Artigo 16

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Artigo de Revisão
Tratamento de ameloblastoma
Karima Yustra Jaber1
Laurindo Moacir Sassi2
Sérgio Altino Franzi3
Treatment of ameloblastoma
RESUMO
O ameloblastoma é um tumor odontogênico da maxila e da
mandíbula, sendo indolor; é benigno e incide mais em mandíbula.
São lesões localizadas e tumores odontogênicos agressivos.
Apresenta alto índice de recidiva. O cirurgião dentista tem um papel
importante no diagnóstico dessas lesões por meio do uso da
radiografia panorâmica, que é importante instrumento no
diagnóstico diferencial. O aspecto radiográfico de favos de mel ou
de bolhas de sabão é o principal indício de sua presença. A
presença de reabsorções e deslocamentos dentários deve ser
considerada também. O ameloblastoma unicístico pode ser
confundido clinica e radiograficamente com cisto dentígero e este
ocorre em jovens e, entre a segunda e terceira década de vida.
Inúmeras alternativas de tratamento têm sido propostas na
literatura e, destas, as técnicas de ressecção demonstram
melhores resultados em relação ao índice de recidiva e sobrevida
do paciente.
Descritores: Ameloblastoma. Neoplasias Mandibulares.
Neoplasias Maxilares. Procedimentos Cirúrgicos Reconstrutivos.
INTRODUÇÃO
O ameloblastoma é um tumor odontogênico da maxila e da
mandíbula. Representa aproximadamente 1% de todos os
tumores e cistos dos ossos faciais. Tem origem
preferencialmente nas regiões molares e pré-molares.
Caracteriza-se por crescimento lento e indolor e é
frequentemente diagnosticado devido ao aumento de volume
local ou por meio de radiografia de rotina1.
O ameloblastoma é um tumor odontogênico benigno, derivado
da lâmina basal, de alta taxa de recidiva e possui uma
frequência de localização, na mandíbula, quatro vezes maior
do que na maxila2. Embora benignos, são lesões localizadas e
tumores odontogênicos agressivos. Sua presença associada
com radiolucidez pericoronal em terceiros molares impactados
é bem documentada, embora rara. Logo, a apresentação
associada à radiolucidez pericoronal em dentes impactados
pode confundir o dentista clínico3.
REVISÃO DA LITERATURA E DISCUSSÃO
Inúmeras técnicas têm sido propostas na literatura para o
ABSTRACT
Ameloblastoma is a painless odontogenic tumor of the jaws. It is
benign and occurs more often in the mandible. They are localized
and aggressive lesions. Clinicians have an important role in the
diagnosis of such lesions, through the use of the panoramic X-rays,
which is an important tool for their the differential diagnosis. The
radiographic aspect of honey combs or soap bubbles under the
panoramic X-rays is the main indication of its presence. The
presence of reabsorption and dental displacement areas should
also be considered in the differential diagnosis. The unicystic
ameloblastoma can be misleading with dentigerous cyst, and it
happens in youngsters, between second and third decade of life.
Several treatment approaches have been proposed in the
literature, and of those, the resective techniques described have
been demonstrating better results in relation to the recurrence of
the lesion and for the long-term results.
Key words: Ameloblastoma. Mandibular Neoplasms. Maxillary
Neoplasms. Reconstructive Surgical Procedures.
tratamento de ameloblastomas em mandíbula.
A reabilitação de paciente submetido à ressecção segmentar de
mandíbula para tratamento de ameloblastoma com o uso de
enxerto autógeno de ilíaco e implantes mediatos tem sido
proposta4. Após a ressecção do tumor, enxerto autógeno de
ilíaco foi colocado na mandíbula para posterior (um ano e seis
meses) colocação de implantes endósseos.
A técnica de distração óssea também foi proposta a fim de
promover a osteogênese após a ressecção de ameloblastoma
em mandíbula e posterior colocação de implantes endósseos. A
distração foi realizada em dois estágios devido à curvatura
mandibular. Após dez meses da primeira cirurgia de distração,
uma segunda cirurgia de distração foi realizada e, três meses
depois de consolidado o osso, sete implantes endósseos foram
instalados na mandíbula. Três meses após a instalação desses
implantes, as próteses implanto-suportadas foram instaladas.
Três anos após sua instalação, as próteses estavam estáveis e
não apresentavam sinais clínicos nem radiográficos de perda
óssea em torno dos implantes5.
Em outro trabalho envolvendo a reabilitação após ressecção de
tumor em mandíbula de crianças e adolescentes, após a
ressecção do tumor, em um segundo momento cirúrgico, a
reconstrução foi realizada com o uso de enxerto de ilíaco. Vinte
1) Mestre pelo Curso de Pós-graduação em Ciências da Saúde do Hospital Heliópolis – HOSPHEL, São Paulo/SP, Brasil.
2) Mestre pelo Curso de Pós-graduação em Ciências da Saúde do Hospital Heliópolis – HOSPHEL, São Paulo/SP, Brasil. Chefe do Serviço de Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial do
Hospital Erasto Gaertner, Curitiba/PR, Brasil.
3) Doutor em Medicina pelo Curso de Pós-graduação em Oncologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Medicina de São Paulo, São Paulo/SP, Brasil. Docente do Curso de Pósgraduação em Ciências da Saúde do Hospital Heliópolis – HOSPHEL, São Paulo/SP, Brasil.
Instituição: Hospital Erasto Gaertner, Curitiba/PR, Brasil.
Correspondência: Av. Cândido de Abreu, 469, sala 703 – 80530-000 Curitiba/PR, Brasil. E-mail: [email protected]
Recebido em: 15/08/2008; aceito para publicação em: 30/12/2008; publicado online em: 10/05/2009.
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
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meses após a cirurgia de ressecção, implantes foram
instalados e, sete meses após a instalação, as próteses
implanto-suportadas foram instaladas. Dessa amostra de nove
pacientes, apenas um era diagnosticado com ameloblastoma.
Esse paciente recebera a ressecção em bloco, a colocação da
placa rígida na primeira cirurgia, enxerto de crista ilíaca na
segunda cirurgia e quatro implantes endósseos na terceira
cirurgia6.
O tratamento para ameloblastoma de mandíbula, a ressecção
segmentada da mandíbula e o uso de enxerto
microvascularizado de fíbula e imediata instalação de
implantes endósseos foram sugeridos como sendo o ideal. Um
total de treze pacientes portadores de ameloblastoma de
mandíbula receberam cirurgia de ressecção segmentada de
mandíbula seguida de reconstrução mandibular com a
simultânea instalação de implantes. Um seguimento de 40
meses demonstrou sucesso em todos os implantes instalados7.
O uso do enxerto microvascularizado de fíbula na reconstrução
ressecções de mandíbulas extensas devidas à presença de
tumores odontogênicos foi demonstrado em 13 pacientes, dos
quais três eram casos de ameloblastoma, submetidos à
hemimandibulectomia. Esses pacientes foram divididos em
três grupos, de acordo com a área ressectada. Havia o grupo
de ressecção central, ressecção lateral e de ressecção central
e lateral. Treze pacientes foram tratados com enxerto
microvascularizado de fíbula; desses, três tinham sido
acometidos de ameloblastoma. Todos tinham sofrido
ressecção lateral. Destes três pacientes, apenas um recebera
implantes e, posteriormente, uma prótese implanto-suportada;
dos outros dois, um usava prótese total. Um deles sofrera
reabsorção parcial do enxerto em dois anos de observação. Os
autores concluem que o enxerto microvascularizado de fíbula é
um método seguro e previsível na reabilitação de pacientes que
sofreram ressecções grandes de mandíbula para o tratamento
de tumores odontogênicos8.
A reconstrução de defeitos mandibulares extensos por meio do
uso de distratores osteogênicos verticais também foi sugerida
como uma alternativa para o tratamento do ameloblastoma9.
Dez pacientes haviam recebido ressecção segmentada ou em
caixa de mandíbula e, posteriormente, o aumento do rebordo
ósseo remanescente da mandíbula ou um enxerto total de
crista ilíaca juntamente com o distrator vertical. As distrações e
consolidações ósseas foram monitoradas por ultra-sonografia.
Os implantes endósseos foram instalados uma semana após a
ativação dos distratores. O valor médio de acompanhamento
das instalações dos implantes foi de 38 meses. Apenas um
local foi perdido por infecção. Vinte e oito implantes foram
instalados no osso que sofrera distração osteogênica e, destes,
dois foram perdidos. Após quatro anos, o índice de sobrevida
dos implantes foi de 90% e de sucesso da técnica de 59% em
quatro de sete eventos ocorrendo no mesmo paciente. Os
autores concluem que essa técnica é relativamente segura,
sendo a reabsorção óssea o fator crítico nessa técnica.
A reconstrução com enxerto microvascularizado de fíbula em
mandíbula com duplo segmento em porção anterior em
edentados – variante I foi elegantemente reportada10. A
paciente de 22 anos, após a ressecção do tumor, recebera um
enxerto autógeno osteomiocutâneo microvascularizado de
fíbula, com anastomose vascular e síntese óssea por meio de
mini-placas de liga de titânio, fixadas com parafusos.
O tratamento de ameloblastomas em crianças e jovens foi
avaliado11. Dez pacientes foram examinados; todos os casos
envolviam molares inferiores e ramo de mandíbula. O sinal
mais comum fora o de inchaço indolor. Em cinco dos pacientes,
uma transparência radiográfica multilocular estava presente;
os demais cinco casos apresentavam uma grande lesão
radiolúcida unilocular. Enquanto dois tumores não tinham
regiões microcísticas, dois exibiam somente esparsos focos de
cisto e seis eram inteiramente císticos (unicisto). Casos com
aparência radiográfica unilocular eram tratados com
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enucleação cirúrgica e osteotomia com instrumentos rotatórios.
Casos com aparência radiográfica multilocular eram tratados
com ressecção cirúrgica. Durante o período de proservação
(média 7,6 anos), nenhuma recorrência ou metástase foi
observada. Todos os pacientes mantiveram função e estética
aceitáveis.
Vinte e seis pacientes acometidos de ameloblastomas foram
restrospectivamente avaliados. Cinco tinham ameloblastomas
na maxila, dos quais três eram mulheres e dois eram homens. A
incidência geral de ameloblastomas foi quatro vezes maior na
mandíbula (21) do que na maxila (cinco). Em 69% dos casos
(18) ocorrera em homens e, em 31% dos casos, em mulheres
(oito). A média foi diferente na maxila: 40% homens (dois) e 60%
mulheres (três). Embora tenha crescimento lento e
praticamente indolor, este pode atingir um tamanho significativo
e acometer estruturas especializadas da face como a órbita, a
base do crânio e o cérebro. Grandes ressecções cirúrgicas,
com considerável margem de segurança foram feitas a fim de
evitar a recorrência. No entanto, recorrência era frequente
devido à invasão do osso subjacente. Embora a recorrência
fosse observada após uma simples curetagem de um cisto
dental, grande destruição óssea, envolvendo a cavidade nasal,
etmoidal e os seios da face, infiltração da base do crânio e
metástase a distância foi observada. O tratamento de escolha
foi a mandibulectomia com 10-15 mm de margem de segurança
em osso saudável incluindo a crista óssea, o palato duro, a
mucosa dos seios e a parede lateral do nariz12.
A presença de tumores odontogênicos foi avaliada em 362
casos13. Um total de 28.041 espécimes foi revisado, utilizando o
critério de classificação de tumores odontogênicos da
Organização Mundial de Saúde, proposto em 1992. Os
resultados demonstraram que a frequência de tumores
odontogênicos foi de 1,29%. O mais frequente achado
histológico foi o odontoma (44,7%), seguido pelo
ameloblastoma (20,4%) e mioxoma (8,8%).
A análise retrospectiva de ameloblastomas unicísticos foi
revista de maneira clinica e histopatológica14. As características
clínicas dessa amostra estavam em acordo com outros
estudos. Trinta e três casos de ameloblastomas unicísticos
foram estudados e havia uma tendência a ocorrerem mais em
jovens (média de 25,3 anos), com predileção para o gênero
masculino e predominância na mandíbula (90,9%).
Microscopicamente, os tumores apresentaram um crescimento
em geral monocístico, sendo oito císticos, 10 apresentando
nódulos e 15 tendo considerável quantidade de componente
infiltrativo em ilhas de tumor na cápsula cística. Proservação de
29 pacientes revelou seis recorrências, com uma média de
intervalo de sete anos. A recorrência também estava
relacionada aos subtipos de achados histológicos. O
ameloblastoma unicístico apresentou recorrência em média de
35,7% e aqueles que tinham invasão da parede, 6,7%.
O ameloblatoma desmoplástico apresenta importantes
diferenças na sua distribuição anatômica, na sua aparência
histológica e aspectos radiográficos se comparado com o tipo
clássico de ameloblastoma. Foram descritos dois casos desta
variante do tumor de ameloblastoma localizados na porção
anterior da mandíbula. Os tumores eram expansivos,
destrutivos e indolores. Os achados radiográficos mostraram
uma lesão difusa, tanto radiopaca quanto radiolúcida e com a
destruição da cortical óssea. Excisões em bloco foram
realizadas em ambos os casos. Ao examinar os pacientes um
ano e dois anos depois, nenhum sinal de recorrência dos
tumores foi observado. A grande problemática dessa variante
do tumor deve-se ao fato de poder infiltrar as trabéculas ósseas.
A curetagem da lesão pode levar pequenas ilhas do tumor para
dentro do osso, provocando posteriormente a recorrência do
tumor. Conclui-se que, por essa razão, a excisão em bloco deve
ser o tratamento de escolha nesses casos15.
Muito embora o ameloblastoma seja considerado um tumor
benigno, fora descrito uma variante maligna desse tumor12, em
125
paciente de 44 anos. O tumor inicialmente apresentou
crescimento lento e indolor na maxila direita do paciente, sendo
removido com ressecção em bloco e com margem de
segurança. Após seis anos, houve recidiva e crescimento
considerável dentro da face até a órbita e atingiu a base do
crânio, apresentando alterações histológicas de células
escamosas metaplásticas. O paciente foi a óbito e a necropsia
revelara uma metástase em miocárdio.
De 41 pacientes, 17(41%) tiveram recorrência; 14 recorrências
ocorreram em 19 pacientes com tratamento inicial de
curetagem e 22 recorrências ocorreram onde o tratamento
inicial fora a ressecção. A recorrência mais recente fora com 15
meses e a mais tardia com 18 anos (média de sete anos).
Destes 17 pacientes, sete tiveram uma segunda recorrência e
quatro tiveram três ou mais recorrências. As porcentagens de
recorrência para lesão unicística e multicística foram três (20%)
de 15, 14 (53%) de 26 pacientes, respectivamente; as três
recorrências de lesões unicísticas ocorreram após o
tratamento inicial com curetagem. A proporção de recorrência
na mandíbula foi de 14 em 38 pacientes e, na maxila, três em
três pacientes. Radioterapia fora utilizada (dose de 50 cGy)
quando houve recorrência, mesmo após várias ressecções em
seis pacientes e, em outros dois, como tratamento combinado.
Os pacientes eram reavaliados após um mês do término do
tratamento e, depois, de seis em seis meses por dois anos e,
depois, a cada ano. Cada recorrência era confirmada
histologicamente. Dois pacientes morreram devido à
progressão da doença. Sendo assim, estes autores concluem
que o ameloblastoma tem um alto índice de recorrência se não
removido adequadamente. Ressecções segmentadas de
mandíbula e maxilotomia parcial para a maxila devem ser o
tratamento inicial; ressecção marginal só é apropriada para
tumores pequenos e inicias. Para recorrências múltiplas,
radioterapia é efetiva e cirurgia e radioterapia (50 cGy,
adjuvante) deverima ser utilizadas em casos selecionados16.
A relação do vírus da papilomatose humana (HPV) com o
ameloblastoma foi também estudada 1 7 . Em estudo
retrospectivo, observacional, duplo-cego, 50 blocos de
parafina de ameloblastomas, foram comparados com 50
folículos dentais impactados de terceiros molares, por meio da
reação da enzima polimerase. A escolha dos folículos dentais
de terceiros molares deve-se ao fato de que histologicamente
esse tecido apresenta características semelhantes àquelas
dos ameloblastomas. Os resultados demonstraram que havia
significância estatisticamente significante de incidência do
HPV nas amostras dos testes (ameloblastomas) se
comparados às amostras dos controles (folículos dentais de
terceiros molares) {p< 0,025}. Ainda, a incidência do vírus tipo 6
nas amostras positivas foi significativamente maior (p<0,005).
Nenhum vírus tipo 8,11, 16, 18, 31 e 33 foi observado. Portanto,
muito provavelmente existe a possibilidade de que o HPV seja
um dos fatores etiológicos para o desenvolvimento do
ameloblastoma.
Em outra revisão da literatura referente aos ameloblastomas,
juntamente com uma série de relatos de casos onde as
imagens radiográficas, demonstrou-se uma série de
características peculiares associadas a essas lesões. O
ameloblastoma pode-se apresentar em uma radiografia
panorâmica como imagens osteolíticas uni ou multiloculadas,
halo radiopaco e com expansão da cortical, assemelhando-se
a bolhas de sabão ou favo de mel, podendo ainda ocorrer
reabsorções e deslocamentos dentários18.
Foi realizada análise retrospectiva das fichas dos pacientes
diagnosticados com ameloblastoma em crianças e revisão da
literatura de 1970 a 2001, tanto dos países ocidentais como da
África19. Estudos que antecedessem 1971 não foram incluídos
devido ao fato de que os exames histológicos ainda não eram
padronizados para o diagnóstico de ameoloblastomas. Os
resultados da análise retrospectiva demonstraram 11 pacientes
com idade inferior a 20 anos tratados. Oito pacientes haviam
126
sido diagnosticado inicialmente e três apresentaram
recorrência. A média de anos foi de 15,5 anos, cinco desses
pacientes eram afro-descendentes e nove apresentaram
ameloblastoma unicístico. A literatura revisada demonstrou que
85 crianças nas sociedades ocidentais e 77 crianças na África
tiveram ameloblastoma no período. A média de idade de 14,3
anos e 14,7 anos, respectivamente. Ameloblastoma unicístico
contou para 76,5% dos ocidentais e somente 19,5% dos
africanos, com uma frequência maior ocorrendo na sínfise
mandibular na África (44,2%) versus Ocidente (5,8%). A análise
da recorrência após a enucleação do ameloblastoma unicístico
em 20 crianças acompanhadas por pelo menos cinco anos ou
até a recorrência ocorrer mostrou um índice de recorrência de
40%. Portanto, os ameloblastomas em crianças diferem dos
adultos, apresentado maior índice de recorrência e uma maior
porcentagem de tumores unicísticos. Crianças africanas
parecem apresentar mais o padrão adulto da doença. Embora a
enucleação apresente índices aceitáveis de recorrência nos
ameloblastomas unicísticos, não existem estudos longitudinais
de longa duração em crianças. As características histológicas
que exibem invasão das paredes em ameloblastomas
unicísticos sugerem que cirurgia mais agressiva deve ser
necessária.
De 26 pacientes encaminhados para o tratamento de
ameloblastoma mandibular, todos tratados somente com
curetagem desenvolveram recorrência (11 pacientes); nenhum
paciente tratado com curetagem ou ressecção mais nitrogênio
líquido (crioterapia) sofrera recorrência (nove); pacientes que
apresentavam tumores imagem radiográfica extensa e aspecto
de casca-de-ovo nas margens ósseas e que sofreram
ressecção segmentada com excisão dos tecidos moles
envolvidos também não apresentaram recorrência (oito). Ainda,
dois pacientes que apresentaram recorrência de tecidos moles
necessitaram ressecção. Ambos sofreram múltiplas resecções.
Todos receberam reconstrução cirúrgica com enxerto ósseo
primário ou secundário e apenas três pacientes tiveram
completa reabilitação dentária com implantes endósseos
osteintegrados. A curetagem dos ameloblastomas apresenta
um índice de recorrência inaceitável. Lesões contidas na
mandíbula são adequadamente tratadas com curetagem ou
ressecção marginal se combinadas com crioterapia. Ressecção
segmentada da mandíbula com envolvimento de tecidos moles,
incluindo o periósteo, traz um resultado aceitável quando há
extravasamento ósseo. A primeira operação garante a melhor
chance de cura. Quando o tumor reincide em tecido mole,
cirurgias extensas são necessárias para salvar o paciente.
Poucos pacientes nessa amostra tiveram a reabilitação
completa do aparelho mastigatório, incluindo o uso de implantes
endósseos osteintegrados20.
A análise de 5.289 biópsias orais, registradas em um período de
30 anos demonstrou 127 casos de tumores odontogênicos
(2,4%). A lesão mais frequente fora o odontoma, seguida do
ameloblastoma. Trinta e nove casos de ameloblastoma foram
encontrados nessa amostra, acarretando 30,7% do montante
de todos os tumores odontogênicos. Esses casos ocorreram em
22 mulheres e 17 homens e as fachas etárias mais afetadas
foram a terceira e a quinta década de vida. O paciente mais
jovem foi de 12 anos de idade e o mais idoso, 71 (média de
38,25 anos). Todas as lesões foram exclusivamente
encontradas na mandíbula. Havia 35 casos de tumores sólidos
ou multicísticos, três de unicístico e um caso de ameloblastoma
periférico. Histologicamente, os ameloblastomas foram
classificados em uma das categorias: folicular (oito casos),
plexiforme (10 casos) e folicular-plexiforme (12 casos).
Pequenos focos de alterações tipo escamosa e ceratinizada
foram observados em algumas lesões foliculares, mas apenas
um caso demonstrou extensa metaplasia associada com
formação de ceratina e foi, por isso, considerado um
ameloblastoma acantomatoso. Duas lesões foram
consideradas ser variantes de célula basal e um caso de
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ameloblastoma folicular exibiu um grau suficiente de mudanças
celulares para ser considerado um ameloblastoma granular.
Um ameloblastoma periférico e um desmoplástico foram
também observados21.
Outro autor descreve de maneira muito didática as diferenças
entre os ameloblastomas. O tumor pode ter três tipos bem
distintos, cada um deles com comportamento clínico e resposta
ao tratamento distintos. Esses três tipos seriam os tumores
chamados de ameloblastomas multicísticos ou sólidos,
unicístico e os perféricos22. Uma vez que o prognóstico para os
dois últimos tipos é considerado melhor após uma curetagem,
enucleação ou simples excisão cirúrgica, o autor guiou sua
revisão bibliográfica para as características do ameloblastoma
multicístico, o qual é essencialmente intra-ósseo. Dois fatores
teriam extrema importância quanto ao comportamento
biológico desse tumor. O primeiro é o de que ele é altamente
infiltrativo e, por isso, quando ocorre em osso medular, será
mais perigoso. Isso deve ser considerado no momento da
cirurgia. O segundo é que ele ocorre sempre nos maxilares.
Mais ainda, se invadir estruturas vitais, poderá ser letal. Isso
ocorre, portanto, mais facilmente na maxila onde existe mais
osso medular e há proximidade com estruturas vitais. Se
ocorrer em regiões posteriores de maxila, poderá atingir a base
do crânio. Os ameloblastomas intra-ósseos clássicos têm uma
característica geralmente associada com a malignidade, são
altamente infiltrativos dos tecidos subjacentes, mas
tradicionalmente são considerados tumores benignos porque
não apresentam tendência à metástase. Por essa razão, esse
último autor sugere que eles sejam considerados tumores
malignos de baixo grau. Considerando-se o seu poder de
infiltrar-se, é importante ainda que o período de
acompanhamento do paciente seja longo. Devido ao índice de
recidiva ser alto, faz-se necessário acompanhar o paciente por
pelo menos 10 anos. O fato de que as delimitações do tumor
podem não ficar claras na radiografia, especialmente em se
tratando da maxila, devem ser consideradas tanto no ato
cirúrgico quanto na proservação dos pacientes. A localização
do ameloblastoma na mandíbula torna menos complicada a
sua completa remoção cirúrgica com margem de segurança,
uma vez que é mais fácil delimitar a lesão em presença de mais
osso cortical do que medular, diferente da maxila. A maxila não
possui a barreira cortical para impedir a progressão e invasão
do tumor, tendo apenas finas camadas de osso cortical, como é
o caso do soalho do seio maxilar, infiltrando-se facilmente em
estruturas vitais. Já o ameloblastoma unicístico geralmente
pode ser confundido radiográfica e clinicamente com um cisto
dentígero, muito embora a sua incidência junto aos germes
dentários não seja comum. Ocorre mais frequentemente em
jovens e entre a segunda e terceira décadas de vida. Tem
melhor prognóstico após a enucleação ou curetagem do que o
ameloblastoma multicístico ou intra-ósseo.
O resultado longitudinal de tratamento de ameloblastomas com
nitrogênio líquido após a curetagem e as complicações dessa
modalidade terapêutica foram reportados23. Trinta e seis
pacientes com ameloblastoma sólido nos maxilares foram
tratados. A crioterapia consistia de curetagem com instrumento
manual da lesão intra-óssea seguida de três ciclos de
congelamento, de um minuto cada, do remanescente ósseo
com spray de nitrogênio líquido. As complicações pósoperatórias foram avaliadas clínica e radiograficamente. Os
resultados demonstraram que recorrência local ocorreu em 11
casos (30,6%). Exceto pela recorrência, complicações pósoperatórias eram frequentes mas não eram graves. Estas
foram: deiscência da ferida em 5,5% dos casos, parestesia em
5,5%, infecção em 5,5% e fratura patológica em 11,1% dos
casos. A crioterapia associada com a curetagem no tratamento
do tumor de ameloblastoma sólido ou multi-cístico dos
maxilares diminui o número de recidivas e também reduz a
indicação inicial de ressecção com defeitos contínuos.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
As ressecções apresentam maiores chances de sucesso. Os
pacientes são submetidos à cirurgia de remoção e recebem a
reconstrução imediata ou posterior do defeito. Essas
reconstruções são feitas por meio de enxerto
microvascularizado de fíbula, através da técnica de distração
osteogênica ou outras técnicas de enxertia. A reabilitação
protética por meio de implantes dentários osseointegrados
também foi proposta e será executada no mesmo ato cirúrgico
ou não. O uso do nitrogênio líquido também foi proposto
associado à curetagem.
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