legado de um programa que apenas começou

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PERSPECTIVAS HABITAÇÃO
CONJUNTURA DA CONSTRUÇÃO
7
JUNHO 2010
LEGADO DE UM PROGRAMA
QUE APENAS COMEÇOU
Na avaliação do Minha Casa, Minha Vida, é necessário considerar o
processo de aprendizado e capacitação institucional
Edney Cielici Dias e Ana Maria Castelo
A
CAPACIDADE do setor da construção de promover qualidade vida é
amplamente reconhecida, o que ressalta a importância da política habitacional, sobretudo para as famílias de baixa
renda. Mas, além dos efeitos sociais, a
construção de habitações traz resultados mais imediatos representados pela
elevação da renda, do emprego e da arrecadação tributária. Dessa forma, ao
ser anunciado em abril de 2009, um dos
aspectos mais ressaltados do Programa
Minha Casa, Minha Vida (PMCMV) foi
seu caráter anticíclico, que se tornava
particularmente relevante no momento em que o país sofria os impactos da
crise econômica.
O PMCMV conferiu à habitação um
papel de primeira grandeza na política
social do governo, o que ainda não havia ocorrido após a democratização do
país. O ressurgimento da habitação na
agenda nacional deve ser creditado a
uma conjugação de fatores: estabilidade econômica aliada a um forte crescimento do PIB, o que possibilitou melho-
res condições de crédito e acesso à casa
própria; uma seqüencia de avanços institucionais ao longo de mais de uma década; existência de um desenho de política habitacional na esfera executiva;
mobilização de entidades do setor da
construção em defesa da bandeira habitacional em anos mais recentes. A crise internacional foi o fator que desencadeou o processo, alimentando o programa com recursos orçamentários
Neste ano, o programa foi ampliado,
de 1 milhão para 3 milhões de unida-
HISTÓRICO DO SISTEMA DE FINANCIAMENTO DA HABITAÇÃO
Número anual de financiamentos habitacionais
SBPE
O papel do Minha
Casa, Minha Vida
em 2009
896.908
FGTS(*)
Total se forem
consideradas as
contratações
realizadas pelo
MCMV com
recursos do
Orçamento da
União
800.000
699.047
700.000
Total sem
o MCMV
627.342
Recorde anterior
600.000
500.000
400.000
300.000
200.000
100.000
0
1974
(*) FGTS inclui materiais de construção
1980
1985
Fonte: Abecip, BNH e Caixa Econômica Federal
1990
1995
2000
2005
2009
8
des habitacionais. Executar tal tarefa,
como se sabe, depende de capacitação
da burocracia estatal, da viabilização e
regulamentação de terrenos, da elaboração e aprovação de projetos, da concessão de crédito para construtoras e
compradores. A implementação de um
programa dessa envergadura implica,
portanto, avanços notáveis nos procedimentos que envolvem a produção
imobiliária no país.
O sucesso do plano é fundamental
para sua permanência, o que levará a próxima administração federal
a seguir uma política no mesmo sentido. Ao que tudo indica, há grande
possibilidade de que seja estabelecido o que os economistas e cientistas
políticos chamam de dependência da
trajetória (path dependence). Tratase de um padrão que não possibilita
mudanças sem que se incorra em altos custos. Se o formato e o aparato
de implementação do PCMV se mostrarem satisfatórios do ponto de vista
produtivo e político, estará estabelecida base do que será a política habitacional brasileira – o que é uma hipótese bastante provável.
Depois de um ano de seu anúncio, os
resultados podem parecer à primeira
vista modestos, pois haviam sido contratadas apenas 44% das unidades. No
entanto é preciso considerar que um
programa dessa envergadura envolve
um processo de aprendizado obrigatoriamente lento e custoso. Não se pode
esquecer que, após a extinção do BNH,
em 1986, o aparato gerencial de política habitacional foi desarticulado, com
sua pulverização entre diversos órgãos
de governo. Conforme relatou diretor
da Caixa Econômica Federal responsável pela implementação do PMCMV,
Jorge Hereda, a entidade sofre um amplo processo de aprendizado, de forma
a torná-la capaz de articular um programa dessa magnitude em nível nacional (Conjuntura da Construção, dezembro de 2009)
Metas e realização
O programa surgiu com a meta de construção de 1 milhão de unidades habitacionais, o que envolveria um total de
quase R$ 70 bilhões em recursos, considerando todas as fontes envolvidas
– o orçamento da União, o FGTS e o
SBPE. Um ano depois, na sua ampliação, o governo adicionou mais 2 milhões de moradias, a serem construí-
CONJUNTURA DA CONSTRUÇÃO
das em 4 anos a partir de 2011, o que
envolverá R$ 278 bilhões.
Para ter dimensão do que esses recursos determinam na economia, suponhase um fluxo anual de desembolso R$ 70
bilhões. Esse investimento seria capaz
de promover a cada ano a criação de 1,4
Investimentos
anuais de R$ 70
bilhões promoveriam
o aumento da
arrecadação tributária
em R$ 15,7 bilhões,
montante equivalente
ao que foi destinado
para o subsídio
direto das famílias
pelo PMCMV 1
milhão de empregos, sendo 984 mil gerados no próprio setor de construção e
450 mil nos demais setores. Assim, se
todas as obras do programa fossem colocadas em prática imediatamente, elas
gerariam 4,9 milhões de empregos diretos e 2,3 milhões de empregos indiretos
durante o período de execução.
A geração de renda determina ainda outro efeito igualmente importante: o aumento da arrecadação tributária, que permite ao governo recuperar
os recursos destinados ao subsídio das
famílias. Assim, investimentos de R$
70 bilhões ao ano promoveriam o au-
JUNHO 2010
mento da arrecadação tributária em R$
15,7 bilhões, montante equivalente ao
que foi destinado para o subsídio direto das famílias pelo PMCMV 1.
Os números representam antes de
tudo um exercício sobre a capacidade
de geração de renda, emprego e tributos. O comprometimento dos governantes com as metas de política habitacional tem resultado no retorno dos recursos envolvidos diretamente nos programas, ou seja, a geração de emprego e
renda que os investimentos habitacionais ensejam assegura aos governantes
a recuperação dos recursos direcionados na forma de subsídio.
Mas, a despeito do comprometimento do governo com as metas PMCMV
em sua primeira fase, o programa enfrenta outros desafios importantes. Um
deles diz respeito às dificuldades com
a burocracia, que surgiram tanto para
aprovação dos projetos nas prefeituras.
Outra grande dificuldade está no custo
elevado dos terrenos. A expansão da
oferta de crédito promovida pelo programa agravou ainda mais essa questão, ao provocar um movimento de valorização dos terrenos nas áreas mais
procuradas pelas empresas. Assim, o
programa conseguiu em 2009 garantir
a contratação de apenas 275,5 mil unidades habitacionais, o que representará investimentos de R$ 14,10 bilhões.
Isso, no entanto, já significou um salto no volume de financiamentos (ver
gráfico na pág. 7).
Em 2010, o ritmo de aprovação dos
projetos tem aumentado de tal forma que soma-se um comprometimento efetivo com 44% das metas iniciais
do programa. Ou seja, até 17 de maio
foram contratadas 440,4 mil unidades
habitacionais, sendo 53% na faixa de
até 3 salários mínimos. Esses projetos representam investimentos de R$
29,39 bilhões e implicarão 415 mil empregos diretos e 190 mil indiretos durante seu período de execução. Devese notar que 76% dos projetos aprovados já têm obras iniciadas.
Muitos dos problemas enfrentados
assumiram uma dimensão maior ou
menor dependendo de especificidades regionais. Assim a evolução nos
Estados tem sido bastante desigual:
enquanto em Goiás e Santa Catarina
as contratações efetuadas estão muito
próximas das metas estabelecidas inicialmente, em outros, como Amapá e
Ceará, não se atingiu 10%.
CONJUNTURA DA CONSTRUÇÃO
JUNHO 2010
9
Os efeitos do Minha Casa, Minha Vida 1 e 2 na economia
Total
Contratado até 17 de maio
Na construção
Empregos
em toda a
economia
Em outros setores
4.921.709
2.252.246
415.957
Renda em
toda a
economia
(R$ milhões)
190.348
As obras
contratadas
implicarão 415 mil
empregos diretos e
190 mil indiretos
durante seu período
de execução
191.775
Os 3 milhões de
residências gerarão
R$ 192 bilhões de
renda na construção
e R$ 123 bilhões nos
demais setores
122.509
16.208
Arrecadação
(R$ milhões)
39.812
10.354
Os 3 milhões de
moradias gerarão
R$ 40 bilhões de
tributos na
construção e
R$ 39 bilhões nos
demais setores
38.628
3.265
3.365
Total de recursos do programa
R$ 347,75 bilhões
MCMV 1
R$ 69,55 bilhões
(*) FGTS inclui materiais de construção
Se todas as obras do
programa fossem
colocadas em prática
imeditamente, elas
gerariam 4,9 milhões
de empregos diretos e
2,3 milhões de
empregos indiretos
Fonte: Abecip, BNH e Caixa Econômica Federal
MCMV 2
R$ 278,2 bilhões
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