Zwielewski e Bub Transtorno de Ansiedade e DAC Ponto de Vista Ponto de Vista Rev Bras Cardiol. 2014;27(5):311-313 setembro/outubro Identificação de Transtornos de Ansiedade em Pacientes com Suspeita de Doença Arterial Coronariana Identifying Anxiety Disorders in Patients with Suspected Coronary Artery Disease Graziele Zwielewski1, Theo Fernando Bub2 Clínica Unidade Psiquiátrica - Florianópolis, SC - Brasil Hospital SOS Cardio - Florianópolis, SC - Brasil 1 2 Resumo Abstract Devido ao aumento de pacientes nas emergências apresentando sintomas semelhantes aos de transtorno de ansiedade (TA) e sintomas de doença arterial coronariana (DAC), buscou-se esclarecer a relação entre DAC e TA através de experiência vivenciada na emergência de hospital especializado e da literatura existente sobre o assunto. Foram analisados prontuários de 15 pacientes e realizada entrevista semiestruturada com cada um. Perceberam-se padrões cognitivos nesses pacientes e, como contribuição, sugeriu-se a utilização de dois elementos auxiliares no diagnóstico de TA nas salas de emergência: a catastrofização e a hipervigilância. Prompted by an upsurge of patients in emergency rooms presenting symptoms similar to those of anxiety disorder (AD) together with symptoms of coronary artery disease (CAD), an attempt was made to clarify the relationship between CAD and AD through hands-on experience in a specialized hospital ER, in addition to the specialized literature on this subject. The medical records of fifteen patients were analyzed, followed by semi-structured interviews with each of them. Cognitive patterns were noted in these patients and, as a contribution, the use of two auxiliary elements is suggested for diagnosing AD in ERs: catastrophization and hypervigilance. Palavras-chave: Transtornos de ansiedade; Medicina de emergência baseada em evidências; Serviço hospitalar de cardiologia; Técnicas de diagnóstico cardiovascular Keywords: Anxiety disorders; Evidence-based emergency medicine; Cardiology unit, hospital; Diagnostic techniques, cardiovascular Introdução Esta paciente foi atendida por cardiologista, em uma pesquisa com 15 pacientes, objetivando compreender a relação entre doença arterial coronariana e transtorno de ansiedade. Para tanto, utilizou-se análise de prontuários médicos e entrevista semiestruturada, feita por psicóloga cognitiva com cada um dos pacientes. Paciente feminina, 61 anos, apresentando sintomas de formigamento nos braços, lábios endurecidos, peso no peito, dor torácica, falta de ar e náusea, foi atendida na emergência de hospital especializado em cardiologia. Dados da evolução da enfermagem e conduta médica: pressão arterial (PA): 12 mmHg x 8 mmHg; pulso 80 bpm; eletrocardiograma (ECG) normal, marcadores de necrose miocárdica normais. A paciente foi medicada com clonazepan e recebeu alta, por não apresentar sintomas relacionados à doença arterial coronariana (DAC). Nessa observação, 30,0% dos pacientes apresentavam TA, 70,0% apresentavam DAC e, dentre estes, 25,0% apresentaram crise de ansiedade. Esses índices são confirmados em estudo realizado anteriormente, por outro pesquisador, também na emergência, afirmando Correspondência: Graziele Zwielewski Rua Herman Blumenau, 245 - Centro - 88020-020 - Florianópolis, SC - Brasil E-mail: [email protected] Recebido em: 17/12/2013 | Aceito em: 15/07/2014 311 Rev Bras Cardiol. 2014;27(5):311-313 setembro/outubro que 74,0% dos 1 364 pacientes apresentavam crise de pânico 1. Essa observação comprova que alguns pacientes com problemas coronarianos também podem apresentar sintomas de ansiedade e precisam ser adequadamente tratados, pois a ansiedade não tratada pode atrapalhar o procedimento médico, levar à cronificação dos sintomas e ao uso excessivo e inadequado dos recursos médicos, reduzindo-se a qualidade de vida do paciente1,2. A pesquisa também comprovou que pacientes sem DAC significante são os maiores usuários de emergências1. Identificar diferenças entre esses quadros é fundamental, pois a dor torácica é queixa comum na prática médica2 e pode vir ou não acompanhada de outros sintomas, como: vômito, sudorese, sensação de morte iminente e palidez. Embora muito semelhantes aos sintomas de DAC3, esses sintomas fazem parte de um quadro de ansiedade. Estudos3,4 mostram que, atualmente, o diagnóstico emergencial de TA se dá por exclusão, já que seis dos 13 critérios diagnósticos do transtorno de pânico F41.0 são encontrados em doenças coronarianas, dificultando o diagnóstico inicial de crise de pânico, pois o paciente deve inicialmente passar por avaliação clínica cardiológica e exames da mesma área, para que seja excluída a hipótese de problemas coronarianos, antes de se diagnosticar a TA. Portanto, é necessário identificar se os sintomas são de crise momentânea de ansiedade ou se esta está generalizada em outros comportamentos do paciente, otimizando seu encaminhamento para profissional adequado1,5. Dentre as emoções humanas, a ansiedade é das mais perturbadoras. Também chamada de “nervosismo”, “medo”, ela inclui fobias, ataques de pânico, transtorno de estresse pós-traumático, transtorno obsessivo compulsivo ou de ansiedade generalizada. Acontecimentos importantes de vida, como traumas, doenças, mortes, comportamentos e valores ensinados ou observados, assim como experiências aparentemente impossíveis de manejar4-6 podem contribuir para a ansiedade. O modelo cognitivo considera a origem da ansiedade como multifatorial e, dentre esses fatores, está a distorção cognitiva, originada em interpretação disfuncional de situações vivenciadas pelo paciente4-7. Pessoas ansiosas se percebem ameaçadas por iminente dano físico ou social. Essas interpretações distorcidas da realidade são produzidas pelos chamados pensamentos automáticos negativos (PAN), que surgem rapidamente e desencadeiam a ansiedade. Sabe-se que emoções são desencadeadas pela forma como as pessoas interpretam os eventos4-7, pois uma 312 Zwielewski e Bub Transtorno de Ansiedade e DAC Ponto de Vista mesma situação pode provocar emoções e reações diferentes em pessoas diversas 4-7. A ansiedade é inevitavelmente acompanhada da sensação de perigo, ou de ameaça e vulnerabilidade6,7, que pode ser física (sofrer ataque cardíaco, morrer sufocado), social (ser rejeitado, envergonhado etc.) ou mental (sensação de estar enlouquecendo). Indivíduos em crise de pânico geralmente interpretam de forma distorcida as sensações corporais e mentais, criando um círculo vicioso, no qual sintomas físicos, emoções e pensamentos interagem entre si e se intensificam rapidamente. Não se questiona, aqui, a necessidade de seguir os protocolos médicos já sugeridos em outras pesquisas. Porém, pretende-se auxiliar cardiologistas ou clínicos plantonistas nas emergências a identificarem sinais de ansiedade no paciente com ou sem DAC, para que este possa ser encaminhado para tratamento adequado. Nesse sentido, como elementos auxiliares no diagnóstico do TA, apresentam-se os pensamentos catastróficos e a hipervigilância. Pensamentos catastróficos4-6: o paciente encontra-se excessivamente preocupado, aterrorizado, convencido de estar diante de desastre iminente, a respeito do qual nada pode fazer. Isso acontece porque portadores de ansiedade geralmente interpretam cada situação ou estímulo como mais perigoso do que realmente é; consequentemente, sua emoção e comportamento respondem proporcionalmente a essa sensação. De acordo com a terapia cognitiva, o paciente ansioso tem maior probabilidade de realizar distorções cognitivas, superdimensionando o problema e não enxergando possibilidades ou ferramentas para lidar com ele, o que reduz sua capacidade de enfrentamento5-8. Assim, na catastrofização podem ser observados dois fatores: a) vulnerabilidade; b) superestimação do perigo e minimização da capacidade de enfrentamento. Hipervigilância 7-9: Nota-se, no paciente ansioso, percepção aumentada da probabilidade de perigo e persistência em interpretações excessivamente negativas de estímulos, eventos ou situações. Assim, aos pacientes ansiosos, a aceleração do batimento cardíaco ou fisgadas no braço podem parecer infarto agudo do miocárdio, e um simples arrepio de frio pode ser interpretado como queda de pressão arterial e/ou sensação de desmaio. Além disso, a adrenalina liberada diante dessas sensações reforça ainda mais a interpretação de ameaça. Assim, com este documento, objetiva-se sugerir dois elementos (pensamento catastrófico e hipervigilância) Zwielewski e Bub Transtorno de Ansiedade e DAC Ponto de Vista para auxiliarem no diagnóstico do TA, e alertar os cardiologistas para que atentem aos sintomas e à possibilidade do diagnóstico de ataques de pânico, independente dos problemas físicos apresentados pelo paciente, podendo encaminhá-lo a tratamento através da terapia cognitivo comportamental (TCC). A TCC é considerada atualmente como tratamento mais eficaz e com índice de recaída de 0,0-10,0%, ao contrário do tratamento apenas medicamentoso, em que 71,0-95,0% das pessoas tratadas reexperimentaram a crise 90 dias após a descontinuação da medicação10. Potencial Conflito de Interesses Declaro não haver conflitos de interesses pertinentes. Fontes de Financiamento Este estudo não teve fontes de financiamento externas. Vinculação Acadêmica O estudo não estava vinculado a qualquer programa de pós-graduação. Ponto de vista As opiniões apresentadas neste artigo são somente as dos autores. A Revista Brasileira de Cardiologia acolhe pontos de vista diferentes, a fim de estimular discussões com o intuito de melhorar os diagnósticos e tratamentos dos pacientes. Rev Bras Cardiol. 2014;27(5):311-313 setembro/outubro Referências 1. Lynch P, Galbraith KM. Panic in the emergency room. Can J Psychiatry. 2003;48(6):361-6. 2. Huffman JC, Pollack MH. 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