Unidade 1 - Adolescência Sangramento Genital na Infância, Ectrópio de Uretra e Traumatismo CAPÍTULO 9 SAnGRAMEnTO GEnITAL nA InFÂnCIA, ECTRÓPIO DE URETRA E TRAUMATISMO Sangramento genital na infância é qualquer sangramento vulvo-vaginal que ocorra antes do surgimento dos eventos que caracterizam a puberdade isiológica, ou seja, telarca, pubarca, estirão do crescimento e menarca. Dividem-se em causas funcionais e orgânicas. Dentre as funcionais podemos citar o sangramento vaginal da recém-nascida, uso de hormônios tópicos para tratamento de aglutinação das ninfas e puberdade precoce. Como causas orgânicas destacamos as vulvovaginites, corpos estranhos, sarcoma botrióide e outros tumores, ectrópio de uretra e traumatismo vulvovaginal e perineal. ECTRópIO DE URETRA: Consiste na eversão parcial ou total da mucosa pelo meato uretral externo. Sua etiologia é desconhecida, mas aparentemente decorre do hipoestrogenismo isiológico desta faixa etária, que leva a uma fragilidade da adesão da mucosa uretral à lâmina basal. Ocorre mais frequentemente entre 05 e 08 anos, sendo mais comum na raça negra. DIAGNóSTICO E pROpEDÊUTICA O diagnóstico é feito através da história clínica de sangramento podendo haver queixa de disúria e dor que aumentam em casos de trauma e crise de tosse. Ao exame observamos uma massa anelar, avermelhada na região do meato uretral. O exame detalhado mostra o hímen abaixo da lesão e pode-se identiicar o canal uretral no centro da massa. O diagnóstico diferencial se faz com sarcoma botrióide e outros tumores, condiloma e carúncula uretral. 61 Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas Maternidade Escola Assis Chateaubriand TRATAMENTO O ectrópio apresenta boa resposta às medidas de higiene local e banhos de assento com sabonete anti-séptico e à aplicação de cremes a base de estrógenos, duas vezes ao dia por duas semanas. A melhora pode levar 4 semanas. Em casos de persistência após terapêutica clínica adequada, realiza-se tratamento cirúrgico, onde inicialmente coloca-se a sonda vesical com balão que é insulado. Faz-se leve tração para baixo e identiica-se o começo da uretra normal, pode ser feita a eletrocauterização da zona de ectopia ou resseção da massa até o meato externo da região evertida, seguida de sutura término-terminal com pontos separados de categute 00 simples ou Poliglecaprone (tipo monocril) 000. TRAUMATISMO Vários fatores podem determinar traumatismo genital nas meninas; entre os mais comuns podemos citar as quedas de bicicletas ou sobre objetos pontiagudos que podem levar a hematomas de diferentes proporções. Pode ser decorrente de coito forçado em casos de abusos sexuais e também conseqüentes a acidentes automobilísticos, onde podem estar comprometidas outras estruturas do aparelho genital. DIAGNóSTICO E pROpEDÊUTICA De um modo geral, em casos de traumatismo vulvovaginais e perineais é conveniente descartar o comprometimento vesical para o qual observamos micção espontânea tratando de detectar a presença de sangue. Também podemos proceder a injeção intravesical de soro; a impossibilidade de obter novamente líquido nos estará indicando a existência de uma lesão ou rompimento da bexiga através do qual se iltrará o elemento injetado. Realiza-se em seguida o toque retal que será de grande utilidade para comprovar a integridade do reto e para sugerir um provável comprometimento de vísceras abdominais, ao mesmo tempo em que por pressão vaginal eliminam-se coágulos e possibilita o exame vaginoscópico. TRAUMATISMO vULvAR A contusão da vulva usualmente não requer tratamento. O hematoma manifesta-se por uma massa arredondada, equimótica, tensa e sensível. Durante o exame a vulva deve estar limpa e seca. Em casos de pacientes de tenra idade e traumas severos pode ser preciso realizar o exame sob anestesia geral. Se o 62 Unidade 1 - Adolescência Sangramento Genital na Infância, Ectrópio de Uretra e Traumatismo hematoma é pequeno procedemos à compressão e aplicação de bolsa de gelo, repouso e antiinlamatório. Se o hematoma for grande ou que continua a aumentar de tamanho pode ser necessário incisá-lo para remover os coágulos a ligar os pontos sangrantes. Se a fonte de sangramento não é encontrada a cavidade explorada deve ser preenchida com rolo de gazes compressivas, que é retirado dentro de 24 horas e antibiótico proilático é aconselhado. Quando um grande hematoma obstrui a uretra faz-se mister inserir um cateter uretral usualmente por via suprapúbica. Um raios-X de pelve é importante para excluir fratura pélvica. TRAUMATISMO vAGINAL Usualmente é de pequena monta o sangramento proveniente de injúria himenal, entretanto quando o hímen é lacerado ou há evidência de que um objeto entrou na vagina ou penetrou o períneo, um exame detalhado deve ser realizado para excluir trauma da parte superior da vagina ou órgãos intrapélvicos; é importante o exame vaginal mesmo quando a criança não sente dor ou o sangramento é pequeno, pois embora a maioria das lesões não seja séria, algumas podem levar a perfuração peritoneal sem sintomas notáveis até várias horas depois do trauma. A maioria das lesões vaginais envolve as paredes laterais. Geralmente há pequeno sangramento e a criança não sente muita dor se somente a mucosa sofre dano. Se a laceração se estende além da abóbada vaginal, exploração da cavidade pélvica é necessário para excluir extensão para dentro do ligamento largo ou cavidade peritoneal. Muitas lacerações vaginais são limitadas a mucosas e submucosas e seus tecidos são aproximados com material de sutura delicada após completa hemostasia. Um hematoma proveniente de um pequeno vaso sangrante na parede vaginal pode ser interrompido espontaneamente. Vasos maiores podem dar origem a grandes e tensos hematomas que requerem esvaziamento e ligadura do vaso sangrante. Quando o vaso é lesado acima do assoalho pélvico, um hematoma retroperitoneal pode-se desenvolver. Nestes casos se hematoma é grande uma laparotomia exploradora torna-se necessária visando a remoção dos coágulos e ligadura do vaso sangrante. TRAUMATISMO DECORRENTE DE ABUSO SExUAL Muitas crianças vítimas de abuso sexual não apresentam sinais de injúrias físicas principalmente se elas comparecem para exame médico semanas ou meses depois da ocorrência do incidente. Lesões na vulva podem ser causadas por manipulação da vulva ou intróito, sem penetração vaginal, o por fricção do pênis na vulva da criança. Durante o 63 Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas Maternidade Escola Assis Chateaubriand exame pode-se notar edema, eritema e escoriações nos lábios e vestíbulo vaginal. Estas lesões são supericiais e limitadas à pele vulvar, resolvem-se dentro de alguns dias e não requerem tratamento especial. Higiene perineal meticulosa é importante na prevenção de infecções secundárias. Banhos de assentos devem ser usados para remover secreções e agentes infectantes. Em algumas pacientes com extensas lesões abrasivas na pele, antibiótico de amplo espectro deve ser utilizado como proilaxia de infecções. Grandes lesões vulvares requerem sutura com io absorvível, que é melhor realizada sob anestesia geral. Muitas injúrias vaginais ocorrem quando um objeto penetra a vagina através da abertura himenal, podendo resultar em pequenas ou grandes lacerações. Um exame detalhado é necessário para excluir lesão da parte superior da vagina. Faz-se necessário a imunização antitetânica na criança que não seja vacinada. Nas injúrias ano-retais por objetos penetrantes, as lesões variam desde lacerações mucosas até lesão grosseira do esfíncter anal. Faz-se necessário toque retal para melhor avaliação das lesões e tratamento adequado. Ocasionalmente as crianças vítimas de abuso podem adquirir uma doença sexualmente transmissível. Se há suspeita clínica pode-se logo iniciar terapia adequada. Em outros casos, o tratamento deve ser postergado até os resultados de testes sorológicos estarem disponíveis. Se existe infecção severa, um curso curto de estrogeniterapia é dado na forma de creme para promover a cicatrização da vulva e vagina. Quando irritação extensa ocorre, hidrocortisona pode ser administrada para aliviar o prurido. Um VDRL deve ser repetido para detectar soroconversão após seis semanas. Imprescindível o acompanhamento psicológico destas crianças vítimas de violência sexual durante e após o tratamento médico. 64