A taxa média anual de desemprego aberto cai
lentamente dos 7,1%, em 2000, para 6,5% e 6% ao
final de 2001 e 2002. Cerca de 1 milhão de pessoas
começam a sair anualmente da linha de pobreza. E
a mobilidade social dá tímidos sinais de retomada.
Desemprego com pequena
queda
Pressões da mídia e da
sociedade por resultados
sociais
Melhoria das ações dos
governos e dos indicadores
de educação e saúde
Pequena redução do
número absoluto de pobres
Manutenção da violência
urbana
Estas modestas melhorias são conseqüência do
crescimento econômico e também
do desempenho operacional do Governo Federal, da
maioria dos Governos Estaduais e parte dos
Municipais. Aumentos na arrecadação, melhor
gestão dos recursos públicos, fiscalização da mídia,
pressão da sociedade por mais resultados e um ambiente político mais competitivo
são fatores que contribuem neste sentido.
No entanto, contingenciamentos impostos nas liberações de recursos, para preservar
o equilíbrio fiscal e o acirramento de disputas políticas, atrapalham a execução de
diversos programas sociais no âmbito do setor público.
Mesmo assim, o ‘Projeto Alvorada’ em parte sai do papel, programas de renda
mínima e bolsa escola são intensificados e os serviços públicos de educação e saúde
experimentam novas expansões e melhorias. O quadro de violência e criminalidade
pelo menos para de piorar.
Neste cenário, há uma redução do número absoluto de pobres (de 53 milhões em
2000 para 50 em 2002) com aumento na renda familiar per capita e no consumo de
bens duráveis.
Na área da saúde ocorrem algumas melhorias como a queda da taxa de mortalidade
infantil (de 34,6 em 2000 para 31 em 2002); a expansão do número de domicílios
atendidos com redes de abastecimento de água e esgotos; e a ampliação da
cobertura dos planos de saúde (de 24% da população em 2000 para 28% em 2002).
A educação tem avanços mais expressivos, como a consolidação da tendência de
universalização do ensino fundamental; e forte crescimento da taxa de escolarização
do ensino médio, que passa dos 33% em 2000 para 37% em 2002.
No entanto, em 2001 e 2002 este cenário não exibe melhorias no que se refere à
questão da violência. As taxas de redução do crime geral permanecem no mesmo
nível do ano de 1999, cerca de 1.400 por 100.000 habitantes, índice que não dá para
tranqüilizar a sociedade.
As melhorias ocorridas em 2001 e 2002, são pouco significativas diante do imenso
déficit social do país. A violência, a insegurança e o desconforto nas cidades mantémse em níveis muito elevados, a forte concentração de renda não se altera, a exclusão
ainda é forte, e o passivo de problemas ambientais significativo.
30
Quadro político: tensão crescente e competição acirrada
O quadro econômico positivo e a pequena melhoria da situação social do País não
coincidem com o panorama político que vai ficando cada vez mais tenso na medida
em que se aproximam as eleições de 2002.
No nível federal, os traumas decorrentes das eleições para as mesas do Senado e da
Câmara dos Deputados são profundos e duradouros e provocam grandes rachaduras
na base política de sustentação do governo. A aliança é parcialmente desfeita, com o
bloco remanescente passando por uma reconfiguração que reforça as correntes que
dão prioridade ao crescimento econômico com redução das desigualdades sociais
inclusive como estratégia de sobrevivência e competição nas eleições que se
avizinham. Esta fragmentação parcial das forças
integrantes da aliança em nível federal se reproduz
Quadro político tenso e
ou amplia na maioria dos Estados17.
muito competitivo
Nestes, coexistem dois esforços simultâneos, muitas
vezes contraditórios: a busca pelo enquadramento
nos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal e, ao
mesmo tempo, a intensificação das obras e serviços
públicos. Este último movimento se acentua na
medida em que se aproximam as eleições. E apesar
das limitações financeiras e orçamentárias, o saldo
de realizações estaduais é bastante positivo.
Aliança governista
reconfigurada
Prefeitos ‘da esquerda’
frustram boa parcela do
eleitorado
Denúncias de escândalos e
recrudescimento dos
movimentos sociais
Independência operacional
do Banco Central
População satisfeita mas
com sentimento difuso
Presidente com
popularidade ascendente
mas não decisiva.
Nas cidades e municípios, é ainda maior o esforço para enquadramento na Lei de Responsabilidade
Fiscal. Boa parte dos novos prefeitos tem que
priorizar o saneamento financeiro e aprender a
operar com poucos recursos face a muitas necessidades, do que resulta um quadro
de realizações pouco expressivo. E o Partido dos Trabalhadores, agora à frente de
grandes prefeituras, experimenta algumas dificuldades em atender à enorme
expectativa popular que suscitou com suas vitórias eleitorais de 2000, frustrando boa
parcela do eleitorado.
O panorama político pré-sucessão vai ‘esquentando’ na medida em que as eleições
ficam mais próximas: surgem denúncias de novos escândalos envolvendo dinheiro
público, os movimentos sociais intensificam-se, principalmente nas áreas urbanas.
Tudo isto com razoável repercussão entre os eleitores.
17
Uma hipótese alternativa, também coerente com este cenário, é a manutenção da aliança governista mas com uma correlação
de forças em que os liberais são menos influentes.
31
Mas o evento mais polêmico e controverso é a aprovação, pelo Congresso Nacional,
de Lei Complementar que dá ‘independência operacional’ ao Banco Central a partir
de 2003. Ressaltada pelos governistas como um aperfeiçoamento institucional para
garantir a estabilidade monetária, e denunciada pelas oposições como casuísmo ou
‘golpe branco’ face à sua perspectiva de vitória nas eleições, esta independência é o
fato político mais importante de 2001 e, de certa forma, reduz os receios dos
investidores externos.
Neste cenário, a percepção da opinião pública em relação ao futuro e à qualidade de
vida é relativamente positiva, mas um tanto difusa. A expectativa da população de
que a sua situação econômica individual está melhorando ou vai melhorar cresce de
44% (dez 2000) para 50% (dez 2001) e 55% (jun 2002). Esta mesma expectativa
positiva quanto a situação do País evolui de 24% (dez 2000) para 30% (dez 2001) e em
seguida para 35% (jun2002).
A popularidade do Presidente Fernando Henrique, por sua vez, também apresenta
trajetória levemente ascendente, mas sem repetir a mesma performance do período
setembro de 1998 a outubro de 1999, de modo que, às vésperas das eleições, FHC
alcança os 36% de aprovação (bom + ótimo) - 7 pontos abaixo do índice que exibia
quando foi reeleito. Ou seja, é um grande eleitor mas que não chega a ser decisivo
isoladamente.
Eleições de 2002: vitória ‘apertada’ do bloco governista
Neste contexto, o jogo dos atores políticos apresenta uma configuração diferente da
prevalecente em 1998. Do lado da antiga aliança, duas candidaturas: uma mais liberal
(com discurso moralista e que prega a continuidade do projeto vitorioso em 1994), e
outra que enfatiza o ‘desenvolvimento social’. Do outro lado, estão as oposições
fragmentadas em pelo menos três candidaturas, com um discurso que enfatiza a
mudança do modelo econômico. Quadro semelhante se reproduz na maioria dos
Estados da Federação.
Com a economia em crescimento, um Presidente com razoável popularidade mas
diante de um quadro social adverso, a disputa eleitoral é muito equilibrada e a
decisão vai para o segundo turno nas eleições presidenciais e na maioria dos Estados.
A polarização, inevitável, ‘eletriza’ o ambiente político nacional, aumentando a curto
prazo o chamado ‘risco Brasil’, com reflexos na cotação do dólar (para cima) e nas
bolsas de valores e outros investimentos de risco de curto e médio prazos (para
baixo).
O resultado final aponta vitória do bloco governista mais identificado com o
desenvolvimento social, tanto nas eleições presidenciais como em governos
estaduais. Mas as oposições também exibem um crescimento expressivo na
32
conquista de Estados relevantes e no aumento de sua representação na Câmara dos
Deputados e nas Assembléias Estaduais. No Congresso, a maioria das forças
governistas também é ‘apertada’.
5.2. Cena 2: 2003 – o ajuste da rota
O ano de 2003 marca um ajuste na rota traçada nos
dois anos anteriores.
O contexto internacional é parcialmente favorável
ao País, e os investidores externos e internos,
aliviados com os resultados das eleições, recuperam
a tranqüilidade, confiança e otimismo, o que
justifica uma redução do chamado ‘risco Brasil’ e a
retomada do ingresso de expressivo volume de
capitais estrangeiros no país.
No Governo Federal, as políticas econômica e social
são mantidas no essencial mas com uma mudança
na dosagem: todos os investimentos e ações de
cunho social são intensificados dentro de
parâmetros um pouco mais flexíveis de disciplina
fiscal. A política externa é bastante ativa tendo em
vista a inserção do Brasil e do MERCOSUL na ALCA.
2003 melhor que os 2 anos
anteriores
Cenário externo
parcialmente favorável
com nova queda do ‘risco
Brasil’
Governo federal: ‘troca de
tripulação’, ajuste de rota
e na dosagem das políticas
Investimento em alta,
inflação em queda
Crescimento do PIB chega
aos 4,5%
Para ganhar de novo, o time
governista teve de ser ‘mexido’.
A aliança, agora menor, ganha
‘apertado’: a presidência, parte
dos governos estaduais e a
maioria no Congresso.
A balança comercial alcança um superávit de US$
2,5 bilhões. Os juros internos continuam caindo e chegam aos 11% em dezembro. O
câmbio (real/dólar) flutua em torno dos R$ 2,22. E a inflação anual chega ao patamar
dos 3%.
Os investimentos alcançam os 22% do PIB, com destaque para os setores de infraestrutura - telecomunicações, energia, transportes, saneamento e a inserção do Brasil
na nova economia acelera-se em relação aos anos anteriores. Como conseqüência, a
taxa de crescimento do PIB aumenta para 4,5% no ano.
O quadro social do Brasil também segue trajetória positiva com aumentos reais nos
salários mínimo e médio; queda do desemprego formal (para uma taxa média de 5%
no ano); melhoria em quase todos os indicadores sociais e maior mobilidade social.
Apesar dos resultados econômicos e sociais positivos, os déficits e as injustiças sociais
são imensas, representando um passivo cuja eliminação ainda irá requerer muito
tempo e trabalho.
33
5.3.Conclusão: agora quem voa é o Tuiuiú
Em dezembro de 2003, tanto para a comunidade internacional como para a maior
parcela da sua população, o Brasil está ‘no rumo certo, agora com a rota bem mais
ajustada’. Ressurgindo da grave crise de 1999, confirma as expectativas positivas e,
apesar de algumas dificuldades externas e internas, sinaliza um ciclo virtuoso de
crescimento econômico com baixa inflação e perspectivas mais concretas de
melhoria do quadro social face à nova configuração do bloco político hegemônico.
Neste cenário, no começo do século XXI, o Brasil desponta não só como um país
viável e promissor, mas também como uma nação decidida a aproveitar as
oportunidades externas e potencialidades internas e, desta vez, reduzir as imensas
desigualdades sociais que marcaram os primeiros 500 anos de sua história.
34
Cenário ‘Tuiuiú’
Principais Indicadores - 2001-2003
Indicador
2000
2001
2002
2003
Agregados Macroeconômicos
Balança Comercial (US$ bi)
-0,69
0,00
1,50
2,50
Taxa de Investimento (% PIB)
20,00
20,00
20,00
22,00
1,96
2,10
2,20
2,22
15,75
14,00
13,00
11,00
Inflação anual (%)
5,97
4,50
3,50
3,00
Crescimento anual do PIB (%)
4,20
4,00
3,50
4,50
Câmbio (R$/US$ 1,00)
Juros (% - dez)
O Brasil na Nova Economia
Base Instalada de Computadores (milhões)
9,00
11,30
14,10
17,6
Usuários da Internet (milhões de pessoas)
7,00
8,8
10,9
13,7
36,00
39,0
43,0
49,5
No. de Telefones Fixos (milhões)
Indicadores Sociais
Desemprego formal (% - média anual)
7,10
6,5
6,0
5,0
Número absoluto de pobres (milhões)
53,00
52,0
50,0
48,0
Taxa de mortalidade infantil
34,60
32,00
31,0
29,00
Cobertura de planos de saúde (% população)
24,00
26,0
28,0
30,0
Taxa escolarização ensino médio (% pop)
33,00
35,00
37,00
40,00
Crimes por 100.000 habitantes
1.400
1.400
1.400
1.350
Indicadores Políticos
Avaliação Plano Real (% Bom+Ótimo) - Out
39
42
47
59
Popularidade Presidente (% Bom+Ótimo) - Out
23
30
36
45
Expectativa positiva situação individual (%)
44
50
55
65
Expectativa positiva situação do país (%)
24
30
35
45
Intenção votos candidatos oposição (%)
66
56
48
-
Elaboração: Macroplan – Prospectiva & Estratégia. As quantificações acima apresentadas não são estimativas precisas, e sim
indicações ‘exemplificativas’ para ajudar a avaliar as tendências mapeadas qualitativamente no cenário
35
6. Cenário B2: Seguindo as Arribaçãs
ARRIBAÇÃ: também chama-da
‘ave de arribação’ é uma ave
migratória muito conhe-cida no
Nordeste do Brasil e que, todos
os anos e sempre em bandos,
voa para longe. É usada para
designar este cenário como um
símbolo
de
uma
grande
mudança de rumo, mas que é
feita de modo organizado e que
‘tem longo curso’. Representa,
também, o estágio inicial do
cenário
de
longo
prazo
‘Crescimento Endógeno’, que
desenhamos em 1998.
O Brasil começa mudando no início do século 21: um novo bloco político assume o
poder diante de dificuldades externas e internas, em um contexto de crescimento
econômico moderado e inflação estabilizada, e diante de um quadro de acentuada
exclusão e agudos problemas sociais.
MUDANÇA DE RUMO é a idéia-força deste cenário.
6.1. Cena 1: 2001-2002
18
Contexto internacional : ‘turbulências eventuais e localizadas’
O panorama internacional é desafiante para o Brasil.
A economia mundial mantém uma taxa razoável de crescimento, em torno de 3,5%, e
com relativa estabilidade. Mas a economia norte-americana tem dificuldades de
realizar um ‘pouso suave’; e a recuperação do Japão demora a acontecer, embora a
Europa continue sua trajetória de crescimento.
O preço do petróleo oscila em torno dos US$ 28 o barril, e os termos de troca das
principais commodities que fazem parte da pauta de exportações brasileiras têm uma
18
Este cenário também é plausível em um contexto internacional desfavorável, como o descrito no Cenário C1.
36
pequena melhoria. A taxa de juros americanos cai
em comparação à média de 2000, mas não o
suficiente para evitar uma recessão neste país.
Ao mesmo tempo, a Argentina só consegue superar
alguns dos desequilíbrios que ameaçam o seu
sistema cambial e implementa com sucesso parcial
as medidas de ajuste econômico e retomada do
crescimento.
As relações comerciais no âmbito MERCOSUL são
preservadas com dificuldades pontuais. O processo
de aproximação com o Chile progride a passos lentos
e o bloco assume uma postura mais pró-ativa e
empreendedora em relação à ALCA. No entanto, o
Brasil continua enfrentando dificuldades e revezes na
OMC e em disputas comerciais externas, inclusive
com os Estados Unidos e Canadá.
Panorama externo
desafiante
Preço do petróleo em
patamar semelhante ao de
2000
Queda dos juros
americanos
Pequena melhoria dos
termos de troca dos
produtos brasileiros de
exportação
Argentina tem sucesso
parcial no ajuste
econômico
Brasil continua com
dificuldades nas disputas
comerciais externas
‘Risco Brasil’ aumenta
moderadamente
Os êxitos econômicos internos, especialmente os do ano 2000, melhoram a posição e
a imagem brasileira no cenário externo. No entanto, com a expectativa de eleições
muito disputadas em 2002, os índices de risco de aplicação no Brasil sobem
moderadamente, e os investidores estrangeiros relutam em ampliar suas aplicações e
investimentos diretos de longo prazo no País.
Panorama econômico: crescimento declinante com instabilidades localizadas
No plano interno, a condução do ajuste econômico é competente e eficaz, mas com
custos políticos e sociais elevados.
A política fiscal é preservada e a inflação
estabilizada, mesmo com algumas pressões nos
preços, sobretudo no 1º semestre de 2001.
Austeridade fiscal e
inflação estável em 4,5%
ao ano
Pequena redução dos
investimentos externos e
internos
Rolagem das dívidas
externa e interna com
custos levemente
crescentes
Balança comercial
superavitária
Crescimento do PIB
arrefece para 4% em 2001
e 3% em 2002
As taxas de juros experimentam oscilações para
cima e para baixo, em ‘sintonia fina’ com o cenário
externo, impactando os investimentos e os níveis
de consumo. O quadro externo parcialmente
problemático e o interno com crescentes incertezas políticas provocam uma redução do fluxo de investimentos estrangeiros no País em relação aos
níveis do ano 2000. Neste cenário, a rolagem das
dívidas externa e interna é feita a custos ligeiramente crescentes, sobretudo em
2002. Mas, mesmo assim, o Brasil consegue ir convivendo com os seus principais
37
estrangulamentos econômico-financeiros, principalmente a dívida interna e a
vulnerabilidade externa.
Apesar das turbulências localizadas, a trajetória da maioria dos indicadores
econômicos é positiva.
A balança comercial alcança o equilíbrio em 2001 e finalmente apresenta superávit,
embora modesto, de US$ 1,5 bilhão em 2002. Os juros internos declinam em 2001,
mas sobem um pouco em 2002, chegando aos 13% e 14% em dezembro destes dois
anos. E o câmbio (real/dólar) apresenta tendência de elevação dentro da faixa dos R$
2,10 a 2,40 no período.
A inflação anual, por sua vez, mantém-se dentro das metas estabelecidas pelo Banco
Central, em 2001 (4,5%), mas fica neste mesmo patamar (4,5%) em 2002.
Os investimentos oscilam entre os 18% e 20% do PIB, com destaque para os setores
de telecomunicações, energia, transportes e saneamento, e para o setor serviços
(especialmente educação, saúde, informática, serviços financeiros e turismo).
O País também experimenta avanços no rumo da ‘nova economia’. Há uma
expressiva ampliação do acesso às telecomunicações (o número de telefones fixos
aumenta de 36 milhões em 2000 para 42 milhões em 2002; e o de telefones celulares
passa de 22 para 30 milhões); o número de usuários da Internet cresce de 7 para
quase 11 milhões (2002); a base instalada de computadores salta de 9 para 13
milhões de unidades no mesmo período. O comércio eletrônico (B2B, principalmente)
e o volume de transações financeiras bancárias on line têm grande crescimento, o
mesmo ocorrendo com a informatização da administração pública em todos os níveis.
O efeito conjunto destes fatores, em um contexto de algumas dificuldades externas e
internas que se acentuam ao longo do ano de 2001, é uma trajetória de crescimento
declinante do PIB, que alcança os 4% ao final de 2001 e um nível um pouco menor, de
3% em 2002.
Situação social e a ação dos governos: pequenos sinais de melhora
A trajetória positiva da maioria dos indicadores econômicos contribui para o
aumento da arrecadação. Esse aumento, aliado a um melhor direcionamento de
recursos, dá margem a maiores gastos públicos na área social. No entanto, pesam em
sentido contrário as restrições impostas nas liberações de verbas para preservar o
equilíbrio fiscal e o acirramento de disputas políticas, que atrapalham a execução de
diversos programas.
Ainda assim, o quadro social do Brasil apresenta alguns sinais positivos, entre eles
pequenos aumentos reais no salário mínimo e uma ligeira queda na taxa média de
desemprego - dos 7,1% em 2000 para 6,5% em 2001 - e em seguida estabiliza, mas
38
não há sinal de uma reversão estrutural da tendência de deterioração e exclusão
social.
O ‘Projeto Alvorada’ só sai do papel parcialmente. Alguns programas de renda
mínima e bolsa escola são intensificados, especialmente nos Estados e Municípios
governados por forças ‘de esquerda’ e os serviços
Desemprego com pequena
públicos de educação e saúde experimentam novas
queda
Melhoria
das ações dos
expansões e melhorias.
Neste cenário, há uma ligeira redução do número
absoluto de pobres (de 53 milhões em 2000 para
51 em 2002) e ocorre um pequeno aumento na
renda familiar per capita e no consumo de bens
duráveis.
governos e dos indicadores
de educação e saúde
Pequena redução do
número absoluto de pobres
A violência urbana para de
piorar
Na área da saúde, há melhorias como a queda da taxa de mortalidade infantil (de
34,6 em 2000 para 31 em 2002), a expansão do número de domicílios atendidos com
redes de abastecimento de água e esgotos, e pequena ampliação da cobertura dos
planos de saúde (de 24% da população em 2000 para 26% em 2002).
A educação tem avanços mais expressivos, como a consolidação da tendência de
universalização do ensino fundamental e o forte crescimento da taxa de escolarização
do ensino médio, que passa dos 33% em 2000 para 37% em 2002.
No entanto, em 2001 e 2002 este cenário não exibe melhorias no que se refere à
questão da violência. As taxas de redução do crime geral permanecem no mesmo
nível do ano de 1999, cerca de 1.400 por 100.000 habitantes. O quadro de violência
pelo menos deixa de piorar, mas os elevados índices de criminalidade não permitem
tranqüilidade.
As melhorias ocorridas em 2001 e 2002, ainda são pouco significativas diante do
imenso déficit social do país. A violência, a insegurança e o desconforto nas cidades
mantém-se em níveis muito elevados; a forte concentração de renda não se altera, a
exclusão ainda é forte, e o passivo de problemas ambientais significativo.
Quadro político: tensão crescente e competição acirrada
O quadro econômico predominantemente positivo, apesar das dificuldades externas,
e a pequena melhoria da situação social do país não coincidem com o panorama
político que vai ficando cada vez mais tenso na medida em que se aproximam as
eleições de 2002.
No nível federal, os traumas decorrentes das eleições para as mesas do Senado e da
Câmara dos Deputados têm conseqüências profundas e duradouras e abrem grandes
rachaduras na base política de sustentação do governo. A aliança é parcialmente
39
desfeita, com o bloco remanescente passando por uma reconfiguração que reforça as
correntes que dão prioridade ao crescimento econômico e à redução das
desigualdades sociais, inclusive como estratégia de sobrevivência e competição nas
eleições que se avizinham. Esta fragmentação parcial das forças integrantes da
aliança em nível federal se reproduz ou amplia na maioria dos Estados.
Nestes, coexistem dois esforços simultâneos, muitas vezes contraditórios: a busca
pelo enquadramento nos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal e, ao mesmo
tempo, a intensificação das obras e serviços públicos. Este último movimento se
acentua na medida em que se aproximam as
Quadro político tenso e
eleições. E apesar das limitações financeiras e
muito competitivo
orçamentárias, o saldo de realizações estaduais é Aliança governista é
reconfigurada
bastante positivo.
Prefeituras ‘da esquerda’
destacam-se em ações
sociais e moralidade
administrativa
Denúncias de escândalos e
recrudescimento dos
movimentos sociais
Independência operacional
do Banco Central
Insatisfação popular
aumenta em 2002
Presidente com
popularidade em pequena
queda
Nas cidades e municípios, é ainda maior o esforço
para enquadramento na Lei de Responsabilidade
Fiscal. Boa parte dos novos prefeitos tem que priorizar o saneamento financeiro e aprender a
operar com poucos recursos face a muitas necessidades, do que resulta um quadro de
realizações ainda pouco expressivo. Mas, entre as exceções, são os Municípios governados pela
esquerda que mostram resultados mais visíveis em
suas ações sociais e na austeridade administrativa,
inclusive nas grandes Prefeituras, correspondendo
em boa parte à enorme expectativa popular que suscitou com suas vitórias eleitorais
em 2000.
O panorama político pré-sucessão vai ‘esquentando’ na medida em que as eleições
ficam mais próximas: surgem denúncias de novos escândalos envolvendo dinheiro
público, os movimentos sociais intensificam-se, inclusive os liderados pelos ‘Sem
Terra’, que orquestram novas ondas de invasões. Tudo isto com razoável
repercussão.
Mas o evento mais polêmico e controverso é a aprovação, pelo Congresso Nacional,
de Lei Complementar que dá independência operacional ao Banco Central a partir de
2003. Ressaltada pelos governistas como um aperfeiçoamento institucional para
garantir a estabilidade monetária; e denunciada pelas oposições como casuísmo ou
‘golpe branco’ face à sua perspectiva de vitória nas eleições, esta independência é o
fato político mais importante de 2001 e que, de certa forma, reduz os receios dos
investidores externos.
Neste cenário, a percepção da opinião pública em relação ao futuro e à qualidade de
vida melhora em 2001, mas recua em 2002. Deste modo, a expectativa da população
de que a sua situação econômica individual está melhorando ou vai melhorar cresce
40
de 44% (dez 2000) para 50% (dez 2001), mas em seguida cai para 45% (jun 2002). As
expectativas positivas quanto a situação do País evoluem de 24% (dez 2000) para 32%
(dez 2001) e a seguir diminuem para 30% (jun 2002).
A popularidade do Presidente Fernando Henrique também apresenta trajetória
semelhante: chega a 30% em dezembro de 2000, mas cai para 27% às vésperas das
eleições, 16 pontos abaixo do índice que exibia quando foi reeleito. Ainda é um
eleitor forte, porém longe de ser decisivo.
Eleições de 2002: vitória da oposição
Neste contexto, o jogo dos atores políticos
apresenta uma configuração diferente da de 1998.
Do lado da antiga aliança, duas candidaturas: uma
mais liberal (com discurso moralista e que prega a
continuidade do projeto vitorioso em 1994), e
outra que promete priorizar o ‘desenvolvimento
social’. Do outro lado estão as oposições
fragmentadas em pelo menos três candidaturas,
sendo que ao menos uma delas com um discurso
alternativo priorizando não a revisão do modelo
econômico,
mas
o
binômio
moralidade
administrativa com responsabilidade social e fiscal,
nesta ordem.
Com a economia em crescimento, um Presidente
com razoável popularidade, mas diante de um
quadro social adverso, a disputa eleitoral é muito
equilibrada e a decisão vai para o segundo turno
nas eleições presidenciais e na maioria dos Estados.
A polarização, inevitável, ‘eletriza’ o ambiente
político nacional, aumentando o chamado ‘risco
Brasil’ com pressões significativas sobre o câmbio
(para cima) e o fluxo de investimentos externos
(para baixo).
Mesmo tendo sido ‘mexido’ o
time governista desta vez
perde. A oposição, ganha
‘apertado’ mas bem: a
presidência, parte dos governos
estaduais e a maioria no
Congresso. Conquista o
governo e uma base de
governabilidade.
2003: transição desafiante
Cenário externo
problemático com
aumento do ‘risco Brasil’ e
pequena fuga de capitais
Governo federal: quase
conservador na política
econômica, mas ‘jogando
pesado’ nas políticas
sociais e externa
Investimentos e inflação
praticamente estáveis
Crescimento do PIB chega
aos 3,5%
O resultado final aponta vitória da oposição nas eleições presidenciais e na maioria
dos governos estaduais e também um aumento significativo de sua representação na
Câmara dos Deputados e nas Assembléias Estaduais. Numa proporção que configura,
de fato, uma mudança de bloco hegemônico no poder.
41
6.2. Cena 2: 2003 – a mudança de rumo
O ano de 2003 é o marco da mudança do rumo seguido até então pelo Brasil.
O contexto internacional é desafiante para o País. Os investidores externos,
temerosos com os resultados das eleições, paralisam suas aplicações e, desde o final
de 2000 e meses iniciais de 2001, ocorre um aumento do chamado ‘risco Brasil’ com
uma pequena fuga de capitais estrangeiros do País. A desconfiança dos investidores
só não é maior por conta da independência do Banco Central e de anúncios
tranquilizadores dos novos governantes.
Na realidade, apesar de um discurso de mudança, o novo Governo Federal na prática
é extremamente cauteloso - quase conservador - na condução da política econômica
e prefere ‘jogar pesado’ na intensificação das políticas sociais, com ênfase em
programas emergenciais de combate à pobreza absoluta, à violência urbana e
geração de empregos, dentro de rígidos parâmetros de disciplina fiscal.
Já a política externa experimenta uma revisão mais profunda, ganhando conotação
mais nacionalista e incluindo uma reavaliação da inserção do Brasil no MERCOSUL e
na ALCA. Há, também, uma mudança no estilo diplomático: ao invés de só buscar
dirimir conflitos, o governo parte para aceitar confrontos sobretudo em disputas
comerciais no que tem amplo apoio popular.
A balança comercial alcança um superávit de US$ 2,5 bilhões. Os juros internos
permanecem estáveis nos 14%. O câmbio (real/dólar) flutua em torno dos R$ 2,3. E a
inflação anual não ultrapassa os 4,5%.
Neste cenário, em 2003 a taxa de investimento situa-se em torno dos 19% do PIB,
com destaque para os setores de saneamento e infra-estrutura urbana. A inserção do
Brasil na nova economia continua acelerando. E o PIB apresenta uma pequena
melhora em relação a 2002, alcançando uma taxa de crescimento de 3,5% no ano.
O quadro social do Brasil também segue trajetória positiva com aumentos reais nos
salários mínimo e médio; pequena queda do desemprego formal (para cerca de 6,3%
no ano); uma redução expressiva no número absoluto de pobres (de 52 para 49
milhões de brasileiros) e na taxa de mortalidade infantil.
É justamente aí que reside o principal desafio para o novo bloco político hegemônico:
enfrentar, decisivamente, os enormes déficits e injustiças sociais do país.
42
6.3.Conclusão: o Brasil está de mudança
Em dezembro de 2003, e após muita apreensão no 1º semestre, a comunidade
internacional começa a recuperar a confiança no Brasil. O país parece estar fazendo
uma firme mudança de rumo com segurança no terreno social, mas também com
cautela e prudência na esfera econômica. Confiança que se traduz na renovação das
esperanças de milhões de brasileiros menos favorecidos, que agora acreditam ter vez
na repartição dos frutos de um ciclo virtuoso de crescimento econômico com baixa
inflação que pode estar por vir.
Neste cenário, no começo do século XXI, o Brasil desponta não só como um país
viável e promissor, mas também como uma nação decidida a mudar para, desta vez,
aproveitar as oportunidades externas e potencialidades internas e reduzir, no menor
tempo possível, as imensas desigualdades sociais que marcaram os primeiros 500
anos de sua história.
43
Cenário ‘Arribaçã’
Principais Indicadores - 2001-2003
Indicador
2000
2001
2002
2003
Agregados macroeconômicos
Balança Comercial (US$ bi)
-0,69
0,00
1,50
2,50
Taxa de Investimento (% PIB)
20,0
20,0
18,0
19,0
Câmbio (R$/US$ 1,00 – dez)
1,96
2,10
2,40
2,30
15,75
13,0
14,0
14,0
Inflação anual (%)
5,97
4,5
4,5
4,50
Crescimento anual do PIB (%)
4,20
4,00
3,0
3,5
Juros (% - dez)
O Brasil na Nova Economia
Base Instalada de Computadores (milhões)
9,00
11,30
13,0
15,6
Usuários da Internet (milhões de pessoas)
7,00
8,8
10,9
13,7
36,00
39,0
42,0
47,0
No. de Telefones Fixos (milhões)
Indicadores Sociais
Desemprego formal (% - média anual)
7,10
6,5
6,5
6,3
Número absoluto de pobres (milhões)
53,00
52,0
51,0
49,0
Taxa de mortalidade infantil
34,60
32,00
31,0
29,0
Cobertura de planos de saúde (% população)
24,00
26,0
26,0
26,0
Taxa escolarização ensino médio (% pop)
33,00
35,00
37,00
40,00
Crimes por 100.000 habitantes
1.400
1.400
1.400
1.350
Indicadores Políticos
Avaliação Plano Real (% Bom+Ótimo) - Out
39
42
40
50
Popularidade Presidente (% Bom+Ótimo) - Out
23
30
27
45
Expectativa positiva situação individual (%)
44
50
45
65
Expectativa positiva situação do país (%)
24
32
30
45
Intenção votos candidatos oposição (%)
66
56
52
-
Elaboração: Macroplan – Prospectiva & Estratégia. As quantificações acima apresentadas não são estimativas precisas, e sim
indicações ‘exemplificativas’ para ajudar a avaliar as tendências mapeadas qualitativamente no cenário
44
7. Cenário C1: Do jeito do Caramujo
CARAMUJO: molusco que tem a
concha forte e grossa e que,
quando exposto ao perigo, se
encolhe dentro dela. Designa,
também,
um
indivíduo
ensimesmado. Simboliza, nos
nossos cenários, uma resposta
interna nacionalista e defensiva
face à crise externa e à
instabilidade
econômica.
Constitui uma nova alternativa
política de caráter introspectivo.
Pode representar, também, o
estágio inicial do cenário de
longo
prazo
‘Crescimento
Endógeno’, que desenhamos em
1998.
O Brasil começa dando uma ‘guinada’ no início do século 21: um novo bloco político
social-reformista e nacionalista assume o poder diante de dificuldades externas e
internas, em um contexto de queda do crescimento econômico e moderado
aumento da inflação, e começa, com dificuldades e resistências, a implantar
políticas que priorizam a distribuição de renda, o combate à exclusão social e a
reafirmação do sentimento nacional.
RESISTÊNCIA é a idéia-força deste cenário.
7.1.Cena 1: 2001-2002
Contexto internacional19: ‘tempestade à vista’
O panorama internacional é desfavorável ao Brasil.
A economia mundial experimenta uma queda na sua taxa de crescimento, que fica
abaixo de 3,0%, e com sinais de crescente instabilidade. A economia norte-americana
não consegue realizar o chamado ‘pouso suave’, ingressando em um acidentado
19
Este cenário também é plausível em um contexto internacional menos desfavorável, como o descrito no cenário B2.
45
desaquecimento com intensas quedas da bolsa de valores, recessão e inflação. A
recuperação do Japão também não acontece e a Europa arrefece sua trajetória de
crescimento. Isto tudo sinaliza que uma forte recessão está a caminho. E há um
significativo aumento das incertezas em nível mundial.
O preço do petróleo recua um pouco, mas os
termos de troca das principais commodities que
fazem parte da pauta de exportações brasileiras
continuam se deteriorando. A taxa de juros
americanos cai bastante em comparação à média
de 2000, mas sem qualquer efeito positivo sobre o
custo da captação externa de recursos pelo Brasil.
Ao mesmo tempo, a ‘blindagem’ e o ajuste
econômico da Argentina fracassam, acentuando-se
não só os desequilíbrios que ameaçam o seu
sistema cambial, mas a recessão e as dificuldades
sociais internas, com graves reflexos sobre a
governabilidade do País. A fuga de capitais se
acelera e os riscos de uma moratória tornam-se
crescentes.
Panorama externo
desfavorável
Preço do petróleo recua um
pouco
Queda dos juros
americanos não tem efeito
no custo de captação do
Brasil
Deterioração dos termos
de troca dos produtos
brasileiros de exportação
‘Blindagem’ fracassa na
Argentina, gerando uma
crise de governabilidade
com ameaça de moratória
Imagem brasileira piora e o
‘risco Brasil’ dispara
Este conjunto de dificuldades põe em xeque as relações comerciais no âmbito
MERCOSUL e contagia o próprio Brasil. Deste modo, apesar dos êxitos econômicos
internos alcançados no ano 2000 e no 1o semestre de 2001, a imagem brasileira piora
no cenário externo20, especialmente com a expectativa de ampla vitória da esquerda
nas eleições de 2002. Deste modo, há uma expressiva queda na cotação brasileira
entre as organizações especializadas em análises de riscos, aumentando fortemente o
custo de captação externa para o país.
Os investimentos externos diretos para o Brasil começam a refluir.
Panorama econômico: dificuldades crescentes
No plano interno, a condução do ajuste econômico é feita com dificuldades
crescentes e custos políticos e sociais elevados.
A política fiscal é preservada ‘a ferro e fogo’ e a inflação mantém-se estabilizada em
um quadro que sinaliza recessão.
20
Os investidores estrangeiros enxergam brasileiros e argentinos como ‘farinha do mesmo saco’ segundo muitos analistas de
mercado.
46
As taxas de juros voltam a subir para fazer face ao cenário externo adverso que,
combinado com as crescentes perspectivas de mudança política, leva a uma
significativa diminuição do fluxo de investimentos estrangeiros no País em
comparação aos níveis do ano 2000. Neste cenário, a rolagem das dívidas externa e
interna é feita a custos crescentes, agravando os principais estrangulamentos
econômico-financeiros do Brasil, principalmente a dívida interna e a vulnerabilidade
externa.
Diante deste conjunto de turbulências, a trajetória da maioria dos indicadores
econômicos é sofrível ou negativa.
A balança comercial continua deficitária, em torno
de US$ 1 bilhão por ano. Os juros internos sobem
em 2001 e também em 2002, chegando aos 19% e
23% em dezembro destes dois anos. E o câmbio
(real/dólar) também apresenta elevações, oscilando
na faixa dos R$ 2,3 a 2,5 (2001 e 2002).
A inflação anual, por sua vez, mantém-se dentro das
metas estabelecidas pelo Banco Central, em boa
parte como conseqüência do ambiente recessivo
que vai se desenhando.
Política fiscal federal
mantida ‘a ferro e fogo’
Juros aumentam e os
investimentos externos
diminuem
Rolagem das dívidas a
custos crescentes
Balança comercial
deficitária e câmbio
pressionado
Crescimento do PIB cai
para 1,5% em 2002
Os investimentos caem para 17% do PIB em 2002, concentrando-se nos setores de
telecomunicações, energia e saneamento, e no setor serviços (especialmente
educação, saúde, informática, serviços financeiros e turismo).
O País perde um pouco de velocidade no rumo da ‘nova economia’. A ampliação do
acesso às telecomunicações é expressiva, mas em escala menor que a esperada (o
número de telefones fixos aumenta de 36 milhões em 2000 para 40 milhões em 2002
e o de telefones celulares passa de 22 para 28 milhões); o número de usuários da
Internet cresce de 7 para pouco mais de 9 milhões (2002); a base instalada de
computadores salta de 9 para 12,4 milhões de unidades no mesmo período. O
comércio eletrônico (B2B, principalmente) e o volume de transações financeiras
bancárias on line têm razoável crescimento, o mesmo ocorrendo com a
informatização da administração pública em todos os níveis.
O efeito conjunto destes fatores em um contexto de algumas dificuldades externas e
internas, que se acentuam substancialmente no 2º semestre de 2001, é uma
trajetória de crescimento declinante do PIB, que alcança os 3,5% ao final de 2001 e
cai para apenas 1,5% em 2002.
47
Situação social e ação dos governos: deterioração e pouca eficácia
O quadro social do Brasil continua negativo, sem nenhum sinal de reversão da
tendência de deterioração e exclusão social, exceto uma pequena melhoria nos
salários reais no ano 2001, que depois é diluída em 2002.
O desemprego formal volta aos níveis de 1998 e 1999 (média anual em torno dos
7,6%). E o número de pessoas abaixo da linha da pobreza absoluta volta a crescer em
2002, após uma pequena redução no ano anterior.
Neste cenário, as linhas política, econômica e social, embora não caminhem em
sentidos opostos, não conseguem se conciliar plenamente, guardando uma relativa
distância entre elas. E o mais grave é que as restrições impostas pelo cenário externo
e pela falta de um entendimento interno mais amplo, oferecem obstáculos à
implementação de políticas e programas sociais que causem impacto nas condições
de vida dos brasileiros, cada vez mais urbanos e, particularmente, metropolitanos.
Além disso, as restrições impostas nas liberações
de recursos, para preservar o equilíbrio fiscal, e o
acirramento de disputas políticas, atrapalham a
execução de diversos programas. Deste modo,
apesar da aprendizagem acumulada nos níveis
federal e estadual, só acontecem melhorias
localizadas no desempenho operacional dos
Governos Federal e da maioria dos Governos
Estaduais e Municipais.
Desemprego e pobreza
voltam a crescer
Baixa realização dos
programas sociais federais
e estaduais
Governo ‘de esquerda’ com
melhor desempenho social
e imagem de austeridade
administrativa
Agravam-se a
criminalidade e a violência
nas grandes cidades
O ‘Projeto Alvorada’ praticamente não sai do papel,
e somente alguns programas de renda mínima e bolsa escola são intensificados,
especialmente nos Estados e Municípios governados por forças ‘de esquerda’. Nestes,
os serviços públicos de educação e saúde experimentam pequenas expansões e
melhorias. Mas o quadro de violência e criminalidade continua a piorar.
Na área da saúde a taxa de mortalidade infantil estabiliza-se em torno dos 32 óbitos
por 1.000 nascidos, e há uma pequena expansão do número de domicílios atendidos
com redes de abastecimento de água e esgotos. Na seqüência, a cobertura dos
planos de saúde permanece estabilizada em torno de 26% da população.
A educação tem avanços expressivos, como a consolidação da tendência de
universalização do ensino fundamental e pequeno crescimento da taxa de
escolarização do ensino médio, que passa dos 33% em 2000 para 35% em 2002.
48
No entanto, em 2001 e 2002 neste cenário se agrava a questão da violência. As taxas
de criminalidade geral21 aumentam de 1400 (1999) para cerca de 1.500 em 2002,
índice que causa apreensão a toda a sociedade.
As pequenas melhorias ocorridas em 2001 e 2002 são pouco significativas diante das
novas dificuldades surgidas e do imenso déficit social do país. E isto alimenta uma
crescente insatisfação da população com o status quo.
Quadro político: fragmentação e revezes da base governista
O quadro econômico de crescentes dificuldades,
tanto externas como internas, e a gravidade da
situação social desenham um panorama político de
forte desgaste das forças governistas na medida em
que se aproximam as eleições de 2002.
No nível federal, os traumas decorrentes das eleições
para as mesas do Senado e da Câmara dos
Deputados e a acentuação da rejeição social às
políticas vigentes, levam a uma fragmentação
definitiva na base de sustentação do governo. A
aliança é desfeita, com a debandada e pulverização
das forças existentes. Esta fragmentação se reproduz
ou amplia na maioria dos Estados.
Pulverização da aliança
governista
Rejeição do projeto de
independência do Banco
Central
‘Abrandamento’ desfigura
a Lei de Responsabilidade
Fiscal
Ressurgimento do
pessimismo e forte rejeição
da sociedade ao Governo e
suas políticas centrais
Popularidade do
Presidente despenca e sua
influência no processo
sucessório é quase nula
Com isto, dois fortes revezes são impostos ao
Governo no Congresso Nacional: a rejeição do Projeto de Lei que dá independência
ao Banco Central (denunciada com sucesso pelas oposições como casuísmo ou ‘golpe
branco’ face à sua perspectiva de vitória nas eleições) e o ‘abrandamento’ da Lei de
Responsabilidade Fiscal com a redução para 10% do teto de comprometimento da
receita líquida de Estados e Municípios para pagamento à União e ampliação de
limites de gastos com pessoal.
Com o afrouxamento dos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal há uma
intensificação das obras e serviços públicos na medida em que se aproximam as
eleições. Deste modo, o saldo de realizações de Estados e Municípios é modesto, mas
positivo. Especialmente nos administrados por ‘partidos de esquerda’ são mais
visíveis os benefícios de suas ações sociais, inclusive nas grandes Prefeituras,
correspondendo parcialmente à enorme expectativa popular que suscitou com suas
vitórias eleitorais em 2000.
21
Número total de crimes ocorridos/100.000 habitantes.
49
O panorama político pré-sucessão vai ‘esquentando’ na medida em que as eleições
ficam mais próximas: surgem denúncias de novos escândalos envolvendo dinheiro
público, os movimentos sociais intensificam-se, principalmente nas grandes cidades.
Tudo isto com grande repercussão na população.
Neste cenário, a percepção da opinião pública em relação ao futuro e à qualidade de
vida é difusa ao final de 2001 e piora bastante em 2002. Deste modo, a expectativa
da população de que a sua situação econômica individual está melhorando ou vai
melhorar cai de 44% (dez 2000) para 38% (dez 2001) e 30% (jun 2002). E as
expectativas positivas quanto a situação do País evoluem negativamente de 24% (dez
2000) para 20% em junho de 2002. Ou seja, o pessimismo ressurgiu e com ele uma
forte rejeição ao Governo e suas políticas essenciais.
A popularidade do Presidente Fernando Henrique também apresenta trajetória
semelhante: mantém-se estável durante o ano 2001 (em torno dos 23%), mas cai
substancialmente no ano seguinte e chega às vésperas das eleições 30 pontos abaixo
do índice que exibia quando foi reeleito. Ou seja, como José Sarney em 1989, sem
nenhuma influência no quadro sucessório.
As Eleições de 2002 : ampla vitória da oposição
Neste contexto, o jogo dos atores políticos
A oposição capitaliza as
apresenta uma configuração completamente
insatisfações da sociedade e
vence ‘de ponta a ponta’ com
diferente da de 1998. Do lado da antiga aliança,
uma proposta nacionalista,
pelo menos três candidaturas: uma radicalmente
estatista e moralista para fazer
liberal (com discurso moralista e que prega a volta
face às dificuldades externas e
internas
às raízes do projeto vitorioso em 1994) e as outras
que prometem priorizar o ‘desenvolvimento social’.
Do outro lado estão as oposições reunidas em torno de duas candidaturas, e pelo
menos uma delas com um discurso alternativo que foca e prioriza tanto a revisão do
modelo econômico, como o retorno ao nacionalismo, associado à responsabilidade
social e a moralidade administrativa.
Com a economia diante de dificuldades, um Presidente desgastado, um quadro social
adverso, a disputa eleitoral favorece amplamente as oposições nas eleições
presidenciais e na maioria dos governos estaduais e também lhes dá maioria na
Câmara dos Deputados e em importantes Assembléias Estaduais. Numa proporção
que configura, de fato, uma mudança de bloco hegemônico no poder: as dificuldades
externas e o fracasso político interno, em 2001 e 2002, levam a novas alternativas
políticas.
A perspectiva, depois confirmada, de vitória da esquerda mais ‘ortodoxa’, aumenta
substancialmente o chamado ‘risco Brasil’ com pressões significativas sobre os custos
50
da rolagem da dívidas externa e interna, o câmbio (para cima) e o fluxo de
investimentos externos (para baixo).
7.2.Cena 2: 2003 – igual a um caramujo, o Brasil “se fecha” para resistir
2003 é o marco da mudança do rumo seguido pelo Brasil na década de 90 e nos dois
anos anteriores: a hegemonia liberal-modernizante é substituída por um projeto
dominante de orientação nacionalista e social reformista.
O contexto internacional continua desfavorável
ao País. Os investidores externos e internos,
assustados com os resultados das eleições,
retiram suas aplicações e, logo após as eleições,
há uma explosão no ‘risco Brasil’ com uma grande
fuga de capitais. Fuga que se intensifica com a
reiterada manifestação das forças vitoriosas de
‘rever soberanamente as condições de
pagamento das dívidas externa e interna’.
2003: transição difícil
Cenário externo
problemático com
aumento do ‘risco Brasil’ e
grande fuga de capitais
Governo federal cumpre
compromissos externos
mas alonga a dívida
interna e anuncia revisão
das privatizações
Revigoramento do estado
provedor e programas
emergenciais na área
social
Juros e câmbio em alta
Crescimento do PIB chega
aos 2,0%
Contando com forte apoio popular e uma
respeitável base de sustentação política, e
mantendo um forte discurso de mudança, o novo Governo Federal age cautelosamente no front
externo – garantindo o cumprimento de todos os
compromissos assumidos. No entanto, ‘joga pesado’ e alonga compulsoriamente a
dívida interna além de intensificar todas políticas sociais, com ênfase em programas
emergenciais de combate à pobreza absoluta, à violência urbana e geração de
empregos, dentro de parâmetros pouco rígidos de disciplina fiscal. Medidas
protecionistas são imediatamente adotadas ao lado de um revigoramento do Estado
provedor e investidor. E uma revisão das privatizações chega a ser anunciada.
A política externa, por sua vez, experimenta uma revisão profunda, ganhando
conotação mais nacionalista e terceiromundista e incluindo uma reavaliação da
inserção do Brasil no MERCOSUL e na ALCA.
A balança comercial alcança um superávit de US$ 2,0 bilhões. Mas os juros internos
têm que aumentar para permitir a rolagem da dívida, chegando aos 25% ao ano. O
câmbio passa a ser ‘administrado’, experimentando sucessivas desvalorizações até
chegar aos R$ 2,9/dólar em dezembro de 2003. A inflação anual supera os 10%.
Os investimentos situam-se em torno dos 18% do PIB, com destaque para os setores
de saneamento e infra-estrutura urbana. A inserção do Brasil na nova economia
51
perde um pouco a aceleração. E o PIB apresenta uma pequena melhora em relação a
2002, alcançando uma taxa de crescimento de 2% no ano.
O quadro social do Brasil começa a apresentar trajetória positiva com pequena queda
no desemprego formal (taxa média de 6% ao longo do ano); uma pequena redução
no número absoluto de pobres (de 54 para 53 milhões de brasileiros) e na taxa de
mortalidade infantil.
É este quadro adverso que representa o principal desafio para o novo bloco político
hegemônico: encontrar novas saídas para o crescimento econômico sustentável e
reduzir, decisivamente, os enormes déficits e injustiças sociais do País.
7.3.Conclusão: a esperança está dentro de casa
Em dezembro de 2003, e após muita apreensão ao longo do ano, a comunidade
internacional começa a recuperar a esperança de que o Brasil pode acertar no
terreno social e mais adiante retomar um crescimento saudável na esfera econômica.
Esperança que também está presente em milhões de brasileiros.
Neste cenário, no começo do século XXI, o Brasil desponta como um país onde a
maioria resolveu começar a resistir aos efeitos da globalização. E que aposta, ‘pra
valer’, no aproveitamento das suas potencialidades.
52
Cenário ‘Caramujo’
Principais Indicadores - 2001-2003
Indicador
2000
2001
2002
2003
Agregados Macroeconômicos
Balança Comercial (US$ bi)
-0,69
-1,00
-1,00
2,0
Taxa de Investimento (% PIB)
20,0
18,0
17,0
18,0
Câmbio (R$/US$ 1,00 – dez)
1,96
2,30
2,50
2,90
15,75
19,0
23,0
25,0
5,97
4,50
4,50
12,0
4,2
3,5
1,5
2,0
Juros (% - dez)
Inflação anual (%)
Crescimento anual do PIB (%)
O Brasil Na Nova Economia
Base Instalada de Computadores (milhões)
9,00
11,30
12,4
13,0
Usuários da Internet (milhões de pessoas)
7,00
8,8
9,2
10,2
No. de Telefones Fixos (milhões)
36,0
38,0
40,0
42,0
Indicadores Sociais
Desemprego formal (% - média anual)
7,10
7,6
7,6
6,0
Número absoluto de pobres (milhões)
53,00
52,0
54,0
53,0
Taxa de mortalidade infantil
34,6
32,0
32,0
31,0
Cobertura de planos de saúde (% população)
24,0
26,0
26,0
26,0
Taxa escolarização ensino médio (% pop)
33,0
35,0
35,0
35,0
1.400
1.450
1.500
1.400
Crimes por 100.000 habitantes
Indicadores Políticos
Avaliação Plano Real (% Bom+Ótimo) - Out
39
36
25
30
Popularidade Presidente (% Bom+Ótimo) - Out
23
23
13
45
Expectativa positiva situação individual (%)
44
38
30
50
Expectativa positiva situação do país (%)
24
24
20
40
Intenção votos candidatos oposição (%)
66
66
66
-
Elaboração: Macroplan – Prospectiva & Estratégia. As quantificações acima apresentadas não são estimativas precisas, e sim
indicações ‘exemplificativas’ para ajudar a avaliar as tendências mapeadas qualitativamente no cenário
53
8. Cenário C2:
A Síndrome da Vaca Louca
VACA LOUCA: nome popular da
encefalopatia
espongifor-me
bovina, doença mortal tanto
para animais como para
humanos, que teve incidência
em larga escala nos rebanhos
ingleses no final da década de
80. E que, após diversos anos,
quando se supunha que
estivesse definitivamente erradicada, ressurgiu como uma
epidemia no continente europeu. E que, mais recente-mente,
foi usada pelo Canadá com fins
de
retaliação
na
guerra
comercial que trava contra o
Brasil. Simboliza, neste caso, um
cenário no qual
emerge
repentinamente uma grave crise
no
País,
quando
todos
imaginavam que ‘estava tudo
muito bem’.
O Brasil mais uma vez surpreende, desta vez para pior: face a um contexto externo
desfavorável, combinado com um quadro político interno complicado, inicia o
século 21 com uma séria crise econômica, social e de governabilidade, com inflação
e desemprego em franca elevação.
CRISE é a idéia-força deste cenário.
54
8.1. Cena 1: 2001-2002
Contexto Internacional: ‘tempestade à vista’
O panorama internacional é desfavorável ao Brasil.
A economia mundial experimenta uma queda na
sua taxa de crescimento, que fica abaixo de 3% e
apresenta sinais de crescente instabilidade. A
economia norte-americana não consegue realizar o
chamado ‘pouso suave’, ingressando em um
acidentado desaquecimento, com intensas quedas
da bolsa de valores. A recuperação do Japão
também não acontece e a Europa arrefece sua
trajetória de crescimento. Isto tudo sinaliza que
uma forte recessão está a caminho. E há um
significativo aumento das incertezas em nível
mundial.
Panorama externo
desfavorável
Preço do petróleo recua um
pouco
Queda dos juros
americanos não tem efeito
no custo de captação do
Brasil
Deterioração dos termos
de troca dos produtos
brasileiros de exportação
‘Blindagem’ fracassa na
Argentina, gerando uma
crise de governabilidade,
com a ameaça de
moratória
Imagem brasileira piora, o
‘risco Brasil’ dispara e os
investimentos externos
refluem
O preço do petróleo recua um pouco, mas os termos de troca das principais commodities que
fazem parte da pauta de exportações brasileiras
continuam se deteriorando. A taxa de juros
americanos cai bastante em comparação à média de 2000, mas sem qualquer efeito
positivo sobre o custo da captação externa de recursos pelo Brasil.
Ao mesmo tempo, fracassa a ‘blindagem’ e o ajuste econômico da Argentina,
acentuando-se não só os desequilíbrios que ameaçam o seu sistema cambial mas
também aumentando a recessão e as dificuldades sociais internas, com graves
reflexos sobre a governabilidade do País. A fuga de capitais se acelera e os riscos de
uma moratória tornam-se crescentes. Além disto, as crises políticas e sociais se
alastram, saindo dos países marginais como o Equador e a Colômbia para os países
médios e centrais do continente.
Este conjunto de dificuldades não só põe em xeque as relações comerciais no âmbito
do MERCOSUL como também contagia o próprio Brasil. Deste modo, apesar dos
êxitos econômicos internos obtidos no ano 2000 e no início de 2001, a imagem
55
brasileira deteriora-se rapidamente no cenário externo22, para o que contribui,
também, um quadro político complicado com perspectiva de vitória da esquerda nas
eleições de 2002. Deste modo, há uma expressiva queda na cotação brasileira entre
as organizações especializadas em análises de riscos, aumentando fortemente o custo
de captação externa para o País.
Os investimentos externos diretos para o Brasil refluem numa intensidade crescente.
Panorama econômico: instabilidade forte com o Real em risco
No plano interno, a condução do ajuste econômico sofre ataques e revezes de
grandes proporções que começam a comprometer a estabilidade monetária. O
equilíbrio fiscal é feito com dificuldades crescentes, com custos políticos e sociais
elevados.
A política fiscal, sob fortes restrições, começa a
perder eficácia e margens de manobra, e a inflação
volta a crescer em um quadro que sinaliza
recessão.
Política fiscal sob ataque
perde margens de
manobra e a inflação volta
a subir
Juros aumentam muito e
os investimentos
despencam
Rolagem das dívidas a
custos crescentes
Balança comercial
deficitária, câmbio
pressionado
Recessão à vista:
crescimento do PIB cai para
1% em 2002.
As taxas de juros são elevadas para fazer face ao
cenário externo adverso que, combinado com as crescentes complicações e instabilidades políticas,
leva a uma significativa diminuição do fluxo de investimentos estrangeiros no País. Neste cenário,
a rolagem das dívidas externa e interna é feita a custos crescentes. E assim agravam-se os principais
estrangulamentos econômico-financeiros do Brasil,
principalmente a dívida interna e a vulnerabilidade externa.
Diante deste conjunto de turbulências, a trajetória da maioria dos indicadores
econômicos é sofrível ou negativa.
A balança comercial continua deficitária, em torno de US$ 1 bilhão por ano. Os juros
internos sobem em 2001 e também em 2002, chegando aos 20% e 25% em dezembro
destes dois anos. E o câmbio (real/dólar) também apresenta fortes elevações,
oscilando na faixa dos R$ 2,30 a R$ 3,00, fruto de especulação e de movimentos de
hegde.
22
Os investidores estrangeiros enxergam brasileiros e argentinos como ‘farinha do mesmo saco’ segundo muitos analistas de
mercado.
56
A inflação anual, por sua vez, escapa das metas estabelecidas pelo Banco Central, em
boa parte como conseqüência de reajustes preventivos de preços, e chega perto dos
10% ao final de 2002.
Os investimentos caem para 18% em 2001 e em seguida
com destaque para os setores de telecomunicações e de serviços (especialmente educação, saúde,
informática, serviços financeiros e turismo).
para 16% do PIB em 2002,
Desemprego e pobreza
voltam a crescer
jogo político complica de
vez
Baixa realização dos
programas sociais federais,
estaduais e municipais.
Inclusive nos governos de
esquerda
Agravam-se a
criminalidade e a violência
nas grandes cidades
Neste cenário, o País perde velocidade no rumo da ‘nova economia’. A ampliação do acesso às
telecomunicações é expressiva, mas em escala
menor que a esperada (o número de telefones fixos
aumenta de 36 milhões em 2000 para 40 milhões em 2002; e o de telefones celulares passa de 22
para 28 milhões); o número de usuários da Internet
cresce de 7 para quase 9 milhões (2002); a base
instalada de computadores salta de 9 para 11,4 milhões de unidades no mesmo
período. O comércio eletrônico (B2B, principalmente) e o volume de transações
financeiras bancárias on line têm razoável crescimento, mas o mesmo não ocorre
com a informatização da administração pública, que sofre atrasos consideráveis.
O efeito conjunto destes fatores em um contexto de algumas dificuldades externas e
internas, que se acentuam substancialmente no 2º semestre de 2001, é uma
trajetória de crescimento declinante do PIB, que alcança os 2,5% ao final deste ano e
cai para cerca de 1% em 2002.
Situação social e ação dos governos: deterioração e baixa governabilidade
O quadro social do Brasil continua negativo, sem nenhum sinal de reversão da
tendência de deterioração e exclusão social.
O desemprego formal volta aos níveis de 1998 e 99 (média anual de 7,6%) e em
seguida os supera, alcançando os 8%. E o número de pessoas abaixo da linha da
pobreza absoluta volta a crescer a partir de 2002.
Neste cenário, o jogo político é cada vez mais parecido com o de 1999: tenso,
complicado, sem rumos nítidos. E antecipa, cada vez mais, o processo de sucessão
presidencial.
Com a intensificação das dificuldades econômicas e sociais, a base governamental se
esgarça de vez, deixando o Planalto sem força junto ao Congresso Nacional que, com
a aproximação das eleições, prefere escutar ‘as vozes das ruas’. A linha da
popularidade presidencial torna-se novamente declinante. Os conflitos sociais de rua
57
colocam em questão a credibilidade presidencial. No Congresso Nacional um discurso
anti-reforma e nacionalista começa a se esboçar, inclusive no interior dos partidos da
base governamental, além do aumento das críticas às privatizações, que por sua vez
se congelam, e mesmo recuam.
As perturbações e complicações políticas, a concentração total dos governantes na
administração da crise, a inércia burocrática das administrações públicas e a escassez
de recursos existentes, paralisam os principais programas dos governos,
especialmente do federal. Em decorrência, o PPA – lançado em 1999 com grande
alarde – dá sinais de esgotamento.
Neste cenário não há políticas e ações sociais que causem impacto nas condições de
vida dos brasileiros, cada vez mais urbanos e particularmente, metropolitanos. Além
disso, restrições impostas nas liberações de recursos, para tentar preservar o
equilíbrio fiscal, e o acirramento de disputas políticas atrapalham a execução de
muitos programas. Deste modo, apesar da aprendizagem acumulada nos níveis
federal e estadual, só acontecem melhorias localizadas no desempenho operacional
dos Governos Federal e da maioria dos Governos Estaduais e Municipais.
O ‘Projeto Alvorada’ não sai do papel, e somente alguns programas assistencialistas
são intensificados. Os serviços públicos de educação e saúde experimentam
pequenas expansões e melhorias. Mas o quadro de violência e criminalidade continua
a piorar.
Na área da saúde, a taxa de mortalidade infantil estabiliza-se em torno dos 32 óbitos
por 1.000 nascidos, em 2001 e 2002. Há uma pequena expansão do número de
domicílios atendidos com redes de abastecimento de água e esgotos; mas a
cobertura dos planos de saúde expande em 2001 para 26% e, em seguida, recua para
cerca de 24% da população no fim de 2002, ou seja, as mesmas taxas de 2000.
Apesar do quadro de crise, a educação mantém avanços expressivos, como a
consolidação da tendência de universalização do ensino fundamental; e pequeno
crescimento da taxa de escolarização do ensino médio, que passa dos 33% em 2000
para 35% em 2002.
No entanto, neste cenário se agrava a questão da violência. As taxas de criminalidade
geral aumentam de 1400 (1999) para cerca de 1.540 crimes ocorridos por 100 mil
habitantes em 2002, índice que causa apreensão a toda a sociedade.
As dificuldades econômicas surgidas e o imenso déficit social do País alimentam uma
crescente insatisfação da população com o status quo.
58
Quadro político: fragmentação e desgaste generalizados
O quadro econômico de crescentes dificuldades, tanto externas como internas, e a
gravidade da situação social desenham um panorama político de forte desgaste das
forças governistas na medida em que se aproximam as eleições de 2002.
No nível federal, os traumas decorrentes das eleições para as mesas do Senado e da
Câmara dos Deputados e a acentuação da rejeição social às políticas vigentes, levam
a uma fragmentação definitiva na base de sustentação do governo. A aliança é
desfeita, com a debandada e pulverização das forças existentes. Uma parcela da base
governista assume um discurso oposicionista. E a fragmentação se reproduz ou
amplia na maioria dos Estados. Mas também contamina os partidos de oposição, que
não conseguem se entender quanto a alternativas viáveis para saída da crise.
Neste cenário, dois fortes revezes são impostos ao Governo no Congresso Nacional: a
rejeição do projeto de lei que dá independência ao Banco Central (denunciada com
sucesso pelas oposições como casuísmo ou ‘golpe branco’ face à sua perspectiva de
vitória nas eleições) e um forte ‘abrandamento’ que
Pulverização da aliança
desfigura
completamente
a
Lei
de
governista e das forças de
Responsabilidade Fiscal, incluindo uma redução,
esquerda
para 5%, do teto de comprometimento da receita Rejeição do projeto de
independência do Banco
líquida de Estados e Municípios para pagamento à
Central
União e ampliação de limites de gastos com ‘Abrandamento’ desfigura
totalmente a Lei de
pessoal.
Responsabilidade Fiscal
Com a revogação, na prática, da Lei de Ressurgimento do
pessimismo e forte rejeição
Responsabilidade Fiscal, há uma intensificação das
da sociedade ao Governo e
obras e serviços públicos na medida em que se
aos políticos em geral
aproximam as eleições. Mas com reflexos imediatos Popularidade do
Presidente despenca e sua
nas taxas de inflação que voltam a subir. De todo
influência no processo
modo, o saldo de realizações de Estados e
sucessório é negativa
Municípios é modesto e pouco visível face ao
cenário de crise. Nem mesmo os Estados e Municípios administrados por ‘partidos de
esquerda’ conseguem benefícios visíveis com suas ações sociais, principalmente nas
grandes Prefeituras, frustrando a enorme expectativa popular que suscitou com suas
vitórias eleitorais em 2000.
O panorama político pré-sucessão vai ‘esquentando’ na medida em que as eleições
ficam mais próximas: surgem denúncias de novos escândalos envolvendo dinheiro
público, inclusive em Estados e Municípios governados pela esquerda. Os
movimentos sociais intensificam-se, inclusive os liderados pelos ‘Sem Terra’, que
orquestram novas ondas de invasões. Tudo isto com grande repercussão. E
59
provocando uma grande confusão mental em toda a opinião pública que culpa a
todos os políticos pela crise que se instala.
Neste cenário, a percepção da opinião pública em relação ao futuro e à qualidade de
vida já é negativa ao final de 2001 mas piora bastante em 2002. Deste modo, a
expectativa da população de que a sua situação econômica individual está
melhorando e vai melhorar cai de 44% (dez 2000) para 34% (dez 2001) e 26% (jun
2002). E as expectativas positivas quanto a situação do país evoluem negativamente
de 24% (dez 2000) para 20% em junho de 2002. Ou seja, o pessimismo ressurgiu e
com ele uma forte rejeição ao Governo e suas políticas essenciais. Mas, também, uma
rejeição ou descrença em relação aos partidos de esquerda, vistos, por boa parte da
sociedade, como ‘farinha do mesmo saco’.
A popularidade do Presidente Fernando Henrique também apresenta trajetória
semelhante: mantém-se estável durante o ano 2001 (em torno dos 23%) mas cai
substancialmente no ano seguinte e chega às vésperas da eleições 30 pontos abaixo
do índice que exibia quando foi reeleito. Ou seja, como José Sarney em 1989, sem
nenhuma influência no quadro sucessório.
Eleições de 2002: dispersão de votos e um ‘salvador da pátria’
Neste contexto, o jogo dos atores políticos
A disputa eleitoral produz um
apresenta uma configuração completamente
quadro político completamente
diferente daquela verificada em 1998, mas parecida
fragmentado, desenhando um
cenário de baixa
com a verificada em 1989. Do lado da antiga
governabilidade.
aliança, pelo menos três candidaturas: uma
radicalmente liberal (com discurso moralista e que
prega a volta às raízes do projeto vitorioso em 1994); e as outras que prometem
priorizar o ‘desenvolvimento social’. Do outro lado estão as oposições, também
fragmentadas em pelo menos três candidaturas. Uma delas, com caráter messiânico
e voluntarista, empolga a maioria do eleitorado com um discurso ‘contra tudo o que
aí está’: a globalização, o modelo econômico neoliberal, a corrupção, as elites, a
ineficácia e também a hipocrisia da esquerda ortodoxa ... e assim por diante.
Com a economia diante de dificuldades, com a maioria dos governantes de todos os
partidos muito desgastados, em um quadro social adverso, a disputa eleitoral produz
um quadro político completamente fragmentado: o novo Presidente emerge sem
base partidária ou parlamentar sólida, Governos Estaduais são distribuídos entre os
partidos sem uma hegemonia clara, há grande pulverização das representações na
Câmara dos Deputados, Senado e em importantes Assembléias Estaduais. Numa
proporção que configura, de fato, a inexistência de bloco hegemônico no poder: ou
seja, estão dadas as condições objetivas para um cenário de baixa governabilidade.
60
Esta perspectiva aumenta rápida e substancialmente o ‘risco Brasil’ com pressões
imediatas sobre os custos da rolagem da dívidas externa e interna, o câmbio (para
cima) e o fluxo de investimentos externos (para baixo).
8.2. Cena 2: 2003 – a crise continua
2003 é o marco de uma mudança para pior no rumo seguido pelo Brasil na década de
90: após 8 anos de vida com estabilidade monetária, o Plano Real é desfigurado e
começa a fracassar.
O contexto internacional continua desfavorável ao País. Os investidores externos e
internos, assustados com os resultados das eleições, retiram suas aplicações e, logo
após as eleições, há uma explosão no ‘risco Brasil’ com uma grande fuga de capitais.
Fuga que se intensifica com a reiterada manifestação das forças vitoriosas de ‘rever
soberanamente as condições de pagamento das dívidas externa e interna’.
Contando com forte apoio popular, mas sem uma
base de sustentação político-partidária, o novo
Governo decreta moratória das dívidas externa e
interna e lança programas emergenciais, de caráter
assistencialista, para combate à pobreza absoluta, à
violência urbana e geração de empregos, dentro de
parâmetros pouco rígidos de disciplina fiscal.
Medidas protecionistas são imediatamente
adotadas e em seguida revogadas face à pressão
internacional.
2003: a crise se agrava
Moratória das dívidas
externa e interna e grande
fuga de capitais
Programas emergenciais,
de caráter assistencialista
Maxi desvalorização do
câmbio e nova política
cambial
Juros internos e inflação
disparam
Crescimento do PIB não
passa dos 0,5%
A política externa, por sua vez, experimenta uma
revisão profunda, ganhando conotação nacionalista e terceiromundista e incluindo
uma reavaliação da inserção do Brasil no MERCOSUL e negação da ALCA.
A balança comercial exibe um déficit de US$ 1 bilhão. Os juros internos têm que
aumentar chegando aos 30% ao ano, mesmo com o alongamento compulsório da
dívida. É decretada uma máxi-desvalorização do câmbio que, a partir de então, passa
a ser ‘administrado’, chegando aos R$ 4,00/dólar em dezembro de 2003. A inflação
anual retorna à casa dos dois dígitos e alcança os 24%, já com sinais de reindexação.
Os investimentos, muito baixos, situam-se em torno dos 15% do PIB. A inserção do
Brasil na nova economia perde a aceleração. E o PIB apresenta uma nova queda em
relação a 2002, alcançando uma taxa de crescimento de apenas 0,5% no ano.
61
O quadro social do Brasil mantém a trajetória negativa com o desemprego formal
chegando aos 8,5%; e um aumento expressivo no número absoluto de pobres (de 56
para 59 milhões de brasileiros).
É este quadro amplamente adverso que o Brasil apresenta no início do século 21: sem
rumo claro, e aparentemente sem capacidade política para encontrar novas saídas
para o crescimento econômico sustentável e reduzir, decisivamente, os enormes
déficits e injustiças sociais presentes no País.
8.3. Conclusão: o país perde o rumo como uma ‘vaca louca’
Em dezembro do ano 2003, o sentimento dominante é de atordoamento, decepção e
forte incerteza em relação do futuro. E não é para menos: depois de um começo de
século que parecia altamente promissor, o Brasil volta a entrar em crise, desta vez
porque não consegue manter, a tempo, um entendimento político para enfrentar um
cenário externo adverso.
Neste cenário, pouco depois de completar 500 anos desde o seu descobrimento, o
Brasil parece lembrar uma das caravelas da expedição de Cabral que não chegou ao
seu destino, naufragando no meio do caminho. Ou o ressurgimento, como uma
epidemia, da ‘síndrome da vaca louca’, que parecia definitivamente debelada.
62
Cenário ‘Vaca Louca’
Principais Indicadores - 2001-2003
Indicador
2000
2001
2002
2003
Agregados Macroeconômicos
Balança Comercial (US$ bi)
-0,69
-1,00
-1,00
-1,0
Taxa de Investimento (% PIB)
20,0
18,0
16,0
15,0
Câmbio (R$/US$ 1,00 – dez)
1,96
2,30
3,00
4,00
15,75
20,0
25,0
30,0
5,97
6,0
9,0
24,0
4,2
2,5
1,0
0,5
Juros (% - dez)
Inflação anual (%)
Crescimento anual do PIB (%)
O Brasil na Nova Economia
Base Instalada de Computadores (milhões)
9,00
10,8
11,4
12,0
Usuários da Internet (milhões de pessoas)
7,00
8,4
8,8
9,3
No. de Telefones Fixos (milhões)
36,0
38,0
40,0
41,0
Indicadores Sociais
Desemprego formal (% - média anual)
7,1
7,6
8,0
8,5
Número absoluto de pobres (milhões)
53,00
53,0
56,0
59,0
Taxa de mortalidade infantil
34,6
32,0
32,0
31,0
Cobertura de planos de saúde (% população)
24,0
26,0
24,0
22,0
Taxa escolarização ensino médio (% pop)
33,0
35,0
35,0
35,0
1.400
1.470
1.540
1.600
Crimes por 100.000 habitantes
Indicadores Políticos
Avaliação Plano Real (% Bom+Ótimo) - Out
39
30
20
15
Popularidade Presidente (% Bom+Ótimo) - Out
23
23
13
35
Expectativa positiva situação individual (%)
44
34
26
35
Expectativa positiva situação do país (%)
24
20
20
30
Intenção votos candidatos oposição (%)
66
66
55
-
Elaboração: Macroplan – Prospectiva & Estratégia. As quantificações acima apresentadas não são estimativas precisas, e sim
indicações ‘exemplificativas’ para ajudar a avaliar as tendências mapeadas qualitativamente no cenário
63
9. Análise Comparativa e Plausibilidade dos Cenários
Uma vez descritos os cinco cenários, a questão prática que se coloca é a seguinte:
qual a probabilidade de cada um? E qual o cenário mais provável?
Neste campo, só temos uma certeza – trazida da literatura e de cerca de 20 anos de
trabalho com cenários: na ‘vida real’ nenhum dos cinco cenários irá acontecer
exatamente como descrito. Por isso, eles devem ser interpretados e utilizados, nas
reflexões e decisões estratégicas, muito mais como uma sinalização que antecipa
tendências do que como a configuração de uma situação definitiva e já consolidada.
O Cenário Fênix, descreve um círculo virtuoso onde ‘tudo dá certo’, inclusive com o
início de um processo de inclusão social. Lembra os primeiros anos do Plano Real
quando um contexto externo e condições internas favoráveis ‘injetaram’ otimismo e
confiança na população e fizeram alguns milhões de brasileiros sair da linha da
pobreza absoluta. Mas este cenário está apoiado em três hipóteses cuja
probabilidade de coexistência simultânea não parece ser
muito alta: a
predominância de condições externas favoráveis por três anos consecutivos; um
ambiente político ‘morno’23 e uma clara preferência da sociedade pela continuidade
pura e simples do quadro político e econômico dos últimos anos. O que nos parece
mais provável é que os próprios êxitos da estabilização e retomada do crescimento
estimulem demandas da sociedade por políticas sociais muito mais ativas.
Esta é justamente a idéia-força do Cenário Tuiuiú: nele, há uma inflexão de
trajetória, em 2001 e 2002, para contemplar um rearranjo de forças que torna
hegemônicos os atores que incorporam políticas sociais e desenvolvimentistas ativas
no projeto nacional. Ou seja, o sucesso agora exige a ampliação das políticas,
iniciando-se uma ‘nova era’ do Real24. Este é um cenário que nos parece mais
provável que o anterior, inclusive porque pressupõe a existência de algumas
turbulências externas (como aconteceu no ano 2000), as quais não chegam a
comprometer a trajetória de crescimento e nem a capitalização dos êxitos
econômicos e sociais pelas forças governistas. Mas isto tudo não se realizará
23
Como foi o da reeleição do Presidente Fernando Henrique.
24
Daí a troca da ‘Fênix’ (que significou a saída país das cinzas da hiperinflação), pelo Tuiuiú, uma belíssima ave brasileira e com
grande capacidade de vôo.
64
‘naturalmente’. Pelo contrário: se o Tuiuiú vier a decolar será depois de muitas
disputas e da superação de dificuldades econômicas e políticas significativas.
O Cenário Arribaçã tem a mesma ‘raiz’ e, por isso, probabilidade semelhante ao
anterior. Só que sua lógica é diferente: o insucesso social contrasta com a
estabilidade econômica e isto exige mudanças políticas profundas. Neste cenário, a
oposição galvaniza a insatisfação popular e alcança o poder. Ele também supõe
turbulências externas que não chegam a comprometer o crescimento em 2001 e
2002, o qual, no entanto, não é capitalizado eleitoralmente pelas forças governistas,
pois as demandas sociais prioritárias são outras: ética administrativa, eficácia social e
responsabilidade fiscal. Neste cenário vence a esquerda ‘mais moderada’, também
depois de muita disputa. Mas, à semelhança do cenário anterior, com boas condições
de governabilidade.
O cenário Caramujo, por sua vez, simula o Brasil diante de um contexto externo
desfavorável: desaceleração substancial e acidentada da economia americana, fortes
complicações econômicas na Argentina e deterioração dos preços de nossos produtos
de exportação. Desenha, portanto, uma resposta social típica de defesa introspectiva:
nacionalismo, protecionismo e mesmo um certo populismo, implementadas por
forças políticas da esquerda mais ‘ortodoxa’ que neste cenário impõe uma ampla
derrota às forças liberais e adjacentes25. O ponto crítico deste cenário é o seguinte: o
novo bloco hegemônico conseguiria fazer uma ‘guinada’ desta amplitude em tão
pouco tempo e diante de tamanhas restrições externas? Conseguiria manter apoio
popular e condições de governabilidade para liderar uma transição deste vulto? Suas
chances, portanto, não parecem ser muito grandes. Mas não podemos esquecer que
o Brasil ainda é uma economia muito fechada e que tem massa crítica para escolher
um caminho menos dependente do exterior.
Finalmente, temos o Cenário Vaca Louca, que configura uma situação inversa ao
Fênix: um círculo vicioso, no qual ‘tudo dá errado’. Nos dias de hoje (início do ano
2001) ele parece completamente improvável. Como pareceria a descrição de
qualquer crise cambial, com a intensidade da que atravessamos em 1999, em
qualquer cenário apresentado, por exemplo, em novembro de 1998. De fato, as
condições presentes felizmente reduzem – e muito – as chances deste cenário
acontecer. No entanto, estamos diante de tantas incertezas simultâneas - um mundo
volátil e interdependente; o País ainda muito vulnerável face ao exterior e uma
grande eleição a ser disputada logo adiante – que não podemos ignorar o que de pior
pode acontecer. Ainda bem que, apesar das insinuações do Canadá, a chance de
25
Numa proporção que lembra os resultados das eleições para o Senado em 1974, quando o então MBD venceu em quase todos
os estados do Brasil.
65
aparecer uma vaca louca em nosso País hoje em dia é quase nula. Esta é a
probabilidade deste cenário.
De todo modo, alguma aposta deve e pode ser feita.
Olhando o Brasil em fevereiro de 2001, a trajetória real que hoje nos parece mais
provável até o ano 2003 situa-se entre os cenários Tuiuiú e Arribaçã.
Nas avaliações que faremos sistematicamente ao longo do ano, será possível aferir
até que ponto esta hipótese está certa. Afinal, como já dissemos, o futuro é a morada
da incerteza. O que aqui fizemos foi apenas tentar reduzi-la a um pequeno número
de alternativas e assim melhor mapear os riscos ou, pelo menos, tornar as decisões e
ações estratégicas mais conscientes destes riscos. Porque o mundo não para e as
escolhas têm que ser feitas. Afinal, como nos ensina Alvin Tofler, “ou você tem uma
estratégia própria, ou então é parte da estratégia de alguém”.
66
Anexo 1
Números do Brasil 1994-2000
Indicadores
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
Agregados Macroeconômicos
Balança Comercial
10,47
-3,47
-5,6
-6,75
-6,61
-1,26
-0,69
15,3
16,6
16,5
18
17,4
18,6
20
Inflação
1.240,92
25,9
11,3
7,2
1,6
9,1
5,97
Juros
24,4
33,1
16,6
16,4
26,5
19
15,75
Câmbio
0,85
0,97
1,04
1,12
1,21
1,79
1,96
Crescimento do PIB (%)
5,85
4,22
2,66
3,27
0,22
0,79
4,2
(US$ bilhões)
Taxa de Investimento
(% PIB)
Brasil na Nova Economia
Base instalada de Computadores
2,2
2,8
4
5,2
6,6
8
9
Usuários da Internet
(milhões de pessoas)
0,1
0,25
0,6
1,10
2,2
4,2
7
No. de Telefones
13,3
14,6
16,5
18,8
22,1
27,8
35
(milhões)
(acessos fixos - milhões)
Situação Social
Desemprego Formal
5,1
4,6
5,4
5,7
7,6
7,6
7,1
53,93
50,22
50,13
51,47
50,30
53,1
n.d.
22,7
23,5
24,4
27,6
30,8
32,6
33
n.d
n.d
n.d.
1.755
1.500
1.500
1.400
40
40
17
20
(média anual)
Pobreza - Pessoas Abaixo da Linha de
(milhões)
Taxa Escolarização
(ensino médio, % pop.)
Crimes por 100.000 habitantes
Desempenho Político
Popularidade Presidente (% Bom +
Ótimo, IBOPE)
65
43
48
Fontes: ANATEL BACEN, IBGE, IBOPE, IPEA, MCT e Revista Exame.
n.d: não disponível.
67
Anexo 2
Sobre a Macroplan e seus Cenários
A Macroplan® Prospectiva & Estratégia é uma empresa de consultoria especializada em
estudos prospectivos, administração estratégica e modernização organizacional, com sede no
Rio de Janeiro e Brasília.
Reúne uma experiência de cerca de 200 Estudos e Projetos e cerca de quase 10.000 horas de
treinamentos, workshops e seminários.
Suas principais linhas de produtos/serviços, desenvolvidos segundo metodologias próprias
testadas e aprovadas ‘em condições brasileiras’ são as seguintes:
Construção e análise de macrocenários e de cenários de ambientes de negócios
específicos.
Planejamento estratégico global e de negócios
Administração estratégica (por antecipação e em tempo real)
Design e implantação de mudanças organizacionais.
A Macroplan reúne uma equipe permanente e multidisciplinar de 15 consultores e tem, entre
seus clientes a PETROBRAS DISTRIBUIDORA, PETROS, INMETRO, ELETRONORTE, SENAI, SESI,
SENAC, IEL e diversas Universidades privadas.
Os cenários Macroplan para o Brasil 2001-2003 foram elaborados por Claudio Porto, Elimar
Nascimento e Sergio C. Buarque, com a colaboração de Ana Arroio, Andréa Belfort, Enéas
Aguiar e Karla Régnier.
Comentários, críticas e sugestões, assim como solicitações de estudos adicionais poderão ser
encaminhados à Macroplan: Rua Visconde de Pirajá, 351, Sala 803 – Cep 22410 003 Ipanema – Rio de Janeiro - Fone: (xx) 21 287 3293 / E-mail: [email protected]
É autorizada a reprodução e veiculação deste documento, desde que citada a fonte.
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