INSTITUTO POLITÉCNICO DE BRAGANÇA – Engenharia Civil Mecânica Aplicada 2 – Conceito de Tensão Conceito de Tensão Índice Breve Revisão dos Métodos da Estática 1 Tensões em Elementos Estruturais 2 Análise e Dimensionamento 3 Esforço Axial; Tensão Normal 4 Princípio de Saint-Venant 5 Tensão Tangencial 6 Tensão num plano inclinado sujeito a esforço axial 7 Exercício Resolvido 9 Bibliografia 9 Breve Revisão dos Métodos da Estática Considere a estrutura representada na figura que foi concebida para suportar uma carga de 30 kN. Esta estrutura é constituída por: - uma escora AB (barra bi-articulada sujeita a compressão) de secção transversal rectangular cujas dimensões são de 30x50 mm, - um tirante (barra bi-articulada sujeita à tracção) cuja secção circular tem 20 mm de diâmetro. A escora e o tirante encontram-se ligados por uma articulação no ponto B e são suportados por apoios fixos em A e C. O primeiro passo para análise desta estrutura é o traçado do diagrama de corpo livre da estrutura. Para tal isola-se a estrutura dos seus apoios em A e C, e representa-se a acção que estes apoios exercem sobre a estrutura (reacções de apoio). Note-se que a representação da estrutura foi simplificada omitindo-se todos os detalhes supérfluos. Nesta altura é possível inferir que as barras AB e BC estarão sujeitas apenas a esforço axial (pois trata-se de um sistema articulado plano). Mário Nuno Valente – Setembro 2004 1/9 INSTITUTO POLITÉCNICO DE BRAGANÇA – Engenharia Civil Mecânica Aplicada 2 – Conceito de Tensão Este facto não será tomado em conta na determinação das reacções de apoio, assumindo-se que a direcção da reacção em + cada ponto é desconhecida. Cada uma das reacções será então representada pelas suas componentes verticais e horizontais. Podem escrever-se três equações de equilíbrio: ∑ M = 0 ⇔ A × 0.6 − 30 × 0.8 = 0 ⇔ A = 0 ∑ F = 0 ⇔ A + C = 0 ⇔ C = − A ⇔ C = −40kN ∑ F = 0 ⇔ A + C − 30 = 0 ⇔ A + C = 30 - C - x x x x x y y y x x y x y A quarta equação de equilíbrio será escrita para a articulação B: - ∑M corpo AB B = 0 ⇔ − Ay × 0.8 = 0 ⇔ Ay = 0 (Estes resultados poderiam ter sido obtidos de uma forma mais simples aplicando o Método dos Nós ao nó B) Conclui-se que para equilibrar uma carga vertical de 30 kN em B surge um esforço axial de tracção de 50 kN na barra BC e um esforço axial de compressão de 40 kN na barra AB. Estes resultados embora necessários, não fornecem qualquer informação acerca da segurança da estrutura face à carga aplicada. O facto de o tirante BC, por exemplo, ceder ou não sob a acção da carga aplicada depende não só do valor encontrado para o esforço axial FBC, mas também da área da secção transversal do tirante e do material que o constitui. Tensões em Elementos Estruturais O esforço FBC determinado anteriormente, representa, na verdade, a resultante das forças internas que se encontram distribuídas em toda a área A da secção transversal da barra BC, e a intensidade média dessas forças distribuídas é igual à força por unidade de área. A força por unidade de área, ou intensidade das forças distribuídas sobre uma dada secção, é designada por tensão nessa secção e é denotada pela letra grega σ (sigma). A tensão num elemento da área da secção transversal A sujeito a um esforço axial P é então obtida através do quociente do valor P do esforço pela área A: σ= Mário Nuno Valente – Setembro 2004 P (sinal positivo indica tracção e sinal negativo compressão) A 2/9 INSTITUTO POLITÉCNICO DE BRAGANÇA – Engenharia Civil Mecânica Aplicada 2 – Conceito de Tensão Dado que foram utilizadas as unidades do Sistema Internacional com P expresso em newtons (N) e A em 2 metros quadrados (m ), a tensão σ é expressa em N/m2 (Pa – Pascal). Apresentam-se de seguida a conversão para o SI de outras unidades também utilizadas. 1lb 4.448 N = = 6.895 kPa (psi = pound per square inch) 2 1in 0.025402 m 2 - 1 psi = - 1bar = 100 kPa Análise e Dimensionamento Considere-se novamente a estrutura anterior e assuma-se que o tirante BC é constituído por aço cuja máxima tensão admissível é σ adm = 165 MPa. Poderá o tirante BC suportar com segurança a carga a que vai estar sujeito? 0 valor da força FBC no tirante foi encontrado anteriormente e é igual a 50 kN. Recordando que o diâmetro do tirante é 20 mm: σ= Dado que o valor obtido para +50 E 3 N P = = 159 E 6 Pa = 159 MPa A π ( 0.02 / 2 ) 2 m 2 σ é menor que o valor σ adm da tensão admissível do aço utilizado, conclui-se que o tirante BC pode suportar com segurança a carga a que vai ser submetido. Para ser completa, a análise desta estrutura deveria incluir, também: - a determinação da tensão de compressão na escora AB, - uma investigação das tensões desenvolvidas nas articulações, - determinar se as deformações induzidas pela solicitação são aceitáveis, - uma análise adicional, necessária para elementos sujeitos a compressão, envolvendo a estabilidade do membro, i. e., a sua capacidade para suportar uma dada carga sem que haja urna mudança súbita na sua configuração. Para além da análise de estruturas e máquinas existentes sujeitas a dadas condições de carregamento, é também importante o dimensionamento de novas estruturas e máquinas, ou seja, a selecção de componentes apropriados para desempenhar uma dada tarefa. Como exemplo de dimensionamento, considere-se novamente a estrutura anterior e admita-se que se pretende utilizar alumínio cuja tensão admissível é σ adm = 100 MPa. Dado que o esforço na barra BC é, ainda, P = FBC = 50 kN para o mesmo carregamento, tem-se: σ adm = Mário Nuno Valente – Setembro 2004 P P 50 E 3 N ⇔ A= = = 500 E − 6 m 2 A σ adm 100 E 6 Pa 3/9 INSTITUTO POLITÉCNICO DE BRAGANÇA – Engenharia Civil Mecânica Aplicada 2 – Conceito de Tensão r= A = 12.62 E − 3 m = 12.62 mm π Conclui-se que será adequado um tirante de alumínio com, pelo menos 26 mm de diâmetro. Esforço Axial; Tensão Normal Como já foi indicado anteriormente, o tirante BC do exemplo precedente é um elemento de treliça, logo a força FBC é dirigida segundo o eixo da barra. Diz-se então que a barra está sujeita a esforço axial. Voltando à barra BC, recorde-se que o plano de seccionamento através da barra para determinar o esforço axial no elemento e a tensão correspondente, é perpendicular ao eixo da barra. O esforço axial é portanto normal à secção transversal e a correspondente tensão é denominada por tensão normal. Então, a seguinte equação exprime a tensão normal num membro submetido a esforço axial: σ= P A Note-se que nesta equação, obtém-se σ dividindo o valor P (força resultante do esforço axial distribuído na secção transversal) pela área A. σ representa então o valor médio da tensão na secção transversal, e não a tensão num ponto específico da mesma. Para definir a tensão num dado ponto Q da secção transversal considere-se uma área elementar Dividindo o módulo de ∆A . ∆F por ∆A obtém-se o valor médio da tensão sobre ∆A . Fazendo ∆A tender para zero, obtém-se a tensão no ponto Q: ∆F ∆A→ 0 ∆A σ = lim De um modo geral, o valor obtido para a tensão pela equação σ no ponto Q é diferente do valor da tensão média dado σ = P A , e verifica-se que σ varia ao longo da secção transversal. Mário Nuno Valente – Setembro 2004 4/9 INSTITUTO POLITÉCNICO DE BRAGANÇA – Engenharia Civil Mecânica Aplicada 2 – Conceito de Tensão Na prática, assume-se que a distribuição de tensões normais em peças sujeitas a esforço axial é uniforme, excepto na vizinhança dos pontos de aplicação das cargas. O valor da tensão σ é então igual a σ médio . No entanto, chama-se a atenção para o facto de que quando é assumida uma distribuição uniforme de tensões na secção, i.e., quando é assumido que as forças internas estão uniformemente distribuídas sobre a secção transversal, resulta da estática elementar, que a resultante P das forças internas tem que ser aplicada no centróide C da secção. Isto significa que uma distribuição uniforme da tensão apenas é possível se a linha de acção das cargas concentradas P e P’ passar através do centróide da secção considerada. A este tipo de solicitação chama-se carregamento centrado e assume-se que ocorre em todas as barras de eixo recto existente em treliças, tal como a considerada. Princípio de Saint-Venant Se forem aplicadas cargas concentradas num modelo de borracha conforme ilustrado na figura, os elementos na vizinhança imediata dos pontos de aplicação das cargas estão submetidos a tensões muito elevadas, enquanto os outros elementos na proximidade da extremidades da barra praticamente não são afectados pelas cargas. Este efeito pode ser verificado observando-se que os maiores deslocamentos, e logo as maiores tensões e deformações ocorrem perto dos pontos de aplicação das cargas, enquanto que nos cantos não se observam deformações. No entanto, à medida que se consideram secções mais afastadas das extremidades nota-se uma progressiva igualização das deformações envolvidas, logo uma distribuição de deformações e tensões quase uniforme na secção transversal. Este fenómeno está ilustrado na figura seguinte, em que estão representadas as distribuições de tensões em várias secções transversais de um placa rectangular fina submetida a cargas concentradas, obtidas com métodos matemáticos baseados na teoria da elasticidade. Mário Nuno Valente – Setembro 2004 5/9 INSTITUTO POLITÉCNICO DE BRAGANÇA – Engenharia Civil Mecânica Aplicada 2 – Conceito de Tensão Verifica-se que a uma distância b de cada extremidade, sendo b a largura da placa, a distribuição de tensões é quase uniforme na secção, podendo admitir-se que o valor da tensão dessa secção é igual a σ y em qualquer ponto σ médio . Por outras palavras, à excepção da vizinhança imediata dos pontos de aplicação das cargas, pode admitir-se que a distribuição das tensões é independente do modo de aplicação das cargas. Esta afirmação é conhecida pelo princípio de Saint-Venant (1797-1886). Tensão Tangencial As forças internas e as correspondentes tensões discutidas anteriormente eram normais à secção transversal considerada. Quando duas forças P e P’ são aplicadas perpendicularmente ao eixo de uma barra AB, surgem tensões de um tipo distinto Seccionando a barra AB no ponto C, entre os pontos de aplicação das cargas, obtém-se o diagrama da parte AC. Conclui-se que têm de existir forças internas no plano da secção e que a sua resultante é igual a P. Estas forças internas distribuídas são denominadas tensões tangenciais ou tensões de corte e o valor da sua resultante, P, é a força de corte na secção. Dividindo a forca de corte, P, pela área A da secção transversal, obtém-se a tensão tangencial média na secção. Indicando a tensão tangencial pela letra grega τ (tau), tem-se: τ medio = P A Note-se que o valor obtido é o valor médio da tensão tangencial ao longo da totalidade da secção. Ao contrário do que foi assumido anteriormente para a tensão normal, a distribuição de tensões tangenciais ao longo da secção não pode admitir-se como sendo constante. O valor real da tensão tangencial, Mário Nuno Valente – Setembro 2004 τ , varia 6/9 INSTITUTO POLITÉCNICO DE BRAGANÇA – Engenharia Civil Mecânica Aplicada 2 – Conceito de Tensão entre zero nas superfícies da peça até ao valor máximo, τ max , sobre uma determinada linha situada no interior da secção transversal, podendo ser significativamente superior ao valor médio. Ligação entre duas chapas com um parafuso sujeito ao corte Tensão num plano inclinado sujeito a esforço axial Foi visto anteriormente que: - forças axiais aplicadas numa barra originam tensões normais, - forças transversais exercidas sobre parafusos e cavilhas provocam aparecimento de tensões tangenciais nas ligações. A razão apontada para a dependência entre as forças axiais e as tensões normais por um lado, e as forças transversais e as tensões tangenciais, por outro, consistiu no facto de as tensões terem sido determinadas apenas em planos perpendiculares ao eixo da barra ou da ligação. Como será discutido neste capítulo, forças axiais provocam tanto tensões normais como tensões tangenciais em planos que não são perpendiculares ao eixo da peça. De modo análogo, forças transversais exercidas sobre um parafuso ou rebite originam tanto tensões normais corno tensões tangenciais em planos que não sejam perpendiculares ao eixo do parafuso ou rebite. Mário Nuno Valente – Setembro 2004 7/9 INSTITUTO POLITÉCNICO DE BRAGANÇA – Engenharia Civil Mecânica Aplicada 2 – Conceito de Tensão Considere a barra da figura ao lado, sujeita à acção das forças axiais P e P’. Seccionando a barra por um plano que faz um ângulo θ com o plano normal ao eixo da peça (figura a) e desenhando o respectivo diagrama de corpo livre da parte esquerda (figura b) conclui-se, através das equações de equilíbrio, que as forças distribuídas que actuam na secção têm de ser equivalentes à força P. Decompondo a força P nas componentes F e V, normal e tangencial à secção, respectivamente (figura c), pode escrever-se: F = P cos θ V = Psenθ A força F representa a resultante das forcas normais distribuídas sobre a secção e a força V a resultante das forças tangenciais. Os valores médios das correspondentes tensões normais e tangenciais são obtidos pela divisão de F e V pela área Aθ da secção, e observando na figura c que σ= F P cos θ P = = cos 2 θ Aθ A0 A0 cos θ Aθ = A0 cos θ , obtém-se: τ= V P sin θ P = = sin θ cos θ Aθ A0 A0 cos θ Pode observar-se através da primeira equação, que a máxima tensão normal, ocorre para θ = 0, i.e., quando o plano da secção transversal é perpendicular ao eixo da peca, e que tende para zero quando θ tende para 90°. A segunda equação mostra que a tensão tangencial é nula quando θ = 0º e θ = 90º , e que atinge o seu valor máximo para θ = 45º . Constata-se que o mesmo carregamento pode produzir tanto tensões normais sem gerar qualquer tensão tangencial ou provocar tensão normal e tangencial com o mesmo valor absoluto, dependendo da orientação da faceta considerada. Mário Nuno Valente – Setembro 2004 8/9 INSTITUTO POLITÉCNICO DE BRAGANÇA – Engenharia Civil Mecânica Aplicada 2 – Conceito de Tensão Exercício Resolvido Duas peças de madeira com uma secção transversal rectangular uniforme de 90 x 140 mm são unidas através de uma emenda simplesmente colada, como é indicado. Sabendo que a máxima tensão tangencial admissível na cola é de 500 kPa, determine o valor da máxima carga axial, P, que pode ser aplicada em segurança. θ = 20º A = 90x140 mm Resolução - Da decomposição da força P em componentes normais e tangenciais ao plano da emenda, sabe-se que V = Psenθ ; Aθ = A0 cos θ ; - Observando a figura sabe-se que - A tensão tangencial provocada pela força P é de τ= τ= V . Aθ P sin θ P 0.090 × 0.140 = sin θ cos θ ≤ 500 kPa ⇔ P ≤ × 500 E 3 ⇔ P ≤ 19.6 E 3 N A0 sin 20º × cos 20º A0 cos θ Bibliografia Beer, Ferdinand P., Johnston, E. Russell, DeWolf, John T., 2003. Mecânica dos Materiais, 3ª edição, McGraw-Hill, Portugal Mário Nuno Valente – Setembro 2004 9/9