Relato de Caso Ameloblastoma multicístico em mandíbula: Relato de caso Daniel Santiago Vale 1 Marcelo Marotta Araujo 2 Lúcio Murilo dos Santos 3 Marcus Antônio Brêda Jr 4 Milkle Bruno Pessoa Santos 1 Multicystic ameloblastoma in mandible: Case report Resumo Abstract O ameloblastoma é uma neoplasia odontogênica benigna de origem epitelial com comportamento localmente agressivo. Acomete predominantemente a mandíbula e pode atingir proporções variadas de acordo com o tempo de evolução. Manifesta-se geralmente entre a terceira e quarta décadas da vida. O diagnóstico é realizado através da anamnese, exame físico, exames de imagens e confirmado pela biópsia incisional da lesão. Pacientes com ameloblastoma do tipo multicístico têm sido tratados de diversas maneiras e a melhor forma de tratamento vem sendo motivo de controvérsias há vários anos devido ao alto potencial de recidiva deste tumor. O tratamento varia de simples enucleação e curetagem a ressecção total da lesão. O objetivo deste estudo é relatar um caso clínico de ameloblastoma musticístico em mandíbula tratado com ressecção marginal e fixação de placa de reconstrução para reforço ósseo. Atualmente o paciente se encontra há 1 ano sem sinais de recidiva, e ausências de alterações estéticas e funcionais. Descritores: Odontogênicos. Ameloblastoma; Neoplasias; The ameloblastoma is a benign odontogenic tumor of epithelial origin with aggressive local behavior. It predominantly affects the jaw and can reach proportions varied according to time of evolution. Gave its assent usually between the third and fourth decades of life. The diagnosis is made by history, physical examination, imaging and confirmed by biopsy of the lesion. Patients with type multicystic ameloblastoma have been treated in various ways and the best form of treatment has been the subject of controversy for several years due to the high potential for recurrence of this tumor. Treatment varies from simple enucleation and curettage to total resection of the lesion. The aim of this study is to report a case of multicystic ameloblastoma of the mandible treated with marginal resection and using reconstruction plate fixation for bone strengthening. Currently the patient is 1 year with no signs of recurrence, and absence of cosmetic and functional complaints. Key words: Ameloblastoma; Neoplasms; Odontogenic Tumors. Tumores INTRODUÇÃO O ameloblastoma pode se originar de remanescentes da lâmina dentária, do órgão do esmalte em desenvolvimento, do revestimento epitelial de cistos odontogênicos ou das células da camada basal da mucosa bucal1. Estes tumores são de crescimento lento, localmente invasivo, que tem um curso benigno na maioria dos casos5. Os ameloblastomas ocorrem em três diferentes situações clínico-radiográficas, que merecem considerações em separado por causa do tratamento e prognóstico diferentes. Tais situações são: 1) Sólido convencional ou multicístico (92% dos casos), 2) Unicístico (6% dos casos) e 3) Periférico ou extraósseo (2% dos casos). Sendo o tipo multicístico o mais agressivo entre as três variantes4. O objetivo deste estudo é relatar um caso clínico de ameloblastoma musticístico em mandíbula tratado com ressecção marginal e fixação de placa de reconstrução para reforço ósseo. Atualmente o paciente se encontra há 1 ano sem sinais de recidiva, e ausência de alterações estéticas e funcionais. RELATO De CASO Paciente, gênero masculino, leucoderma, 45 anos, procurou o serviço de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial, queixando-se de aumento de volume intra-bucal na região mandibular posterior direita, assin- 1)Residente do Serviço de CTBMF do Hospital Policlin/Clínica Prof. Dr. Antenor Araújo. Residente R1. 2)Professor Doutor da Faculdade de Odontologia Unesp-SJC e Professor da Residência de CTBMF Hospital Policlin / Clínica Prof. Dr. Antenor Araújo. 3)Professor Doutor da Faculdade de Odontologia Unesp-SJC e Cirurgião de Cabeça e Pescoço. 4)Residente do Serviço de CTBMF do Hospital Policlin/Clínica Prof. Dr. Antenor Araujo. Residente R3. Instituição: Residência de CTBMF Hospital Policlin/Clínica do Prof. Dr. Antenor Araújo. São José dos Campos / SP - Brasil. Correspondência: Daniel Santiago Vale – Rua Dr. Gaspar Rezende, N. 95 – Jardim Bela Vista (Centro) – São José dos Campos / SP – Brasil – CEP: 12209-140 – E-mail: [email protected] Recebido em 12/01/2010; aceito para publicação em 23/05/2010; publicado online em 20/07/2010. Confilto de interesse: não há. Fonte de fomento: não há. 146 R������������������������������������������������������������� Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v.39, nº 2, p. 146-148, abril / maio / junho 2010 Ameloblastoma multicístico em mandíbula: Relato de caso. Vale et al. Figura 1. Aspecto clínico pré-operatório. Figura 2. Reconstrução em 3D de TC. Figura 3. Aspecto trans-operatório. tomática com aumento progressivo há 3 anos (Figura 1). A biópsia do tipo incisional por acesso intra-bucal foi realizada e o diagnóstico do exame histopatológico foi compatível com ameloblastoma do tipo folicular. Nos exames imaginológicos, nota-se uma lesão radiolúcida multilocular envolvendo o corpo, ângulo e ramo ascendente do lado afetado assim como a íntima relação da lesão com o terceiro molar inferior direito incluso (Figura 2). O planejamento cirúrgico, feito juntamente com o Cirurgião de Cabeça e Pescoço, foi composto de acesso orofacial com abertura melolabial estendendo-se pela região submandibular até o ramo ascendente de mandíbula, com exposição completa da Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v.39, nº 2, p. 146-148, abril / maio / junho 2010 Figura 4. Relação do elemento dentário 48 com a lesão. hemimandíbula direita (Figura 3), sendo o tumor ressecado com margem tridimensional incluindo cortical superior e porção medular do corpo mandibular e ramo ascendente, preservando-se a cortical óssea inferior e posterior do ramo ascendente (Figura 4) e fixação de placa de reconstrução do tipo Locking de 2.7. mm sobrepondo a cortical óssea inferior residual (Figura 5). O exame anatomopatológico revelou margens cirúrgicas livres de comprometimento neoplásico e ausência de infiltração angiolinfática e perineural detectáveis. Atualmente o paciente apresenta 1 ano de preservação sem sinais de recidiva, e ausência de alterações estéticas e funcionais (Figura 6). –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– 147 Ameloblastoma multicístico em mandíbula: Relato de caso. Vale et al. Figura 5. Fixação da placa de reconstrução. Figura 6. Aspecto radiográfico pós-operatório de 01 ano. DISCUSSÃO recorrência de aproximadamente 15% tem sido relatada após a ressecção marginal, sendo então, preconizado que a margem de segurança deva ser de pelo menos 1 cm além dos limites radiográficos1. As vantagens dos tratamentos cirúrgicos menos extensos são significativas, tendo em vista que o tratamento menos radical como a ressecção marginal da mandíbula reduz sequelas como: deformidade facial, disfunção mastigatória, movimento anormal da mandíbula3,5 e a necessidade de outras cirurgias reconstrutivas3. Conclui-se que a decisão terapêutica deve avaliar situações como morbidade do método de tratamento e a qualidade de vida na reabilitação dos pacientes5. O ameloblastoma intra-ósseo multicístico ou sólido convencional é encontrado mais comumente entre a terceira e a quarta décadas de vida2, sem predileção de raça e sexo1,2. Cerca de 85% dos ameloblastomas convencionais ocorrem na mandíbula, mais frequentemente na região de molares e ramo ascendente. A tumefação ou a expansão do maxilar são manifestações clínicas comuns. A dor e parestesia são incomuns, mesmo em tumores com grandes dimensões1. O aspecto radiográfico mais característico é uma lesão radiotransparente multilocular, e muitas vezes é descrita como tendo o aspecto de “bolha de sabão”, quando são loculações grandes e quando pequenas, são descritas como “favo de mel”. Frequentemente há a expansão da cortical lingual e/ou vestibular. É comum a reabsorção das raízes de dentes adjacentes a lesão. Em muitos casos, um dente incluso, na maioria das vezes um terceiro molar inferior, está associado com a lesão. O diagnóstico diferencial pode ser feito com outras lesões multiloculares, como: ceratocisto, mixoma, tumor de Pindborg, hemangioma central, carcinoma mucoepidermoide intra-ósseo, entre outros1. A melhor forma de tratamento vem sendo motivo de controvérsias há vários anos. O ameloblastoma convencional tende a se infiltrar entre as trabéculas ósseas do osso esponjoso na periferia da lesão, antes da reabsorção óssea ficar visível radiograficamente. Portanto a verdadeira margem do tumor muitas vezes estende-se além da aparente margem clínica ou radiográfica3. Elevado potencial de recidiva (60 a 80%) após tratamento simples com enucleação ou curetagem é evidenciado; sendo assim, em função disto, o mesmo requer tratamento mais agressivo2. A ressecção marginal é a forma de tratamento mais amplamente utilizada, porém uma 148 R������������������������������������������������������������� Conclusão O tratamento do ameloblastoma multicístico em mandíbula através do método de ressecção marginal com margem de segurança pode ser utilizado, a fim de evitar mutilações por um tratamento mais radical, como a ressecção parcial. No caso descrito, a conduta conservadora de ressecção mostrou-se efetiva até o momento. REFERÊNCIAS 1. Neville BW, Damn DD, Allen CM, Bouquit JE. Patologia Oral & Maxilofacial. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan 2ª Edição; 2004. 2. Pogrel MA, Montes DM. Is there a role for enucleation in the management of ameloblastoma? Int Jor Oral Maxillofac Surg. In Press, 2009. 3. Bataineh AB. Effect of preservation of the inferior and posterior borders on recurrence of ameloblastomas of the mandible. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod 2000;90:155–163. 4. Carlson ER, Marx RE. The ameloblastoma: primary, curative surgical management. J Oral Maxillofac Surg 2006;64:484–494. 5. Nakamura N, Higuchi Y, Mitsuyasu T, Sandra F, OhIishi M. Comparison of longterm results between different approaches to ameloblastoma. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod 2002;93:13–20. Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v.39, nº 2, p. 146-148, abril / maio / junho 2010