O PAPEL DO BNDES NO FINANCIAMENTO DA DA ECONOMIA

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O PAPEL DO BNDES NO FINANCIAMENTO DA
DA ECONOMIA BRASILEIRA
Ana Cristina Lima Couto1
Jaime Graciano Trintim2
Resumo
Considerando que neste ano de 2012 o BNDES está completando 60 anos, este artigo tem como
objetivo resgatar aspectos importantes de sua atuação como instrumento de financiamento de longo
prazo da economia brasileira, destacando sua importância enquanto instrumento de intervenção do
Estado na economia, em especial nos anos 2000. O banco teve um papel essencial na
industrialização brasileira, principalmente durante o Plano de Metas e o II PND. Nos anos 1990, sua
participação foi decisiva no processo de privatizações do Governo Federal. Nos anos 2000, o banco
passa a desempenhar uma função pouco conhecida, a de agente anticíclico, sendo fundamental para
minimizar os efeitos negativos de alguns eventos que afetaram o Brasil. Recentemente, tem havido
uma maior participação da instituição junto às micro, pequenas e médias empresas.
Palavras-chave: BNDES; Agente anticíclico; Banco de desenvolvimento; Financiamento público.
Abstract
In this year, BNDES is completing 60 years. So this article aims to rescue his performance in the
long-term financing of the brazilian economy, highlighting its importance as an instrument of state
intervention in the economy, especially in the 2000s. It was found that BNDES had an essential role
in industrialization, especially during the “Plano de Metas” and “II PND”. In the 1990s, the
participation of the bank was decisive in the process of privatization of the Federal Government. In
the 2000s, the bank begins to play an unfamiliar role, as agent countercyclical, being essential to
minimize the negative effects of some events that affected Brazil. Recently there has been greater
involvement of the institution with the micro, small and medium enterprises.
Key-words: Agent countercyclical; Development bank; BNDES; Public financing.
Área: Sistema Financeiro e Financiamento da Economia
INTRODUÇÃO
Através do crédito, os agentes econômicos podem obter os recursos necessários para a
realização dos seus planos de gastos. As famílias podem aumentar o seu consumo (normalmente
restringido pela renda) e as empresas conseguem realizar investimentos produtivos, sem a
necessidade de possuir a totalidade do capital. A concessão de crédito é um instrumento eficaz para
o crescimento econômico de um país, pois contribuiu para elevar a demanda efetiva da economia e,
consequentemente, aumentar o volume da produção e do emprego.
Grandes teóricos das Ciências Econômicas destacaram em suas obras a importância do
crédito. Para Schumpeter (1996, p.83), o crédito era um dos três elementos fundamentais ao
1
Aluna do Curso de Doutorado em Economia/UEM. Professora do Departamento de Economia/UEM. Email:
[email protected].
2
Professor Associado do Departamento de Economia/UEM. E-mail: [email protected].
1
desenvolvimento ecnonômico. Já Keynes (1985), reforçava a necessidade da disponibilidade de
crédito para viabilizar os investimentos produtivos, motor do crescimento econômico.
Em uma economia moderna, as instituições financeiras têm um importante papel na oferta
de crédito. Mas quando se trata do financiamento ao investimento produtivo de longo prazo, são
grandes as dificuldades encontradas pelos empresários. Em geral, as instituições financeiras
privadas não atuam na concessão desse tipo de crédito devido aos riscos e incertezas, baixos
retornos, grande volume de recursos e maiores prazos de financiamento. Além disso, em muitos
países, o mercado de capitais é insuficiente para atender o volume da demanda de recursos das
empresas. Daí o papel relevante exercido pelos bancos de desenvolvimento, os quais atuam visando
atender as demandas não supridas pelo setor financeiro privado.
No Brasil, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), um
banco público, criado em 1962, cumpre papel crucial de apoiar projetos de investimentos que
contribuem para o crescimento do país, concedendo empréstimos de longo prazo com taxas de juros
subsidiadas (ou seja, abaixo das taxas de mercado). O banco é a principal instituição de fomento no
país, e está entre os maiores do mundo nesta modalidade.
Além de atuarem no processo de desenvolvimento econômico, os bancos públicos podem
exercer uma função que tem sido evidenciada recentemente: a de agente anticíclico. Esta função é
de grande relevância porque os bancos públicos podem atuar de forma a compensar os
desequilíbrios no mercado de crédito, o qual é considerado muito volátil e prócíclico, na medida em
que os empréstimos aumentam nos períodos de crescimento e se retraem em momentos de
desaceleração econômica. No Brasil, o papel anticíclico dos bancos públicos, em especial do
BNDES, foi fundamental quando do agravamento da crise financeira internacional a partir do
segundo semestre de 2008.
Nesse contexto, considerando que neste ano de 2012 o BNDES está completando 60 anos,
este trabalho tem como objetivo resgatar aspectos importantes de sua atuação como instrumento de
financiamento de longo prazo da economia brasileira. Será dada maior ênfase aos acontecimentos
recentes que evidenciaram a capacidade do governo brasileiro intervir no mercado de crédito graças
ao controle que tem sobre um banco público do porte do BNDES.
Para cumprir tal objetivo, o trabalho está organizado em três seções. A primeira, aborda
aspectos conceituais e teóricos sobre os bancos públicos e de desenvolvimento. A segunda seção,
apresenta brevemente um histórico e caracterização do BNDES e sua atuação no financiamento da
economia brasileira. A terceira seção, ilustra a estrutura de funding do banco e a partir dos dados
obtidos, alguns aspectos do mercado de crédito brasileiro, enfatizando-se a capacidade do governo
brasileiro intervir no mercado de crédito através do BNDES, destacando-se uma nova função que
veio à tona nos anos 2000, a de agente anticíclico. Nesta seção, também é feita uma breve discussão
sobre algumas questões ligadas aos custos e benefícios dos aportes de recursos feitos pelo Tesouro
Nacional ao BNDES. Em seguida, são apresentadas as considerações finais.
1 ASPECTOS CONCEITUAIS E TEÓRICOS SOBRE OS BANCOS PÚBLICOS E DE
DESENVOLVIMENTO
Para impulsionar o processo de desenvolvimento econômico, é necessário executar
projetos de investimento em setores estratégicos, que aumentam a formação bruta de capital fixo e a
capacidade produtiva da economia. Tais projetos possuem um longo tempo de maturação, exigem
um grande montante de recursos e requerem custos financeiros relativamente baixos. Sendo assim,
é de suma importância a existência de mecanismos de financiamento de longo prazo, que, em geral,
são fornecidos por bancos públicos e de desenvolvimento, seja porque o setor privado não tem
interesse em suprir tais demandas, seja porque o mercado de capitais de alguns países é pouco
desenvolvido e não consegue satisfazer as necessidades de financiamento das empresas. Desse
2
modo, é fundamental a intervenção do Estado para estimular o mercado de crédito de longo prazo.
De modo geral, os governos podem dispor de seus bancos públicos e/ou de desenvolvimento. De
acordo com a teoria financeira, são três os motivos que levaram à criação de bancos públicos.
Primeiro, as dificuldades do mercado financeiro para atender o financiamento requerido
pelo desenvolvimento. Em razão das incertezas quanto ao retorno dos empréstimos, as instituições
financeiras privadas possuem maior aversão ao risco e, por isso mesmo são muito cautelosas na
concessão de crédito de longo prazo e em grande volume. Segundo, a necessidade de maior
autonomia financeira para a execução das políticas de desenvolvimento. Essa motivação se deve à
existencia de problemas orçamentários de alguns países, especialmente daqueles em
desenvolvimento, os quais são um fator impeditivo para o governo viabilizar o financiamento de
longo prazo da economia. Nesta situação, a existência de um banco público pode ser a solução, à
medida que ele tenha maior autonomia financeira em função do acesso às fontes de recursos mais
diversificadas, como a captação de poupança doméstica (voluntária ou compulsória), empréstimos
de outros bancos (nacionais ou estrangeiros) e reinvestimento no caso dos bancos já existentes e que
possuem recursos próprios. Já a terceira motivação para o surgimento dos bancos públicos deve-se
ao poder que têm de atuarem como agente anticíclico no mercado de crédito, de modo a compensar
os desequilíbrios no sistema financeiro, seja mantendo, contraindo ou expandindo a oferta de
recursos de acordo com a conjuntura econômica e com a política macroeconômica do governo
(HERMANN, 2010).
Através dos bancos públicos, portanto, os governos podem intervir no mercado de crédito,
visando atingir diferentes objetivos, os quais podem ser reunidos em três áreas distintas. A primeira,
diz respeito à regulação, no sentido de determinar regras para o bom funcionamento do mercado
financeiro doméstico. A segunda área, refere-se à política monetária, que visa a administração da
quantidade de moeda e da taxa de juros de curto prazo de modo a manter a estabilidade de preços. A
terceira área, está relacionada com a alocação (direcionamento) de crédito. Ao contrário das duas
primeiras áreas, esta última não considera o mercado como um todo. Através da alocação de
crédito, o governo pode interferir nas condições de financiamento de um país, visando atender
setores, regiões ou determinados tipos de empresas que necessitem de tratamento especial e
diferenciado no que diz respeito à obtenção de recursos para a realização de investimentos e que o
governo deseja fomentar (TORRRES FILHO, 2007; 2009).
Um outro conceito importante, que está intrinsecamente relacionado com a discussão em
torno do financiamento de longo prazo da economia, diz respeito a bancos de desenvolvimento, que
em geral são estatais, consituindo-se também em um mecanismo de fomento e de intervenção dos
governos no mercado de crédito. De acordo com Torres Filho (2007), os bancos de
desenvolvimento foram criados a partir da Segunda Guerra Mundial com o objetivo de fornecer
condições para a reconstrução dos países destruídos pela guerra ou para financiar a industrialização
nos países da Ásia e da América Latina.
Bancos de desenvolvimento são “(...) instituições financeiras dedicadas sobretudo à oferta
de financiamentos de capital de longo prazo para projetos dos quais se esperam externalidades
positivas, mas cujo financiamento por parte de credores privados seria insuficiente” (PANIZZA et
al., 2004 citados por TORRES FILHO, 2007, p. 287).
Torres Filho (2007), ao tratar dos bancos de desenvolvimento enfatiza dois aspectos
importantes. O primeiro refere-se ao funding destas instituições. Para exercer adequadamente seu
papel, tais instituições devem buscar fontes de financiamento no mercado doméstico, de modo a não
se tornarem dependentes das fontes externas de recursos. O segundo aspecto diz respeito às
operações de crédito que, por sua vez, afetam a formação dos preços e a quantidade de crédito. Em
outras palavras, o banco de desenvolvimento não opera apenas como mero repassador de recursos
para o setor bancário, mas influencia um dos principais sinais da economia: os preços.
O BNDES, órgão subordinado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio
Exterior, é o principal exemplo de banco público e de desenvolvimento brasileiro, criado para
promover os financiamentos de longo prazo de projetos de investimentos, especialmente nos
setores ligados à indústria e à infra-estrutura.
3
2 BREVE HISTÓRICO DO BNDES
Através da Lei nº 1.628, de 20 de junho de 1952, foi criado o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico (BNDE)3, que tinha como objetivo formular e executar a política
nacional de desenvolvimento econômico. O banco é uma empresa pública de propriedade integral
da União, cujo objetivo é financiar projetos de investimento de longo prazo da economia brasileira
em diversos segmentos, tais como agricultura, indústria, infraestrutura, comércio e serviços. O
banco também fornece financiamentos especiais para as micro, pequenas e médias empresas, além
de linhas de investimentos sociais voltadas a educação e saúde, agricultura familiar, saneamento
básico e transporte urbano (BNDES, 2012). Sua missão é “Promover o desenvolvimento sustentável
e competitivo da economia brasileira, com geração de emprego e redução das desigualdades sociais
e regionais” e sua visão é “Ser o Banco do desenvolvimento do Brasil, instituição de excelência,
inovadora e pró-ativa ante os desafios da nossa sociedade” (BNDES, 2009, s.p.).
Conforme o seu Estatuto atual, o BNDES é o principal instrumento de execução da política
de investimento do Governo Federal e tem por objetivo primordial apoiar programas, projetos,
obras e serviços que se relacionem com o desenvolvimento econômico e social do país (BNDES,
2010b, p. 15). É, portanto, a principal intituição provedora de crédito de longo prazo do Brasil,
atuando em todas as áreas da economia através de uma política que possui três dimensões: social,
regional e ambiental.
Inicialmente, o banco teve forte participação nos investimentos na área de infra-estrutura
do Governo Federal, mas à medida que as empresas estatais foram surgindo, o banco passou a atuar
mais nos empréstimos para o setor privado, principalmente aqueles voltados para a industrialização
do país. De acordo com BNDES (2002, p.2 ):
A criação do BNDE (ainda sem o S), em 1952, representou um marco na jornada para o
desenvolvimento do Brasil. O Banco nasceu da convicção de que o país não podia depender
somente de recursos externos para avançar seu projeto de renovação da infra-estrutura
rodoviária, energética, de portos, e assim melhor competir no mercado internacional.
O BNDES foi fruto da Comissão Mista Brasil-Estados Unidos (CMBEU), criada em 1950,
visando a viabilização do financiamento de projetos no país. Sobre a fundação do BNDES, escreveu
Lessa (1983, p. 21):
Outrossim, diretamente orientado para o propósito do desenvolvimento industrial, foi
incorporado em 1952 o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico, apoiado em
fundos provenientes de empréstimos compulsórios dos contribuintes de imposto de renda,
com o propósito declarado de apoiar a diversificação industrial. Contudo, nos anos iniciais
de vida desta agência, o principal de seus recursos esteve comprometido com o
financiamento dos programas de infra-estrutura e apenas na segunda metade dos anos 50
iria orientar suas atividades para a área propriamente industrial.
O primeiro e único financiamento aprovado pelo BNDES, em 1952, foi para viabilizar as
melhorias da Estrada de Ferro Central do Brasil (compra de vagões, substituição de trilhos, etc.). No
ano seguinte (1953), cinco novos financiamentos foram aprovados: três no Estado do Rio de Janeiro
(Companhia Nacional de Álcalis, Fábrica Nacional de Motores e Superintendência das Empresas
Incorporadoras ao Patrimônio Nacional - SEIPAN), um no Espírito Santo (Usina Rio Bonito) e
outro no Rio Grande do Sul (Viação Férrea do Rio Grande do Sul).
3
Em 1982, devido à inclusão da área social, foi adicionado o “S”, e o banco passou a ser denominado Banco Nacional
de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
4
Os dados da Tabela 1 mostram o volume dos financiamentos liberados pelo banco entre
1952 e 2001. Os valores estão atualizados pelo IGD-DI de dezembro de 2001. Nos primeiros anos,
de consolidação de sua implantação, os valores dos financiamentos do BNDES não são expressivos.
No entanto, verifica-se um significativo aumento a partir de 1957, justamente no período do Plano
de Metas do Governo Juscelino Kubitschek. Durante a década de 1950, 60% dos recursos do banco
foram destinados para a área de infra-estrutura econômica, principalmente energia e transporte. Os
40% restantes foram destinados à industrialização, com destaque para as áreas de papel e siderurgia
(BNDES, 2002). Um salto no volume de financiamentos pode ser verificado na década de 1970,
durante o II Plano Nacional de Desenvolvimento do Governo de Ernesto Geisel.
Com base em Prates et al. (2000) e Hermann (2010), é possível apresentar um breve
resumo da atuação do BNDES no financiamento da economia brasileira. Entre os anos de 1950 e
1970, o banco atuou como o principal financiador da indústria brasileira. 4 Ele teve importância
como o mais importante agente financeiro de fomento do país e suas metas eram definidas de
acordo com os planos de desenvolvimento. Na década de 1950 seu foco foi no setor de infraestrutura; na década de 1960, foi privilegiada a indústria de base, de bens de consumo, as pequenas
e médias empresas e o desenvolvimento tecnológico. Já na década de 1970, o banco atuou nos
setores voltados para insumos básicos e bens de capital.
Durante a década de 1980, conforme ressaltado por Prates et al. (2000), o BNDES passou
por uma “crise de indentidade”. De um lado, devido às crises fiscal e externa e aceleração
inflacionária associadas ao fim do padrão de desenvolvimento da economia brasileira. De outro
lado, por conta das ideias neoliberais que começaram a surgir no fim da década, dentre as quais a
redução da participação do Estado na economia, através dos processos de privatização, e que
tiveram repercussões dentro do banco. Neste período, as políticas de desenvolvimento foram
inviabilizadas e a participação do BNDES foi reduzida devido à forte retração da atividade
econômica. A Tabela 1 mostra a queda do volume de financiamentos do banco: os recursos do
triênio 1980/1982, em relação ao triênio 1977/1979, foram 26% menores. Ainda assim, sua
participação na chamada “década perdida” se deu nos setores de energia, agricultura, integração
competitiva e na área social.
Nos anos 1990, durante o Governo de Fernando Collor de Mello, a atuação do BNDES foi
redefinida em razão da onda neoliberal que se difundia no Brasil, e na aceitação do chamado
Consenso de Washington. Como a presença do Estado no desenvolvimento deveria ser substituída
pela iniciativa privada, ocorreu o processo de privatização das empresas estatais. Ao Estado caberia
o papel de regulador, com o objetivo de estimular a competição e a eficiência dos mercados.
Portanto, o BNDES passou a adotar uma nova estratégia de desenvolvimento, sendo responsável
pela gestão do Plano Nacional de Desestatização (PND), tornando-se o agente financeiro dos
programas de privatização do país, atuando na aquisição e saneamento financeiro das empresas que
seriam vendidas à iniciativa privada. Além disso, também estimulou as exportações e o
desenvolvimento social e urbano. No fundo, o banco reduziu significativamente seu volume de
financiamentos: o quinquênio 1989/1993, em relação ao quinquênio 1984/1988, marcou um
decréscimo dos financiamentos de 49,6%. Já a partir de 1997, ainda conforme Tabela 1, os
financiamentos do banco alcançam valores inéditos. No entanto, os recursos estavam sendo
destinados, principalmente, ao processo de privatização do setor elétrico, e não para investimentos
em novas empresas.
4
O Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal se voltaram predominantemente para os financiamentos ao setor
agrícola e imobiliário, respectivamente (HERMANN, 2010).
5
TABELA 1: Financiamentos do BNDES - em mil US$ e R$ (1952-2001)
Anos
Valores em US$
Valores em R$
1952
0
0
1953
9.234
112.586
1954
11.384
154.989
1955
16.009
228.525
1956
33.723
396.976
1957
58.118
611.976
1958
39.314
617.118
1959
50.490
644.261
1960
50.620
606.069
1961
31.436
394.914
1962
112.981
1.325.817
1963
87.347
871.391
1964
59.326
692.557
1965
113.723
1.242.001
1966
150.242
1.391.902
1967
164.193
1.424.488
1968
136.082
1.224.934
1969
252.193
2.251.178
1970
312.550
2.626.058
1971
428.703
3.439.128
1972
629.481
4.839.225
1973
874.259
6.021.866
1974
1.637.972
9.782.804
1975
1.734.111
15.287.688
1976
3.020.596
15.781.720
1977
3.455.595
16.665.358
1978
4.051.769
18.022.293
1979
4.163.492
17.712.767
1980
3.329.044
13.874.305
1981
3.101.935
10.895.463
1982
4.004.055
13.982.510
1983
3.653.321
16.257.573
1984
3.277.186
14.430.099
1985
3.006.121
13.437.456
1986
3.499.762
14.169.857
1987
4.267.040
15.390.333
1988
4.129.471
12.983.353
1989
3.156.146
7.933.793
1990
3.248.021
6.281.305
1991
3.077.377
6.990.167
1992
3.178.460
7.523.972
1993
3.224.245
6.733.695
1994
5.511.141
10.092.774
1995
7.678.137
12.847.192
1996
9.604.998
15.833.176
1997
16.461.854
27.030.368
1998
16.349.415
27.792.152
1999
9.881.866
23.416.093
2000
12.403.811
26.282.800
2001
10.706.794
26.250.639
Fonte: BNDES (2002).
Obs.: Valores em Reais calculados a partir do IGP-DI de dez/2001.
6
Durante os anos 2000, o BNDES ampliou sua atuação em beneficio das exportações. Além
disso, a partir de 2004, se iniciou um novo ciclo de crescimento, baseado no aumento da renda, do
investimento e da produtividade da economia. Com o Governo Lula, o Estado retomou seu papel
como um importante indutor do crescimento econômico e o banco ganhou mais evidência, no
sentido de dar continuidade à sua função básica de desenvolvimento. Em 2004, o governo lançou a
Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE), com participação direta do
BNDES na sua formulação. Destaca-se também sua atuação no Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC). O banco promoveu a modernização de setores produtivos, de áreas de infraestrutura, exportação, desenvolvimento social e urbano, micro, pequenas e médias empresas,
privatização e mercado de capitais. Por fim, o banco teve importante papel, assim como outros
bancos oficiais, na manutenção do nível dos investimentos durante a fase de escassez de liquidez
pela qual passou o sistema financeiro privado nacional em decorrência da crise financeira
interncional, que teve seu ápice em setembro de 2008. Entre 2004 e 2010, o volume de
financiamentos salta de R$ 40,0 bilhões para R$ 168,4 bilhões, evidenciando o aumento dos
empréstimos do banco nos últimos anos.
3 A ATUAÇÃO DO BNDES NO MERCADO DE CRÉDITO BRASILEIRO NOS ANOS 2000
3.1 A estrutura de funding, a evolução e a distribuição do crédito do BNDES no Brasil
Para que os bancos públicos cumpram sua função para o desenvolvimento de um país, é
importante que sua estrutura de funding esteja fortemente baseada em fundos parafiscais, recursos
próprios do banco e empréstimos de organismos internacionais de desenvolvimento e que as
condições de crédito em termos de prazos (mais longos) e custos (mais baixos) sejam melhores que
aquelas oferecidas pelo setor privado, de modo que possam estimular o investimento (HERMANN,
2010, p. 26).
Araújo (2007), ao tratar do formato de captação de recursos para promover o fomento,
constatou que em muitos países os recursos dos seus bancos de desenvolvimento eram fornecidos
pelas autoridades monetárias. No Brasil, o BNDES teve um padrão de financiamento diferente,
dado que na época de sua criação havia estudos que mostravam o caráter inflacionário do
financiamento via emissão monetária (teoria monetarista) e o descontrole da inflação era fonte de
preocupações das autoridades. Os economistas da tradição heterodoxa, que associavam a inflação a
problemas estruturais e o excesso de moeda um mecanismo de transmissão, também pregavam que
o desenvolvimento deveria ser não inflacionário. Sendo assim, os recursos obtidos pelo banco
deveriam vir de mecanismos que utilizassem poupança compulsória, representada pela criação de
fundos fiscais.
Assim, no que diz respeito à estrutrutura de fundos, o BNDES utiliza em grande parte
recursos parafiscais e próprios. O banco capta de fontes nacionais, tais como o Fundo de Amparo ao
Trabalhador (FAT), Fundo do Programa de Integração Social – Programa de Formação do
Patrimônio do Servidor Público (PIS-PASEP), Fundo de Investimento do Fundo de Garantia
por Tempo de Serviço (FI-FGTS), patrimônio líquido da instituição, Tesouro Nacional,
emissão de debêntures da BNDESpar, fundos públicos de menor porte, como o Fundo da Marinha
Mercante e o Fundo Nacional de Desenvolvimento (FND).
O banco também capta recursos no exterior de agências governamentais e instituições
multilaterais, tais como Banco Mundial, Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Japan
Bank for International Cooperation (JBIC), Banco de Desenvolvimento da China, Banco Alemão de
Desenvolvimento, fundos de mercado, bônus, empréstimos e repasses no exterior (BNDES, 2009).
7
Cabe mencionar que os fundos externos representam uma parcela muito pequena no passivo total do
banco (TORRES FILHO, 2007).
Uma característica relevante das fontes de financiamento do BNDES é que elas não sofrem
com os ciclos de crédito bancário e, portanto, o fornecimento de fundos se mantém relativamente
estável diante das oscilações da oferta de crédito dos demais bancos. A estrutura de capital do banco
é ilustrada pelo Gráfico 1. Nota-se que tanto em dezembro de 2007 quanto em dezembro de 2008,
os recursos oriundos do FAT tinham proporções mais elevadas, 52,3% e 42,0%, respectivamente.
Em 2009, em razão dos empréstimos do Tesouro Nacional ao BNDES, estes passaram a ter maior
representatividade. Como se vê, em junho/2011, cerca de 50% do funding do banco foi fornecido
pelo Tesouro. Essa é uma questão que tem gerado muita discussão, em razão do diferencial de taxa
de juros paga pelo Tesouro para captar recursos via emissão de títulos (a taxa Selic) e a que o
BNDES cobra pelos empréstimos concedidos (TJLP). Mais adiante, essa questão será retomada.
Gráfico 1: Estrutura de capital do BNDES (2007-2011)
Fonte: BNDES (2011, slide 44).
Quanto ao custo dos financiamentos, o BNDES cobra taxas mais baixas que a dos bancos
privados e dos demais bancos públicos (Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil). O custo
básico dos empréstimos concedidos pelo banco é definido pela taxa de juros de longo prazo
(TJLP)5, que desde julho de 2009 tem sido fixada em 6% ao ano mais um spread, cujo valor é
muito menor que aquele praticado no mercado bancário. Com custos financeiros menores, os níveis
de inadimplência no BNDES são baixos (Gráfico 2), sobretudo em comparação com o que vigora
no resto do setor bancário. Por exemplo, em 2011, enquanto a taxa média de inadimplência no
BNDES era de 0,14%, a taxa do Sistema Financeiro Nacional era de 3,6%. Ademais, vale ressaltar
também que os níveis mais baixos de inadimplencia do banco também se devem à sua capacidade
de analisar o risco de crédito. Conforme Torrres Filho (2009), a qualidade do crédito originado pelo
BNDES é alta visto que boa parte dos credores são instituições financeiras e grandes empresas que
possuem um relacionamento de longo prazo com o banco.
5
A TJLP é fixada pelo Conselho Monetário Nacional e tem período de vigência de um trimestre-calendário.
8
3,50
3,10
3,00
2,50
2,00
1,50
1,00
0,60
0,50
0,90
0,80
0,30
0,50
0,60
0,70
0,10
0,15
0,20
0,15
0,14
0,00
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011
Gráfico 2: Taxa média de inadimplência do BNDES (1999-2011)
Fonte: Dados até 2007, obtidos de Torres Filho (2009, p. 47); dados a partir de 2008, obtidos de
BNDES (2011).
É comum a afirmação de que o crédito no Brasil é caro, escasso e muito volátil quando são
feitas comparações internacionais. De fato, o Brasil ainda apresenta uma baixa relação crédito/PIB
(49,1% em dezembro de 2011) em relação a alguns países desenvolvidos e em desenvolvimento.
Conforme exposto na Tabela 2, há casos em que o crédito supera o PIB: Canadá (153%), Coréia do
Sul (163%), Estados Unidos (187%), China (130%) e França (103%), por exemplo. Entre alguns
países emergentes, notam-se altas proporções: Chile (80%) e Índia (76%).
Tabela 2: Relação Crédito Total/PIB (%) – Países selecionados
9
A evolução do crédito ao setor privado como proporção do PIB no Brasil, entre janeiro de
2001 e dezembro de 2011, é visualizada no Gráfico 3. No período de 2001 a 2005, o crédito em
relação ao PIB ficou estacionado em torno de 25%. Esta tendência foi modificada a partir de 2006,
quando o volume de crédito em relação ao PIB deu saltos expressivos, chegando a 49% em
dezembro de 2011. Mesmo com este crescimento dos últimos anos, o Brasil continua com uma
modesta relação crédito/PIB em termos internacionais.
60,00
50,00
40,00
30,00
20,00
10,00
2000.06
2000.11
2001.04
2001.09
2002.02
2002.07
2002.12
2003.05
2003.10
2004.03
2004.08
2005.01
2005.06
2005.11
2006.04
2006.09
2007.02
2007.07
2007.12
2008.05
2008.10
2009.03
2009.08
2010.01
2010.06
2010.11
2011.04
2011.09
0,00
Gráfico 3: Evolução do crédito ao setor privado no Brasil - em % do PIB (2001-2011)
Fonte: Banco Central do Brasil (2012).
O Gráfico 4, mostra a evolução do crédito concedido pelo BNDES como proporção do
PIB, que evoluiu de 5,0% em 2000, para 9,6%, em julho de 2011. O comportamento desse
indicador ao longo do período permite fazer as seguintes observações. Entre 2000 e 2003, período
de crise econômica e consequente restrição creditícia, a relação crédito do BNDES/PIB aumentou 1
ponto percentual (p.p.), passando de 5,0% em 2000 para 6,0% em 2003. De 2004 a 2007, período
caracterizado pela recuperação da atividade econômica, tal relação manteve uma tendência de
estabilidade, aumentando apenas 0,3 p.p. Em seguida, a participação do BNDES no crédito como
proporção do PIB volta a elevar-se, de 6,0% (2007) para 9,6% (julho/2011), o que se deve ao
esforço do governo brasileiro no direcionamento do crédito para conter os efeitos negativos da falta
de recursos na economia que caracterizou o período. E, como será visto, o BNDES foi vital para
compensar a falta de liquidez no mercado e garantir a manutenção dos investimentos.
10
12,0%
9,7%
10,0%
8,0%
6,9%
5,8%
6,0%
9,6%
8,9%
5,0%
5,4%
2000
2001
6,0%
5,7%
5,7%
5,8%
6,0%
2003
2004
2005
2006
2007
4,0%
2,0%
0,0%
2002
2008
2009
2010
jul/11
Gráfico 4: Evolução do crédito do BNDES - Em % do PIB (2000-2011)
Fonte: Lamenza; Pinheiro; Giambiagi (2011, p. 48).
O Gráfico 5 apresenta os desembolsos concedidos pelo BNDES no período compreendido
entre os anos de 2000 e 2011. Observa-se que a participação do banco no financiamento da
economia brasileira vem se consolidando com a ampliação contínua da liberação de recursos,
especialmente nos últimos três anos, em que o montante dos desembolsos superou os cem bilhões
de reais.
Gráfico 5: Evolução dos desembolsos do BNDES - em R$ bilhões (2000-2011)
Fonte: BNDES (2012).
O Gráfico 6 mostra a distribuição dos desembosos concedidos pelo BNDES por setor de
atividade desde 2002 até junho de 2011. Nota-se que os financiamentos realizados pelo banco se
concentram majoritariamente nos setores da indústria e da infra-estrutura.
11
Gráfico 6: Participação percentual dos desembolsos do BNDES por setor de atividade (2002-2011)
Fonte: BNDES (2011).
Merece destaque uma importante alteração que vem sendo observada no que diz respeito
ao porte da empresa que é atendida pelo BNDES. Os desembolsos concedidos pelo banco eram
predominantemente voltados para as grandes empresas, sobretudo no período do II Plano Nacional
de Desenvolvimento. Esta característica dos empréstimos vem se alterando, principalmente a partir
dos anos 2000. Cada vez mais o banco aumenta suas operações com as micro, pequenas e médias
empresas (MPME´s) e pessoa física. O Gráfico 7 ilustra a distribuição dos empréstimos concedidos
pelo banco por porte de empresa.
Vale ressaltar que apesar da necessidade de o BNDES reduzir sua participação no total de
crédito da economia brasileira em 2011, dada a recuperação do mercado privado de crédito e as
pressões inflacionárias, neste ano específico, R$ 49,8 bilhões foram liberados para as MPME´s.
Esse montante representou cerca de 36% do total de desembolsos feito pelo banco. Esta proporção
foi a maior da história da instituição para um ano completo (BNDES, 2012).
12
Gráfico 7: Distribuição percentual dos empréstimos do BNDES de acordo com o porte da empresa
(2002-2011)
Fonte: BNDES (2012).
3.2 A função anticíclica do BNDES na economia brasileira nos anos 2000
O BNDES tem desempenhado uma importante função anticíclica no mercado de crédito
nacional. Tal mercado é extremamente volátil em razão de uma série de riscos: de crédito, de
liquidez, de juros e de câmbio 6. Portanto, as vulnerabilidades desse mercado levam os bancos
privados a responder de forma procíclica diante do comportamento da atividade econômica. Se a
economia vai bem, os financiamentos como um todo se expandem. Mas se a economia vai mal, há
uma retração dos empréstimos. Sendo assim, o BNDES vem agindo de modo a estabilizar a oferta
de fundos e manter os investimentos produtivos da economia. As fontes de recursos do banco são
consideradas estáveis, e tal característica fornece condições para que ele exerça sua função
contracíclica no mercado de crédito, a qual é dividida em duas partes:
A primeira está relacionada à função econômica cumprida pela instituição: garantir fundos
em moeda nacional para investimentos de longo prazo. Dada a autonomia de seu funding e
de sua liquidez em face do mercado, a capacidade de financiamento do BNDES não é
muito afetada pelo ciclo de crédito do mercado. O impacto maior do ciclo sobre o BNDES
se faz sentir pelo lado da demanda. Flutuações relevantes no crédito afetam os níveis de
investimento das empresas e, em consequência, as atividades do banco. Sua ação a esse
respeito é, basicamente, dar continuidade aos projetos em curso e, sobretudo, evitar que
uma eventual escassez de fundos de longo prazo se torne um elemento adicional de
desaceleração do investimento. (...) A segunda parte da análise diz respeito ao curto prazo.
Diante de relativa inelasticidade de suas fontes de recursos e de liquidez, a atuação do
BNDES pode ter foco anticíclico, em particular nas fases descendentes da economia. Essa
6
Risco de crédito, quando o tomador de crédito não honra os pagamentos devidos. Risco de liquidez, associado ao
descasamento de prazos entre os ativos e passivos. Risco de juros e de câmbio, resultantes de uma variação
desfavorável da taxa de juros e da taxa de câmbio, respectivamente.
13
ação depende de políticas de crédito específicas e da resposta dos investidores aos
incentivos criados (TORRES FILHO, 2007, p. 300-301).
Nos anos 2000, diante de eventos que afetaram o mercado de crédito e consequentemente o
financiamento da economia brasileira, o BNDES teve oportunidade de agir de modo anticíclico. Por
exemplo, devido ao aumento do risco Brasil e da crise de confiança político-eleitoral que afetou o
país em 2002, os bancos estrangeiros suspenderam suas linhas de crédito para o financiamento das
exportações. O Banco Central e o BNDES agiram para fornecer os recursos para que os bancos
brasileiros concedessem os empréstimos necessários às empresas e reduzissem assim os efeitos da
redução da liquidez. De acordo com os dados obtidos de Torres Filho (2006), entre junho/2001 e
junho/2002, o crédito ao setor privado como proporção do PIB reduziu-se de 29,1% para 23,8%.
Nesse mesmo período, a participação do BNDES no crédito total foi mantida, o que contribuiu para
o não agravamento da oferta de crédito, evitando a paralisação de uma série de projetos de
investimentos. O BNDES também financiou as empresas do setor elétrico que estavam passando
por problemas na época (crise do “apagão” de 2001) e tiveram dificuldades de obter empréstimos
nas instituições privadas.
Dados extraídos de Sant´anna (2009), também ilustram o papel do BNDES como
estabilizador no mercado de crédito. O Gráfico 8 mostra claramente que, entre junho/2000 e
junho/2006, enquanto a relação crédito/PIB para a economia estava baixa, o crédito fornecido pelo
BNDES em relação ao crédito total estava em alta (BNDES/Crédito). A partir de então, com a
recuperação do crédito total, a relação BNDES/crédito se reduz. Desse modo, o crédito fornecido
pelo BNDES como proporção do crédito total ao setor privado aumentou de 18,1%, em abril de
2001, para 24,3%, em março de 2003. Desde então, tal participação foi sendo reduzida à medida
que a situação econômica melhorava e os bancos retomavam suas funções de emprestadores.
Gráfico 8: A função estabilizadora do BNDES no mercado de crédito (2000-2008)
Fonte: Sant´anna et al. (2009, p. 166).
No entanto, a partir de setembro de 2008, com o agravamento da crise financeira
internacional (desencadeada pelo mercado subprime dos Estados Unidos) e a consequente redução
da liquidez externa, o governo teve que atuar de forma a minimizar os efeitos da restrição do
crédito. No que diz respeito ao BNDES, houve ampliação das linhas de financiamento às
exportações e ao capital de giro, e o banco foi responsável por cerca de um terço da expansão do
14
crédito no país. Em setembro de 2008, o BNDES respondia por apenas 16% da oferta de crédito ao
setor privado. Mas com o agravamento da crise financeira internacional, a participação do BNDES
sobe para 17% em dezembro do mesmo ano.
Outro exemplo que ilustra o papel ativo do BNDES em momentos de crise é a contribuição
dos bancos no que diz respeito à expansão do crédito entre setembro e dezembro de 2008. Os
bancos privados responderam por 32% e os bancos públicos por 68%, sendo que desse total o
BNDES respondeu por 32 pontos percentuais da variação líquida do total de crédito na economia no
período. Vale ainda destacar que a participação das operações de crédito do BNDES no PIB
aumentou de 4,5%, em 2000, para 6,0%, em setembro de 2008, e para 7,0%, em dezembro de 2008
(SANT´ANNA, 2009). Assim, o BNDES teve um papel essencial para reduzir os efeitos da retração
do crédito privado na economia brasileira neste período de crise: “Um dos grandes diferenciais da
economia brasileira frente a outros países no processo de enfrentamento da crise financeira
internacional foi justamente essa atuação anticíclica do sistema público de crédito” (PUGA;
BORÇA JR., 2011, p. 2).
Um estudo realizado por Micco e Panizza (2004) sobre o papel anticíclico dos bancos
públicos, citado por Cintra (2009), mostra que os empréstimos concedidos por estes bancos são
84% menos procíclicos do que o dos bancos privados. Desse modo, os bancos públicos reduzem
menos as operações de crédito nas fases recessivas, quando os bancos privados, mais avessos ao
risco, aumentam a preferência pela liquidez; já nas fases expansionistas, os bancos públicos
aumentam seus empréstimos relativamente menos que os bancos privados. Deste modo, os bancos
públicos atuam como importantes estabilizadores da oferta de crédito através de sua função
anticíclica.
A partir de 2010, novamente o BNDES precisou atuar de forma anticíclica. Desta vez,
reduzindo suas operações de crédito visando contribuir com a política econômica do Governo
Federal. Para evitar um descontrole inflacionário, foi necessário “esfriar” o crescimento da demanda
agregada, e nessa situação foi preciso reduzir o montante de empréstimos. De acordo com Puga e
Borça Jr. (2011), o BNDES atuou em conjunto com a autoridade monetária de modo a evitar
pressões inflacionárias. Portanto, a participação dos empréstimos concedidos pelo BNDES no total
de crédito diminuiu de 21,2%, em dezembro de 2010, para 20,3%, em maio de 2011.
A atuação anticíclica do BNDES na economia brasileira, especialmente quando do
agravamento da crise financeira internacional, no segundo semestre de 2008, teve de contar com o
aporte de recursos do Tesouro Nacional. O Governo Federal concedeu empréstimos de R$ 180
bilhões ao BNDES, entre os anos de 2009 e 20107, com prazos variando de 20 a 40 anos e custo
principal conforme a TJLP 8. Analistas de mercado criticaram tal medida porque consideraram que
foi dada ao banco uma possibilidade de financiamento um tanto quanto infinita e prejudicial aos
cofres públicos (É BOM QUE ..., 2010). Para Gerardo (2010), citado por Lacerda e Oliveira (2011),
os efeitos negativos sobre as contas públicas gerariam um menor superávit primário do Governo
Federal. Isto aconteceria porque os empréstimos foram feitos ao BNDES a taxas de juros abaixo
daquelas que o Tesouro Nacional paga para captar recursos no mercado. Segundo Oliveira (2011), o
Tribunal de Contas da União (TCU) chegou a realizar uma auditoria para avaliar os benefícios para
o Tesouro Nacional de tal empréstimo e os custos dos subsídios. O próprio BNDES também
realizou um estudo intitulado “Benefícios dos Empréstimos do Tesouro ao BNDES” para mensurar
os custos fiscais e os benefícios dessa operação.
7
No início de 2009, o Tesouro Nacional repassou R$ 100 bilhões para assegurar o funding para que o banco
viabilizasse sua política anticíclica por conta dos efeitos da crise financeira mundial. Em 2010, o Tesouro repassou
outros R$ 80 bilhões.
8
Vale mencionar que a retração dos investimentos, de 2005 para 2006, por causa da elevação da taxa básica de juros no
Brasil, fez com que o BNDES elevasse seus financiamentos, principalmente para o PAC (Plano de Aceleração do
Crescimento). Tal procedimento contribuiu para esgotar o potencial de financiamento do banco no final de 2007. Diante
das dificuldades durante o ano de 2008, o BNDES teve que recorrer ao empréstimo do Tesouro Nacional para poder
contribuir com a recuperação da economia brasileira, especialmente nos momentos mais críticos da crise financeira
mundial.
15
De acordo com BNDES (2010a) e Coutinho (2011), o custo direto para o Tesouro
Nacional deve-se à diferença entre a taxa de juros cobrada pela União ao BNDES e a que o Tesouro
obtém no mercado para captar recursos (Taxa Selic). O BNDES repassa os recursos e cobra a TJLP
mais o spread de risco, que varia conforme o projeto. Para o Tesouro há um custo elevado, que
equivale ao valor presente da diferença entre as taxas de remuneração dos ativos e passivos. No
estudo feito pelo BNDES, foi estimado que ao final do empréstimo o banco teria um lucro em valor
presente de R$ 37,1 bilhões, os quais voltariam para a União através de dividendos ou capitalização
do próprio banco. Para Oliveira (2011, s.p.), o relatório do TCU afirma que: “As operações
subsidiadas do Tesouro Nacional com o BNDES, ao mesmo tempo em que criam um custo fiscal
para o Tesouro, acarretam um aumento do lucro da instituição financeira, que termina por se tornar
receita de dividendos para o Tesouro”. Outros benefícios referem-se à possibilidade de manutenção
do financiamento na economia brasileira, visto que várias fontes “secaram” e o banco havia
esgotado seu potencial de empréstimo na época.
Assim, os investimentos realizados contribuíram para aumentar o PIB e a arrecadação de
impostos no curto prazo. Além disso, aumentava a capacidade produtiva potencial da economia de
modo mais permanente, o que geraria uma maior arrecadação no longo prazo (BNDES, 2010a).
Portanto, os benefícios superariam os custos, pois sem os aportes de recursos do Tesouro ao
BNDES, não teria sido possível ao banco realizar os desembolsos da época. Sem tais recursos, o
crescimento do PIB ficaria ainda mais comprometido em 2009, intensificando as perdas em termos
fiscais, de emprego e de renda. Segundo Coutinho (2011, p. 415), “O efeito positivo da criação e
manutenção da renda compensou o ônus fiscal embutido”.
A despeito dos custos citados, acredita-se que os benefícios são suficientes para superá-los.
É inegável que os empréstimos do Tesouro ao BNDES, em um momento de crise financeira,
marcada pela escassez de recursos tanto no mercado interno quanto externo, mantiveram a oferta de
fundos para garantir os investimentos e assim diminuir os efeitos negativos no curto prazo sobre a
economia brasileira, minimizando os impactos sobre o emprego e a renda. Conforme Lacerda e
Oliveira (2011), com a crise financeira internacional de 2008, veio à tona o papel essencial do
BNDES (e dos demais bancos públicos) enquanto instrumento de política macroeconômica
anticíclica. Vale mencionar que foi muito comentado na mídia que o Brasil conseguiu superar mais
rapidamente os efeitos da crise porque tinha um banco como o BNDES, ao contrário de outros
países que sofreram com a escassez de crédito.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O BNDES teve um papel essencial no desenvolvimento industrial brasileiro. Ele ainda hoje
é a principal instituição fornecedora de financiamento de longo prazo no país, com taxas de juros
mais adequadas e muito abaixo daquelas praticadas pelo sistema bancário. Através do BNDES, o
Governo Federal também dispõe de um importante instrumento de política econômica. Quando de
sua criação, seu objetivo era estimular o desenvolvimento de setores que ainda não existiam no país.
Outro objetivo do banco era o de atuar complementando o sistema de financiamento, visto que a
operacionalização de alguns segmentos da atividade econômica requeria empréstimos de longo
prazo, a custos mais competitivos. Como o setor financeiro privado é mais avesso ao risco e, de
modo geral, não tem interesse em atuar nestes segmentos, coube ao setor público, através do
BNDES, preencher essa lacuna.
Na ausência do BNDES, diversos setores não teriam obtido os recursos necessários para a
realização dos seus projetos de investimentos, o que teria impactado negativamente sobre o
desenvolvimento da economia brasileira. Ao longo de sua história, o BNDES foi ampliando sua
base de atuação. Foi crucial no processo de industrialização do país, apoiando os investimentos em
infra-estrutura, indústrias de base, máquinas e equipamentos. Atuou no financiamento da
16
privatização e constitui-se numa importante fonte de recursos para o financiamento de longo prazo
das grandes empresas.
A partir de meados dos anos 2000, observou-se uma tendência de crescimento das
operações do BNDES, graças ao novo ciclo de investimento por que passa a economia brasileira
desde 2004. Muitos desses investimentos estão concentrados em áreas ligadas à infra-estrutura,
cujos projetos são de longo prazo e de alto risco, requerendo empréstimos também de longo prazo.
Apesar dos financiamentos concedidos pelo BNDES se concentrarem nas grandes empresas,
recentemente tem havido uma maior participação da instituição junto às micro, pequenas e médias
empresas, o que também contribui para o crescimento do país, visto que a maior parte dos empregos
é gerada por essas empresas.
Também nos anos 2000, veio à tona uma função pouco conhecida do BNDES (e dos
demais bancos públicos), que é sua capacidade de atuar de modo anticíclico no mercado de crédito.
O papel anticíclico do BNDES contribuiu para garantir a oferta de recursos para os investimentos
produtivos na economia nos períodos de 2002/2003 e 2008/2010, e assim diminuir os efeitos da
escassez de recursos durante as fases de forte retração do mercado financeiro.
Com o esgotamento de seus recursos, na crise de 2008/2010, foi essencial a participação do
Tesouro Nacional como uma nova fonte de funding do banco. A despeito das críticas sobre a
relação Tesouro-BNDES e dos subsídios por trás dessa relação, acredita-se que os benefícios em
subsidiar os investimentos (que geram emprego, renda e maior arrecadação tributária) superam os
custos fiscais iniciais. Sendo assim, o fato de o Brasil possuir um banco público de
desenvolvimento constitui-se num instrumento essencial para atuação do Estado na economia. E o
BNDES tem cumprido seu papel no estímulo ao desenvolvimento do país, visto que apesar dos
avanços recentes, o crédito de longo prazo a taxas de juros mais baixas ainda é escasso tanto para as
grandes empresas quanto para as pequenas e medias.
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