ABSTRACT: This paper is about the thematic roles into a grammatical theory. I propose a representational semantic view of thematic roles where there is an autonomy between a syntax and semantics. Also. I give empirical evidence from Brazilian Portuguese of some syntactic properties which is restricted by semantic factors. thematic roles; representational semantics. . KEYWORDS: semantic autonomy; empirical evidence; o que se pretende propor neste texto e ado~ao da semantica em uma teoria gramatical, nao como sendo uma interpreta~ao da sintaxe, mas como sendo urn modulo autonomo e distinto, com principios e constituintes proprios, assim como 0 modulo sintlitico. 0 que se entende por autonomia entre esses dois modulos e que cada urn tem sua estrutura~ao e funcionamento pr6prios, mas silo ligados entre si por urn principio, que e 0 conhecido principio da hierarquia tematica. Nesse modulo semantico, teriamos urna organiza~ao das nossas representa~oes mentais, em uma estrutura conceitual que reflete as rela~oes predicativas constituidas pelas propriedades semanticas dos itens lexicais - 0 sentido lexical - e pelo resultado da composi~ao desses elementos; estamos aqui falando dos conhecidos papeis tematicos. Alem dessa representa~ao conceitual entre eventos e objetos e as expressoes a que se refere, assurne-se tambem que a linguagem se estende atraves de mecanismos deiticos, quantificacionais e modais que associam as representa~oes conceituais a determinados estados de fato. Nao se exclui, portanto, a relevancia gramatical de urna semantica referencial, tradicionalmente construida como uma semantica de valores de verdade e da forma logica da linguagem (Franchi e Can~ado, 1998). A diferen~a basica entre essa proposta e a maioria das abordagens lingiiisticas correntes e que estamos deslocando a no~ao de papeis tematicos da sintaxe para urn componente semantico, ou seja, "estamos dando a Cesar 0 que e de Cesar". Esse componente semantico nao so leva em conta a existencia dos papeis tematicos, mas tambem atribui relevancia gramatical ao conteudo semantico desses papeis, ou seja, tem relevancia para a estrutura~ao das frases falar-se de urn agente, paciente, etc. • Este texto e fruto de urn trabalho conjunto com Carlos Franchi; evidentemente, as afirmay(les, que aqui farei, 510 de minha inteira responsabilidade. A no~ao de papeis tematicos foi, primeiramente, introduzida Fillmore com a sua Gratruitica dos Casos (1968) sob a alega~ao de que as rela~oes gramaticais de sujeito, objeto, etc. sao insuficientes para traduzir as rela~oes de dependencia existentes entre certas constru~oes. Para ilustrar mais essa ideia, vejamos os exemplos abaixo : (l)a. Joao abriu a porta. b. A porta abriu. (2)a. Joao vendeu urna casa para Maria. b. Maria comprou a casa de Joao. Vemos que em (la e b), a porta tem a mesma fun~ao semantica de paciente, mas em (a) exerce a fun~ao sinUiticade objeto e em (b) de sujeito. Em (2), Joao e Maria estao em uma rela~ao semantica de vendedor/comprador mas suas fun~oes sintliticas sao diferentes. Diante disso, propoe-se que as no~oes semanticas dos papeis tematicos fossem incluidas em urna teoria gramatical. Entretanto, as defini~oes utilizadas correspondem a caracteriza~oes intuitivas, e, certamente, divergentes quanto a suas c1assifica~oes; considerou-se que essas defmi~oes sao muito informais e vagas· para urn tratamento teorico. Por isso, muitos foram levados a desistir de considerar os papeis tematicos como parte de uma teoria gramatical, e, atualmente, ha urn consenso entre a maioria dos lingUistas de que qs papeis tematicos, ou casos de agente, tema, etc. exercem urn papel puramente descritivo. Vejamos algumas dessas defini~oes encontradas na literatura: (3) Agente: - 0 agente e a fun~ao desempenhada por urn ente animado que e responsavel, voluntaria ou involuntariamente, pela a~ao ou pelo desencadeamento dos processos. -0 agente e 0 elemento controlador da a~ao. - Algo que realiza a a~ao; inc1uindoai animados , for~a naturais e inanimados. (4) Paciente: - Elemento que e modificado no processo ou na a~ao. - Incorpora-se sob essa fun~ao 0 elemento que especifica aquilo que esta em determinado estado ou recebe uma determinada descri~ao. Pelos exemplos acima, ja se pode perceber porque essas defini~oes foram muito criticadas na literatura: corria-se 0 risco de encontrar urna lista enorme de papeis tematicos e tambem pelo fato- de os criterios usados nessas defini~oes nem sempre permitir a distin~ao de argumentos de modo inteiramente exc1usivo. Por isso, a maioria dos autores, principalmente os gerativistas , apesar de concordarem intuitivamente que essas no~oes existem e sao importantes na lingua, so as usam de urna maneira descritiva. Porem, outros como por exemplo Jackendoff (1990), continuaram tentando defmir esses papeis de urna maneira mais consistente e abrangente. Mas insistir em urn modelo onde 0 conteudo semantico dos papeis tematiCos e levado em considera~ao nao e uma simples questao de gosto. Isso se deve a existencia de alguns dados das linguas que corroboram a necessidade para uma teoria gramatical de se distinguir semanticamente esses papeis. Ou seja, se existem questOes de natureza semantica, mais especificamente, questOesenvolvendo 0 conteudo semantico dos papeis tematicos que restringem e/ou ordenam a-estrutura~40 sintatica das ora~Oes,elas devem fazer parte de uma teoria gramatical. Darei alguns exemplos do portugues que me fizeram seguir um caminho distinto dos gerativistas, seguindo a ideia de uma semantica forte e autonoma como propoo Jackendoff. A ergativiza~40 e uma propriedade sintatica que ocorre com verbos transitivos diretos, assim como a passiva, em que 0 sujeito da senten~a e omitido, deixando vaga a primeira posi~40 argumental, e levando para essa posi~40 0 argumento intemo; note-se que, para haver esse processo, e necessario que 0 evento descrito permane~a 0 mesmo, sendo omitido apenas 0 agente desse evento. Entretanto 040 s40 todos os verbos transitivos que permitem tal propriedade. Vejamos os exemplos abaixo: (5)a. Jose quebrou 0 vaso de barro. b. Jose encheu 0 vaso de barro com terra vegetal. c. Jose modelou um vaso de barro. d. Jose colocava 0 vaso de barro na estante. (6) a. 0 vaso de barro quebrou. b. 0 vaso de barro encheu com terra vegetal. c.·O vaso de barro modelou. d.·O vaso de barro colocou. A sintaxe 040 tem nenhuma explica~40 para as o4o-ocorrencias em (c) e (d). Para Whitaker-Franchi (1989), 0 que barra as frases em (6c e d) s40 algumas condi~Oes semanticas. Whitaker-Franchi especifica essas condi~Oes: - a ergativiza~40 040 e possivel quando 0 verbo e necessariamente agentivo; - e ela so ocorre quando 0 argumento intemo e um objeto afetado pelo processo. Um outro exemplo de que existem restri~Oesde natureza semantica para que certas propriedades sintaticas ocorram e 0 processo de passiviza~40. Can~ado (1995) lan~a a hipotese que para serem aceitas as constru~Oespassivas, 0 papel tematico do argumento extemo tem que ter um tra~o de [+controle]. Vejamos que nas frases abaixo, consideradas estativas, em que 040 ha 0 tra~o de controle, as passivas 040 s40 aceitas: (7)a. 0 fazendeiro tem/possui cem alqueires de terra. b.·Cemalqueires de terra s40 tidos/possuidos pelo fazendeiro. Mas observem que se usarmos os mesmos verbos, porem, para descrevermos eventos que tenham caracteristicas agentivas, cujo 0 tra~o de controle estaria presente na posi~40 de argumento extemo, a passiva e razoavelmente boa: (8)a. Suzana teve seus tres filhos em uma cabana. b.?Os tees filhos de Suzana foram tidos em uma cabana. (9)a. 0 diabo possuiu 0 homem totalmente. b. 0 homem foi possuido pelo diabo. (10)a. Jolo recebeu uma heran~a. b. A heran~a foi recebida por Jolo. (11)a. Jolo recebeu um tapa. b.*O tapa foi recebido por Jolo. Veja que (10) acarreta 0 controle de JoIo, ao contrario de (11). Isso pode ser visto pelas ocorrencias abaixo, que pressup6em controle por parte dos sujeitos das frases; se nAohA o controle, a sent~a nAoe boa: (12)a. Jolo nAovai mais receber a heran~a; ele a rejeitou. b.*Jolo nAovai mais receber um tapa; ele 0 rejeitou. Um Ultimoexemplo e 0 dos chamados verbos psicol6gicos. A literatura diz que ocorre um estranho fenomeno com essa classe de verbos em que os papeis tematicos de Experienciador e Tema aparecem tanto na posi~lo de sujeito como na posi~l\o de objeto; nAoexiste outra classe de verbos transitivos em que ocorra tal fenomeno: (13)a. Jol\o temia os fantasmas. Exp Tema b. Os fantasmas assustavam Jol\o. Tema Exp Para Can~ado (1995) a explica~l\o de tal fenomeno e exclusivamente de ordem semantica; adota-se uma descri~l\o semantica mais fIDa dos papeis tematicos e a existencia de uma hierarquia tematica que funciona como um principio de liga~l\o entre a sintaxe e a semantica. Tendo-se esses pressupostos em mente, podemos dizer que na realidade os papeis tematicos que envolvem as frases em (13) a e b sl\o: (14)a. Jol\o temia os fantasmas. Exp Objetivo b. Os fantasmas assustavam Jolo. Causa Exp E, portanto, nAo existe apenas uma alternancia de papeis na estrutura~l\o de frases envolvendo verbos psicol6gicos, mas sim a aplica~ao de uma hierarquia entre os papeis que organiza a estrutura sintatica das ora~oes. De uma maneira bem simplificada, podemos dizer que essa hierarquia estabelece a preferencia para a posi~ao de sujeito do Experienciador em rela~ao ao Objetivo, e da Causa em rela~ao ao Experienciador. Outros trabalhos tem sido feitos na dire~ao de se mostrar a relevancia do conteudo semantico dos papeis tematicos. Pode-se citar: Constru~Oes com Verbos de Movimento (Can~ado, em prep.); Adjun~ao e Complementa~ao: Urn Estudo Sintatico/Semantico (em prep. Tese de Mestrado de Alice Lana - Orienta~ao: Marcia Can~ado); e Constru~oes com Verbos Estativos (em prep. Tese de Mestrado de Carla Moreira - Orienta~ao: Marcia Can~ado). Os fortes .indicios de que certos aspectos seminticos 810 relevantes para a sintaxe das expressOes corrobora, portanto, a ad~lo de um modelo de semintica representacional no tratamento dos papeis tematicos. Dowty (1989) entende que 0 conteudo semintico dos papeis tematicos se define a partir da familia de acarretamentosl3 partilhados por argumentos da mesma posi~lo sintatica aberta por um verbo . Refonnulando essa proposta parcialmente, Franchi e C~o (1998) falam de argumentos de "expressOes predicadoras" e do de verbos. Primeiro para incluir nesse tenno os itens lexicais que enttam em rela~oes predicativas, independentemente da categoria sintatica em que se manifestem (nome, verbo, adjetivo/adverbio, preposi~lo); segundo, para dar conta do processo composicional que reconstr6i 0 sentido das expressOes complexas. Seguindo com a defmi~lo de Dowty, agora refonnulada para predicadores, primeiramente, define-se um papel tematico individual como sendo 0 conjunto de todas as propriedades que se pode atribuir ao individuo atraves dos possiveis acarretamentos das expressOes predicadoras. No exemplo: Podemos nos referir ao papel tematico individual como 0 conjunto de acarretamentos possiveis atribuidos a Joiio pela expresslo predicadora beijar Maria. Portanto, se e verdade que Jolo beijou Maria, e verdade que: (16)a. Jolo tem controle sobre a a~lo de beijar; b. Jolo agiu de um certo modo intencionalmente; c. Jolo desencadeou a a~lo de beijar; d. Jolo tern boca; e. Jolo tocou Maria; f. Jolo e Maria estavam proximos; etc... Em um segundo passo, define-se um papel tematico-tipo como uma intersec~lo sobre 0 conjunto de papeis individuais de classes de verbos, relevantes para uma teoria gramatical (evidentemente, acarretamentos como d, e, f do serlo relevantes para 0 portugues). Assim em um grupo de verbos que poderiamos classificar de agentivos: teremos a inte~lo dos acarretamentos atribuidos ao argumento Joiio como sendo 0 papel tematico-tipo, ou seja, 0 papel tematico-tipo e 0 conjunto de acarretamentos que 810 comuns a todos os papeis tematicos individuais do argumento Joiio dos diferentes predicadores. Por exemplo, esse grupo de acarretamentos, ou 0 papel tematico tipo do argumento extemo de (17), poderiamos rotular, descritivamente, de "agente". Mas sempre tendo em mente que termos como "agente", "paciente", "experienciador" e outros similares referem-se a certos papeis tematicos prototipicos, mais freqilentemente associados a urn grande mimero de predicadores Utilizando-nos da n~io de atribui~io composicional de papel tematico e da defmi~io de papel tematico-tipo, ou simplesmente papel tematico daqui para frente, livramo-nos de dois tipos de problemas cruciais que vem permeando a no~io de papel tenuitico desde entlo: (18)a. Paulo quebroll 0 vaso com urn martelo. b. PaUloquebrou a promesSa. c. Paulo quebrou 0 andamento das coisas. d. Paulo quebrou a Cara' Adotando-se a atribui~io composicional de papel tematico, nio teremos mais 0 problema de falar em quatro tipos de quebrar. Teremos sim, quatro predicadores distintos; em a, e quebrar 0 vaso com um martelo que e 0 predicador atribuidor de papel tematico a Paulo, em b e quebrar a promessa, em ceo andamento das coisas e em d e quebrar a cara. Um segundo ponto e que a defini~io proposta aqui, permite-nos caracterizar os papeis tematicos de modo mais flexivel. Como ja foi observado acima, urna das dificuldades para caracterizar esses papeis de modo inequivoco esta no fato de que os criterios usados nas defini~oes nem sempre permitem distinguir argumentos de modo inteiramente exc1usivo. Isto e, propriedades associadas ao agente, como a iniciativa, 0 controle e a intencionalidade, se reconhecem em beneficiarios e comitativos; a mudan~a ou afeta~ao do objeto em determinados processos, que gostariamos de tomar como criterio para a caracteriza~ao do paciente, se atribui em muitos casos ao agente; agentes, pacientes, beneficiarios se comportam, se colocamos 0 foco sobre 0 movimento envolvido em determinadas a~oes, como fonte, tema e meta; e assim por diante. Considerem ora~oes comuns na linguagem coloquial: (19)a. 0 professor correu 0 garoto atrevido para fora da sala. b. A mae casou a filha bem. c. 0 pai estudou todos os filhos ate a faculdade. Nas malises correntes, teriamos problemas para atribuirmos os papeis tematicos do objeto das frases em (19), porque garotolfilhalfilhos seria urn agente, no sentido em que e1es,de certo modo, controlam a a~ao, mas tambem seriam classificados como pacientes no sentido em que sio afetados pela a~ao do projessor/mae/pai. E tambem teriamos .dois agentes na mesma senten~a. A atribui~ao de dois papeis tematicos a urn Unico argumento, e a dois argumentos de uma mesma senten~a sendo atribuido urn Unicopapel tematico vai de encontro ao conhecido criterio theta, que e urn criterio aceito por varias correntes lingilisticas. Mas se falamos em urn grupo de acarretamentos atribuidos ao argumento como sendo 0 papel tematico desse dado argumento, nio teremos nenhurn problema para c1assificaros papeis tematicos em (19). Ao projessor/mae/pai poderiamos atribuir 0 seguinte papel tematico: tem controle sobre a a\fao, desencadeiam urn processo, etc., que descritivamente poderiamos chamar de agente prototipico. Ao garotolfilhalfilhos atribuiriamos 0 seguinte papel tematico: tem controle sobre a a\fao, desencadeiam urn processo, silo afetados por uma a\fao, etc, que descritivamente poderiamos chamar de agente/afetado ou paciente/agentivo. Casos como 0 exemplo (19) tem desencorajado a incorpora\fao dos papeis tematicos em uma teoria explicita da gramatica (ou de principios como 0 da hierarquia tematica). Entretanto, nao lui nada de estranho nesses fatos, quando se pensa que os papeis tematicos se caracterizam justamente por essas variadas intersec\foes possiveis (agente-afetado, agente-fonte, agente-destinatlirio). E e justamente 0 caniter mais flexivel e aberto do conceito de papeis tematicos adotado que nos facilita a estrategia de atribuir urn estatuto teorico nao a papeis tematicos assim definidos, mas a certos acarretamentos cruciais, estes sim relevantes no estabelecimento da hierarquia temlitica e, pois, nos processos de sele\fao argumental. A Hierarquia Tematica e urn pnnclplo que estabelece a liga\fao entre a semantica e a sintaxe, ou seja, e ela quem estabelece uma lista ordenada dizendo qual papel temlitico vai para qual posi\fllo sintlitica. Nllo hli, porem, inteiro consenso sobre como implementar essa hipotese. De urn modo geraI, os autores a definem como parte da propria organiza\fllo semantico-conceitual seja da estrutura do evento, seja da representa\fllo lexical. As propostas diferem, ainda, em como as regras de correspondencia sao especificadas. Mas para todas as abordagens, a concep\fllo blisica do sistema, do ponto de vista da correspondencia entre 0 temlitico-para-sintlitico, e a mesma. Finalmente, do ponto de vista da ordenal(ilo dos papeis tematicos em uma hierarquia, apesar de pressuposta, geralmente, como universal, existem controversias quanto a posi\fllo relativa de alguns papeis, como os de tema, instrumento, meta/fonte/locativo e tambem quanto a rela\fllo dos papeis dentro desse Ultimo grupo. Isso decorre do fato que, na defini\fllo da hierarquia tematica, nilo se faz distin\(llo entre fun\(oes e macrofun\(oes, nem entre os pIanos em que se organizam, tentando estabelece-la em uma Unica sequencia linear. Um exemplo disso seria a hierarquia abaixo: Essa formula\(llo, por privilegiar 0 criterio de escolha do elemento para a promo\(llo a sujeito, dificulta muito 0 estabelecimento correto da correspondencia entre as fun\(oes semanticas e as fun\fOes gramaticais, sobretudo no que diz respeito a organiza\fllo da estrutura dos argumentos intemos. Com essas breves referencias as propostas correntes sobre 0 principio da hierarquia tematica, vamos, pois, mostrar rapidamente a proposta elaborada em Franchi e Can\fado (1998). Sllo pressupostos os seguintes itens: - A hierarquia organiza a representa\fllo semantico-conceitual dos eventos e distribui os argumentos nas posi\(Oes sintliticas blisicas da oral(ilo, ou seja, nas posi\(Oes de sujeito e complementos. - A hierarquia tematica tern urn camter implicacional no sentido de que ela pressupOe uma determinada sucessllo na constnl~Ao das rela~oes tematicas conforme 0 evento descrito; - disso decorre que a hierarquia tematica nAo e definida em urn Unico plano (em uma Unica sequencia linear), mas em uma estrutura pluridimensional complexa: existe uma hierarquia que chamaremos de horizontal que e estabelecida por macro-fun~oes; existe dentro das macro-fun~oes uma hierarquia vertical que e estabelecida pelas propriedades dos acarretamentos que compoem 0 sistema gramatical do portugues brasileiro; e existe os pIanos da causa~Ao e da I~Ao que dividem essas propriedades. Dito 0 acima, vejamos, pois, 0 principio da hierarquia tematica: CAUSA~Ao- ->AFETA~AO ->ESTATIVIDADE-~DESTINA~AO A U controle estado psi. S cau. dir. A cau.indJins objetivo outros ~ A o L fonte o C. Dada a hierarquia, aplica-se 0 seguinte: A. Os acarretamentos dos papeis tenuiticos que representam urn determinado evento obedecem a uma hierarquia tematica em rela~Ao aos argumentos nucleares, ou seja, sujeito e complementos. B. No portugues brasileiro, primeiramente, os acarretamentos se ordenam hierarquicamente pelas propriedades em horizontal, que chamaremos de macro-fun~oes: CAUSA~AO > AFETA~AO > ESTATIVIDADE > DESTINA~AO C. Havendo dois papeis concorrentes em uma mesma macro-fun~Ao, aplica-se a hierarquia vertical; 0 mais alto ocupa a posi~ao nuclear e havendo outro acarretamento da hierarquia horizontal, esse ocupa a outra posi~ao nuclear; 0 acarretamento concorrente da hierarquia vertical vai para uma posi~Ao periferica (adjun~Ao), nAopassando mais pela hierarquia. D. Em qualquer caso, os acarretamentos do plano da Causa~ao antecedem os dos plano da Loca~Ao. (22)a {Agente, Pac} : Paulo assassinou 0 parceiro. b. {Agente, Ben, ...}: Paulo ajudou Maria a vestir-se. 14 Lembro que as propostas aqui mostradas ainda fazem parte de urn programa de pesquisa em andamento, e nAo de urn modelo acabado. c. {Agente, Exp, ...}: Paul() assustou Maria com urn grito. d. {Agente, Obj}: Paulo usou uma faca. e. {Agente, Obj}: Paulo desenhava a paisagem. f. {Agente, Res}: Paulo construiu uma casa. g. {Agente, Tema}: Paulo levou 0 livro (na escola). A grande maioria dos verbos do portugues que se inclui na classe que se costuma chamar de "a~1\o-processo" e de "atividade" acarretam ao seu argumento extemo (ou sujeito): ter algum papel direto no desencadeamento do processo, ter controle sobre esse processo. Veja que, na posi~1\ode argumento intemo, ocorre uma variedade de papeis, mas segundo a hierarquia, qualquer propriedade localizada na macro-fun~1\o da Causa~1\o tem privilegio para a posi~1\ode sujeito. Ou podemos ter , tambem, alguns desses verbos que em outras circunstancias admitem na posi~1\o de sujeito urn argumento que tettl como acarretamento, somente, ter algum papel indireto no desencadeamento do processo (a-d) ou ser 0 instrumento ou meio utilizado no desencadeamento do processo(e-f), que &8.0 da macro-fun~1\o CAUSACAO. Tambem nesse caso temos esses papeis na posi~1\odo sujeito: (23)a. 0 descuido do medico matou a crian~a. b. Jo1\oquebrou 0 vaso com 0 empurrno que Jose the deu. c. Falar de si propria assustou Maria. d. A chegada de Jose alegrou Maria. e. 0 grito de Jose acordou Maria. f. 0 cM acalmou Maria. Exduindo os verbos "de a~ao", temos alguns verbos experienclals e benefactivos, aqueles que, respectivamente, tem na posi~ao de sujeito 0 acarretamento de estar em um determinado estado mental e ser interessado no processo: (24)a. {Exp, Obj}: Jo1\otem medo de fantasmas. b. {Exp, Obj}: Jo1\oolha para 0 seu passado. c. {Ben, Obj}: Sam recebeu urna heran~a. d. {Ben, Obj}: Sam cortou 0 cabelo com 0 Carlos. Poderiamos conduir erroneamente que os acarretamentos acinla tambem indicam uma preferencia para a posi~1\ode sujeito. Mas, se examinamos os exemplos abaixo: (25)a. {Cau,Exp} As provas preocupam/assustam Maria. b. {Cau,Exp,Obj} Este livro lembra Joao de sua wancia. c. {Agente,Ben} Joao pagou/xingou Maria pelo servi~o. d. {Agente,Obj,Ben} Jo1\oconstruiu uma casa para Jose. Em (24), temos os mesmos acarretamentos de (25), eo Beneficilirio e Experienciador estiio em posi~ao de complemento e ate de adjun~1\o. 0 que observamos e que em (24), alem dos acarretamentos citados acinla, tambem existe urn outro acarretamento, inexistente em (25), que privilegia a posi~1\ode sujeito - 0 de ter um cerio controle sobre 0 processo. As frases abaixo indicam urn certo controle dos Exp e Ben: (26)a. JoAovai parar de ter medo de fantasmas; ele se prometeu. b. JoAo nio quer mais olhar para 0 seu passado. c. Sam desistiu de receber a ~a. d. Sam nio vai mais cortar 0 cabelo com 0 Carlos. o que nio ocone com as frases em (27), onde uma leitura atribuindo controle aos Exp e Ben e impossivel: (27)a.· As provas preocupam Maria para ela se esquecer do namorado. b. *Este livro lembra JoAo de sua infancia para ele se esquecer do passado. c.*JoAopagou Maria pelo servi~ para ela ganhar mais. (e agramatical na leitura relevante; uma leitura em que 0 controle da segunda sent~a esta no Agente e possivel.) d.*JoAo deulconstruiu uma casa para Jose para Jose se esquecer de seu apartamento.( 0 mesmo de c) Portanto, 0 que podemos concluir e que 0 que esm impulsionando os argumentos para a posi~o de sujeito e 0 acarretamento de ter controle, pertencente a macro-fun~Ao CAUSAc;Ao, preferencial para essa posi~Ao. Existem, taJ:nbem, alguns poucos predicadores de processo que admitem um complemento, mas esse, porem, e sempre caracterizado pelo acarretamento de estar em determinado estado: (28)a. {Pac,Res} JoAotomou-selficou 0 lider de todo b. {Pac,Obj} JoAo igualou 0 innio na esperteza. c. {Exp,Obj} Rosa softeu muito com Jose. 0 grupo. Portanto, vemos que na ausencia de um papel pertencente a macro-fun~Ao CAUSAc;Ao, a preferencia para a posi~o de sujeito e da macro-fun~Ao AFETAc;Ao. Isso se confirma no caso de alguns verbos de estados transitivos, em que quando 0 argumento-sujeito expressa o acarretamento de estar em determinado estado, 0 argumento-objeto s6 ocorre taJ:nbem como um estado: (29)a. {Exp,Obj}: Joao adora falar de si mesmo. b. {Obj,Valor}: 0 livro custou cem reais aos alunos. c.(Obj,Referencia}: 0 seu ordenado equivale ao meu. d. {Obj,Locativo} :JoAomora em Sao Paulo. Deve-se notar, porem, que a Hierarquia Tematica, formulada em termos de macro-fun~oes, esconde outras duas dimensOes em sua linearidade. De fato, os acarretamentos dessas macro-fun~oes silo conelatos a acarretamentos no plano da Loc~Ao; e, tambem, a sele~ilo dos argumentos depende de uma ordena~ilo dos acarretamentos especificos que se incluem nessas macro-fun~oes, ou seja, existe uma hierarquia vertical. Por exemplo, urn evento que tenha em sua representa~ilo papeis tematicos da macro-fun~ilo Causa~ilo, na sele~ilo do argumento-sujeito, obedece a uma hierarquia em que 0 controle e 0 desencadeamento direto do processo predominam sobre 0 ser 0 meio ou o instrumento pelo qual se dlJ 0 processo e desencadeamento indireto de um processo: (30)a. Sam quebrou 0 vaso de raiva. b. *A raiva quebrou 0 vaso por/com Sam. (31 )a. Sam quebrou 0 vaso com urn empurrao. b. *0 empurrao quebrou 0 vaso por/com Sam. (32)a. Sam quebrou 0 vaso com urn martelo. b. *0 martelo quebrou 0 vaso por/com Joilo. Na macro-fun~ilo da estatividade temos que 0 experienciador antecede 0 objetivo que por sua vez antecede 0 resultativo, e alguns outros acarretamentos como termo de referencia e 0 valor: (33)a. Joilo amou a festa. b. 0 livro ficou 0 que nos desejavamos. c. 0 premio vale 0 sacrificio que fizemos. d. 0 livro custa dez reais. Em qualquer caso, os acarretamentoss do plano da Causa~ilo antecedem os do plano da Loca~ilo: (34)a. A seta aponta 0 norte. b. Os caminhos rodeiam 0 parque tlorestal. (35)a. Sam mora em uma bela casa. (36)a. Eu YOU de Silo Paulo a Belo Horizonte em lh. b. *Eu YOU a RH. de Silo Paulo. Esses seriam, portanto, alguns exemplos ilustrativos de como a hierarquia funciona. E para concluir, ressalto que a abordagem pluridimensional proposta elimina a visiio linear de uma hierarquia como a mostrada em (20), resolvendo assim os problemas expostos acima para outras hierarquias. RESUMO: Esse artigo trata dos papeis tematicos e sua relevancia para urna teoria gramatical. E proposto que se inclua urn modulo semantico autonomo, assim como a sintaxe teria seu modulo. Para corroborar essa hipotese, silo mostradas evidencias empiricas do portugues brasileiro em que certas propriedades sintaticas sofrem restri~oes de ordem semantica. PALA VRAS-CRA VES: papeis temliticos; semantica autonoma; evidencias empiricas; semintica representacional. CANCADO, Marcia. A Relevancia dos Papeis Tematicos vistos sob a Otica de uma Semantica Representacional. Tese de Doudorado. IEL: UNICAMP, 1995. DOWTY, David. On the Semantil::Content of the Notion of Thematic Role. IN: Chierquia, Partee e Turner (eds.). Properties, Types and Meaning. Studies in Linguistic and Philosophy, 2: Semantic Issues. Daordrecht: Kluver: 69-129,1989. FILLMORE, Charles. The Case for the Case. In E. Bach e R. Harms (eds). Universals in Linguistic Theory. New York: Holt, Rinnehart and Winston, 1968. FRANCHI, Carlos e Marcia Can~ado. 0 Estudo das Rela~oes Semanticas (Papeis Tematicos) em uma Semantica Representacional. UNICAMP/UFMG. Manuscritos, 1998. JACKENDOFF, Ray. Semantic Structures. Cambridge (MA): MIT Press, 1990. WHITAKER-FRANCHI, Regina Celia. As Constru~oes Ergativas: Um Estudo Sintitico e Semantico. Tese de Mestrado. IEL. UNICAMP, 1987.