NeuroAtual Volume 2, número 3, 2006 NEUROLOGIA GERAL Dr. Osvaldo M. Takayanagui Idiopathic intracranial hypertension. Ball AK et al. Lancet Neurol, 5: 433, 2006. A hipertensão intracraniana idiopática ocorre mais comumente em mulheres obesas e pode levar a um grave comprometimento visual. Por definição, é uma síndrome caracterizada por hipertensão intracraniana, na ausência de lesões tumorais ou vasculares, sem hidrocefalia, cujo fator causal não pôde ser identificado. O termo hipertensão intracraniana benigna não é adequado pelo risco de grave comprometimento visual. Com o advento de técnicas de neuroimagem mais sofisticadas, as lesões intracranianas e doenças vasculares têm sido identificadas em condições previamente rotuladas como sendo hipertensão intracraniana idiopática. Da mesma forma, os critérios diagnósticos sofreram várias modificações e, atualmente, são os seguintes: 1- na presença de sintomas e/ou sinais, eles podem indicar apenas aqueles relacionados à hipertensão intracraniana difusa ou papiledema 2- a pressão intracraniana, quando medida em decúbito lateral, está elevada 3- a composição do LCR é normal 4- não há qualquer evidência de hidrocefalia, lesão com efeito de massa ou estrutural ou anormalidade vascular 5- ausência de evidência de qualquer causa de hipertensão intracraniana Na situação de hipertensão intracraniana ser resultante de uma determinada doença de base ou associada a drogas, o termo idiopático é incorreto. Se houver evidências convincentes da associação causal com drogas ou alguma doença, a denominação mais apropriada seria hipertensão intracraniana secundária. Epidemiologia A incidência anual nos EUA é em torno de 1 caso/100.000 habitantes, similar à da síndrome de Guillain Barre, tumores hipofisários e cefaléia em salva. Se restringirmos à população feminina, entre 20 a 44 anos, a incidência sobe para 15-19 casos/100.000 habitantes, aproximando-se da de doenças mais freqüentes como a esclerose múltipla e doença do neurônio motor. A hipertensão intracraniana idiopática é mais freqüente nas mulheres (numa proporção entre os gêneros de 4:1 a 15:1) e indivíduos obesos (a freqüência de obesidade varia de 71% a 94%). A média da idade do início dos sintomas é de 28 a 35 anos. É rara em jovens antes da puberdade e tem características distintas dos adultos, sem predomínio em meninas obesas. Nos adolescentes, no entanto, a taxa de obesos espelha a dos adultos. Condições associadas Vitamina A Têm sido relatados casos de hipertensão intracraniana em crianças tanto por deficiência como por excesso de vitamina A. Medicamentos Vários medicamentos têm sido implicados com hipertensão intracraniana, tais como danazol, tamoxifeno, hormônio de crescimento, tetraciclina, ácido nalidíxico, nitrofurantoina, indometacina, rofecoxib, litium e cimetidina. A pílula anticoncepcional tem sido historicamente associada com a moléstia, mas os estudos mais recentes não têm mostrado um aumento significativo da freqüência de hipertensão intracraniana idiopática quando comparada com a população em geral. É possível que os estudos iniciais tenham incluído casos não diagnosticados de trombose de seios venosos cerebrais. Doenças A hipertensão arterial sistêmica é constatada em 14% a 32% dos pacientes e um estudo mostrou que a pressão arterial era significantemente maior nos indivíduos com hipertensão intracraniana idiopática que nos controles. A síndrome do ovário policístico parece ocorrer numa freqüência maior na hipertensão intracraniana idiopática. Outras comorbidades descritas incluem diabete mellitus, doença tireoidiana, hipoparatireoidismo, AVC, enxaqueca, anemia ferropriva, colite ulcerativa, lupus eritematoso sistêmico, entre outras, embora não possa ser excluída a possibilidade de trombose de seios venosos cerebrais não diagnosticada ou, simplesmente, uma mera coincidência. Gravidez A gravidez tem sido tradicionalmente vinculada com um risco aumentado de hipertensão intracraniana idiopática. Recentemente, esta relação tem sido investigada mais criteriosamente e não tem se mostrado ser significante. Disfunção menstrual A queixa de disfunção menstrual é mais freqüente na hipertensão intracraniana idiopática. Entretanto, não há evidências de qualquer disfunção hormonal específica para explicar esse achado; por outro lado, a própria obesidade é sabidamente associada a irregularidade menstrual. Patogênese – Mecanismos de elevação da pressão intracraniana O LCR é produzido numa taxa de 500 mL nas 24 horas, sendo todo o volume renovado a cada 6-8 horas. A idéia inicial de que a hipertensão intracraniana idiopática fosse resultante da hiperprodução de LCR tem sido descartada pelos estudos não relevando qualquer diferença na taxa de produção do LCR entre os pacientes e seus controles. Adicionalmente, a única condição em que ocorre hipersecreção do LCR (papiloma de plexo coróide na infância) não acarreta quadro clínico similar ao de hipertensão intracraniana idiopática. A hipótese mais aceita é de que a hipertensão intracraniana idiopática seja conseqüente à redução da reabsorção do LCR, confirmada por evidências de retardo na circulação do LCR por cisternografia com isótopos radioativos. Características Clínicas A cefaléia é a queixa mais freqüente, ocorrendo em 68% a 98% dos casos, com características semelhantes à enxaqueca ou à cefaléia tensional ou, então, com indícios de hipertensão intracraniana, isto é, exacerbação com tosse, esforço ou manobra de Valsalva. A alteração visual é a segunda manifestação mais freqüente; 57% a 72% dos pacientes referem escurecimento transitório por segundos a minutos. Outros quadros menos comuns são diplopia, fotopsia ou sensação de flashes. A queixa de barulhos na cabeça é freqüente, muitas vezes de caráter pulsátil. Papiledema é quase sempre presente na hipertensão intracraniana idiopática e sua ausência coloca em dúvida o diagnóstico. A avaliação dos campos visuais por mera confrontação pode não ser suficientemente acurada e a realização da campimetria formal é mandatória para detecção de déficit de campo visual ou alargamento da mancha cega. O grau de comprometimento de campo não tem sido correlacionado com a gravidade do papiledema. Embora seja menos freqüente que o déficit de campo, pode também ocorrer redução da acuidade visual. Os critérios mais recentes do diagnóstico de hipertensão intracraniana idiopática exigem que o exame neurológico seja inteiramente normal, exceto pela presença de sinais de hipertensão intracraniana generalizada e de papiledema. Investigação A hipertensão intracraniana idiopática é um diagnóstico de exclusão. Embora inexistam sinais radiológicos patognomônicos, a sela túrcica vazia e a diminuição da dimensão ventricular podem ser presentes. A trombose de seio venoso cerebral deve ser descartada, pois pode ter a mesma manifestação clínica da hipertensão intracraniana idiopática e, para isso, é recomendável a avaliação da fase venosa da tomografia computadorizada ou da ressonância magnética. A medida da pressão do LCR é imprescindível nos casos suspeitos de hipertensão intracraniana idiopática e a punção lombar é procedimento seguro nos pacientes conscientes, sem sinais localizatórios e com exames de neuroimagem normais, mesmo na presença de papiledema. O critério diagnóstico exige que a composição do LCR seja inteiramente normal. A pressão deve ser medida em decúbito lateral, sendo anormais valores superiores a 25 cm de H20. O registro contínuo revela que na hipertensão intracraniana idiopática a pressão do LCR oscila durante o dia, podendo ocasionalmente cair para níveis normais. Portanto, teoricamente, uma mensuração isolada pode não revelar um valor elevado de pressão. Tratamento O objetivo do tratamento é evitar a perda visual. Uma revisão sistemática de Cochrane, de 2005, não identificou qualquer ensaio randomizado e controlado de tratamento. A prática atual consiste na combinação de medicamentos, recomendação de redução do peso, caso indicado, e intervenção cirúrgica nos casos mais graves. As punções repetidas do LCR tinham como base a redução da pressão intracraniana. Um estudo mostrou, no entanto, que embora a remoção de 15-25 ml de LCR tenha reduzido a pressão abaixo de 10 cm de H20, seu efeito era efêmero, perdurando por apenas 82 minutos, em média. Apesar disso, as punções repetidas poderiam desempenhar um papel no tratamento imediato de comprometimento agudo da visão até que se possa programar um esquema terapêutico adequado. Tratamento medicamentoso A acetazolamida, inibidor da anidrase carbônica, é o medicamento mais comumente utilizado no tratamento. Pacientes tomando acetazolamida referem com freqüência náusea, fadiga, distúrbios da gustação e parestesias. Outros diuréticos, tais como furosemida, podem sem prescritos se a acetazolamida não for bem tolerada. Os costicosteróides melhoram os sintomas e sinais de hipertensão intracraniana, mas os relatos são apenas de séries pequenas de casos. As reações adversas, especialmente o ganho de peso, limitam enormemente seu uso. Outros medicamentos podem ser necessários para combater a dor da hipertensão intracraniana idiopática, como analgésicos e drogas antimigranosas. Redução de peso Acredita-se que a redução de peso possa melhorar a evolução da hipertensão intracraniana idiopática em indivíduos com sobrepeso. Vários autores têm descrito resolução do papiledema com a redução de peso por modificação da dieta. A redução de peso por meio cirúrgico também é considerada útil para melhora da hipertensão intracraniana idiopática. Entretanto, as evidências são limitadas e são necessários estudos futuros para avaliação dos métodos, quantificação e a velocidade da perda de peso. Conduta cirúrgica Alguns pacientes requerem intervenção cirúrgica no controle dos sintomas e na prevenção do comprometimento visual. No passado, indicava-se a descompressão subtemporal, mas este procedimento foi substituído por intervenções menos agressivas. Atualmente, as duas principais cirurgias são derivação do LCR e fenestração da bainha do nervo óptico. Não há qualquer estudo prospectivo comparando os dois procedimentos e a decisão é freqüentemente baseada na disponibilidade local. A indicação do tratamento cirúrgico deve ser considerada se o paciente apresentar perda visual ou se houver deterioração da função visual. A intervenção cirúrgica está também indicada nos casos de insucesso do tratamento medicamentoso e na cefaléia refratária. Derivação do LCR Atualmente, o procedimento padrão na prática clínica é a interposição de derivação ventrículo-peritoneal ou lombo-peritoneal. Contudo, a taxa de obstrução necessitando de revisão de válvula é elevada, assim como de complicações (cefaléia por hiperfuncionamento, infecções, complicações cirúrgicas gerais). Apesar disso, a derivação realizada por um neurocirugião experiente é efetiva para todas as manifestações da hipertensão intracraniana idiopática. Fenestração da bainha do nervo óptico O nervo óptico é descomprimido através desse procedimento. O mecanismo de ação é incerto, mas deve estar relacionado à formação de uma fístula crônica evitando a transmissão da elevada pressão do LCR ao nervo óptico. Para um cirurgião oftalmológico experiente, é uma intervenção relativamente simples e, diferentemente da derivação, não envolve qualquer corpo estranho. As complicações são habitualmente benignas e transitórias, embora possam ocorrer problemas oculares graves e nem sempre a cirurgia é exitosa. A visão pode deteriorar muitos anos após e, mesmo com melhora inicial, pode ser necessária a realização da derivação do LCR para o tratamento de cefaléia refratária e da perda progressiva da visão. Acompanhamento evolutivo Não há um consenso sobre como monitorizar pacientes com hipertensão intracraniana idiopática ou sobre quais parâmetros clínicos são mais confiáveis para a identificação do risco da perda visual. A mensuração repetida da pressão do LCR é raramente indicada pela inconveniência aos pacientes e pela ampla variação pressórica. A prática atual inclui a avaliação dos sintomas e da acuidade visual, exame do disco óptico e campimetria instrumental. Esta última é o método mais preciso para a identificação da perda visual e tem mostrado maior sensibilidade estatística que os demais meios. Prognóstico Para a maioria dos casos, a denominação anterior como sendo uma condição benigna é perfeitamente cabível, sem comprometimento visual a longo prazo. Entretanto, para uma pequena, mas significante parcela de pacientes com hipertensão intracraniana idiopática, a evolução é mais agressiva. A amaurose ocorre em 8% a 10% em pelo menos um dos olhos e algum grau de comprometimento visual é observado em quase 50% dos pacientes. Não foi constatada qualquer correlação consistente entre a perda visual e faixa etária, sexo, peso corporal, uso de anticoncepcionais, tratamento com corticosteróides, pressão inaugural do LCR, duração e tipo dos sintomas e cronicidade do papiledema. Pode haver recorrência da hipertensão intracraniana idiopática meses ou anos após resolução do quadro inicial, inexistindo qualquer fator preditivo identificável. Essa possibilidade faz com que seja recomendável o acompanhamento cuidadoso dos pacientes mesmo daqueles assintomáticos. São necessários no futuro estudos randomizados, controlados e metodologicamente bem desenhados para determinação dos meios mais eficazes de tratamento e seguimento dos pacientes com hipertensão intracraniana idiopática. Seizure versus syncope. McKeon A et a. Lancet Neurol, 5: 171, 2006. Um dos problemas mais freqüentes e desafiadores na medicina é o atendimento de pacientes com perda súbita e transitória da consciência. Os possíveis diagnósticos são: crise e síncope. Esta última é definida como perda da consciência e do tonus postural por hipoperfusão cerebral com recuperação espontânea. No atendimento, os detalhes do episódio são escassos, pois o paciente pode ter amnésia e o acompanhante não ter testemunhado pessoalmente e o diagnóstico pode ser de difícil estabelecimento mesmo após investigação através de múltiplos exames complementares. Pode também haver fatores geradores de confusão diagnóstica nos episódios de síncope convulsiva, que é uma reação semelhante à crise, resultado da hipoperfusão cerebral global; isto ocorre em torno de 12% dos casos de síncope. Um estudo de monitoramento por vídeo mostrou que a mioclonia ocorre freqüentemente na síncope, assim como outros movimentos vistos classicamente na epilepsia, tais como automatismos e desvio cefálico. Os episódios de perda da consciência são muito freqüentes nas unidades de emergência; a síncope é responsável por 3% dos atendimentos e 6% das internações. A incidência da epilepsia é de 30/100.000 habitantes, atingindo a cifra de 62/100.000 habitantes nos indivíduos acima de 65 anos de idade. A síncope é mais freqüente na população idosa: 23% das pessoas acima de 70 anos têm esses episódios, num período de 10 anos, comparados com 15% nos jovens abaixo de 18 anos. Num estudo prospectivo com 650 pacientes com síncope, a taxa de letalidade foi de 9% dentro de um período de 18 meses. Embora a síncope tenha um bom prognóstico, os pacientes com doença cardiovascular subjacente apresentam uma taxa de mortalidade de até 30% em um ano. Muitos indivíduos têm recorrência de síncopes, sem identificação da causa. Nos estudos de desfecho diagnóstico, 25% a 42% dos pacientes com síncope ficaram, ao final, sem elucidação etiológica, com altos níveis de disfunção física, psicológica e social. Adicionalmente, a aderência às recomendações sobre condução de veículos entre os que apresentam síncope é muito baixa, cerca de 7%. A investigação de perdas súbitas e recorrentes da consciência é onerosa e é ineficaz, a menos que seja direcionada por uma boa história clínica e exame físico. Num estudo austríaco, o custo mediano da avaliação desses indivíduos foi de €7.756, com 38% deles sem um diagnóstico estabelecido. História clínica e exame físico A obtenção de uma boa história clínica com o paciente e com as testemunhas desempenha um papel primordial. Os detalhes são úteis na distinção entre crise e síncope e Sheldon et al. (J Am Coll Cardiol, 46: 142, 2002) propuseram um protocolo de pontuação, baseado apenas nos sintomas, com sensibilidade e especificidade para o diagnóstico de crises de 94%. Inclui informações como mordedura da língua, déjà vu ou jamais vu, stress emocional associada com a perda da consciência, desvio cefálico, ausência de resposta, postura estranha, movimentos dos membros, amnésia, confusão pós-ictal, tontura, sudorese antes do evento, associação com permanência prolongada de pé, etc. A informação de sensação epigástrica ascendente, distúrbio do olfato ou da gustação, sensação de déjà vu precedendo o episódio correspondem provavelmente a uma crise do lobo temporal. Palpitações ou dor pré-cordial apontam para uma doença cardíaca subjacente. A perda da consciência precedida por tonturas, sudorese profusa, náusea, distúrbios da visão ou da audição e sensação de desfalecimento, particularmente após permanência prolongada de pé, é provavelmente uma síncope neurocardiogênica. Se o episódio for precipitado por micção, defecação ou dor, o diagnóstico provável é de síncope situacional. A síncope causada por estenose aórtica ou cardiomiopatia obstrutiva hipertrófica pode estar relacionada ao exercício. Na síncope convulsiva, podem surgir sintomas do tipo náusea, tontura e sensação de desfalecimento, sudorese profusa e palidez, antes da perda postural, seguida por convulsão. O exame cardiovascular pode revelar uma anormalidade do ritmo cardíaco ou valvular e o registro da pressão ortostática uma hipotensão postural. O exame neurológico pode revelar uma anormalidade localizada, suspeita de um possível foco epileptogênico. É apresentada uma tabela, apontando as principais causas de síncope e de crises. A síncope neurocardiogênica é muito freqüente; num estudo com 641 pacientes com síncope, 43% tinham essa causa. Crises não-epilépticas psicogênicas e pseudo-síncopes psicogênicas Os distúrbios psicológicos podem se manifestar como uma crise ou episódio sincopal. Esta origem é constatada em um terço dos casos em clínicas de síncope e em até 30% dos pacientes com “crises refratárias” em serviços de monitoramento por vídeo-EEG. Embora a suspeita do diagnóstico de crises não-epilépticas psicogênicas surja pela combinação de fatores tais como a semiologia das crises, traços de personalidade, antecedentes psiquiátricos ou de trauma ou abusos, a confirmação depende de EEG ou de vídeo-EEG. Ocasionalmente, esses eventos são observados durante o tilt-table teste na ausência de alterações nos parâmetros cardiovasculares. Investigação com Exames Complementares O artigo apresenta um algorritmo de investigação através de exames complementares. The European Society of Management of Syncope recomenda a internação para investigação de qualquer paciente atendido por síncope que tenha doença cardíaca, alguma anormalidade no ECG, síncope causando traumatismo grave, síncope durante exercício, ou história familiar de morte súbita. Pacientes com síncope secundária a arritmia, isquemia cardíaca, ou com síncope neurocardiogênica que necessite de marcapasso devem também ser hospitalizados para o tratamento. Os exames laboratoriais básicos devem ser realizados para exclusão de anemias, infecção, distúrbio eletrolítico, disfunção renal e hepática, embora os dados bioquímicos rotineiros no sangue tendam a ser de pouca valia. A prolactina sérica não é confiável na distinção entre crise epiléptica e síncope, mas é útil para diferenciar crises epilépticas de crises nãoepilépticas psicogênicas. O ECG de 12 canais é absolutamente mandatório, pois pode revelar a causa específica de síncope como bloqueio de ramo, bloqueio A-V, hipertrofia ventricular esquerda e síndrome de QT longo. Entretanto, num estudo recente avaliando as unidades de emergência dos Estados Unidos, apenas 59% dos pacientes com síncope tinham sido submetidos ao ECG. O EEG de 30 minutos é útil quando há uma suspeita de epilepsia. O momento adequado para o exame é importante; 50% dos pacientes com presumível crise convulsiva generalizada apresentam EEG anormal nas primeiras 24 horas. No entanto, se o exame for realizado em 48 horas, apenas 21% a 34% apresentam atividades epileptiformes. Nos casos em que esteja havendo dificuldades na distinção entre síncope convulsiva e epilepsia, o EEG realizado durante o tilt-table test pode ser elucidativo. Na ausência de trauma, a tomografia computadorizada ou a ressonância magnética deve ser reservada aos pacientes com suspeita de primeira crise não provocada ou com algum déficit neurológico. O Tilt-table testing, que induz stress ortostático causando diminuição do retorno venoso, é amplamente utilizado na avaliação de sincope neurocardiogênica. O teste eletrofisiológico baseado em cateter cardíaco, a monitorização cardíaca pelo Holter, preferencialmente por um período de 48h ou 72 h. e o vídeo-EEG podem ser também úteis. Tratamento Na síncope neurocardiogênica, algumas medidas conservadoras tais como ingerir líquidos, evitar fatores predisponentes e deitar aos primeiros sintomas prodrômicos são importantes. A contração isométrica da musculatura dos membros aos primeiros sintomas pode interromper o episódio por reforçar o retorno venoso. Os beta-bloqueadores são as drogas mais comumente utilizadas. Apesar da esperança inicial de que atenolol e metoprolol pudessem reduzir a freqüência de síncopes, a recorrência de síncopes neurocardiogênicas em pacientes tratados com atenolol foi similar ao do grupo placebo. Várias outras drogas (medodrine, fludrocortisona, etilefrina, parxetina) têm sido testadas, mas com resultados duvidosos. Os trabalhos com o uso de marcapasso permanente produziram resultados conflitantes. De qualquer modo, a síncope neurocardiogênica é habitualmente um quadro benigno, não havendo necessidade de colocação de marcapasso, a menos que os episódios sejam muito freqüentes. Os antiepilépticos estão indicados nos indivíduos com diagnóstico de epilepsia. Cerca de 50% do pacientes têm as crises controladas com o primeiro medicamento. Outros 20% tornam-se livres de crises com um segundo ou terceiro medicamento e os 30% restantes desenvolvem epilepsia refratária. A escolha do medicamento é fundamentada no tipo de crises ou de epilepsia, sexo, idade reprodutiva, medicação concomitante e presença de comorbidades relevantes. Ictal eye closure is a reliable indicator for psychogenic seizures. Chung SS et al. Neurology, 66: 1730, 2006. As crises não epilépticas psicogênicas são freqüentes entre os pacientes com possível epilepsia, com uma taxa de prevalência de 5% a 20% da população epiléptica ambulatorial e de 10% a 40% daqueles internados em centros de epilepsia. Essas crises são rotuladas como “pseudocrises”ou “crises psicogênicas”, implicando uma etiologia de natureza psicológica. Representam um desafio para o diagnóstico pela dificuldade na distinção entre eventos epilépticos e não epilépticos, pela possível ocorrência de ambos num mesmo indivíduo e pela elevada freqüência de distúrbios da personalidade ou de doenças psiquiátricas. O retardo na distinção pode acarretar conseqüências ao indivíduo como o uso desnecessário de medicamentos antiepilépticos e seus efeitos adversos, demora no tratamento adequado, limitações profissionais e restrição para a condução de veículos. Estudos prévios identificaram alguns movimentos estereotipados nas crises psicogênicas, tais como impuxo pélvico e arqueamento para trás, mas estes achados são baseados no monitoramento prolongado, com persistência da dificuldade diagnóstica nos pacientes ambulatoriais. O objetivo deste trabalho é determinar se a permanência com olhos abertos ou fechados durante a crise pode ser um sinal confiável para diferenciar entre ambos os eventos. Os dados de 234 pacientes consecutivos submetidos ao monitoramento prolongado de vídeo-EEG no Instituto Neurológico Barrow, em Phoenix, Arizona, foram analisados retrospectivamente. As drogas antiepilépticas foram reduzidas ou suspensas para o desencadeamento de crises para fins diagnósticos. Foram analisadas 939 crises de 221 pacientes. Cinqüenta e dois pacientes (23,5%) tinham crises não epilépticas psicogênicas e 156 (70,6%) eventos epilépticos. Houve franco predomínio do sexo feminino entre os que apresentaram crises psicogênicas, numa proporção de 3:1. Em contraposição, não houve diferenças no gênero nos que apresentaram crises epilépticas. Entre aqueles com crises psicogênicas, 50 dos 52 pacientes ocluíram as pálpebras durante o evento. A maioria deles permaneceu dessa forma durante toda a duração da crise e alguns fecharam os olhos de forma forçada franzindo a face. Em contraste, 152 dos 156 pacientes com epilepsia tinham seus olhos amplamente abertos ou desviados para um dos lados no início das crises. Durante a fase de contrações tônico-clônicas, o piscamento dos olhos foi seguido por confusão pós-ictal e fechamento das pálpebras, mesmo embora seus olhos estivessem abertos no início. Mesmo quando as crises surgissem durante o sono, muitos pacientes abriam seus olhos no início no quadro. No total, o fechamento das pálpebras indicou uma alta probabilidade de crises não epilépticas psicogênicas, com um valor preditivo positivo de 0,943 (sensibilidade de 96,2% e especificidade de 98,1%). Adicionalmente, a abertura ocular ictal teve também um elevado valor preditivo positivo, de 0,987 para crises epilépticas verídicas (sensibilidade de 98,1% e especificidade de 96,2%). Os achados indicam que a presença da abertura ocular ou o seu fechamento durante a crise é uma característica clínica altamente confiável na diferenciação das crises não epilépticas psicogênicas das genuinamente epilépticas. Portanto, a obtenção de uma história clínica cuidadosa sobre as características semiológicas da crise de pacientes ambulatoriais, questionando sobre a abertura ou fechamento dos olhos, pode permitir o correto esclarecimento da natureza do evento. Lunar phases and seizure occurrence: just an ancient legend? Polychronopoulos P. et al. Neurology, 66: 1442, 2006. Através dos séculos, as fases lunares foram consideradas como capazes de afetar o comportamento humano, particularmente no desencadeamento de distúrbios psiquiátricos e crises epilépticas. Os estudos prévios dos ciclos lunares e os fenômenos biológicos são conflitantes. Os pacientes acreditam que as crises epilépticas são precipitadas ou agravadas na lua cheia e 80% das enfermeiras e 64% dos médicos das unidades de emergência crêem que a lua interfira efetivamente na saúde mental dos pacientes. Os autores realizaram um estudo retrospectivo objetivando a avaliação da eventual associação entre as fases lunares e a indução de crises. No período de 1999 a 2003, foram atendidos 12.156 casos neurológicos na Unidade de Emergência do Hospital Universitário de Patras, Grécia, sendo 859 por crises epilépticas. Do total, 34,2% ocorreram nos dias de lua cheia, numa freqüência significativamente maior que nas outras fases lunares, variando de 21,4% a 22,5%; não houve predomínio da ocorrência diurna ou noturna. Quanto a outras modalidades de eventos neurológicos não epilépticos (cefaléia, enxaqueca, AVC, vertigem e síndrome de Guillain-Barré) não houve predomínio nos dias de lua cheia. Concluem os autores que houve uma elevada freqüência de crises nos dias de lua cheia, durante todos os anos do estudo e em ambos os sexos, confirmando uma antiga crença popular. Tension-type headache: the most common, but also the most neglected headache disorder. Bendtsen L et al. Curr Opin Neurol, 19: 305, 2006. A cefaléia tensional é a forma mais comum de cefaléia. Muitas pessoas consideram-na uma cefaléia “normal”, em contraste com a enxaqueca. Os custos diretos devidos aos serviços médicos e medicamentos são maiores com a cefaléia tensional que com a enxaqueca, decorrentes da maior prevalência. São relatados prejuízos na produtividade do trabalho e nas atividades sociais em até 60% das pessoas com cefaléia tensional. Um recente estudo apontou uma elevação da freqüência de absenteísmo por cefaléia tensional, mas não por enxaqueca. Assim, embora não seja o tipo mais destacado de doença, é uma das mais onerosas para a sociedade. Mas, ao mesmo tempo, é o tipo menos estudado de cefaléia. A cefaléia tensional é caracterizada por uma dor bilateral, do tipo aperto, de intensidade moderada ou acentuada. Não apresenta as características típicas da enxaqueca tais como vômitos, piora com a atividade física, ou fotofobia ou fonofobia. Durante décadas, a falta de critérios adequados de diagnóstico e de um marcador biológico constituiu sério obstáculo para a pesquisa da cefaléia tensional. Em 1988, a noção de cefaléia tensional foi introduzida na Classificação Internacional das Cefaléias, podendo ser separada nas formas esporádica e crônica. Uma segunda versão da Classificação Internacional subdividiu a forma episódica em infrequente (menos de 12 dias com dor/ano) e freqüente (entre 12 e 180 dias/ano). A forma episódica infrequente tem pouco impacto individualmente; seria um fenômeno normal e não propriamente uma doença, e pode estar relacionada como trivial, sem a necessidade de atendimento médico. Entretanto, os pacientes com episódios freqüentes podem apresentar considerável incapacidade e necessitar uma intervenção específica. A forma crônica difere da episódica na fisiopatologia, insucesso com a maioria dos esquemas terapêuticos, maior abuso de medicamentos, maior incapacidade e custos individuais e sócio-econômicos mais expressivos. Na classificação revisada, podem ser caracterizados dois subgrupos: abuso de medicamentos e a cefaléia persistente diária, que tem um início agudo e é refratária ao tratamento. Assim, classificação revisada permite um diagnóstico mais preciso com relação à freqüência e impacto, abuso de medicamentos e evolução temporal da cefaléia. Epidemiologia A prevalência da cefaléia tensional pode atingir valores de até 89% ao longo da vida, mas a grande maioria das pessoas teria por um dia por mês, e pode ser agora classificada como tendo a forma episódica infrequente. Num estudo recente, a avaliação da cefaléia tensional em dois momentos distintos, separados por um intervalo de 12 anos, revelou um aumento da freqüência de 79% para 87%, com elevação mais pronunciada da sub-forma episódica freqüente de 29% para 37%. Os fatores de risco para este incremento foram pior condição de saúde, incapacidade de relaxar após o trabalho e distúrbios do sono. Tais achados são importantes, pois indicam novos meios de prevenção e tratamento da cefaléia tensional. O mesmo estudo permitiu avaliar, pela primeira vez, a taxa de incidência num estudo longitudinal. A incidência anual da cefaléia tensional freqüente foi de 14,2 por 1.000 indivíduos, com uma proporção de 2,6 mulheres para 1 homem. A incidência declinou de forma consistente com a idade, cuja importância está na necessidade de um paciente idoso referindo uma cefaléia freqüente e de instalação recente ser submetido a uma investigação através de exames complementares. Fisiopatologia A cefaléia tensional é geralmente relacionada a conflitos emocionais e ao stress psicosocial, mas, como na enxaqueca, a relação causa-efeito não está clara. O perfil de personalidade é predominantemente normal nos indivíduos com a forma episódica, mas os estudos com a forma crônica revelam maior freqüência de depressão e de ansiedade. Tratamento O tratamento não farmacológico é amplamente utilizado no tratamento da cefaléia tensional, principalmente a fisioterapia. Os analgésicos comuns são eficazes na cefaléia tensional episódica (cautela pela evitar seu uso abusivo), mas ineficazes na forma crônica. Há evidências a favor da eficácia da profilaxia com amitriptilina na cefaléia crônica, mas não dos inibidores seletivos da recaptação de serotonina, na ausência de depressão. Mirtazapina, um antidepressivo noradrenérgico e serotoninérgico, parece ser igualmente eficaz e melhor tolerado que a amitriptilina. De qualquer modo, nenhum deles é bem tolerado por todos os pacientes, havendo necessidade de novos medicamentos ou modalidades terapêuticas. Health effects of ionising radiation from diagnostic CT. Martin DR et al. Lancet, 367: 1712, 2006. Antigamente, os grupos ocupacionais expostos à radiação ionizante eram radiologistas e técnicos em radiologia. Esses profissionais empregados antes de 1950, quando a exposição à radiação da fluoroscopia era elevada, apresentavam alta taxa de mortalidade por câncer. Desde o advento dos primeiros equipamentos comerciais de tomografia computadorizada (TC), em 1972, este exame passou a ser a principal fonte de radiação médica. Estimativas conservadoras indicam que mais de 60 milhões de exames de TC foram realizadas em 2002 nos Estados Unidos, representando um total de 70% de todos os exames com exposição ao raio X. A exposição à radiação ionizante de uma simples TC de abdômen ou do tórax pode ser associada com elevado risco de dano no DNA e formação de câncer. O VII Relatório da Academia Nacional de Ciências sobre os Efeitos Biológicos da Radiação Ionizante, documento mais recente de uma organização altamente respeitada, afirmou que uma dose única de 10 mSv é associada a um risco de desenvolvimento de um câncer sólido ou de leucemia de 1 em 1.000, ao longo da vida. O risco total de desenvolvimento de um câncer sólido ou leucemia de todas as causas seria de 42 em 100. Os tecidos mais sensíveis são predominantemente aqueles dentro do campo de visão de TC de tórax, do abdômen e da pelve. A dose de um exame convencional de TC de abdômen é de 10 a 20 mSv, enquanto a da mama, durante a angiografia por TC da artéria pulmonar, de 20 mSv. Infelizmente, muitos pacientes são submetidos a múltiplos exames o que aumenta a dose cumulativa. Um estudo recente mostrou que um grupo de pacientes com litíase renal tem uma taxa de exposição total entre 19,5 e 153,7 mSv. Muitos médicos nas unidades de emergência desconhecem os efeitos potencialmente deletérios da exposição por radiação de TC; apenas 9% deles eram cônscios do risco aumentado de câncer. Os radiologistas realizando exames de TC não estão preocupados com a exposição à radiação; apenas 47% estavam familiarizados com o risco elevado de câncer e muitos deles desconheciam a dose de radiação emitida aos pacientes durante o exame. Se os próprios médicos desconhecem os riscos da radiação associada a TC, não é nada surpreendente que os perigos não sejam adequadamente explicados aos pacientes antes da obtenção do consentimento para a realização do exame. Para fins de comparação, o risco de complicações e de óbito do contraste endovenoso da TC é estimado em cerca de 1 em 400.000, o que é muito inferior ao risco atribuído de uma carga única de 10 mSv. Essa inversão de valores pode ser imputada à relação causal, pois os sintomas do contraste surgem imediatamente após sua administração. Os efeitos da radiação, em contrapartida, ocorrem de 5 a 20 anos após a TC e o elo causal pode passar desapercebido. Tendo em vista os riscos da TC, há algumas sugestões. Primeiro, o ultra-som e a ressonância magnética são mais seguros na investigação por imagem do abdômen e da pelve. Segundo, a dose de TC deveria ser reduzida de forma significativa, focando a atenção em detalhes como uma maior restrição do campo de visão à área de interesse, ajuste da dose de acordo com a idade e dimensão corporal, utilização de TC de único ao invés de múltiplos cortes (multiple passes). Terceiro, os fabricantes deveriam desenvolver equipamentos automatizados com mecanismos de redução de dose. Quarto, os órgãos governamentais deveriam ter uma atuação mais rigorosa, determinando normas específicas sobre as doses máximas aceitáveis e indicações precisas de TC. Por exemplo, é absolutamente inaceitável a realização de screening de TC de todo o corpo, expondo indivíduos normais a riscos conhecidos com benefícios questionáveis. Comentário Embora este artigo explicite TC de tórax, da pelve e do abdômen, é de extrema importância para os neurologistas, pois todo o raciocínio é igualmente válido para o de crânio. E, na nossa prática diária, certamente estamos solicitando este exame de forma excessiva, a julgar pelos resultados normais. É também incontestável que indicamos com enorme freqüência o que denominamos “TC de controle”. Scale for the assessment and rating of ataxia. Development of a new clinical scale. Schitz-Hübsch T et al. Neurology, 66: 1717, 2006. Com o enorme progresso na compreensão da patogênese molecular de muitas doenças atáxicas, a perspectiva de novas modalidades terapêuticas exige meios adequados de avaliação dos ensaios clínicos. E um pré-requisito é a disponibilidade de métodos validados de avaliação neurológica para mensurar o grau de ataxia. A escala ICARS – International Cooperative Ataxia Rating Scale, a mais amplamente utilizada no momento, apresenta problemas de aplicabilidade e de estrutura na sub-escala para a avaliação mais detalhada, pondo em dúvida a conveniência de seu uso nos futuros ensaios intervencionistas. A recentemente proposta escala – Friedreich’s Ataxia Rating Scale é específica para a avaliação da doença de Friedreich e não é aplicável às ataxias cerebelares. Um grupo de neurologistas europeus criou uma nova escala de avaliação semiquantitativa de ataxia cerebelar, SARA – Scale for the Assessment and Rating of Ataxia, composta de 8 itens (os detalhes estão no Web site de Neurology: www.neurology.org). Esta escala foi testada em dois ensaios com 167 e 119 pacientes com ataxia espinocerebelar. O tempo médio para efetuar SARA foi de 14,2 minutos. Os níveis de concordância inter-avaliador e intra-avaliador (no re-teste), foram elevados, configurando SARA como uma escala confiável e válida para mensuração do grau de ataxia nos futuros estudos clínicos. Neoplastic meningitis. Gleissner B et al. Lancet Neurol, 5: 443, 2006. A meningite neoplásica é uma complicação do SNC que ocorre em 3% a 5% dos pacientes com câncer e é caracterizada por sinais e sintomas neurológicos multifocais. O diagnóstico é problemático porque apresenta manifestações pleomórficas e concomitância de envolvimento de outros locais. Os exames úteis para o diagnóstico e tratamento incluem a ressonância magnética do encéfalo e da medula espinhal, análise citológica do LCR e estudos do fluxo do LCR com radioisótopos. É fundamental a avaliação da extensão da doença no SNC pela repercussão no prognóstico. A radioterapia é benéfica na meningite neoplásica com tumor de grande volume, incluindo metástase cerebral intraparenquimatosa ou obstrução do trânsito do LCR. Pelo fato da meningite neoplásica afetar todo o neuroeixo, o tratamento quimioterápico pode incluir a administração intratecal (por intraventricular ou lombar) ou terapia sistêmica. A maioria dos pacientes (>70%) com meningite neoplásica apresenta comprometimento sistêmico progressivo e, conseqüentemente, o tratamento é paliativo e a resposta do tumor transitória. Pela ausência de evidências consistentes a respeito benefício do tratamento agressivo multimodal na sobrevida, há necessidade de estudos futuros sobre o efeito terapêutico no controle dos sintomas neurológicos e na qualidade de vida dos pacientes. Management of paraneoplastic neurological syndromes: report of an EFNS Task Force. Vedeler CA et al. Eur J Neurol, 13: 682, 2006. As síndromes paraneoplásicas foram inicialmente definidas como síndromes neurológicas de causa desconhecida que freqüentemente antecipam o diagnóstico de um câncer subjacente, habitualmente inaparente do ponto de vista clínico. Nas últimas duas décadas, a descoberta da associação de muitas síndromes paraneoplásicas com anticorpos contra antígenos neurais expressos pelo tumor (anticorpos onconeurais) sugere um processo imunomediado. As síndromes paraneoplásicas são raras, ocorrendo em cerca de 1% dos pacientes com câncer. Este é um excelente artigo de revisão consensual preparado por um grupo de pesquisadores da European Federation of Neurological Societies. Discute, em detalhes, os aspectos diagnósticos e terapêuticos das seguintes síndromes paraneoplásicas: encefalite límbica, neuronopatia sensitiva subaguda, degeneração cerebelar, opsoclônus-mioclônus, síndrome miastênica de Lambert-Eaton e hiperexcitabilidade de nervos periféricos. A instituição precoce do tratamento pode prevenir a progressiva morte neuronal e a irreversibilidade da invalidez. Os anticorpos oncogênicos são de grande importância na investigação das síndromes paraneoplásicas e podem ser úteis na localização do tumor. A imunoterapia é habitualmente decepcionante nas síndromes do sistema nervoso central, mas pode ser benéfica no envolvimento da junção neuromuscular. Managing paraneoplastic neurological disorders. Beukelaar JW et al. The Oncologist, 11: 292, 2006. As síndromes neurológicas paraneoplásicas representam efeitos remotos do câncer que não são causadas pela invasão do tumor ou de metástases. Os fatores imunológicos parecem desempenhar importante papel na patogênese pois têm sido identificados autoanticorpos antineuronais e resposta de células-T contra antígenos do sistema nervoso. A resposta imunológica é promovida pela expressão ectópica de antígenos neuronais pelo tumor. A expressão dos assim denominados antígenos “onconeurais” é limitada ao tipo tumoral e o sistema nervoso e, por vezes, ao testículo. Por ocasião do surgimento dos sintomas neurológicos, a maioria dos pacientes não tem ainda um diagnóstico de câncer estabelecido. A detecção de anticorpos antineoplásicos é extremamente útil para o diagnóstico correto de uma síndrome neurológica inexplicável e de caráter rapidamente progressivo. Adicionalmente, os anticorpos paraneoplásicos podem auxiliar no direcionamento da busca de uma neoplasia subjacente. Por outro lado, nos pacientes sabidamente portadores de câncer, a apresentação da síndrome paraneoplásica pode ser um prenúncio de recorrência do tumor ou de uma segunda neoplasia. É cada vez maior o número de anticorpos antineoplásicos, e pelo menos sete deles podem ser considerados bem característicos. De acordo com o quadro clínico, o tipo de anticorpos e a presença ou ausência de câncer, os pacientes podem ser classificados como tendo um diagnóstico de síndrome paraneoplásica “definitivo” ou “possível”. Apesar da presumível etiologia autoimune, os resultados das várias modalidades de imunoterapia são mormente desapontadores, com algumas exceções. A rápida detecção e o imediato tratamento da neoplasia parecem oferecer melhor condição para a estabilização do quadro e prevenção de futura deterioração neurológica. Guidelines on routine cerebrospinal fluid analysis. Report from an EFNS task force. Deisenhammer F et al. Eur J Neurol, in press, 2006. Este guia apresenta as recomendações da European Federation of Neurological Societies sobre a análise de rotina do LCR, incluindo contagem celular, coloração de células, proteínas totais, albumina, imunoglobulinas, glicose, lactato e a investigação de infecções. A metodologia empregada foi a busca no Medline para essas variáveis, revisão dos artigos publicados, catalogando os graus de evidência e recomendações, em busca de consenso entre os membros da Força Tarefa. É recomendado que o LCR seja analisado imediatamente após a coleta. Se pretender armazenar, um volume de 12 ml deve ser dividido em 3 ou 4 tubos estéreis. O quociente de albumina (albumina LCR/soro) é preferível à quantificação de proteínas totais e o limite superior de normalidade deve ser ajustado de acordo com a faixa etária. Valores elevados do quociente de albumina é um achado inespecífico, mas ocorre predominantemente nas meningites bacteriana, criptocócica e tuberculosa, metástases leptomeníngeas, assim como nas polineuropatias desmielinizantes aguda e crônica. A diminuição patológica da relação glicose LCR/soro ou a elevação da concentração de lactato indicam meningite bacteriana ou fúngica, ou metástases leptomeníngeas. A síntese intratecal de IgG é melhor demonstrada pelo método de focalização isoelétrica seguida de coloração específica. A morfologia celular (coloração citológica) deve ser avaliada na presença de pleocitose, metástases leptomeníngeas ou suspeita de sangramento patológico. O sangramento intratecal com tomografia negativa deve ser investigado pela detecção de bilirrubina. Pneumococcal meningitis in adults: new approaches to management and prevention. Weisfelt M et al. Lancet Neurol, 5: 332, 2006. Desde a virtual erradicação da meningite por Haemophilus influenzae do tipo B através da vacinação nos países desenvolvidos, a meningite pneumocócica passou a ser a principal causa de meningites bacterianas fora do período neonatal. Nas últimas décadas, as pesquisas clínicas e experimentais têm contribuído para melhorar nosso conhecimento sobre a fisiopatologia e patogênese da doença. Apesar da disponibilidade de antibióticos eficazes, dos cuidados gerais e os recentes avanços do emprego associado de dexametasona, as taxas de morbidade e de letalidade da meningite pneumocócica permanecem inaceitavelmente elevadas. Embora os resultados preliminares da vacina conjugada pneumocócica sejam promissores, a incidência de cepas de pneumococo multiresistente tem apresentado elevação mundial. Os autores discutem os aspectos clínicos da meningite pneumocócica no adulto, focalizando a fisiopatologia, e clamam por adoção urgente de medidas preventivas adequadas e por novos tratamentos eficazes. Meta-analysis: cysticidal drugs for neurocysticercosis: albendazole and praziquantel. Del Brutto OH et al. Ann Intern Med, 145: 43, 2006. Os trabalhos sobre o tratamento etiológico da neurocisticercose são controversos, com questionamentos se as drogas cisticidas modificam a história natural da doença. O objetivo do trabalho foi a realização de meta-análise dos ensaios randomizados avaliando o efeito das drogas parasiticidas tendo como desfechos a neuroimagem e os aspectos clínicos dos pacientes. Os trabalhos foram procurados no MEDLINE, no Cochrane Database e no LILACS entre 1979 e 2005, sem restrição de língua. Foram identificados 11 estudos que preencheram os critérios de seleção: 6 ensaios avaliaram 464 pacientes com lesões císticas (cisticercos vesiculares) e outros 5 analisaram 478 casos com lesões com reforço (forma coloidal). As lesões eram localizadas no parênquima cerebral ou no espaço subaracnóideo, na convexidade dos hemisférios cerebrais. O tratamento medicamentoso esteve associado com completa resolução das lesões císticas (44% vs 19%; p=0,025). Os ensaios com lesões com reforço mostraram uma tendência de resolução, favorável ao uso de drogas cisticidas (72% vs 63%; p=0,38), que se tornou estatisticamente significante quando foi excluído da análise um trabalho considerado heterogêneo (69% vs 55%; p=0,006). O risco de recorrência de crises foi menor após tratamento parasiticida nos pacientes com lesões com reforço (14% vs 37%; p<0,001). O único trabalho avaliando a freqüência de crises em pacientes com lesões císticas mostrou uma redução de 67% na taxa de crises generalizadas (p=0,006). Concluem os autores que o tratamento medicamentoso parasiticida resulta em melhor resolução de cisticercos vesiculares e coloidais e uma redução na taxa de crises generalizadas nos pacientes com cisticercos vesiculares. Fighting HIV. Lessons from Brazil. Okie S. N Engl J Med, 354: 1977, 2006. Em 1996, numa decisão pioneira de combate ao HIV, o país decidiu distribuir gratuitamente tratamento retroviral a todos o pacientes com aids. O programa governamental, criticado por alguns como desencadeador de resistência medicamentosa do HIV, tem sido aclamado internacionalmente como importante passo na luta contra a aids, pois melhorou a saúde e prolongou a sobrevida de dezenas de milhares de brasileiros e propiciou uma economia de $2,2 bilhões em gastos hospitalares, estimados entre 1996 e 2004. Adicionalmente, essa iniciativa inspirou outros países no esforço global de combate à aids. Os Estados Unidos da América passaram a fornecer medicamentos contra HIV aos países da África e do Caribe, e a Organização Mundial da Saúde criou a iniciativa 3 por 5, que consiste na distribuição adicional de medicamentos antiretrovirais a 3 milhões de pessoas até o final de 2005. Ainda, os esforços persistentes e agressivos na prevenção de novas infecções pelo HIV desempenham papel até maior no controle da disseminação do vírus. No início da década de 1990, o Brasil e a África do Sul estavam num estádio similar, com uma prevalência da infecção pelo HIV de 1,5% entre adultos em idade reprodutiva. Mas, em 1995, ano anterior ao início do programa brasileiro, a epidemia na África do Sul tinha começado a explodir, com uma prevalência já superior a 10%, enquanto a taxa de infecção no Brasil havia declinado à metade. Isto é, no momento da implantação do programa de distribuição de medicamentos, o Brasil já tinha controlado a disseminação epidêmica e apresentava uma prevalência relativamente baixa e estável. O êxito inicial dos esforços de prevenção permitiu que o programa nacional de tratamento fosse verdadeiramente confiável, limitando o número de pessoas infectadas. Por sua vez, a disponibilidade de acesso gratuito à medicação antiretroviral sensibilizou o brasileiro a efetuar o teste de HIV e a atentar para os tipos de comportamento associados com a transmissão. Embora o Banco Mundial tivesse previsto no início da década de 1990 que o Brasil teria 1,2 milhões de pessoas infectadas pelo HIV até 2000, as cifras atuais apontam a existência de apenas 600.000 infectados. Os esforços preventivos dirigidos a populações de alto risco atingiram sucesso impressionante, particularmente entre os usuários de drogas injetáveis e profissionais do sexo, através de campanhas educativas. Outro aspecto positivo foi a produção de medicamentos genéricos de antiretrovirais. Das 16 drogas atualmente adquiridas pelo governo, o país manufatura 8. A produção local de genéricos e a negociação de descontos das drogas importadas propiciaram uma redução de custos anuais de $6.240/paciente em 1997 para $1.336/paciente em 2004. Entretanto, em 2005, o custo médio aumentou para $2.500, como reflexo do crescimento de resistência do HIV, o que motivou a discussão sobre a produção nacional de medicamentos protegidos por patente, com obtenção de descontos expressivos ou de concessão de licenças voluntárias da indústria farmacêutica. DOENÇAS CEREBROVASCULARES Dr. Jorge Noujain Carotid artery calcification on CT may independently predict stroke risk. Kiran R et al. Am J Roentgenol, 186: 547, 2006. Introdução: o depósito de cálcio nas paredes dos vasos arteriais tem sido objeto de grande interesse de pesquisa devido a evidência de seu efeito deletério com sua participação na arteriosclerose e resultado clínico desfavorável. Exemplo de prevalência de aumento de risco para morbidade e mortalidade ocorre com aumento de depósito cálcico medidos por TC associados a estenose luninal coronária e sobrecarga de arteriosclerose coronariana. Além disso, depósitos de cálcio na aorta abdominal detectados no Raio X lombar indicam um aumento de risco de doença coronariana- cardiovascular com tb. maior mortalidade, o mesmo acontecendo com depósitos de cálcio na aorta torácica que significam maior risco de AVC isquêmico e doença coronariana. Devido à abrangência sistêmica da arteriosclerose, os depósitos de cálcio nas artérias carótidas cervicais podem ter importância similar no grau de estenose luminar e sintomas isquêmicos. Entretanto, poucos estudos têm sido realizados para determinar o grau de depósitos de cálcio nas artérias carótidas medidos por TC. Isto é explicado em parte pelo uso mais freqüente de Ultrasonografia e Angioressonância dos vasos cervicais sendo limitada a identificação de calcificação e do grau de espessura da parede cálcica através desses aparelhos. Material e Métodos: o objetivo do estudo foi de avaliar quantitativamente o dano da calcificação e arteriosclerose das artérias carótidas cervicais utilizando angiotomografia computadorizada (MDCT) para determinar a relação do grau de estenose luminar e sintomatologia. O volume das placas de cálcio foi medido em 106 artérias carótidas cervicais (53) pacientes em Angiografia MDCT. Dos 53 pacientes, 32 eram assintomáticos (idade média de 70,2 com SD de 8,7 anos; 15 mulheres, 17 homens) e 21 pacientes sintomáticos com sintomas isquêmicos (69,6 com SD de 12,9 anos; 8 mulheres, 13 homens). Por vaso, constatou-se 43 estenoses de alto grau (≥ 60% pelo critério NASCET), 15 vasos de estenose moderada (30 a 50%) e 44 vasos de estenose leve ou normal (0 – 29%). Quatro vasos foram excluídos devido a endoarterectomia prévia. Resultados: com identificação de fatores de risco cardiovascular e estenose luminal os autores encontraram índices altos de sintomas isquêmicos (p=0.003). Mesmo considerando idade como covariante, pacientes com alto grau de estenose apresentaram índices mais altos do que comparado àqueles sem alto grau de estenose (p=0.004). O valor de predição quanto à especificidade e positividade para estenose luminal de alto grau foi notadamente inferior na análise individual dos vasos quando comparado à análise global dos mesmos, provavelmente representando variabilidade no remodelamento dos vasos. Conclusão: os índices de cálcio nas artérias carótidas cervicais podem representar um marcador independente para estenose luminal e sintomas isquêmicos. Um estudo longitudinal prospectivo dos níveis de concentração de cálcio e sua relação com morbidade podem ser de valia a fim de examinar-se qual o papel da sobrecarga de depósito de cálcio na estratificação de risco. Small vessel abnormalities in alternating hemiplegia of childhood. Pathophysiologic implications. Auvin S et al. Neurology, 66: 499, 2006. Introdução: A patofisiologia da hemiplegia alternante da infância (AHC) é obscura. Os autores avaliaram através de biópsias da pele e de músculo de pacientes com AHC a presença de anormalidades vasculares. Métodos: biópsia de pele de 4 pacientes nas idades de 18 meses, 8 anos, 9 anos e 18 anos e de músculo e de músculo em 2 dos pacientes foram examinadas com microscopia eletrônica e comparadas com estudo controle em pessoas normais. Resultados: anormalidades vasculares foram encontradas em ambos especimens em todas biópsias. Vacúolos foram identificados no endotélio. A anormalidade mais marcante foi a presença de vacúolos intracitoplasmáticos nas células musculares lisas da túnica média dos vasos e ocasionalmente núcleos apoptóticos com variações de acordo com a idade do paciente. Além disso, estas células haviam perdido suas junções com as células vizinhas e algumas estavam completamente isoladas. Nos vasos das biópsias musculares as células da musculatura lisa revelaram vacúolos, depósitos de resíduos osmofílicos e perda dos miofilamentos substituídos por vacúolos. Conclusões: as anormalidades vasculares desses pacientes sugerem uma patofisiologia vascular primária ou secundária para hemiplegia alternante da infância. As células musculares lisas das paredes dos pequenos vasos podem ser o alvo inicial do desenvolvimento da doença. Discussão: Hemiplegia Alternante da Infância é uma doença rara de patofisiologia desconhecida caracterizada por déficits episódicos da função neurológica. Apresenta-se em três fases clínicas distintas: movimentos oculares anormais, acompanhados de episódios distônicos; instalam-se depois ataques de hemiplegia com regressão da atividade psicomotora e finalmente atraso no desenvolvimento neurológico com déficits neurológicos definitivos completa a terceira fase. As características clínicas típicas de AHC foram estabelecidas no Simpósio Internacional sobre AHC em Roma em 1991: início antes dos 18 meses de idade; ataques repetitivos de hemiplegia alternante; outros distúrbios paroxísticos incluindo ataques tônico-distônicos, nistagmos, estrabismos e fenômenos autonômicos ocorrendo durante ataques de hemiplegia ou isolados; resolução imediata de todos os sintomas durante o sono e evidência de retardo do desenvolvimento. Inicialmente pensou-se que esta doença fosse relacionada a enxaqueca com seu equivalente, numa forma incomum de epilepsia ou a uma forma diferente de doença com distúrbio dos movimentos. Outras etiologias foram sugeridas como disfunção mitocondrial, canalopatias e disfunção cerebrovascular. Estudos ultraestruturais dos vasos da pele e músculo revelam alterações das paredes dos vasos, vacúolos no endotélio e anormalidades na túnica média sugerindo uma doença sistêmica vascular. Canalopatia tem sido levantada como hipótese pelo fato da apresentação paroxística dominante nessa patologia e por ter flunarizina , antagonista dos canais de cálcio, como o único agente benéfico capaz de reduzir a severidade e a duração dos ataques de hemiplegia alternante. Devido às similaridades clínicas de AHC com enxaqueca hemiplégica e ataxia episódica tipo 2 condições estas com mutações na subunidade do gene CACNA1A do canal de cálcio a1A o mesmo foi pesquisado nos 4 pacientes e foi negativo para sua presença. Os autores salientam a importância da relação entre cálcio, mitocôndria e apoptose, pois estudos indicam o papel central do íon de cálcio orquestrando o processo de morte celular por ativação específica de partes do programa de morte celular. Cerebral microbleeds on MRI. Prevalence, associations, and potential clinical implications. Koennecke H. Neurology, 66: 165, 2006. Objetivo: avaliar o valor potencial de microsangramentos cerebrais (CMB) na hemorragia intra-cerebral (ICH) como indicadores de doença dos pequenos vasos cerebrais e possíveis implicações para o tratamento antitrombótico. Método: o autor reviu a literatura publicada até julho de 2005 em MEDLINE , PubMed e em pesquisa manual. Resultados: foram analisados os dados prevalentes de 5200 pessoas. Em idosos sem doença cerebrovascular, a prevalência de microsangramentos está entre 5% a 6%, associada à idade avançada enquanto os dados não são consistentes em relação a microsangramentos cerebrais e hipertensão crônica. Microsangramentos são prevalentes em 68% dos pacientes com hemorragia intracerebral espontânea e em 40% dos pacientes com doença cerebrovascular isquêmica. Microangiopatia cerebral (lacunas e leukoareiose) está associada com maior prevalência (57%) de microsangramentos em pacientes com AVC isquêmico. Em pacientes com suspeita de angiopatia cerebral amilóide (CAA) ou doença de Alzheimer, os microsangramentos localizam-se principalmente na área córtico-subcortical. Dados atuais não favorecem a nenhuma evidência de que CMB aumentem o risco de hemorragia intracerebral entre pacientes com tratamento antitrombótico ou naqueles tratados com trombolise para AVC isquêmico. Conclusões: microsangramentos cerebrais podem indicar maior risco futuro de hemorragia intracerebral e podem ser um marcador para doença vascular dos pequenos e angiopatia cerebral amilóide. O autor salienta, entretanto, que mais dados prospectivos são necessários de modo a confirmar suas afirmativas e que recomendações para orientar o tratamento antitrombótico baseando-se na detecção de microsangramento não se justificam no presente momento. Mechanical thrombolysis in ischemic stroke attributable to basilar artery occlusion as first-line treatment. Bergui M et al. Stroke, 37: 145, 2006. Propósito: relatar os resultados da dissolução e resgate mecânicos de trombos como primeira opção de tratamento em pacientes com AVC atribuído a oclusão da artéria basilar, em particular no que se refere a segurança e eficácia. Resultados: Em 12 consecutivos pacientes com AVC agudo por oclusão da artéria basilar submetidos a trombólise mecânica intraarterial, 6 apresentaram recanalização completa. Ocorreu um único infarto cerebral, possivelmente atribuído a embolização distal. Três pacientes obtiveram um bom resultado. Em 5 dos 6 remanescentes a artéria foi recanalizada utilizando r-tPA. Nesses ocorreu uma hemorragia assintomática. Três pacientes apresentaram um bom resultado. A duração do procedimento e dose de r-tPA foram significativamente reduzidos com a trombólise mecânica bem sucedida (43.33 minutos e 13.33mg x 112.33 minutos e 55.83mg, respectivamente). Limitações do Estudo: os autores observam várias limitações nos seus trabalhos principalmente do ponto de vista científico, pois o procedimento não foi padronizado e dependeu diretamente do operador, o r-tPA foi administrado conjuntamente com a trombólise mecânica e algumas manobras mecânicas com cateteres e guias foram usadas durante a trombólise intraarterial local. Além do mais, o número de pacientes foi pequeno e sem estudo controle. Comparação direta dos resultados no desfecho, de pacientes com recanalização mecânica com sucesso ou fracasso e o impacto do tratamento devem ser considerados com precaução. A trombólise mecânica permitiu redução no tempo do procedimento e na dose de r-tPA. Isto pode significar menos hemorragias e melhor resultado, mas o impacto global no resultado final não pode ser avaliado definitivamente.A experiência dos autores limitou-se a artéria basilar que é uma artéria de grande diâmetro com ramos arteriais distais que podem ser eventualmente “embolizados”, sem maiores conseqüências clínicas. O contrário pode acontecer com outros diferentes sítios anatômicos, primariamente na circulação anterior ou em ramos periféricos. Finalmente, suas séries têm as mesmas limitações e restrições que as séries sem estudos controle de outros centros. Ressaltam, os autores, que estão lidando com uma técnica que pode ser usada só nos poucos casos entre um pequeno número de pacientes referidos para tratamento experimental como trombólise local intraarterial. As pequenas séries são um obstáculo e Smith e col. formaram 25 centros durante 2 anos e meio recrutando 125 pacientes com só 10 pacientes apresentando oclusão vertebrobasilar. Conclusão: apesar das dificuldades acima os autores sugerem que a técnica de trombólise mecânica permite uma recanalização rápida e segura com poucas complicações e que a mesma deva ser considerada como primeira opção nos casos de isquemia cerebral aguda devido à oclusão da artéria basilar. NEUROLOGIA INFANTIL Dra. Umbertina Conti Reed Therapeutic approaches and advances in pediatric stroke. Kirton A et al. NeuroRX, 3: 133, 2006. Os autores consideram que os acidentes vasculares isquêmicos em crianças, por isquemia arterial ou por trombose venosa, estão entre as 10 afecções mais encontradas na prática da neurologia infantil. Referem uma incidência de 2-8/100000 crianças por ano e, em recémnascidos, de 1/4000 nascidos vivos, bem como morbidade quanto a seqüelas motoras, sensitivo-sensoriais, cognitivas e de linguagem de aproximadamente 50%. Embora os autores apresentem rapidamente a etiopatogenia e os principais fatores de risco para o acidente vascular isquêmico em crianças, o enfoque principal desta revisão é terapêutico, sendo discutida a abordagem na fase “hiper-aguda” (primeiras horas de instalação), aguda (primeiros dias), subaguda (de semanas a meses) e crônica (anos). É salientado que estudos colaborativos multicêntricos devem ser incentivados com a finalidade de uniformizar condutas de consenso para o tratamento do AVC da criança, que é ainda pouco estudado em relação ao AVC do adulto, cujo tratamento já inclui protocolos bem definidos. Os autores baseiam-se em grande parte no resultado de dois estudos randomizados recentes, Chest (2004) e UK Guidelines (2005), que congregaram as opiniões de neurologistas infantis e hematologistas de diversos centros. Relativamente ao enfoque na fase hiper-aguda, os autores concluem que, embora se reconheça o emprego de tratamentos trombolíticos intra-arteriais ou intravenosos em casos isolados, a grande maioria das crianças não é atendida nas primeiras horas após a instalação do quadro, não existindo consenso quanto à eficácia e aos riscos do emprego de agentes trombolíticos ou procedimentos de angioplastia, adotados rotineiramente em adultos, na faixa etária pediátrica. No caso de acidente isquêmico arterial, relativamente ao tratamento na fase aguda e subaguda com anti-agregante plaquetário ou anticoagulante, os autores apontam diferenças de conduta entre os dois protocolos acima citados. O Chest recomenda iniciar a terapia anticoagulante com heparina não fracionada ou de baixo peso molecular, mantê-la durante uma semana, então substituindo-a por aspirina (3 a 5 mg/Kg) nos pacientes em que se exclua embolia cardiogênica ou dissecção arterial. Nestes últimos, a terapia anti-coagulante deve ser mantida por no mínimo três meses. Já, o UK Guidelines indica terapia anticoagulante em primeira instância apenas em pacientes com dissecção arterial comprovada e em alguns casos de embolia cardiogênica, limitando-se ao uso de aspirina nos demais. Quanto à trombose venosa, em linhas gerais, a terapia anticoagulante é consenso nos casos não hemorrágicos, devendo ser mantida por 3 a 6 meses, dependendo do grau de recanalização mostrado pela neuroimagem de controle. Os autores discutem ainda as medidas de suporte e de prevenção de lesões cerebrais secundárias e a importância do tratamento de manutenção com aspirina na fase crônica, a fim de reduzir o risco de recorrência. Na parte final deste trabalho de revisão de extensa bibliografia, os autores apresentam as particularidades da indicação e do risco do tratamento em recém-nascidos, em pacientes com acidentes vasculares de etiopatogenia definida, tais como a anemia falciforme, a doença de Moya-Moya e vasculites inflamatórias progressivas, bem como as medidas preventivas a serem adotadas quanto à dieta, exercícios de reabilitação, medicamentos contra-indicados, e outros aspectos da vida do paciente após a recuperação. Therapeutics development for spinal muscular atrophy. Summer CJ. NeuroRX, 3: 235, 2006. A autora apresenta uma revisão completa sobre os aspectos clínicos e genéticos da forma clássica de amiotrofia espinal progressiva (AEP), bem como os seus modelos animais, como introdução para uma ampla discussão sobre as promissoras tentativas terapêuticas que, a partir de 2003, estão sendo consideradas para esta grave doença neuromuscular da infância, que mostra uma incidência de 1:10000 nascidos vivos e uma freqüência de portadores de 1:50. Relata em detalhes o mecanismo molecular da AEP, conhecido desde a década de 90: o gene SMN1 (survival motor neuron) é coadjuvado em 5q pelo gene SMN2 que possui diversas cópias; as mutações afetam o número de cópias e pelo mecanismo da dosagem gênica originam diferentes fenótipos. Somente uma cópia confere um grau de apoptose neuronal incompatível com a vida; pelo menos duas cópias do gene associam-se ao fenótipo Werdnig-Hoffmann; três cópias originam a forma intermediária e pelo menos quatro cópias relacionam-se à AEI tipo III. Não se conhece perfeitamente a função da proteína do gene SMN1, acreditando-se que esteja envolvida no processo de amadurecimento tanto do motoneurônio como do músculo: trata-se de um complexo macromolecular que além da proteína SMN inclui pelo menos outras 6 proteínas chamadas geminas ou gemas. Acredita-se que o complexo SMN seja regulado pelas geminas 2 e 6 e tenha papel essencial na formação e agrupamento de várias pequenas proteínas ribonucleares localizadas no núcleo, implicadas não só na integridade do motoneurônio como de outras células. Em condições normais, a proteína SMN2 é produzida em quantidade reduzida e a observação de que existindo pelo menos 60% da proteína SMN1, que é o que ocorre nos pais e nos irmãos heterozigotos da criança afetada, o quadro não se manifesta, gerou uma linha de pesquisa terapêutica que visa aumentar o nível da proteína SMN2, agindo sobre o gene SMN2, e assim melhorando o quadro clínico. As informações quanto à natureza e a função da proteína SMN e a viabilidade do emprego de agentes farmacológicos já conhecidos que agem sobre o gene SMN2, fazendo com que este passe a produzir mais proteína e proteína mais eficiente, abriu um vasto campo para testes clínico-terapêuticos que a autora expõe e analisa com precisão. Inicialmente, verificou-se que aclarubicin e butirato de sódio aumentam o nível de SMN na célula em cultura e, posteriormente demonstrou-se que o tratamento de cultura de fibroblastos de pacientes com ácido valpróico em doses terapêuticas aumenta o nível da SMN2 de 2 a 4 vezes. Finalmente, a administração de fenilbutirato de sódio a pacientes em doses de 500 mg/kg/dia em 5 doses por via oral, alternando 7 dias de tratamento e 7 sem, resultava em melhora da habilidade funcional Também foi demonstrado que 4-fenilbutirato de sódio aumenta a expressão do gene SMN in vitro e nos leucócitos de pacientes que recebem o sal por via oral e que o tratamento de cultura de fibroblastos de pacientes com tobramicina e amikacina resulta em aumento do número de gemas com a proteína SMN. O butirato de sódio pertence à classe de compostos que podem alterar a expressão do gene por regular a acessibilidade do mecanismo de transcripção do DNA. O ácido valpróico, anti-epiléptico de largo emprego, mostrou ter esta mesma propriedade, em cultura de fibroblastos de pacientes com AEP, por ativar o promotor da proteína SMN e por evitar a deleção do exon 7 no produto gênico. A autora descreve os diferentes tipos de protocolos que estão em andamento com estas drogas em diferentes países e também discute outras opções terapêuticas, tais como: o uso de protetores neuronais, dos quais o mais conhecido é o riluzole, que conseguiria impedir ou retardar a morte neuronal, de acordo com pesquisas ainda em andamento; drogas que estabilizam a proteína SMN, entre as quais aminoglicosídeos e indoprofeno, ambos, porém, com baixa penetração no sistema nervoso central; terapia gênica e o uso de células-tronco, tratamentos estes que esbarram na dificuldade de se definir com certeza em qual momento do desenvolvimento devem ser aplicados e como alcançar os motoneurônios periféricos. Finalmente, enfatiza a necessidade de estudos multicêntricos para melhor avaliação da eficácia do tratamento, bem como a importância de se uniformizar parâmetros clínicos de força muscular e de habilidade funcional, que permitam quantificar os resultados do tratamento. MOLÉSTIAS INFECCIOSAS Dr. Hélio R. Gomes CSF findings in 250 patients with serologically confirmed West Nile virus meningitis and encephalitis. Tyler KL et al. Neurology, 66: 361, 2006. Este estudo traz uma ampla análise dos achados liquóricos em pacientes com envolvimento neurológico pelo vírus West Nile (VWN). Em 2003, o VWN foi o responsável pela maior epidemia já vista de encefalite por arbovírus nos EUA. Além de encefalite pode ocorrer meningite e paralisia flácida. Durante essa epidemia, 622 casos de infecção neurológica pelo VWN foram observados (388 de meningites e 234 de encefalites), sendo que destes, 407 tiveram amostras de líquido cefalorraquidiano (LCR) analisadas e este artigo descreve as características em 250. Desses 250, 174 (70%) eram meningites e 76 (30%), encefalites. Com relação à celularidade, não houve diferença significativa entre o número de células (por mm3) encontrado no LCR de pacientes com meningite ou encefalite (226 ± 50 e 227 ± 47). Aproximadamente 8% de cada grupo tinham mais de 500 células/mm3 e não houve correlação entre o número de células e o momento em que a amostra foi colhida. O padrão celular foi predominantemente neutrofílico, sem diferenças significativas entre os percentuais de neutrófilos nos 2 grupos. Aproximadamente 24% dos pacientes de ambos os grupos tinham mais que 50 eritrócitos/mm3 e 5 a 6% mais de 500, sendo o número médio de eritrócitos maior nos indivíduos com encefalite. Foi observada diferença de concentração proteica entre os pacientes com encefalite e aqueles com meningite. A proteinorraquia (em mg/dL) estava mais elevada nos casos com encefalite (101 ± 6 contra 76 ± 2,5). 47% dos pacientes com encefalite tinham proteinorraquia maior que 100, enquanto que esse fato ocorria em apenas 16% dos pacientes com meningite. Não houve diferença estatística entre os teores de glicose no LCR dos 2 grupos. A mortalidade entre os pacientes com encefalite foi maior que naqueles com meningite (13,2% x 1,1%), mas os parâmetros liquóricos não se mostraram marcadores de prognóstico. Apenas 18 pacientes foram puncionados uma segunda vez, sendo que em 17 (94%) houve diminuição do número de células e em 14 (88%), diminuição do percentual de neutrófilos. Com relação à proteinorraquia, 67% (10/15) houve diminuição dos níveis proteicos enquanto que em 33% (5/15) houve aumento. Chama atenção, portanto a maior hiperproteinorraquia nas encefalites quando comparada à meningite e a semelhança entre o perfil liquórico das meningites por VWN e outros vírus. Outra informação que o artigo traz é que no envolvimento neurológico pelo VWN, os níveis de proteínas e eritrócitos são significativamente maiores que na encefalite por herpes simples. Incidence and pathogenesis of clinical relapse after herpes simplex encephalitis in adults. Skoldenberg B et al. J Neurol, 253: 163, 2006. Neste trabalho, os autores estudaram a fisiopatologia da recidiva da encefalite herpética através análise de marcadores no líquido cefalorraqueano. Para determinar a incidência de recidiva, foram seguidos 32 pacientes que tiveram encefalite herpética. Desses 32, 4 tiveram deterioração neurológica interpretada como recidiva da encefalite herpética e foram utilizados outros 4 pacientes, que não tiveram alterações durante o seguimento, como controles. Amostras pareadas de LCR e soro foram colhidas, e analisados marcadores de destruição glial e neuronal, citoquinas, mediadores inflamatórios e quantidade de HSVDNA. As reincidências ocorreram entre 1 e 4 meses após o quadro inicial em 3 pacientes e em 1 paciente, após 3,3 anos. As alterações tomográficas na reincidência foram menos intensas que nos quadros agudos e os pacientes foram tratados com acyclovir e corticóides endovenosos por 7 a 21 dias. HSV DNA foi detectado em todas as amostras durante a fase aguda, mas em nenhum na reincidência. Os níveis de sCD8 no LCR estavam aumentados na fase aguda da encefalite herpética e nas fases iniciais da reincidência, enquanto que os níveis liquóricos de enolase neurônio específica, S-100 e proteína glio fibrilar estavam significativamente mais diminuídos na reincidência que na fase aguda. A ausência de carga viral, de sinais de destruição neuro glial e a relativa ausência de atividade antiinflamatória, associadas à atividade inflamatória indicam que a fisiopatologia da reincidência da encefalite herpética está associada a um mecanismo imuno-mediado e não a reativação viral. CEFALÉIA Dra. Célia Roesler Ocular motor measures in migraine with and without aura. Wilkinson F et al. Cephalalgia, 26: 660, 2006. O objetivo do estudo foi avaliar a função oculomotora em indivíduos portadores de migrânea. Foi utilizado para estimulação um sistema de acompanhamento pelo olhar de uma luz infravermelha realizando movimentos sinusoidais (rastreio), movimentos sacádicos de 5 a 20%, e fixação ocular em 03 grupos: o primeiro formado por 19 indivíduos portadores de migrânea com aura (MA); o segundo formado também por 19 portadores de migrânea sem aura (MoA), e um terceiro grupo controle, também de 19 indivíduos, perfazendo um total de 57 indivíduos examinados. Os movimentos foram medidos duas vezes: uma em relação apenas ao deslocamento e outra em relação ao deslocamento frente a três tipos de painéis (fundos) apresentados, sendo um painel totalmente cinza, outro com listas verticais – preto e branco -, e outro de fundo estampado em cinza. Estatisticamente não foram encontradas diferenças significativas entre os indivíduos portadores de migrânea com e sem aura e os do grupo controle em qualquer um dos parâmetros de movimentação ocular analisado, porém, foram encontradas diferenças significativas em relação a velocidade de apresentação do estímulo e o tipo de painéis em todos os grupos. Esses resultados não oferecem subsídios quanto a alterações cerebelares, ainda em fase sub-clínica, em portadores de migrânea. Comprovam, no entanto, que as alterações visuais descritas na migrânea não são consequências de dificuldades de movimentação ou de fixação ocular. Os resultados encontrados neste estudo comprovam as observações na nossa prática clínica diária quando realizamos a avaliação otoneurológica. Ao aplicarmos o teste do rastreio pendular, os pacientes, na maioria dos casos, referem tontura quando o estímulo é apresentado em freqüência maior, sem que isso implique em nenhum comprometimento quanto a movimentação ocular para acompanhamento do estímulo apresentado. Sneddon’s syndrome: another migraine-stroke association? Tietjen GE et al. Cephalalgia, 26: 225, 2006. Champion e Rook descreveram pela primeira vez em 1960 a associação de doença cérebrovascular isquêmica e dermatopatia isquêmica. Em 1965, I. B. Sneddon, dermatologista inglês, descreveu uma série de casos que apresentavam acidentes cérebro-vasculares associados ao levedo reticular, ficando esse quadro conhecido como síndrome de Sneddon. Os autores revisaram a literatura dessa síndrome ao examinar a associação desta condição com dores de cabeça incluindo migrânea. Relatos de casos e de séries são estratificados em dois grupos baseados nas referências de dores de cabeça. No grupo sem referência à dor de cabeça, há 208 pessoas com uma proporção de 3 mulheres para 1 homem. No grupo com referência à dor de cabeça, há 175 pessoas numa proporção de 3,5 mulheres para 1 homem. A proporção com dor de cabeça nesse segundo grupo é 58% (102 indivíduos), com dor de cabeça descrita como migrânea 27,5% (28 indivíduos), incluindo 6 com migrânea com aura. A freqüência da dor de cabeça não é significantemente mais alta em pessoas com anticorpos anti-fosfolipídeos comparado com coorte negativo (43% vs. 32%, P=0,07). Uma revisão dos dados histológicos, radiológicos e sorológicos da síndrome de Sneddon e migrânea salienta a plausibilidade da associação. Embora os dados epidemiológicos ainda sejam inconclusivos os autores pretendem com este trabalho chamar a atenção para que novos estudos sejam feitos sobre a associação: migrânea – levedo reticular – ataque isquêmico. DOENÇAS DO NEURÔNIO MOTOR/ELA Dr. Francisco Tellechea Rotta Ao acompanharmos pacientes com esclerose lateral amiotrófica (ELA) devemos sempre lembrar que o fato desta ser uma doença incurável, não deve significar que seja também intratável. Dentre os sintomas da ELA, um que freqüentemente apresenta má resposta ao tratamento e um impacto negativo na qualidade de vida dos pacientes, é a salivação excessiva. Revisamos dois estudos recentes que avaliam o uso injeções de toxina botulínica nas glândulas salivares de pacientes com ELA. Embora sejam estudos abertos, não controlados, sugerem o benefício desta técnica em pacientes com sialorréia resistente ao tratamento convencional. Indicam ainda ser seguro utilizar esta técnica em pacientes com doença do neurônio motor. Application of botulinum toxin to reduce the saliva in patients with amyotrophic lateral sclerosis. Manrique D. Rev Bras Otorrinolaringol, 71: 566, 2005. Cinco pacientes com ELA (média de 2,8 anos de duração), com sialorréia resistente ao tratamento anticolinérgico sistêmico foram incluídos neste estudo aberto. Foi aplicado um total de 20 U de Botox em cada parótida e 30 U de Botox em cada glândula submandibular (com uso de guia ecográfica em tempo real). Quatro pacientes apresentaram melhora significativa em um questionário que mede de qualidade de vida relacionada a sialorréia. A duração do efeito foi de 3 a 4 meses. Não foram observados efeitos adversos. Botulinum toxin improves sialorrhea and quality of living in bulbar amyotrophic lateral sclerosis. Verma A et al. Muscle & Nerve, in press, 2006. Dez pacientes com ELA (média de 22,8 ± 14,6 meses de duração), com sialorréia socialmente incapacitante e sem resposta a tratamento farmacológico prévio foram incluídos. Foram injetadas as glândulas parótidas com uma dose de 7,5 U de Botox, apenas com referências anatômicas. Uma dose extra de 15 U de Botox em cada parótida foi aplicada quatro semanas depois nos pacientes que não haviam apresentado melhora significativa. Dos oito pacientes que completaram o estudo, três necessitaram reaplicação da dose extra em quatro semanas. Foi observada redução na quantidade de lenços de papel usados pelos pacientes, melhora na escala analógica visal de salivação e em um questionário de qualidade de vida relacionado à sialorréia. A duração do efeito foi entre 2 e 5 meses, não se observando efeitos adversos. MOLÉSTIAS NEUROMUSCULARES Dra. Márcia Cruz Neurologic complications after surgery for obesity. Boyd M et al. Muscle & Nerve, 33: 166, 2006. Neste artigo de revisão os autores chamam a atenção para o número crescente de cirurgias bariátricas, ou seja, cirurgias para obesidade, levando-se em consideração que o número de obesos (IMC > 30 Kg/m2) pelo menos nos EUA é alarmante e chega aos 26 % dos adultos e crianças. Em nosso meio o numero destas cirurgias também vem crescendo, sendo candidato aquele sujeito que estiver com seu peso no dobro do ideal, e que demonstrar falha em perder peso seguindo dieta, não tiver contra indicações cardiopulmonares ou psiquiátricas e for mais jovem do que 50 anos. Neste contexto o clínico, além do neurologista deve estar atento à prevenção e tratamento das complicações decorrentes, e são elas: Mononeuropatias decorrentes de compressão a medida que se perde peso ou durante o tempo de cirurgia, e disfunção ou lesão em vários pontos do neuroaxis causadas por má absorção de vitaminas e outros elementos. As técnicas cirúrgicas empregadas no passado causavam maiores complicações do tipo desabsortivas. A técnica atual mais utilizada, restrição gástrica com bypass (Roux-en-Y gastric bypass), minimiza esta complicação mas ainda assim ela é freqüente. A técnica ideal visa: limitar a ingesta de alimento, causar saciedade, manter absorção normal de nutrientes, causando perda de 50 a 50 % do excesso de peso. De 8 estudos que avaliaram os níveis de micronutrientes após a cirurgia (957 pacientes), 25% demonstraram deficiência de vitamina B 12, 20 % deficiência de folato, e 1 % deficiência em tiamina. A deficiência de vitamina B 12 causa normalmente degeneração combinada da medula, porém apenas casos de neuropatias periféricas tem sido relatados. Nos casos de má absorção de folatos estão relatados neuropatia periférica, mielopatia e síndrome de pernas inquietas. Na falta de piridoxina estão relatados casos de neuropatia periférica e degeneração combinada da medula. A deficiência de tiamina é responsável pelos casos de encefalopatia de Wernicke e neuropatia periférica. A carência de vitamina E causa miopatia e neuronopatia sensitiva atáxica. Pode ocorrer ainda neurite ótica. Durante a cirurgia, várias são as neuropatias compressivas descritas assim como rabdomiólise. Para avaliar o paciente estão preconizados: eletroneuromiografia, biópsia neuromuscular em alguns casos e monitorização dos níveis séricos de vitaminas B 12, B 6, D, E, folato, cálcio, magnésio, fósforo, selênio e cobre, e tratamento empírico com tiamina, vitamina B 12 ou complexo multivitamínico. A prevenção deve ser feita com dosagens destes elementos a cada 6 meses e suplementação com complexo multivitamínico e sais minerais, contendo vitamina B 12, ácido fólico, ferro, suplemento adicional de ferro e vitamina C e B 12, e cálcio. NEUROLOGIA COGNITIVA E DO ENVELHECIMENTO Dra. Sonia M. D. Brucki Diagnosis and management of dementia with Lewy bodies. Third report of the DLB consortium. McKeith IG et al. Neurology, 65: 1863, 2005. Dois consensos anteriores foram publicados citando os critérios diagnósticos para Demência com corpos de Lewy. Este foi o terceiro com modificações propostas pertinentes para melhor acurácia diagnóstica deste quadro neurológico. Mc Keith et al, 1996; McKeith et al, 1999 - Critérios diagnósticos: - duas das seguintes características centrais são essenciais para o diagnóstico de DCL provável e uma é essencial para o diagnóstico de possível: a) flutuação da cognição com variações acentuadas de alerta e atenção b) alucinações visuais recorrentes que tipicamente são bem formadas e detalhadas c) características motoras espontâneas de parkinsonismo Características de suporte para o diagnóstico: quedas repetidas síncope perda transitória de consciência sensibilidade à neurolépticos delírios sistematizados alucinações em outras modalidades desordem comportamental do sono REM* depressão* * estas duas últimas características foram incorporadas em 1999 (McKeith et al). Consensos anteriores: especificidade OK, porém baixa sensibilidade Dificuldades no reconhecimento das flutuações As características centrais: flutuação, alucinações visuais e parkinsonismo – baixa freqüência na presença de NFT neocorticais. Mudança nos critérios para incorporar itens adicionais indicativos de patologia por Lewy Body. Distinção entre características sugestivas de DLB (mais freqüentes do que em outras demências) e de suporte (ocorrência comum, porém com baixa especificidade) CRITÉRIOS: 1- MANDATÓRIO “central feature”– essencial para o diagnóstico de possível ou provável DEMÊNCIA Perfil cognitivo: comprometimentos corticais e subcorticais Déficit atenção, executivo, visuoespacial Diferenças entre DLB e DA: preservação relativa da nomeação por confrontação, evocação curto e médio prazo e reconhecimento, e >> diminuição: fluência verbal, percepção visual, tarefas executivas Pacientes com DLB com NFT neocorticais podem ter déficits de memória proeminentes, característicos de DA Diferenças entre DLB x Demência na D. de Parkinson: sem muita diferença qto ao curso temporal, cognitivo, idade Em pesquisa: considerar um ano entre início da demência e parkinsonismo para diagnóstico de DLB 2- CORE FEATURES: sem muitas diferenças em relação aos critérios anteriores. Recomendações para sua abordagem e uso no diagnóstico e medida de gravidade FLUTUAÇÃO - perguntas como: sujeito parece ter pensamento muito claro e depois se torna ruim – 75% de cuidadores tanto de Ad e DLB respondem positivamente. - necessários: questionários qualitativos e quantitativos - Clinician Assessment of Fluctuation Scale – mês prévio - One Day Fluctuation Assessment Scale – cut off para distinção entre DLB e AD ou DV. - Mayo Fluctuations Composite Scale – 3 ou mais “sim” . Questões sobre sonolência e letargia diurnas, sono diurno> 2 horas, ficar fitando o nada por longos períodos, ou episódios de fala desorganizada. ALUCINAÇÕES VISUAIS (AV) Recorrentes e complexas. Presentes no início. - uso do NPI com cuidador - pacientes com AV: > comprometimento visuoespacial - associação com: - maior número de LB no lobo temporal anterior e inferior, amígdala (necrópsia) - perfusão cerebral diminuída em regiões occipitais - > maior déficit de ACh cortical - pode predizer melhor resposta à terapia colinérgica PARKINSONISMO - > instabilidade postural, dificuldade à marcha, hipomimia. Tremor – menos comum. 3- SUGGESTIVE FEATURES: se 1 ou + está presente junto a 1 ou + das centrais : DLB provável. Possível – demência + 1 ou mais das sugestivas, mesmo sem características centrais. DESORDEM COMPORTAMENTAL DO SONO REM - sonhos vívidos durante sono REM, mas sem atonia muscular. Movimentam-se, brigam, vocalizam durante o período. Pode preceder por anos o início da demência e parkinsonismo. -pode ser confirmado por polissonografia SENSIBILIDADE A NEUROLÉPTICOS - início agudo ou exacerbação do parkinsonismo e perda de consciência - aproximadamente 50% dos sujeitos com DLB têm tolerância a neurolépticos – não usar como exclusão - história positiva de sensibilidade – altamente sugestiva de DLB. IMAGEM FUNCIONAL COM TRANSPORTADOR DE DOPAMINA - atividade diminuída em transportadores de dopamina estriatais em DLB e normal em AD- útil na distinção entre as duas entidades. 4- SUPPORTIVE FEATURES: comumente presentes, porém sem especificidade. 5- CARACTERÍSTICAS DE EXCLUSÃO: ver tabela INVESTIGAÇÕES ESPECIAIS - imagem funcional com transportador de dopamina - preservação do volume do hipocampo e lobo temporal medial no RM - hipoperfusão occipital (SPECT), hipometabolismo occipital (PET) sem atrofia na RM. - cintigrafia com I-123 (MIBG) – quantificação de inervação simpática pós-ganglionar cardíaca – reduzida na DLB – alta sensibilidade e especificidade na distinção com DA. ABORDAGEM PATOLÓGICA - diagnóstico: era a presença de LB em qualquer local do cérebro na presença de demência (1996). - imunohistoquímica para alfa-sinucleína e graduação semi-quantitativa de gravidade da patologia relacionada aos LB: leve, moderada, grave e muito grave. VER FIGURA E TABELAS ARTIGO MANEJO CLÍNICO PARKINSONISMO L-DOPA: baixas doses e aumento lento, deixar em dose mínima para controle sintomas SINTOMAS NEUROPSIQUIÁTRICOS Inibidores da acetilcolinesterase ou neurolépticos atípicos Depressão: inibidores recaptação de serotonina e/ou noradrenalina Apatia: Inibidores da acetilcolinesterase Desordens do sono: clonazepam 0,25 mg ao deitar, ou quetiapina 12,5 mg; melatonina 3 mg ao deitar; anticolinesterásicos.