269 FATORES EFETIVOS NA OCORRÊNCIA DE ESCORREGAMENTOS: ESTUDO DE CASO EM MACHADO-MG Luís Fernando Borges Silva [email protected] Geografia -Universidade Federal de Alfenas Lineo Aparecido Gaspar Junior [email protected] Professor Adjunto - Universidade Federal de Alfenas Introdução O conceito de área de risco, ainda gera discussões, mas de um modo geral, ele sempre vai levar em conta a relação estabelecida entre vulnerabilidade e à ameaça a eventos que possam provocar algum tipo de perda. Portanto é necessária uma intersecção entre a susceptibilidade e a ocorrência de um determinado evento e consequentemente a ocupação antrópica desse determinado espaço. Mas seria o homem apenas um passivo diante do risco? No processo de construção e transformação do espaço, o homem altera os processos e formas da paisagem, em especial, no processo de urbanização. A apropriação do espaço urbano leva a modificação da geometria das encostas, através de técnicas, muitas vezes, precárias, e, frequentemente, manuais. A larga ocorrência de áreas dobradas, e consequentemente com encostas, associada a ocupação que não considera as condições do meio físico, denotam o Sudeste do Brasil como uma região de larga ocorrência de áreas de risco a escorregamentos. É justamente nessa região, mais especificamente no Sul de Minas Gerais, que se encontra o município de Machado, cujas porções do perímetro urbano fora objeto do presente estudo. (Figura1) Varnes, (1978) nos lembra que as causas básicas da instabilidade de vertentes são bem descritas. Dessa forma o que se procura alcançar, em geral, por meio do Anais da 4ª Jornada Científica da Geografia UNIFAL-MG 30 de maio a 02 de junho de 2016 Alfenas – MG www.unifal-mg.edu.br4jornadageo entendimento dos processos envolvidos, são os condicionantes ao desencadeamento dos escorregamentos, quando, onde e quais são seus mecanismos, permitindo a predição da suscetibilidade. É importante lembrar que os fatores efetivos referem-se ao conjunto de características que são diretamente responsáveis pelo desencadeamento do movimento de massa, incluindo-se a ação humana. O presente estudo procurou compreender e identificar os fatores efetivos que corroboram com a interpretação de que a determinada população se encontra sob risco a escorregamentos, subsidiando um zoneamento da área. Figura 1 - Área de Estudo. Elaborado pelo autor Objetivos Identificar os fatores efetivos que atuaram sobre o último escorregamento ocorrido na área no ano de 2011; Identificar os fatores efetivos na ocorrência de atuais instabilizações na área. Fundamentação Teórica Cunha (1991) aponta que entende-se por risco a possibilidade de perigo, perda ou dano, do ponto de vista social e econômico, a que a população esteja submetida caso ocorram escorregamentos e processos correlatos. Procurando compreender esses processos, e os possíveis riscos da área se faz necessário identificar e compreender os diversos fatores desencadeantes desses Anais da 4ª Jornada Científica da Geografia UNIFAL-MG 30 de maio a 02 de junho de 2016 Alfenas – MG www.unifal-mg.edu.br4jornadageo 270 eventos. Tominaga (2009, p.34) nos lembra que os agentes predisponentes são “as condições naturais dadas pelas características intrínsecas dos materiais, sem a ação do homem”. Correspondendo ao conjunto de condições geológicas, topográficas e ambientais da área onde se desenvolve o movimento de massa. Guidicini & Nieble (1984) nos lembram que são exemplos de agentes efetivos imediatos: chuva intensa, erosão, terremotos, ondas, vento, interferência do homem, entre outros. Para Tominaga (2009) os agentes efetivos referem-se ao conjunto de fatores diretamente responsáveis pelo desencadeamento do movimento de massa, incluindo-se a ação humana. Dessa forma podemos compreender que para a ocorrência de um escorregamento é necessário um conjunto de fatores, dentre os quais podemos separar os predisponentes, que levam em consideração apenas aspectos naturais; e os efetivos, que além de naturais incluem a ação humana, e que no caso específico deste trabalho, fora alvo de maiores atenções. Metodologia Realizou-se primeiramente a análise de imagens SPOT 5 (2011) disponíveis no Google Earth Pro, buscando-se identificar alterações antrópicas que efetivamente contribuíssem com o processo em áreas do perímetro urbano de Machado-MG. A metodologia, ainda, se baseou em 4 trabalhos de campo, onde se buscou identificar ações que alteraram as feições nas encostas, e as implicações que isso pode acarretar na compreensão, desencadeamento e prevenção de possíveis movimentos de massa. As feições identificadas foram georreferenciadas e fotografadas, para auxílio de zoneamento da área. Os agentes predisponentes de risco, como aqueles ligados as condições geológico-geotécnicas e topográficas, foram contempladas em outros trabalhos realizados pelos autores, compondo uma análise geológico-geotécnica e zoneamento de riscos geológicos, trabalhos estes realizados sob financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Resultados As encostas urbanas talvez sejam as mais alteradas formas de relevo nos espaços urbanos, como podemos observar na figura 2 o bairro Vila do Céu é um exemplo dessa alteração, em especial pela densidade de edificações e pela criação de taludes artificiais. Para Guerra (2011, p.37) “a ocupação e o uso da terra talvez sejam Anais da 4ª Jornada Científica da Geografia UNIFAL-MG 30 de maio a 02 de junho de 2016 Alfenas – MG www.unifal-mg.edu.br4jornadageo 271 ainda mais críticos para a ocorrência de impactos ambientais do que as próprias características naturais das encostas.” Para Guidicini & Nieble (1984, p.53) “uma das causas mais comuns e óbvias no desencadeamento de condições de instabilidade consiste em modificar as condições geométricas da massa terrosa”. Esse pode ser entendido como um importante agente efetivo para a ocorrência do escorregamento de 2011. A geometria da vertente onde ocorreu o escorregamento foi brutalmente alterada, sendo essa alteração mais visível em sua base, ao longo da Avenida Ricardo Annoni Filho. A figura 2, mostra ainda a cicatriz produzida pelo escorregamento em 2011, o último na área, que afetou diretamente duas edificações, as quais foram interditadas pela Defesa Civil, sendo que uma ainda continua habitada. As evidências levam a crer que o fator que levara a resistência ao cisalhamento decrescer, sendo assim o principal fator efetivo, tenha sido a entrada abrupta de água no sistema, que só fora possível graças a inadequabilidade e incapacidade das galerias pluviais a montante de onde ocorrera o escorregamento. Essa situação fez com que, ao receber chuvas acima da média, as galerias não pudessem conter, controlar ou direcionar o fluxo momentaneamente, direcionando-o diretamente para a área onde ocorreu o evento. Figura 2 – Vista do bairro Vila do Céu, com destaque para talude de escavação e cicatriz de escorregamento translacional ocorrido em 2011. Arquivo dos autores. Pohl (1996) em estudos de solos tropicais contaminados por chorume e esgoto obteve concentrações maiores de Fe no chorume percolado no solo que no chorume e Anais da 4ª Jornada Científica da Geografia UNIFAL-MG 30 de maio a 02 de junho de 2016 Alfenas – MG www.unifal-mg.edu.br4jornadageo 272 esgoto sem percolação, mostrando que houve uma redissolução de oxi-hidróxidos de Fe dos solos, devido a uma redução do pH, que por sua vez, foi promovida pelo tampão residual entre o solo e o chorume ou esgoto. Ainda notou que, com a ressaturação, a permeabilidade se tornou menor em conseqüência do colapso do solo. Foram muitos os pontos encontrados nos bairros Vila do Céu e Centenário com tubulações aparentes e/ou vazamentos de esgoto, corroborando para a remoção do oxi-hidróxido de Ferro, que assume grande importância por afetar a estabilidade estrutural do solo e promover a mudança de comportamento ao longo do tempo. Dessa forma, os vazamentos de esgoto encontrados na área caracterizam-se como expressivos fatores efetivos, que contribuem com atuais instabilizações, que diante de um quadro extremo de chuva podem culminar em um novo escorregamento. Há de se lembrar que os escorregamentos e outros acidentes ou desastres naturais decorrem de uma série de fatores, que não agem de modo isolado. O exemplo escolhido para exemplificar os agentes efetivos que tornam a área mais vulnerável a novas ocorrências, fora os amplos vazamentos de esgoto, porém é necessário citar, além dos já discutidos, fatores considerados pela literatura como efetivos, que ampliam essa vulnerabilidade e que foram identificados na área, como: o acúmulo de material tecnogênico, padrões construtivos que ampliam a alteração da geometria da encosta, vegetação que acumula umidade em suas raízes, lançamento de águas pluviais diretamente na vertente, entre outros. Conclusões A compreensão dos fatores que levam a ocorrência de escorregamentos e processos correlatos é complexa. Há uma sinergia, que para ser compreendida demanda esforços múltiplos. Há de se lembrar que cada evento é único, e é justamente aí que reside os desafios das tentativas de compreensão e previsão de riscos geológicos. Há de se lembrar que além dos fatores efetivos, cujas alterações antrópicas nos espaços urbanos foram os principais alvos desse trabalho, as características químicas e físicas dos solos, o regime pluviométrico, a cobertura vegetal, entre outros fatores predisponentes formam importantes características a serem levantadas e compreendidas para interpretação de risco. A análise dos presentes fatores efetivos, junto ao histórico de escorregamentos da área foram os principais combustíveis para que fossem avaliados também os fatores predisponentes, de modo a coletar a maior quantidade possível de dados, para Anais da 4ª Jornada Científica da Geografia UNIFAL-MG 30 de maio a 02 de junho de 2016 Alfenas – MG www.unifal-mg.edu.br4jornadageo 273 que os mesmos subsidiem um zoneamento e sejam disponibilizados ao poder público para a tomada de decisões e ações mitigatórias. Referências Bibliográficas CUNHA, M. A. (coord.). Ocupação de Encostas. São Paulo: IPT, 1991. GUERRA, A. J. T. Encostas Urbanas. In: GUERRA, A.J.T. (Org.). Geomorfologia Urbana. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2011. 278p. GUIDICINI, G. & NIEBLE, C. M. Estabilidade de Taludes Naturais e de Escavação. São Paulo: 2a ed. Edgard Blücher, 194p. 1984 POHL, D. H.. Tropical residual soils: Applications in solid waste containment. Thesis submitted to the Faculty of Drexel University. 1996 TOMINAGA, L.K. Escorregamentos. In: AMARAL, R.; SANTORO, J.; TOMINAGA, L.K. Desastres Naturais: Conhecer para Prevenir. 1ª edição. São Paulo: Instituto Geológico, 196p,2009. VARNES, D. J. Slope movement types and processes. In: SCHUSTER, R.L. & KRIZEK, R.J. (eds.). Landslides: analysis and control. Transportation Research Board Special Report 176, National Academy of Sciences, Washington DC. p. 11-33. 1978 Anais da 4ª Jornada Científica da Geografia UNIFAL-MG 30 de maio a 02 de junho de 2016 Alfenas – MG www.unifal-mg.edu.br4jornadageo 274