As Normas Internacionais de Contabilidade (NIC) e a Fiscalidade

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As Normas Internacionais de Contabilidade (NIC) e a Fiscalidade
Por: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
Julho de 2005
Boletim APECA
INTRODUÇÃO
De acordo com o Regulamento (CE) n.º 1606/2002 do Parlamento Europeu e do
Conselho, de 19 de Julho de 2002, publicado no Jornal Oficial da Comunidade Europeia
(JOCE) de 11 de Setembro de 2002, os Estados Membros (EM) da União Europeia
(UE) deverão adoptar, a partir de 1 de Janeiro de 2005, as Normas Internacionais de
Contabilidade (NIC) e as actuais Normas Internacionais de Relato/Informação1
Financeira (NIRF), bem como as respectivas Interpretações (SIC/IFRIC)2, relativamente
às sociedades cujos valores mobiliários estejam admitidos à negociação num mercado
regulamentado de qualquer EM e no que tange, exclusivamente, às contas consolidadas
(em Portugal são apenas cerca de uma centena e na UE cerca de 7.000).
O Regulamento supra surgiu na sequência da estratégia da UE definida em
Novembro de 1995 através da apresentação de um documento intitulado “Harmonização
Contabilística – uma nova estratégia relativamente à harmonização internacional”, na
sequência do qual, em 13 de Junho de 2000, a Comissão da UE definiu “Uma estratégia
da UE para o futuro em matéria de relato financeiro para as empresas”.
Em Janeiro de 2003, a Comissão de Normalização Contabilística (CNC)
apresentou ao Governo um documento intitulado “Projecto de Linhas de Orientação
para um Novo Modelo de Normalização Contabilística”3 que visa dar cumprimento
àquele Regulamento e, especialmente, no que se refere ao art.º 5.º, prevendo que as
NIC/NIRF possam (é facultativo, i.e., uma opção de cada EM) também ser adoptadas
relativamente às contas individuais/anuais das empresas, com títulos cotados, atrás
referidas, bem como às restantes empresas.
Neste contexto, o Projecto da CNC contempla dois níveis de adaptação das
NIC/NIRF. Um primeiro nível, relativo às referidas sociedades com valores mobiliários
admitidos num mercado regulamentado da UE (art.º 4.º do Regulamento), prevendo a
1
Traduzido da expressão “International Financial Reporting Standards” (IFRS). A CNC traduziu a
palavra “Reporting” por “Relato” e a UE por “Informação”.
2
Traduzido de “Standing Interpretations Committee” do “International Financial Reporting
Interpretations Committee”.
3
Sobre este tema elaborámos um estudo intitulado “Um Novo Modelo de Normalização Contabilística
Nacional”, publicado na revista TOC da Câmara dos TOC n.º 38, de Maio de 2003, pp. 39-41.
1
aplicabilidade das NIC/NIRF (NIC “Puras”), quer às contas consolidadas, quer às
contas individuais/anuais das empresas associadas. Um segundo nível, aplicável às
restantes empresas, i.e., a grande maioria das micro e PME’s que constituem o tecido
empresarial português, em que se prevê uma adaptação das NIC/NIRF com um âmbito
reduzido e adaptado à realidade contabilística e de relato financeiro dessas empresas
(NIC “Adaptadas”).
Já depois da apresentação dessa Proposta, foi publicado o Regulamento (CE) n.º
1725/2003 da Comissão, de 21 de Setembro, publicado no JOCE de 13 de Outubro de
2003, em vigor três dias após a sua publicação (art.º 2.º), i.e., a partir de 16 de Outubro
de 2003, que confirma4 a adopção das NIC nos termos do primeiro Regulamento atrás
referido e sublinha que o mesmo teve por base um parecer do Comité de
Regulamentação Contabilística5 que concluiu o seguinte:
-
As NIC vigentes em 14 de Setembro de 2002 respeitam os critérios definidos
no art.º 3.º do Regulamento (CE) n.º 1606/2002, com excepção das NIC 32 e
39 e das respectivas Interpretações, relativas aos instrumentos financeiros, pelo
que devem ser adoptadas;
-
Os actuais projectos de alteração das NIC não têm qualquer impacto na
decisão da Comissão destinada a adoptar as NIC, com excepção das NIC 32 e
39.
Mais recentemente, foi publicado o Decreto-Lei n.º 35/2005, de 17 de Fevereiro,
que transpõe para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2003/51/CE, do Parlamento
Europeu e do Conselho, de 18 de Junho, também designada por “Directiva da
Modernização Contabilística”, que altera as Directivas n.os 78/660/CEE, 83/349/CEE,
86/635/CEE e 91/674/CEE, do Conselho, relativas às contas anuais e às contas
consolidadas de certas formas de sociedades, bancos e outras instituições financeiras e
empresas de seguros, e visa assegurar a coerência entre a legislação comunitária e as
NIC, em vigor desde 1 de Maio de 20026.
Face a este enquadramento contabilístico e considerando que o nosso modelo
contabilístico, inserido na designada corrente europeia-continental, é caracterizado por
4
O art.º 1.º prevê: “São adoptadas as normas internacionais de contabilidade constantes do Anexo.”.
O art.º 6.º do Regulamento n.º 1606/2002 estabelece: “A Comissão é assistida por um Comité de
Regulamentação Contabilística, a seguir designado “Comité”.
6
Conforme texto do primeiro parágrafo do preâmbulo e do art.º 1.º “Objecto” do diploma.
5
2
uma significativa dependência/influência da fiscalidade na contabilidade, questiona-se o
impacto das NIC/NIRF na fiscalidade.
Este assunto foi abordado em Comunicação da Comissão ao Conselho, ao
Parlamento Europeu e ao Comité Económico e Social Europeu (COM/2003-726, de 24
de Novembro de 2003), sob o título “Um Mercado Interno sem Obstáculos em Matéria
de Fiscalidade das Empresas - Realizações, Iniciativas em Curso e Desafios a
Ultrapassar”.
Por outro lado, aquele Decreto-Lei aborda alguns aspectos fiscais resultantes da
aplicação das NIC.
Ao referirmos os reflexos das NIC/NIRF na fiscalidade, não podemos deixar de
enquadrar o tema essencialmente em sede do IRC7, i.e., teremos de abordar quais os
articulados do CIRC que poderão (deverão) ser susceptíveis de alteração para atender a
essa adaptação.
1. AS “NIC” NO NORMATIVO CONTABILÍSTICO PORTUGUÊS
1.1 – No POC
O POC actualmente em vigor, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 410/89, de 21 de
Novembro, baseia-se na 4.ª Directiva (78/660/CEE) e na 7.ª Directiva (83/349/CEE),
que regulam, respectivamente, as contas individuais/anuais e as contas consolidadas8.
Considerando os dois Organismos Internacionais de Contabilidade que lideram o
processo de normalização contabilística – o Financial Accounting Standards Board
(FASB) dos EUA e o International Accounting Standards Board (IASB)9 - a CNC optou
pelo segundo, como resulta do item 1.4 do POC que transcrevemos:
“1.4 .../...
Por outro lado, deve-se dizê-lo, estão a ser desenvolvidos, no âmbito das
organizações europeias dos profissionais de contabilidade e em ligação com
as estruturas da CEE, vários trabalhos com vista a conseguir a harmonização
7
E na categoria B do IRS, para os rendimentos não abrangidos pelo regime simplificado, por força das
regras de apuramento do lucro tributável, face ao preceituado no art.º 32.º do CIRS.
8
A transposição da 7.ª Directiva foi efectuada pelo Decreto-Lei n.º 238/91, de 9 de Julho, tendo sido
alterado o POC através da inclusão do Capítulo 14 sob o título “Demonstrações Financeiras
Consolidadas”.
9
Esta designação resulta da reestruturação do organismo que antes era designado por IASC (International
Accounting Standards Committee).
3
contabilística mundial, objectivo máximo da International Federation of
Accountants (IFAC). Para a sua consecução estão a fazer-se esforços no
sentido de eliminar as divergências, não muito significativas, entre as normas
contabilísticas contidas na 4.ª Directiva e as normas internacionais de
contabilidade emitidas pelo Internacional Accounting Standards Committee
(IASC), órgão dependente da IFAC. Neste sentido, o próprio IASC se propõe
limitar as opções de políticas contabilísticas contidas nas suas normas, de
forma a facilitar a harmonização.”.
Como podemos verificar, o POC assume claramente que entre a 4.ª Directiva, na
qual se baseou o POC, e as NIC não existem divergências significativas, pelo que se
compreende que, quer o próprio POC, quer as Directrizes Contabilísticas, tenham sido
elaborados com base nesse enquadramento contabilístico internacional.
Na verdade, embora o POC não estabeleça uma relação directa, podemos inferir
que a Estrutura Conceptual do IASB está, de uma forma geral, dispersa pelos capítulos
do POC e pelas Directrizes Contabilísticas10, especialmente a DC18, como resumimos
no QUADRO N.º 1 seguinte:
QUADRO N.º 1 – Estruturas Conceptuais do IASB e do POC
“EC” DO IASB
1. Objectivos das Demonstrações
Financeiras
2. Características qualitativas
3. Definição, reconhecimento e
valorimetria na elaboração das DF’s
4. Conceitos de capital e de manutenção
do mesmo
Fonte: Elaboração própria
“EC” PORTUGUESA
1. Capítulo 1 “Introdução” do POC e
DC18
2. Capítulo 3 “Características da
informação financeira” do POC
3. - Capítulo 2 “Considerações técnicas”
do POC
- Capítulo 4 “Princípios contabilísticos”
do POC
- Capítulo 5 “Critérios de Valorimetria”
4. Não contemplado11
Assim, exceptuando o “conceito de capital e de manutenção do mesmo”, podemos
inferir que os aspectos conceptuais atrás referidos estão contemplados no POC,
10
As Interpretações Técnicas (IT) da CNC também integram o normativo contabilístico português. Até à
data foram publicadas apenas duas: A IT n.º 1 sobre “Locações” e a IT n.º 2 sobre “Reserva Fiscal para
Investimento”.
11
Em determinada altura chegou-se a equacionar a elaboração de uma Directriz Contabilística.
4
faltando, no entanto, conceitos importantes como os de activo, de passivo, de gastos,
etc., constantes da estrutura conceptual do IASB.
1.2 – Nas Directrizes Contabilísticas
Em estudo anterior, sob o título “As Directrizes Contabilísticas - Sua Importância
no Contexto da Normalização Contabilística Nacional”12, descrevemos diversos
aspectos sobre a relevância das Directrizes Contabilísticas no normativo contabilístico
português.
No que concerne à influência das NIC nas Directrizes Contabilísticas, o
QUADRO N.º 2 descreve-as:
12
Publicado na revista Revisores & Empresas da OROC n.º 20, de Janeiro/Março de 2003, pp. 27-35.
5
QUADRO N.º 2 – Directrizes Contabilísticas vs NIC
N.º
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
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16
17
18
19
20
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22
23
24
25
26
27
28
Directriz Contabilística
Tratamento contabilístico de concentrações de actividades
empresariais
Contabilização pelo donatário de activos transmitidos a título
gratuito
Tratamento contabilístico dos contratos de construção
Contabilização de obrigações contratuais de empresas
concessionárias
Tratamento contabilístico das receitas e obrigações inerentes à
concessão do jogo do bingo
Eliminação dos resultados nas transacções entre empresas do grupo
Contabilização das despesas de investigação e de desenvolvimento
Clarificação da expressão “regularizações não frequentes e de
grande significado”, relativamente à conta 59 – “Resultados
Transitados”
Contabilização nas contas individuais de detentora de partes de
capital em filiais e associados
Regime transitório da contabilização da locação financeira
IVA Intracomunitário
Conceito contabilístico de trespasse
Conceito do justo valor
Demonstração dos fluxos de caixa
Remição e amortização de acções
Reavaliação de activos imobiliários tangíveis
Contratos de Futuros
Objectivo das demonstrações financeiras e princípios
contabilísticos geralmente aceites
Benefícios de reforma
Demonstrações dos resultados por funções
Contabilização dos efeitos da introdução do EURO
Transacções sujeitas a Impostos Especiais sobre o Consumo
Relações entre entidades contabilísticas de uma mesma entidade
Jurídica
Empreendimentos conjuntos
Locações
Rédito
Relato financeiro por segmentos
Impostos sobre o rendimento
Ano de
Aprov./Publ.
IAS(NIC) Influência
91/92
22(93)
91/92
-
91/92
11(93)
91/92
-
91/92
-
91/92
92/93
27(90)
9(93)
92/93
8(93)
92/93
28(91)
92/93
93/93
93/93
93/94
92/93
94/95
95/95
96/97
22(93)
22(93)
7(92)
16(93)
32(95)
96/97
1(97)
97/97
97/97
97/00
98/98
19(98)
1(97)
21(93)
-
98/98
-
98/00
98/00
99/00
00/01
01/03
31(98)
17(97)
18(93)
14(97)
12(98)
Recomendação da
29 Matérias Ambientais
02/05
Comissão de 30/05/01
Fonte: Comissão de Normalização Contabilística – “Projecto de Linhas de Orientação para um Novo
Modelo de Normalização Contabilística Nacional”, Janeiro de 2003, com ligeiras adaptações da
nossa autoria.
Assim, podemos concluir que 20 das 29 Directrizes Contabilísticas têm influências
directas das NIC.
Note-se, porém, que algumas dessas NIC (v.g. NIC 20 “Subsídios”, NIC 23
“Custo dos Empréstimos Obtidos”) estão, de uma forma ligeira, contidas no POC,
nomeadamente no “Capítulo 5 – Critérios de valorimetria” e no “Capítulo 12 – Notas
explicativas”.
6
Das Directrizes Contabilísticas, destacamos a DC n.º 18, de 18 de Dezembro de
1996, sob o título “Objectivos das Demonstrações Financeiras e Princípios
Contabilísticos Geralmente Aceites” que veio clarificar a referida estrutura conceptual
da contabilidade portuguesa, da qual destacamos os seguintes aspectos:
a) Enuncia os objectivos das DF’s;
b) Ressalta as expectativas inerentes à apresentação das DF’s em prol da
“imagem verdadeira e apropriada”;
c) Clarifica
a
expressão
“geralmente
aceites”
contida
nos
Princípios
Contabilísticos Geralmente Aceites (PCGA);
d) Acolhe os quatro níveis atrás descritos da Estrutura Conceptual do IASC;
e) Esclarece que os segundos e terceiros níveis dessa Estrutura Conceptual do
IASC, i.e., as características qualitativas e a definição, reconhecimento e
valorimetria dos elementos já estão parcialmente contemplados no POC;
f) Define os objectivos das demonstrações financeiras e os PCGA usados na sua
preparação, correspondentes ao primeiro nível da “Estrutura Conceptual do
IASC;
g) Sublinha a ausência de definição do quarto nível do quadro conceptual do
IASC relativo aos conceitos de capital e manutenção do mesmo, o que seria
abordado posteriormente numa outra directriz, o que até à data não aconteceu;
h) Privilegia uma perspectiva conceptual de substância económica13 para o relato
financeiro;
i) Estabelece que o uso dos PCGA deve obedecer à seguinte hierarquia:
-
Os constantes do POC;
-
Os constantes das Directrizes Contabilísticas;
-
Os divulgados nas NIC emitidas pelo IASC.
j) As respostas interpretativas da CNC não têm carácter genérico e são válidas
para a entidade e para a situação concreta.
13
Quanto a nós, constitui uma referência explícita ao princípio contabilístico “Da substância sobre a
forma”.
7
Como podemos verificar pela alínea i) supra, um dos aspectos conceptuais mais
importantes contemplados na DC18 é o da hierarquia da aplicação dos PCGA, em que
os divulgados nas NIC são subsidiários aos do POC e aos das Directrizes
Contabilísticas. Ou seja, o normativo das NIC deve ser utilizado quando não existem ou
são insuficientes as normas previstas no POC e ou nas Directrizes Contabilísticas.
Refira-se, no entanto, que, mesmo antes da DC18, já algumas empresas,
especialmente as de grande dimensão económica e com relações internacionais (v.g.
relações com empresas sediadas no estrangeiro) utilizavam as NIC na elaboração das
demonstrações financeiras, utilizando o mecanismo derrogatório em prol da imagem
verdadeira e apropriada.
Um dos casos em que se verificava tal situação era na NIC12 “Impostos sobre
lucros”, tendo em conta que a Directriz Contabilística n.º 28 “Impostos Sobre o
Rendimento” só muito recentemente foi publicada, tendo entrado em vigor em 1 de
Janeiro de 2003.
De notar que as NIC estão numeradas até ao n.º 41 “Agricultura”, mas apenas 3214
estão em vigor, o que se justifica pela eliminação e ou integração de algumas NIC
noutras, tendo-se mantido a numeração.
Neste contexto, podemos concluir que o impacto das NIC no normativo
contabilístico português será minimizado pela adaptação já efectuada, antes até dos
Regulamentos (CE) em análise.
Sublinhamos, ainda, que especialmente nas últimas Directrizes Contabilísticas
(n.os 25, 26, 27 e 28, excepto, portanto, a 29) já houve uma preocupação de as estruturar
de acordo com as NIC.
1.3 – No Projecto da CNC
Como já referimos, a CNC apresentou um “Projecto de Linhas de Orientação para
um Novo Modelo de Normalização Contabilística” que prevê dois níveis de
normalização em função da dimensão das empresas e da maior (1.º nível) ou menor (2.º
nível) exigência de relato financeiro.
14
São as NIC n.os 1, 2, 7, 8, 10, 11, 12, 14, 16, 17, 18, 20, 21, 22, 23, 24, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33,
34, 35, 36, 37, 38, 39, 40 e 41.
8
Em estudo anterior, sob o título “Um Novo Modelo de Normalização
Contabilística Nacional”15, apresentámos os aspectos mais importantes desse
documento da CNC16.
No ESQUEMA N.º 1 seguinte sintetizamos o Projecto da CNC.
ESQUEMA N.º 1 – Projecto de Normalização da CNC
ESTRUTURA CONCEPTUAL DO IASB
1.º Nível
NIC/NIRF
“PURAS”
Empresas com títulos cotados em
bolsa
- Obrigatório – Contas
consolidadas
- Facultativo - Contas das
empresas filiais e associadas
2.º Nível
NIC/NIRF
“ADAPTADAS”
Restantes Empresas (99,...%)
-Empresas sem títulos cotados
-PME’s
- Micro-empresas
Fonte: Elaboração própria
Como referimos na introdução deste artigo, foi recentemente publicado o DecretoLei n.º 35/2005, de 17 de Fevereiro, que embora dê cumprimento ao citado
Regulamento n.º 1606/2002, não dá resposta ao Projecto da CNC no que respeita ao
âmbito do 2.º nível, i.e., às empresas de menor dimensão e de menores exigências de
relato financeiro, como a seguir comentamos.
15
16
Publicado na revista TOC da CTOC n.º 38, de Maio de 2003 (pp. 39-41).
No estudo apresentámos dois quadros-resumo, cuja consulta sugerimos.
9
2. ANÁLISE (BREVE) DO DECRETO-LEI N.º 35/2005
O Decreto-Lei n.º 35/2005, de 17 de Fevereiro, transpõe para a ordem jurídica
interna a Directiva n.º 2003/51/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de
Junho, também designada por “Directiva de Modernização Contabilística”17.
O diploma produz diversas alterações, das quais destacamos as de índole
contabilística18 que resumimos:
–
Novo conceito de provisões (art.º 2.º) que não podem ter por objecto corrigir
valores dos elementos do activo, i.e., apenas têm por objecto cobrir as
responsabilidades cuja natureza esteja claramente definida e que à data do
balanço sejam de ocorrência provável ou certa, mas incertas quanto ao seu
valor ou data de ocorrência. Assim, passamos a ter apenas provisões no
passivo, i.e., as até agora designadas “Provisões para riscos e encargos” que
passam a designar-se de “Provisões”;
–
Novo conceito de “ajustamentos de valores do activo”, por aditamento do item
2.12 ao POC, que substitui o anterior conceito de “provisões no activo”,
mantendo-se os aspectos conceptuais que conduzem à relevação contabilística
dos factos patrimoniais, designadamente no que respeita ao reconhecimento
das diferenças entre as quantias registadas a custo histórico e as quantias
decorrentes de avaliação a preço de mercado, se inferior àquele. Ou seja, as
correcções do activo antes designadas de “provisões” passam a designar-se de
“ajustamentos”. Estas alterações justificam-se, nomeadamente, pelo facto de a
valorimetria ao “justo valor”, de acordo com as NIC/NIRF, exigir o
reconhecimento de perdas de imparidade nos activos, face, nomeadamente, à
NIC36 “Imparidade de activos”;
–
Essas alterações conceptuais assentam, também, num novo enunciado para o
princípio “Da prudência”, como prevê o art.º 3.º do diploma, e consequente
alteração da alínea e) do capítulo 4 do POC;
17
Sobre este diploma elaborámos um artigo sob o título “O Decreto-Lei n.º 35/2005 – Alterações ao
Plano Oficial de Contabilidade” publicado no Jornal da AIMinho n.º 57, de Abril de 2005 e no Guia do
Contribuinte do Semanário Económico n.º 29, de Maio de 2005.
18
As restantes alterações produziram efeitos no Decreto-Lei n.º 36/92, de 28 de Março (art.º 5.º),
Decreto-Lei n.º 147/94, de 25 de Maio (art.º 6.º), Decreto-Lei n.º 262/86, de 2 de Setembro que aprovou o
Código das Sociedades Comerciais (art.º 8.º) e no Decreto-Lei n.º 403/86, de 3 de Dezembro que aprovou
o Código do Registo Comercial.
10
–
No que concerne às NIC, prevê-se a obrigatoriedade da sua aplicação, a partir
do exercício que se inicie em 2005, às entidades cujos valores mobiliários
estejam admitidos à negociação num mercado regulamentado, nos termos do
art.º 4.º do Regulamento n.º 1606/2002 (art.º 11.º do Decreto-Lei 35/2005). No
entanto, esta obrigatoriedade apenas abrange as contas consolidadas, pois a sua
aplicação é facultativa em relação às contas individuais. Acresce, ainda, que
para as restantes entidades obrigadas à consolidação de contas de acordo com
o POC e o Decreto-Lei n.º 238/91, de 2 de Julho, quer relativamente às contas
consolidadas quer em relação às contas individuais, a aplicação das NIC é
facultativa, i.e., constitui uma opção (art.º 12.º do diploma).
No entanto, de acordo com o art.º 14.º do Decreto-Lei 35/2005, as entidades que
elaborem as contas individuais em conformidade com as NIC, são obrigadas, para
efeitos fiscais, nomeadamente a nível de apuramento do lucro tributável, a manter a
contabilidade organizada de acordo com a normalização contabilística nacional e
demais disposições em vigor para o respectivo sector de actividade. Ou seja, caso a
entidade seja obrigada à consolidação de contas e exerça a opção de elaborar as contas
individuais de acordo com as NIC, terá de manter também a contabilidade de acordo
com o POC, i.e., admite-se a existência de uma dupla contabilidade. É, por assim dizer,
uma cláusula de neutralidade contabilístico-fiscal.
No QUADRO N.º 3 seguinte resumimos este enquadramento.
QUADRO N.º 3 – Decreto-Lei n.º 35/2005 – Aplicação das NIC
Contas Individuais
POC
NIC
Entidades cujos valores estejam
OBRIGATÓRIO FACULTATIVO
admitidos à negociação num mercado
Obs.: Para
(Art.º 12.º, n.º 2)
regulamentado da UE (art.º 11.º n.º 1)
efeitos fiscais
Obs.:
(Art.º 14.º)
Condicionada à
certificação legal
das contas
Entidades obrigadas a aplicar o POC não OBRIGATÓRIO* FACULTATIVO OBRIGATÓRIO FACULTATIVO
abrangidas pelo art.º 11.º, i.e., as
(Art.º 12.º, n.º 1)
Obs.: Para
(Art.º 12.º, n.º 2)
entidades sem títulos cotados em bolsa
Obs.:
efeitos fiscais
Obs.:
que sejam obrigadas pelo POC à
Condicionada à
(Art.º 14.º)
Condicionada à
consolidação de contas (art.º 12.º n.º 1).
certificação legal
certificação legal
das contas
das contas
* As entidades referidas no Art.º 12.º n.º 1 não dispõem de um artigo de dispensa idêntico às entidades do art.º 11.º, pelo
que entendemos que se poderá interpretar da mesma forma, i.e., a obrigatoriedade da elaboração das contas consolidadas
de acordo com o POC fica dispensada (i.e. facultativa) caso optem por elaborar as contas consolidadas de acordo com as
NIC.
Entidades
Contas Consolidadas
POC
NIC
FACULTATIVO OBRIGATÓRIO
(Art.º 11.º, n.º 2)
(Art.º 11.º, n.º 1)
Fonte: Elaboração Própria
11
3. O CASO DO JUSTO VALOR (“FAIR VALUE”)
Um dos aspectos conceptuais que tem sido abordado como um dos principais
problemas de adaptação das NIC e o seu reflexo na fiscalidade é, sem dúvida, o do
“justo valor” (“fair value”).
Em estudos anteriores19 sublinhámos alguns aspectos conceptuais da contabilidade
inerentes ao conceito de “justo valor”.
Então escrevemos20:
“Mas não podemos esquecer que, a nível interno, o “justo valor” já está
acolhido em algumas Directrizes Contabilísticas (DC), com especial destaque
para as “DC 1 – Tratamento Contabilístico de Concentrações de Actividades
Empresariais” e “DC 13 – Conceito do Justo Valor”, que definem o “justo
valor” como a quantia pela qual um bem (ou serviço) poderia ser trocado,
entre um comprador conhecedor e interessado e um vendedor nas mesmas
condições, numa transacção ao seu alcance.
Outras DC reflectem já, também, situações/operações de aplicação do “justo
valor”, como sejam as políticas contabilísticas relativas aos activos
transmitidos a título gratuito (DC 2), ao trespasse (DC 12), à remição e
amortização de acções (DC 15), às reavaliações extraordinárias (DC 16), aos
benefícios da reforma (DC 19) e às locações (DC 25).”
Referimos também21:
“Ao colocarmos em contraposição o critério do “justo valor” com o do
“custo histórico” teremos, obviamente, de concluir que este é objectivo e que
aquele é subjectivo. Ou seja, a relevação contabilística ao “justo valor” terá
de ser aplicada com preocupação (apelo ao princípio contabilístico “Da
prudência”), sob pena de afectarmos a contabilidade e as demonstrações
financeiras de valores subjectivos, o que não facilita a decisão dos
utilizadores.”.
19
- “A Contabilidade - Utilidade para a Gestão (Decisão)”, publicado na revista Revisores & Empresas da
OROC n.º 25, de Abril/Junho de 2004 e na revista TOC da CTOC n.º 54, Setembro de 2004.
- “A Contabilidade ao «Justo Valor»”, publicado no Semanário Económico n.º 713, Setembro de 2003 e
no nosso livro Temas de Contabilidade, Fiscalidade e Auditoria, ed. Vislis, Lisboa, 2001, pp. 225-6.
20
“A Contabilidade ao Justo Valor”, ob. cit. p. 226.
21
“A Contabilidade ao Justo Valor”, ob. cit., p. 226.
12
Na verdade, repetimos, o conceito de “justo valor” tem sido um dos aspectos
conceptuais que mais polémica tem gerado. Com efeito, existe uma corrente de certa
forma considerada conservadora e defensora dos princípios contabilísticos “Do custo
histórico” e “Da prudência”, bem como da característica qualitativa da “fiabilidade”, em
prol da objectividade da informação, e uma outra corrente mais preocupada com a
característica da “relevância” na perspectiva do paradigma da utilidade da contabilidade
para a tomada de decisões, especialmente para os accionistas actuais e potenciais, i.e.,
uma viragem para o mercado22.
A este propósito e das NIC, Pinheiro Pinto23 refere:
“E uma das razões que, em nosso entender, tem conduzido a que não sejam
adoptadas por um número crescente de países tem a ver precisamente com a
sua fraca qualidade, designadamente no domínio da objectividade.
É que este requisito é fundamental, na medida em que a contabilidade deve
manter-se equidistante dos interesses dos seus múltiplos e heterogéneos
destinatários, sendo ainda certo que um dos principais utilizadores – o Fisco
– tem de ser muito mais exigente que os outros na busca dessa informação
objectiva, atenta a sua primordial preocupação de repartir equitativamente a
carga fiscal.”.
Esta problemática foi, também, acolhida no nosso normativo contabilístico,
através do Decreto-Lei n.º 88/2004, de 20 de Abril, que transpôs para o ordenamento
jurídico interno a Directiva n.º 2001/65/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de
27 de Setembro, que altera as Directivas n.os 78/660/CEE, do Conselho, de 25 de Julho,
relativa às contas individuais de certas formas de sociedades (vulgo 4.ª Directiva),
83/349/CEE, de 13 de Junho, relativa às contas consolidadas (vulgo “7.ª Directiva”), e
86/635/CEE, do Conselho, de 8 de Dezembro, relativa às contas individuais e às contas
consolidadas dos bancos e de outras instituições financeiras, relativamente às regras de
valorimetria aplicáveis às contas individuais e consolidadas de certas formas de
sociedades, bem como dos bancos e de outras instituições financeiras (cf. art.º 1.º
“Objecto” do diploma).
22
Sobre esta problemática remetemos para a leitura do nosso estudo “A Contabilidade - Utilidade para a
Gestão (Decisão)” atrás referido.
23
PINHEIRO PINTO, José Alberto: “Implicações das Normas Internacionais de Contabilidade na
Fiscalidade e na Auditoria”, comunicação em Seminário realizado em 30 de Abril de 2004 na Escola
Superior de Estudos Industriais e de Gestão de Vila do Conde.
13
Face ao disposto no art.º 2.º “Âmbito” do referido diploma as entidades que
adoptem o POC relativamente às contas consolidadas de acordo com o Decreto-Lei n.º
238/91, de 2 de Julho, podem valorizar pelo justo valor os instrumentos financeiros que
detêm, incluindo os derivados.
Assim, preconiza-se a aplicação, com carácter facultativo, do “sistema de
contabilização pelo justo valor” aos instrumentos financeiros (primários e derivados)24
mas apenas relativamente às contas consolidadas, o que abrange um pequeno número de
empresas.
Além disso, o art.º 4.º “Justo valor” do diploma ao definir as regras de
determinação do “justo valor”, ressalva que no caso dos instrumentos financeiros não
poderem ser mensurados de forma fiável (apelo à característica qualitativa da
“fiabilidade”), devem ser avaliados de acordo com os critérios valorimétricos do POC, o
que constitui um apelo ao princípio contabilístico “Do custo histórico”.
Esta é, efectivamente, uma questão recorrente, actual e futura, e que, de per se,
justificaria um maior desenvolvimento que nos abstemos face ao objectivo deste
trabalho.
Registamos, porém, que o tema terá de ser objecto de uma apreciação cuidadosa
em termos da fiscalidade em sede de IRC e que mais à frente nos referiremos.
4. COMUNICAÇÃO COM(2003)726 DA UE
Na sequência da adopção das NIC/NIRF, a UE está a estudar os seus efeitos na
fiscalidade das empresas, o que resultou na elaboração da Comunicação da Comissão ao
Conselho, ao Parlamento Europeu e ao Comité Económico e Social Europeu –
COM(2003)726, de 24 de Novembro de 2003 - sob o título “Um Mercado Interno sem
Obstáculos em Matéria de Fiscalidade das Empresas – Realizações, Iniciativas em
Curso e Desafios a Ultrapassar”, dividido nos seguintes capítulos:
1. Introdução;
2. Necessidade constante de adaptar a fiscalidade das empresas na UE;
3. Progressos efectuados no que respeita às medidas destinadas a lutar contra os
obstáculos fiscais no mercado interno;
24
O n.º 3 do art.º 2.º do diploma descreve algumas situações de não aplicação do “justo valor”.
14
4. Progressos registados no que respeita à introdução de uma matéria colectável
consolidada para as actividades das empresas a nível da UE;
5. Conclusão e prioridades para os próximos anos.
O objectivo estratégico da Comissão Europeia, aprovado no Conselho Europeu de
Lisboa de Março de 2000, reiterado por ulteriores Conselhos, é o de tornar a economia
da UE baseada no conhecimento a mais competitiva do mundo, assente num
crescimento económico sustentável e na criação de mais e melhores empresas até 2010.
Para atingir tal desiderato, assume-se que a fiscalidade das empresas da UE tem um
papel fundamental, definindo-se uma estratégia “dupla” destinada a corrigir as
deficiências e a eliminar os obstáculos associados à fiscalidade que dificultam a
actividade económica transfronteiriça no âmbito do Mercado Interno, como
transcrevemos25:
“A estratégia em matéria de fiscalidade das empresas proposta pela Comissão
em 2001 baseava-se em dois aspectos fundamentais. Em primeiro lugar, as
disposições fiscais continuam a impedir os operadores económicos de tirarem
pleno partido das vantagens proporcionadas pelo Mercado Interno, situação
essa que tem, imperativamente, que mudar. Em segundo lugar, ao longo dos
últimos anos o quadro económico global registou importantes mudanças tais
como o aparecimento do comércio electrónico e a internacionalização cada
vez maior das empresas, na sequência de fusões transfronteiras e de outras de
reestruturação.”
Considerando a diversidade dos sistemas fiscais dos 15 países da UE, e agora 25,
apresentam-se diversos obstáculos ao cumprimento da legislação fiscal, pelo que a
Comissão entende que se deve avançar para a introdução de uma matéria colectável
comum consolidada para as actividades das empresas a nível da UE, como forma de
eliminar tais obstáculos.
Para tal, a Comissão é de parecer que essa decisão deverá ser tomada com base na
votação por maioria qualificada, pois o actual requisito de votação por unanimidade
vigente nas decisões de âmbito fiscal não favorece tal entendimento e objectivo.
25
Cf. capítulo Introdutório da Comunicação – COM(2003)726.
15
É, neste contexto, que o grande debate fiscal actual no âmbito da UE aponta para
uma reforma profunda, a longo prazo, dos seus sistemas fiscais, tendo a Comissão
procedido a vastas consultas sobre os dois aspectos seguintes:
(i) A eventual aplicação, a título experimental, do sistema de tributação no
Estado de Origem (Home State Taxation) às pequenas e médias empresas da
UE e,
(ii) As consequências da introdução das NIC para a criação de uma matéria
colectável consolidada das actividades das empresas à escala da UE.
No que respeita à aplicação das NIC/NIRF, com base nos referidos Regulamentos
(CE) n.os 1606/2002 e 1725/2003, o pressuposto é o de que se as empresas da UE
declaram os seus lucros de acordo com uma norma comum, por que não utilizar essa
medida comum da rentabilidade como ponto de partida da determinação do lucro
tributável. Ou seja, as NIC/NIRF devem constituir o ponto de partida para se obter uma
matéria colectável comum.
Nesta conformidade, estabeleceu-se um quadro de discussão assente em duas
abordagens:
(i) A “abordagem NIRF” que parte de uma posição contabilística comum, para,
em seguida, procurar definir quais os ajustamentos que seriam necessários
introduzir para chegar a matéria colectável comum;
(ii) A “abordagem alternativa” que consiste em procurar chegar a um acordo
separado sobre os princípios fiscais e só em seguida abordar a questão de
como assegurar a sua aplicação.
No que respeita à via das NIRF, a Comissão entende:
“Certos aspectos das NIIF26 exigem uma atenção especial. É claro que o
primado do princípio geral da materialidade e a prevalência da substância
sobre a forma não estão inteiramente de acordo com os princípios fiscais
existentes, pelo que para se chegar ao estabelecimento da matéria
colectável
seria
necessário
introduzir
certos
ajustamentos.
Em
contabilidade, o princípio da materialidade é essencialmente definido como
26
O documento da Comissão traduz as IFRS por NIIF (Normas Internacionais de Informação Financeira).
e não por NIRF (Normas Internacionais de Relato Financeiro) como foi traduzido pela CNC. Ou seja, a
palavra “Reporting” é traduzida por “Informações” ou por “Relato”.
16
um limiar ou limite a partir do qual uma omissão ou inexactidão poderia
influenciar as decisões económicas dos utilizadores. No entanto, para
efeitos fiscais, é geralmente necessário um maior grau de precisão. A
atribuição de uma maior importância à substância de uma transacção em
relação à sua forma jurídica (por exemplo, os activos que são objecto de
locação financeira) é corrente em contabilidade, mas este princípio não é
aplicado de uma forma tão uniforme para efeitos fiscais. Os dois princípios
poderiam ter de ser objecto de ajustamentos. Do mesmo modo, quando é
aplicável o método contabilístico do “justo valor” (por exemplo, quando se
procede a uma reavaliação dos activos em função do valor de mercado e
essa mais-valia é assimilada a um “lucro”) esses lucros não realizados não
deveriam ser objecto de tributação e conviria nesse caso introduzir outros
ajustamentos adicionais. De um modo mais geral, os trabalhos relativos às
possibilidades oferecidas pelas NIIF no que se refere à matéria colectável
salientaram uma questão que respeita a todas as formas possíveis que uma
matéria colectável comum pode assumir, ou seja, a relação entre as contas
financeiras e a fiscalidade, geralmente conhecida por "dependência".”.
5. O NORMATIVO FISCAL EM IR
Como já referimos, na temática em análise interessa, essencialmente, analisar os
efeitos da aplicação das NIC/NIRF na fiscalidade em sede de IRC e em IRS (Categoria
B)27, pois é nestes tributos que a questão tem pertinência.
5.1 – O Conceito de “rendimento-acréscimo”, a “teoria do incremento
patrimonial” e o “lucro tributável”
Face ao art.º 104.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) a tributação
das empresas incide fundamentalmente sobre o rendimento real.
O saudoso Professor Doutor Sousa Franco, referia que aquele preceito
constitucional deveria ser interpretado da seguinte forma:28
“Mas quando falamos de rendimento real queremos dizer rendimento real
mesmo.”.
27
Por força da remissão do art.º 32.º do CIRS.
Numa palestra realizada em 4 de Setembro de 1998 aquando da inauguração da primeira sede da
CTOC, transcrita na revista Eurocontas n.º 41, de Agosto/Setembro de 1998, pp. 8-13.
28
17
Sem pretendermos alargar-nos sobre o conceito de “rendimento real” que tem feito
correr muita tinta, destacamos os contributos de um dos maiores fiscalistas portugueses,
Fernandes Ferreira, que se vem debruçando há muitos anos sobre a temática como
comprova a publicação do livro “A Tributação do Lucro Real”29.
Nesta problemática o livro supra constitui, sem dúvida, um documento histórico
de extrema importância e que tem servido de base para Fernandes Ferreira efectuar
acrescentos e actualizações em publicações seguintes.
No Capítulo I do livro intitulado “Dificuldades de Determinação de Lucro Real”,
Fernandes Ferreira inventariou vinte e quatro problemas, alguns deles ainda mantêm
actualidade, divididos em três categorias30:
-
Insuficiências do nosso Direito e das estruturas da Administração e das
empresas portuguesas;
-
Dificuldades relacionadas com a peculiar natureza do fenómeno do lucro;
-
Dificuldades intrínsecas do cálculo e contabilização dos lucros (ou seja dos
custos e perdas e proveitos e ganhos).
Mais recentemente, Fernandes Ferreira31, em comentário sob o título “Tributação
do Lucro Real ou do Lucro Normal?”, escreveu:
“O tema – tributação do “lucro efectivo” ou do “lucro normal” -, cuja
acuidade é inegável, implica sempre reflexão séria e envolve problemática
vasta.”.
Uma das polémicas mais actuais sobre o conceito de “rendimento real” refere-se
ao Pagamento Especial por Conta (PEC), institucionalizado pelo Decreto-Lei n.º 44/98,
de 3 de Março, pois colocou-se em causa a sua constitucionalidade.
Em defesa do PEC argumenta-se que o advérbio “fundamentalmente”, previsto
naquele articulado constitucional, dá-lhe cobertura, pois não põe em causa a base
tributável daí resultante. Ou seja, a regra é a da tributação das empresas com base no
rendimento real, mas o advérbio supra permite excepções como é o caso do PEC.
29
FERNANDES FERREIRA, Rogério: A Tributação do Lucro Real – Comentário ao Código da
Contribuição Industrial, Ed. Ática, Lisboa, 1965.
30
FERNANDES FERREIRA, Rogério: A Tributação do Lucro Real..., ob. cit. pp. 11-21.
31
FERNANDES FERREIRA, Rogério: Gestão, Contabilidade e Fiscalidade, Ed. Notícias Editorial, 2.ª
Edição revista, Lisboa, 1999, pp. 299-301.
18
Refira-se, aliás, que, sob a cobertura de tal advérbio, o legislador tem procedido ao
lançamento do que apelidamos de “formas alternativas de tributação” ao lucro
tributável, face ao preceituado no art.º 17.º do CIRC.
Foi neste contexto que, em artigo de opinião, sob o título “A Insuficiência do
Lucro Tributável como Base de Tributação no CIRC32”, referimos:
“Ao preconizarem-se essas formas alternativas (leia-se: “alternativas ao
lucro tributável”) de tributação, como são os casos das que incidem sobre as
despesas de representação, as despesas confidenciais ou não devidamente
documentadas, os encargos com viaturas ligeiras de passageiros e mistas, o
regime simplificado de tributação e os pagamentos especiais por conta (PEC),
assume-se, clara e objectivamente, que a tributação baseada no lucro
tributável e no resultado contabilístico, por força do art.º 17.º n.º 1 do CIRC,
não é suficiente para assegurar o nível de receita fiscal para o tão propalado
equilíbrio orçamental.”.
No entanto, podemos inferir que, de uma forma geral e sem prejuízo dessas
formas alternativas de tributação, o rendimento real é traduzido em sede IRC e de IRS
(Categoria B) pelos conceitos de “lucro” e de “lucro tributável”, previstos,
respectivamente, no art.º 3.º, n.º 2 e no art.º 17.º, n.º 1, ambos do CIRC que prescrevem:
QUADRO N.º 4 – Conceitos de “Lucro” e de “Lucro Tributável” no CIRC
ART.º 3.º N.º 2 do CIRC
ART.º 17.º N.º 1 do CIRC
“LUCRO”
“LUCRO TRIBUTÁVEL”
Para efeitos do disposto no número O lucro tributável das pessoas colectivas e outras
anterior, o lucro consiste na diferença entidades mencionadas na alínea a) do n.º 1 do
entre os valores do património líquido artigo 3.º é constituído pela soma algébrica do
no fim e no início do período de resultado líquido do exercício e das variações
tributação,
com
as
correcções patrimoniais positivas e negativas verificadas no
estabelecidas neste Código.
mesmo período e não reflectidas naquele resultado,
determinados
com
base
na
contabilidade
eventualmente corrigidos nos termos deste Código.
Fonte: Elaboração própria
32
Publicado no Boletim da APECA n.º 47, de Janeiro/Março de 2004.
19
e
No ESQUEMA N.º 2 seguinte articulamos estes dois preceitos:
ESQUEMA N.º 2 – Conceitos de “Lucro” e de “Lucro Tributável”
Art. 3.º, n.º 2
Legenda
L = PL fim - PL início + C
Lucro
Art. 17.º, n.º 1
Lucro
Tributável
L = Lucro
PL = Património Líquido (=Situação Líquida = Capital
Próprio)
C = Correcções fiscais positivas e negativas no âmbito
do CIRC
LT = Lucro Tributável
RL = Resultado líquido do exercício (conta 88 do POC)
LT =
RL + VP
+ C
VP = Variações patrimoniais positivas (art. 21.º) e
negativas (art. 24.º) não reflectidas no RL que
concorrem para o LT
COM BASE NA CONTABILIDADE
Fonte: Elaboração própria
Na nossa perspectiva podemos interpretar essa relação como uma “visão
patrimonialista” da tributação, o que nos faz lembrar a denominada “teoria
patrimonialista” da contabilidade, que, ainda hoje, tem muitos seguidores33.
Na senda desta interpretação, o item 5 do preâmbulo do CIRC prevê:
“5 – O conceito de lucro tributável que se acolhe em IRC tem em conta a
evolução que se tem registado em grande parte das legislações de outros
países no sentido da adopção, para efeitos fiscais, de uma noção extensiva de
rendimento, de acordo com a chamada teoria do incremento patrimonial.
Esse conceito – que está também em sintonia com os objectivos de
alargamento da base tributável visados pela presente reforma – é
explicitamente acolhido no Código, ao reportar-se o lucro à diferença entre o
património líquido no fim e no início do período de tributação.” (sublinhados
nossos).
5.2 – A Contabilidade como “ponto de partida” para o apuramento do lucro
tributável
Como resulta claramente do ESQUEMA N.º 2 a contabilidade e o seu “produto
final” – o resultado líquido do exercício (conta 88 do POC) – é o ponto de partida para o
33
Entre os patrimonialistas destacamos os cientistas da contabilidade: Vincenzo Mazi, Jaime Lopes
Amorim e António Lopes de Sá. Este último Professor tem desenvolvido uma nova visão do
patrimonialismo designada de “Neopatrimonialismo”.
20
cálculo do lucro tributável, o que resulta clara e objectivamente do referido art.º 17.º, n.º
1.
A este propósito, o item 10 do preâmbulo do CIRC estabelece:
“10 – Dado que a tributação incide sobre a realidade económica constituída
pelo lucro, é natural que a contabilidade, como instrumento de medida e
informação dessa realidade, desempenhe um papel essencial como suporte da
determinação do lucro tributável.
As relações entre contabilidade e fiscalidade são, no entanto, um domínio que
tem sido marcado por uma certa controvérsia e onde, por isso, são possíveis
diferentes modos de conceber essas relações. Afastadas uma separação
absoluta ou uma identificação total, continua a privilegiar-se uma solução
marcada pelo realismo e que, no essencial, consiste em fazer reportar, na
origem, o lucro tributável ao resultado contabilístico ao qual se introduzem,
extracontabilisticamente, as correcções – positivas ou negativas – enunciadas
na lei para tomar em consideração os objectivos e condicionalismos próprios
da fiscalidade.
Embora para concretizar a noção ampla de lucro tributável acolhida fosse
possível adoptar como ponto de referência o resultado apurado através da
diferença entre os capitais próprios no fim e no início do exercício, mantém-se
a metodologia tradicional de reportar o lucro tributável ao resultado líquido
do exercício constante da demonstração de resultados líquidos, a que
acrescem as variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no
mesmo e não reflectidas naquele resultado.
Nas demais regras enunciadas a propósito dos aspectos que se entendeu dever
regular reflectiu-se, sempre que possível, a preocupação de aproximar a
fiscalidade da contabilidade.”
De notar que esta relação entre a contabilidade e a fiscalidade em sede de IRC,
transitou do anterior Código da Contribuição Industrial (CCI), aprovado pelo DecretoLei n.º 45.103, de 1 de Julho de 1963, que vigorou até 1998, cujo n.º 2 do preâmbulo
previa:
“2. Como os demais impostos directos, também a contribuição industrial se
mostra agora dominada pela preocupação de atingir o mais proximamente o
21
rendimento real dos contribuintes. Não é nova esta preocupação mesmo entre
nós, pois de há muito se reconheceu que o rendimento real, reflectindo as
condições económicas dos cidadãos e das empresas, constitui o melhor
indicador da sua capacidade e, portanto, a base mais conveniente para uma
equitativa repartição do imposto; e sempre se admitiu igualmente que a
incidência de um imposto sobre o rendimento real pode ser determinada com
relativa facilidade, o que recomenda a sua utilização como instrumento de
uma política de estabilização ou crescimento.”.
E o n.º 4 do mesmo preâmbulo referia:
“4 (...) A necessidade de encontrar um conceito operacionalmente relevante,
associada a considerações administrativas, é factor limitativo da contribuição
susceptível de ser prestada pela ciência económica ou pela contabilidade. Daí
que o rendimento líquido para efeitos fiscais nos apareça como uma categoria
a se: o substrato económico é aproveitado na medida em que pode ser vazado
em moldes contabilísticos e, em qualquer caso, objecto das correcções que a
consideração do sistema fiscal no seu conjunto e a consecução dos objectivos
da política fiscal tornarem indispensáveis.
Dentro deste condicionalismo, buscou-se a medida do rendimento líquido no
saldo da conta de resultados do exercício, sem embargo de ulteriores
ajustamentos e de se considerarem como encargos apenas aqueles que, dentro
dos limites razoáveis, tenha havido necessidade de suportar em ordem a
garantir a obtenção do rendimento e a manutenção da fonte produtora.”.
Esta importância dada à contabilidade para apuramento do resultado fiscal e da
matéria colectável insere-se na já mencionada corrente normativa da contabilidade
continental-europeia.
Há quem invoque que se a fiscalidade em IRC não tomasse como ponto de partida
a contabilidade, esta não teria a importância que, efectivamente, tem. É óbvio que esta é
uma visão minimalista ou redutora das relações entre as duas disciplinas.
Tal como o Código do IRC, que contém diversas disposições com referências à
contabilidade34 e a termos e expressões puramente contabilísticas (v.g. custos ou perdas,
34
Ver, por exemplo, o art.º 115.º “Obrigações contabilísticas das empresas”, o art.º 116.º “Regime
simplificado de escrituração” e o art.º 117.º “Centralização da contabilidade ou da escrituração”.
22
proveitos ou ganhos, amortizações, provisões, reavaliações) também o CCI previa tais
referências dos quais destacamos o art.º 22.º que determinava:
“O lucro tributável reportar-se-á ao saldo revelado pela conta de resultados
do exercício ou de ganhos e perdas, elaborada em obediência a sãos
princípios de contabilidade35, e consistirá na diferença entre todos os
proveitos ou ganhos realizados no exercício anterior àquele a que o ano fiscal
respeitar e os custos ou perdas imputáveis ao mesmo exercício, uns e outros
eventualmente corrigidos nos termos deste Código.”.
Seguindo o formulário idêntico ao do ESQUEMA N.º 2, o lucro tributável em
sede do CCI pode resumir-se no ESQUEMA N.º 3:
ESQUEMA N.º 3 - Lucro Tributável no CCI
Legenda:
LT – Lucro Tributável
PG – Proveitos ou ganhos
CP – Custos ou Perdas
C – Correcções Fiscais positivas e
negativas nos termos do CCI
LT = (PG – CP) + C
Fonte: Elaboração própria
Se comparamos os ESQUEMAS N.os 2 e 3, podemos verificar que a diferença
substancial resulta das variações patrimoniais positivas (art.º 21.º do CIRC) e negativas
(art.º 24.º do CIRC), não reflectidas no resultado líquido do exercício, e previstas apenas
no CIRC, como resumimos no ESQUEMA N.º 4 seguinte:
ESQUEMA N.º 4 - Lucro Tributável (Do CCI para o CIRC)
LTCCI = (PG –
LTCIRC =
CP)
RL
+
C
+ VP± + C
Fonte: Elaboração própria
Essa diferença resulta, obviamente, dos conceitos de “rendimento-acréscimo” e
“teoria do incremento-patrimonial” atrás enunciados.
35
Referência aos “princípios contabilísticos geralmente aceites” ou “princípios contabilísticos
fundamentais”.
23
De notar que as correcções fiscais positivas (acréscimos ao lucro tributável) e
negativas (deduções ao lucro tributável), bem com as variações patrimoniais36 são
traduzidas no quadro extracontabilístico37 da declaração de rendimentos modelo 22 do
IRC (quadro 07).
ESQUEMA N.º 5 - Lucro Tributável e Quadro 07 da DR22
CIRC
LT
Q07/DR22
Campo 239 (PEF)
Campo 240 (LT)
=
RL
Campo 201
+
VP+
Campo 202
+
VP-
Campo 203
+
C
Campo 205 ao
Campo 237
Fonte: Elaboração própria
Refira-se, por último, que mesmo que o RL seja coincidente com o resultado fiscal
(PEF ou LT), i.e., no Esquema n.º 5, LT=RL38, o próprio RL não é um resultado
contabilístico “puro”, pois há uma parte significativa de factos patrimoniais que são
relevados de acordo com as regras fiscais e não em sintonia com as normas
contabilísticas (nacionais e internacionais), como acontece, por exemplo, com a
contabilização das amortizações e das provisões (agora “ajustamentos” e “provisões”).
5.3 – Algumas Possíveis Alterações (ou não) ao Código do IRC
Analisados alguns aspectos contabilísticos e fiscais de enquadramento do tema,
importa analisar algumas das possíveis alterações (ou não) ao Código do IRC e demais
legislação complementar, por força da aplicação das NIC/NIRF.
É óbvio que esta análise deveria ser mais aprofundada, tendo em conta o impacto
de cada uma das NIC/NIRF no Código do IRC. Porém, apenas pretendemos alertar para
alguns dos factos que consideramos mais significativos.
36
Sobre este tema elaborámos alguns artigos, dos quais destacamos os dois seguintes:
- As Variações Patrimoniais (POC e CIRC), publicado Jornal de Contabilidade da APOTEC n.º 208,
Julho de 1994 e no nosso livro Contabilidade, Fiscalidade, Auditoria: Breves Reflexões, Ed. do
Autor, Braga.
- As Variações Patrimoniais (POC e CIRC), publicado na revista TOC da CTOC n.º 48, de Março de
2004.
37
Designa-se de “extracontabilístico” pois não implica qualquer assento/registo contabilístico de partida
dobrada.
38
Acontece, por exemplo, quando os resultados antes de impostos igualam o resultado líquido do
exercício, por inexistência da estimativa do IRC.
24
5.3.1
– A Estrutura Conceptual, os PCGA e o CIRC
Como referimos no item 1.1, a Estrutura Conceptual do IASB contempla os
denominados PCGA (ou, de acordo com o POC, “Princípios Contabilísticos
Fundamentais”), que, de uma forma geral, estão previstos no Capítulo 4 do POC. No
entanto, a nível dos PCGA constatam-se as seguintes diferenças:
-
Os princípios contabilísticos “Da continuidade” e “Da especialização” (ou
acréscimo)”
previstos
no
POC
são
considerados
na
NIC1
como
“pressupostos”;
-
Os princípios “Da consistência” e “Da materialidade” estão previstos quer no
POC quer na NIC1;
-
O princípio “Da compensação” está previsto na NIC1, mas não está no POC.
Este princípio, também, designado de “Da não compensação de saldos”
estabelece que os activos e passivos não devem, por regra, ser compensados;
-
O princípio contabilístico “Do custo histórico” está previsto no POC e não na
NIC1.
Em artigo sob o título “Os Princípios Contabilísticos Geralmente Aceites e os
Princípios Fiscais Geralmente Aceites (Impostos)”39 desenvolvemos alguns aspectos
teórico-práticos da aplicação dos PCGA e a sua interpretação pela legislação fiscal, com
especial destaque para o Código do IRC.
Então sublinhámos a importância da DC18 na clarificação da Estrutura
Conceptual da Contabilidade em Portugal, destacando, entre outros, os seguintes
aspectos:
-
A clarificação do alcance da expressão “geralmente aceites”, contemplada na
DC18 da seguinte forma:
“Significa que um organismo contabilístico normalizador, com autoridade e
de larga representatividade, estabeleceu um princípio contabilístico numa
dada área ou aceitou como apropriado determinado procedimento ou prática,
atendendo à sua aplicação universalmente generalizada e ao seu
enquadramento na estrutura conceptual.”;
39
Publicado no Boletim APECA n.º 82, de Maio de 1998, e no nosso livro “Temas de Contabilidade,
Fiscalidade e Auditoria”, Ed. Vislis Editores, Lisboa, Janeiro de 2001 (pp. 229-37).
25
-
O estabelecimento de uma hierarquia na aplicação dos PCGA:
1. Os constantes do POC;
2. Os constantes das Directrizes Contabilísticas;
3. Os divulgados nas NIC;
-
Nessa hierarquia releva-se, também, a perspectiva conceptual da substância
económica para o relato financeiro, o que constitui uma referência explícita ao
princípio contabilístico “Da substância sobre a forma”;
-
Quer o POC quer a DC18 não estabelecem uma hierarquia dos PCGA. Assim,
em caso de conflito dos PCGA na revelação contabilística de um determinado
facto patrimonial, qual o princípio contabilístico que deve prevalecer sobre
o(s) restante(s)?
Como já referimos, o art.º 17.º do CIRC ao apelar para o normativo contabilístico
acolhe, também, os PCGA, i.e., esse articulado constitui uma referência genérica à
aplicação dos PCGA.
No entanto, o Código do IRC determina regras próprias de interpretação desses
PCGA para efeitos de apuramento do lucro tributável, pelo que, independentemente
dessa referência genérica à aplicação dos PCGA, o Código do IRC estabelece os limites
fiscais da sua aplicação.
No referido artigo apresentámos alguns casos concretos de interpretação dos
PCGA no âmbito do CIRC, dos quais destacamos dois:
-
O princípio contabilístico “Da especialização (ou acréscimo)”, designado no
art.º 18.º do CIRC por princípio “Da especialização dos exercícios”, tem um
tratamento privilegiado no CIRC, quer no próprio art.º 18.º, quer nos art.º 19.º
“Obras de carácter plurianual” e 22.º “Subsídios ou subvenções não destinadas
à exploração”.
26
Além disso, o Fisco clarificou algumas regras de aplicação desse princípio
através do Ofício-Circulado n.º 14/93, de 23 de Novembro, que ainda se
encontra em vigor40;
-
O princípio contabilístico “Da prudência” aplicável às “provisões”, cujas
regras fiscais estão previstas nos art.os 34.º a 38.º do CIRC e que deverão ser
alteradas (mais em forma do que em substância) face à aplicação do DecretoLei n.º 35/2005 já comentado no Capítulo 2 desse artigo.
No que concerne à aplicação das NIC/NIRF não nos parece que os princípios e
pressupostos contabilísticos da Estrutura Conceptual do IASB venham a suscitar
alterações significativas no Código do IRC, pois não podemos esquecer que o Fisco terá
sempre a sua própria interpretação, visando o principal objectivo de arrecadação de
receitas fiscais.
5.3.2
– Valorimetria
Associadas aos PCGA estão as alterações a nível da valorimetria das diversas
rubricas do Balanço e das Demonstrações dos Resultados, constituindo, sem dúvida, das
principais preocupações da adaptação das NIC/NIRF ao Código do IRC.
Refira-se, porém, que tais alterações não condicionam a regra da determinação do
lucro tributável prevista no art.º 17.º, n.º 1, pois o que passaremos a ter é, repetimos, um
enquadramento contabilístico diferente em cada uma dessas componentes, como
demonstramos no seguinte esquema:
40
Sobre este assunto também elaborámos dois artigos complementares:
– “Custos e Proveitos de Exercícios Anteriores”, publicado no Jornal de Contabilidade APOTEC
n.º 203, de Fevereiro de 1994 e no Boletim da APECA n.º 61, de Março de 1996, bem como no
nosso primeiro livro “Contabilidade, Fiscalidade, Auditoria – Breves Reflexões, Ed. do Autor,
Março de 1997 (1.ª edição), Janeiro de 1998 (2.ª edição) e Junho de 1998 (3.ª edição), pp. 23-37.
– “As Correcções Relativas a Exercícios Anteriores (POC e CIRC)”, revista TOC da CTOC n.º 32,
de Novembro de 2002.
27
ESQUEMA N.º 6 – Lucro Tributável (Enquadramento actual e futuro –
NIC/NIRF)
LT
=
RL
+
VP±
↓
Actualmente
Futuro
→
→
POC, DC
e NIC (cf. DC18)
+
↓
+
Art.os 21.º e 24.º
CIRC
C
↓
+
Correcções
Fiscais c/ base
no CIRC
↓
↓
↓
- NIC “Puras”
- NIC “Adaptadas”
e novo POC
Art.os 21.º e 24.º
do CIRC, com
adaptações
Correcções
Fiscais c/ base
no CIRC, com
adaptações
+
Fonte: Elaboração própria
Ou seja, as alterações da valorimetria contabilística face às adaptações das
NIC/NIRF terão reflexos naquelas três componentes do LT, sem, contudo, provocar
qualquer alteração conceptual no lucro tributável.
Sem sermos exaustivos, de seguida apresentamos alguns aspectos inerentes à
valorimetria e que resultam da possibilidade de alterações das práticas/políticas
contabilísticas, face às “novas” opções permitidas pelas NIC/NIRF.
5.3.3
– O “Justo Valor”
Como sublinhámos no item 3 deste trabalho, o conceito de “justo valor” é um dos
aspectos valorimétricas mais abordados relativamente à aplicação das NIC/NIRF.
À parte algumas alterações, a seguir comentadas, à aplicação do “justo valor”,
insistimos na ideia de que o nosso normativo contabilístico já o contempla em algumas
Directrizes Contabilísticas, com especial destaque para a “DC n.º 13 – Conceito de justo
valor”. Refira-se, aliás, que nesses casos houve a preocupação de seguir o estabelecido
nas NIC.
Desta forma, não sendo um conceito novo, as alterações ao CIRC por força da
aplicação do “justo valor” não deverão ser tão importantes que justifique tal destaque.
Na verdade, temos que admitir que o actual CIRC já responde em grande parte à
valorimetria do “justo valor”, caso contrário já deveria ter sido alterado em
conformidade com o disposto nas Directrizes Contabilísticas.
28
5.3.4
– O art.º 17.º do CIRC
Como já referimos, consideramos o art.º 17.º do CIRC como um “artigo de ponte”
entre a contabilidade e a fiscalidade em sede de IRC, na medida em que releva a
importância do resultado líquido do exercício como ponto de partida para a
determinação do resultado fiscal (lucro tributável ou prejuízo para efeitos fiscais).
A alínea a) do n.º 3 do art.º 17.º do CIRC apela à organização da contabilidade de
acordo com a normalização contabilística, pelo que não nos parece que a redacção deste
articulado tenha que ser alterado, pois a expressão “normalização contabilística” é
suficientemente abrangente e genérica para acolher o modelo contabilístico que vier a
ser adoptado no âmbito NIC/NIRF.
Na verdade, o que vai alterar é o modelo de normalização contabilística, passando
de um assente essencialmente no POC e nas Directrizes Contabilísticas41 para outro
baseado nas NIC/NIRF “PURAS” aplicável às empresas do primeiro nível de
normalização, e nas NIC/NIRF “ADAPTADAS”, incluindo um novo POC ajustado às
NIC/NIRF, para o segundo nível de normalização.
5.3.5
– Custos e/ou perdas42
A Estrutura Conceptual do IASB não prevê a definição de custos mas sim as
definições de gastos (em contraposição à de réditos) e perdas (em contraposição à de
ganhos), como se descreve (parágrafos 78 a 80):
“78. A definição de gastos engloba perdas assim como aqueles gastos que
resultem do decurso das actividades ordinárias da entidade. Os gastos
que resultem do decurso das actividades ordinárias da entidade
incluem, por exemplo, o custo das vendas, os salários e as
depreciações. Tomam geralmente a forma de um exfluxo ou
deperecimento de activos tais como dinheiro e seus equivalentes,
existências e activos fixos tangíveis.
79. As perdas representam outros itens que satisfaçam a definição de gastos
e podem, ou não, surgir no decurso das actividades correntes da
entidade. As perdas representam diminuições em benefícios económicos
41
E subsidiariamente nas NIC, como referimos no item 1.2 deste trabalho, de acordo com a DC18. Incluise também as Interpretações Técnicas referidas no rodapé n.º 10.
42
O POC refere “e” e o CIRC “ou”.
29
e como tal não são na sua natureza diferentes de outros gastos. Daqui
que não sejam vistas como um elemento separado nesta Estrutura
Conceptual.
80. As perdas incluem, por exemplo, as que resultam de desastres como os
incêndios e as inundações bem como as que provêm da alienação de
activos não correntes. A definição de gastos também inclui perdas não
realizadas como, por exemplo, as provenientes dos efeitos do aumento
da taxa de câmbio de uma moeda estrangeira respeitante a empréstimos
obtidos de uma entidade nessa moeda. Quando as perdas forem
reconhecidas na demonstração dos resultados, elas são geralmente
mostradas separadamente porque o conhecimento das mesmas é útil
para finalidades de tomar decisões económicas. As perdas são muitas
vezes relatadas líquidas de rendimentos relacionados.”
Braz Machado43 apresenta a seguinte classificação esquemática:
Proveitos
Réditos
Ganhos
Lucro
(Prejuízo)
Gastos ou Custos Gastos (Operacionais)
Extintos
Perdas
O Código do IRC utiliza a terminologia do POC (Custos e/ou perdas vs proveitos
e/ou ganhos).
O art.º 23.º do CIRC refere-se aos custos e perdas aceites para efeitos fiscais, que,
de uma forma geral, correspondem à “Classe 6 – Custos e perdas” do POC. No entanto,
inclui situações/operações que não provocam registos nessas contas e que são
consideradas custos e perdas fiscais (v.g. menos-valias realizadas), bem como algumas
situações/operações que não são aceites como custos ou perdas para efeitos fiscais.
Por outro lado, o art.º 42.º do CIRC refere-se aos custos registados na
contabilidade que não são aceites para efeitos fiscais.
As eventuais alterações destes dois articulados dependerão da estrutura que vier a
ser determinada para as Demonstrações dos Resultados.
43
BRAZ MACHADO, José Rita: Contabilidade Financeira – Da Perspectiva da Determinação dos
Resultados, Ed. Protocontas, 2.ª Edição, Lisboa, Abril de 2000, p. 106.
30
Considerando a tipificação dos custos e perdas prevista no art.º 23.º, opinamos que
este articulado poderia referir-se genericamente aos custos e perdas relevados na
contabilidade (actual “Classe 6” do POC), i.e., não deveria efectuar o desenvolvimento
de tais custos e perdas, mas apenas referir o requisito da sua indispensabilidade para a
realização dos proveitos ou ganhos ou para a manutenção da fonte produtora (n.º 1 do
art.º 23.º) e sublinhando os custos fiscais que não são reflectidos no resultado
contabilístico (v.g. menos-valias realizadas).
No entanto, as situações referidas nos actuais n.os 2 a 7 do art.º 23.º deveriam
manter-se.
5.3.6
– Proveitos e/ou ganhos44
Tal como os custos e perdas, o POC não define proveitos e ganhos. No entanto, a
Directriz Contabilística n.º 26 “Rédito”, inspirada na NIC18 com o mesmo título, prevê
(item 2):
“De acordo com a Norma Internacional de Contabilidade nº 18, o rédito é
o influxo bruto, durante o período contabilístico, de benefícios económicos
obtidos no decurso das actividades ordinárias de uma entidade, quando
esses influxos resultem em aumentos de capital próprio45.
O conceito de rédito é menos amplo que o de proveito, na medida em que
aquele tem de ser gerado internamente, enquanto o proveito pode não o ser.
São, por exemplo, os casos dos subsídios ao investimento e dos
donativos...”.
Por outro lado, a Estrutura Conceptual (parágrafo 74) define rendimento:
“A definição de rendimentos engloba quer réditos quer ganhos. Os réditos
provêm do decurso de actividades ordinárias de uma entidade sendo
referidos por uma variedade de nomes diferentes incluindo vendas,
honorários, juros, dividendos, royalties e rendas.”.
Assim, repetimos, as NIC contemplam os conceitos de rendimentos, réditos e
ganhos e não o de proveitos.
44
O POC refere “e” e o CIRC “ou”.
A NIC18 (item 7) acrescenta: “que sejam aumentos relacionados com contribuições de participantes
no capital próprio”.
45
31
Apesar da DC26 já ter sido publicada no ano de 2000, o legislador fiscal não viu
necessidade de alterar o art.º 20.º do CIRC para atender a essa conceptualização, pelo
que não nos parece que a NIC18 o venha a exigir.
Tal como referimos para os custos e perdas, os proveitos e ganhos deverão
contemplar as seguintes situações:
-
Adaptação à estrutura das Demonstrações dos Resultados que vier a ser
definida;
-
Referência genérica aos proveitos e ganhos reflectidos na Demonstração dos
Resultados (actual “Classe 7” do POC), pois também não vislumbramos
razões para o elenco contemplado no art.º 20.º;
-
Manter a referência aos proveitos fiscais que não implicam assentos
contabilísticos (v.g. mais-valias realizadas).
5.3.7
– Inventários (ou “Existências”)
A valorimetria das existências está prevista no item 5.3 do POC e na NIC 2
“Inventários” ou “Existências”46.
No que respeita à valorimetria das entradas existe uma grande sintonia entre o
actual POC e a NIC2, especialmente no que respeita aos aspectos conceptuais do custo
de aquisição e do custo de produção. No entanto, a NIC2 especifica com maior
pormenor os componentes do custo de aquisição e do custo de produção.
Já o art.º 26.º do CIRC determina regras próprias da valorimetria das entradas para
efeitos do apuramento do lucro tributável, apresentando algumas divergências com as
regras do POC e da NIC2, nomeadamente as seguintes:
-
Prevê como critério “preços de venda deduzidos da margem normal do lucro,
definindo (n.º 3) que são havidos por preços de venda os constantes de
elementos oficiais ou os últimos que em condições normais tenham sido
praticados pela empresa ou ainda os que, no termo do exercício, forem
46
Morais e Lourenço: Aplicação das Normas do IASB em Portugal, Publisher Team, Lisboa, Abril de
2005, traduzem a NIC2 por “Existências”, justificando a sua opção nos seguintes termos (p. 59): “Apesar
da expressão contemplada na publicação no Jornal Oficial das Comunidades ser inventários, utiliza-se a
expressão existência por se considerar que esta é a mais adequada.”. Note, porém, que a Ordem dos
ROC também utiliza a palavra “inventários” no livro que publicou sob o título “Normas Internacionais de
Relato Financeiro (IFRSs)”.
32
correntes no mercado, desde que sejam considerados idóneos ou de controlo
inequívoco.
Além disso, determina (n.º 4) que esse critério só poderá ser aceite nos
sectores de actividade em que o cálculo do custo de aquisição ou do custo de
produção se torne excessivamente oneroso ou não possa ser apurado com
razoável rigor, podendo a margem normal de lucro, nos casos de não ser
facilmente determinável, ser substituída por uma dedução não superior a 20%
do preço de venda;
-
Fixa a possibilidade de existirem “Valorimetrias especiais para as existências
tidas por básicas ou normais” (n.º 5), carecendo de autorização prévia da
Direcção Geral dos Impostos, solicitada em requerimento em que se indiquem
os critérios a adoptar e as razões que as justificam.
Não nos parece que estas disposições venham a ser alteradas por força da
aplicação da NIC2, pois além da referida proximidade POC/NIC2, o Fisco não abdicará,
repetimos, de definir as suas próprias regras.
Nota-se, ainda, que o art.º 26.º do CIRC apenas se refere à valorimetria das
entradas e não à valorimetria das saídas.
Compreende-se que o legislador tenha efectuado esta opção, pois apenas
pretendeu definir regras de valorimetria especiais para as entradas das existências para
efeitos fiscais. Além disso, os critérios de valorimetria de saída são objectivos, i.e., não
suscitam uma interpretação diferente pelo legislador fiscal em relação ao contabilístico.
Neste contexto, na valorimetria das saídas em sede de IRC segue-se a “regra
geral” prevista no art.º 17.º, no que concerne ao apelo às normas contabilísticas que, de
uma forma geral, estão previstas no item 5.3.11 do POC47, definindo, como métodos de
custeio das saídas, o custo específico, o custo médio ponderado, o FIFO, o LIFO e o
custo padrão.
De notar que a NIC 2 não prevê o critério LIFO.
Face aquele normativo do IRC, não é plausível que haja lugar, também, a qualquer
alteração por força de aplicação da NIC2.
47
Os itens 5.3.12 a 5.3.18 prevêem outras regras específicas de determinados sectores e ou situações.
33
Já no que concerne às “Provisões para depreciação de existências”, o POC define
as respectivas regras nos itens 5.3.4 a 5.3.10.
O item 5.3.10 foi recentemente alterado pelo referido Decreto-Lei n.º 35/2005, de
17 de Fevereiro, prevendo que as diferenças entre o custo de aquisição ou de produção e
o preço de mercado48, previstos nos itens 5.3.4 e 5.3.5 do POC, sejam relevadas em
rubricas de ajustamentos de existências (custo do exercício na conta “66 – Amortizações
e ajustamentos do exercício”), a qual será reduzida ou anulada (proveito do exercício na
conta “77 - Reversões de amortizações e ajustamentos”) quando deixarem de existir os
motivos que a originaram.
No que respeita ao art.º 36.º do CIRC “Provisões para depreciação de existências”
que, como já sublinhámos, deverá ser alterado no sentido de acolher o novo conceito de
“ajustamentos”, não nos parece que as regras fiscais aí mencionadas sejam alteradas por
força da aplicação da NIC2.
Acresce, ainda, que a Administração Fiscal, de acordo com doutrina emitida,
aceita como justificativos dos preços de mercado, designadamente49:
-
No caso de bens adquiridos para a produção, os constantes de elementos
oficiais ou os correntes no mercado (facturas ou tabelas de preços de
fornecedores), desde que sejam considerados idóneos ou de controlo
inequívoco, reportados à data da constituição da provisão;
-
No caso de bens adquiridos para venda, os constantes de elementos oficiais ou
os últimos que em condições normais sejam correntes no mercado (facturas ou
tabelas de preços) desde que sejam considerados idóneos ou de controlo
inequívoco, reportados à data da constituição da provisão.
5.3.8
– Provisões e Ajustamentos
Como referimos no Capítulo 2 deste artigo, o Decreto-Lei n.º 35/2005, de 17 de
Fevereiro, alterou o conceito de provisões e introduziu um novo conceito de
“ajustamentos de valores do activo”, o que originou diversas alterações ao POC, pelo
que teremos de analisar esta problemática no âmbito do Código do IRC.
48
Os itens 5.3.7, 5.3.8 e 5.3.9 conceptualizam o preço de mercado, o custo de reposição e o valor
realizável líquido.
49
Conforme comentários ao ex-art.º 35.º do CIRC (actual 36.º) no Código do IRC, Ed. DGCI, 1990 (p.
184).
34
Assim, as provisões estão contempladas na subsecção IV “Regime das Provisões”
e nos art.os 34.º a 38.º do CIRC, através de um artigo genérico (art.º 34.º) e de alguns
artigos específicos de certos tipos de provisões (art.os 35.º a 38.º), como resumimos no
QUADRO N.º 5.
QUADRO N.º 5 - As Provisões no CIRC – Regime Actual
NATUREZA DA PROVISÃO
Aceites fiscalmente:
28 – Provisões para cobranças
duvidosas
293 – Provisões para processos
judiciais em curso
39 – Provisões para depreciação de
existências
- Provisão - B.P. e I.S.P.
- Provisão para constituição de jazigos
- Provisão para a recuperação
paisagística de terrenos
Não aceites fiscalmente:
19 – Provisões para aplicações de
tesouraria
29 – Provisões para riscos e encargos
49 – Provisões para investimentos
financeiros
Fonte: Elaboração própria
ARTIGO GENÉRICO
(ART.º 34.º)
ARTIGO
ESPECÍFICO
Art.º 34.º n.º 1, al. a)
Art.º 35.º
Art.º 34.º n.º 1, al. c)
Não previsto
Art.º 34.º n.º 1, al. b)
Art.º 36.º
Art.º 34.º n.º 1 al. d)
Art.º 34.º n.º 1, al. e)
Não previsto
Art.º 37.º
Art.º 34.º n.º 1, al. f)
Art.º 38.º
Não previsto
Não previsto
Não previsto
Não previsto
Não previsto
Não previsto
Analisando o texto actual dos articulados do CIRC e considerando que apenas se
manterão as provisões para responsabilidades (conta “29 – Provisões” e respectivas
subcontas), apenas a alínea c) do 1 do art.º 34.º relativa às “provisões para processos
judiciais em curso” (actual conta 293 do POC) deve permanecer no CIRC como elegível
para efeitos do CIRC50.
Assim, o CIRC deverá ser alterado para contemplar uma secção própria para os
“ajustamentos de valores do activo”51 que terão de contemplar as situações/operações
relativas ao registo dos custos e proveitos correspondentes, e a sua aceitabilidade ou não
para efeitos fiscais em IRC.
5.3.9
– Amortizações/Depreciações do Imobilizado
50
Excluímos desta análise as provisões para a reconstituição de jazigos (art.º 37.º do CIRC), de
recuperação paisagística de terrenos (art.º 38.º do CIRC) e as do BP e do ISP.
51
Pode admitir-se a concepção de uma secção conjunta de “Provisões e Ajustamentos”.
35
A política contabilística das amortizações/depreciações do imobilizado é das mais
abordadas quando se coloca a questão da interferência da fiscalidade na contabilidade, o
que
nos
motivou
para
a
elaboração
de
um
artigo
sob
o
título
“As
Reintegrações/Amortizações do Imobilizado”, no qual salientámos alguns aspectos
conceptuais contabilístico-fiscais52.
Desde o anterior Código da Contribuição Industrial (CCI) que o legislador fiscal
tem regulamentado as amortizações do imobilizado, destacando-se na sua vigência o
primeiro diploma - Portaria n.º 21867, de 12 de Fevereiro de 1966 (vigorou até ao
exercício de 1980) - e, posteriormente, a Portaria n.º 737/81, de 29 de Agosto53. Com a
entrada em vigor em 1 de Janeiro de 1989 dos Códigos do IRC e do IRS passou a
aplicar-se o Decreto-Regulamentar n.º 2/90, de 12 de Janeiro e a Subsecção III –
“Regime das reintegrações e amortizações” (do art.º 28.º ao art.º 33.º do CIRC)54.
Como comprovámos em trabalho empírico incluído na nossa dissertação do
Mestrado em Contabilidade e Auditoria (U. Minho)55, a generalidade das empresas,
quer aquelas com títulos cotados em bolsa e quer as não cotadas56, aplicaram essa
legislação fiscal.
Assim, perante a insuficiência de normas contabilísticas para a relevação dos
factos patrimoniais relativos à depreciação do imobilizado, as empresas utilizam os
critérios definidos na legislação fiscal, seja por uma questão de comodidade, seja porque
“dá jeito” e ou não “dá trabalho”.
Esta é, efectivamente, a realidade, pelo que se questiona se, agora, com a
aplicação das NIC/NIRF, o panorama vai alterar-se.
As NIC específicas de imobilizado corpóreo (ou tangível) e incorpóreo
(ou
intangível) são, respectivamente, a NIC 16 “Activos Fixos Tangíveis” e a NIC 38
“Activos Fixos Intangíveis”.
52
Publicado na revista Eurocontas n.º 25, de Fevereiro de 1997, no Boletim da CROC n.º 11, de
Abril/Junho de 1997 e no nosso livro Contabilidade, Fiscalidade, Auditoria – Breves Reflexões, Ed. do
autor, Março de 1997 (1.ª edição), Janeiro de 1998 (2.ª edição) e Junho de 1998 (3.ª edição), pp. 349-72.
53
Essas Portarias sofreram algumas alterações, com especial destaque para a Portaria n.º 95/88, de 9 de
Fevereiro.
54
No artigo referido no rodapé 52, alertámos para a necessidade de alteração do CIRC no sentido de
restringir estes articulados a um só, efectuando a remissão para o Decreto-Regulamentar n.º 2/90, pois os
mesmos estão previstos neste diploma, não havendo, por isso, necessidade de manter tais disposições.
55
Publicada em livro sob o título O Sistema Contabilístico e Fiscal Português – Uma Abordagem aos
Relatórios e Contas das Empresas, Edição do Vislis Editores, Novembro de 2000.
56
No estudo seleccionamos sete empresas com títulos cotados em bolsa e dez não cotadas.
36
Sublinhe-se, no entanto, que outras NIC referem-se a outros aspectos específicos
dos activos fixos, como são os casos das NIC 17 “Locações”, NIC 28 “Investimentos
em Associadas”, NIC 36 “Imparidade de Activos” e a NIC 40 “Propriedades de
Investimento”.
Em primeiro lugar, há que reter os aspectos conceptuais consagrados nas NIC 16 e
3857:
-
A NIC 16 define “depreciação” como sendo a imputação sistemática da
quantia depreciável de um activo durante a sua vida útil;
-
A NIC 38 define “amortização” como sendo a imputação sistemática da
quantia depreciável de um activo intangível durante a sua vida útil.
De notar que o POC utiliza o termo “amortizações”, as NIC o termo “depreciação”
e o Código do IRC utiliza, separadamente ou em conjunto, os termos “amortizações” e
“reintegrações”.
A NIC 16 trata da “Depreciação” nos parágrafos 43 a 62, prevendo,
nomeadamente, o seguinte58:
-
O custo de depreciação em cada período deve ser reconhecido nos resultados a
menos que seja incluído na quantia escriturada de um outro activo, como, por
exemplo, a depreciação de instalações e do equipamento de fabrico é incluída
nos custos de conversão de inventários/existências cf. NIC 259 (parágrafos 48 e
49). No actual POC é relevado na conta 66 “Amortizações do exercício”;
-
A quantia depreciável de um activo deve ser imputada numa base sistemática
durante a sua vida útil (item 50). O POC prevê esta norma no item 5.4.1 e o
CIRC no art.º 28.º, n.º 1;
-
O valor residual e a vida útil de um activo devem ser revistos pelos menos no
final de cada ano financeiro e, se as expectativas diferirem das estimativas
anteriores, a(s) alteração(ões) deve(m) ser contabilizada(s) como uma
alteração numa estimativa contabilística de acordo com a NIC 8 (parágrafo
57
Nestes comentários seguimos a tradução das NIC/NIRF efectuada pela OROC, publicadas em livro sob
o título “Normas Internacionais de Relato Financeiro (IFRSs)”, Ed. 2004.
58
O objectivo deste trabalho não é, repetimos, o de efectuar uma análise exaustiva dos efeitos fiscais das
NIC, mas o de alertar para alguns aspectos conceptuais mais relevantes.
59
Exemplos extraídos do parágrafo 49 da NIC 16.
37
51). A Directriz Contabilística n.º 8 baseia-se na NIC 8 e prevê (item 4) esta
situação;
-
O método de depreciação usado deve reflectir o modelo por que se espera que
os futuros benefícios económicos do activo sejam consumidos pela entidade
(parágrafo 60). O método de depreciação aplicado deve ser revisto pelo menos
no final de cada ano financeiro e, se existiu alguma alteração significativa no
modelo esperado de consumo dos futuros benefícios económicos incorporados
no activo, o método deve ser alterado para reflectir o modelo alterado. Tal
alteração
deve
ser
contabilizada
como
alterações
numa
estimativa
contabilística de acordo com a NIC 8.
O parágrafo 62 da NIC16 sublinha que pode ser usada uma variedade de métodos
de depreciação para imputar a quantia depreciável de um activo numa base sistemática
durante a sua vida útil, exemplificando (o que quer dizer que são permitidos outros
métodos) o método da linha recta (na legislação fiscal identificado como “método das
quotas constantes”), o método do saldo decrescente (na legislação fiscal identificado
como “método das quotas degressivas”) e o método das unidades de produção (não
referido na legislação fiscal, mas que podemos identificar, nomeadamente, como a
depreciação baseada em “horas/máquinas”, “horas/homens ou mão de obra”).
Prevê, ainda, esse parágrafo que a entidade seleccione o método que reflicta mais
proximamente o modelo esperado de consumo dos futuros benefícios económicos
incorporados no activo, devendo ser aplicado consistentemente (aplicação do princípio
contabilístico “Da consistência”) a menos que ocorra uma alteração no modelo esperado
de consumo desses futuros benefícios económicos.
Comparando estes normativos com o Decreto-Regulamentar n.º 2/90 (DR 2/90) e
o Código do IRC constatamos o seguinte:
-
O art.º 29.º, n.º 1 do CIRC e o art.º 4.º, n.º 1 do DR 2/90 estabelecem que a
regra é o método das quotas constantes (linha recta na NIC16);
-
O art.º 29.º, n.º 2 do CIRC e o art.º 4.º, n.º 2 do DR 2/90, determinam, como
excepção à regra, a utilização do método das quotas degressivas (método do
saldo decrescente na NIC16), não permitindo, no entanto, a sua aplicação a
determinados activos;
38
-
A NIC16 não define aquelas condições e limites para aplicação dos dois
métodos. A única condição definida na NIC16 é de a entidade utilizar o
método que reflicta mais proximamente o modelo esperado de consumo dos
futuros benefícios económicos incorporados no activo.
Compreende-se que assim seja, pois tal aferição depende de entidade para
entidade e, até, de país para país, daí que cada entidade/país possa determinar as suas
próprias
regras
contabilísticas
ou
contabilístico-fiscais
de
relevação
das
amortizações/depreciações.
Desta forma, Portugal, a exemplo de outros países, como o caso da Espanha,
também definiu tais regras.
Com efeito, embora o POC (item 5.4) defina as regras de valorimetria aplicáveis
ao imobilizado, incluindo as amortizações, o Fisco tem determinado as suas próprias
regras na referida legislação, o que, com certeza, continuará a fazer.
Assim, embora as NIC estabeleçam as mencionadas regras contabilísticas, a
legislação fiscal interpreta-as à sua maneira, como aconteceu, por exemplo, com os dois
métodos de amortizações/depreciações das quotas constantes e das quotas degressivas.
É, nestes termos, que, no caso da empresa utilizar o método das quotas constantes,
o art.º 5.º, n.º 1 do DR 2/90 fixa as taxas máximas de amortização para um conjunto
significativo de activos de diversos sectores (Tabela I – Taxas específicas) e de outros
activos com carácter genérico (Tabela II – Taxas genéricas).
Por outro lado, na hipótese da utilização do método das quotas degressivas, o art.º
6.º, n.º 1 do DR 2/90 e o art.º 30.º, n.º 3 do CIRC, estabelecem, também, a forma da sua
aplicação, fixando coeficientes de majoração das taxas, constantes daquelas tabelas, em
função da vida útil dos elementos do activo, pois é sabido que existem outros métodos
de quotas degressivas (v.g., método dos números dígitos, ou método de Colle, método
das quotas decrescentes em progressão aritmética, método das quotas decrescentes em
progressão geométrica)60.
Sublinhe-se, ainda, que a legislação fiscal permite diversas variantes na aplicação
dos métodos, como o caso do regime intensivo de amortizações, o regime duodecimal, a
amortização de elementos de reduzido valor, etc.
60
Para uma análise pormenorizada destes métodos sugerimos a consulta a: PINHEIRO PINTO, José
Alberto: Tratamento Contabilístico e Fiscal do Imobilizado, Areal Editores, Porto 2005.
39
Note-se, porém, que o art.º 29.º, n.º 3 do CIRC e o art.º 4, n.º 3 do DR 2/90 (este
tem uma redacção mais clarividente) determinam que podem ser utilizados métodos de
reintegração e amortização diferentes dos dois métodos atrás referidos, quando a
natureza do deperecimento ou a actividade económica da empresa o justifiquem, após
reconhecimento prévio da Direcção Geral dos Impostos.
Ora, estes articulados permitem uma grande abertura na aplicação dos diversos
métodos de amortização/depreciação a utilizar pela entidade, nomeadamente o método
das unidades de produção especificado na NIC 16.
Refira-se, aliás, que, como já referimos, a própria NIC 16 admite outros métodos
além dos atrás exemplificados.
Neste contexto, será que a legislação fiscal irá (deverá) ser alterada?
Mais uma vez, opinamos que o Fisco não deverá abdicar de definir as suas
próprias regras para apuramento do lucro tributável, pelo que a aplicação da NIC 16 e
de outras NIC, nomeadamente a NIC 38, relativas à depreciação dos activos, não
encontra nenhum obstáculo na fiscalidade vigente. Com efeito, a entidade poderá seguir
o método de amortização/depreciação que bem entender e dentro dos pressupostos
definidos nas NIC, mas para efeitos de apuramento do LT, terá de cumprir os requisitos
atrás enunciados e os restantes previstos na legislação fiscal, reflectindo, se for caso
disso, as competentes correcções extracontabilísticas no Q07/DR22.
Uma outra questão que se coloca relativamente às amortizações/depreciações do
imobilizado é a da “imparidade de activos”.
A NIC 16 (item 63) remete para a NIC 36 “Imparidade de Activos”, aplicável a
todos os activos, incluindo, portanto, o imobilizado tangível.
A NIC 36 define:
“Uma perda de imparidade é a quantia pela qual a quantia escriturada de
um activo ou unidade geradora de caixa excede a sua quantia
recuperável.”.
E a “quantia recuperável” de um activo ou unidade geradora de caixa é o valor
mais elevado entre o justo valor menos os custos de vender e o seu valor de uso.
Assim, um activo está em imparidade quando a sua quantia escriturada (registada
no balanço) excede a quantia recuperável.
40
A NIC 36 (parágrafo 12) enumera um conjunto de indicações para a entidade
testar a imparidade de activos, designando-as de “fontes externas de informação” e
“fontes internas de informação”. Ou seja, elenca algumas das situações de causas
internas (dentro da entidade) e causas externas (fora da entidade) justificativas das
perdas de imparidade.
Nas “fontes internas” exemplifica a ociosidade do activo, a descontinuação ou
reestruturação de unidades operacionais a que o activo pertence e planos de alienação
do activo antes da data anteriormente esperada.
Traduzindo esta realidade contabilística para o actual normativo contabilístico
nacional, inferimos o seguinte:
-
As perdas de imparidades representam “ajustamentos de valores do activo”
(item 2.12 do POC, com a actual redacção do DL 35/2005) e são reconhecidas
como diminuições dos resultados operacionais nas contas “66 – Amortizações
e ajustamentos do exercício”;
-
O item 5.4.4 do POC determina:
“Quando, à data do balanço, os elementos do activo imobilizado corpóreo e
incorpóreo, seja ou não limitada a sua vida útil, tiverem um valor inferior ao
registado na contabilidade, devem ser objecto de amortização correspondente
à diferença se for de prever que a redução desse valor seja permanente.
Aquela amortização extraordinária não deve ser mantida se deixarem de
existir os motivos que a originaram.”.
No que respeita às amortizações extraordinárias inerentes ao reconhecimento de
perdas de imparidade, o art.º 10.º do DR 2/90 estabelece as respectivas regras para as
denominadas “desvalorizações excepcionais provenientes de causas anormais”, das
quais destacamos o seguinte:
-
Apenas se refere às causas anormais que o n.º 2 do art.º 10.º exemplifica como
os desastres, fenómenos naturais e inovações técnicas excepcionalmente
rápidas;
-
Os eventos que deram origem a essas situações terão de ser devidamente
comprovados (v.g. declaração dos bombeiros e de autoridades policiais);
41
-
O contribuinte terá de efectuar uma exposição devidamente fundamentada até
ao fim do primeiro mês seguinte ao da ocorrência do facto (n.º 3 do art.º
10.º)....
De notar que este normativo não abrange situações de imparidade, ditas normais.
A questão que se coloca é se o Fisco irá aceitar como custo fiscal essas perdas de
imparidade.
5.3.10 –Reavaliações/Revalorizações
A Directriz Contabilística n.º 16 “Reavaliação de Activos Imobilizados Tangíveis”
regula as reavaliações/revalorizações61 do imobilizado corpóreo62 e no item 2.3 prevê
que a mesma poderá ser efectuada ao “justo valor”, tendo em conta dois critérios: o
custo de reposição depreciado e o valor corrente do mercado63.
Em matéria de reavaliações/revalorizações, a DC16 baseia-se na NIC 16 sob o
título “Activos Fixos Tangíveis”, não existindo divergências significativas nos aspectos
conceptuais.
Nos termos de legislação fiscal nacional, tais reservas geram mais-valias
potenciais ou latentes que são excluídas do lucro tributável, por força do art.º 21.º, n.º 1
al. b) do CIRC64.
Quanto às amortizações que incidem sobre os bens reavaliados, o aumento das
amortizações resultante da reavaliação entra no apuramento do lucro tributável de duas
formas:
-
Não é aceite fiscalmente na totalidade (acréscimo num campo em branco do
Q07/DR22), no caso de se utilizarem os critérios do justo valor previstos na
DC16 atrás referidos e no caso de se utilizarem coeficientes de desvalorização
da moeda sem suporte do diploma legal regulamentador das reavaliações;
-
Não é aceite em 40% (acréscimo no Campo 218 do Q07/DR22) se a
reavaliação for efectuada ao abrigo de um diploma legal65.
61
As duas palavras são apresentadas como sinónimos.
As palavras “corpóreo” e “tangível” são apresentadas como sinónimos. Em Espanha utiliza-se a palavra
“material”.
63
A DC16 também prevê as denominadas “reavaliações legais” do imobilizado, previstas em diploma
legal (decreto-lei) publicado para o efeito.
64
Embora o CIRC não o preveja explicitamente, julgamos que também poderão ocorrer menos-valias
potenciais ou latentes quanto a reavaliação tem sinal negativo, o que se enquadra, no art.º 24.º, n.º 1 al. b).
62
42
No primeiro caso não há qualquer disposição do CIRC ou do DecretoRegulamentar n.º 2/90 que refira tal preceito fiscal, resultando de doutrina fiscal.
No segundo caso, além do art.º 11.º do diploma que aprovou o CIRC, também o
Decreto-Regulamentar n.º 2/90 (art.º 16.º) e os próprios diplomas que prevêem as
reavaliações, contemplam tal efeito fiscal66.
Dada a referida aproximação conceptual entre a DC16 e a NIC16, o
enquadramento fiscal supra não deverá sofrer alterações.
6. CONCLUSÕES
Em 13 de Junho de 2000, a Comissão efectuou uma Comunicação intitulada
“Estratégia da UE para o Futuro em Matéria de Relato Financeiro”, na sequência da
qual foi publicado o Regulamento (CE) n.º 1606/2002, do Parlamento Europeu e do
Conselho, de 19 de Julho de 2002, que prevê a aplicação das NIC, a partir de 1 de
Janeiro de 2005, às contas consolidadas das sociedades com títulos negociados
publicamente.
Na sequência desse Regulamento, a CNC apresentou um documento ao Governo
intitulado “Projecto de Linhas de Orientação para um Novo Modelo de Normalização
Contabilística”, que até à data não obteve resposta, propondo dois níveis de
normalização contabilística em função de dois factores: a dimensão das empresas e as
necessidades de relato financeiro.
Posteriormente, foi aprovado o Regulamento (CE) n.º 1725/2003, da Comissão, de
21 de Setembro de 2003, que fixa a adopção das NIC vigentes em 14 de Setembro de
2002, com excepção das NIC 32 e 39 e das interpretações conexas em virtude de se
encontrarem em revisão.
De forma a manter a coerência entre as directivas comunitárias e as NIC, a UE
publicou duas Directivas que foram transpostas para a ordem jurídica interna, como
indicamos:
65
O último diploma foi o Decreto-Lei n.º 31/98, de 11 de Fevereiro. O n.º 3 do art.º 29.º da Lei n.º 55B/2004, de 30 de Dezembro, que aprovou o OE/2005, prevê o seguinte:
“3 – Fica o Governo autorizado a determinar a possibilidade dos sujeitos passivos de IRC
procederem a reavaliações do activo imobilizado corpóreo, designadamente no âmbito do processo
de reforço dos capitais próprios para cumprimento do disposto no artigo 35.º do Código das
Sociedades Comerciais, de acordo com o coeficientes a fixar por portaria do Ministro das Finanças
e da Administração Pública, sendo o aumento das amortizações dedutíveis até 60%.”
66
É o caso do art.º 7.º do último diploma legal que permitiu a reavaliação legal de âmbito fiscal – o
Decreto-Lei n.º 31/98, de 11 de Fevereiro.
43
–
A Directiva n.º 2001/65/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de
Setembro, transposta para ordenamento jurídico interno através do Decreto-Lei
n.º 88/2004, de 20 de Abril, que procede à adopção do “sistema de
contabilização do justo valor”, com carácter facultativo, aos instrumentos
financeiros incluindo os derivados;
–
A Directiva n.º 2003/51/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de
Junho (também designada por “Directiva de Modernização Contabilística”),
transposta para a ordem jurídica interna através do Decreto-Lei n.º 35/2005, de
17 de Fevereiro, que consagra, nomeadamente, alterações ao direito societário
e ao POC, revendo o conceito de provisões e introduzindo um novo conceito
de “ajustamentos de valores do activo”, aos quais está associada uma
alteração, também, do princípio contabilístico “Da prudência”.
Neste trabalho, além de nos pronunciarmos sobre alguns dos aspectos mais
relevantes deste normativo contabilístico nacional e internacional, apelamos à
necessidade de se equacionarem as alterações ao Código do IRC, nomeadamente nos
articulados relativos às provisões e a alguns aspectos relacionados com a adopção do
“justo valor”.
Sabemos, porém, que está constituído um grupo de trabalho, nomeado pelo
anterior Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais67, que está a analisar o impacto das
NIC nas receitas fiscais, pelo que aguardamos os resultados.
Finalmente, esclarecemos que este trabalho visou essencialmente alertar para
alguns dos temas contabilístico-fiscais que estão “em cima da mesa”.
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DE
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Contabilidade, Fiscalidade, Auditoria: Breves Reflexões, Ed. do Autor, Braga.
67
Não temos conhecimento que o Grupo de Trabalho tenha sido nomeado através de despacho, pois não
verificamos a sua existência no Diário da República.
44
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46
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