Imperialismo em moratória

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Núcleo de Educação Popular 13 de Maio - São Paulo, SP
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CRÍTICA SEMANAL DA ECONOMIA
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EDIÇÃO Nº 1165/1166 – Ano 28; 4ª Semana Setembro/ 1ª Outubro 2013.
IMPERIALISMO
MORATÓRIA
.
EM
JOSÉ MARTINS.
As funções do Estado terrorista norte-americano estão sendo
enfraquecidas internamente e no espaço mundial por mortíferos
desequilíbrios financeiros do seu governo.
A parasitalha imperialista não vive só de juros. Precisa também se apropriar de
grande parte dos impostos arrecadados pelos governos. Quando as despesas
improdutivas dos governos – administrativas, financeiras, polícia, justiça,
legislativas, exército, armas, propaganda, etc. – ultrapassam as receitas, cria-se a
dívida pública e daí nasce e se reproduz o capital produtor de juros, também
conhecido como capital financeiro. Juros e impostos são irmãos siameses. Sem a
dívida pública não existiria o capital financeiro. Nem os capitalistas.
Quando, ao contrário, as finanças públicas apresentam raros superávits
fiscais – receitas maiores que despesas por vários anos seguidos – o governo
poderia virtualmente resgatar seus títulos em circulação no mercado e zerar sua
dívida. Esse fato inusitado poderia ter ocorrido, por exemplo, na segunda metade
dos anos 1990, nos EUA. A economia crescia tanto que oceanos de impostos e
taxas inundavam os cofres do governo. A queda das despesas militares como se
verá abaixo, também contribuiu bastante para essa geração de superávits. No
período pós-guerra, os EUA só apresentaram superávit fiscal de 1998 a 2001.
Presidente do país na época, Bill Clinton – que sempre se beneficiou da
boa saúde da economia para se eleger e se reeleger presidente, mas que não
entendia nada de economia – teve então a ingênua ideia de resgatar a dívida
pública do país. Ou, pelo menos, reduzi-la significativamente. Precisou ser
bruscamente contido por Alan Greenspan, presidente do Fed, banco central dos
EUA, que lhe explicou com toda paciência do mundo que essa estapafúrdia
medida simplesmente eliminaria o sistema financeiro privado, e que, corolário
inevitável, todos os capitalistas estariam mortos no dia seguinte.
Agora, a situação é totalmente diferente de treze anos atrás. Duas crises
periódicas (2000/2001 e 2008/2009) e várias guerras depois, o superávit virou
um gigantesco déficit fiscal na economia reguladora do mercado mundial. E a
1
dívida pública explodiu para níveis nunca dantes imagináveis. Sem prazo para
desacelerar. Em apenas nove anos, o superávit de 2.3% em 2000 havia desabado
para um déficit de 9.8% em 2009, auge da última crise. Em 2013, com a
recuperação da economia e redução das taxas de juros pagos pelo governo,
prevê-se 6.0% de déficit. Entrementes, a dívida pública sustentada pelos títulos
em poder do público passou de 3.3 trilhões de dólares (31.4% do PIB) em 2001,
para 12,4 trilhões de dólares (76.6% do PIB), em 2013. Diminui-se o déficit, mas
aumenta-se a dívida pública. Essa é a regra sagrada dos parasitas do sistema.1
Mas a conta é ainda maior. Se somar à dívida em poder do público acima
a dívida de contas do governo (government accounts), com a qual o governo
ajusta seus fluxos de gastos da administração, tem-se a divida federal bruta. Em
2013, ela corresponde a 17,249 trilhões de dólares, mais de 1 trilhão de dólares
acima do maior PIB do planeta (16,206 trilhões).
O problema que está neste momento agitando o sempre ansioso mercado é
que o governo não poderia ter ultrapassado o teto da dívida (debt ceiling) de 16,7
trilhões autorizados pelo Congresso no início deste ano. É aqui que começa a
atual batalha entre a Casa Branca e o Congresso sobre o novo orçamento a ser
aprovado para o ano fiscal de 2014.
O que se passa, nas acaloradas discussões desta semana, é que o Congresso tem a
data prevista de 30 de Setembro, segunda-feira, para aprovar nova elevação de
uso de verbas pelo governo, evitando-se a paralização da administração federal.
O Congresso ainda pode espichar esse assunto para um limite de prazo de 18 de
Outubro. Se a aprovação desta nova elevação do teto da dívida não ocorrer até
esta data limite, abre-se a possibilidade de uma impensável e devastadora
moratória do governo dos EUA, por volta de meados de Novembro próximo. Os
primeiros a sofrer o calote do governo seriam os aposentados, funcionários em
hospitais, escolas, creches, polícia, bombeiros, serviços públicos em geral.
As repercussões sociais seriam de monta. E também no mercado: a
negociação do teto da dívida em 2011 provocou o primeiro rebaixamento da nota
de crédito do país, uma forte queda do mercado de ações e abalou a confiança da
população no governo. Agora, mesmo que se resolva mais uma vez esse
problema fiscal de curto-prazo, o que é o mais provável, o de longo prazo, do
orçamento e da crise do crédito público, só pode se agravar. E, o mais
importante, o stress social interno e a consequente ingovernabilidade burguesa
devem aumentar ainda mais, para alcançar seu ponto máximo de ebulição na
explosão do próximo período de desaceleração da produção e crise econômica.
1
Esses números do orçamento dos Estados Unidos foram extraídos da página do Congressional Budget
Office ( HBO) “Historical Budget Data—August 2013” http://www.cbo.gov/publication/44507
2
O que está por traz destas prosaicas discussões econômicas, portanto, é a tarefa
cada vez mais difícil da burguesia norte-americana administrar a luta de classes
em época de agudização das condições de exploração do capital. Discute-se o
orçamento e as finanças públicas para se decidir a repartição da gigantesca massa
de recursos públicos arrecadados anualmente, em torno de 3 trilhões de dólares.
Primo, a parte destinada aos pobres. Com o descontrolado aumento da
pauperização das massas – provocado pelo desemprego, redução de salário,
aumento das condições desumanas de trabalho, aumento do preço dos alimentos,
dos aluguéis, dos serviços médicos, remédios, etc. – o Estado deve destinar
somas crescentes de recursos para a Seguridade Social, Serviços Médicos
(Medicare, medicaid), seguro desemprego, auxilio moradia, albergues, etc. A
solução dos economistas do sistema para os problemas das finanças públicas dos
EUA é o congelamento desses gastos com o pauperismo. É isso que está
emperrando a elevação do teto da dívida e aprovação do novo orçamento.
Secondo, a parte destinada aos negócios dos capitalistas e ao seu poder
militar e imperialista no mercado mundial. Mesmo a parte dos recursos fiscais
que eram destinados à infraestrutura (transportes, energia, edificações, etc.) e
outros incentivos ao aparelho produtivo e comercial estão desacelerando e
diminuindo relativamente à parte dos recursos destinados ao poder militar e
imperialista. Os primeiros representavam 3.1% do PIB em 2000 e 3.8% em 2012.
Os gastos militares, por seu lado, alcançaram 295 bilhões de dólares (2.9% do
PIB) em 2000, e 670 bilhões (4.2% do PIB) em 2012. Recorde-se que nos anos
1990, os níveis de gastos militares dos EUA diminuíram frente às décadas
anteriores do pós-guerra. Pouco antes da pesada crise de 2000/2001 atingiram os
menores níveis históricos. Mas a partir de 2002 (3.2% do PIB), voltaram aos
níveis da época da guerra-fria, atingindo o pico em 2010 (4.7% do PIB). Assim, a
própria capacidade de regulação anticíclica da política fiscal se enfraquece, na
medida em que escasseiam os recursos direcionados à economia real.
Os gastos militares subiram mais rapidamente que os próprios gastos com
a Seguridade Social, a grande vilã dos economistas do sistema para salvar seus
patrões da responsabilidade pela explosão do déficit público nos últimos anos.
Mas em 2000 gastava-se com a Seguridade Social apenas 406 bilhões de dólares
(4.0% do PIB). Em 2012, gastava-se 767 bilhões de dólares (4.8% do PIB).
Aumentou-se, assim, mais lentamente que os gastos militares no mesmo período.
A função do Estado terrorista norte-americano está sendo enfraquecida
internamente e no espaço mundial por esses desequilíbrios financeiros do seu
governo. Internamente, é cada vez mais difícil a combinação dos interesses
particulares da parasitalha imperialista sobre os recursos públicos para aumentar
seu capital, de um lado, e, de outro, as necessidades também crescentes da
3
imensa população trabalhadora para continuar se reproduzindo fisicamente. A
acumulação da riqueza do capitalista só pode continuar com a simultânea
acumulação da miséria e do desespero do trabalhador.
Externamente, a repentina imobilidade da mortífera máquina militar norteamericana no abortado ataque sobre a pobre Síria, neste mês de Setembro,
lembra imediatamente Napoleão Bonaparte, o grande imperador, para quem
nenhum soberano pode exercer e conservar o poder sentado apenas na ponta das
baionetas. Essa lei fundamental da ciência política e da teoria do Estado, que se
realizou praticamente contra seu próprio formulador, ajuda a esclarecer melhor
não só a imobilidade monetária do Fed de Bernanke e a não menos imóvel
administração fiscal do Tesouro de Obama, mas principalmente como esses
fatores materiais perfeitamente dimensionados e organicamente relacionados
estão na base dos primeiros e bem vindos sinais de fragilidade (e de imobilidade,
claro) do monolítico poder imperial dos EUA.
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