ESMEG Direito Constitucional ESCOLA SUPERIOR DA MAGISTRATURA DO ESTADO DE GOIÁS - ESMEG - DIREITO CONSTITUCIONAL Parte 1 PROF. TIAGO BENTES 2011 1 ESMEG Direito Constitucional ÍNDICE CAPÍTULO I: NOÇÕES DE TEORIA GERAL DO ESTADO I. 1. DO ESTADO: CONCEITO E ELEMENTOS:..................................................................4 I. 2. HISTÓRICO:................................................................................................................ 5 I. 2. HISTÓRICO:................................................................................................................ 5 I. 3. FORMAS DE ESTADO:................................................................................................ 6 I. 3. 1. Estado Unitário ou Simples:............................................................................ 7 I. 3. 2. Estado Composto:.......................................................................................... 7 I. 4. FORMAS DE GOVERNO..........................................................................................11 I. 4. 1. Classificações Antigas das Formas de Governo:......................................12 I. 4. 2. Classificação Moderna:............................................................................... 13 I. 5. REGIMES OU SISTEMAS DE GOVERNO:................................................................. 13 CAPÍTULO II: CONSTITUCIONALISMO E PODER CONSTITUINTE II.1. CONSTITUCIONALISMO:......................................................................................... 15 II. 1. 1. Constitucionalismo no Brasil:......................................................................16 II. 1. 2. Constitucionalismo do Futuro:................................................................... 16 II. 2. PODER CONSTITUINTE:........................................................................................... 16 II. 2. 1. Poder Constituinte Material e Poder Constituinte Formal:......................17 II. 2. 2. Poder Constituinte Originário e Poder Constituinte Derivado:...............17 II. 2. 3. Poder Constituinte Difuso:........................................................................... 20 II. 2. 4. Poder Constituinte Supranacional:............................................................ 20 CAPÍTULO III: TEORIA DA CONSTITUIÇÃO III. 1. INTRODUÇÃO, CONCEITO E ACEPÇÕES:...........................................................21 III. 2. CLASSIFICAÇÃO DAS CONSTITUIÇÕES:.............................................................. 22 III. 3. OUTROS DIFERENTES TIPOS DE CONSTITUIÇÃO:.................................................25 III. 4. REFORMA DA CONSTITUIÇÃO:............................................................................ 26 III. 4. 1. Emendas Constitucionais:.......................................................................... 26 III. 4. 2. Revisões Constitucionais:............................................................................28 2 ESMEG Direito Constitucional CAPÍTULO I NOÇÕES DE TEORIA GERAL DO ESTADO I. 1. DO ESTADO: CONCEITO E ELEMENTOS: O Estado corresponde à organização de um povo, localizado estavelmente sobre um território, sob o comando de um único poder (autogoverno soberano). O Estado da idade contemporânea tem como principal característica o fato de ser um ente político com um governo institucionalizado. Tais elementos podem ser classificados como materiais (população e território) e formais (ordenamento jurídico e o governo), além da finalidade que seria alcançar o bem comum de todos os cidadãos. Assim, é possível identificar três principais elementos identificadores do Estado, a saber: a) Povo (elemento humano); b) Território (elemento material); c) Soberania (elemento formal). Registre-se que, para alguns doutrinadores, há ainda um quarto elemento, qual seja, o “ordenamento jurídico”, responsável pela organização e normatização estatal. Entretanto, para a maioria da doutrina, esse elemento já estaria abrangido na acepção jurídica de “Soberania”, defendendo a ideia de que um governo somente poderia ser chamado como tal se houvesse um ordenamento jurídico que lhe desse sustentáculo. De qualquer modo, não há uma regra definida para garantir que um novo Estado seja reconhecido como tal. Normalmente, são necessários a 3 ESMEG Direito Constitucional viabilidade interna (estabilidade social, política e jurídica) e reconhecimento pelos demais Estados (comunidade internacional). Geralmente, quando esses dois fatores ocorrem, o novo Estado é aceito pela ONU, mas isso não é condição essencial para a existência de um Estado. A título meramente ilustrativo, podemos citar o caso de Kosovo, que é um território habitado por albaneses étnicos que fazia parte da Federação Iugoslava e foi palco de uma guerra civil nos anos 90, quando foi atacado pelo governo iugoslavo e defendido pela OTAN. Após negociações fracassadas, declarou unilateralmente a independência, sendo reconhecido como Estado por EUA e França, mas não pela Rússia e pela Espanha, e ainda não obteve ingresso na ONU. Suas instituições governamentais ainda são precárias. Por isso, ainda não pode ser considerado como um Estado consolidado. I. 2. HISTÓRICO: A história do Estado no Ocidente começa na Antiguidade Clássica. Durante esse período, o Estado teve uma grande variedade de formas, mas nenhum deles se parece muito com o moderno Estado, como monarquias que justificavam o poder através das religiões, impérios burocratizados, como o Império Romano, que dependia menos da função religiosa e era mais centralizada sobre militares e organizações legais e de uma coesão da nobreza. Também vieram na Antiguidade Clássica inovações como nas cidade-estados e na República Romana. A Grécia Antiga durante o século IV antes de Cristo concedeu cidadania à população livre, e em Atenas esses direitos foram combinados com uma democrática forma de governo embrionária. Com a queda do Império Romano, houve uma fragmentação do Estado imperial para mãos de privados e dos chamados feudos descentralizados (sistema feudal), cujo papel político, jurídico e militar correspondia à organização da produção econômica. Nestas condições, de acordo com os marxistas, a unidade econômica da sociedade correspondia exatamente à situação a nível local. A formalização das lutas sobre a taxação entre o monarca e outros 4 ESMEG Direito Constitucional elementos da sociedade (especialmente a nobreza e as cidades) deram origem ao que agora é chamado de “Standestaat”, caracterizada pelos parlamentos em que grupos sociais fundamentais negociam com o rei sobre questões jurídicas e econômicas. As tentativas de lutas contra o monarca conduziram a uma maior centralização de legislar de forma coercitiva (principalmente militar) com o poder em suas mãos. A partir do século XV, este processo deu origem ao Estado Absolutista, tido como "Estado moderno". Essa centralização do poder político envolveu a delimitação das fronteiras, como monarcas europeus gradualmente derrotados ou co-optado outras linhas de poder, tais como a Igreja Católica e a nobreza. Em lugar do sistema fragmentado das leis feudais, com muitas vezes reivindicações territoriais, grandes territórios definitivos emergiram. Este processo deu origem à alta centralização e cada vez mais formas burocráticas de leis absolutistas do séculos XVII e XVIII, quando as principais características do sistema estatal contemporâneo tomou forma, incluindo a introdução de um exército permanente, um sistema de tributação central, relações diplomáticas permanentes com as embaixadas, bem como o desenvolvimento da política econômica do Estado mercantilista. É neste período que o termo "Estado" é primeiramente introduzido no discurso político, em mais ou menos o seu significado atual. O primeiro teórico a utilizar a palavra “Estado” para denominar uma sociedade política foi Nicolau Maquiavel, na obra “O Príncipe”, escrito em 1513. A palavra vem do latim status ou state, que significa “estar firme”, sendo coerente com o anseio de Maquiavel de que a Itália da época, dividida em vários pequenos reinos e repúblicas, muitas vezes em guerra entre si, se unificasse sob um poder soberano e obtivesse estabilidade social e política. I. 3. FORMAS DE ESTADO: As formas de Estado surgem quando se busca classificar os Estados de acordo com as relações entre seus elementos constitutivos (população, território, governo e ordenamento jurídico). Portanto, segundo a doutrina, pode-se classificar os Estados entre (a) Estados Simples ou Unitários e (b) Estados Compostos. 5 ESMEG Direito Constitucional I. 3. 1. Estado Unitário ou Simples: O Estado Simples ou Unitário, constitui a forma de Estado por excelência, segundo a sua formulação histórica e doutrinária; o poder central é exercido sobre todo o território sem as limitações impostas por outra fonte do poder; inexistem entes politicamente descentralizados, podendo ocorrer, no máximo, uma descentralização de caráter administrativo. Ex.: França, Portugal e Uruguai. Como se pode notar, é a unicidade do poder, seja na estrutura, seja no exercício do mando, o que bem caracteriza esse tipo de Estado. Pelo fato de apresentar a centralização política, o Estado Unitário só tem uma fonte de Poder, o que não impede a descentralização administrativa. Geralmente o Estado Simples, divide-se em departamentos e comunas que gozam de relativa autonomia em relação aos serviços de seus interesses, tudo, porém como uma delegação do Poder Central e não como poder originário ou de auto-organização. O Estado unitário, por sua vez, pode ser classificado como: 1) Centralizado: caracterizado pela estruturação simples, onde existe uma só ordem jurídica, política e administrativa; e 2) Descentralizado: manifestado através do Estado Regional, estruturado pela primeira vez na Constituição espanhola de 1931, e se caracteriza pela descentralização meramente administrativa, com formação de regiões que se assemelham aos Estadosmembros de uma federação, mas destes se distinguem porque aqueles não são detentores de um Poder Constituinte derivado decorrente, ou seja, não possuem suas próprias constituições regionais, mas apenas estatutos regionais que passam pela aprovação do poder central, ou seja, não possuem autonomia política; neste caso, o que ocorre é uma descentralização administrativa (mera ramificação do poder central para facilitar a gestão admisnitrativa) e não descentralização política (criação de outros centros de poder autônomos, típicos do federalismo). I. 3. 2. Estado Composto: Na forma composta, o Estado continua sendo um só e assim se apresenta na vida internacional, mas, internamente, é formado por mais de um poder agindo sobre o mesmo território, de maneira harmoniosa. São consideradas formas compostas de Estado: a)as Uniões 6 ESMEG Direito Constitucional (pessoal, real e incorporada); b) as Confederações; e c) as Federações. As Uniões são próprias do período monárquico, e, com o enfraquecimento deste, já não oferecem tanto interesse. As uniões originaramse das circunstâncias políticas e sociais então vigentes e logo desapareceram. São espécies de Uniões: a Pessoal, que apresenta um único monarca, sendo que os Estados gozam de autonomia no plano interno e externo Representam uma situação temporária (Ex: Portugal e Espanha sob Felipe II, Felipe III e Felipe IV); a Real, na qual, embora cada Estado continue tendo autonomia interna, a vida internacional é comum, sob o poder de um só monarca (Ex: Suécia e a Noruega, Áustria e a Hungria durante muitos anos); e a Incorporada, por meio da qual os Estados desaparecem para constituir um terceiro, o que significa a criação de um novo Estado (Os antigos reinos da Inglaterra, Escócia e Irlanda, eram independentes, passando posteriormente a formar a monarquia britânica). As Confederações se formam mediante um Pacto entre Estados (Dieta) e não mediante uma Constituição; é uma União permanente de Estados Soberanos que não perdem esse atributo; têm uma assembléia constituída por representantes dos Estados que a compõe; não se apresenta como um poder subordinante, pois, as decisões de tal órgão só são válidas quando ratificadas pelos Estados Confederados; cada Estado permanece com sua própria soberania, o que outorga a Confederação um caráter de instabilidade devido ao Direito de Separação (secessão). Como a Confederação não possui um aparelho coativo capaz de impor as próprias decisões, o meio de que se utiliza para coibir os conflitos entre os Estados componentes é a organização de um sistema de arbitragem, cujos processos variavam imensamente. Em muitos casos, o membro rebelde da Confederação sofria numerosas represálias, como a pressão diplomática, o bloqueio militar, o boicote comercial, medidas que podiam chegar a alterações substanciais na vida interna do país excluído. A mais importante das confederações foi a Suíça, que se iniciou com um tratado entre três Cantões, em 1291, tendo passado por várias mudanças, porém conseguindo subsistir, até que se estabeleceu a União Federal em 1848. Da mesma forma a Confederação, sendo interessante destacar 7 ESMEG Direito Constitucional que, em verdade a Confederação não é uma forma de Estado, já que se trata de uma União precária de Estados soberanos que se agregam para atingir a determinado fim de interesse comum. A precariedade tem sede na soberania que cada Estado Confederado mantém, podendo ocorrer, inclusive a possibilidade de denúncia do tratado e a conseqüente extinção da Confederação. Nas Federações, o Estado se divide em províncias politicamente autônomas, possuindo duas fontes paralelas de Direito Público, uma Nacional e outra Provincial. Ex.: Brasil, EUA, México e Argentina. O fato de se exercer harmônica e simultaneamente sobre o mesmo território e sobre as mesmas pessoas a ação pública de dois governos distintos (federal e estadual) é o que justamente caracteriza o Estado Federal. Queiroz Lima define o Estado Federal como um Estado formado pela União de vários Estados-membros; "É um Estado de Estados". O doutrinador Pinto Ferreira formulou a seguinte definição: "O Estado Federal é uma organização formada sob a base de uma repartição de competências entre o governo nacional e os governos Estaduais, de sorte que a União tenha supremacia sobre os Estados-Membros e estes sejam entidades dotadas de autonomia constitucional perante a mesma União". O Estado federal se manifestou pela primeira vez Unidos, com a Constituição americana de 1787. nos Estados São características fundamentais do sistema federativo, segundo o modelo norte-americano: a) Distribuição do poder do governo em dois planos harmônicos (federal e provincial). O governo federal exerce todos os poderes que expressamente lhe foram reservados na Constituição Federal, poderes esses que dizem respeito às relações internacionais da União ou aos interesses comuns das Unidades Federadas. Os Estados-Membros exercem todos os poderes que não foram expressa ou implicitamente reservados à União, e que não lhes foram vedados na Constituição Federal. Somente nos casos definidos de poderes concorrentes, prevalece o principio da superioridade hierárquica do Governo Federal; b) Sistema Judiciarista, consistente na maior amplitude e 8 ESMEG Direito Constitucional competência do Poder Judiciário, tendo este, na sua cúpula, um Supremo Tribunal Federal, que é órgão de equilíbrio federativo e de segurança da Ordem Constitucional; c) Composição bicameral do Poder Legislativo, realizando-se a representação nacional na câmara dos deputados e a representação dos Estados-Membros do Senado Federal sendo esta última representação rigorosamente igualitária; d) Constância dos princípios fundamentais da Federação e da Republica, sob as garantias da imutabilidade desses princípios, da rigidez Constitucional e do instituto da Intervenção Federal. As Federações, de acordo com a forma de criação, podem ser classificadas como: 1º) Federalismo por agregação (ou processo centrípeto): é o processo de formação do Estado federal norte-americano. Diz-se por agregação em virtude de as 13 colônias americanas, após terem se tornado independentes da Inglaterra, e assim permanecido por pouco mais de 10 anos, abriram mão de suas soberanias e se uniram em um único e comum Estado soberano, mantendo-se apenas a autonomia. 2º) Federalismo por desagregação (ou processo centrífugo): foi o processo de formação do Estado federal brasileiro. Este, antes imperial e unitário, com o poder concentrado nas mãos da coroa, desagregou-se para formar os Estados-membros federados. Outra divisão do modelo de federalismo se dá entre federalismo dual e federalismo cooperativo. O modelo de federalismo dual surgiu nos EUA e se caracteriza por um sistema horizontal de divisão de competências. O modelo fundamental de divisão de competência dual é o de competências privativas ou exclusivas, que são modelos reciprocamente excludentes de concessão de competência. Se é conferida uma competência privativa para a União, a mesma não pode ser conferida para os Estados-membros e vice-versa. Esse modelo tem como principal propósito limitar o poder do Estado, definindo as atribuições de cada ente federativo. Da mesma que a separação de poderes separa as funções do estado (executivo, legislativo e judiciário), o federalismo dual divide as atribuições entre união e estados membros, a fim de evitar o exercício abusivo do poder do Estado contra as liberdades individuais. Surge juntamente com o Estado liberal, que se preocupa em conter o poder do estado. O outro modelo é o federalismo cooperativo, que se caracteriza 9 ESMEG Direito Constitucional por um sistema vertical de distribuição de competência. A atribuição de determinada competência à União não exclui a possibilidade de o Estadomembro exercer também a mesma competência. O modelo típico é o das competências comuns e/ou concorrentes. As competências comuns ou concorrentes se caracterizam pela conjugação de esforços entre os entes federativos para atingir um objetivo comum. Esse federalismo se desenvolveu no Estado social, cuja preocupação era a união de esforços entre os entes políticos para a satisfação das necessidades básicas da população. Não por outro motivo que os serviços públicos qualificados como tal no Estado de bem estar social (wellfare state), saúde e educação, são matérias de competência comum dos entes. Outra classificação mais recente é entre federalismo simétrico e federalismo assimétrico. O federalismo será simétrico quando não houver diferenças culturais, sociais e econômicas significativas dentro do país. Há uma simetria, homogeneidade, entre as diversas partes do país quanto a esse aspecto, característica essa não pertencente ao federalismo brasileiro, o qual é claramente assimétrico, dotado de heterogeneidade cultural, social e econômica ao logo de suas regiões. I. 4. FORMAS DE GOVERNO. Em ciência política, chama-se forma de governo (ou sistema político) o conjunto de instituições políticas por meio das quais um Estado se organiza a fim de exercer o seu poder sobre a sociedade. Cabe notar que esta definição é válida mesmo que o governo seja considerado ilegítimo. Tais instituições têm por objetivo regular a disputa pelo poder político e o seu respectivo exercício, inclusive o relacionamento entre aqueles que o detêm (a autoridade) com os demais membros da sociedade (os administrados). A forma de governo adotada por um Estado não deve ser confundida com a forma de Estado (unitária ou federal) nem com seu sistema de governo (presidencialismo, parlamentarismo, dentre outros). 10 ESMEG Direito Constitucional I. 4. 1. Classificações Antigas das Formas de Governo: I. 4. 1. 1. Classificação de Aristóteles: a) Formas puras: a.1) Monarquia: governo de um no interesse geral; a.2) Aristocracia: gov. de poucos no interesse geral; a.3) Politéia: governo de muitos no interesse geral. b) Formas impuras: b.1) Tirania: governo de um no interesse pessoal; b.2) Oligarquia: gov. de poucos no próprio interesse; b.3) Democracia: gov. de muitos no próprio interesse. I. 4. 1. 2. Classificações de Montesquieu: a) Primeira classificação: a.1) Aristocracia(Princípio–Moderação); a.2) Monarquia (Princípio-Honra); a.3) Despotismo(Princípio – Terror). b) Segunda classificação: b.1) Formas impuras: 1) Monarquia: Governo de um só; 2) Aristocracia: Governo de vários; 3) Democracia: Governo do povo. b.2)Formas impuras: 1) Tirania: Corrupção da Monarquia; 2) Oligarquia: Corrupção da Aristocracia; 3) Demagogia: Corrupção da Democracia. I. 4. 1. 3. Classificação de Maquiavel: a) Principados (Monarquia, Reino): a.1) Absoluto: Sem divisão de poder; a.2) Não-Absoluto: Divide poder com a nobreza. b) República (Aristocracia ou Democracia). O diferencial na classificação de Maquiavel consiste no fato de ser pregada a ocorrência de ciclos de formas de governos, de modo a se tornar possível prever o destino de determinado Estado ao se estudar 11 ESMEG Direito Constitucional meticulosamente os eventos passados (Teoria dos Ciclos). I. 4. 2. Classificação Moderna: I. 4. 2. 1. Quanto às funções de Chefes de Governo e de Estado: a) Cumulativo; b) Não-Cumulativo. I. 4. 2. 2. Quanto à relação entre o Governo e o cidadão: a) Monarquia (vitaliciedade, irresponsabilidade); b) República responsabilidade). hereditariedade e eletividade e (temporariedade, Inovação interessante deve-se ao mestre austríaco Hans Kelsen, que, partindo da definição do Estado como ordenamento jurídico, sustenta que o único meio de distinguir uma forma de governo de outra seria na indicação do modo pelo qual uma constituição regula a produção do ordenamento jurídico. Esse ordenamento poderia ser criado de forma heterônoma (os destinatários das normas não participariam de sua produção), o que resultaria na forma chamada de autocracia, ou, com a participação dos destinatários na produção do ordenamento jurídico (normas classificadas como autônomas), o que resultaria na chamada democracia. I. 5. REGIMES OU SISTEMAS DE GOVERNO: Os chamados regimes de governo (ou sistemas de governo) mostram as relações que podem observar-se entre o Poder Executivo e o Poder Legislativo, ou ainda, seria o regime de governo uma espécie de técnica de organização do Poder Executivo. São classificadas pela doutrina parlamentarismo, semipresidencialismo e diretorial. como presidencialismo, No regime presidencialista, as funções de Chefe de Estado e Chefe de Governo são cumuladas pelo Presidente da República, em uma chefia unipessoal do Poder Executivo, fato este que leva alguns doutrinadores a 12 ESMEG Direito Constitucional sustentarem que esse regime seria uma forma de monarquia na versão republicana. Outra marca principal do regime presidencialista é a rígida separação de poderes, sem ingerências do legislativo no executivo, e viceversa. Por fim, também caracterizam o regime em tela a elegibilidade por período determinado e o poder de veto suspensivo dos projetos de lei. O regime parlamentarista, por sua vez, tem como característica a divisão nítida entre a chefia de governo e a chefia de Estado, sendo exercidas tais funções por pessoas distintas. Destarte, dependendo da forma de governo adotada, o Presidente ou o Monarca (Rei ou Imperador) assumem a Chefia do Estado e o Primeiro-Ministro ou premier a chefia do governo (condução dos negócios político-administrativos do Estado), o que se denomina forma “dualista” de poder. Outra característica marcante desse regime é a interdependência entre os poderes executivo e legislativo. O Primeiro-Ministro não possui mandato, sendo mantido no poder enquanto obtiver apoio da maioria do parlamento; de outro lado, o Chefe de Estado tem po poder de dissolver o parlamento (ou, pelo menos, da Câmara eletiva, no sistema bicameral) e convocar novas eleições. O sistema semipresidencalista consiste numa derivação do regime parlamentarista, agora numa forma organizatória, também conhecida como “parlamentarismo misto, híbrido ou intermediário” ou “neoparlamentarismo”. Nesse regime, convivem regras típicas dos sistemas presidencial e parlamentar de governo, de modo que o chefe de Estado (geralmente com o título de presidente) compartilham (partilham) em alguma medida o poder executivo, participando, ambos, do cotidiano da administração pública de um Estado. Já no regime diretorial, também chamado de convencional, o poder político do Estado se concentra no parlamento, sendo o Poder Legislativo aquele que escolhe quem exercerá a função executiva. Nota-se que há uma nítida subordinação do Poder Executivo ao Legislativo. 13 ESMEG Direito Constitucional CAPÍTULO II CONSTITUCIONALISMO E PODER CONSTITUINTE II.1. CONSTITUCIONALISMO: Constitucionalismo “é um movimento social que dá sustentação à limitação do poder, inviabilizando que os governantes possam fazer prevalecer seus interesses e regras na condução do Estado”.1 Uadi Lammêgo Bulos divide o constitucionalismo em dois sentidos: o amplo e o estrito. Em sentido amplo, constitucionalismo seria o fenômeno relacionado ao fato de todo Estado possuir uma constituição, seja qual for a época da humanidade. Já em sentido estrito, constitucionalismo seria a técnica jurídica de tutela das liberdades que possibilitou aos cidadãos o exercício de seus direitos e garantis fundamentais, sem que o Estado pudesse oprimi-los. J. J. Gomes Canotilho, por sua vez, identifica os vários formatos de constitucionalismo, de acordo com a maneira que esse movimento se desenvolveu. Assim, teríamos o constitucionalismo inglês, caraterizado pela conquista paulatina e imperceptível dos direitos e das garantias fundamentais (desde a Magna Charta de 1215, o “Petition of Rights”, de 1628, “Bill of Rights”, de 1689, até a Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948); o constitucionalismo americano, que se deu de forma convencional (pactual) entre as 13 colônias, por meio dos contratos de colonização (o “Compact”, de 1620, as “Fundamental Orders of Connecticut”, de 1639, e a “Declaration of Rights”, de 1776); e o constitucionalismo francês, caracterizado por movimentos revolucionários que impuseram uma violenta ruptura entre o ancién regime e o Estado de Direito (Revolução Francesa e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, ambas de 1789). 1 CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional. Belo Horizonte: Del Rey, 2005. p. 165. 14 ESMEG Direito Constitucional II. 1. 1. Constitucionalismo no Brasil: O constitucionalismo no Brasil evoluiu no mesmo ritmo das transformações substanciais do próprio Estado e teve como primeiro esboço (sem resultados concretos) o movimento revolucionário em Pernambuco, em 1817, com a elaboração de um projeto de Constituição da “nova república”. Entretanto, num ato de violência, surge a Constituição de 1824, a primeira e a mais duradoura das constituições, que culminou com a dissolução da Assembleia Constituinte que estava sendo organizada. Quatro fases marcam o constitucionalismo brasileiro: 1) Liberalcentralizadora (Império, com pensamentos de Pimenta Bueno); 2) Republicana (1889, com pensamentos de Rui Barbosa); 3) Autoritária (CF/37, conivente com os arbítrios do ditador) ; e 4) Liberal-social (CF/46 e CF/88, com o hiato do golpe militar que restabeleceu o modelo centralizador). II. 1. 2. Constitucionalismo do Futuro: Com a evolução cada vez mais veloz da humanidade, urge a necessidade de serem incorporados ao conceito de constitucionalismo, até então focado na preocupação meramente social, as perpetcivas do fraternalismo e da solidariedade. Assim, novos valores caracterizarão o constitucionalismo do futuro, como: a verdade (constituições sem promessas impossíveis), a solidariedade (nova ideia de igualdade e de justiça social), a continuidade (evitar a ruptura da “lógica dos antecedentes”), a participação (democracia participativa), a integração (adesão a órgãos supranacionais que garantam a convivência harmônica entre os povos),e a universalização (direitos fundamentais internacionais). II. 2. PODER CONSTITUINTE: Pode ser conceituado como sendo aquele poder que institui o Estado, firmando as novas balizas jurídicas de convivência do homem em sociedade. Assim, sob um enfoque formal, o poder constituinte antecede o próprio Estado. 15 ESMEG Direito Constitucional Embora o poder constituinte já fosse uma força intrínseca e já existente entre os povos, foi apenas no século XVIII que o mesmo se teorizou, através da obra “Qu'est-ce que le tiers État?” (tradução: “Que é o terceiro Estado?”), de autoria do Abade Emmanuel Joseoh Sieyès, para quem o “terceiro Estado” seria a nação, que seria o verdadeiro titular do poder constituinte, como forma de se igualar o povo aos outros dois Estados (clero e nobreza). Segundo Sieyès, “em toda nação livre – e toda nação deve ser livre – só há uma forma de acabar com as diferenças que se produzem com respeito à Constituição. Não é aos notáveis que se deve recorrer, é à própria nação. Se precisamos de Constituição devemos fazê-la. Só a nação tem direito de fazê-la”. Canotilho salienta que esse poder é, ao mesmo tempo, desconstituinte e reconstituinte, pois desconstitui o poder anterior, criando um novo. II. 2. 1. Poder Constituinte Material e Poder Constituinte Formal: O poder constituinte material se identifica com a força política da nação, que tem o condão de gerar a mudança institucional e obedecerá os anseios dos diferentes grupos sociais. Essa faceta material do poder constituinte é a que determinará as pautas sobre as quais a nova constituição se revelará, indicando o conteúdo razão pela qual antecede a faceta formal. Já o poder constituinte formal se identifica com o ato de empregar a força política, com a atividade de “escrever” o conteúdo da constituição dentro das pautas fixadas pelo poder constituinte material. II. 2. 2. Poder Constituinte Originário e Poder Constituinte Derivado: De acordo com as atribuições do poder constituinte, a maioria da doutrina o classifica em originário e derivado. 16 ESMEG Direito Constitucional II. 2. 2. 1. Poder Constituinte Originário: Também denominado de poder constituinte genuíno, de primeiro grau, primário, primogênito ou fundacional. É o poder de elaborar uma nova constituição Considerando que a Constituição inaugura o próprio ordenamento jurídico de um Estado, ou seja, que sem ela não há direito, o poder de elaborar essa Constituição antecede ao próprio direito, razão pela qual o poder constituinte originário é um poder “de fato”. São características desse poder: a) Inicial: por não se fundar em outro poder e por não derivar de uma ordem jurídica anterior; b) Autônomo ou Ilimitado: por não estar subordinado a outro poder, podendo, em tese, incluir qualquer espécie de norma na Constituição; c) Incondicionado: não se sujeita a condições ou fórmulas jurídicas para sua manifestação. Para alguns doutrinadores mais aprofundados, o poder constituinte originário não pode ser caracterizado como ilimitado, como como sói ocorrer com outras formas de poder. Deve, portanto, o poder constituinte seguir alguns balizamentos mínimos para que possa ser legitimado. Uadi Lammêgo Bulos revela limitações metajurídicas ao poder constituinte originário, que podem ser classificadas como: 1) ideolágicas, consistentes nas crenças, e nos valores arraigados no âmago de uma sociedade; 2) institucionais, referentes aos institutos sociologicamnte reconhecidos pela comunidade, como a família, a apropriedade, a educação, etc.; e 3) substanciais, que estabelecem os parâmetros para a fixação do conteúdo material das normas constitucionais, subdividindo-se em três espécies de vedações: as transcendentes (referentes à consciência jurídica universal, como a dignidade da pessoa humana), as imanentes (quanto à identidade do Estado como república) e as heterônomas (condicionamento às normas de Direito Internacional). 17 ESMEG Direito Constitucional II. 2. 2. 2. Poder Constituinte Derivado: É o poder constituído pelo poder constituinte originário destinado a proceder as reformas do texto constitucional ou a organizar o Estado-membro dentro de uma federação. Daí temos duas espécies de poder constituinte derivado: o decorrente e o reformador. O primeiro é típico dos Estados Compostos Federados e se assemelha a um poder constituinte dos Estados-membros, permitindo que estes elaborem e reformem suas constituições estaduais, mas sempre obedecendo aos limites estabelecidos pela Constituição Federal, podendo complementar esta, mas nunca contrariá-la. No caso brasileiro, o poder constituinte derivado decorrente se manifesta pelo art. 11 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que convocou os Estados-membros a elaborarem suas constituições estaduais no prazo de um ano. Observe-se que os Municípios e o Distrito Federal não foram agraciados com o poder constituinte derivado decorrente, de modo que os mesmos não podem elaborar Constituições municipais ou distrital, mas, apenas, Leis Orgânicas. Esse fato é o principal argumento de crítica à elevação dos Municípios ao patamar de ente federativo autônomo. Já o poder constituinte derivado reformador, também chamado de poder constituinte secundário, é aquele destinado à alteração do texto constitucional. Ao contrário do poder constituinte originário, o derivado reformador é subordinado e condicionado, pois este se vincula e se limita naquele. O poder constituinte derivado reformador se manifesta através de duas formas: as emendas constitucionais e as revisões constitucionais. Enquanto aquelas são uma forma permanente de alterar o texto constitucional através de um procedimento mais dificultoso e solene (3/5 em dois turnos de cada casa do Congresso Nacional, obedecendo-se às cláusulas pétreas), estas foram previstas transitoriamente no art. 3º, ADCT para modificar a Constituição de 18 ESMEG Direito Constitucional maneira mais célere e informal (pelo prazo de 5 anos, a CF podia ser modificada pela votação do Congresso Nacional em turno único e em sessão unicameral). Atualmente, já foram editadas 67 Emendas Constitucionais e 6 Revisões Constitucionais. II. 2. 3. Poder Constituinte Difuso: Alguns doutrinadores identificam uma modalidade sui generis de poder constituinte, responsável pelas mutações constitucionais, entendidas estas como formas informais e imperceptíveis de alteração do conteúdo semântico das normas constitucionais. II. 2. 4. Poder Constituinte Supranacional: Partindo da premissa de que cresce, cada vez mais, a globalização de valores (e não só econômica), o Direito Internacional passa a se preocupar ainda mais com o Direito Constitucional, no afã de estabelecer regras jurídicas cada vez mais uniformes. Esse poder tende à elaboração de uma Constituição supranacional, seja continental, seja mundial, que estabelecerá regras mínimas de limitação dos poderes e de direitos humanos. 19 ESMEG Direito Constitucional CAPÍTULO III TEORIA DA CONSTITUIÇÃO III. 1. INTRODUÇÃO, CONCEITO E ACEPÇÕES: Segundo Ferdinand Lassalle, existe um pressuposto universal de que em todos os lugares do mundo e em todas as épocas, sempre existiu a Constituição, bastando a reunião de três elementos fundamentais para que uma comunidade, sociedade ou Estado moderno existisse, ou seja, para que fosse estruturado por uma constituição (ainda que não escrita): identidade (que leva o povo a se identificar como pertencente a uma determinada sociedade, cuja noção é conhecida modernamente como nacionalidade), organização reiterada (regras de quem manda e quem obedece, normalmente por meio de hierarquia, o que nem sempre ocorre, como na anarquia) e valores (um grupo somente se reconhece como tal se tiver valores comuns construídos pela própria sociedade, os quais se tornarão, com o passar do tempo, normas coercitivas jurídicas). A Constituição pode ser definida como a estrutura de um ente que se convencionou chamar de Estado. Na Constituição encontram-se os elementos estruturadores do Estado, fixadores de sua organização e da previsão de direitos e garantias fundamentais; Pode-se também afirmar que a Constituição é o conjunto de normas e princípios que organizam os elementos constitutivos do Estado (território, povo e governo). Assim, por conter normas que dão estrutura ao Estado, normas que estabelecem a forma de elaboração de outras normas e que fixam os direitos e as responsabilidades fundamentais dos indivíduos, é que a Constituição passa a ser reconhecida como Lei Fundamental, por ser a base de todo o direito positivo da comunidade que a adote, em especial, naqueles países que possuem um sistema jurídico baseado na lei escrita, sobrepondo-se aos demais atos normativos por estar situada no vértice da pirâmide jurídica, que representa idealmente o conjunto de normas jurídicas vigentes em 20 ESMEG Direito Constitucional determinado âmbito espacial. Segundo leciona Uadi Lammêgo Bulos, a constituição possui três acepções tradicionais distintas, por meio das quais se busca compreender o que é uma constituição: a) Acepção Sociológica (Ferdinand Lassalle): constituição seria a norma fundamental que se apoia nos “fatores reais de poder”, tidos como a força ativa de todas as leis da sociedade, sem os quais a constituição seria uma mera promessa impraticável. Assim, Lassalle identifica as “constituições reais” (dotadas de fatores reais de poder) e as “constituições folha de papel” (despidas desses fatores); b) Acepção Jurídica (Hans Kelsen): constituição seria a “norma hipotética fundamental” que se apresenta como o vértice superior do ordenamento jurídico (pirâmide de Kelsen); c) Acepção Política (Carl Schmitt): constituição seria o fruto da decisão política fundamental, que se refere aos direitos fundamentais e aos elementos estruturantes do Estado, no que se diferenciaria das por ele chamadas de “leis constitucionais” (normas que, apesar de estarem no texto constitucional, não são fruto da decisão política fundamental) III. 2. CLASSIFICAÇÃO DAS CONSTITUIÇÕES: As Constituições podem ser classificadas sob inúmeras formas, a depender do critério utilizado. Abaixo seguem as principais classificações encontradas na doutrina e na jurisprudência: III. 2. 1. Quanto ao Conteúdo: a) Materiais: Para que uma norma seja adjetivada de “constitucional”, é preciso que o seu conteúdo seja tipicamente constitucional, ou seja, uma norma que diga respeito à estruturação do Estado, à limitação de poderes e à previsão de direitos e garantias fundamentais. As demais normas, ainda que inseridas em um texto denominado “constituição”, 21 ESMEG Direito Constitucional não poderiam ser chamadas de constitucionais, mas apenas de previstas na Constituição. Assim, norma constitucional é aquela que tenha conteúdo constitucional, ainda que esteja fora da compilação textual da constituição; b) Formais: Constituição seria apenas o conjunto normas inseridas no texto compilado e solene que tenha a denominação de “Constituição” independentemente de seu conteúdo. É o caso da CF/88, na qual existem normas que não precisariam estar inseridas em seu bojo, mas que, por estarem ali localizadas, devem ser chamadas de normas constitucionais (ex.: art. 242, §2º, CF). III. 2. 2. Quanto à Estabilidade: a) Flexíveis: Para ser alterada, não exige-se um procedimento mais dificultoso do que aqueles utilizados para a elaboração de normas infraconstitucionais. O critério de revogação seria o cronológico, não o hierárquico, de modo que a Constituição estaria no mesmo patamar que as leis infraconstitucionais; a.1.) Transitoriamente Flexíveis: É a que traz a previsão de um determinado período dentro do qual a Constituição pode ser alterada da mesma forma que são alteradas as normas infraconstitucionais; b) Rígidas: Para ser alterada, exige-se um procedimento mais dificultoso do que aqueles utilizados para a elaboração de normas infraconstitucionais. É o caso da CF/88. A rigidez constitucional possui três diferentes graus: b.1.) Super-rígidas (grau máximo): processo de modificação rigorosíssimo, fora do comum, mediante a previsão de freios jurídicos de elevado teor proibitório; b.2.) Rígidas (grau médio): nem muito, nem pouco rígida; b.3.) Pouco rígidas (grau mínimo): processo de modificação apenas um pouco mais dificultoso do que o da alteração das leis. c) Semi-flexíveis ou semi-rígidas: Aquela que possui uma parte de normas rígidas e outra parte flexível (ex.: Constituição brasileira de 1824, art. 178); e) Fixas, Silenciosas ou “em Branco”: Somente pode ser alterada pelo mesmo poder que a criou (poder constituinte originário). Também são chamadas de silenciosas por não preverem procedimentos especiais para a sua modificação (ex.: Constituição espanhola de 1876); f) Imutáveis: Alicerçam-se na crença de que não haveria órgão competente para proceder, legitimamente, à reforma delas, muito 22 ESMEG Direito Constitucional menos para revogá-la. São inconcebíveis nos dias atuais, razão pela qual também são chamadas de utópicas, ou ainda de graníticas, permanentes ou intocáveis; f.1.) Transitoriamente Imutáveis: As que preveem um período dentro do qual elas não poderiam ser modificáveis. III. 2. 3. Quanto à Forma: a) Escritas ou Instrumentais: As prescritas de modo sistemático e codificado em documentos solenes. b) Não-Escritas: As que não são prescritas de modo único, codificado e exaustivo em um texto solene e formal (Ex.: Constituição inglesa). Deve-se observar que não existem constituições inteiramente não-escritas; a própria Carta inglesa possui alguns textos escritos, sendo a outra parte integrada pela jurisprudência e pelas convenções constitucionais. III. 2. 4. Quanto à Extensão: a) Sintéticas: São as concisas, sucintas, contendo apenas aquilo que toda constituição essencialmente deveria conter (ex.: CF-EUA/1787). Também são chamadas de tópicas, breves ou curtas. b) Analíticas ou Prolixas: São mais detalhistas, com inúmeros dispositivos com subdivisões. (Ex: CF/88). III. 2. 5. Quanto à Ideologia: a) Ecléticas ou Complexas: Influenciadas por diversas ideologias, que convivem harmonicamente entre si. b) Ortodoxas ou Simples: Elaboradas com base em um único pensamento ideológico (Ex.: Constituições Soviéticas). III. 2. 6. Quanto Modo de Elaboração: a) Históricas ou Consuetudinárias: As que são produto da lenta evolução histórica, nascendo e aumentando aos poucos. b) Dogmáticas: As elaboradas por um órgão constituinte, já nascendo pronta. III. 2. 7. Quanto à Origem: a) Promulgadas ou Democráticas: Quando o órgão constituinte é composto por representantes do povo. 23 ESMEG Direito Constitucional b) Outorgadas: Elaboradas sem a participação do povo, sendo simplesmente impostas aos cidadãos. Também denominada por alguns como “Carta Constitucional”, de modo que apenas os textos que são livremente discutidos pelo povo é que poderiam ser chamadas de Constituição. c) Pactuadas: Surgem mediante um pacto entre o soberano e a organização nacional, de modo que o poder constituinte originário fica nas mãos de mais de um titular. Também são chamadas de constituições dualistas. d) Cesaristas: São aquelas elaboradas sem a participação dos cidadãos, mas são submetidas a plebiscito ou referendo, como forma de legitimar a presença do detentor do poder. Também são chamadas de constituições bonapartistas. III. 2. 8. Quanto ao Sistema: a) Principiológicas ou Abertas: Predominam os princípios, compostas de normas de elevado grau de abstração. b) Preceituais: Prevalecem as regras. III. 2. 9. Quanto ao Modelo Finalístico (ou Função): a) Constituições-Garantia: Aquelas que estruturam o Estado, delimita os seus poderes e asseguram o respeito aos direitos fundamentais. É o modelo clássico. b) Constituições-Balanço: São reflexo das lutas de classes no Estado, sendo editadas outras constituições à medida em que a construção do comunismo atinge um novo estágio. c) Constituições-Dirigentes: Desenvolvidas por Canotilho. São as que prevêem um plano político obrigatório, com normas programáticas que vinculam o legislador. III. 3. OUTROS DIFERENTES TIPOS DE CONSTITUIÇÃO: 1) Heteroconstituições: Concebia por Jorge Miranda. São aquelas decretadas de fora do Estado que irão reger. Ex.: Constituição cipriota, que surgiu do acordos celebrados em Zurique, ente a Grã-Bretanha, a Grécia e a Turquia. 24 ESMEG Direito Constitucional 2) Constituição Suave: Concebida por Gustav Zagrebelsky. É aquela que não contém exageros, sem a consagração de preceitos impossíveis de ser vividos na prática. Ex.: Constituição dos EUA de 1787 ( constituiçãogarantia). 3) Constituição Plástica: Defendida por Raul Machado Horta. É a que apresenta mobilidade, maleabilidade, permitindo que ela seja adequada de acordo com as situações concretas, com maior suscetibilidade de sofrer mutações contitucionais. Normalmente, consagram normas de eficácia limitada. III. 4. REFORMA DA CONSTITUIÇÃO: Duas são as formas de alterar, formalmente, a Constituição: Emendas Constitucionais e Revisões (ou Emendas Constitucionais de Revisão). III. 4. 1. Emendas Constitucionais: As Emendas Constitucionais estão previstas no art. 59, I, da Constituição Federal, e constituem-se em atos normativos primários que visam acrescer, suprimir ou modificar o texto constitucional. O procedimento legiferante se encontra disciplinado no art. 60, CF, possuindo as seguintes formalidades: 1) Iniciativa: a) 1/3 da Câmara ou do Senado; b) O Presidente da República; c) Mais da metade das Assembléias Legislativas (cada uma com maioria relativa);2 2) Procedimento: a) Apresentação da PEC na Câmara (salvo se for PEC do Senado); 2 Note-se que não há iniciativa popular de emenda constitucional. Outro detalhe é que o STF assentou o entendimento de que as matérias de iniciativa privativa do Presidente da República aplicáveis às leis também são, por simetria, aplicáveis às emendas constitucionais. 25 ESMEG Direito Constitucional b) Votação em dois turnos em cada casa (total de 4 turnos); c) Aprovação por 3/5 em cada turno na casa iniciadora; d) Aprovação por 3/5 em cada turno na casa revisora; e) Se houver alteração do projeto em uma das casas, volta-se para a outra casa. Se nesta última a alteração for rejeitada, retorna-se à casa que havia alterado para votar o projeto originário. Se houver rejeição da própria PEC, ela não poderá ser objeto de nova proposta na mesma Sessão Legislativa; f) Promulgação pelas Mesas da Câmara e do Senado, inexistindo sanção presidencial. Principais diferenças nos procedimentos dos Projetos de Leis (PL) e das Propostas de Emendas Constitucionais (PEC): 1) A iniciativa dos PL é bem mais abrangente, incluindo a iniciativa popular (art. 61, caput, CF); na PEC, poucos podem apresentá-la, não incluindo a iniciativa popular (art. 60, caput, CF); 2) Quanto às alterações, no PL, a casa revisora que apresentar uma emenda ao projeto também já está, de antemão, aprovando o texto originário caso a alteração seja rejeitada pela casa iniciadora. Assim, se uma das casas não concorda com o teor do PL, deve rejeitá-lo, e não apresentar emenda. Já na PEC, não há esse consentimento prévio e tácito; se houver alteração da PEC por uma das casas e a outra rejeitar a alteração, a proposta é reenviada para a casa revisora, de modo que uma EC somente pode ser aprovada se o mesmo texto for aprovado expressamente por ambas as casas; 3) No PL, há submissão à sanção presidencial; na PEC, não; 4) No PL, a promulgação cabe, em regra, ao Presidente da República; caberá, contudo, ao Presidente do Senado Federal promulgá-lo se o Presidente da República ficar inerte no prazo de 48 horas, nas hipóteses de sanção tácita ou derrubada de veto (art. 66, §§ 3º e 5º, CF); na PEC, cabe às Mesas da Câmara e do Senado a promulgação. A edição das emendas constitucionais deve obedecer a certos limites previstos no art. 60, CF. São quatro as principais espécies de limitações a esse poder: a) Formais: estão previstas no art. 60, I, II e III, c.c. §§ 2º e 5º, CF, e impõem às reformas constitucionais o dever de obediência a um procedimento pré-estabelecido, de acordo com a espécie de alteração. Para a grande maioria dos doutrinadores, as regras da reforma constitucional não podem ser modificadas, sob pena de se burlar o sistema, evitando-se, assim, o que se denomina de “dupla 26 ESMEG Direito Constitucional revisão”; b) Materiais: estão previstas no art. 60, §4º, CF, e consistem na vedação de as reformas constitucionais abrangerem determinados conteúdos tidos por imodificáveis, também chamados de cláusulas pétreas; c) Circunstanciais: estão previstas no art. 60, §1º, CF, e proíbem que a Constituição seja reformada enquanto o Estado estiver vivenciando certas situações de crise institucional, como a intervenção federal, o estado de sítio e o estado de defesa; d) Temporais: não foram previstas na CF/88. Vedam a reforma da Constituição durante um prazo determinado, como ocorreu na Constituição de 1824 (art. 174). O art. 3º do ADCT não pode ser encarado como limitação temporal, pois vedava apenas uma espécie de reforma constitucional. Há, ainda, as limitações implícitas ao poder de reforma, como a as que dizem respeito ao próprio procedimento de reforma ( dupla revisão) e à titularidade do poder constituinte. Insta alertar que há uma corrente doutrinária minoritária que defende a ideia de que esse poder não sofre limitações, por ser ele manifestação do próprio poder constituinte. III. 4. 2. Revisões Constitucionais: A revisão constitucional está prevista no art. 3º do ADCT, cuja realização havia sido previamente programada para depois do 5º ano da promulgação da Constituição, ou seja, a partir de 1993. Note-se que a Constituição, por meio desse dispositivo transitório, não estabeleceu uma época exata para a feitura da revisão, mas apenas estabeleceu o termo inicial, com prazo indeterminado para o seu exercício. Entretanto, apesar de não ter sido prevista data limite para o exercício dessa faculdade, ela somente poderia ser exercitada por uma única vez, ou seja, em apenas uma sessão do Congresso Nacional, seja qual for a quantidade de revisões. Esse entendimento é fruto da interpretação do próprio art. 3º do ADCT, que prevê, no no singular, a locução : “A revisão constitucional será realizada...”. Assim, uma vez exercitada a faculdade de “revisar”, de forma 27 ESMEG Direito Constitucional menos solene, a Constituição, a norma que a previu se torna uma “norma constitucional de eficácia exaurida”, não podendo mais tal faculdade ser exercitada no futuro. Em 1994, o Congresso Nacional exercitou a faculdade do art. 3º do ADCT, editando 6 “Emendas Constitucionais de Revisão”. Logo, não pode mais o Poder Legislativo proceder a nova revisão da Constituição, passando esta a ser modificável apenas pelo processo de emenda constitucional. Atente-se ao fato de que a ECR n. 01 foi editada em 01/03/1994, enquanto que as ECR`s ns. 02 a 06 em 07/06/1994. Então se pergunta: considerando que as datas são diferentes, a edição da primeira já não tornaria exaurida a faculdade revisional? A resposta é negativo, pois, no caso concreto, a sessão unicameral não foi formalmente encerrada, mas apenas suspensa para ulterior continuação, votando-se a ECR sobre a qual não havia maiores controvérsias e postergando as demais para a sessão continuativa. Destarte, o caso brasileiro foi de sessão única, dividida em duas datas distintas. Por algum tempo se discutiu sobre a possibilidade de o art. 3º do ADCT ser alterado através de emenda constitucional para que fosse reaberta a faculdade revisional. Entretanto, logo se firmou o entendimento no sentido da impossibilidade da modificação do art. 3º do ADCT, em razão de se tratar de vontade específica e excepcional do constituinte originário, a fim de conferir maior rididez ao texto constitucional. O procedimento da revisão constitucional, que é mais simplificado, consistindo em uma singela sessão unicameral do Congresso Nacional, em turno único, e bastando a aprovação da maioria absoluta. Perceba-se que a sessão é do Congresso Nacional (Senado Federal + Câmara dos Deputados) em sessão unicameral, ou seja, senadores e deputados federais se unem em uma só sessão e, com votos de igual valor, deliberam sobre a ECR. Essa é a única previsão constitucional em que o sistema bicameral é desfeito para a deliberação de um ato normativo. Há de ser salientado que “sessão unicameral” (art. 3º, ADCT) difere de “sessão conjunta” (art. 57, §3º, CF). Apesar de, em ambos os casos, a reunião dos deputados e senadores ocorrer em um mesmo instante, na sessão conjunta, a votação é simultaneamente feita por cada casa e os votos 28 ESMEG Direito Constitucional são computados separadamente (maioria absoluta da Câmara = 257 deputados, e maioria absoluta do Senado = 41 senadores), ou seja, “conjunta” é apenas a votação, não a apuração. Já na sessão unicameral, tanto a votação quanto a apuração são conjuntas, ou seja, os votos de senadores e deputados são contados de forma igual, como se todo o Congresso Nacional fosse uma só casa (513 deputados + 81 senadores = 594 parlamentares, sendo a maioria absoluta 298 congressistas). Por fim, as revisões constitucionais devem obediência aos mesmos limites estabelecidos para a edição das emendas constitucionais. Assim, são os requisitos para a edição de uma ECR: a) Em período após 5 anos da promulgação da CF/88 (após 1993); b) Somente se exercita por uma vez; c) Sessão unicameral do Congresso Nacional; d) Cada ECR é votada em turno único; e) Quorum de aprovação de maioria absoluta; f) Promulgação pela Mesa do Congresso Nacional; g) Atendimento aos mesmos limites estabelecidos para as EC`s. 29