Jurema Pena Jurema Penna nasceu em 1927, na cidade de Alcobaça, localizada ao extremo sul da Bahia. Quando criança morando na cidade de Itajuípe, sonhou em fugir com o circo que por ali passava. Esse sonho só foi concretizado duas décadas depois, após a conclusão do curso de Bacharelado em Direito, um desejo de seu pai. Aluna da primeira turma da Escola de Teatro da UFBA, dirigida por Martim Gonçalves. Seu primeiro espetáculo foi O Auto da graça e Glória da Bahia, de Godofredo Filho, em 1949, por ocasião das festas pelo 4º centenário da cidade de Salvador. Nesta primeira montagem em que atuou como atriz amadora, ganhou o prêmio no Festival Nacional de Teatro Amador. Fascinada pela força do Teatro, com Leonel Nunes, Reinaldo Nunes e Sóstrates Gentil, fundou a Companhia Baiana de Comédias – CBC, que ocupava um pequeno palco no prédio da Biblioteca Pública do Estado da Bahia. A companhia foi criada, na década de 1960, a partir do desejo de se fazer um teatro profissional na Bahia, que também se preocupasse em levar a arte a lugares desfavorecidos, como periferias e penitenciárias. Essa preocupação social se estendia à formação cultural de sua plateia, assim a CBC promovia diversas palestras acerca dos temas abordados em cada espetáculo, no intuito de fazer um teatro que se preocupasse com o estético e o político. Destaca-se o espetáculo da companhia Em moeda corrente do país, de Abílio Pereira de Almeida, em 1962, que lhe rendeu inúmeros elogios da crítica especializada da época. Em 1966, encenou Cocteau' 66, espetáculo composto por dois textos de Jean Cocteau: Voz humana e Belo indiferente. O sucesso marcou a despedida de Jurema Penna dos palcos baianos, que só voltariam a revê-la em 1973. Sua ida para o Rio de Janeiro foi acompanhada de grandes desafios de adaptação ao novo ambiente: era preciso conhecer e jogar o jogo da 1/4 Jurema Pena televisão. Talento e dedicação fizeram Jurema Penna alcançar um dos lugares mais cobiçados pelos atores brasileiros: um espaço na TV Globo. Destaca-se sua participação nas novelas Verão vermelho (1969) de Dias Gomes; A rosa rebelde (1969), Irmãos Coragem (1971), Selva de Pedra (1972), de Janete Clair; nas minisséries A tenda dos milagres (1985), de Jorge Amado; O pagador de promessas (1988), de Dias Gomes. Nos longa-metragens, destacam-se Mandacaru vermelho (1961), de Nelson Pereira dos Santos; O Pagador de promessas (1961), de Anselmo Duarte; Tocaia no asfalto (1961), de R. Chindler; Seara Vermelha (1963), de Alberto D'Aversa; Os pastores da noite (Odília da Bahia) (1975), de Marcel Camus; Tenda dos milagres (1977), de Nelson Pereira dos Santos, dentre muitos outros. No período em que esteve no Rio de Janeiro, Jurema Penna também inicia a sua produção dramatúrgica. Sua obra é composta por textos destinados ao público adulto e infantil. Em relação aos textos infantis, destacam-se dois nos quais se observa a retomada de clássicos dessa literatura, são eles: A Orquídea azul da bela adormecida (1974) e Alice no País das maravilhas, dos sonhos e dos encantados (1984). Na primeira narrativa, a bela adormecida é amazonense e os super-heróis fogem de uma vida cercada de tecnologia, optando por viver em harmonia com a natureza. No segundo enredo, a personagem de Lewis Carrol vem para a Bahia e conhece a rainha do reisado e a rainha dos mares, Yemanjá. Observa-se, portanto, que Jurema Penna se apropria de personagens clássicas e amplia os seus limites de significação, mesclando narrativas presentes no imaginário infantil a personagens do referencial cultural local. Quanto aos textos destinados ao público adulto, há predominância de dois eixos temáticos. O primeiro refere-se ao eixo étnico-cultural e compreendem aqueles que dizem respeito a temáticas relativas à comunidade baiana caracterizada por sua herança afrodescendente. Fazem parte desse grupo os textos: Abre alas para o Major Cosme (1975), Na feira de São Joaquim (s.d), Natal do Nordeste (1980), Natal na Feira de São Joaquim (s.d), Bahia Livre Exportação (1975/1976), Yemanjá, Rainha de Ayocá / A moça dos cabelos verdes ou nos Verdes cabelos de Yemanjá (1972/1980) Por sua vez, os textos pertencentes ao tema dos relacionamentos interpessoais versam sobre as dificuldades e prazeres dos relacionamentos humanos amorosos ou não, entre pares diversos. Seguem essa temática as obras Negro amor de rendas brancas (1972/1973), Procurando Maria (1988/1989), Dona Clara Clareou (1981/1982). Durante os anos de chumbo (1964-1985), foi preciso enfrentar com criatividade e sagacidade o veto à palavra e ao corpo que era constantemente imposto pela Censura Militar. Jurema Penna teve poucos textos que apresentavam cortes feitos pela censura, nestes termos, a existência 2/4 Jurema Pena de uma autocensura é evidente quando a autora afirma que deixou de encenar uma peça por receio da ação da censura: "A minha peça que mais gosto não foi montada, o 'Auto da Salvação', porque eu achei que nem passava no protocolo da censura.". No auge do sucesso em âmbito nacional, Jurema Penna decide voltar para a Bahia num desejo de retornar às suas raízes e atuar no teatro baiano no sentido de promover o acesso às artes cênicas, levando o teatro para o povo. Sua volta, em 1973, foi bastante celebrada pela crítica. Retornou estreando a peça Negro amor de rendas brancas, de sua própria autoria, em que contracenava com Mário Gusmão, parceria antiga e sempre bem sucedida desde o O Auto da compadecida e A Respeitosa. Invertendo o procedimento normalmente adotado pelas companhias de teatro, a peça estreou primeiro em Juazeiro e depois em Salvador, no teatro do SESC. Para Jurema Penna, era prioritário, em seu retorno à Bahia, lutar pela descentralização das produções teatrais. Em 1977, ao assumir a diretoria da Divisão do Folclore de Salvador, Jurema Penna conseguiu implantar, de 1983 a 1986, os projetos Colméia e Penitenciária, em Salvador, e o Projeto Chapéu de Palha, em quarenta e cinco municípios baianos. O principal objetivo do Projeto Chapéu de Palha era despertar a comunidade, através do teatro para sua identidade cultural, para as manifestações culturais regionais, submetidas a uma progressiva homogeneização de suas formas e relegadas ao esquecimento. Assim, Jurema Penna escolheu o "chapéu de palha", um signo que traz consigo uma série de valores culturais referentes ao homem do interior do estado, sua condição socioeconômica, é ícone que, ao mesmo tempo em que generaliza o homem do campo, particulariza-o em suas especificidades. Para alcançar a meta do projeto, os instrutores que promoviam as oficinas entravam em contato com os articuladores culturais da cidade, de maneira a sensibilizá-los para o trabalho. O processo durava em média vinte dois dias entre a realização de oficinas e a encenação. Com o grupo formado, eram oferecidas oficinas de dicção e preparação corporal, visando ao desenvolvimento da expressão artística para a encenação. Ao mesmo tempo, realizavam-se coletas de informações sobre a região, de maneira a identificar os mitos, lendas e histórias, dispersas ou fragmentadas, que efetivamente fossem representantes da identidade cultural do povo daquela região. A partir dessas informações, preparava-se o texto do espetáculo, procedia-se ao ensaio e apresentação. Além de Jurema Penna, coordenadora do projeto, outros atores também ministravam as oficinas, eram o caso de Luis Carillo, Aricelma Borges, Jesus Vilas, Cesar Vasconcelos, Sonia Pereira e Doralice Ferrari. 3/4 Jurema Pena Sua despedida oficial se deu com o espetáculo Os fuzis da senhora Carrar, de Berthold Brecht, em 2000, no teatro ICBA, sob a direção de Cecília Raiffer. Em 20 de setembro de 2001, vítima de um acidente vascular cerebral, Jurema Penna deixou o palco da vida após 52 anos de carreira. Seu legado, no entanto, permanece vivo. 4/4