Economia Brasileira Contemporânea

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Universidade do Sul de Santa Catarina
Economia Brasileira
Contemporânea
Disciplina na modalidade a distância
Palhoça
UnisulVirtual
2013
Créditos
Universidade do Sul de Santa Catarina – Unisul
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Campus Universitário UnisulVirtual
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Ciências Sociais, Direito,
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Articulador
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Direito
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Ciências Econômicas
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Gestão de Cooperativas
Pós-graduação
Aloísio José Rodrigues
Gestão de Segurança Pública
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Direitos Difusos e Coletivos
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Segurança
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Programa de Pós-Graduação em Gestão Pública
Thiago Coelho Soares
Programa de Pós-Graduação em Gestão Empresarial
Produção, Construção e
Agroindústria
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Articulador
Graduação
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Gestão da tecnologia da Informação
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Produção Multimídia
Diva Marília Flemming
Matemática
Ivete de Fátima Rossato
Gestão da Produção Industrial
Jairo Afonso Henkes
Gestão Ambiental
José Carlos da Silva Júnior
Ciências Aeronáuticas
José Gabriel da Silva
Agronegócios
Mauro Faccioni Filho
Sistemas para Internet
Pós-graduação
Luiz Otávio Botelho Lento
Gestão da Segurança da Informação.
Vera Rejane Niedersberg Schuhmacher
Programa em Gestão de Tecnologia da Informação
Luis Augusto Araújo
Economia Brasileira
Contemporânea
Livro didático
Design instrucional
Marina Melhado Gomes da Silva
Palhoça
UnisulVirtual
2013
Copyright © UnisulVirtual 2013
Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida por qualquer meio sem a prévia autorização desta instituição.
Edição – Livro Didático
Professor Conteudista
Luis Augusto Araujo
Design Instrucional
Marina Melhado Gomes da Silva
Projeto Gráfico e Capa
Equipe UnisulVirtual
Diagramação
Daiana Ferreira Cassanego
Revisão
Amaline Boulos Issa Mussi
330.981
A69
Araujo, Luis Augusto
Economia brasileira contemporânea : livro didático / Luis Augusto
Araujo ; design instrucional Marina Melhado Gomes da Silva. – Palhoça :
UnisulVirtual, 2013.
166 p. : il. ; 28 cm.
Inclui bibliografia.
1. Economia – Brasil. 2. Desenvolvimento econômico. 3. Brasil –
Condições econômicas. I. Silva, Marina Melhado Gomes da. II. Título.
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Universitária da Unisul
Sumário
Apresentação. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7
Palavras do professor. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .9
Plano de estudo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
UNIDADE 1 - Abertura comercial, privatização e
os planos de estabilização. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
UNIDADE 2 - Estabilização, desequilíbrios macroeconômicos e
as reformas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53
UNIDADE 3 - As mudanças recentes na economia brasileira: a euforia. . . . . 99
Para concluir o estudo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 153
Referências. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 155
Sobre o professor conteudista. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 159
Respostas e comentários das atividades de autoavaliação. . . . . . . . . . . . . . 161
Biblioteca Virtual. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 165
Apresentação
Este livro didático corresponde à disciplina Economia
Brasileira Contemporânea.
O material foi elaborado visando a uma aprendizagem
autônoma e aborda conteúdos especialmente selecionados e
relacionados à sua área de formação. Ao adotar uma linguagem
didática e dialógica, objetivamos facilitar seu estudo a
distância, proporcionando condições favoráveis às múltiplas
interações e a um aprendizado contextualizado e eficaz.
Lembre‑se que sua caminhada, nesta disciplina, será
acompanhada e monitorada constantemente pelo Sistema
Tutorial da UnisulVirtual, por isso a “distância” fica
caracterizada somente na modalidade de ensino que você
optou para sua formação, pois na relação de aprendizagem
professores e instituição estarão sempre conectados com você.
Então, sempre que sentir necessidade entre em contato; você tem
à disposição diversas ferramentas e canais de acesso tais como:
telefone, e‑mail e o Espaço Unisul Virtual de Aprendizagem,
que é o canal mais recomendado, pois tudo o que for enviado e
recebido fica registrado para seu maior controle e comodidade.
Nossa equipe técnica e pedagógica terá o maior prazer em lhe
atender, pois sua aprendizagem é o nosso principal objetivo.
Bom estudo e sucesso!
Equipe UnisulVirtual.
7
Palavras do professor
Bem‑vindo/a à disciplina Economia Brasileira Contemporânea.
Apresento uma análise diversificada da economia, numa
perspectiva histórica, o que lhe permitirá alcançar melhor
compreensão dos fatos mais marcantes do desenvolvimento
da economia brasileira contemporânea, do começo da década
de 1990 até os dias atuais.
O Brasil de hoje é um país diferente daquele de duas décadas
atrás. Conseguimos superar muitas crises: a superinflação, os
colapsos do Balanço de Pagamentos, o desemprego, a moratória
da dívida externa e, mais recentemente, a crise financeira de
2008/2009, esta que desencadeou a maior recessão mundial
desde o início da terceira década do século passado.
A inflação apresenta taxas civilizadas, deixando para trás
o pesadelo da inflação crônica, embora já tenha atingido
taxas superiores a três dígitos. Retomamos o crescimento
econômico – que havia entrado em colapso desde os anos 80 –,
e apresentamos avanços positivos nos indicadores de emprego, nos
indicadores de nossa lastimável distribuição da renda e de pobreza.
Este livro encontra‑se dividido em três unidades, as quais
procuram explicar o funcionamento da economia brasileira
com base em uma linha do tempo. A compreensão desse
processo dá‑se por meio da explanação de temas que são objeto
de debate e estão na agenda política do país.
A promoção do “diálogo” entre os futuros profissionais da área
da economia com a economia brasileira contemporânea é o
objetivo deste livro. Tenho uma ambiciosa expectativa de que
isso produzirá frutos, os quais, bem cultivados, poderão mudar
a sua história de vida pessoal, profissional e de nosso país.
Um ótimo estudo!
Professor Luis Augusto Araújo
Plano de estudo
O plano de estudos visa a orientá‑lo no desenvolvimento da
disciplina. Ele possui elementos que o ajudarão a conhecer o
contexto da disciplina e a organizar o seu tempo de estudos.
O processo de ensino e aprendizagem na UnisulVirtual leva
em conta instrumentos que se articulam e se complementam,
portanto, a construção de competências se dá sobre a
articulação de metodologias e por meio das diversas formas de
ação/mediação.
São elementos desse processo:
„„
o livro didático;
„„
o Espaço UnisulVirtual de Aprendizagem (EVA);
„„
„„
as atividades de avaliação (a distância, presenciais e
de autoavaliação);
o Sistema Tutorial.
Ementa
As Políticas de estabilidade monetária, privatização e abertura
no início da década de 90: o Plano Collor. A experiência do
Real: a estabilidade monetária no contexto da privatização e da
abertura da economia brasileira, no primeiro Governo FHC.
Desequilíbrio externo e ausência de crescimento: a política
macroeconômica no segundo governo FHC. Políticas Sociais e
continuidade das políticas macroeconômicas no governo Lula.
A economia brasileira no início do século 21: estabilidade
monetária, crescimento econômico e inserção internacional.
Universidade do Sul de Santa Catarina
Objetivos da disciplina
Geral
Aprender as características fundamentais da evolução
contemporânea da economia brasileira, compreendendo o
período dos governos Collor a Dilma, de sua situação atual e
das perspectivas da economia para o futuro.
Específicos
„„
„„
„„
Conhecer as principais medidas, ações e políticas nos
campos econômico e social.
Avaliar os grandes temas contemporâneos, como a
conquista da estabilidade, o desafio do crescimento
sustentado e do desenvolvimento, a restrição externa,
o problema da pobreza e a nossa péssima distribuição
de renda.
Reconhecer a complexidade das relações internas e
externas do Brasil.
Carga horária
A carga horária total da disciplina é 60 horas‑aula.
Conteúdo programático/objetivos
Veja, a seguir, as unidades que compõem o livro didático desta
disciplina e os seus respectivos objetivos. Estes se referem aos
resultados que você deverá alcançar ao final de uma etapa de
estudo. Os objetivos de cada unidade definem o conjunto de
conhecimentos que você deverá possuir para o desenvolvimento
de habilidades e competências necessárias à sua formação.
Unidades de estudo: 03
12
Economia Brasileira Contemporânea
Unidade 1 – Abertura comercial, privatização e os planos de estabilização
Nesta unidade, você aprenderá que a primeira metade dos anos 90
é marcada pela continuidade da “saga dos planos heterodoxos” na
condução de políticas econômicas voltadas ao combate da inflação.
Estes planos buscavam uma queda abrupta da inflação e traziam
como principal elemento o congelamento de preços. Entenderá,
ainda, a abertura comercial, a forma de sua implementação no
Brasil, e como se iniciou o processo de privatização. Por último,
você analisará os principais indicadores macroeconômicos da
economia brasileira no período 1990‑94, que apresentou grandes
oscilações nas taxas de inflação e uma recessão no início da década.
Unidade 2 – Estabilização, desequilíbrios macroeconômicos e as reformas
Você conhecerá as circunstâncias e a implementação do plano
de estabilização de maior êxito na história do Brasil, além de
compreender alguns desequilíbrios na economia brasileira,
que surgiram por conta da condução do plano. Estudará os esforços
em favor da estabilização empregados no primeiro governo de
Fernando Henrique. E, finalmente, irá conhecer as mudanças
de política macroeconômica e as principais mudanças estruturais
implementadas a partir do seu segundo governo, que fizeram com
que nosso país ficasse com uma economia muito mais moderna e
competitiva do que em 1990.
Unidade 3 – As mudanças recentes na economia brasileira: a euforia
Nesta unidade você compreenderá o contexto econômico e político
no início do governo Lula, as desconfianças em relação ao novo
governo e as medidas econômicas de transição. Aprenderá que
as metas de inflação foram cumpridas dentro do intervalo de
tolerância, com uma tendência contínua de queda. Estudará como
se desenvolveu a política fiscal e o desempenho das contas públicas,
com destaque para o pagamento de juros do setor público, o déficit
nominal, o resultado primário, o comportamento da dívida pública
e da carga tributária. Analisará a trajetória da taxa de câmbio e
o desempenho externo de nossa economia, com destaque para as
contas do Balanço de Pagamento. Por fim, você aprenderá como se
deu a retomada do crescimento econômico e discutirá os avanços nos
indicadores do emprego, da distribuição da renda e da pobreza.
13
Universidade do Sul de Santa Catarina
Agenda de atividades/Cronograma
„„
„„
„„
Verifique com atenção o EVA, organize‑se para acessar
periodicamente a sala da disciplina. O sucesso nos seus
estudos depende da priorização do tempo para a leitura,
da realização de análises e sínteses do conteúdo e da
interação com os seus colegas e professor.
Não perca os prazos das atividades. Registre no espaço
a seguir as datas com base no cronograma da disciplina
disponibilizado no EVA.
Use o quadro para agendar e programar as atividades
relativas ao desenvolvimento da disciplina.
Atividades obrigatórias
Demais atividades (registro pessoal)
14
UNIDADE 1
Abertura comercial, privatização
e os planos de estabilização
Objetivos de aprendizagem
„„
Entender a abertura comercial e a forma de sua
implementação no Brasil.
„„
Conhecer os planos de estabilização do governo Collor.
„„
Compreender como se iniciou o processo de privatização.
„„
Analisar os principais indicadores macroeconômicos da
economia brasileira no período 1990‑94.
Seções de estudo
Seção 1 Modelo de desenvolvimento no início dos anos 90
Seção 2 Abertura comercial nos países em desenvolvimento
e no Brasil
Seção 3 O governo Collor: Planos Collor 1 e 2
Seção 4 Privatizações
Seção 5 A economia brasileira entre 1990 e 1994
1
Universidade do Sul de Santa Catarina
Para início de estudo
A economia brasileira sofreu uma profunda reestruturação
produtiva, influenciada pelas medidas liberalizantes propostas
por organizações com vínculos com Washington, como o FMI
e o Banco Mundial. Este assunto será abordado nesta unidade e
será útil para você entender especialmente os assuntos abertura
comercial e privatização.
A primeira metade dos anos 90 é marcada pela continuidade
da “saga dos planos heterodoxos” na condução de políticas
econômicas voltadas ao combate da inflação. Estes planos
buscavam uma queda abrupta da inflação e traziam como
principal elemento o congelamento de preços.
Você conhecerá os planos de estabilização do governo Collor:
Plano Collor I e Plano Collor II. Além disso, entenderá por que
o insucesso de cada um dos planos econômicos fez com que os
agentes econômicos se precavessem de novos congelamentos.
Por último, você analisará os principais indicadores
macroeconômicos da economia brasileira no período 1990‑94,
que apresentou grandes oscilações nas taxas de inflação e uma
recessão no início da década.
Do ponto de vista político, é importante registrar um fato
importante. Pela primeira vez desde o ano de 1961, os brasileiros
empossam o primeiro presidente eleito pelo voto direto,
o presidente Fernando Collor de Mello, que, após dois anos e
meio de mandato, sofrerá um impeachment.
16
Economia Brasileira Contemporânea
Seção 1 – Modelo de desenvolvimento no início dos
anos 90
Você está lembrado dos números da primeira “década perdida”,
a década de 80?
Vamos relembrar dois deles: a taxa média de crescimento do
PIB na década de oitenta foi 2,9% por ano, em decorrência das
medidas adotadas para pagar os serviços da dívida externa e
interna; e, no último ano desta década, o PIB per capita era 2%
maior do que no início deste período, em termos reais.
A segunda metade da década de oitenta corresponde ao período
do governo José Sarney que, de acordo com Gremaud (2011,
p. 435), foi marcado por um grande descontrole das contas
públicas, o crescimento do endividamento interno e a necessidade
de sua rolagem. Em suma, a política fiscal e a monetária estavam
reféns da rolagem da dívida interna.
A política monetária estava refém, porque, nestas
condições, por exemplo, as taxas de juros precisavam
manter‑se elevadas. Não havia muita possibilidade
de flexibilização.
É neste contexto que você irá conhecer a mudança do modelo
de desenvolvimento pela qual passou a economia brasileira no
início dos anos 90. Essa mudança é influenciada pelo surgimento,
no cenário internacional, do chamado Consenso de Washington
e o Plano Brady, que se discute a seguir.
1.1 Consenso de Washington
Em 1989, acontece uma reunião no Institute for Internacional
Economics, em Washington, entre membros do Fundo
Monetário Internacional (FMI), Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID), Banco Mundial, governo americano
e representantes latino‑americanos, especialmente economistas.
Unidade 1
17
Universidade do Sul de Santa Catarina
Segundo Guedes (2007, p. 174), o objetivo era analisar o
panorama mundial e as crises econômicas da América Latina.
Expressão cunhada pelo economista
norte‑americano John Williamson,
que lecionou na PUC/RJ. Trata‑se
de um decálogo de medidas
liberalizantes e de ajustes sugerido
para reformas nos países em
desenvolvimento, concebido
no âmbito de organizações
sediadas ou vinculadas a (sic)
Washington, como o FMI e o Banco
Mundial. (REGO, 2006, p. 202).
Como conclusões deste encontro, John Willianson relacionou uma
série de medidas que os países devem adotar na área econômica
para crescer de forma sustentável, medidas conhecidas como
Consenso de Washington. A palavra “Consenso” é utilizada, aqui
por se acreditar que o conjunto das medidas propostas estivesse de
acordo com o pensamento dos economistas ali presentes.
As propostas buscavam assegurar disciplina fiscal, liberalização
comercial e forte redução do papel do Estado na Economia. Segundo
Baumann (2000, p. 13), elas abordavam as seguintes questões:
Disciplina fiscal, redirecionamento das prioridades
de gastos públicos para as áreas de saúde, educação e
infraestrutura, reforma fiscal (ampliando a base fiscal
e reduzindo impostos marginais), estabelecimento de
taxas de câmbio competitivas, garantia dos direitos de
propriedade, desregulamentação, liberalização comercial,
privatização, eliminação de barreiras ao investimento
estrangeiro e liberalização financeira.
Souza (2008, p. 201) resume em quatro pontos o que ficou
conhecido pelo documento Consenso de Washington:
1. A abertura econômica representada pelo fim das
barreiras protecionistas entre as nações;
2. A desestatização representada pela privatização das
empresas estatais;
3. A desregulamentação representada pelo fim das regras
que limitam o movimento de capitais entre os países e ao
interior de cada país, particularmente o especulativo;
4. A flexibilização das relações de trabalho, sobretudo
nos países da América Latina.
18
Economia Brasileira Contemporânea
1.2 Plano Brady
Antes de abordar questões relacionadas à inserção internacional
do Brasil, você estudará o Plano Brady, que muitos consideram
uma das medidas fundamentais para o sucesso da estabilidade de
nossa moeda, ocorrida na segunda metade dos anos 90.
O secretário do tesouro dos Estados Unidos, Nicholas F. Brady,
anunciou, em março de 1989, um plano que pretendia renovar
a dívida externa de países em desenvolvimento. A renovação da
dívida ocorreu pela troca de bônus novos que ficaram conhecidos
como bradies.
Segundo Giambiagi (2011, p. 136), o Plano Brady reestrutura
a dívida soberana de 32 países. Troca‑se a dívida pela emissão
de um bônus emitido pelo país devedor que contempla um
abatimento do encargo da dívida, em decorrência da redução de
seu principal ou por alívio na carga de juros.
Na América Latina, vários países aderiram ao plano,
o que alterou significativamente as condições de
liquidez desses países. O México concluiu o acordo em
1989, a Argentina em 1992 e o Brasil em 1994, apesar de
iniciar a negociação em 1992.
Os principais títulos da dívida externa brasileira estão listados na
Tabela 1.1:
Tabela 1.1 – Títulos da divida externa: Bradies Bonds
Título
Prazo (ano)
Carência (ano)
Juros
C‑Bond
20
10
4% até o sexto ano e 8%
depois do sétimo ano
Par Bonds
30
30
4%, subindo até 6% que
vigora depois do sexto ano
Discount Bonds
30
30
Libor* mais 0,8125%
Fonte: Gremaud (2011, p. 542).
*Libor é a sigla para London Interbank Offered Rate. Segundo o Banco Central do Brasil, trata‑se
da taxa preferencial de juros oferecida para grandes empréstimos entre os bancos internacionais.
Disponível em: <http://www.bcb.gov.br/htms/infecon/dividarevisada/apends_gloss_bibliografia.
pdf>. Acesso em: 15 nov. 2012.
Unidade 1
19
Universidade do Sul de Santa Catarina
Os principais títulos emitidos pelo Brasil neste acordo foram
os Par Bonds e os Discount Bonds. Em abril de 2006, o governo
brasileiro faz o resgate antecipado dos títulos bradies e elimina
da dívida externa brasileira todos os títulos relacionados com o
plano Brady.
Especialmente para o caso brasileiro, o Plano Brady tem
um papel importante para consolidar a estabilidade no
primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso, ao
permitir a renegociação da dívida.
Você também deve lembrar que o financiamento internacional
naquele momento estava condicionado à realização de reformas e
de um profundo ajuste fiscal. Trataremos desses condicionantes
nas próximas seções.
Seção 2 – Abertura comercial nos países em
desenvolvimento e no Brasil
A globalização da economia corresponde ao aumento da
interdependência entre as pessoas, as empresas e as nações.
Mariano (2012, p. 71) define globalização da economia como
“um processo de intensificação das trocas comerciais, capitais e
serviços realizados entre os países”.
Aqui no Brasil, este processo é intensificado a partir dos anos 90.
Você já parou para pensar sobre a importância da abertura
comercial como uma das dimensões da globalização da economia?
Lembre que, além da comercial, existem a dimensão produtiva e a
dimensão financeira da globalização da economia.
Pois bem, a partir de agora, você conhecerá questões a respeito da
abertura comercial e sua forma de implementação nos países em
desenvolvimento e no Brasil.
20
Economia Brasileira Contemporânea
2.1 As vantagens do comércio internacional
Vou iniciar com outra pergunta:
Será que as vantagens da liberação do
comércio externo vão além da tradicional teoria
das vantagens comparativas?
A resposta é positiva. As novas teorias do comércio internacional
apresentam novas visões acerca das vantagens dessa prática.
Gremaud (2011) aponta pelo menos outras três visões que
fundamentam a defesa da abertura comercial:
„„
„„
„„
A diversidade de opções de consumo. Admita que o
consumidor valorize ter uma diversidade de opções de
consumo. Nessas condições, a liberalização traz ganhos
de bem‑estar para a coletividade ao oportunizar um
leque maior de produtos e serviços.
Os ganhos de eficiência e de escala. A liberalização do
comércio força as empresas a adotar estruturas de custos
mais adequadas e buscar melhorias na produtividade.
Por outro lado, os ganhos de escala resultam do “ajuste
tecnológico das empresas em direção a volumes de
produção com custos unitários inferiores”. Os ganhos,
aqui, advêm do processo de concorrência quando da
liberação do comércio externo.
As vantagens no processo de estabilização. Aqui a
abertura comercial sustenta os efeitos benéficos que ela
traz em um processo de estabilização, tal como você
poderá verificar que ocorreu durante a adoção dos planos
de estabilização (especialmente a partir do Plano Real).
Os argumentos em defesa da abertura comercial e os argumentos em
defesa de medidas protecionistas são relacionados no Quadro 1.1.
Unidade 1
21
Universidade do Sul de Santa Catarina
Quadro 1.1 – Argumentos favoráveis à abertura comercial e a medidas protecionistas
Argumentos em defesa da
abertura comercial
Argumentos em defesa de
medidas protecionistas
Teoria das vantagens comparativas
A crítica estruturalista
Ganhos de escala
A indústria nascente
Ganhos de eficiência
Falhas de mercado
Ampliação das possibilidades de consumo
A vulnerabilidade externa e os problemas
de Balanço de Pagamentos
Vantagens no processo de estabilização
Combate ao desemprego no curto prazo
Fonte: Gremaud (2011, p. 555).
Ainda segundo Gremaud (2011, p. 555), o argumento protecionista
é baseado no fato de os mercados não se aproximarem da estrutura
de concorrência perfeita. Este é o argumento que se relaciona à
crítica estruturalista.
Admita que, com uma economia aberta, seja possível
melhorar a situação do país com a proteção a alguns
setores. Este é o argumento para a defesa da indústria
nascente, que foi utilizado na economia brasileira ao
longo do processo de industrialização.
Outro argumento tão controverso quanto importante está
relacionado à ocorrência de rendimentos crescentes de escala.
Esta condição favorece as situações de monopólio, “falhas de
mercado” que podem resultar em duas situações:
1.A perda dos benefícios obtidos por conta dos ganhos
de escala, que se constituem em um dos argumentos
favoráveis à abertura comercial;
2.A existência de custos elevados de aprendizado na
produção de novos produtos configura vantagens às
empresas que primeiro se estabeleceram no mercado.
Esta situação representa barreiras à entrada de novas
empresas e pode não conferir benefícios para os países
consumidores do produto.
22
Economia Brasileira Contemporânea
Nas próximas linhas, você poderá acompanhar a discussão sobre
como se deu a abertura comercial nos países em desenvolvimento
e no Brasil.
2.2 Abertura comercial nos países em desenvolvimento e
no Brasil
Até o início da década de 90, o Brasil era uma das economias
mais fechadas do mundo. O país utilizava o argumento de
proteção da economia nacional, impondo muitas restrições à
compra de produtos importados.
Você saberia argumentar alguns motivos que
justifiquem termos sido, até o início dos anos 90,
uma das economias mais fechadas do mundo?
Como você estudou em outras disciplinas, durante muito tempo
as exportações brasileiras eram formadas principalmente por
produtos agrícolas, dado o seu histórico caráter agroexportador.
A adoção do modelo de desenvolvimento baseado
no Processo de Substituição das Importações (PSI),
segundo Gremaud (2011, p. 556), visava atender
fundamentalmente a demanda doméstica (interna) de
produtos que antes eram importados. Outros países
em desenvolvimento, entretanto, tinham um processo
de industrialização que visava atender o mercado
externo, o que explica a condição de baixo grau de
abertura comercial da economia brasileira.
Você deve lembrar que, para realizar o PSI, era necessário
importar, especialmente máquinas e equipamentos, com objetivo
de ampliar a capacidade produtiva. Em decorrência disto,
mesmo praticando um PSI voltado para atender a demanda
doméstica, havia uma importante participação do mercado
internacional em nossa economia. Além de atender à demanda
doméstica, as políticas comerciais protecionistas tinham também
Unidade 1
23
Universidade do Sul de Santa Catarina
o objetivo de conter os desequilíbrios relacionados ao Balanço de
Pagamentos (especialmente graves nos anos 80).
Segundo Rego (2006, p. 204), as discussões a respeito da
abertura comercial dos países em desenvolvimento vão além
dos argumentos favoráveis e desfavoráveis. Devem contemplar
também questões sobre a maneira de como implementar a
abertura econômica.
Você pode estar se perguntando: qual o ritmo
do processo de abertura? Qual o contexto
macroeconômico propício? O que deve ser liberalizado
primeiro, o mercado de bens ou o mercado de capitais?
De acordo com Rego (2011, p. 204), existe um razoável consenso
de qual seja a resposta para as duas primeiras questões, porém a
última questão tem uma resposta mais polêmica. Um indicativo
de resposta às indagações anteriores é apresentado a seguir:
„„
„„
„„
o ritmo do processo de abertura não deve ser muito lento,
tornando‑se vulnerável às pressões políticas, e tampouco
um processo muito rápido, para não agravar o impacto
do ajuste;
o processo de liberalização deve ocorrer em um contexto
de economia estável, possibilitando uma melhor alocação
dos recursos;
muitos analistas sustentam a tese de que, em primeiro
lugar, deve ser liberalizado o mercado de bens, para,
num segundo momento, liberalizar o mercado de capitais.
Sobre a abertura comercial de países da América Latina, é
preciso destacar que:
Na década de 1970, vários países da América Latina
promoveram a liberalização da economia: o Chile em
1973, a Argentina em 1976, o México em 1977 e a
Venezuela em 1979. As crises da dívida externa, em
1982, acabaram por abortar todas essas experiências
liberalizantes, com exceção da Chilena.
24
Economia Brasileira Contemporânea
A partir da segunda metade dos anos 80, ocorreu
uma generalizada abertura comercial nos países
latino‑americanos. Em 1988, o Brasil iniciava a sua
reforma comercial com a eliminação dos controles
quantitativos e administrativos sobre suas importações e
uma proposta de redução tarifária. (REGO, 2006, p. 206).
A evolução da liberalização comercial do Brasil no período
1988 – 1995, tendo por base as tarifas de importação,
é apresentada na Tabela 1.2.
Tabela 1.2 – Evolução da liberalização comercial do Brasil no período 1988 – 1995, tendo
por base as tarifas de importação (%)
Anos
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
Tarifa média
51,3
37,4
32,3
25,3
21,2
13,2
11,2
13,9
‑
‑
19,2
17,4
14,2
6,7
5,9
9,5
Desvio‑padrão
Fonte: Moreira e Correia (1997 apud GREMAUD, 2011, p. 557).
Você deve observar, na Tabela 1.2, que a abertura comercial
no Brasil teve início ainda no governo José Sarney, em 1988.
Durante esse período, acabaram as formas mais importantes de
controle de quantitativo de importação, e aplicou‑se um controle
tarifário com alíquotas reduzidas gradualmente. O anúncio das
reduções graduais, feitas com antecedência pelo governo, tinha
por objetivo preparar os produtores nacionais para uma economia
mais aberta.
No ano de 1995, resultado da pressão de grupos que tiveram
problemas com a abertura (por exemplo, a indústria automobilística),
de sérios distúrbios externos (crise mexicana e asiática) e com o
Balanço de Pagamentos, o ritmo da abertura comercial brasileira
diminui (ocorreu a elevação da tarifa para 13,9%).
O valor das importações do Brasil, que havia aumentado 13%
no primeiro ano do governo Collor, estacionou até o final de
seu mandato.
Como a forte queda das tarifas não provocou um forte
aumento das importações?
Unidade 1
25
Universidade do Sul de Santa Catarina
Souza (2008) sinaliza a resposta, apontando para duas razões básicas:
„„
„„
a contração da economia acabou por limitar a demanda
por produtos importados. Você deve lembrar que, no
início dos anos 90, o Brasil experimentou um período de
recessão econômica;
a maxidesvalorização realizada no início do Plano Collor
tornou o produto importado mais caro.
Giambiagi (2011, p. 137) compara a experiência brasileira de
abertura comercial com a de outros países latino‑americanos e
com algumas experiências asiáticas. Conclui, assim, que
o ritmo e a extensão das reformas introduzidas no
período Collor/Itamar podem ser consideradas
razoavelmente moderados, compreendendo as
dificuldades que a indústria nacional teria após anos de
baixo nível de investimento e turbulência econômica.
As críticas relacionadas à forma como foi implementada a
abertura comercial dizem respeito à velocidade do processo.
Muitos a julgaram rápida, com forte redução das tarifas e sem o
devido tempo para que os agentes econômicos pudessem realizar
os ajustes necessários.
Outra crítica importante se deve à valorização cambial ocorrida,
que intensificou as consequências esperadas da abertura
comercial, os problemas relacionados à questão social e os
problemas do ponto de vista da indústria.
Gremaud (2011, p. 558) comenta que, neste período, o Brasil
experimentou um expressivo fluxo de entrada de capitais em
decorrência dos seguintes pontos, que contribuíram para atrair
para o país os chamados capitais privados:
„„
„„
„„
26
as modificações no sistema financeiro internacional;
a abertura financeira que também se processou na
economia brasileira; e
a política econômica interna, com suas elevadas taxas
de juros.
Economia Brasileira Contemporânea
Agora você tem condições de argumentar por que a abertura
financeira ocasionou uma valorização da taxa de câmbio.
Isto ocorre num momento em que os agentes econômicos sentiam
os efeitos da redução tarifária, entre 1992 e 1995.
A abertura comercial no Brasil e a valorização da
taxa de câmbio tornam explícita e agravam a falta
de competitividade da indústria nacional. Ocorre
o fechamento de várias empresas e a retração do
emprego em vários setores.
Seção 3 – O governo Collor: Planos Collor I e II
Você estudou, anteriormente, que a primeira metade dos anos 90
é marcada pela continuidade da “saga dos planos heterodoxos” na
condução de políticas econômicas voltadas ao combate da inflação.
Você tem clara a diferença existente entre o
pensamento ortodoxo e o pensamento heterodoxo?
Gremaud (2011, p. 432) apresenta a distinção entre esses pensamentos:
Ortodoxia – de acordo com o pensamento ortodoxo,
a inflação é decorrente do processo de emissão monetária
devido aos déficits públicos, o que eleva a demanda e força
a alta de preços. Assim, para combater a inflação, deve‑se
estancar a emissão de moeda, o que só pode ser conseguido
com a retração da demanda, quer do setor privado, pela
elevação de impostos, quer do setor público, pela queda
nos gastos públicos. Assim, o combate inflacionário é
conseguido mediante uma política recessiva.
Heterodoxia – para estes, a inflação não decorre de
excesso de demanda provocado pela emissão monetária.
A emissão monetária é vista muito mais como uma
Unidade 1
27
Universidade do Sul de Santa Catarina
decorrência da inflação do que como causa. Assim,
a inflação poderia ser combatida sem o apelo ao controle
da demanda, isto é, não haveria necessidade de uma
política recessiva. O congelamento de preços e salários
é um tipo de medida (política de rendas) característico
dessa corrente.
Nesta seção, você irá conhecer os planos de estabilização do
governo Collor, marcadamente heterodoxos, e os resultados
obtidos com sua aplicação.
3.1 Alguns antecedentes
Segundo Bresser Pereira (1991, p. 92), a inflação tendia
para uma aceleração permanente e era interrompida por
congelamento de preços. O colapso do Plano Cruzado, em 1986,
e, particularmente, do Plano Verão, em 1989, acelera mais
ainda este processo, dado que estes planos contribuíram para
desorganizar a economia.
A Figura 1.1 ilustra as condições inflacionárias dos anos 80 e o
momento do estabelecimento dos planos de combate à inflação.
A partir de 1986, em, praticamente, todos os anos, o governo
brasileiro lança um novo plano.
Figura 1.1 – Taxa de inflação mensal no período 1980 a 1989, medida pelo IGP‑di da
Fundação Getulio Vargas
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
28
Economia Brasileira Contemporânea
Você deve lembrar que a indexação convencional é baseada
na inflação passada que deixou de ser um bom substituto para
a inflação corrente. O sistema de preços perde sua principal
âncora e o nível geral de preços de nossa economia se acelera
como uma espiral.
No início dos anos 90, a economia brasileira pela primeira vez
apresenta uma situação de hiperinflação. Vale a pena lembrar
alguns números: a inflação chega a 56% em janeiro, 73% em
fevereiro e 84% em março de 1990.
3.2 As medidas do Plano Collor I
O presidente Fernando Collor de Mello assume a presidência
no dia 15 de março de 1990 e, nesse mesmo dia, lança o Plano
Collor. A adoção imediata do plano visava romper com a
indexação da economia.
As principais medidas adotadas foram:
„„
Reforma monetária
Adoção de redução drástica da liquidez da economia
através do bloqueio da metade dos depósitos à vista,
80% das aplicações do overnight e fundos de curto
prazo, e, aproximadamente, um terço dos depósitos de
poupança. A medida objetivou evitar as pressões de
consumo e retomar a capacidade do Banco Central de
fazer política monetária ativa.
“A hiperinflação é uma
situação de inflação tão
alta que a perda do poder
aquisitivo da moeda
faz com que as pessoas
abandonem aquela
moeda.” (GREMAUD, 2011,
p. 96). Não existe uma taxa
certa para que se possa
afirmar sobre a ocorrência
de hiperinflação. Muitos
autores consideram
que taxas de inflação
superiores a 50%, como
aquelas ocorridas no
início do ano de 1990,
já caracterizam um
quadro de hiperinflação.
Segundo Giambiagi (2011, p. 138), as aplicações acima
do limite de NCr$ 50.000,00, em torno de US$1.200,00
ao câmbio da época, sofreram um bloqueio por um prazo
de um ano e meio. A devolução dos cruzados novos
bloqueados aconteceria a partir de setembro de 1991,
em doze prestações iguais e sucessivas, recebendo a
correção monetária mais os juros de 6% ao ano.
Unidade 1
29
Universidade do Sul de Santa Catarina
„„
Reforma administrativa e fiscal
A reforma administrativa previa o programa de
privatizações e a melhoria dos instrumentos de
fiscalização e de arrecadação para diminuir as fraudes
e a sonegação. Além disso, o governo adotou um maior
controle sobre os bancos estaduais e medidas para
aumentar a eficiência da administração do setor público e
redução dos gastos.
Giambiagi (2011, p. 139) cita que o número de ministérios
foi reduzido de 23 para 12, uma série de autarquias e
fundações foram extintas e um regime de câmbio flutuante
foi implementado. O Ministério da Economia agregou as
pastas da fazenda e do planejamento sob o comando da
ministra Zélia Cardoso de Mello.
Fizeram parte desta reforma medidas de redução do custo
de rolagem da dívida pública, suspensão dos subsídios,
incentivos fiscais e isenções, ampliação da base tributária
pela incorporação dos ganhos da agricultura, do setor
exportador e dos ganhos de capital nas bolsas, tributação
das grandes fortunas, IOF extraordinário sobre o estoque
de ativos financeiros e fim do anonimato fiscal, mediante a
proibição dos cheques e das ações ao portador.
De acordo com Souza (2008, p. 207), citando os estudos
do Instituto de Economia do Setor Público da Fundação
do Desenvolvimento Administrativo (Iesp‑Fundap), a
redução dos gastos públicos afetou principalmente os
gastos sociais. Os gastos com a educação foram reduzidos
pela metade e os gastos com a saúde caíram 44%, quando
comparados aos valores aplicados em 1989.
„„
Congelamento de preços e desindexação dos salários
em relação à inflação passada
O Plano Collor I reintroduziu o cruzeiro como padrão
monetário. O congelamento de preços de bens e serviços
aconteceu em meados do mês de março, sendo que
os trabalhadores não receberam a variação ocorrida
nos primeiros dias daquele mês. Uma nova regra de
prefixação de preços e salários entraria em vigor a partir
de 1º de maio de 1990.
30
Economia Brasileira Contemporânea
„„
Mudança do regime cambial para taxas flutuantes,
definidas livremente pelo mercado.
A taxa de câmbio sofreu forte valorização com a
aceleração inflacionária no segundo semestre de 1990.
Este fato, combinado com os menores incentivos para
exportação e a maior facilidade para importação, (além
da Guerra do Golfo que elevou significativamente
o preço do barril do petróleo), deteriorou o saldo
da Balança Comercial. O Banco Central, então,
interveio no mercado cambial e promoveu uma grande
desvalorização do cruzeiro, medida que alimentou ainda
mais o processo inflacionário.
„„
Promoção da abertura comercial
A política comercial mudou, dando início ao processo
de liberalização do comércio exterior. Você estudou este
assunto, especialmente, na seção dois desta unidade.
O Plano Collor I recebeu muitas críticas, entre elas:
„„
„„
„„
„„
„„
„„
O bloqueio dos recursos foi considerado uma
inadmissível intervenção estatal.
O limite imposto era baixo e prejudicava
pequenos poupadores.
A remuneração oferecida foi inferior ao rendimento
de outras aplicações.
A prática do congelamento de preços e salários já estava
desgastada perante a sociedade brasileira.
O ajuste fiscal foi baseado em aumento de receitas e não
em cortes de gastos.
O Plano Collor I confundiu os conceitos de “fluxo”
e “estoque”.
Mas por que a inflação voltou após os Planos Collor?
Unidade 1
31
Universidade do Sul de Santa Catarina
Segundo Bresser Pereira (1991), existem três explicações para a
volta da inflação:
„„
„„
„„
a monetarista: O pensamento monetarista tem por
base o aumento de oferta monetária, que, nos três meses
seguintes ao plano, sofreu um aumento de quatro vezes.
O aumento da base monetária basta para a volta da
inflação, não necessitando haver um excesso de demanda.
“O aumento de liquidez gerou expectativas que a inflação
voltaria – e a ‘expectativa racional’ é uma profecia que se
auto‑realiza.”
a keynesiana: De acordo com o pensamento keynesiano,
a inflação voltou, porque o aumento da oferta de moeda
teria causado um excesso de demanda. O choque de
liquidez “contém” a inflação temporariamente. A liquidez
se restabelece, a demanda se recupera e, por conta disto,
volta a inflação; e
a neoestruturalista (inercialista): A explicação não
reside nos erros relacionados à oferta de moeda, mas
sim na natureza da inflação no Brasil. A inflação aqui
era inercial e, como dito anteriormente, em níveis de
hiperinflação quando do lançamento do Plano Collor I.
Os agentes econômicos, acostumados à inflação,
acreditaram que aumentar os preços seria a melhor
maneira de se proteger.
Observe que:
Em 16 de março, no momento do congelamento
de preços e salários, as empresas que tinham
acabado de aumentar seus preços “ganharam com
o congelamento”. Já aquelas empresas que estavam
por aumentar os preços perderam com essa medida,
prejudicadas pelo bloqueio de seus ativos financeiros.
Aqui estão dois bons motivos para que as empresas,
na primeira oportunidade, façam a remarcação de seus
preços para cima.
32
Economia Brasileira Contemporânea
Bresser Pereira (1991, p. 112), ao estudar a hiperinflação e os
planos de estabilização, conclui sobre o Plano Collor I:
O Plano Collor não foi capaz de controlar a inflação.
O governo Collor falhou em sua primeira prova.
Mas ela não será a última. A época da inflação crônica
está acabando no Brasil. Depois da breve experiência
brasileira com hiperinflação, parece claro que o controle
da inflação terá prioridade no governo Collor. O Plano
Collor I contou demais com a drástica redução da oferta
monetária. Por outro lado, alguns erros relacionados à
oferta de moeda e aos salários, um ajustamento fiscal
incompleto, uma visão errônea acerca da taxa de câmbio,
as dificuldades naturais em sair de um congelamento
em condições de preços relativos desequilibrados,
a demora em enfrentar a dívida externa e em liberalizar
o comércio e, finalmente, a falta de um verdadeiro
acordo social e político trabalharam contra o plano.
Mais uma vez, o pior inimigo dos planos de estabilização
no Brasil – a inflação inercial – não foi vencido.
A aceleração inflacionária no início de 1991 e a dificuldade
crescente de financiamento do governo levaram a um novo plano
de estabilização: o Plano Collor II.
3.3 As medidas do Plano Collor II
Em 1º de fevereiro de 1991, é lançado o Plano Collor II com
objetivo de conter as taxas de inflação, que já estavam ao redor
de 20%.
As duas principais medidas tomadas sob o comando da Ministra
Zélia Cardoso de Mello foram:
„„
Reforma financeira: A proposição do plano é dar fim
a toda e qualquer forma de indexação da economia.
São extintos os fundos de investimento de curto prazo,
inclusive aqueles cobertos por operações de overnight,
e outras formas de indexação como o BTN (Bônus do
Tesouro Nacional), que era utilizado como referência
para a indexação dos impostos.
Unidade 1
33
Universidade do Sul de Santa Catarina
Giambiagi (2011, p. 141) comenta que foi criado o
Fundo de Aplicações Financeiras (FAF), que teria como
rendimento a Taxa Referencial (TR). A TR, ao invés de
considerar a inflação passada, introduzia um elemento
forward looking para a indexação no Brasil, e embutia
“expectativas de inflação futura”.
„„
Congelamento de preços e salários. Segundo Souza
(2008, p. 209), “os preços foram congelados somente
pró‑forma, pois adotaram‑se cláusulas que significavam,
na prática, manter os preços livres.” Os salários foram
convertidos pela média real dos últimos doze meses,
o que, em momento de acelerada inflação, acaba se
traduzindo em “arrocho salarial”.
Simultaneamente às medidas anteriores, o governo tentou uma
maior austeridade fiscal, através da racionalização dos gastos nas
administrações públicas e do corte das despesas. (GREMAUD,
2011, p. 442).
Apesar da queda da inflação observada entre fevereiro a
maio de 1991, escândalos e a resistência política à equipe
econômica levam a deixar o cargo a Ministra Zélia e assume o
ex‑embaixador brasileiro em Washington, Marcílio Marques
Moreira, como Ministro da Fazenda.
O novo ministro adotou uma tentativa de combate gradual à
inflação contemplando as medidas:
„„
„„
„„
34
controle do fluxo de caixa do governo e dos meios
de pagamento;
preocupação com a negociação da dívida externa;
reaproximação do país com o sistema financeiro
internacional;
„„
descongelamento dos preços;
„„
desbloqueio dos ativos que estavam no Banco Central.
Economia Brasileira Contemporânea
Neste período, o Brasil tem certo alívio do ponto de vista
externo. As altas taxas de juros, a manutenção da taxa de câmbio
real e a abertura financeira, combinadas com um cenário de
desaquecimento internacional, contribuem para a entrada de
capital externo no país e elevação de reservas.
O comportamento da evolução das reservas internacionais do Brasil
(liquidez internacional, em milhões de US$), de 1990 a 2000, é
apresentado na Figura 1.2.
Figura 1.2 – Reservas Internacionais do Brasil: liquidez internacional US$ (milhões)
Fonte: Elaboração do autor, 2013.
Concluímos que o período Collor de Mello marca a volta dos
recursos externos ao Brasil e traz à baila a discussão sobre a
abertura comercial (mudança na estratégia de comércio exterior) e
sobre um tema ainda hoje controverso: a privatização. Este último
é o nosso próximo assunto.
Seção 4 – Privatizações
Você inicia o estudo de um tema controverso e que tomou um
bom espaço na mídia nos anos 90: as privatizações.
A presença de empresas estatais em nossa economia acontece
desde o período colonial. Segundo Guedes (2007, p. 196), essa
presença toma impulso durante o Governo de Getúlio Vargas,
com o objetivo de:
Unidade 1
35
Universidade do Sul de Santa Catarina
„„
„„
manter sob controle público setores estratégicos
da economia;
defender o nacionalismo econômico, o protecionismo,
os investimentos públicos em infraestrutura e a criação
de monopólios públicos.
Em 1940, havia no Brasil cerca de 20 empresas estatais.
Esse número pula para 268 em 1979. Com o agravamento das
condições econômicas a partir de 1980, o governo brasileiro
inicia o processo de privatização, que se mostra mais dinâmico
na década de 90.
Quais são as razões alegadas para se iniciar um
processo de privatização?
Gremaud (2011, p. 580) aponta quatro razões:
a)Ineficiência das empresas públicas, decretada pela baixa
qualidade dos serviços e/ou pela existência de déficit
financeiro nas empresas estatais.
b)Diminuição da capacidade estatal em fazer os
investimentos necessários à manutenção e ampliação dos
serviços e atualização tecnológica das empresas.
c)Necessidade de gerar receitas para abater a elevada
dívida estatal.
d)Mudanças no quadro tecnológico e financeiro internacional.
O mesmo autor faz referência ao primeiro aspecto, relacionado
à qualidade dos serviços prestados, e apresenta os resultados de
análises de empresas estatais válidas não só para o Brasil, mas em
termos mundiais. Estão listados a seguir:
„„
36
baixo nível de eficiência operacional, que traz como
resultado baixa qualidade dos serviços prestados;
Economia Brasileira Contemporânea
„„
„„
„„
fraca mobilização de recursos financeiros, que traz como
resultado uma inadequada capacidade de recuperação dos
custos incorridos na prestação dos serviços;
crescente deterioração física dos ativos, resultado de
inadequada manutenção e decorrente da indisponibilidade
de recursos financeiros;
desbalanceamento entre oferta e demanda que se agrava
por um viés preferencial por novos investimentos.
O último ponto apresentado está associado aos interesses de
natureza política, que, por sua vez, tendem a privilegiar a
realização de novas obras, quando comparado ao cuidado e à
otimização dos ativos existentes.
Sobre os resultados apontados pelos estudos, Gremaud (2011,
p. 580) observa:
Tais resultados são vistos como decorrência da própria
característica monopolista das empresas, que, em razão
da não‑existência de concorrentes, diminuem sua
preocupação com a eficiência na utilização dos recursos.
Esse fato é fortemente agravado pela ingerência política na
administração e pela falta de responsabilidade que o aparato
institucional imputa aos administradores da empresa.
Souza (2008, p. 212) prefere não adotar a expressão “monopólio
público”. A empresa pública expressa o conjunto de interesses
representado pelo Estado, interesses que sempre terão
objetivos coletivos. Argumenta, ainda, que o Estado “tem que
responder as necessidades do conjunto da sociedade, sob pena
de perder legitimidade – e assim também as estatais. Não é,
portanto, monopólio.”
No Brasil, se observou certa decepção em relação aos resultados e
à qualidade dos serviços prestados pelo serviço público, apesar do
seu crescimento. Este tipo de serviço deveria ser especialmente
importante para a diminuição da pobreza e das desigualdades,
mas, muitas vezes, quem mais se aproveita não são os que mais
necessitam dos serviços.
Unidade 1
37
Universidade do Sul de Santa Catarina
Giambiagi (2011, p. 136) utiliza a metáfora que será preciso
uma “cenoura” e um “porrete” para fazer a “carroça da indústria
nacional” voltar a andar. Cita Erber e Vermulm, que concebem
a Política Industrial e de Comércio Exterior (PICE) como
sendo uma “pinça” que possui uma “perna” para incentivar a
competição e a outra “perna” para incentivar a competitividade.
Para esse mesmo autor, a perna da competição foi mais forte
do que da competitividade, apesar de os gastos em pesquisa e
desenvolvimento (P&D) no Brasil terem saltado de 0,5%, em
1989, para 1,3% do PIB, em 1994, como resultado da PICE.
Você deve lembrar que o governo enfatizaria, internamente, uma
estratégia de privatização e, externamente, uma reforma tarifária
e de comércio exterior.
Outra interessante reflexão feita por Gremaud (2011, p. 581) é
sobre a difusão de novas tecnologias, novos métodos de produção
e, mesmo, novos produtos que criam a oportunidade de modificar
o modo de fornecimento dos serviços públicos. O avanço
tecnológico minimizaria as preocupações citadas anteriormente
sobre a falta de concorrência em certas atividades.
O desenvolvimento de novos produtos pode gerar
concorrência não somente dentro de determinado ramo
de atividade, mas entre diferentes ramos. A concorrência
entre determinados tipos de energias ou formas
alternativas de transportes são alguns exemplos.
4.1 Resumo das fases do processo de privatização do Brasil
até 1994
O processo de privatização até 1994 pode ser dividido em
três fases: a ocorrida na década de 80; entre 1991 e 1992; e,
por último, entre 1993 e 1994. A seguir, vamos estudar um
pouco mais sobre essas fases e os resultados obtidos.
Um resumo sobre o processo de privatização por período e
os resultados obtidos é apresentado na Tabela 1.3.
38
Economia Brasileira Contemporânea
Tabela 1.3 – Processo de privatização: um resumo até o ano de 1994, com valores em milhões de US$
Período
Nº de
empresas
Reprivatização
1981‑89
39
PND
1991
4
1.614
374
1.988
98,9
1992
14
2.401
982
3.383
98,7
1993
6
2.627
1.561
4.188
92,3
1994
9
1.966
349
2.315
28
72
8.608
3.266
12.609
Total
Valor
arrecadado
Dívidas
transferidas
Moedas
podres/
total
Tipo
Total
735
Fonte: Elaboração do autor, 2013, com adaptação de Gremaud (2011, p. 584).
Na década de 80, ocorre a reprivatização, quando foram vendidas
as empresas estatizadas que estavam em situação de falência.
Naquele período, foram reprivatizadas 39 empresas, o que
permitiu arrecadar um total de US$ 735 milhões.
A segunda fase do processo de privatização do Brasil, entre
1991 e 1992, ocorre com a criação do Programa Nacional de
Desestatização (PND) que, naquele momento, foi considerado
prioritário. Giambiagi (2011, p. 136) aponta as pretensões
do PND:
1.Contribuir para o redesenho do parque industrial.
2.Consolidar a estabilidade.
3.Reduzir a dívida pública (via aceitação de títulos como
moeda de privatização).
Entre 1991 e 1992, foram vendidas 18 empresas, ainda durante
o governo Collor, representando um valor total arrecadado
de US$5.371 milhões. Segundo Gremaud (2011, p. 583),
as principais empresas vendidas eram de setores produtores de
bens siderúrgicos, petroquímicos e fertilizantes.
A terceira fase do processo de privatização no Brasil, entre 1993 e
1994, ocorreu durante todo o governo Itamar Franco. Nesta fase,
segundo Gremaud (2011, p. 583), parte dos aspectos legais sofreu
Unidade 1
39
Universidade do Sul de Santa Catarina
Segundo Rego (2006, p. 217),
o incentivo à compra foi realizado
mediante aceitação das moedas de
privatização, também conhecidas
como moedas podres. “O processo
de privatização brasileiro admite,
para aquisição das participações
acionárias das sociedades a serem
desestatizadas, outros meios
de pagamento além da moeda
corrente: as chamadas moedas de
privatização. São dívidas contraídas
no passado pelo governo federal,
aceitas como forma de pagamento
das ações das empresas estatais
que estão sendo privatizadas.
Dessa forma o governo federal
reduz seu endividamento e liquida
os compromissos financeiros
provenientes dessas dívidas.”
alterações: “ampliação do aceite das chamadas moedas podres
– antigas dívidas do Governo Federal, não limitação ao capital
estrangeiro, venda de participações minoritárias.”
Na terceira fase, 15 empresas do setor siderúrgico, petroquímico
e fertilizante foram privatizadas, permitindo arrecadar US$ 6.503
milhões. Esta fase praticamente finaliza a privatização de
empresas produtoras de bens.
Você pode concluir que, nos governos Fernando Collor e Itamar
Franco, foram privatizadas 33 empresas federais, com uma
arrecadação de US$ 8,6 bilhões e transferência para o setor
privado de US$ 3,3 bilhões em dívidas.
Os números acima são relativamente modestos em relação à
proposição inicial. Giambiagi (2011, p. 137) apresenta várias
explicações para esses números:
(1) Muitas empresas públicas estavam em má situação
financeira e precisavam ser saneadas para que existisse
interesse em sua aquisição;
(2) Existia grande dificuldade em avaliar os ativos de
diversas estatais, após anos de alta inflação e várias
mudanças de moeda;
(3) Havia resistência do público e um governo que
perdia credibilidade;
(4) Alguns setores, tais como o de jazidas minerais e
setor elétrico, não podiam, pela Constituição de 1988,
ser vendidos para estrangeiros;
(5) Operações mais complexas exigiam per se ganhos de
experiência de privatização, que ainda não existiam.
Além dessas explicações, você deve lembrar que as dificuldades
relacionadas ao controle da inflação exigiram boa parte do
esforço do governo. Isto fez com que as privatizações ficassem
em segundo plano.
40
Economia Brasileira Contemporânea
Seção 5 – A economia brasileira entre 1990 ‑ 1994
Nas seções anteriores, você estudou as reformas relacionadas à
abertura comercial, a política de privatização e os Planos Collor I
e II, que ocorreram no período 1990 – 1994.
Agora chegou o momento de conhecer, com mais detalhes,
o comportamento do PIB, da inflação, do balanço de pagamentos
e das contas fiscais no período 1990 a 1994, utilizando‑se de
séries estatísticas disponíveis. Com isso, você irá entender melhor
as implicações das mudanças que ocorreram na economia por
conta das reformas e dos planos econômicos.
5.1 A evolução do Produto Interno Bruto
O crescimento médio do PIB no período compreendido entre
os governos Fernando Collor e Itamar Franco (1990 a 1994) foi
de 1,24% ao ano, mas apresentou um comportamento diverso
quando avaliado ano a ano. A Figura 1.3 destaca a evolução do
PIB do Brasil no intervalo de 1989 a 1994.
Figura 1.3 – Variação real anual do PIB do Brasil, em % a.a.: período 1989 a 1994
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA e IBGE).
O Plano Collor I promoveu uma violenta retração da economia
no ano de 1990, ‑ 4,3% ao ano (a.a.). A explicação é simples,
e você já a conhece: o “sequestro de liquidez” realizado com
o plano retira o dinheiro da economia e, por conta disso, esta
entra em crise. Segundo Souza (2008, p. 207), “a situação se
agravou em face do violento arrocho salarial e do corte dos gastos
públicos, que derrubaram fortemente a demanda.”
Unidade 1
41
Universidade do Sul de Santa Catarina
No ano seguinte, em 1991, o desempenho do PIB melhorou
um pouco, ao crescer 1,03%, mas volta a cair em 1992, ‑ 0,47%.
A queda observada muito se deve à instalação de uma crise em
decorrência do processo de impeachment do presidente.
O ano de 1992 foi o último com taxa de crescimento
negativa para o PIB brasileiro até a chegada do ano
de 2009, que diminui 0,33%, sob os efeitos da crise
financeira mundial de 2008.
No intervalo 1993‑94, governo Itamar, a economia brasileira
retoma seu ciclo de expansão, apresentando taxas expressivas de
crescimento de 4,9% em 1993 e 5,9% em 1994.
Giambiagi (2011, p. 155) associa esse crescimento à recuperação
da indústria e ao bom resultado da agropecuária em 1994, que foi
chamada de “âncora verde do real”. O aumento da oferta agrícola
contribuiu para a queda da inflação.
Setti (2011), em sua coluna na Revista Veja de 9 de março de
2011, escreveu um artigo intitulado “PIB cresceu mais, em
média, no governo de Itamar do que nos de FHC e de Lula”.
Reproduzo aqui parte de seu texto:
Em balanços publicados a partir de sexta‑feira passada,
4, muito se enfatizou a comparação entre a média de
crescimento do PIB durante o governo do presidente
Fernando Henrique Cardoso (1995‑2003), que enfrentou
várias crises internacionais – crescimento médio de
2,3% – e a do alcançado no governo do presidente Lula,
que pegou pela proa a grande crise de 2008: 4%.
Ninguém se lembrou, porém, de apontar que bem
superior, mais de 30% melhor do que a do lulalato foi a
média de crescimento obtida pelo governo do presidente
Itamar: sonoros, eloquentes 5,4%.
Não se pode contar para Itamar o ano de 1992, em
que a catastrófica gestão do então presidente Fernando
Collor (1990‑1992) levou o PIB a cair 0,5%: o então
vice‑presidente assumiu a 2 de outubro de 1992, ainda
como interino que depois permaneceria com a renúncia
42
Economia Brasileira Contemporânea
do presidente para escapar ao impeachment, a 29 de
dezembro daquele ano.
Apesar da condução um tanto errática e atabalhoada
que deu aos negócios públicos, inclusive trocando
freneticamente de ministros – os da Agricultura,
por exemplo, foram 9 em pouco mais de dois anos,
os da importantíssima Fazenda, 6 –, já no primeiro
ano completo de gestão, 1993, o país cresceu 4,9%.
No segundo, 1994, com a implantação do Plano Real,
em junho, a pancada na inflação e o aumento da renda e
do consumo, o PIB bateu em 5,9%.
Itamar, portanto, pode orgulhar‑se dos números que deixou.
Em linhas gerais, você pode concluir que o crescimento médio do
PIB brasileiro no período 1990‑94 foi baixo: 1,3% a.a.
5.2 O comportamento do “dragão”: a inflação
O comportamento da inflação no período 1990‑94 acompanhou
o mesmo padrão verificado na segunda metade da década de 80.
Após uma tentativa de estabilização, você deve lembrar‑se do plano
Cruzado, Bresser e Verão, quando a taxa de inflação caía muito e
depois voltava a acelerar. A Figura 1.4 ilustra esta afirmação.
O Plano Verão, editado durante a gestão do ex‑ministro da fazenda
Mailson da Nóbrega, faz as taxas diminuírem significativamente,
para, em seguida, voltarem a crescer de forma preocupante.
O mesmo veio a suceder com os planos Collor I e Collor II.
Figura 1.4 – Comportamento da taxa de inflação mensal brasileira, IGP di: 1989-1994
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
Unidade 1
43
Universidade do Sul de Santa Catarina
Nos dois primeiros meses de 1990, o Brasil viveu um momento
de hiperinflação: as taxas ultrapassaram a marca de 80% ao mês.
Souza (2008, p. 208) lembrou afirmação do presidente Fernando
Collor sobre a inflação: “era um tigre que se mataria de um tiro
só”, provavelmente tentando atrair a atenção da população para o
novo pacote.
O Plano Collor I fez com que ela cedesse vertiginosamente,
mais ainda em patamares elevados, vindo a sofrer aceleração
logo em seguida. Segundo Cordeiro (2005, p. 111), “a variação
do IPCA em dezembro foi de 18,45%, o que perfazia o total de
927,4% ao ano.”
Mais uma vez, o dragão da inflação não estava domado. A adoção
do Plano Collor II em janeiro de 1991 faz a inflação cair e, como
padrão, voltar a crescer continuamente, nos meses seguintes.
Souza (2008, p. 217) afirmou que o Brasil, entre fins de 1980 até
fins de 1992, somente nos dois primeiros anos do governo Sarney
escapou de adotar uma política recessiva. Sobre isso, destaca:
Havendo concluído que, apesar de mais de uma década
de política recessiva, não se conseguira dominar a
inflação, o Presidente Itamar optou por um outro
caminho: o de que a prioridade seria não mais um suposto
combate à inflação, mas a retomada do desenvolvimento;
isso implicava também a concepção de que a inflação se
combate com desenvolvimento – e não com recessão.
O padrão de comportamento descrito anteriormente só iria sofrer
uma alteração com a introdução do Plano Real, em 1994. Este
plano de estabilização será abordado na próxima unidade.
44
Economia Brasileira Contemporânea
5.3 A balança comercial
Você lembra que o Brasil sofreu uma recessão no início
do período entre 1990‑1994?
A partir de 1992, ocorre uma expansão de nossa economia e
acontece a intensificação do processo de abertura comercial.
Estes dois fatos são importantes para a análise da balança
comercial brasileira no período.
O período é marcado por superávits no saldo da balança comercial,
que pode ser verificado na Figura 1.5.
Figura 1.5 – Balança comercial: exportações, importações e saldo, em US$ milhões, 1989-1994
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
Giambiagi (2011, p. 157) faz a seguinte afirmação, que pode ser
verificada no gráfico anterior:
[...] nos dois primeiros anos do período (1990 – 91),
houve uma forte retração nas exportações, em relação
aos patamares anteriores. Entretanto, nos três anos
que se seguiram, as exportações – especialmente as
de manufaturados – tiveram um comportamento
significativamente expansivo.
As importações apresentaram um aumento contínuo durante
estes anos. A diminuição das tarifas médias de importação,
somada à expansão da economia, contribui para que as
importações cresçam de US$20,661 milhões para US$32,701
milhões: um aumento de 60%.
Unidade 1
45
Universidade do Sul de Santa Catarina
5.4 As contas públicas
Você pode se perguntar: qual foi a interferência do
resultado do déficit público no comportamento da
inflação?
Segundo Lopreato (2002, p. 279), a visão dominante em
economia mostra que a causa fundamental do processo
inflacionário é a expansão da moeda, e que uma expansão acima
do crescimento da produção provoca aumento da taxa de juros
nominal e da inflação. A explicação usual para a expansão da
moeda é a existência de déficits orçamentários.
O mesmo autor questiona a tese de que a política econômica deve
ter como preocupação central o déficit público e propõe:
O déficit público não foi a causa determinante do
processo inflacionário vivido pela economia brasileira
desde os anos 1980 até o início dos anos 1990.
A questão central tem de ser buscada na crise da
dívida e na incapacidade do país de garantir fontes
externas de financiamento do Balanço de Pagamentos.
(LOPREATO, 2002, p. 279).
O déficit público pode ser
caracterizado como déficit
primário (DP), quando as despesas
com juros e correção monetária são
excluídas do cálculo do déficit.
O déficit público pode ser
caracterizado como déficit
operacional (DO) quando somente
as despesas com correção monetária
(CM) são excluídas do cálculo.
Mas o bom resultado das contas públicas no período de 1990 até
1993 não conteve a aceleração inflacionária. A Tabela 1.4 mostra
os números do déficit operacional e do resultado primário,
além dos valores de juros reais líquidos pagos no período de
1990 a 1994.
Tabela 1.4 – Necessidades de financiamento do Setor Público – 1990 ‑ 1994 (% do PIB)
1990
1991
1992
1993
1994
Déficit operacional
‑1,4
0,2
1,9
0,8
‑1,3
Resultado primário
2,3
2,7
1,6
2,2
5,2
Juros reais líquidos
0,9
2,9
3,5
3,0
3,9
Fonte: Giambiagi (2011, p. 158).
46
Economia Brasileira Contemporânea
O resultado primário apresentou um superavit de 2,3% em 1990
e continuou a melhorar em 1991, chegando a 2,7%. A melhora
do resultado primário foi interrompida em decorrência da
instabilidade política em 1992, mas, logo em seguida, ocorreu
nova melhora nos anos seguintes, alcançando, em 1994,
um superávit de 5,2%.
Ainda sobre a tese de que, para debelar a inflação, é preciso
cortar o gasto público, Souza (2008, p. 218) afirma:
[...] existindo capacidade ociosa, como existia naquela
época, o déficit público, em lugar de ser inflacionário,
estimula o aumento da produção. Além disso,
não havia déficit nas contas públicas naquele período.
O insuspeito Delfim Neto, que adotara um programa
anti‑inflacionário com base no corte do gasto público,
demonstrou que o déficit havia desaparecido. Em artigo
na Folha de S. Paulo, denominado “Qual o Plano”,
revelou que, de 1986 a 1989, houve nas contas públicas,
um superávit primário (conceito que não inclui o
pagamento dos juros) de 0,37% do PIB, em 1990 de
2,23%, em 1991 de 2,77%, em 1992 de 1,77% e em 1993
de 2,90%.
Os números apresentados nos permitem concluir, entre outras
coisas, que o Brasil apresentou melhora em suas contas públicas no
período imediatamente anterior ao estabelecimento do Plano Real.
Unidade 1
47
Universidade do Sul de Santa Catarina
Síntese
Nesta unidade, você estudou a mudança de modelo de
desenvolvimento pela qual passou nossa economia no início dos
anos de 1990, que foi influenciado pelo surgimento, no cenário
internacional, do chamado Consenso de Washington e do
Plano Brady.
Em seguida, você iniciou o estudo de um tema que ainda hoje é
controverso e que tomou um bom espaço na mídia nos anos de
1990: as privatizações.
A primeira metade dos anos 90 foi marcada pela continuidade
dos sucessivos planos de combate à inflação, que traziam como
principal elemento o congelamento de preços, com exceção do
Plano Real (um dos assuntos da próxima unidade). Você conheceu
os planos de estabilização do governo Collor: Plano Collor I e
Plano Collor II.
Você aprendeu sobre o processo de abertura comercial e sua forma
de implementação nos países em desenvolvimento e no Brasil.
Entendeu por que as vantagens da liberação do comércio externo
vão além da tradicional teoria das vantagens comparativas.
Finalmente, você analisou os principais indicadores
macroeconômicos da economia brasileira no período 1990‑94 e
concluiu que o crescimento médio do PIB foi baixo, influenciado
por uma recessão no início da década; a inflação anual média foi
alta, 1.200% a.a., com grandes oscilações nas taxas de inflação; as
importações cresceram a uma taxa bem superior àquela verificada
para as exportações; e houve uma clara melhora das contas públicas.
48
Economia Brasileira Contemporânea
Atividades de autoavaliação
Ao final de cada unidade, você realizará atividades de autoavaliação.
O gabarito está disponível no final do livro didático. Mas esforce‑se para
resolver as atividades sem ajuda do gabarito, pois, assim, você estará
promovendo (estimulando) a sua aprendizagem.
1) Leia a citação a seguir:
[...] Os clássicos concluíram que seria muito melhor
para todos os países se especializarem na produção
dos bens em que tivessem vantagem comparativa.
Como cada país tem recursos naturais diferentes,
em quantidades diferentes, e habilidades também
diferentes, apresentam custos de produção diferentes.
(PINHO, 2003, p. 440).
Os economistas clássicos recomendam o livre comércio entre as nações,
tendo por base a teoria das vantagens comparativas. Considerando esta
afirmação, julgue cada um dos argumentos abaixo, sobre o livre comércio:
I. A defesa da indústria nascente foi a estratégia utilizada na economia
brasileira ao longo do processo de industrialização.
II. Proporciona ganhos de bem‑estar para a coletividade ao
oportunizar um leque maior de produtos e serviços.
III. Força a adoção de estruturas de custos mais adequadas e a busca
por melhorias na produtividade.
IV. Possibilita combate ao desemprego no curto prazo.
V. Proporciona efeitos benéficos em um processo de estabilização.
Quais dos argumentos (itens) relacionados anteriormente não
correspondem às recomendações dos economistas clássicos. Assinale a
opção correta:
a. ( ) Apenas o item (I) está correto
b. ( ) Apenas o item (V) está correto
c. ( ) Apenas o item (II) e (V) está correto
d. ( ) Apenas o item (I) e (IV) está correto
e. ( ) Apenas o item (II) e (III) está correto
Unidade 1
49
Universidade do Sul de Santa Catarina
2) Sobre o processo inflacionário, existem várias posições sobre o assunto.
Considere duas delas:
Posição I: Ortodoxia – de acordo com o pensamento ortodoxo,
a inflação é decorrente do processo de emissão monetária devido aos
déficits públicos, o que eleva a demanda e força a alta de preços.
Posição II: Heterodoxia – para estes, a inflação não decorre de excesso
de demanda provocado pela emissão monetária. A emissão monetária é
vista muito mais como uma decorrência da inflação do que como causa.
Leia o parágrafo a seguir, retirado do artigo “Hiperinflação e estabilização
no Brasil: o primeiro Plano Collor”, do ex‑ministro Bresser Pereira (1991):
No início de 1990 a economia brasileira viveu pela
primeira vez a hiperinflação. A taxa de inflação
chegou a 56% em janeiro, 73% em fevereiro e 84% em
março. Em 15 de março, o presidente tomou posse e,
no dia seguinte, anunciou um ambicioso programa
de estabilização, incluindo uma reforma monetária
profunda. Noventa dias depois, quando este trabalho
foi concluído, estava claro que o plano não havia
conseguido realizar o que esperavam seus autores:
a inflação estava de volta, de maneira muito similar
à dos planos anteriores, e uma recessão já estava em
curso, diferentemente dos planos anteriores. (BRESSER
PEREIRA, 1991, p. 89).
Considerando as características do primeiro Plano Collor e o trecho
apresentado acima, defenda uma das duas posições sobre as medidas
de combate à inflação e fundamente os motivos de sua escolha.
50
Economia Brasileira Contemporânea
Saiba mais
GIAMBIAGI, Fábio; VILLELA, André; BARROS DE
CASTRO, Lavinia; e HERMANN, Jennifer. Economia
brasileira contemporânea. 2. ed. São Paulo: Editora Campus /
Elsevier, 2011.
GREMAUD, Amaury P. Economia brasileira contemporânea:
para cursos de economia e administração. 7. ed. São Paulo:
Atlas, 2011.
SOUZA, Nilson Araújo de. Economia brasileira contemporânea:
de Getúlio a Lula. 2.ed. São Paulo: Atlas, 2008.
Unidade 1
51
UNIDADE 2
Estabilização, desequilíbrios
macroeconômicos e as reformas
Objetivos de aprendizagem
„„
Conhecer as circunstâncias e a implementação do plano
de estabilização de maior êxito na história do Brasil.
„„
Compreender algumas dificuldades e desequilíbrios que
a condução do plano trouxe à economia brasileira.
„„
Conhecer os esforços do governo em favor da
estabilização empreendidos no primeiro governo.
„„
Aprender a respeito das mudanças de política
macroeconômica e as principais mudanças estruturais
implementadas no segundo governo de FHC.
Seções de estudo
Seção 1 O Plano Real: contexto econômico
Seção 2 A implementação do Plano Real
Seção 3 O primeiro governo de FHC: os esforços
em favor da estabilização
Seção 4 Desequilíbrio do setor externo e a crise fiscal
Seção 5 O segundo governo de FHC: a tríplice mudança
de políticas e as mudanças estruturais
2
Universidade do Sul de Santa Catarina
Para início de estudo
A primeira metade dos anos 90 é marcada pela continuidade
dos sucessivos planos de combate à inflação, que traziam como
principal elemento o congelamento de preços. O último plano
que você estudou, o Plano Collor II, também não obteve êxito
no controle do processo inflacionário.
A partir de agora, você conhecerá a mais bem‑sucedida tentativa
de combate à inflação empreendida na economia brasileira,
o Plano Real, que conseguiu reduzir a inflação e mantê‑la sob
controle durante longo período de tempo. Apesar do sucesso
em termos de estabilização, alguns problemas permaneceram,
e outros até se agravaram.
Conhecerá os esforços em favor da estabilização, empregados
no primeiro governo de Fernando Henrique. E, finalmente, irá
conhecer as mudanças de política macroeconômica e as principais
mudanças estruturais implementadas a partir do seu segundo
governo, que fez com que nosso país ficasse com uma economia
muito mais moderna e competitiva do que em 1990.
Seção 1 – O Plano Real: contexto econômico
Você já conheceu alguns dos principais indicadores macroeconômicos
da economia brasileira no período 1990‑94. Nesta seção, iremos
discutir o contexto e o diagnóstico realizado pelo governo para a
concepção do novo programa de estabilização.
O ministro das Relações Exteriores, Fernando Henrique
Cardoso, tomou posse como o quarto ministro da Fazenda do
governo Itamar, em maio de 1993. Antes dele, assumiram o
ministério da Fazenda Gustavo Krauser, Paulo Haddad e Eliseu
Rezende, revelando um pouco da instabilidade dos oito meses
iniciais do governo Itamar.
54
Economia Brasileira Contemporânea
Ao assumir o novo ministério, Fernando Henrique e sua equipe
econômica prepararam o novo plano de estabilização. Segundo
Bacha (2012, p. 137), os desequilíbrios das contas do setor público
foram identificados como a causa fundamental da inflação crônica
e que ocorria no Brasil um “efeito Oliveira Tanzi às avessas”.
[...] a inflação ajudava a equilibrar o orçamento, já que os
impostos eram protegidos contra a inflação, enquanto as
despesas eram determinadas no orçamento em termos
nominais. O efeito Oliveira‑Tanzi sustenta, ao contrário,
que o déficit orçamentário aumenta quando a inflação
sobe, sob o pressuposto de que os gastos do governo são
fixos em termos reais, enquanto as receitas tributárias não
são protegidas contra a inflação. (BACHA, 2012, p. 137).
Naquele período, a inflação reduzia o gasto real previsto no
orçamento e gerava um imposto inflacionário para o Tesouro
Nacional, resultado do aumento da demanda de moeda a ser
emitida pelo Banco Central. Segundo Giambiagi (2011, p. 143),
existia um desajuste fiscal ex ant (isto é, entre os gastos e as
receitas orçadas) muito elevado, mas, conforme a inflação
corroía os gastos do governo em termos reais (e suas receitas
mantinham‑se relativamente protegidas), surgia ex post,
um déficit apenas moderado.
A adoção do novo plano não poderia incorrer nos mesmos erros
dos planos anteriores. Para Gremaude (2011), as medidas deveriam:
„„
„„
„„
„„
ser adotadas de forma gradual, sem provocar surpresas;
promover uma substituição natural de moeda, sem
recorrer a congelamentos de preços e salários;
ter preocupação com os desequilíbrios existentes
na economia;
considerar que o contexto da aplicação do plano era
muito diferente, dado que a inserção internacional do
país era completamente distinta daquela observada nos
planos anteriores.
Unidade 2
55
Universidade do Sul de Santa Catarina
O déficit público pode ser
caracterizado como déficit
nominal (DN) quando se inclui no
seu cálculo o pagamento dos juros
nominais sobre a dívida pública.
O ministro Fernando Henrique e sua equipe sabiam da
necessidade de ir além das metas fiscais do programa econômico.
Em 1993, o orçamento operacional apresentou um superávit de
0,25% do PIB, enquanto o déficit nominal foi de 58.4% do PIB.
Lembre que a inflação, naquele ano, foi de 2.490%.
Quando o déficit nominal seria igual ao
déficit operacional?
Segundo Bacha (2012, p. 139), isto ocorreria quando não
houvesse inflação, uma vez que, se o déficit operacional está em
equilíbrio, a oferta monetária deixa de crescer, contribuindo para
o fim da inflação. Neste sentido, o controle do déficit nominal era
um problema monetário, e não fiscal.
O programa de estabilização foi submetido ao presidente
Itamar, que esperava resultados mais imediatos e com menos
precondições, mas aprovou o programa. Segundo Bacha (2012),
o programa foi submetido também à liderança do PSDB, quando
o senador Mário Covas sintetizou a discussão nos seguintes
termos: “Neste partido, nós, políticos, damos a direção política
e vocês, economistas, dão a direção técnica: se esta é a única
maneira pela qual vocês acham razoável proceder, OK, nós os
acompanharemos... até o precipício!”. (BACHA, 2012, p. 141).
Souza (2008, p. 224) identifica oito etapas em que o Plano Real
foi desdobrado: 1) renegociação da dívida externa e suspensão da
moratória; 2) criação da “âncora monetária”; 3) criação da “âncora
fiscal”; 4) transição para uma nova moeda; 5) criação da nova
moeda; 6) criação da “âncora cambial”; 7) implementação de um
amplo programa de desestatização da economia; e, 8) eleição do
presidente Fernando Henrique para a presidência da república.
A maioria dos autores identifica três estágios principais, que
compreenderiam estas etapas: Estágio 1 – O ajuste fiscal;
Estágio 2 – Desindexação; e Estágio 3 – Âncora nominal.
Na próxima seção, você estudará o desdobramento, a concepção
e a prática da implementação do Plano Real em cada um desses
três estágios.
56
Economia Brasileira Contemporânea
Seção 2 – A implementação do Plano Real
Você estudou que o Plano Real pode ser concebido como um
programa em três estágios, de modo a evitar os equívocos
e os fracassos dos planos anteriores. O ataque ao processo
inflacionário foi apresentado ao país por Fernando Henrique
em 7 de dezembro de 1993.
Oliveira (2006, p. 113) cita que o governo diagnosticava as
seguintes necessidades, quando, em junho de 1993, apresentou
um plano econômico para estabilizar a economia, o Plano de
Ação Imediata (PAI): reduzir os gastos da União e aumentar
a eficiência no ano de 1993; recuperar a receita tributária;
equacionar as dívidas dos estados e municípios com a União;
controlar os bancos estaduais de forma mais rígida; sanear os
bancos federais; e aperfeiçoar o programa de privatização.
2.1 Estágio I: o ajuste fiscal
O primeiro estágio do Plano Real era um mecanismo de equilíbrio
orçamentário para os próximos anos e para impedir a ocorrência
de pressões inflacionárias em decorrência do desequilíbrio
orçamentário. Foi composto por três esforços de ajuste fiscal:
a) o Programa de Ação Imediata (PAI); b) o aumento das receitas;
e c) o Fundo Social de Emergência (FSE).
a) Programa de Ação Imediata (PAI)
Segundo Giambiagi (2011, p. 143), o Programa de Ação Imediata
já havia sido lançado em maio de 1993, redefinindo a relação da
União com os Estados e do Banco Central com os bancos estaduais
e municipais, além de um programa de combate à sonegação.
Oliveira (2006, p. 115) ressalta o otimismo de Fernando Henrique,
em junho de 1993, a respeito das perspectivas do PAI:
O Brasil está a um passo de uma grande transformação [...]
Vamos resolver esses problemas [da inflação, crise cambial,
Unidade 2
57
Universidade do Sul de Santa Catarina
da miséria etc.] sem mágica ou planos mirabolantes. Se
vários países latino‑americanos têm logrado êxito em seus
programas de estabilização, por que o Brasil, com uma
economia muito mais forte e dinâmica, não haverá de
consegui‑lo também?
Souza (2008, p. 222) comenta que a ideia básica do PAI pode
ser assim resumida: “O diagnóstico sobre a causa fundamental
da doença inflacionária já foi feito. É a desordem financeira e
administrativa do setor público.” Por isso, a terapia preconizada:
o governo deve arrumar a sua própria casa e colocar as contas
em ordem.
Para enfrentar esses problemas, o PAI previu as seguintes medidas
iniciais: corte orçamentário de US$ 6 bilhões em 1993; estimativa
realista da proposta orçamentária de 1994; um projeto de lei
que limitasse as despesas com os servidores civis em 60% da
receita corrente da União, assim como dos estados e municípios;
elaboração de projeto de lei que definisse as normas de cooperação
da União com os estados e municípios.
b) O aumento das receitas
Rego (2006, p. 231) comenta que “para cada cruzeiro arrecadado,
outro cruzeiro era sonegado.” Em vista deste problema, para
aumentar a arrecadação foram tomadas medidas de combate
à sonegação, entre elas: iniciou‑se uma campanha massiva de
conscientização contra a sonegação; aumentou‑se a fiscalização
especialmente sobre as maiores empresas do país; e, atuou‑se
de maneira mais contundente na cobrança dos impostos das
pessoas físicas. Segundo Gremaude (2011, p. 450), o aumento
da arrecadação dar‑se‑ia, também, pela criação de um novo
imposto, chamado de Imposto Provisório sobre Movimentação
Financeira (IPMF), que depois se tornou a Contribuição
Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). Este
imposto ficou conhecido como “imposto do cheque”, que
estabelecia uma alíquota de 0,25% sobre o valor de toda operação
com cheque.
Era um imposto criado para equilibrar as contas do governo no
biênio 1993‑1994, que apresentava facilidade de recolhimento e
uma ampla base tributária (com incidência, inclusive, nas atividades
58
Economia Brasileira Contemporânea
informais). Como sua incidência ocorria em todas as etapas do
processo produtivo, o imposto desestimulava a intermediação
financeira e contribuía para ampliar as taxas de juros.
c) O Fundo Social de Emergência (FSE)
A criação do Fundo Social de Emergência, que não era nem de
emergência e tampouco social, foi a principal medida de ajuste
fiscal que abrigou US$15,8 bilhões no primeiro ano.
Segundo Souza (2008, p. 227), o FSE seria abastecido por três
fontes de recursos:
1. Aumento dos impostos dos que já pagavam, mediante a
incidência de 5% sobre as taxas vigentes dos tributos federais;
2. Desvinculação de 20% das transferências constitucionais
e legais, particularmente das destinadas aos Estados,
municípios, educação, habitação (20% do então IPMF)
e fundos regionais;
3. Destinação de 20% de todas as receitas não vinculadas.
A aprovação do Fundo Social de Emergência permitiu um corte
de 20% das destinações orçamentárias, nos anos fiscais de 1994
e 1995. Até esse percentual de impostos arrecadados, a União
não teria que cumprir as vinculações de despesas estabelecidas na
Constituição de 1988.
A diminuição das transferências do governo ampliava os recursos
livres à disposição do governo federal. Você deve lembrar também
que o FSE foi concebido como um instrumento temporário para
equilibrar o orçamento, enquanto as medidas mais permanentes
não entrassem em vigor.
Para Giambiagi (2011, p. 145), as mudanças introduzidas pelo
PAI e pelo FSE não se mostraram suficientes para assegurar
o equilíbrio fiscal sequer em 1995. Lembre‑se também de
que reformas estruturais, consideradas fundamentais para a
estabilidade duradoura, não foram feitas. Estas reformas não
tiveram sua aprovação no Congresso.
Unidade 2
59
Universidade do Sul de Santa Catarina
Na prática, o ajuste fiscal não se comprovou como uma
precondição para a estabilidade. Como você verá a seguir,
o mesmo não poderá ser dito em relação às medidas do segundo
estágio: as medidas de desindexação.
2.2 Estágio 2: desindexação
Em primeiro de março de 1994, o governo brasileiro introduziu
uma unidade de conta estável denominada de Unidade Real
de Valor (URV), que marca o início da reforma monetária.
O objetivo principal da desindexação foi eliminar o componente
inercial da inflação e “zerar a memória inflacionária”.
A URV seria corrigida diariamente pela taxa de inflação medida
por vários índices (IGP‑M, IPC‑FIPE e IPCA), sendo que o seu
valor, nessa fase, seria a própria taxa de câmbio (paridade fixa de
um para um com o dólar).
Bacha (2012, p. 143) explica que os contratos com preços e
salários foram redenominados nessa nova unidade de conta,
com poucas exceções. Os termos das conversões poderiam
ser negociados livremente, com exceção dos salários, aluguéis
residenciais, mensalidades escolares e preços e tarifas públicos.
Por que é mais fácil combater uma hiperinflação do
que eliminar inflações altas?
Giambiagi (2011, 147) comenta que, na inflação alta, os preços
acompanham os movimentos da inflação passada, enquanto
que, na hiperinflação, isso não ocorre: os preços passam a seguir
os movimentos de outra moeda (por exemplo, o dólar). Assim,
através da URV, implementou‑se uma reforma monetária que
anula a memória inflacionária, simulando uma hiperinflação,
sem viver suas consequências.
60
Economia Brasileira Contemporânea
Bacha (2012, p. 144) sustenta que a principal finalidade deste
segundo estágio era:
[...] alinhar os preços relativos mais importantes da
economia, uma vez que contratos indexados, com
indicadores e datas de reajuste diferentes, implicava
uma grande dispersão de preços a qualquer momento,
com alguns deles tendo sido reajustados recentemente
e outros apresentando uma grande defasagem. Em tais
circunstâncias, uma súbita interrupção do processo
inflacionário surpreenderia alguns preços em seu
valor de pico e outros no vale. Tais desalinhamentos
de preços tenderiam inevitavelmente a impor
pressões inflacionárias adicionais, na medida em que
cláusulas prévias de reajustes continuariam a forçar
para cima os preços defasados. Esse mecanismo
de indexação não sincronizado forçaria o chamado
componente inercial da inflação brasileira, distinto
do componente estrutural associado ao déficit
operacional ex ante do orçamento federal.
A URV durou apenas de março a junho de 1994. Em 1º de julho,
daquele ano, o Banco Central começa a emitir a URV como
a nossa nova moeda: o Real. Inicia‑se aqui o terceiro estágio:
a introdução do Real.
2.3 Estágio 3: a nova moeda e a âncora nominal
As medidas que afetaram diretamente a vidas das pessoas foram:
(1) a mudança na unidade monetária; (2) a conversão de todos
os contratos pré‑fixados em URV para reais; e (3) a limitação
da correção monetária à variação do Índice de Preços ao
Consumidor em reais (IPCr).
Unidade 2
61
Universidade do Sul de Santa Catarina
Admita que você recebesse seu salário no dia 25 de
junho de 1994, no valor de CR$ 4.000.000,00 (quatro
milhões de cruzeiros). Qual seria o valor do seu salário
em URVs? Você teria que identificar o valor da URV
do dia 25/06/94, que, no caso, era CR$2.547,09. Assim
sendo, bastaria dividir o valor de seu salário pelo valor
da URV diária (CR$ 4.000.000,00 / CR$ 2.547,09) para
encontrar o valor de seu contra‑cheque: 1.570,42 URVs.
Assim, quando praticamente todos os preços estavam
expressos em URV, o governo introduziu a nova moeda,
o Real (R$). Os preços em CR$ foram convertidos em R$,
agora dividindo‑se pelo valor da URV do dia, que, no
caso de nosso exemplo, seria 1º de julho: CR$2.750,00.
No momento da conversão, houve uma aceleração inflacionária,
já que alguns agentes tentaram elevar seus preços para tirar
alguma vantagem ou se precaver de um possível congelamento,
que, de fato, acabou não sendo efetivado.
Oliveira (2006, p. 117) lembra que, durante a apresentação da
Exposição de Motivos da Medida Provisória do Real, pode‑se
aprender a visão do então ministro da Fazenda Rubens Ricúpero.
O ministro assim apresentou as medidas:
A partir de 1º de julho, com a entrada da nova moeda,
os brasileiros começarão a sentir os efeitos da queda
decisiva da inflação. Cabe recapitular as medidas
preparatórias que, cuidadosamente elaboradas e
implementadas ao longo dos últimos doze meses,
permitem a Vossa Excelência transmitir ao País a
convicção de que a vitória agora conquistada sobre a
inflação nada tem de artificial ou efêmera, mas inaugura
um ciclo duradouro de estabilidade, prosperidade
crescente e – o que é mais importante – de justiça social
na história brasileira. (OLIVEIRA, 2006, p. 117).
Você também deve lembrar que o Plano Real foi implantado
em condições de período eleitoral, inclusive para a presidência
da República. Bacha (2012, p. 151), sobre o momento político,
lembra o seguinte:
Tendo‑se obtido a partir de 1º de julho de 1994 o controle
inflacionário inicial, todos os candidatos tiveram de adaptar
62
Economia Brasileira Contemporânea
seus discursos eleitorais à nova realidade monetária,
comprometendo‑se a manter intacto o plano caso fossem
eleitos. Mas o principal beneficiário do sucesso inicial
do plano foi seu autor, Fernando Henrique. No início da
campanha, as pesquisas de opinião conferiam‑lhe a metade
dos votos do candidato líder, Lula. Fernando Henrique
assumiu a liderança das pesquisas após a introdução do real
e elegeu‑se presidente com uma maioria de 54% dos votos
no primeiro turno.
Segundo Bacha (2012, p. 146), quando comparado a outros
programas de reforma monetária, o Plano Real apresentou cinco
principais características peculiares:
1. A desindexação de preços e salários foi precedida de
uma fase de indexação plena. Pode parecer estranha
essa medida, dado o diagnóstico de que a dificuldade
de controle da inflação residia exatamente no alto
grau de indexação de nossa economia. A explicação de
como seria possível uma acentuação no mecanismo de
indexação ajudar o combate à inflação é apresentada pelo
mesmo autor, Bacha (2012, p. 146).
2.A reforma monetária foi preanunciada, negociada
com o Congresso e introduzida sem congelamento
de preços e salários. Através de mecanismos informais
de consulta e de negociação para manter seus preços
constantes em reais, chegou‑se a acordos entre o governo
e os grupos empresariais mais importantes do país.
A cooperação foi negociada, e não imposta.
3. A estabilidade foi alcançada sem confisco de ativos
financeiros. Como você estudou, o Plano Collor I
decretou o bloqueio de 75% de todas as contas de curto
prazo por um período de 18 meses (apenas os 25%
restantes teriam liquidez imediata). Diferentemente,
o Plano Real procurou conscientizar a população
da necessidade de zerar o déficit operacional do
orçamento; obter do Congresso a aprovação da emenda
constitucional para garantir tal equilíbrio no período
1994/95; e, proceder à conversão monetária passo a
passo, introduzindo a nova moeda de forma transparente
e gradual. Prometia‑se uma estabilização, segundo Bacha
(2012, p. 158), “sem choque, sem congelamento e sem
Unidade 2
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Universidade do Sul de Santa Catarina
confisco” e, para conquistar a confiança da população,
seria feito apenas o que foi anunciado e anunciado apenas
o que seria feito.
4. Estabilização com políticas cambial e monetária
flexíveis. No estágio inicial do Plano Real, as autoridades
estavam comprometidas com um limite superior de
R$ 1,00 para US$ 1,00, para a taxa de câmbio real/dólar.
Além disso, as taxas de juros internas foram mantidas altas
o suficiente para evitar a depreciação do Real frente ao
Dólar, e foram estabelecidas restrições à entrada de capital
estrangeiro para evitar uma valorização excessiva do
real. O real operou com um regime de bandas cambiais,
mas com um teto fixo de R$ 1,00 para US$ 1,00 (banda
assimétrica), que durou apenas três meses. A política
monetária e a política cambial foram flexíveis, uma vez
que não obedeciam a metas monetárias estritas ou a um
regime cambial fixo.
5. A estabilização aconteceu no contexto de uma
economia em expansão. O fim de uma inflação muito
elevada tende a provocar uma retomada da atividade
econômica. A estabilização acontece sem recessão.
O Plano Real seguiu exatamente esta regra, apesar do
esforço para equilibrar o orçamento federal e a adoção
de taxas de juros reais elevadas. Você pode encontrar a
explicação para este fenômeno em Bacha (2012, p. 163).
Como explicar o funcionamento da chamada “âncora
monetária” e da “âncora cambial”?
A inflação foi também diagnosticada como de caráter inercial,
e seu controle dependia da ausência de choques no período
posterior à conversão da URV em real. Nesse sentido, o governo
anunciou metas de expansão monetária bastante restritivas,
limitou as operações de crédito e impôs depósito compulsório de
100% sobre as captações adicionais do sistema financeiro.
A política econômica pós‑plano tentaria controlar a demanda e
desestimular processos especulativos, mantendo as taxas de juros
64
Economia Brasileira Contemporânea
elevadas. O controle da demanda e da expansão monetária, nessa
fase, ficou conhecido como “âncora monetária”.
Segundo Giambiagi (2011, p. 152), em outubro de 1994,
o governo abandona a âncora monetária em prol da cambial e cita
duas grandes virtudes da âncora cambial: (a) estabelecer contratos
de longo prazo; e (b) exercer forte pressão sobre os preços no
setor de bens comercializáveis. A pressão a ser exercida sobre
os preços é dependente do grau de abertura da economia e do
desequilíbrio existente entre oferta e demanda no setor de bens
não comercializáveis.
Bens não comercializáveis internacionalmente podem
ser encontrados no setor de geração de energia,
da habitação, de transporte, de serviços pessoais e de
serviços educacionais.
A valorização da taxa de câmbio em um contexto no qual
o grau de abertura da economia do país tinha aumentado
significativamente, além de este possuir um volume significativo
de US$ 40 bilhões de reservas internacionais, foi muito
importante para romper com o processo inflacionário.
Gremaude (2011, p. 452) comenta que “com a manutenção
da taxa real de juros elevada e como permanecia o excesso de
liquidez internacional, o fluxo de capital externo se manteve”.
Como o Banco Central deixou o câmbio flutuar, ocorreu
uma profunda valorização da taxa de câmbio, estimulando
a importação em uma economia aberta e com um volume
significativo de reservas. Isto travou a possibilidade de aumento
do nível geral de preços e ficou conhecido como a “âncora
cambial” do Plano Real.
Como não existem
pressões competitivas
no setor de bens não
comercializáveis, quanto
maior a diferença entre
a demanda e a oferta
desses bens, espera‑se
que haja um crescimento
no consumo no período
imediatamente após a
estabilização. Assim sendo,
maiores tendem a ser
os preços no setor de
não comercializáveis
e, em consequência,
menor a redução do
nível geral de preços.
A adoção da “âncora cambial” traz algumas consequências
negativas para algumas variáveis econômicas, entre as quais:
(i) Reforça a absorção interna, podendo ocasionar
pressões inflacionárias e até o abandono do programa.
[Observação minha: lembre‑se de que a elevação
dos preços de bens não comercializáveis causa uma
Unidade 2
65
Universidade do Sul de Santa Catarina
redistribuição de renda para setores que possuem uma
maior propensão a consumir.]
(ii) Faz com que a economia perca competitividade no
comércio exterior, em função do aumento dos salários
médios em dólares (redistribuição de renda em favor dos
não comercializáveis).
(iii) Deteriora as contas externas devido à apreciação real
do câmbio, uma vez que a inflação interna cai; porém,
permanece acima da internacional por algum tempo.
(iv) Até que o programa se torne crível ou devido à
existência de rigidez em alguns preços, as taxas de
juros devem permanecer inicialmente superiores às
internacionais, para depois convergirem.
(v) Provoca ciclos na atividade real da economia.
(GIAMBIAGI, 2011, p. 152).
Giambiagi (2011, p. 153) avalia que o Plano Real apresentou
características comuns aos planos de estabilização baseados
em âncora cambial adotados em países com longa história
inflacionária. Entre essas características, destacou as seguintes:
‑ houve apreciação cambial, decorrente de um câmbio
pouco flexível e resistência na queda da inflação;
‑ a atividade real da economia sofreu um boom inicial com
queda do desemprego (1995) e posterior aumento deste;
‑ a expansão do produto (também) se baseou principalmente
no consumo (duráveis em particularmente, mais sensíveis ao
crédito), apesar de que, como na experiência internacional,
tenha ocorrido modesto aumento dos investimentos
produtivos e ganhos mais significativos de produtividade;
‑ os salários reais, nos primeiros períodos do plano,
também se elevaram;
‑ os índices de preços ao consumidor tenderam a ficar,
numa primeira fase, acima dos índices de preços do
atacado (onde os tradables têm maior peso);
‑ houve rápida deterioração da balança de conta‑corrente;
66
Economia Brasileira Contemporânea
‑ o Brasil teve os déficits em transações correntes
financiados por fluxos de capital, abundantes durante
certo tempo, que (também) se reverteram em momentos
de crise de confiança (Crise do México, Crise Asiática e
Crise Russa); e, por fim,
‑ o país sofreu uma crise cambial seguida de desvalorização
em 1999. (GIAMBIAGI, 2011, p. 153).
O humorista e apresentador de televisão Jô Soares
escreveu um texto sobre a chegada da nova moeda,
que foi publicado na Revista Veja, de 6 de julho de 1994.
Vale a pena conferir no Saiba Mais desta unidade!
Seção 3 – O primeiro governo FHC: os esforços em favor
da estabilização
A estabilização foi o tema dominante no primeiro governo de
Fernando Henrique Cardoso, que tomou posse em 1º de janeiro
de 1995.
Até aquele momento, o sucesso inicial do Plano Real era
incontestável. A inflação havia caído de pouco mais de 40% ao
mês para 1 a 2% no final do ano de 1994, conforme ilustrado na
Figura 1.4 (ver p. 27 da primeira unidade).
O governo Fernando Henrique inicia com intensa pressão.
Giambiagi (2011, p. 166) aponta pelo menos quatro razões:
1. A economia em processo de superaquecimento.
Este fato trazia à memória o ocorrido durante a
implementação do Plano Cruzado, quando o aumento
de consumo provocou o colapso da estabilidade.
Unidade 2
67
Universidade do Sul de Santa Catarina
2.O impacto da crise mexicana na economia brasileira.
No final de 1994, a situação de seu balanço de
pagamentos (BP) levou a uma forte desvalorização.
O fato alimentou as suspeitas de que regimes de câmbio
rígido poderiam não acabar bem, sendo o Brasil um
candidato potencial para ser afetado.
3. A queda das reservas internacionais do Brasil. Esta
pressão decorre do efeito combinado do crescimento da
demanda agregada e da redução da entrada de capitais
associada ao ambiente externo.
4. Certa resistência à queda da inflação. No primeiro ano de
implementação do Plano Real (julho de 1994 a junho de
1995), a variação de preços medida pelo INPC foi de 33%.
A visão existente no começo de 1995 era de que a inflação
voltaria com força, e a indexação se reinstalaria na economia.
Assim, no mês de março daquele ano, considerando as pressões
e desequilíbrios que ameaçavam a sustentação do Plano Real,
o governo brasileiro adotou um conjunto de medidas, com
destaque para:
„„
„„
desvalorização controlada, de aproximadamente 6% em
relação à taxa de câmbio da época;
alta da taxa de juros nominal, que passou de 3,3% em
fevereiro para 4,3% em março (taxa de juros expressa em
termos mensais).
Os efeitos dessas medidas logo apareceram. Bacha (2012, p. 171)
comenta que, a partir do segundo semestre de 1995, verificou‑se
uma recuperação das perdas das reservas internacionais (algo
em torno de US$ 10 bilhões). Atraídos pela rentabilidade das
aplicações em moeda local, os investidores retornaram ao país.
No final de 1995, o Brasil acumulou US$ 59 bilhões de reservas
internacionais. A situação esteve sob controle até a primeira metade
de 1996, quando os déficits comerciais começam a aumentar.
As medidas de ajustamento foram bem‑sucedidas em reverter a
tendência inflacionária. Durante quatro anos consecutivos, a taxa
anual de inflação caiu ano após ano. Por outro lado, as medidas
adotadas reverteram apenas temporariamente o déficit externo.
68
Economia Brasileira Contemporânea
Giambiagi (2011, p. 168) concluiu que o Plano Real, nas
circunstâncias de 1995, foi salvo por dois fatores: a política
monetária (a adoção dos juros altos) e a situação do mercado
financeiro internacional, que, naquele momento, havia recuperado
ampla liquidez e buscava a atratividade dos mercados emergentes.
A Figura 2.1 apresenta a evolução mensal da taxa de juros over/
selic, que é a base para a remuneração dos títulos do governo
federal, entre julho de 1994 e dezembro de 2002. Essas taxas são
extremamente elevadas, alcançando uma média de 26% por ano
no período 1995 a 2003.
Figura 2.1 – Taxa de juros Over/Selic (% a.a.) – Banco Central do Brasil: jul/1994 a
dez/2002
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
A taxa de câmbio e o desequilíbrio externo crescente têm
influência direta para que a taxa de juros apresente um patamar
mínimo bastante elevado, como se verifica na figura. Você deve
notar que, durante a crise mexicana, a elevação das taxas de
juros permitiu manter a taxa de câmbio e o país atrativo para
receber capital estrangeiro.
A crise econômica do
México em 1994, mais
conhecida como Efeito
Tequilla, tratou‑se de
uma crise de balança de
pagamentos associada à
especulação financeira,
resultantes de uma
crise política interna do
México. Segundo Kessler
(2001), após três semanas
do governo Ernesto
Zedillo, o Ministério
da Fazenda ampliou a
banda cambial em 15,3%
e, no dia seguinte, a
paridade peso/dólar foi
abandonada. “O valor do
peso imediatamente caiu
a metade de seu valor
nominal, mergulhando o
México numa depressão
surpreendentemente
profunda.” (KESSLER,
2001, p. 3).
Com a entrada de capital estrangeiro e a acumulação de
reservas após a crise mexicana, os patamares da taxa de juros
declinam até meados de 1996, e, a partir daí, praticamente
permanecem inalterados.
O governo precisou dobrar a taxa de juros em outras duas
ocasiões: na crise asiática em 1997 e na crise russa em meados
de 1998. Na crise asiática, o aumento dos juros e o pacote fiscal
adotado ainda foram eficazes. O mesmo não se pode dizer
quando da adoção dessas medidas na crise russa, como você verá
mais adiante.
Unidade 2
69
Universidade do Sul de Santa Catarina
A Figura 2.2 ilustra o comportamento da inflação, medido
pelo IGP_di, durante os dois governos de Fernando Henrique
Cardoso. Nos primeiros anos de seu governo, as taxas de inflação
apresentaram algumas oscilações, mas sempre com tendência
de baixa. A inflação conseguiu ser controlada durante todo o
período. Somente em fevereiro de 1999 e nos meses de outubro
e novembro de 2002, o índice mensal excedeu a 3%. Mas esses
números são insignificantes quando comparados aos 82% de
março de 1990.
Visualize os números da taxa de inflação no Brasil entre 1995 e
2002 no gráfico da figura 2.2 abaixo:
Figura 2.2 – Comportamento da taxa de inflação mensal brasileira, IGP di: 1995 – 2002
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
A inflação anual para o ano de 1995, medida pelo mesmo
indicador, foi de 14,8%; e, em 1996, já se encontrava abaixo de
dois dígitos, marcando 9,3%. Nos anos seguintes, caiu para 7,5%
em 1997 e 1,7% em 1998.
Oliveira (2005, p. 136) observa que um dos mecanismos
para o controle da inflação adotado no período foi a abertura
comercial. A oferta internacional contribuiu para a estabilização
principalmente dos preços agrícolas. Explica o autor:
Quando os produtores locais, como os de leite, arroz,
feijão ou trigo, pressionavam para obter aumentos, as
importações, beneficiadas por um câmbio sobre‑valorizado,
forçavam os preços internos para baixo. Isto pode ser
exemplificado pelos preços da cesta básica na cidade de
São Paulo, calculado pelo Departamento Intersindical de
Estudos Socioeconômicos (Dieese). Entre janeiro de 1995 e
dezembro de 1998, a cesta básica variou apenas 17,6%.
70
Economia Brasileira Contemporânea
Gremaude (2011, p. 455) afirma que a possibilidade de importação,
com a folga cambial e manutenção da taxa de câmbio, força os preços
a se acomodarem aos padrões internacionais, principalmente para os
produtos industriais. Por outro lado, essa estratégia de estabilização é
ineficaz para o caso dos produtos que não são comercializáveis.
Citamos como exemplos de mercadorias que não se
pode importar (não comercializáveis) principalmente
o setor de serviços, tais como: aluguel, mensalidades
escolares, médicos e alimentação fora de casa.
A Tabela 2.1 mostra a taxa de variação de preços de alguns itens
de agosto de 1994 a janeiro de 1997. No Índice de Preços ao
Consumidor (IPC), o setor de serviços tem grande importância
no seu cálculo, o que não ocorre no Índice de Preços por
Atacado (IPA). Este fato explica o % mais alto para o IPC
quando comparado ao IPA.
Tabela 2.1 – Variação de preços acumulada para alguns itens selecionados – agosto/1994
a janeiro/1997
Item
%
Item
%
Índice de Preços por Atacado (IPA)
22,88
Índice de Preços ao Consumidor (IPC)
55,04
Gêneros alimentícios
20,93
Alimentação fora do domicílio
48,14
Serviços de residência
66,58
Aluguel
198,12
Material escolar
36,41
Educação – cursos formais
132,13
Medicamentos
39,36
Médico, dentista e outros
92,46
Peças e acessórios – veículos
14,01
Serviços de oficina
28,94
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (adaptação de Gremaud, 2011, p. 456).
Vários itens da Tabela 2.1 ilustram o fato de que a variação
de preços no setor de serviços ficou bem acima da variação
dos preços dos produtos industriais. O preço dos alimentos
aumentou 20,93%, enquanto comer fora de casa ficou 48,14%
mais caro. O mesmo ocorreu com os preços dos medicamentos,
que aumentaram em 39,36%, enquanto os preços de serviços
médicos e dentários subiram 92,46%.
Unidade 2
71
Universidade do Sul de Santa Catarina
A eficácia dos remédios para a estabilização era cada vez
menor e trazia consigo alguns efeitos colaterais indesejáveis.
Você estudará, neste material didático, dois desses efeitos
principais: o desequilíbrio externo e a crise fiscal.
Seção 4 – Desequilíbrio do setor externo e a crise fiscal
Você conheceu até aqui aspectos da implementação do plano
econômico de maior êxito na história brasileira de combate à
inflação. Apesar do sucesso em seus primeiros meses de Plano
Real, a gestão macroeconômica deixava a economia brasileira
numa rota insustentável.
Bacha (2012, p. 124) aponta causas múltiplas para essa tendência:
a apreciação da taxa de câmbio, o déficit do setor público,
a indexação salarial e a expansão do crédito para o setor privado.
4.1 Desequilíbrio do setor externo
A apreciação do real e o aprofundamento do processo de
liberalização comercial trouxeram dificuldades adicionais
ao incentivarem o aumento das importações combinado ao
desempenho das exportações.
Você deve lembrar que, numa economia aberta, a taxa de
câmbio é uma variável importante. O fluxo de comércio exterior
e as decisões de investimento de empresas internacionais são
influenciados pelo seu preço. A Figura 2.3 descreve a trajetória
da taxa de câmbio mensal entre julho de 1994 a julho de 2002.
72
Economia Brasileira Contemporânea
Figura 2.3 – Taxa de câmbio mensal ‑ R$/US$: jul/1994 a jul/2002
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
O período julho de 1994 a dezembro de 1998 ficou caracterizado
como de estabilidade do câmbio, que oscilou dentro de uma
pequena margem de “bandas cambiais”. É exatamente nesse
período que o país apresentou o déficit da balança comercial.
Em 1999, com a introdução da política de flutuação
cambial, a taxa de câmbio passa a operar em outros
patamares. No final da série, a cotação do câmbio
alcança R$3,00, influenciada por fatores externos,
tais como os atentados de 11 de setembro de 2001
nos Estados Unidos e a crise argentina.
A Figura 2.4 mostra o desempenho do comércio brasileiro no
exterior. Ao visualizar o gráfico, você pode constatar que as duas
variáveis apresentaram grande oscilação e cresceram durante a
série. Giambiagi (2011, p. 169) comenta:
Nos três anos entre 1995‑1997 as importações em
dólar cresceram a uma taxa média de 21,8% a.a. – com
destaque para o crescimento de 51% em 1995 – enquanto
as vendas ao exterior cresceram apenas 6,8% a.a., em que
pese o fato de esses terem sido anos de grande expansão
do comércio internacional e nos quais a economia
mundial cresceu 4,3% a.a.
Unidade 2
73
Universidade do Sul de Santa Catarina
Figura 2.4 – Importações e Exportações (FOB) mensais, em US$ (milhões) – Banco Central
do Brasil: jan/1994 a dez/2002
Segundo Mariano (2012, p. 60),
a Balança de Serviços e Rendas é o
volume de transações relacionadas
a pagamento de bens intangíveis.
A subconta serviços contempla:
remuneração de serviços públicos
e privados; serviços de fretamentos
e seguros de transportes;
gastos realizados por turistas;
serviços financeiros e bancários,
corretagem, comissões e tarifas de
fianças; serviços de informática;
remuneração pela utilização
de marcas, patentes e licenças;
e serviços governamentais.
A subconta rendas contempla:
remuneração de trabalhadores;
renda de investimento direto
decorrente de lucros oriundos da
participação no capital de empresas;
e renda de investimentos em
carteira, referente a lucros e juros
auferidos por empresas que tenham
efetuado a emissão de papéis.
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
A balança comercial brasileira apresentou saldo negativo no
intervalo entre 1995 e 2000, muito influenciada pela abertura
comercial e política de câmbio valorizado. Segundo Oliveira
(2005, p. 140), a desvalorização cambial ocorrida em janeiro
de 1999 e as sucessivas crises cambiais até 2002 foram as
responsáveis pela inversão de tendência, contribuindo para o
aparecimento de superávit.
Os superávits comerciais do Brasil eram utilizados para compensar
os déficits na Balança de Serviços, que, a partir de 2001, passou
a ser chamada de Balança de Serviços e Rendas. Em 1995, com
a deterioração da Balança Comercial, começaram a aparecer os
déficits em transações correntes, conforme nos mostra as Figura 2.5.
Figura 2.5 – Balanço em transações correntes, em US$ milhões: 1994 a 2002
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do Banco Central).
Em 1994, o déficit em transações correntes foi de US$ 1,8 bilhões
e, em 1997, saltou para US$ 30,5 bilhões.
74
Economia Brasileira Contemporânea
A existência de déficits em transações correntes pode não ser
um problema a curto prazo, enquanto houver uma entrada de
recursos externos para financiá‑lo ou o país dispuser de reservas
internacionais suficientes. Para Gremaude (2011, p. 457),
“o problema é que se vai acumulando uma dívida externa que no
futuro pressionará a remessa de juros, e que em algum momento
deverá ser paga.”
A partir de 1995, a piora das transações correntes, influenciada
pelo desempenho da balança comercial e pela necessidade de
financiamento do déficit em transações correntes realimentou
os desequilíbrios externos. Como você pode observar na figura
anterior, o déficit de serviços, rendas e transferências unilaterais
quase que dobrou no primeiro governo de Fernando Henrique.
Os déficits apresentados no saldo de transações correntes durante
todo o período foi compensado pela entrada dos capitais externos.
O ingresso de capitais estrangeiros no Brasil continuou até o final
da década, proporcionando um aumento das reservas internacionais.
As reservas internacionais correspondem ao volume de
moeda estrangeira acumulado por um país (disponível
no cofre do Banco Central).
Gremaude (2011. p. 460), sobre a natureza do capital ingressante
no país, comenta que nos primeiros anos ocorre predomínio
dos investimentos de portfolio (ações, fundos de aplicação
financeira, fundos de privatização). O problema é que este tipo de
ingresso de capital é bastante volátil, o que significa dizer que os
especuladores podem facilmente deixar de investir no país.
Segundo Mariano (2012,
p. 60), as transferências
unilaterais “correspondem
a transações que envolvem
pessoas residentes e
não residentes no país
e não exigem nenhuma
contrapartida, por isso são
chamadas unilaterais.”
Segundo Leite (2011,
p. 58), o investimento
de portfolio é uma das
formas de movimento
internacional de capitais
e diz respeito somente
a ativos financeiros.
Os investimentos são
de curto prazo e seu
movimento se dá de
acordo com a remuneração
(taxa de juros do
país). Como se trata
de aplicação de curto
prazo, torna vulnerável
a situação financeira
do país hospedeiro.
Souza (2008, p. 259), sobre a ameaça de explosão das contas
externas, comenta que, no final de 1996, as reservas somavam
“US$60 bilhões no conceito de liquidez internacional e
estimava‑se que havia no país US$62 bilhões de capitais
especulativos.” As reservas seriam pulverizadas, caso esses
capitais fossem afugentados do país.
Unidade 2
75
Universidade do Sul de Santa Catarina
Segundo Leite (2011, p. 58),
o IED é um investimento de
longo prazo e representa um
importante canal para os fluxos
internacionais de capitais privados.
É a operação na qual uma
empresa cria uma subsidiária no
exterior ou compra uma empresa
já existente em outro país.
Outro importante movimento de capital internacional ocorre
através do Investimento Externo Direto (IED). A Figura 2.6
mostra o fluxo de IED, que aumentou de forma exponencial no
país, durante o governo Fernando Henrique.
Figura 2.6 – Investimentos diretos estrangeiros no país – US$ (bilhões) – Banco Central
do Brasil: 1994 a 2002
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
Oliveira (2005, p. 143) comenta que muitas empresas privadas
brasileiras foram vendidas para grupos estrangeiros, como
Bamerindus, Lacta, Metal Leve, Cofap e outras. Por outro
lado, tomando o exemplo do setor automobilístico, verificou‑se:
o ingresso da montadora Renault, Peugeot‑Citroen, Honda,
Toyota e outras; e a construção ou ampliação da planta da GM,
em Gravataí, Volkswagen, em Curitiba, e Ford, em Camaçari.
Como resultado do processo de privatização, ingressaram
no país US$ 30 bilhões de investimento direto estrangeiro
em empresas no período de 1996 a 2000.
A Figura 2.7 mostra o comportamento das reservas
internacionais do Brasil, em milhões de US$, destacando o
momento da ocorrência da crise mexicana, asiática e russa.
Você deve notar que as reservas cambiais alcançaram elevados
patamares no período em que o câmbio esteve apreciado.
76
Economia Brasileira Contemporânea
Figura 2.7 – Reservas internacionais – liquidez internacional – em US$ milhões: jan/1994
a dez/2002
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
O governo obteve sucesso nas medidas adotadas para conter
o ataque especulativo e manter a taxa de câmbio quando da
crise mexicana. Como você estudou anteriormente, a política
monetária (taxa de juros) seria utilizada para manter a taxa de
câmbio e atrair o capital estrangeiro para o país.
As reservas cambiais declinaram em torno de
US$ 10 bilhões nos primeiros três meses de 1995,
sob o efeito da crise mexicana. A partir de abril,
voltam a crescer continuadamente, até atingirem,
no fim de 1995, US$ 50 bilhões.
Bacha (2012, p. 171) comenta que os dados indicam uma mudança
muito significativa entre o início de 1995 e o final de 1996:
Em 1995, as entradas a curto prazo atraídas pelos
diferenciais de taxas de juros representaram a maior
parte do financiamento. Em 1996, as entradas de curto
prazo diminuíram, enquanto os investimentos diretos
e empréstimos de longo prazo representaram a maior
parte do financiamento. Tais movimentos sugerem que
os déficits comerciais eram menos preocupantes no fim
de 1996 do que no início de 1995, já que, pelo menos
temporariamente, um financiamento mais adequado
parecia estar a disposição do país.
Unidade 2
77
Universidade do Sul de Santa Catarina
Depois do efeito da crise asiática ter passado, em abril de 1998,
ocorre o pico das reservas cambiais de US$ 74 bilhões na série
mostrada na figura 2.6. Em seguida, sob os efeitos da moratória
decretada pela Rússia em agosto, as reservas declinam de
US$ 70,2 bilhões em julho de 1998, para US$ 45,8 bilhões em
setembro de 1998.
Após esse período, entre 1999 e 2002, as reservas cambiais situam‑se
entre US$ 30 e US$ 40 bilhões e não apresentaram qualquer
oscilação brusca, semelhante ao que acontecera anteriormente.
4.2 O setor público e a crise fiscal
As decisões de elevar as taxas básicas de juros e impor restrições
adicionais à expansão do crédito foi uma reação do governo aos
desequilíbrios que ameaçavam a estabilidade.
Os objetivos da adoção de uma política monetária baseada na
gestão da taxa de juros eram relacionados à necessidade de conter
a demanda para controlar a inflação; impedir que os déficits
comerciais se tornassem muito elevados; e manter o país atraente
ao capital estrangeiro (permitindo financiar, assim, os déficits em
transações correntes).
Uma das consequências negativas da política de
elevação das taxas de juros foi sobre o déficit público,
que interrompeu o processo de declínio da dívida
líquida do setor público como proporção do PIB.
Giambiagi (2011, p. 172) aponta a situação fiscal crítica como o
segundo grave problema do período que foi caracterizada pelos
seguintes fatos:
„„
„„
„„
78
Déficit primário do setor público consolidado.
Déficit público (nominal) de mais de 6% do PIB,
na média de 1995‑1998.
Dívida pública crescente.
Economia Brasileira Contemporânea
A Figura 2.8 mostra a trajetória da evolução da dívida pública
em relação ao PIB. Você pode observar que, a partir de 1996,
a dívida líquida se agrava continuamente, saltando de um nível
próximo de 28,0% em janeiro de 1996 para 56,0% em setembro
de 2002.
Figura 2.8 – Dívida líquida total do setor público mensal – com Petrobras e Eletrobrás –
(% PIB) – Banco Central do Brasil: 1994 a 2002
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
Segundo Oliveira (2005, p. 147), a política de juros adotada
pelo governo foi determinante para a elevação da dívida, que
tinha como causas a assunção de dívidas estaduais e municipais
pelo governo federal; o ajuste de contas do setor imobiliário; e
o socorro ao setor bancário através do Programa de Estímulo
à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro
Nacional (Proer).
Outro autor, Giambiagi (2011, p. 172), responsabiliza
principalmente a política fiscal expansionista pela piora do
resultado fiscal no período 1995 a 1998. Segundo este autor:
¾ da piora do resultado operacional das Necessidades de
Financiamento do Setor Público (NFSP) entre as médias
de 1991 – 1994 e 1995 – 1998 foram causadas pela
deterioração do resultado primário e só um quarto pela
maior despesa com juros reais.
A Tabela 2.2, que apresenta a necessidade de financiamento do
setor público como % do PIB, ilustra esse argumento em relação
à questão fiscal.
Unidade 2
79
Universidade do Sul de Santa Catarina
Tabela 2.2 – Necessidade de financiamento do setor público como % do PIB – Conceito
Operacionala
Composição
1991/1994
1995/1998
Deterioração
Composição (%)
Resultado primário
2,9
‑0,2
3,1
72
Juros reais
3,3
4,5
1,2
28
NFSPb
0,4
4,7
4,3
100
a
b
Médias anuais.
NFSP = Juros reais – Resultado primário
Fonte: Banco Central apud Giambiagi (2011, p. 174).
Os encargos financeiros, que se elevaram de 3,3% em 1991/1994
para 4,5% em 1995/1998, combinados com os baixos superávits
primários contribuíram para os elevados déficits operacionais e
para o acentuado crescimento da dívida pública.
A deterioração do superávit primário ocorre apesar da contínua
elevação da carga tributária diante do PIB, conforme mostra a
Figura 2.9.
Figura 2.9 – Carga tributária total (% PIB) – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística,
Sistema de Contas Nacionais: 1994 a 2002
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
Souza (2008, p. 265) observa que o pacote fiscal de 1998
inaugurou uma trajetória de aumento da carga tributária até
o final do governo Fernando Henrique. Só a partir do ano de
1999, começam a ser gerados crescentes superávits primários,
possibilitando o pagamento de juros.
80
Economia Brasileira Contemporânea
Quais as considerações sobre o desequilíbrio externo e
a crise fiscal ocorrida no período de 1995 e 1998?
Giambiagi (2011, p. 174) faz as seguintes considerações:
a)A âncora cambial sofreu um progressivo desgaste
como principal instrumento de política econômica.
Os problemas decorrentes de sua aplicação começaram
a se tornar crescentemente onerosos basicamente por
dois motivos: a deterioração das transações correntes,
causando um aumento dos passivos externos do Brasil;
e a necessidade de compensar o déficit externo mediante
a entrada de capitais atraídos pelas elevadas taxas de
juros (estas últimas pressionavam as contas públicas,
além de conter a atividade econômica).
b)A combinação de déficit em transações correntes e
taxas de juros elevadas, com o tempo e diante de três
crises internacionais, fez com que o espaço para o
endividamento público e externo se fechasse no decorrer
do segundo semestre de 1998.
O primeiro mandato de FHC terminou em um processo de
crise cambial, em função dos desequilíbrios gerados nas contas
externas e na situação fiscal. Além disso, a alta da taxa de
juros utilizada para combater os ataques especulativos contra o
real – as crises mexicana, asiática e russa – deixou de ser eficiente
e agravava a situação fiscal. Foi nesse contexto de crise que os
instrumentos adotados de política econômica se mostraram
exauridos, deixando um claro desafio para o período seguinte do
governo FHC: como corrigir esses desequilíbrios, assegurando
a estabilização, e recolocar o país numa trajetória de crescimento
econômico sustentável?
Unidade 2
81
Universidade do Sul de Santa Catarina
Seção 5 – O segundo mandato de FHC: a tríplice
mudança de políticas e as mudanças estruturais
A década de 1990 tem tudo para ser reconhecida como
uma “década de transformações”, época em que o primeiro
governo FHC será marcado por uma importante mudança
comportamental. Com o dragão da inflação dominado, os
consumidores passam a comparar os preços, forçando uma
disputa entre as empresas que sofriam a concorrência dos
produtos importados.
O primeiro governo foi também marcado pela
dependência da âncora cambial e pela adoção de uma
política fiscal “frouxa”, que dificultou a exportação e o
investimento privado e impediu a retomada sustentável
do crescimento. Apesar do quadro econômico
desfavorável em 1998, ocorre a reeleição do presidente
Fernando Henrique em outubro daquele ano.
Após a crise cambial de 1999, o tripé da política macroeconômica
muda para cambial, monetário e fiscal. Além disso, ocorrem
importantes reformas estruturais que você estudará a partir de agora.
5.1 A adoção do câmbio flutuante
Como você estudou, em 1998 os fundamentos da economia
brasileira se agravaram, aumentando a desconfiança dos credores,
e a crise russa dificultou ainda mais a obtenção de créditos externos.
A situação econômica era tão desfavorável que o governo não
esperou as eleições para começar a negociar um acordo com
o Fundo Monetário Internacional (FMI), em troca de um
empréstimo de US$ 41,5 bilhões.
Giambiagi (2011, p. 176) comenta que este acordo não previa
mudanças na política cambial, mas contemplava um aperto fiscal
em que o superávit primário passaria a 2,6% do PIB em 1999,
2,8% do PIB em 2000 e 3,0% do PIB em 2001.
82
Economia Brasileira Contemporânea
Apesar da defesa do regime cambial adotado
anteriormente, a 15 de janeiro de 1999, o novo
presidente do Banco Central, Armínio Fraga, decidiu
adotar o sistema de câmbio flutuante. O impacto foi
imediato, ocorrendo uma forte desvalorização de 60%
quando se compara o câmbio de fevereiro de 1999,
R$ 1,91, com o câmbio de dezembro de 1998, R$ 1,20.
Segundo Bacha (2012, p. 213), a adoção do regime flutuante
marca o início de uma nova fase. A depreciação da taxa de
câmbio chegou a ponto de o Brasil ter saldos elevados na conta
de comércio e reduzir significativamente o déficit em transações
correntes do balanço de pagamentos. Além disso, as contas do
setor público apresentaram superávits primários continuamente.
Quando se adotou o sistema de câmbio flutuante, a inflação entrou
numa trajetória ascendente. Para evitar o processo inflacionário,
adotou‑se uma política bastante restritiva, estipulando uma elevação
da taxa de juros (Selic) para 45% a.a. em março.
Para controlar a política monetária e as taxas de juros, é criado
o Comitê de Política Monetária (Copom) no início da gestão de
Armínio Fraga no Banco Central.
Por que a desvalorização do real não provocou os
efeitos inflacionários indesejáveis?
Giambiagi (2011, p. 177) aponta alguns fatos que explicam a
baixa inflação registrada quando da desvalorização cambial:
„„
„„
a produção industrial estava 3% abaixo do primeiro
trimestre de 1998 que, por sua vez, era 3% inferior àquela
do primeiro trimestre de 1995. Isto gerou uma retração
da demanda, que diminuiu muito a chance de repasse do
câmbio aos preços;
houve uma mudança de mentalidade indexatória em
decorrência de quase 60 meses (5 anos) de estabilidade e
do desmonte dos mecanismos de reajuste dos preços;
Unidade 2
83
Universidade do Sul de Santa Catarina
„„
„„
„„
„„
„„
a baixa inflação mensal inicial diminuiu muito o temor
do processo inflacionário;
a política monetária rígida pela adoção de uma taxa
de juros real de 15% cumpriu seu papel de evitar as
remarcações e de apreciar o real;
cresceu a confiança de que a economia estaria sob
controle em decorrência do cumprimento sucessivo das
metas fiscais acertadas com o FMI;
o aumento de menos de 5% nominais do salário
mínimo em maio de 1999 balizou reajustes baixos nas
negociações salariais da época;
foi estabelecida, em junho, uma meta de inflação de 8%
para o ano.
O último fato acima marca o início da adoção do sistema de
metas da inflação, o que vinha sendo estudado pela equipe
econômica desde o início do ano. Este é o nosso próximo assunto.
5.2 Sistema de Metas de Inflação
A perda da âncora cambial como referencial de preços pela
adoção do câmbio flutuante funcionou como uma espécie de
troca de âncora. O Banco Central adotou, a partir de julho de
1999, por meio da Resolução nº 2.615, do Conselho Monetário
Nacional, o Sistema de Metas de Inflação como regra para a
política monetária: a nova âncora.
O Sistema de Metas de Inflação
Com a adoção do sistema de metas de inflação, o Conselho
Monetário Nacional (CMN) ao definir um “alvo” para a variação
do IPCA, passou a balizar as decisões de política monetária do
Banco Central (BC) tomadas todos os meses pelo Comitê de
Política Monetária (Copom). Esta tomada de decisões acerca da
84
Economia Brasileira Contemporânea
taxa Selic com base em um modelo no qual a hipótese adotada
quanto à taxa de juros e à cotação cambial gera um certo
resultado da inflação, nos termos desse modelo. Assim,
teoricamente, se a variação dos preços resultante de incorporar
às equações uma hipótese correspondente à taxa de juros Selic
vigente na época se mostrasse inferior à meta, o BC estaria em
condições de reduzir os juros, enquanto, se a inflação estimada
fosse superior à meta, o BC deveria subir os juros. O sistema de
metas trabalha com uma margem de tolerância acima ou abaixo
da meta, para acomodar possíveis impactos de variáveis
exógenas, procurando evitar grandes oscilações do nível de
atividade. A meta inicial fixada para 1999 foi de 8% – com
tolerância de 2% acima ou abaixo do alvo – e, nessa mesma
oportunidade, adotaram‑se metas de 6% para 2000 e de 4% para
2001, passando a partir de então a se definir a meta para o ano t
no mês de junho de (t‑2). A inflação se manteve dentro do
intervalo previsto em 1999 e 2000, mas se situou muito acima do
teto em 2001 e, particularmente, em 2002.
Fonte: Giambiagi (2011, p. 177).
A relação existente entre a taxa de juros e a inflação é conhecida
por Regra de Taylor. É um sistema bastante eficiente para
a política monetária que já estava sendo adotado por vários
países: Nova Zelândia (1990), Chile e Canadá (1991), Israel e
Reino Unido (1992), Austrália e Suécia (1993), Espanha (1994),
Hungria e República Tcheca (1998), Brasil e Polônia (1999).
Com o sistema de metas de inflação, o Banco Central (BC) deixa
de cuidar da defesa de uma determinada taxa de crescimento do
PIB ou de uma determinada taxa de câmbio. O compromisso do
BC agora passa a ser com o patamar da inflação.
Segundo Gremaude (2011,
p. 476), quando a inflação
está crescendo, deve‑se
diminuir a demanda para
controlá‑la. Esta é a ideia
básica da Regra de Taylor.
O aumento da taxa de
juros provoca retração da
demanda, elevação do
desemprego e redução
do produto, fazendo
com que se diminuam as
pressões inflacionárias.
5.3 Superávit primário
Completando o terceiro tripé da política macroeconômica do
segundo mandato de Fernando Henrique, tem‑se a mudança
do desempenho fiscal. A partir de 1999, ocorrem superávits
primários conforme acordado com o FMI.
Unidade 2
85
Universidade do Sul de Santa Catarina
Segundo Gremaude (2011, p. 478), considerando o novo
contexto macroeconômico, a existência de superávits
primários seria importante para absorver os choques
na economia; liberar a taxa de juros para controle da
inflação; e permitir a estabilização através da redução
da dívida pública ao longo do tempo.
Com a desvalorização cambial, a taxa de juros pode descer
aos menores patamares desde a implantação do Plano Real.
Os gastos com juros continuam elevados em 1999, mas ocorre
uma pequena redução em relação aos do ano anterior.
O governo obteve um superávit primário de 2,92% do PIB em
1999. A Figura 2.10 mostra a evolução do resultado primário no
período 1994 a 2002.
Figura 2.10 – Resultado primário (%PIB): 1994 a 2002
Fonte: Elaboração do autor, 2013, a partir de informações de Giambiagi (2011, p. 173).
Nos anos seguintes, o superávit primário segue elevando‑se e
o déficit operacional reduzindo‑se em decorrência do aumento
significativo da arrecadação. Pelo menos dois fatos explicam
esse aumento:
1.O Congresso aprovou a Contribuição Provisória sobre
Movimentação Financeira (CPMF), o aumento do
Cofins e a cobrança da contribuição previdenciária dos
inativos e pensionistas do setor público.
2.Nos Estados e Municípios, existe forte elevação
da arrecadação do ICMS em decorrência da
desvalorização cambial.
86
Economia Brasileira Contemporânea
Além de o ajuste fiscal ter sido feito por elevação das receitas
de impostos, algumas mudanças estruturais relacionadas ao
comportamento das despesas foram implementadas. As principais
mudanças foram:
(i) A aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF),
em 2000. A LRF estabelecia limites para despesas com
pessoal em cada um dos três níveis de governo, dispositivos
para controle e transparência das contas públicas. Impôs
limites ao endividamento, proibiu novas renegociações de
dívidas entre entes da federação e penalizações aos gestores
públicos que não cumprissem a lei.
(ii) A reforma da previdência social. A reforma
previdenciária se dá em dois momentos. No primeiro,
em 1998, estabeleceu‑se uma idade mínima para novos
entrantes no serviço público e ampliou‑se a necessidade
de tempo de contribuição para quem já estava na ativa.
No segundo momento, em 1999, aprovou‑se o fator
previdenciário para o INSS, que alterou a regra de
cálculo dos benefícios e substituiu o preceito do tempo
de serviço pelo tempo de contribuição.
(iii) A renegociação das dívidas estaduais. A renegociação
consistia no comprometimento dos estados junto à União,
na federalização das dívidas, que seriam pagas em 30 anos
em parcelas mensais. Como contrapartida, conseguiu
evitar que os estados burlassem a regra de pagamento.
Gremaude (2011, p. 480) observa que, apesar dessas mudanças
estruturais, o gasto público manteve um crescimento elevado
durante todo o período. Isto reflete a dificuldade existente de se
cortarem gastos no país.
5.4 As reformas do período FHC
Uma das marcas registradas do governo FHC foi a continuidade
e o aprofundamento das reformas iniciadas no governo Collor.
Além das três reformas citadas anteriormente (a Lei de
Responsabilidade Fiscal, a Reforma da Previdência Social e a
Unidade 2
87
Universidade do Sul de Santa Catarina
Renegociação das Dívidas Estaduais), Giambiagi (2011, p. 181)
identifica mais sete mudanças importantes:
1. Privatização. Empresas deficitárias e superavitárias
com níveis inadequados de investimentos foram
desestatizadas. Esses gastos deixariam de pressionar
as contas públicas. A realidade forneceu argumentos
para os dois lados do debate sobre o tema das
privatizações. Houve um conjunto de consequências
positivas, mas que não chegou perto de um caso de
sucesso, como na Inglaterra de Margaret Thatcher.
Do lado negativo, o processo de privatização ficou
aquém do que fora inicialmente alardeado, mas
também não foi um caso de insucesso como o
ocorrido na Argentina, no final dos anos de 1990.
2.Fim dos monopólios estatais nos setores de petróleo
e telecomunicações. Permitiu que esses setores fossem
prerrogativa exclusiva de atuação do Estado.
3. Tratamento do capital estrangeiro. Abriu os setores
de mineração e energia à possibilidade de exploração
por parte do capital estrangeiro e permitiu que firmas
com sede no exterior passassem a dispor do mesmo
tratamento que as empresas constituídas por brasileiros.
A medida contribuiu para a elevação dos investimentos
estrangeiros a partir de 1995.
4.Saneamento do sistema financeiro. Algumas medidas
adotadas foram: (1) instituir o Programa de Estímulo
à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema
Financeiro Nacional (Proer); (2) privatizar a maioria
dos bancos estaduais; (3) facilitar a entrada de bancos
estrangeiros no mercado brasileiro; (4) favorecer um
processo de conglomeração no setor; (5) ampliar os
requisitos de capital para constituição de bancos; e
(6) melhorar substancialmente o acompanhamento e
monitoramento do nível de risco do sistema por parte
do Banco Central.
5. Ajuste fiscal, a partir de 1999. Tema já discutido
anteriormente.
88
Economia Brasileira Contemporânea
6.Criação de uma série de agências reguladoras de
serviços de utilidade pública. Agências criadas com
o intuito de defender os consumidores, assegurar
cumprimento de contratos, estimular níveis adequados de
investimentos e zelar pela qualidade de serviços nas áreas
de telecomunicações, petróleo e energia elétrica.
7. Estabelecimento de um sistema de metas de inflação
como modelo de política monetária. Apesar de
precário pela ausência de autonomia do Banco Central,
o estabelecimento de um sistema de metas de inflação
caracterizou um compromisso das autoridades com a
estabilidade de preços. Até então, isso era algo inédito
no país.
Ainda segundo Giambiagi (2011, p. 181), o conjunto de medidas
moldou a economia brasileira “com menor presença do Estado
nas atividades produtivas, sistemas financeiros sólidos, contas
fiscais sob controle e níveis de inflação relativamente baixos.”
5.5 A atividade econômica e o emprego
O segundo mandato do presidente Fernando Henrique apresentou
taxas de crescimento econômico próximas de uma média de 2,1%
a.a. A Figura 2.11 descreve a evolução do crescimento do Produto
Interno Bruto brasileiro entre 1994 e 2002.
Figura 2.11 – Evolução do PIB – variação real anual – (% a.a): 1994 a 2002
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
Unidade 2
89
Universidade do Sul de Santa Catarina
As expectativas de crescimento econômico no início do seu
mandato eram desfavoráveis. O governo havia promovido a
elevação dos juros simultaneamente à própria desvalorização do
Real, e o ajuste fiscal implementado indicava uma forte contração
da atividade econômica, para 1999.
A expectativa acabou não se concretizando, pelo menos em sua
intensidade, e, conforme você pode observar na Figura 2.11,
o PIB ainda conseguiu crescer um pouco, 0,25 % a.a. naquele ano.
Gremaude (2011, p. 485) avalia que o Brasil, com o câmbio
flutuante, poderia ter encontrado um caminho para o crescimento
sustentado pelo tripé metas de inflação, superávit primário e
câmbio flutuante. Esse tripé só produziu seus efeitos no ano
2000, em especial pela desvalorização cambial. Nesse ano, o país
apresentou a maior taxa de crescimento econômico do segundo
mandato de FHC, 4,31% a.a.
No ano de 2001, você pode observar que há uma forte
queda na taxa de crescimento, agora em torno de
1,31% a.a. A economia brasileira foi fragilizada por uma
combinação de eventos, incluindo a desaceleração da
economia mundial (causada pelo atentado terrorista
de 11 de setembro, o maior da história nos EUA),
o “colapso” da economia argentina (o Brasil foi afetado
pelo aumento do risco da região, diminuindo a entrada
de capitais), e a crise de energia (com a necessidade de
racionamento de energia elétrica).
Segundo Gremaude (2011, p. 487), neste cenário, as pressões
cambiais, a elevação da taxa de juros e o baixo crescimento de
2001 fizeram com que a dívida pública se elevasse naquele ano,
o que teve importância crucial para o ano seguinte. Assim,
em 2002, o PIB cresceu apenas 2,66%, e o baixo crescimento
econômico se refletiu no desemprego. A evolução da taxa mensal
de desemprego aberto da região metropolitana de São Paulo no
período 1994 – 2002 é mostrada na Figura 2.12.
90
Economia Brasileira Contemporânea
Você deve observar que o desemprego pula do
patamar de 9% no início do primeiro mandato para
12% no final do segundo governo de FHC. No mesmo
sentido, o desemprego médio do primeiro governo foi
10,18% e do segundo governo aumentou para 11,59%.
As taxas de desemprego apresentaram oscilações e uma tendência
de alta no primeiro governo. Por outro lado, declinaram até
próximo da metade do segundo governo. Em seguida, retomaram
um período de alta, com oscilações ao longo de todo o período.
Figura 2.12 – Taxa mensal de desemprego aberto da região metropolitana de São Paulo
(%) – Fundação Seade/PED: jan/1994 a dez/2002
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
Giambiagi (2011, p. 192) identifica o desempenho do mercado de
trabalho no período entre 1995 e 2002 como uma das razões para
a derrota do candidato do governo, José Serra, nas eleições de
2002. A política macroeconômica deixou a desejar em termos dos
seus efeitos sobre o emprego e a renda.
Você encerra aqui o estudo do período que compreende os dois
governos de Fernando Henrique, desde o Plano Real. O esforço
maior do governo foi no sentido de manter a estabilidade que será
também do próximo presidente: Luiz Inácio Lula da Silva.
Unidade 2
91
Universidade do Sul de Santa Catarina
Síntese
Nesta unidade, você conheceu o contexto econômico brasileiro
durante a concepção do plano de estabilização de maior êxito
da história brasileira: o Plano Real. Em seguida, estudou o
desdobramento, a concepção e a prática da implementação do
Plano Real em cada um dos seguintes estágios: (1) o ajuste fiscal;
(2) a desindexação; e (3) a nova moeda e a âncora nominal.
Conheceu como foi o primeiro governo Fernando Henrique (FHC),
os esforços em favor da estabilização e a natureza do desequilíbrio
das contas do setor externo e do setor público. O seu primeiro
governo foi marcado pela dependência da âncora cambial e pela
adoção de uma política fiscal “frouxa”, que acabou causando uma
profunda deterioração das contas públicas. Além disso, a valorização
cambial conduziu a um baixo crescimento econômico, pela
necessidade de se manterem elevadas as taxas de juros.
O término de seu primeiro governo ocorreu num contexto de crise,
quando o desafio para o período seguinte estava claro: a correção
desses desequilíbrios, assegurando a estabilização e recolocando o
país numa trajetória de crescimento econômico sustentável.
Aprendeu que o segundo governo FHC foi muito diferente do
primeiro. Após a crise cambial de 1999, mudou o tripé da política
macroeconômica, adotando o câmbio flutuante, o sistema de
metas para a inflação, e a austeridade fiscal com metas para o
superávit primário.
Foi um governo marcado pela continuidade e aprofundamento
das reformas iniciadas no governo Collor, incluindo a Lei de
Responsabilidade Fiscal, a reforma da Previdência Social,
o ajuste fiscal nos Estados, o fim dos monopólios estatais nos
setores de petróleo e telecomunicações, e a reinserção do Brasil
no mundo. Finalmente, você conheceu que o desempenho fiscal
e externo melhorou, mas o país continuou apresentando baixas
taxas de crescimento econômico e alto desemprego.
92
Economia Brasileira Contemporânea
Atividades de autoavaliação
Ao final de cada unidade, você realizará atividades de autoavaliação.
O gabarito está disponível no final do livro didático. Mas esforce‑se para
resolver as atividades sem ajuda do gabarito, pois, assim, você estará
promovendo (estimulando) a sua aprendizagem.
1) A política econômica no Brasil durante boa parte dos anos 90 do século
passado foi marcada por tentativas de controle da inflação. Com relação
a esse período e ao plano de estabilização de maior sucesso no Brasil,
o Plano Real, julgue cada um dos itens seguintes:
I. Pode‑se dizer que uma das medidas de sucesso do Plano Real (1994)
para o controle inflacionário foi a política cambial adotada, que
gerava redução dos saldos da balança comercial.
II. A ancoragem cambial utilizada no Plano Real tinha por objetivo
segurar o preço dos produtos não comerciáveis e tentar coordenar
expectativas futuras em relação à trajetória dos preços.
III. Através de mecanismos informais de consulta e de negociação,
a reforma monetária foi preanunciada, negociada com o Congresso
e introduzida sem congelamento de preços e salários.
IV. O diagnóstico da inflação que fundamentou o Plano Real atribuía a
inflação corrente à indexação da economia e ao desajuste das contas
públicas pela responsabilidade nos aumentos de preços.
Os itens relacionados anteriormente devem estar em conformidade
e/ou apresentar uma relação adequada com os estudos realizados até
aqui (conteúdo da disciplina). Assinale a opção INCORRETA e justifique
sua escolha:
a. ( ) Apenas o item (II) está incorreto
b.( ) Apenas o item (I) e (IV) está incorreto
c. ( ) Apenas o item (II) e (IV) está incorreto
d.( ) Apenas o item (III) está incorreto
e. ( ) Apenas o item (IV) está incorreto
Unidade 2
93
Universidade do Sul de Santa Catarina
2) Leia a afirmação a seguir, extraída de uma entrevista à revista Veja,
em 5/5/1999, feita por Paul Krugman, ganhador do Prêmio Nobel de
Economia em 2008:
O Brasil é um país onde são muito fortes as forças em
favor da gastança de recursos públicos sem lastro.
Creio que deva ser um dos últimos países do mundo
nessa situação. Mas, sinceramente, não acredito que
jogará fora as conquistas que já obteve no campo da
racionalização fiscal.
A partir de 1999, o governo brasileiro põe fim à situação tradicional
de falta de maior controle das contas públicas a que se refere Paul
Krugman. Identifique e explique duas mudanças adotadas pelo
governo brasileiro no sentido de controlar as contas públicas, em texto
com no máximo 15 linhas.
94
Economia Brasileira Contemporânea
3) Leia a afirmação a seguir, extraída de uma entrevista à revista Veja,
em 5/5/1999, feita por Paul Krugman, ganhador do Prêmio Nobel de
Economia em 2008:
No caso do Brasil, vendo o filme de trás para frente,
alguém será capaz de dizer que o presidente brasileiro
poderia ter deslanchado o plano de estabilização
promovendo ao mesmo tempo a desvalorização da
moeda. É fácil falar agora, mas na época a manobra
não parecia tão óbvia ou factível. Se Fernando Henrique
tivesse conseguido fazer isso, ele seria visto hoje
como um dos grandes gênios econômicos do século.
Infelizmente a realidade é mais triste. Não foi culpa dele.
Ao longo do primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso, houve
um profundo desgaste da âncora cambial. Explique os motivos da
ocorrência do desgaste da apreciação do Real, utilizando argumentos
apresentados no material didático.
Unidade 2
95
Universidade do Sul de Santa Catarina
Saiba mais
Se você desejar, aprofunde os conteúdos estudados nesta unidade
ao consultar as seguintes referências:
ARAUJO DE SOUZA, Nilson. Economia brasileira
contemporânea: de Getúlio a Lula. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2008.
BACHA, Edmar Lisboa. Belíndia 2.0: fábulas e ensaios sobre o
país dos constrastes. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012.
GIAMBIAGI, Fabio; VILLELA, André; HERMANN,
Jennifer; BARROS DE CASTRO, Lavínia. Economia
brasileira contemporânea. 2. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011.
GREMAUD, Amaury P. Economia brasileira contemporânea:
para cursos de economia e administração. 7. ed. São Paulo:
Atlas, 2011.
LEITE, André Luis da Silva. Finanças internacionais: livro
didático. 3. ed. Palhoça : UnisulVirtual, 2011.
DE AO REAL
Jô Soares
Do nome que já trazes do teu berço altivo,
nascendo assim, sem mais, trazendo sangue azul,
já és de fato, e tão adjetivo
quanto a constelação do Cruzeiro do Sul.
Real! Que nome lindo e cheio de esperança,
só mesmo sendo nobre pra de supetão,
num gesto audaz, viril, usando em riste a lança,
matar, como São Jorge, o dragão da inflação.
Não sei por que ninguém pensou: sensacional!
Trocar o nome logo de nosso dinheiro:
se perde o seu valor, que idéia genial!
É só mudar o nome do plebeu cruzeiro.
96
Economia Brasileira Contemporânea
O que me aflige ainda é que no plano inteiro
ninguém imaginou nem viu este percalço:
como saber de cara olhando este dinheiro
quando o real é real ou quando o real é falso?
E fico pensando se vai ser aceita
na hora de pagar a conta do açougueiro.
O seu Manoel estuda a nota recém‑feita:
“Este real é falso, o senhor não tem cruzeiro?”
E o que será leitor, realmente um falso real?
Isso me deixa neste instante curioso:
é apenas uma falsificação genial
ou não passa de um rei que é muito mentiroso?
E outra dúvida cruel já me atormenta,
nesta hora vital da troca de dinheiro.
O que vai valer mais depois dessa tormenta?
O real falso ou um cruzeiro verdadeiro?
Em vez deste real seria melhor talvez
pra termos finalmente a inflação em queda
trocar mesmo por dólar logo de uma vez
todo o dinheiro lá da casa da moeda.
Fonte: Revista Veja, 6 de julho de 1994, edição 1347. Disponível em: <http://veja.abril.
com.br/acervodigital/home.aspx>. Acesso em: 8 jan. 2013.
Unidade 2
97
UNIDADE 3
As mudanças recentes na
economia brasileira: a euforia
Objetivos de aprendizagem
„„
Compreender o contexto econômico e político no início
do governo Lula.
„„
Aprender sobre o desempenho do sistema de metas de
inflação, que apresentou uma tendência contínua de
queda das taxas de inflação.
„„
Conhecer como se desenvolveu a política fiscal e o
desempenho das contas públicas nos dois governos Lula.
„„
Conhecer o desempenho externo de nossa economia,
com destaque para as contas do Balanço de Pagamento
e da Balança Comercial.
„„
Aprender como se deu a retomada do crescimento
econômico, que havia entrado em colapso desde os anos 80,
e a posição do país frente à crise econômica internacional.
„„
Discutir o comportamento do emprego, da distribuição
da renda e da pobreza dos anos 1990 aos dias atuais.
Seções de estudo
Seção 1 Início do governo Lula
Seção 2 Acertando o alvo e a estabilidade monetária
Seção 3 A fantasia fiscal e as contas públicas
Seção 4 O desempenho externo e o balanço de pagamentos
Seção 5 A retomada do crescimento econômico com
distribuição de renda
Seção 6 Dilma Rousseff: as nossas insuficiências
3
Universidade do Sul de Santa Catarina
Para início de estudo
Nesta unidade, você conhecerá a condução da política econômica
e os indicadores aparentemente exuberantes obtidos no período
2003 – 2010. Perceberá que a estabilização e as reformas
econômicas da década de 1990, assim como as melhorias
da política social, criaram as condições para a retomada do
crescimento e a redução da desigualdade e da pobreza durante a
primeira década do século XXI.
Primeiramente, analisará o contexto econômico e político
no início do governo Lula, tratando das desconfianças em
relação ao novo governo, da eleição presidencial e das medidas
econômicas de transição.
Em seguida, com o título “acertar o alvo e a estabilidade
monetária”, aprenderá que, ao longo dos dois governos de Lula,
as metas de inflação foram cumpridas dentro do intervalo de
tolerância e apresentaram uma tendência contínua de queda.
Também conhecerá como se desenvolveu a política fiscal e o
desempenho das contas públicas, e analisará a trajetória da taxa
de câmbio nominal, que apresentou uma apreciação substancial,
bem como o desempenho externo de nossa economia, com
destaque para as contas do Balanço de Pagamento.
Você conhecerá como se deu a retomada do crescimento
econômico, que havia entrado em colapso desde os anos 80, e os
seus efeitos sobre o emprego, a distribuição da renda e a pobreza.
Finalmente, você reconhecerá que são enormes os avanços do
país quando se compara a situação atual com aquela descrita na
primeira metade dos anos 1990: o que justifica a utilização no
título desta unidade da palavra “euforia”. Apesar disso, o Brasil em
2013 continua com alguns problemas similares aos que existiam
em meados da década de 1990 e que precisam ser enfrentados.
100
Economia Brasileira Contemporânea
Seção 1 – Início do governo Lula
Você já descobriu que o governo Fernando Henrique terminou
com um quadro de instabilidade econômica relacionada a
pressões cambiais, a uma aceleração da inflação e ao risco‑país.
As medidas implementadas no seu governo não foram suficientes
para gerar crescimento sustentado.
Nesta seção, você irá compreender o contexto econômico e político
no início do governo Lula, que, na visão de muitos analistas,
passou por um processo de moderação e caminho para o centro.
1.1 As desconfianças em relação ao novo governo
Em 2002, os problemas econômicos refletiam, em parte, uma
crise de desconfiança em torno do que ocorreria com a política
econômica com o novo governo.
O Banco Central apurou, em janeiro de 2002, uma
expectativa inflacionária de 4% , variação pelo IPCA,
para o ano de 2003. Em novembro, estando clara
a eleição de Lula e com um cenário de dólar em
desvalorização (em janeiro de 2002 estava a R$2,37,
enquanto no mês de outubro alcançou R$3,80),
a expectativa para a inflação de 2003 chegou a 11%.
Pois bem, lembre também que o governo precisou lidar com
uma sucessão de choques adversos: a crise de energia, o estouro
da bolsa de valores Nasdaq, o 11 de Setembro, a moratória da
Argentina e a forte possibilidade de assumir a presidência da
república um partido de esquerda.
Quais eram as desconfianças relacionadas à postura do
Partido dos Trabalhadores (PT)?
Unidade 3
101
Universidade do Sul de Santa Catarina
Gremaude (2011, p. 491) comenta que, historicamente,
as políticas defendidas pelos seus membros eram:
„„
redução das despesas com juros (pela queda acelerada dos
juros e/ou pela renegociação da dívida);
„„
redução do superávit primário;
„„
repulsa ao acordo com o FMI;
„„
críticas ao regime de metas de inflação; e
„„
questionamentos relacionados à privatização e ao papel
das agências reguladoras.
Desta forma, as políticas defendidas anteriormente colocavam em
dúvida o compromisso com a estabilidade e incertezas em relação
à preservação dos contratos, contribuindo para agravar o quadro
de instabilidade de 2002. A posse de Lula assumiu, portanto,
outro significado: seu governo servia como um teste importante
para a economia brasileira.
A defesa da estabilidade, desde o período Collor/Itamar, e a
austeridade fiscal, a partir do final dos anos 1990, faziam
parte do discurso das mudanças. Porém, o mercado colocava
dúvidas sobre até que ponto esses compromissos seriam também
assumidos pelo governo seguinte.
Giambiagi comenta a possibilidade de se elencar uma longa lista
de declarações que fundamentavam essas dúvidas. A seguir,
reproduzimos algumas dessas declarações e sua autoria
(GIAMBIAGI, 2011, p. 199):
Está mais do que na hora de submeter à população
um plebiscito nacional sobre a dívida externa que
esclareça os prejuízos decorrentes de manter essa
situação de submissão às regras do FMI que mantém
o país prisioneiro do capital financeiro internacional.
(TAVARES, Maria da Conceição. [Ex‑deputada federal
do PT e, na época, conselheira de Lula], 02 jul. 2000.
Folha de São Paulo).
102
Economia Brasileira Contemporânea
Apoiamos a iniciativa da CNBB de realizar um plebiscito
sobre o endividamento do país. (MERCADANTE,
Aloísio [Deputado federal do PT na época]. 04 set. 2000.
Jornal do Brasil).
A meta de superávits primários de 3% (do PIB) de 2001
a 2004, contida na última LDO, é exagerada e suicida
para uma economia que precisa de investimentos.
(MANTEGA, Guido. 10 maio. 2001. Valor Econômico).
Precisamos, em primeiro lugar, readquirir o controle
sobre nossa política fiscal e monetária, hoje comandada
pelo FMI, a serviço da geração de superávits primários
para pagar os credores. (SILVA, Luís Inácio Lula da. [na
época, presidente]. 02 maio. 2000. Valor Econômico).
O teor dessas declarações e uma leitura do primeiro documento
oficial do partido, intitulado “Um outro Brasil é possível”,
de 2001, e que, posteriormente, foi complementado, ajudam a
compreender o comportamento do mercado financeiro em 2002.
Com a possibilidade de vitória de Lula nas eleições,
ao longo de 2002 observou‑se uma mudança de
discurso, em que teve papel fundamental a indicação
de Antônio Palocci como coordenador do programa
de governo. Palocci transmitia a ideia da estabilidade,
da defesa dos contratos, da preservação do ajuste fiscal
e da garantia de pagamento das dívidas.
Para Giambiagi (2011, p. 203), três documentos do Partido
dos Trabalhadores confirmam essa mudança de posição no ano
de 2002: a “Carta ao Povo Brasileiro”, em junho; o programa de
governo, apresentado em julho; e, a “Nota sobre o Acordo com
o FMI”, em agosto. Além desses, o documento oficial “Política
Econômica e Reformas Estruturais” sacramentam a mudança,
em 2003, na gestão do ministro da Fazenda Antônio Palocci.
Unidade 3
103
Universidade do Sul de Santa Catarina
1.2 A eleição do presidente Lula
Os brasileiros elegeram, no dia 27 de outubro de 2002, Luiz Inácio
Lula da Silva como seu presidente. No mesmo dia, em seu discurso
de posse, Lula procurou deixar claro que a palavra chave de seu
governo seria “mudança”.
Segundo Giambiagi (2011, p. 197), a posse de Luiz Inácio Lula
da Silva teve um significado político‑ideológico importante:
representou a ascensão da esquerda ao poder. O governo de Lula
“encarnou” uma mensagem de transformação comparável apenas
à posse de Salvador Allende no Chile, nos anos de 1970.
Souza (2008, p. 288), sobre o discurso do presidente eleito, lembra
que não se tratava de qualquer mudança e cita os seguintes trechos
do discurso:
O Brasil, nesta nova empreitada histórica, social, cultural
e econômica, terá de contar, sobretudo, consigo mesmo,
terá de pensar com a sua cabeça, andar com as suas
próprias pernas, ouvir o que diz seu coração. E, para
isso, basta acreditar em nós mesmos, em nossa força,
em nossa capacidade de criar e em nossa disposição para
fazer. Estamos começando hoje um novo capítulo na
História do Brasil, não como nação submissa, não como
nação injusta, assistindo passivamente o sofrimento dos
mais pobres, mas como nação altiva, nobre, afirmando‑se
corajosamente no mundo como nação de todos.
Na apresentação de seu livro, Mercadante (2006) comenta que a
eleição de Lula foi uma esperada e extraordinária conquista das
forças progressistas do Brasil, que sempre tiveram o compromisso
maior de transformar o país para uma sociedade mais justa e digna.
Complementou, ainda, que “transformações inadiáveis, dentro
do Estado de Direito, sem rupturas [grifo meu], violência ou
autoritarismo, finalmente tiveram a chance de ser incorporadas à
agenda do país.” (MERCADANTE, 2006, p. 13).
Segundo Souza (2008, p. 288), a ampliação de sua base política
teve um peso decisivo na eleição de Lula.
104
Economia Brasileira Contemporânea
Na época, o senador José Alencar foi indicado para
a vice‑presidência e foi obtido o apoio de várias
lideranças do PMDB, tais como: Orestes Quércia,
Roberto Requião, José Sarney e Itamar Franco.
A coligação “Lula Presidente” era composta pelos partidos PT,
PL, PC do B, PMN e PCB, e a coligação “Grande Aliança”
pelo PSDB e PMDB. Após a vitória de Lula, em nome da
governabilidade, o PMDB foi convidado a fazer parte do governo
mesmo tendo apoiado o candidato José Serra para a presidência
em 2002.
Com a Constituição de 1988, a aprovação das Emendas
Constitucionais exigiria três quintos dos votos das duas casas
do Congresso. A Tabela 3.1 mostra a distribuição das bancadas
partidárias na Câmara dos Deputados na eleição de 2002.
Tabela 3.1 – Distribuição das bancadas partidárias na Câmara dos Deputados na eleição
legislativa de 2002
Partidos
Deputados
Participação %
PT
91
17,7
PFL
84
16,4
PMDB
74
14,4
PSDB
71
13,8
PPB
48
9,4
Outros
145
28,3
Total
513
100
Fonte: Elaboração do autor, 2013, com base em Giambiagi (2011, p. 202).
Observe que o PT obteve apenas 17,7% dos votos na Câmara dos
Deputados. A aprovação de uma emenda exigiria a soma de todos
os votos dos quatro partidos com mais bancadas, explicando a
necessidade do chamado “presidencialismo de coalizão”, adotado
no governo Fernando Henrique e, agora, no governo Lula.
Unidade 3
105
Universidade do Sul de Santa Catarina
1.3 As medidas econômicas de transição
O primeiro desafio do governo seria conter e reverter a
instabilidade de 2002. Gremaude (2011, p. 492) comenta que
a situação vivida pelo país era de “dominância fiscal”:
Para aquele nível de juros, crescimento econômico e
montante de dívida, o superávit primário prometido
pelo governo era insuficiente para estabilizar a dívida.
Assim, a reversão da situação passaria por uma
sinalização do novo governo de que este geraria um
superávit primário superior aos 3,75% do PIB do governo
FHC, em nível suficiente para estabilizar e reverter a
tendência de crescimento da dívida.
Segundo o mesmo autor, o PT deveria sinalizar o compromisso
com a estabilidade, rompendo com seu discurso contra elevação
das taxas de juros, e com a ampliação do ajuste fiscal, rompendo
com as ideias anteriores de redução do superávit primário.
Mas qual deveria ser o nível de superávit primário?
Segundo Giambiagi (2011, p. 204), esta era uma questão aberta,
em razão das dificuldades para se conhecerem as taxas futuras de
juros e de crescimento do PIB, existindo uma percepção de que o
superávit de 3,75% do PIB, para 2003, já não era mais suficiente.
Lembrou também a existência de uma fórmula para calcular o
superávit primário necessário para manter estável a relação dívida
pública/PIB, que é:
p = d . (i – q) / (1 + q) – s
Onde:
p é o superávit primário expresso como proporção do PIB;
d é a relação dívida pública/PIB;
i é a taxa de juros real da dívida pública;
q é o crescimento da economia;
s expressa a relação “Senhoriagem”/PIB.
106
Economia Brasileira Contemporânea
A “Senhoriagem” /PIB corresponde ao fluxo de financiamento
através da emissão monetária, enquanto que “d” considera a
dívida “pura” (aquela que rende a necessidade de pagamento
de juros).
A expressão acima revela que quanto maior (menor) a dívida
pública e a taxa de juros e menor (maior) o crescimento da
economia e/ou a emissão monetária para financiar parte do
déficit, maior (menor) terá que ser o superávit primário a ser
alcançado para evitar que a relação dívida pública/PIB aumente.
A Tabela 3.2 mostra o conjunto de superávit primário requerido
para valores de taxas de juros e de crescimento da economia,
considerando uma dívida inicial de 55% do PIB e uma
senhoriagem de 0,4% do PIB (numa condição de inflação baixa).
Segundo relatório do
BACEN (2011, p. 56),
“a senhoriagem pode ser
definida como a receita
ou o lucro do governo
proveniente do monopólio
de emissão de moeda.”
Em 2010, o fluxo relativo
às receitas de senhoriagem
foi de R$15.848.166 e,
em 2011, R$20.291.041.
Tabela 3.2 – Superávit primário requerido para estabilizar a relação dívida pública/PIB (% PIB),
com d = 0,55 e s = 0,004
Crescimento real do PIB (%)
Taxa de juros real (%)
2
3
4
5
8
2,8
2,3
1,7
1,2
9
3,4
2,8
2,2
1,7
10
3,9
3,3
2,8
2,2
11
4,5
3,9
3,3
2,7
12
5
4,4
3,8
3,3
Fonte: Giambiagi (2011, p. 205).
No início de 2003, as perspectivas para a taxa de crescimento
de 2% e a taxa de juros real de mais de 10% sinalizavam para a
necessidade de um superávit primário em torno de 3,9% do PIB.
Você deve notar que, se a economia crescesse mais e os juros
diminuíssem, a relação superávit primário/PIB também poderia cair.
Além disso, caso o objetivo fosse diminuir a relação dívida/PIB,
o superávit a ser obtido deveria ser maior do que aquele estimado
pela fórmula anterior.
Além disso, paralelamente à política fiscal, a política monetária
exigia decisões em relação às taxas de juros. Muitos analistas
Unidade 3
107
Universidade do Sul de Santa Catarina
julgavam que o aumento definido de 18% para 25% da taxa
de juros Selic havia sido insuficiente para conter o processo
inflacionário, além de aplicado tardiamente.
O governo manteve toda a diretoria do Banco Central e nomeou para
o cargo de presidente Henrique Meirelles, que havia anteriormente
ocupado a presidência do Bank Boston. As primeiras medidas
econômicas tomadas pelo novo governo foram no sentido do ajuste
fiscal e da estabilidade. Detalhadamente:
„„
„„
„„
„„
Elevou a meta do superávit primário de 3,75% para
4,25% do PIB em 2003 e também para os demais três
anos do governo Lula.
Ordenou cortes do gasto público, na intenção de
viabilizar o objetivo fiscal.
Elevou a taxa de juros básica, já nas primeiras reuniões
do Copom, deixando claro o firme propósito em relação
à estabilidade.
Anunciou metas de inflação de 8,5% e 5,5%,
respectivamente, para 2003 e 2004, reforçando a
política anti‑inflacionária.
O conjunto dessas medidas sinalizou para a nova postura em
relação à política econômica, deixando de lado muitas das
bandeiras defendidas pelo partido até ali. O mais importante foi
prevalecer a tese de que a estabilidade e a austeridade fiscal devam
se constituir em políticas de Estado, e não apenas de governo.
As medidas fiscais e monetárias, vistas como “pró‑mercado”,
geraram resultados positivos em relação à inflação. Lembre‑se
de que a abundância de liquidez internacional e as medidas
monetárias restritivas (elevação das taxas de juros) contribuíram
para a apreciação de nossa moeda, ajudando no combate à
inflação. Em relação à atividade econômica, essas medidas
comprometeram o desempenho do PIB em 2003.
Além das medidas fiscais e monetárias, o compromisso
do novo governo com as reformas estruturais (proposta de
reforma tributária e de reforma da previdência) foram também
108
Economia Brasileira Contemporânea
vistas como favoráveis “pró‑mercado”, amenizando a onda de
desconfiança anterior à eleição de Lula.
Segundo Cardoso (2013, p. 206), o governo Lula, nos dois
primeiros anos de seu mandato, efetivamente promoveu duas
reformas estruturais:
1.A primeira, de caráter macroeconômico, consistiu na
emenda constitucional que definiu as regras para a
criação de regimes de previdência complementar para
servidores por capitalização e estabeleceu o teto para
remuneração de servidores federais;
2.A segunda, de caráter microeconômico, incluiu a nova
legislação de falências, a legislação que criou os empréstimos
consignados em folha de pagamento, e aprimoramentos
relacionados à execução de garantias nos casos de alienação
fiduciária em financiamentos imobiliários.
Após o segundo ano de seu governo, Lula deixou de lado as
agendas de reformas e buscou apoio junto à ala contrária às
políticas implementadas até ali. Você deve lembrar que, em
meados de 2005, ocorreram denúncias de corrupção envolvendo
pagamentos a parlamentares, conhecido por “mensalão”.
Sobre as denúncias relativas ao financiamento ilegal de
campanhas associadas a desmandos e desvios administrativos no
último ano do primeiro mandato de Lula, Mercadante (2006,
p. 15) avaliou que elas não podem ser subestimadas, e comentou:
É essencial ter a clareza e a humildade para assumir que,
em nosso denso esforço de reconstrução do Brasil, marcado
por tantos êxitos, lamentavelmente cometemos erros
importantes. Seguramente o mais grave foi errar naquilo
que não tínhamos o direito de errar: o império da ética.
Unidade 3
109
Universidade do Sul de Santa Catarina
Seção 2 – Acertando o alvo e a estabilidade monetária
A gestão do governo Lula manteve o tripé metas de inflação,
regime de câmbio flutuante com intervenção e ajuste fiscal.
No período entre 2003 a 2010, o regime de metas de inflação foi
capaz de manter a estabilidade monetária, mesmo tendo o país
retomado o crescimento econômico.
Em 2009, o sistema de metas de inflação completou seu décimo
aniversário merecendo uma avaliação positiva por parte do
economista Armínio Fraga Neto, a quem devemos a implantação
do sistema durante sua gestão no Banco Central. Fraga Neto
(2011, p. 29) argumenta que:
Em geral, em momentos de crise, o sistema de metas
tem se mostrado bastante eficaz. Podemos dizer que,
até estes dias, a experiência brasileira representa o maior
teste de estresse de um sistema de metas para a inflação
já registrado. Em diversos momentos difíceis, o Banco
Central tem podido agir de acordo com a prática hoje
universalmente aceita de acomodar desvios temporários
da meta, com o objetivo de suavizar as flutuações no
nível de atividade da economia. Esse delicado equilíbrio
de objetivos depende crucialmente da credibilidade do
sistema que, entre uma crise e outra, vem se consolidando
adequadamente desde sua implantação.
A Figura 3.1 mostra o comportamento da inflação ao
consumidor, medida pelo IPCA, com dados em variação
percentual no ano (% a.a.).
A inflação herdada pelo governo Lula se deveu à rápida e
intensa desvalorização de nossa moeda que, com o aumento dos
preços dos produtos importados, contaminou os demais preços.
Você deve lembrar que a economia brasileira em 2001 e 2002
praticamente não cresceu, com as vendas em queda indicando
que não se tratou de uma “inflação de demanda”.
110
Economia Brasileira Contemporânea
Figura 3.1 – Inflação ao consumidor – IPCA (% a.a.)
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do Banco Central).
A partir daí, com um comportamento favorável da taxa de câmbio
(valorização) e a política restritiva adotada pelo Banco Central,
a inflação de 2003 foi de 9,3%, situando‑se um pouco acima da
meta de 8,5% redefinida pelo novo governo. Já a meta redefinida
para 2004 era 5,5%, e o resultado observado foi uma inflação de
7,6%. Desta forma, você pode observar a trajetória da inflação
declinante, o que contribuiu para a fixação da meta de inflação em
4,5%, para o ano de 2005 e também para os anos seguintes.
A Figura 3.1 mostra que, nos cinco anos entre 2005 e 2010,
a meta estabelecida para a inflação foi de 4,5%, com uma banda
de 2% para cima ou para baixo. O limite superior, considerando
a banda, era 6,5%; e, o inferior, 2,5%. Note que, neste período,
a inflação observada sempre se manteve no intervalo da banda,
revelando a eficiência das medidas adotadas.
Giambiagi (2011, p. 224) comenta que contribuíram para os
resultados observados “a trajetória bem comportada da taxa de
câmbio – com exceção do ano de 2008 – e uma taxa de juros
real, em média, ainda bastante elevada, embora com tendência
de queda.”
O mesmo autor (2011, p. 224) aponta quatro desafios associados
ao sistema de metas, no final da década:
i. Combater a alta conjuntural da inflação observada em
2010, com chances de “contaminar” o resultado de 2011;
Unidade 3
111
Universidade do Sul de Santa Catarina
ii. Reduzir a meta, em médio prazo, para um número
mais próximo da inflação nos países mais avançados,
talvez para algo entre 3% e 4%, ligeiramente abaixo do
alvo de 4,5% mantido durante vários anos;
iii. Conciliar a preservação do regime de metas com um
crescimento médio sustentado mais robusto da economia,
idealmente mais próximo de 5%;
iv. Conseguir implementar (ii) e (iii) em um contexto
de juros menores que as taxas observadas no Brasil na
primeira década e meia a partir da estabilização de 1994.
Como justificar as elevadas taxas de juros Selic
observadas na primeira década do século XXI?
Arida (2012, p. 213) apontou, no final do primeiro ano do
governo Lula (dezembro de 2003), as seguintes interpretações
correntes para as elevadas taxas de juros:
„„
„„
„„
A política monetária tem sido excessivamente
conservadora, depois que a inflação foi estabilizada.
O ajuste fiscal ainda é insuficiente.
A existência nos últimos anos de uma série excepcional
de choques externos e internos adversos, tais como:
o estouro da bolha de tecnologia Nasdaq, o racionamento
de energia, o 11 de Setembro, o colapso da Argentina e o
chamado risco Lula.
Curado (2011, p. 95) considera três aspectos centrais que podem
justificar a manutenção de elevadas taxas de juros:
1.A convivência com um longo período de alta inflação,
com elevados custos para o desenvolvimento social e
econômico, ajuda a explicar a adoção de medidas mais
conservadoras (o Banco Central reage de forma mais
forte quando da ocorrência de desvios entre a meta e a
expectativa de inflação).
112
Economia Brasileira Contemporânea
2.A relação existente entre política monetária e as finanças
públicas, ou seja, a necessidade de rolagem da dívida
pública, que impõe limites para a queda de juros real.
Além disto, o governo Lula não utilizou instrumentos
fiscais na contenção da demanda agregada.
3.A ocorrência de uma verdadeira explosão do crédito,
especialmente ao consumidor. “Em janeiro de 2003,
a relação operação de crédito (setores público e privado)/
PIB era de 23,94%. Em outubro de 2010, esta relação
atingiu 47,25%.”
A Figura 3.2 exibe o histórico das taxas de juros nominais (% a.a.)
fixadas pelo Copom, no período de janeiro de 2003 a janeiro de
2013, mostrando uma importante redução de sua taxa de juros.
Além disso, a Figura 3.2 exibe também as quatro rodadas de
elevação da taxa de juros nominal:
„„
„„
„„
„„
No começo de 2003, com o dólar pressionado, a taxa
Selic anualizada foi aumentada de 25% para 26,5%.
Entre setembro de 2004 e maio de 2005, em decorrência
de uma forte alta das commodities, a taxa de juros subiu
de 16% para 19,75%.
Entre abril e setembro de 2008, quando o crescimento
da economia e o temor quanto à pressão de demanda
levaram a uma alta de 11,25% para 13,75%.
Entre abril e julho de 2010, pelos motivos anteriores
(depois de apaziguados os efeitos da crise de 2009),
se eleva de 8,75% para 10,75%.
Figura 3.2 – Histórico das taxas de juros nominais (% a.a.) fixadas pelo Copom, período de
janeiro de 2003 a janeiro de 2013
Fonte: Elaboração do autor, 2013, a partir de informações do Banco Central e de Giambiagi (2011, p. 212).
Unidade 3
113
Universidade do Sul de Santa Catarina
É importante registrar que o comportamento da
taxa de juros, tanto no primeiro como no segundo
mandato de Lula, foi influenciado fortemente
pelo comportamento da inflação. Ao final da série
apresentada no gráfico, a taxa Selic apresentou seu
menor patamar desde o lançamento do Plano Real,
7,25% em janeiro de 2013.
Segundo Ministério da Fazenda (2012, p. 63), no documento
“Economia Brasileira em perspectiva”, 17ª edição, “a redução da
taxa real de juros de curto prazo no Brasil foi significativa, saindo
de 14% em dezembro de 2002 para 1,8% em novembro de 2012.”
Curado (2011, p. 95) lembra que, no período especialmente
após a crise financeira de 2008, as taxas de juros reais caíram
praticamente em todos os países do mundo. Veja a evolução do
Brasil neste contexto:
Em 2002, o Brasil liderava o ranking das taxas de juros reais com
11,1% a.a. e, o segundo colocado, a Turquia, tinha um juro real
de 9,4%.
Em setembro de 2004, mês em que as taxas de juros voltaram a
subir no país, o Brasil praticava a segunda maior taxa de juro real
no mundo, 9,3%.
Em janeiro de 2006, o Brasil estava na dianteira com juros reais
de 12,1% ,e o segundo colocado era Cingapura, com 6,4%.
Em dezembro de 2010, o Brasil também liderava o ranking com
4,8% a.a. de juros reais, e a África do Sul, em segundo lugar,
tinha juros reais de 2% a.a.
Souza (2008, p. 299) aponta outro tema relevante relacionado às
elevadas taxas de juros reinantes em nosso país:
Sabemos perfeitamente que, como os especuladores se
acostumaram a usufruir de uma taxa de juros elevada
aqui no Brasil, sua tendência, diante de um movimento
de queda, é ameaçar retirar o dinheiro como forma de
114
Economia Brasileira Contemporânea
pressão para impedir esse movimento. E, para isso,
recorrem ao poder de monopólio de que desfrutam na
esfera mundial.
Segundo Gremaude (2011, p. 498), o elevado patamar das taxas
de juros em contexto internacional favorável e a significativa
redução do risco país contribuíram para atrair capital estrangeiro
e para pressionar no sentido da valorização cambial. Isto ocorreu
mesmo com as intervenções do Banco Central e sua política de
elevação dos níveis das reservas internacionais.
Finalmente, se deve ressaltar também que, apesar de o país ter
taxas de juros muito elevadas no contexto internacional, os picos
e os vales exibidos no gráfico anterior de cada ciclo foram cada
vez menores (indicando a tendência de baixa da taxa de juros ao
longo do período).
Você pode concluir que, ao longo dos dois governos de Lula, as
metas de inflação foram cumpridas dentro do intervalo de tolerância,
com uma tendência contínua de queda. A mesma tendência pode ser
dita em relação ao comportamento da taxa de juros, que contribuiu
para acertar o alvo e a estabilidade monetária.
Seção 3 – A fantasia fiscal e as contas públicas
O emprego da expressão “fantasia fiscal” no título é apenas
para enfatizar que o nosso país tem sido conduzido como se não
estivesse sujeito a limites, especialmente no que diz respeito ao
gasto público. A expressão foi empregada por Giambiagi (2012,
p. 15), em sua recente publicação, o livro “Além da euforia”,
que discute os riscos e as lacunas do modelo brasileiro de
desenvolvimento contemporâneo.
O aumento do gasto público pode ser financiado pelo aumento
dos impostos, pela emissão de dívida pública, ou, em última
instância, por mais inflação. Em relação à situação fiscal,
lembre‑se de que uma das primeiras medidas anunciadas pelo
governo Lula foi a elevação da meta de superávit primário para
Unidade 3
115
Universidade do Sul de Santa Catarina
4,25% do PIB. Pois bem, a partir de agora, você aprenderá
como se desenvolveu a política fiscal e o desempenho das contas
públicas nos dois governos Lula.
Giambiagi (2008) relembrou o editorial do Boletim de Conjuntura
do IPEA de 2004, onde se faz uma reflexão inspirada sobre o que
tinha acontecido nos processos de consolidação em outros países,
com base em análise do FMI (2001):
[...] o País poderá estar ingressando [...] na fase do tão
almejado círculo virtuoso, verificado em outros países que
passaram por processos de ajustamento fiscal no passado,
mais especificamente nos anos de 1990, com destaque
para alguns casos da Europa Ocidental que atingiram
níveis de dívida pública [elevados]. Nesses casos
nacionais, em que pesem as diferenças e nuanças entre os
países, observou‑se um padrão, ao qual a experiência do
Brasil dos últimos anos não foi alheia. No que se poderia
denominar Fase 1 desse processo, o resultado primário
das contas públicas era modesto ou até mesmo deficitário
e, devido aos juros, a dívida pública era crescente, quadro
esse que se encaixa como uma luva na situação do Brasil
até 1998. Na Fase 2, que correspondeu aos primeiros
anos do ajustamento, houve um forte ajuste primário e
o setor público passou a gerar superávits primários que,
com o tempo, foram superiores a 4% a 5% do PIB, mas,
devido à presença de desconfianças acerca da sustentação
do ajuste no tempo, as taxas de juros eram ainda altas
e, consequentemente, uma carga de juros e de déficits
elevados ainda pressionava a dívida pública. Isso espelha
exatamente o que aconteceu no Brasil de 1999 até agora.
Se colocadas em um gráfico mostrando a dívida pública e
o superávit primário [...] como proporção do PIB, as duas
variáveis mostram uma trajetória clara: na primeira fase,
resultados primários modestos ou negativos relativamente
estáveis convivem com uma dívida pública crescente,
enquanto, na segunda, o superávit primário é claramente
ascendente, mas a dívida pública também continua
aumentando, em função das citadas razões. Finalmente,
na Fase 3, na qual pode ser que o Brasil ingresse entre
2004 e 2005, a persistência do ajustamento fiscal, ou seja,
a manutenção de superávits primários robustos por um
número considerável de anos foi aos poucos consolidando
a confiança entre os investidores. Isso ajudou a reduzir
as taxas de juros e permitiu que, enquanto o superávit
primário se manteve – em alguns casos até mesmo
declinando ligeiramente – a queda da taxa de juros
116
Economia Brasileira Contemporânea
possibilitou uma diminuição significativa das despesas
financeiras do governo e do déficit público, gerando, em
consequência, uma trajetória declinante da relação Dívida
pública/PIB. Esta queda pôde ser conservada ao longo
do tempo, pelo efeito benéfico desse processo sobre a
carga de juros, viabilizando novas reduções do coeficiente
Juros/PIB. (GIAMBIAGI, 2008, p. 536).
Neste material didático, você descobriu que, de fato, a economia
brasileira nos anos de 1990 vinha de um processo de deterioração
da situação fiscal, quando passou a conviver, na década atual,
com superávits primários. Vamos verificar como se deu esse
processo de ajustamento na direção do almejado equilíbrio fiscal
durante o governo de Lula.
Diferentemente do esperado pelas posições defendidas durante
a campanha eleitoral, no início do novo governo a política fiscal
se revelou mais contracionista. A Figura 3.3 exibe a evolução do
superávit primário no período 2003 a 2012.
Figura 3.3 – Resultado primário (%PIB): 2003 a 2012
Fonte: Elaboração do autor, 2013, a partir de informações do Ministério da Fazenda (2012, p. 83).
Obs.: O dado de 2012 corresponde ao acumulado em doze meses, até o mês de outubro de 2012.
Nos três primeiros anos do governo Lula, ocorreu um aumento
contínuo do superávit primário, passando de 3,3% em 2003 para
3,8% em 2005. Ao longo dos quatro anos, o superávit situou‑se
entre 3% e 4%, sendo que, em 2006, foi de 3,2%.
Souza (2008, p. 300), para a obtenção desses crescentes saldos
primários, comenta que, no primeiro ano (em decorrência da
carga tributária), o governo cortou fortemente os investimentos
públicos. Para o segundo e terceiro ano, o governo utilizou como
principal instrumento o aumento da carga tributária.
Unidade 3
117
Universidade do Sul de Santa Catarina
Segundo Gremaude (2011, p. 495), a melhora do
superávit primário combinado com a valorização
cambial contribuiu para a redução da Dívida Líquida
do Setor Público em relação ao PIB.
Apesar da obtenção dos superávits relativamente elevados,
a política monetária restritiva acarretou em despesas expressivas,
com o pagamento dos juros. A Figura 3.4 exibe a evolução
do pagamento de juros do setor público, do déficit nominal
(Necessidade de Financiamento do Setor Público – NFSP) e
do resultado primário no período 2003 – 2012 (% PIB).
Figura 3. 4 – Evoluções do pagamento de juros do setor público, do déficit nominal e do
resultado primário no período 2003 – 2012 (%PIB)
Fonte: Elaboração do autor, 2013, a partir de informações do Ministério da Fazenda (2012, p. 83).
Obs.: O dado de 2012 corresponde ao acumulado em doze meses, até o mês de outubro de 2012.
Você deve observar a tendência de redução do pagamento dos
juros ao longo do período, que está relacionada à diminuição
dos juros, como ilustra a Figura 3.2, e à diminuição da relação
Dívida/PIB.
Giambiagi (2011, p. 215) identificou uma nítida mudança de
postura com a saída de Antônio Palocci e a chegada de Guido
Mantega ao Ministério da Fazenda, que se manifestou nos
seguintes elementos:
A taxa de variação real do gasto público teve um aumento
expressivo em relação à média dos dois primeiros anos de
Governo, com ênfase nos aumentos do funcionalismo,
especialmente no segundo Governo Lula;
„„
118
Observou‑se uma tendência a um afrouxamento dos
superávits primários;
Economia Brasileira Contemporânea
„„
O Governo passou a usar a possibilidade de
desconto – por vezes, até mesmo expressivo – de
parte do investimento da meta de superávit primário,
mecanismo que, embora estivesse formalmente
disponível ainda no final do Governo FHC, nunca
tinha sido utilizado. Com isso, a “meta fiscal”, na
prática, deixou de ser efetivamente perseguida, uma
vez que passou a ficar sujeita a uma espécie de “banda
de tolerância”;
„„
O Ministério da Fazenda passou a divergir
claramente, em várias ocasiões, do Banco Central
acerca da condução da política monetária;
„„
Foram abandonados os estudos que a área econômica
vinha fazendo em 2005, destinados a elaborar um
plano de longo prazo visando maior contenção do
crescimento da despesa, para atacar de modo mais
vigoroso o desequilíbrio fiscal;
„„
A retórica ministerial deixou de enfatizar os aspectos
de continuidade ligados à manutenção das políticas
herdadas do Governo anterior e passou a procurar
diferenciar, de forma sistemática, a política oficial em
relação à que era praticada no Governo FHC; e
„„
Houve um aumento substancial da importância e do
papel do BNDES na economia.
Segundo Curado (2011, p. 96), a prometida reforma tributária
não saiu do papel, ou seja, não houve simplificação e nem
ocorreram reduções da carga tributária. Por outro lado,
ocorreram avanços importantes, com destaque para a evolução da
dívida pública. Este último é o nosso próximo assunto.
3.1 A evolução da dívida pública
Segundo Souza (2008, p. 301), a evolução da dívida pública
saltou de US$ 881,1 bilhões em dezembro de 2002 para US$
1,002 trilhão em dezembro de 2005. No triênio considerado, os
juros da dívida pública acumularam um montante de R$ 430,6
bilhões, que correspondia a 8,23% do PIB.
Apesar do crescimento absoluto da dívida pública, a relação
dívida/PIB diminuiu no triênio considerado, assim como
diminuiu nos demais anos da primeira década (apresentando um
Unidade 3
119
Universidade do Sul de Santa Catarina
comportamento diferenciado no ano de 2009, por interferência
da crise mundial).
A Figura 3.5 mostra a evolução da dívida líquida do setor público,
que caiu de 60% do PIB em 2003, para 40% do PIB em 2010, e
chegou a 35% do PIB durante o ano de 2012.
Segundo Giambiagi (2011, p. 217), a explicação para a inflexão
observada no déficit nominal e na dívida pública (redução do
déficit e aumento da dívida pública), em 2009, relaciona‑se à
“combinação de frustração de receita, incentivos concedidos
no bojo da adoção de uma política anticíclica e manutenção de
crescimento do gasto em função de decisões previamente tomadas.”
Figura 3.5 – Dívida ‑ total ‑ setor público ‑ líquida ‑ (% PIB) ‑ Banco Central do Brasil
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do Banco Central do Brasil).
Souza (2008, p. 303), considerando o triênio 2002 a 2005,
comenta que a melhoria da relação dívida/PIB se deveu não à
desaceleração do crescimento da dívida em valores absolutos,
mas ao crescimento do PIB, alavancado pelas exportações.
Giambiagi (2011, p. 215) destacou dois elementos que explicam
o processo contínuo de redução da relação dívida líquida do setor
público/PIB:
1.A apreciação cambial verificada a partir de 2002 incidia
sobre uma dívida pública ainda fortemente atrelada à
taxa de câmbio, mesmo apresentando uma redução do
superávit primário no segundo governo de Lula.
2.A tendência de redução do juro real entre os governos
Fernando Henrique e Lula reduziu as despesas
financeiras e, ao mesmo tempo, os ajustes patrimoniais
evoluíram favoravelmente.
120
Economia Brasileira Contemporânea
3.2 A carga tributária
A melhoria dos indicadores fiscais foi resultado da elevação
contínua da carga tributária até o ano de 2008, conforme nos
mostra a Figura 3.6. Nos dois anos seguintes, 2009 e 2010, sob
os reflexos da crise econômica mundial, ocorreu uma diminuição
da carga tributária, que voltaria a subir no ano de 2011.
Figura 3.6 – Carga tributária total (% PIB) – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística,
Sistema de Contas Nacionais: 2003 a 2011
A carga tributária é
o valor de todos os
impostos pagos pelos
cidadãos e empresas na
proporção das riquezas
produzidas no país.
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
A elevação da carga tributária, que passou de 27,90% do
PIB em 1994 para 34,86% do PIB em 2008, contribuiu
significativamente para a redução da capacidade de poupança e
investimento do setor privado.
A Tabela 3.3 apresenta a taxa de crescimento da receita e da
despesa totais do governo por períodos (% a.a.).
Tabela 3.3 – Taxa de crescimento da receita e da despesa totais do Governo Central por
períodos (% a.a.), que inclui transferências a Estados e Municípios
Variável
2003‑2004
2005‑2010
2003‑2010
Receita total
3,3
5,2
4,8
Despesa primária
2,2
6,4
5,4
PIB
3,4
4,2
4,0
Fonte: Elaboração do autor, 2013, com base em Giambiagi (2011, p. 223).
Segundo Giambiagi (2011, p. 223), nos dois primeiros anos
do governo Lula a política adotada no segundo governo
Fernando Henrique foi mantida. De acordo com essa política,
o crescimento da receita (3,3%) ocorre a taxas superiores às de
incremento da despesa primária (2,2%) do governo central,
Unidade 3
Despesa primária é
também conhecida como
despesa não financeira,
e corresponde ao conjunto
de gastos que possibilita a
oferta de serviços públicos
à sociedade, deduzidas
as despesas financeiras.
São exemplos os gastos
com pessoal, custeio e
investimento. Pode ser
de natureza obrigatória
ou discricionária.
(GLOSSÁRIO DE TERMOS
ECONÔMICOS, 2013).
121
Universidade do Sul de Santa Catarina
que incluem as despesas do Tesouro Nacional, da Previdência
Social e do Banco Central.
A despesa primária apresentou um crescimento médio anual de
6,4% nos seis últimos anos do governo Lula, 2005‑2010, que se
baseou nas transferências diretas a indivíduos através de medidas
como o aumento do salário mínimo, das aposentadorias, seguro
desemprego, o programa Bolsa‑Família, e outras. Esse padrão de
gestão implicou um estímulo ao consumo.
Rodrigues (2010, p. 18) identificou, entre 1991 e 2008, os períodos
em que a política fiscal foi de fato expansionista ou contracionista,
tendo por base o comportamento das finanças públicas e da
característica do ano. No período mais recente, de 2003 em diante,
as tendências relativamente claras foram as seguintes:
„„
„„
No ano de 2003 – a política fiscal foi caracteristicamente
contracionista, com redução dos gastos públicos e
crescimento da carga tributária.
De 2004 a 2008 – a política fiscal foi expansionista,
com aumento dos gastos públicos e crescimento da
carga tributária.
Giambiagi (2008, p. 567) aponta a redução da carga tributária
como um dos desafios da área fiscal:
Embora a reversão ao passado seja provavelmente
utópica, uma vez que muitos dos fatores que geraram
a necessidade de financiar novos gastos mediante uma
maior pressão tributária são irreversíveis – como o
efeito do aumento do salário mínimo sobre as despesas
previdenciárias e assistenciais – o fato é que, assumindo
que a carga tributária elevada atue como um elemento
negativo para o crescimento econômico, o País poderia,
uma vez superada a emergência fiscal das últimas duas
décadas, desfazer parcialmente o aumento da carga
impositiva observada desde meados dos anos de 1990.
Ainda que retornar a uma carga de 25% do PIB seja
irrealista, em um contexto de redução da despesa de
juros e menor superávit primário, uma carga tributária
mais próxima de 30% do PIB poderia ser um objetivo
viável para daqui a 15 ou 20 anos. Isso poderia
contribuir, assim como o maior investimento, para
alavancar as taxas de crescimento do PIB.
122
Economia Brasileira Contemporânea
Você estudou que a carga tributária brasileira somou 35,3% do
Produto Interno Bruto em 2011, estabelecendo nova marca recorde.
Levando esse número em consideração, concluímos que é
necessário conter os gastos públicos, que tem se expandido a
taxas reais maiores que as da economia brasileira nos últimos
vinte anos. Além disso, é preciso modificar a composição das
despesas entre os gastos correntes e os investimentos. Só assim
nosso país poderá aspirar a um crescimento sustentável.
Seção 4 – O desempenho externo e o balanço de
pagamentos
Você já descobriu que, com a introdução da política de flutuação
cambial, a moeda brasileira sofreu um processo contínuo de
desvalorização. A taxa de câmbio, influenciada pelo atentado
de 11 de setembro de 2001, pela crise argentina e, depois pelo
chamado “risco‑Lula”, alcançou valores superiores a R$3,00.
A Figura 3.7 descreve a trajetória da taxa de câmbio nominal
mensal entre janeiro de 2002 e dezembro de 2012, que, ao longo
dos dois governos Lula, apresentou uma apreciação substancial.
Figura 3.7 – Taxa de câmbio nominal ‑ R$ / US$ ‑ comercial venda média: 2002 a 2012
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
Você estudará, a seguir, que o crescimento firme da economia
mundial no período de 2003 a meados de 2008 encobriu em parte
Unidade 3
123
Universidade do Sul de Santa Catarina
os problemas decorrentes da apreciação cambial. Depois disso,
estudará de forma mais abrangente o balanço de pagamentos que
apresentou algumas mudanças cruciais no período.
4.1 Balança Comercial
A desvalorização cambial ocorrida em janeiro de 1999 e as
sucessivas crises cambiais ocorridas até 2002 contribuíram para o
aparecimento de um superávit da balança comercial. A Figura 3.8
exibe o desempenho da balança comercial no período 2002 a 2011.
Figura 3.8 – Importações e Exportações ‑ (FOB) ‑ US$ (milhões) ‑ Banco Central do Brasil:
2002 a 2011
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
As exportações sofreram forte elevação durante todo o
primeiro mandato e até a metade do segundo mandato de Lula.
No primeiro ano de governo (2003), as exportações somaram
US$ 73, em 2004 aproximaram‑se dos US$ 100 bilhões, e, em
2008 chegaram perto dos US$200 bilhões, dobrando seu valor
em quatro anos.
As importações ficaram estagnadas em 2003 em torno de
US$ 48 bilhões e, a partir daí, passam a crescer até o ano de
2008, quando alcançaram US$ 173 bilhões. O aumento no
período refletiu a valorização real da taxa de câmbio.
O comportamento das duas variáveis anteriores (da exportação e
importação) resultou em saldos comerciais crescentes até 2006,
quando atingiu US$ 46. A partir de 2007, os saldos voltam a
decrescer, atingindo US$20 bilhões em 2010.
124
Economia Brasileira Contemporânea
Giambiagi (2011, p. 221) observa que o desempenho da
balança comercial no governo Lula impressiona pela dimensão
monetária dos superávits observados no período, apresentando o
seguinte comportamento:
„„
„„
„„
A evolução do volume de exportações e importações no
período não foi tão brilhante.
Os superávits deveram‑se, em boa parte, ao “boom”
de preço das exportações (forte aumento dos preços
internacionais das commodities).
A participação dos manufaturados na pauta de
exportações do país, que, por mais de uma década e
meia, respondia por perto de 55% do total exportado,
caiu para 39% em 2010.
Curado (2011, p. 101) identifica dois fatores essenciais para
explicar o aumento da participação de produtos não industriais e
a queda das exportações de produtos de alta tecnologia:
1. A profunda mudança no destino das exportações
brasileiras, com significativo incremento da participação
dos países emergentes, cuja demanda por produtos não
industriais é relevante;
2. A redução da competitividade externa dos setores
que dependem de uma taxa de câmbio competitiva,
especialmente setores de alta e médio‑alta tecnologia.
Devido a essas mudanças apontadas por Curado, até o ano de
2000 a China não constava entre os dez principais países de
destino das exportações brasileiras. Já em 2009, a China se
tornou o principal destino das exportações brasileiras.
Segundo o Ministério da Fazenda (2012, p. 98), “a diversificação
dos mercados compradores tem sido uma das estratégias para
ampliar as exportações do Brasil.” A Figura 3.9 mostra a
participação percentual dos maiores parceiros comerciais do
Brasil (% do total exportado), permitindo a comparação entre os
anos 2004 e 2012.
Unidade 3
125
Universidade do Sul de Santa Catarina
Figura 3.9 – Participação percentual dos maiores parceiros comerciais do Brasil (% do
total exportado)
Fonte: Elaboração do autor, com dados do MDIC e Ministério da Fazenda.
Obs.: Os dados de 2012 correspondem ao período de janeiro a outubro. Nos parceiros do MERCOSUL
não se incluiu a Venezuela.
Você deve notar que, na crise externa do Brasil nos anos
1998/1999, a China demandava produtos brasileiros em torno
de 1% do total exportado. Já em 2012, o peso da demanda da
China foi superior a 17% das nossas exportações, representando
um aumento significativo da capacidade de influenciar variáveis
relevantes da economia brasileira.
4.2 Balanço de Pagamentos
A partir de 2005, o saldo em transações correntes, expresso
como proporção do PIB, inverte sua tendência. Os déficits
apresentados no saldo de transações correntes durante o
período, a partir de 2008, foram compensados pela entrada dos
capitais externos. O ingresso de capitais estrangeiros no Brasil
continuou até o final da década, proporcionando um aumento
das reservas internacionais.
A Tabela 3.4 apresenta o desempenho de contas selecionadas
do Balanço de Pagamentos do Brasil, em US$ bilhões, para o
período de 2003 a 2011.
126
Economia Brasileira Contemporânea
Tabela 3.4 – Balanço de Pagamentos do Brasil em US$ Bilhões: 2003 a 2011
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
Transações correntes
4,18
11,68
13,99
13,64
1,55
‑28,19
‑24,30
‑47,27
‑52,48
‑ Balança comercial (Fob)
24,79
33,64
44,70
46,46
40,03
24,84
25,29
20,15
29,81
Exportação de bens
73,08
96,48
118,31
137,81
160,65
197,94
153,00
201,92
256,04
Importação de bens
‑48,29
‑62,84
‑73,61
‑91,35 ‑120,62 ‑173,11 ‑127,71 ‑181,77 ‑226,23
‑23,48
‑25,20
‑34,28
‑37,12
‑42,51
‑57,25
‑52,93
‑70,32
‑85,27
‑ Transferências unilaterais correntes
2,87
3,24
3,56
4,31
4,03
4,22
3,34
2,90
2,98
Conta capital e financeira
5,11
‑7,52
‑9,46
16,30
89,09
29,35
71,30
99,91
112,39
Resultado do balanço
8,50
2,24
4,32
30,57
87,48
2,97
46,65
49,10
58,64
‑ Serviços e Rendas
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do Banco Central do Brasil).
Você deve observar que, em todos os anos do período entre
2003 e 2011, o Balanço de Pagamentos apresentou superávit.
Este resultado foi obtido graças à contribuição da conta capital e
financeira, que, a partir de 2006, se apresentou superavitária.
Desde 2007, ocorre uma preocupante deterioração no saldo
em transações correntes, que teve início antes mesmo da crise
financeira internacional. A Figura 3.10 exibe o comportamento
da balança comercial, dos serviços, rendas e transferências
unilaterais e do saldo em transações correntes no período de
2002 a 2011.
Figura 3.10 – Balanço em Transações Correntes, em US$ milhões: 2002 a 2011
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
Unidade 3
127
Universidade do Sul de Santa Catarina
Curado (2011, p. 99) credita principalmente a dois fatores a
deterioração do saldo em transações correntes:
1. A retomada do crescimento, que pressiona as importações;
2. O processo de valorização do real que tem contribuído
para a queda do saldo comercial e para a ampliação do
déficit na conta de rendas.
É importante lembrar que a apreciação de nossa moeda
estimulou o envio de remessas de lucros e dividendos
para o exterior, pressionando a conta de rendas.
Os superávits em transação corrente obtidos no período 2003 a
2007 e o ingresso contínuo de investimento estrangeiro gerou
uma significativa acumulação de reservas, conforme exibe a
Figura 3.11.
Você deve lembrar que situação similar ocorreu na década de 90,
quando o ingresso de capitais estrangeiros no Brasil continuou
até o final da década, ocasionando um aumento das reservas
internacionais.
Figura 3.11 – Reservas internacionais em US$ milhões (liquidez internacional): 2002 a 2012
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do BACEN).
O aumento contínuo de reservas coincide com a persistência
da apreciação do Real, como foi mostrado na Figura 3.7,
interrompido em 2008, em decorrência dos reflexos da crise
econômica internacional. Segundo Giambiagi (2011, p. 220),
128
Economia Brasileira Contemporânea
a partir de meados da década, a maior parte dos superávits
no Balanço de Pagamentos do país – responsáveis pelo
aumento das reservas – originaram‑se da evolução da conta
de capitais e não dos resultados da conta corrente.
O acúmulo de reservas internacionais proporcionou uma redução
da dívida externa líquida brasileira, conforme mostra a Figura 3.12.
A partir de 2008, a dívida externa líquida do país se tornou
negativa, o que representou uma melhora da posição externa do país
(exatamente no momento da maior crise financeira internacional).
Figura 3.12 – Brasil: Dívida externa líquida/Exportações de bens – 2002‑2010
Fonte: Giambiagi (2001, p. 220), com dados do Banco Central.
Segundo Giambiagi (2011, p. 219), a melhora da posição externa
denota “uma transformação fundamental em relação ao padrão
histórico observado nas décadas anteriores, nas quais o Brasil
sempre tinha sido um devedor líquido.”
Seção 5 – A retomada do crescimento econômico com
distribuição de renda
No campo da economia real, você se lembra de como ocorreu a
variação do PIB brasileiro desde o início do governo Collor? Já
estudamos que, a partir de 1980, antes mesmo de Collor, ocorreu
um colapso do crescimento do PIB brasileiro, do qual o país não
se recuperou mesmo após a estabilização em 1994.
Unidade 3
129
Universidade do Sul de Santa Catarina
Ao longo desta seção, se analisa a expansão de nossa economia no
período 2003 a 2010. Além disso, se pretende discutir os efeitos
obtidos sobre o emprego, a distribuição da renda e a pobreza.
5.1 A expansão do crescimento econômico
A Figura 3.13 exibe o comportamento deste indicador
compreendendo o período 1990 a 2011. Observe que o
crescimento médio no governo Collor/Itamar foi 1,24%; nos
dois governos de Fernando Henrique, 2,31%; e, por último,
nos dois governos Lula, 4,06%.
Figura 3.13 – Variação do PIB do Brasil: 1990 a 2011
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
Segundo o gráfico, a taxa média de crescimento da economia
foi 1,80%, durante a década de 1990, e 2,1%, durante o segundo
mandato de Fernando Henrique. Lembre também que, ao final
do seu último mandato, a economia brasileira se deparou com
uma forte crise cambial e com a expectativa do mercado diante
da possibilidade de um partido de esquerda assumir o governo.
A Tabela 3.5 mostra a evolução do PIB do Brasil e Mundial
entre os períodos 2003/2006 e 2007/2010.
Tabela 3.5 – Evolução do PIB: Brasil x mundo
Brasil
Mundo
Brasil/Mundo
2003/2006
3,49
4,59
(‑) 31,22%
2007/2010
4,62
3,20
31,02%
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
130
Economia Brasileira Contemporânea
O primeiro período, compreendido entre os anos de 2003 e 2006,
foi marcado pela retomada do crescimento. Neste período, sobre a
taxa média de expansão do PIB brasileiro, podemos destacar:
„„
„„
Foi da ordem de 3,49% a.a, em torno de 66% da observada
no período imediatamente anterior (1999 e 2002).
Ao confrontarmos esse desempenho com as taxas de
crescimento mundial, verificamos que o Brasil ficou
31,22% abaixo do crescimento mundial.
Mariano (2012, p. 87), identificou os seguintes fatores como sendo
importantes para explicar a recuperação da economia brasileira:
„„
O fato de as expectativas do mercado não se
concretizarem. Ou seja, não houve ruptura em relação
aos principais pilares da política econômica vigente no
governo anterior;
„„
O elevado superávit fiscal possibilitou ao governo
reduzir a proporção da dívida em relação ao PIB;
„„
A forte desvalorização cambial ocorrida em 2002
produziu uma vantagem significativa para o setor
exportador, contribuindo para a geração de expressivos
superávits na balança comercial;
„„
Ao longo do período, devido ao forte crescimento
das economias emergentes (China, Índia e Rússia)
e o consequente aumento da demanda, ocorreu uma
elevação dos preços das matérias‑primas, favorecendo
a economia brasileira.
Ainda sobre o primeiro governo Lula, verifica‑se um crescimento
praticamente nulo em 2003, com um desempenho de 1,15%,
refletindo o esforço de estabilização realizado. Em 2004,
no rastro do significativo crescimento da economia mundial,
obteve a maior taxa de crescimento, 5,71%, e redução nos dois
anos seguintes para a faixa de 3 a 4% a.a.
Souza (2008, p. 311) pergunta: como o PIB e a
produção industrial brasileira alcançaram esse
respeitável crescimento em 2004?
Unidade 3
131
Universidade do Sul de Santa Catarina
A resposta encontrada é simples e está relacionada às
exportações, que cresceram 21% em 2003 e avançaram 32%
em 2004. Na época, existiam vários fatos desfavoráveis para
essa expansão do PIB: juros reais e saldos primários das contas
públicas elevados, e taxa de câmbio e salário real muito baixo
(“fatos que deprimem a demanda interna e desanimam os
investimentos”). (SOUZA, 2008, p. 311).
A Figura 3.14 exibe, com mais detalhes, a evolução das taxas
anuais de crescimento do PIB brasileiro e mundial para o
período 2002 a 2011.
Figura 3.14 – Evolução da variação do PIB do Brasil e do Mundo: 2002 a 2011
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
Segundo Gremaude (2011, p. 500), o desempenho do PIB
brasileiro em 2004, 5,71%, foi influenciado pelo forte crescimento
das exportações e pela elevação do consumo impulsionado pelo
crédito. Os baixos investimentos em formação bruta de capital
acabaram por limitar as possibilidades de expansão, “gerando
pressões inflacionárias e fazendo com que o Banco Central
utilizasse a política monetária para reverter esse processo.”
A desaceleração de nossa economia nos dois anos seguintes,
2005 e 2006, refletiu as medidas adotadas para conter o processo
inflacionário: elevação das taxas de juros, da carga tributária e da
apreciação de nossa moeda.
Você lembra o que foi discutido em seções anteriores
sobre o comportamento da taxa de juros nesse período?
132
Economia Brasileira Contemporânea
Pois bem, no começo de 2003, com o dólar pressionado, a taxa
Selic anualizada chegou a 26,5% e, a partir daí, apresentou
progressiva redução até 16%, em maio de 2005. As reduções na
taxa básica, com algumas altas durante o período 2003/2010,
contribuíram para a retomada do crescimento e também para
que as taxas de crescimento do PIB fossem as mais intensas em
duas décadas.
No segundo governo Lula, período entre 2007 e 2010, excluindo
o ano de 2009, as taxas de crescimento do PIB foram superiores
aos 5% a.a. A taxa média de crescimento do período foi 4,62%,
ficando 31% acima do crescimento da economia mundial (ver
Tabela 3.5).
A crise econômica de 2008 praticamente afetou todas as
economias do planeta e ficou longe de ser apenas uma
“marolinha” (expressão utilizada pelo presidente Lula) em terras
brasileiras. A Tabela 3.6 mostra o comportamento do PIB do
Brasil por setor de atividade, no 3º e 4º trimestre de 2008.
Tabela 3.6 – PIB do Brasil por setor de atividade, no 3º e 4º trimestre de 2008
Setores
3º trimestre de 2008
4º trimestre de 2008
PIB
1,7
‑3,6
‑ Indústria
3,6
‑7,4
‑ Terciário
0,8
‑0,4
‑ Agropecuária
1,7
‑3,6
Fonte: IBGE, 2008.
Segundo Mariano (2012, p. 91), o 1º trimestre de 2009 ainda
apresentava um quadro de retração, com uma taxa de ‑0,8%.
Lembrou ainda que o Brasil estabeleceu as seguintes ações para
enfrentar a crise:
„„
Na área monetária, o governo promoveu gradativa redução
das taxas de juros, os bancos públicos (Banco do Brasil,
Caixa Econômica Federal e BNDES) ampliaram as linhas
de crédito para o setor público e privado, a margem de
crédito consignado para aposentados foi elevada, entre
outras medidas.
Unidade 3
133
Universidade do Sul de Santa Catarina
„„
„„
Na área fiscal, o governo realizou intervenção em
vários setores, promovendo a desoneração fiscal com
redução do IPI na produção de automóveis, caminhões,
eletrodomésticos e materiais de construção. Em relação
aos gastos públicos, o governo ampliou os investimentos
e os repasses para os municípios (simultaneamente,
reduzindo o superávit primário).
Na área cambial, promoveu ações de vendas de divisas,
valendo‑se da boa quantia de reservas internacionais.
O Brasil foi uma das economias do mundo que mais
rapidamente conseguiu se recuperar e, em 2010, o PIB
apresentou uma expansão de 7,5%. No ano seguinte,
em 2011 (já no governo Dilma), o país obteve um
crescimento modesto de 2,7%.
Um dos reflexos do crescimento da economia brasileira é exibido
na Figura 3. 15, que mostra a evolução do PIB per capita do
Brasil no período 2002 – 2011, a preços de 2011.
Figura 3.15 – Evolução do PIB per capita do Brasil (a preços de 2011): 2002 ‑ 2011
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
Você deve observar que, a partir de 2004, o PIB per capita
apresenta forte elevação nos valores, tendo sofrido uma ligeira
queda em 2009.
134
Economia Brasileira Contemporânea
5.2 Taxa de desemprego
Você sabe que o crescimento econômico pode contribuir para
a redução das taxas de desemprego. Entretanto, isto pode não
ocorrer caso este crescimento intensifique inovações tecnológicas
poupadoras de mão de obra, o que faria com que o mercado de
trabalho sofresse retração.
Aqui no Brasil, a partir do segundo ano do governo Lula, o maior
otimismo com a evolução da economia proporcionou um aumento
na demanda por emprego, ocasionando uma redução nas taxas de
desemprego. A Figura 3.16 exibe o comportamento da taxa de
desemprego aberto – RMSP (%), durante o período 2002 a 2012.
Figura 3.16 – Taxa de desemprego ‑ aberta ‑ RMSP ‑ (%) – Fundação Sistema Estadual de
Análise de Dados, Pesquisa de Emprego e Desemprego (Seade/PED)
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
A taxa de desemprego, ao redor de 12,5% no ano de 2003,
experimentou uma tendência declinante, alcançando um
patamar de 8,5% durante o ano de 2010. Esta queda na taxa de
desemprego veio acompanhada de uma elevação nos níveis de
formalização da economia.
Segundo Giambiagi (2011, p. 235), “o percentual de trabalhadores
com carteira assinada, em relação ao total de trabalhadores
ocupados – nesse total incluindo aqueles empregados no governo,
que não possuem carteira de trabalho – passou de 44% em 2003,
para 51% em 2010.”
Unidade 3
135
Universidade do Sul de Santa Catarina
5.3 Distribuição de renda e a pobreza
O processo de desenvolvimento brasileiro no século XX, até a
crise da década de 1980, se caracterizou por altas taxas de
crescimento, mas com grande exclusão social. Nesta seção, você
irá compreender a dimensão da pobreza e desigualdade atuais
no Brasil, procurando entender as escolhas de política feitas no
passado recente.
A partir da estabilização da economia, em 1994, e sob os efeitos
da retomada do crescimento na primeira década do século XXI,
ocorreu uma melhora de vários indicadores sociais, melhora que
foi sentida também no mercado de trabalho, como vimos na
seção anterior.
Segundo Mariano (2012, p. 51), a capacidade de possibilitar uma
distribuição de renda mais justa na sociedade é um dos aspectos
importantes de uma boa estrutura fiscal e tributária. Lembrou
também que, quando se fala de distribuição de renda, objetiva‑se
verificar de que modo o total da riqueza produzida é distribuído
no país.
Souza (2008, p. 231), citando as ideias de Celso Furtado,
aponta que o desenvolvimento se dá em decorrência do aumento
da produção de riqueza combinado com a transformação das
estruturas econômicas, o aumento da produtividade do trabalho
e a melhor distribuição de renda. Portanto, um dos indicadores
do grau de desenvolvimento de uma economia é o perfil da
distribuição de renda.
Giambiagi (2012, p. 229) seleciona os principais indicadores
sociais que apresentaram melhoras:
1. A distância entre os mais ricos e os mais pobres reduziu‑se
fortemente ao longo da década. Entre 2001 e 2009, a renda
per capita dos 10% mais ricos da população brasileira
aumentou 1,5% ao ano, enquanto a renda dos mais pobres
cresceu a taxa de 6,8%. (NERI, 2010). O ganho
proporcionalmente maior deste último grupo está
relacionado aos programas sociais, com destaque para o
Programa Bolsa Família (PBF). Este foi criado em 2004 e
136
Economia Brasileira Contemporânea
concebido como um programa “focado” nas famílias de
menor renda. O PBF unificou cinco programas federais
pré‑existentes de transferência de renda (Bolsa Escola,
Bolsa Alimentação, Auxílio Gás, Cartão Alimentação e
Erradicação do Trabalho Infantil). De acordo com o
Ministério do Desenvolvimento Social, o programa atendia,
em 2010, mais de 12 milhões de famílias, com maior
impacto no Norte e Nordeste, contribuindo, dessa forma,
também para a redução das desigualdades regionais do
país. Um dos grandes méritos do programa é seu custo
relativamente baixo, uma vez que, mesmo após sua
ampliação, consumiu, em 2010, menos de 0,5% do PIB.
2. O Índice de Gini (indicador que sinaliza maior
desigualdade, quanto mais próximo de um; e maior
equidade, quanto mais próximo de zero) das pessoas
ocupadas caiu de 0,57 em 2001 para 0,52 em 2009.
Entre as causas desse fenômeno, destacam‑se: a) a
elevação do salário mínimo; b) o aumento do emprego,
em particular do emprego formal com carteira
assinada; c) o incremento da taxa de escolaridade;
e d) a queda do trabalho infantil. (SOUZA, 2010).
3. Considerando o país dividido entre cinco classes (A, B, C,
D, E, sendo “A” a mais elevada), 29 milhões de brasileiros
ingressaram na “nova classe média” (Classe C) entre 2003
e 2009, conforme o estudo de Marcelo Neri acima citado.
Muito embora o título “classe média” seja polêmico,
uma vez que o termo vai além do poder aquisitivo e
também se refere a formas de comportamento (ROCHA,
2010), o fato é que milhares de brasileiros ingressaram
na “Classe C”, tendo esta se tornado o maior grupo
social, representando mais de 50% da população total.
Para isso contribuiu o aumento da massa salarial e a
democratização ao acesso ao crédito, associado, no
caso das classes mais baixas, a políticas públicas como
a do “Crédito Consignado”. A ampliação do crédito
popularizou o acesso aos bens, sendo essa também
uma forma de aferir a redução da desigualdade.
4. Por fim, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)
que reúne indicadores de renda, educação e saúde,
também evoluiu positivamente. Considerando a
metodologia iniciada em 2010, o Brasil passou de
0,65 em 2000 para 0,69 em 2010 – sendo a unidade
de valor máximo do índice. Nessas condições, o Brasil
se situou, ao final da década, na posição 73, entre
169 países avaliados, com um índice que classifica o
país como de “alto desenvolvimento humano”.
Unidade 3
137
Universidade do Sul de Santa Catarina
O mesmo autor anterior destacou, ainda, sobre a redução da
desigualdade, quatro principais desafios para a década de 2010
a 2020:
1.a redução da desigualdade regional;
2.a precariedade do acesso ao saneamento básico nas
regiões mais pobres do país;
3.a melhora da qualidade do ensino;
4.a pobreza feminina, sobretudo entre mães solteiras.
Barros (2013, p. 447) comenta que a maior parte das políticas
regionais voltadas para a redução das desigualdades regionais
no Brasil, baseadas no subsídio ao capital ou suporte aos
investimentos nas regiões mais pobres, trouxe muito pouco
resultado concreto. Sobre esse assunto, concluiu:
As políticas regionais deveriam na verdade estimular
a extensão e a melhoria na qualidade da educação nas
regiões mais pobres. De acordo com o que foi visto,
esse tipo de política teria muito maior probabilidade
de reduzir as desigualdades regionais e eliminaria a sua
consequência mais perversa, que é a desigualdade de
oportunidade entre os indivíduos.
Segundo Giambiagi (2012, p. 231), a elevada popularidade
de Lula pode ser explicada pelos seguintes fatos: combinação
de aumentos reais do salário mínimo; injeção de recursos em
programas sociais; e forte crescimento do emprego. Lembre que
estes fatos ocorreram num contexto de economia em crescimento,
com inflação sob controle e melhora na distribuição de renda.
Dos indicadores sociais apresentados anteriormente, dois deles
são muito utilizados para representar a forma como a renda está
distribuída: a estratificação por faixas de renda; e, a utilização do
Índice de Gini.
A Figura 3.17 exibe o comportamento do Índice de Gini do Brasil
compreendendo o período 1990 a 2009, calculado pelo IPEA.
138
Economia Brasileira Contemporânea
Figura 3.17 – Índice de Gini do Brasil – IPEA: 1990/2009
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
O Índice de Gini do Brasil no período entre 1993 a 1998 oscilou
um pouco acima de 0,60. Em seguida, sofreu uma pequena
queda, passando em 2002 para 0,589. A partir de 2003, com a
recuperação da economia, esse índice tem reduzido, ano após
ano, chegando a 0,543 em 2009.
Mariano (2012, p. 52) destaca que o Brasil apresenta um dos
piores quadros de concentração de renda. De acordo com dados
do IBGE, no ano de 2009, a parcela dos 50% mais pobres ficava
com 15,25% da renda e 1% da população mais rica ficava com
12%. Uma década atrás, em 1999, esses números eram 14% e
13%, respectivamente, para os 50% da população mais pobre e
1% para a população mais rica.
Soares (2008, p. 6), em seu texto para discussão, procurou
responder se o ritmo de queda da desigualdade no Brasil
está adequado, ou não. Concluiu que o ritmo de queda na
desigualdade é adequado, mas que o desafio será manter este
ritmo por várias décadas, para alcançar o nível de desigualdade,
por exemplo, do Canadá. Soares explica que:
Os dados indicam que o ritmo de queda da desigualdade
no Brasil de 0,7 pontos de Gini ao ano é superior ao
ritmo que todos os países analisados seguiram enquanto
construíam seus estados de bem‑estar social, salvo a
Espanha, cujo ritmo foi um pouco superior (0,9 pontos
ao ano). Por seu turno, as distâncias que nos separam dos
países‑referência escolhidos são seis anos para o México,
12 para os Estados Unidos, e 24 anos para o Canadá.
Unidade 3
139
Universidade do Sul de Santa Catarina
A taxa de extrema pobreza
mede “o percentual das pessoas
na população total com renda
domiciliar per capita inferior à linha
de extrema pobreza (ou indigência,
ou miséria).” (CURADO, 2011, p. 93).
A recuperação do crescimento brasileiro se dá, também, num
contexto de diminuição das desigualdades e de redução da pobreza.
De acordo com Curado (2011, p. 93), a taxa de extrema pobreza
era de 11,49% em 2005, passando para 7,28% em 2009, enquanto
que a taxa de pobreza era de 30,82% em 2005, passando para
21,42% em 2009.
Você sabe definir a linha de extrema pobreza?
Segundo Curado (2011, p. 93), a linha de extrema pobreza
corresponde a uma estimativa do valor de uma cesta de alimentos
com o mínimo de calorias necessárias para suprir adequadamente
uma pessoa, com base em recomendações da FAO e da OMS.
O fato é que não existe um consenso sobre o critério a ser
utilizado como linha de extrema pobreza.
O governo federal adota como medida de extrema
pobreza familiar rendimentos mensais abaixo de
R$70,00 por pessoa, enquanto o Banco Mundial utiliza
a faixa de US$ 1 dólar por dia por pessoa como linha de
indigência e de US$ 2 dólares por dia por pessoa como
linha de pobreza.
Schwartzmann (2012, p. 297) comenta que ainda persiste no
Brasil a ideia de que os principais problemas sociais do país
são o baixo acesso aos serviços públicos essenciais e a pobreza
extrema. No entanto, existem relativamente poucos pobres no
Brasil quando se adota a linha de extrema pobreza sugerida pela
ONU: “apenas 3,8% da população têm renda per capita inferior a
US$ 1,25 por dia.” (SCHWARTZMANN, 2012, p. 297).
A Figura 3.18 exibe a evolução da taxa de pobreza e da taxa
de extrema pobreza (%) obtidas pelo Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (IPEA).
140
Economia Brasileira Contemporânea
Figura 3.18 – Taxa de pobreza e extrema pobreza do Brasil, em %: 1992‑2009
Fonte: Elaboração do autor, 2013 (a partir de informações do IPEADATA).
Obs.: Não existem dados para os anos de 1994 e 2000, então foram preenchidos por mim com
números intermediários.
Até 1995, a taxa de pobreza oscilava próximo de 40%, quando
passou para o patamar de 35% como resultado do Plano Real
(com a queda observada nas taxas de inflação). Permaneceu nesse
patamar até 2003, quando passou a cair continuamente, até
atingir 21% em 2009.
Por sua vez, a taxa de pobreza extrema exibe comportamento
semelhante ao anterior, mas, em diferentes patamares. Antes de
1995, as taxas eram próximas de 20%. Com o Plano Real,
as taxas caíram para o patamar de 15%, permanecendo neste
patamar até o ano de 2003. A partir daí, também passam a cair
continuamente, até atingir 7,28% em 2009.
A extrema pobreza existe, mas vem sendo reduzida
pelos programas focalizados de transferência de
renda e pela expansão do mercado de trabalho.
O acesso aos serviços básicos, como educação e
saúde, aumentou muito nas últimas décadas. Segundo
Schwartzmann (2012, p. 297), “o que se requer, cada
vez mais, é atenção para a iniquidade, a má qualidade
e o mau uso dos recursos públicos nesse acesso.”
O maior aprofundamento dessas questões vai além dos limites
desta disciplina. Entretanto, vale a pena transcrever parte das
conclusões de Schwartzmann (2012, p. 297), em seu artigo
“Repensando a agenda social”:
Unidade 3
141
Universidade do Sul de Santa Catarina
Repensando a agenda social
Devido à alta concentração de renda no país, os 80% mais pobres
da população detêm apenas 43% da renda e sua renda familiar
per capita mal chega aos R$1.300 por mês. A assim chamada
“nova classe média” consiste de pessoas com frequência
dependente do INSS, do SUS e do ensino público básico e que
mora nos locais onde é maior a criminalidade no país. As políticas
sociais hoje requeridas para atender a essa população são
muito mais complexas e caras do que no passado, requerendo
conhecimentos aprofundados e capacidade de gestão de que
o setor público muitas vezes não dispõe. Em particular, o rápido
envelhecimento da população brasileira, que se avizinha, vai
requerer recursos redobrados nas áreas de saúde e previdência.
O total dos gastos governamentais com saúde, educação,
segurança pública, previdência e transferência de renda está em
torno de 24% do PIB, um nível bem superior àquele dos demais
países de renda média como o Brasil. A carga tributária já atinge
36% do PIB no Brasil, igual à média dos países da OCDE, com
renda per capita três vezes superior à do país. Não parece mais
haver espaço político para aumento de impostos, mas há muito
a fazer para que os recursos disponíveis sejam utilizados de
forma eficiente.
Concluímos, pois, estar na hora de desenvolver uma nova
agenda social para o Brasil, que seja equânime, ao privilegiar
o acesso dos mais pobres à seguridade social; realista,
ao reconhecer a restrição orçamentária; e eficaz, ao lidar com a
complexidade das tarefas à frente, com uma gestão responsável
e consequente dos recursos públicos. Mais especificamente,
as novas políticas sociais brasileiras precisam ir além da miséria,
para cuidar das necessidades básicas da grande massa da
população brasileira – os 80% das famílias brasileiras com renda
per capita inferior a R$1.300 por mês.
Para focar as políticas sociais nesses 80%, é preciso lidar com
alguns problemas políticos e legais complicados. Boa parte dos
chamados gastos sociais beneficia não os 80% mais pobres,
mas os 20% mais ricos. É assim com a previdência do servidor
público, a gratuidade das universidades públicas, os gastos
do SUS com remédios caros e procedimentos de média e alta
complexidade, frequentemente obtidos através de ações
judiciais. É assim, também, com os “bicos” que os policiais
fazem para dar segurança aos mais ricos, nas suas 48 horas de
descanso remunerado. Para ter dinheiro para praticar política
social de qualidade para os 80% mais pobres, é preciso limitar
os privilégios dos 20% mais ricos, o que significa confrontar as
corporações que representam seus interesses.
142
Economia Brasileira Contemporânea
Os problemas legais para focalizar os gastos sociais nos 80% mais
pobres derivam de uma peculiar, mas disseminada, interpretação
dos princípios constitucionais da universalidade e da igualdade.
Na interpretação corrente, as desigualdades dos benefícios
sociais não devem ser corrigidas com o redirecionamento dos
gastos públicos, mas sim pela expansão dos gastos e a extensão
para os demais dos benefícios já conquistados por uma minoria
de 20%, que são considerados direitos adquiridos. É claro,
entretanto, que não há dinheiro suficiente para essa expansão.
O país tem uma carga tributária elevadíssima para seu nível de
renda e, mesmo assim, os orçamentos públicos continuam
deficitários. A única maneira de implantar os princípios da
universalidade e da igualdade na prestação dos serviços
públicos é partindo de baixo para cima, e não de cima para
baixo [grifo meu]. A equidade se impõe como o princípio
norteador básico das políticas sociais numa sociedade tão
desigual como a brasileira.
Você deve reconhecer que são enormes os avanços do país,
quando se compara a situação atual com aquela descrita na
primeira metade dos anos 1990. O “dragão da inflação” foi
domado e a longa década perdida ficou para trás. Desfrutamos
de um período de estabilidade e crescimento com distribuição de
renda, ainda que estejamos numa situação nada confortável em
relação a este último indicador.
É nesse quadro econômico que o presidente Lula elegeu sua
sucessora no segundo turno da eleição de 2010, com 56%
dos votos válidos. Em 1º de janeiro de 2011, Dilma Rousseff
assumiu a presidência do país.
Unidade 3
143
Universidade do Sul de Santa Catarina
Seção 6 – Dilma Rousseff: as nossas insuficiências
Você observou que esta unidade contemplou indicadores econômicos
com dados dos anos 2011 e 2012, período do governo Dilma.
Longe de querer realizar uma abordagem sobre o governo atual,
as próximas linhas se ocupam, principalmente, em apontar algumas
insuficiências de nossa economia.
Em meados de 2012, na solenidade do “Prêmio Melhores e
Maiores 2012 ‑ Revista Exame”, o ministro Guido Mantega
chamou atenção para um aspecto fundamental de cujo impacto
real, segundo ele, os agentes econômicos ainda não se deram conta.
Trata‑se da mais importante reforma estrutural feita
nos últimos anos e cujos efeitos ainda serão sentidos
em sua plenitude: o novo equilíbrio macroeconômico
representado por juros reais bem mais baixos, política
fiscal sólida, combinada com uma política de maior
competitividade do real.
[...] Aos que ainda não estão enxergando a nova realidade
que se configura, minha sugestão é que abram os olhos
para aproveitar as imensas oportunidades que se colocam
no Brasil. (MANTEGA, 2012, p. 2).
Apesar dos avanços obtidos nos últimos anos, em 2013 o Brasil
continua com alguns problemas similares aos que existiam em
meados da década de 1990, e que precisam ser enfrentados.
Estamos preparando‑nos de maneira adequada para
aproveitar no longo prazo a bonança dos últimos anos?
Segundo Giambiagi (2012, p. 266), existem algumas tarefas mais
ou menos claras para serem implementadas, a fim de que o país
possa crescer vigorosamente e de forma animadora no longo prazo:
„„
144
A necessidade de conter o gasto público e modificar o mix
de despesas entre os gastos correntes e os investimentos.
Economia Brasileira Contemporânea
„„
„„
„„
„„
„„
„„
A melhoria da produtividade total dos fatores, que
tem apresentado uma evolução bastante pobre. É bom
lembrar que, uma vez ocupados os recursos existentes,
o desenvolvimento do Brasil se fará a partir da melhoria
da produtividade.
A precariedade evidente da educação, apesar da melhora
alcançada especialmente nos anos do século XXI.
A julgar pela experiência internacional na relação
existente entre desenvolvimento educacional e progresso
econômico, nossa perspectiva futura de desempenho
nessa área parece ainda distante de ser animadora.
A baixa poupança doméstica tem sido um limitador
importante para a economia brasileira, o que tem sido
contornado pelo acesso à poupança alheia (externa).
Na eventualidade de uma nova retração da entrada
de capitais externos, esse mecanismo poderá se
revelar preocupante.
As condições da infraestrutura, que apresenta gargalos
importantes para o crescimento robusto e sustentável no
longo prazo.
O arcabouço institucional continua sendo inadequado para
o ambiente dos negócios, resultado da combinação de:
ineficiências administrativas, dificuldades para abertura de
empresas, burocracia oficial e elevada carga tributária.
As mudanças demográficas pelas quais o país transitará
nas próximas décadas, quando teremos em 2050 a mesma
População Economicamente Ativa (PEA) de 2010.
As projeções do IBGE apontam para um fator de mais
de 5 vezes o número de indivíduos com 80 anos ou mais
e 3,5 vezes o número de indivíduos com 60 anos ou
mais. A transição demográfica talvez seja o desafio mais
importante de todos.
É preciso agir na intensidade necessária para promover o gasto
público eficiente e de qualidade, a produtividade, a poupança
doméstica, a boa infraestrutura e a educação.
Unidade 3
145
Universidade do Sul de Santa Catarina
Ignorar os fatos anteriores não os fará deixar de existir.
O conhecimento da história e de como se desenvolveu o caso
da economia brasileira no período recente é fundamental para
obtenção de um diagnóstico de modo que se possa definir o que
fazer e propor as medidas de política econômica.
Sempre é bom lembrar que, em economia, a versão na qual
se acredita importa muito. Isto porque é essa versão que irá
influenciar as políticas a serem implementadas e a maneira como
se comportará, no futuro, a economia brasileira.
Síntese
Nesta unidade, você compreendeu o contexto econômico
e político no início do governo Lula, que passou por um
processo de moderação e caminho para o centro. Conheceu
as desconfianças em relação ao novo governo, a eleição do
presidente Lula e as medidas econômicas de transição.
Aprendeu que, ao longo dos dois governos de Lula, as metas
de inflação foram cumpridas dentro do intervalo de tolerância,
com uma tendência contínua de queda. A mesma tendência
pode ser dita em relação ao comportamento da taxa de juros,
que contribuiu para “acertar o alvo e a estabilidade monetária”.
Você aprendeu como se desenvolveu a política fiscal e o
desempenho das contas públicas nos dois governos Lula,
com destaque para o pagamento de juros do setor público,
o déficit nominal e o resultado primário. Estudou, ainda,
o comportamento da dívida pública e da carga tributária que
estabeleceu nova marca recorde em 2011.
146
Economia Brasileira Contemporânea
Analisou a trajetória da taxa de câmbio nominal mensal entre
janeiro de 2002 e dezembro de 2012, que apresentou uma
apreciação substancial. Conheceu o desempenho externo de
nossa economia com destaque para as contas do Balanço de
Pagamento e da Balança Comercial.
No campo da economia real, você aprendeu como se deu a
retomada do crescimento econômico, que havia entrado em
colapso desde os anos 80, e seus efeitos sobre o emprego, a
distribuição da renda e a pobreza.
Finalmente, você reconheceu que são enormes os avanços do
país quando se compara a situação atual com aquela descrita na
primeira metade dos anos 1990. Desfrutamos de um período de
estabilidade e de crescimento com distribuição de renda, ainda
que estejamos numa situação desconfortável em relação à questão
da distribuição de renda.
Unidade 3
147
Universidade do Sul de Santa Catarina
Atividades de autoavaliação
Ao final de cada unidade, você realizará atividades de autoavaliação.
O gabarito está disponível no final do livro didático. Mas esforce‑se para
resolver as atividades sem ajuda do gabarito, pois, assim, você estará
promovendo (estimulando) a sua aprendizagem.
1) O governo Fernando Henrique terminou com um quadro de
instabilidade econômica relacionada a pressões cambiais e a uma
aceleração da inflação e ao risco‑país. Explique:
a. O que se entende pela crise eleitoral de 2002?
148
Economia Brasileira Contemporânea
b. Qual o significado da ideia de “dominância fiscal”?
2) Quais as justificativas da equipe econômica para usar a prática de juros
altos como instrumento de combate à inflação?
Unidade 3
149
Universidade do Sul de Santa Catarina
3) A prometida reforma tributária não saiu do papel, ou seja, não houve
simplificação e nem ocorreram reduções da carga tributária. Por outro
lado, no período 2003 a 2010, ocorreram avanços importantes,
com destaque para a evolução da dívida pública. Pede‑se:
a. Descreva a evolução da dívida pública em relação ao PIB durante a
gestão de Palocci‑Meirelles.
b. Aponte, pelo menos, dois elementos que podem explicar o
comportamento observado da Dívida/PIB
150
Economia Brasileira Contemporânea
Saiba mais
Se você desejar, aprofunde os conteúdos estudados nesta unidade,
ao consultar as seguintes referências:
BARROS, Alexandre Rands. Desigualdades regionais e
desenvolvimento econômico. In: FERREIRA, Pedro Cavalcanti
(Coord.). Desenvolvimento econômico: uma perspectiva
brasileira. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013. p. 426 – 447.
CARDOSO, Renato Fragelli. Política econômica, institucional e
crescimento: a experiência brasileira (1945 – 2010). In: FERREIRA,
Pedro Cavalcanti (Coord.). Desenvolvimento econômico: uma
perspectiva brasileira. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013. p. 129 – 165.
FERREIRA, Pedro Cavalcanti; VELOSO, Fernando.
O desenvolvimento econômico brasileiro no pós‑guerra.
In: FERREIRA, Pedro Cavalcanti (Coord.). Desenvolvimento
econômico: uma perspectiva brasileira. Rio de Janeiro: Elsevier,
2013. p. 166 – 210.
BONELLI, Regis; BACHA, Edmar. Crescimento brasileiro
revisitado. In: FERREIRA, Pedro Cavalcanti (Coord.).
Desenvolvimento econômico: uma perspectiva brasileira.
Rio de Janeiro: Elsevier, 2013. p. 236 – 262.
ELLERY, Roberto; TEIXEIRA, Arilton. O milagre,
a estagnação e a retomada do crescimento. In: FERREIRA,
Pedro Cavalcanti (Coord.). Desenvolvimento econômico:
uma perspectiva brasileira. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013.
p. 263 – 286.
SCHWARTZMAN, Simon. Repensando a agenda social.
In: BACHA, Edmar. Belíndia 2.0: Fábulas e ensaios sobre o
país dos contrastes. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012.
p. 269 – 302.
Unidade 3
151
Universidade do Sul de Santa Catarina
MINISTÉRIO DA FAZENDA. Economia brasileira em
perspectiva. 17. ed. 2012. Disponível em: <http://www.fazenda.
gov.br/portugues/docs/perspectiva‑economia‑brasileira/edicoes/
Economia%20Brasileira%20Perspectiva‑‑PT‑‑17ed.pdf>. Acesso
em: 12 mar. 2013.
152
Para concluir o estudo
Neste livro didático, o objetivo foi fazer uma
mediação entre os futuros profissionais das Ciências
Econômicas e o conteúdo da Economia Brasileira
Contemporânea. Os conhecimentos do conteúdo
desta disciplina permitem a contextualização da
situação econômica e política atual no processo
evolutivo histórico da economia brasileira e sua
relação com a economia e política mundiais.
Somente através do reconhecimento da realidade
brasileira será possível para um economista emitir
juízo de valor ou propor soluções adequadas.
O estudo da Economia Brasileira Contemporânea
implica perceber o processo evolutivo histórico,
político, econômico e social das décadas anteriores
ao segundo milênio até os dias atuais.
Sem pretensão de esgotar o assunto, espero que os
estudos tenham contribuído para a compreensão
dos problemas econômicos fundamentais de nosso
país. Aliás, é preciso compreendê‑los bem, para que
possamos equacioná‑los e evitarmos a interrupção do
ciclo de bons resultados obtidos neste segundo milênio.
É bom lembrar que os conhecimentos sobre como
funciona a economia brasileira contemporânea
são fundamentais para a formação do futuro
profissional de economia e, também, de grande
importância para cada cidadão de nosso país.
Sucesso em sua caminhada!
Professor Luis Augusto Araújo
Referências
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SOUZA, Nilson Araujo de. Economia brasileira contemporânea: de Getúlio
a Lula. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2008.
158
Sobre o professor conteudista
Luis Augusto Araújo
Possui mestrado em Economia Aplicada pela
Universidade de São Paulo – USP e especialização
em Administração Rural pela Universidade de
Lavras – MG. Atua em projetos de pesquisa e
desenvolvimento do programa de “Gestão de Negócios
e Mercados” da Empresa de Pesquisa Agropecuária
e Extensão Rural de Santa Catarina – Epagri.
Desde 1998, é professor da Universidade do Sul de
Santa Catarina – Unisul. Tem experiência na área de
Administração e Economia, atuando principalmente nos
seguintes temas: fundamentos de economia, cenários
econômicos, economia brasileira, administração rural,
mercado agrícola e pesquisa operacional.
Respostas e comentários das
atividades de autoavaliação
Unidade 1
1) Item (c). Os dois itens são argumentos favoráveis em defesa
de medidas protecionistas.
2) A posição II. Os planos de estabilização do governo Collor
foram marcadamente heterodoxos. Para o pensamento
heterodoxo, a inflação poderia ser combatida sem o apelo
ao controle da demanda, isto é, não haveria necessidade de
uma política recessiva. O congelamento de preços e salários
é um tipo de medida (política de rendas) característico dessa
corrente e que foi uma das principais medidas adotadas no
Plano Collor I.
Unidade 2
1) Item (a). Em outubro de 1994, o governo passou a adotar a
âncora cambial, que tem a virtude de exercer forte pressão
sobre os preços no setor de bens comercializáveis.
2) Você poderá comentar que, além do ajuste fiscal ter sido
feito por elevação das receitas de impostos, algumas
mudanças estruturais foram implementadas, relacionadas
ao comportamento das despesas. Algumas das principais
mudanças foram: (i) A aprovação da Lei de Responsabilidade
Fiscal (LRF), em 2000 – que estabelecia limites para despesas
com pessoal em cada um dos três níveis de governo,
dispositivos para controle e transparência das contas públicas,
limites ao endividamento – proibiu novas renegociações
de dívidas entre entes da federação e penalizações aos
gestores públicos que não cumprissem a lei; (ii) A Reforma
da Previdência Social. Em 1998, estabeleceu‑se uma idade
mínima para novos entrantes no serviço público e ampliou‑se
a necessidade de tempo de contribuição para quem já estava
na ativa. Em 1999, aprovou‑se o fator previdenciário para o
INSS que alterou a regra de cálculo dos benefícios e substituiu
o preceito do tempo de serviço pelo tempo de contribuição;
(iii) A Renegociação das Dívidas Estaduais. A renegociação
consistia no comprometimento dos estados junto à União,
Universidade do Sul de Santa Catarina
a federalização das dívidas, que seriam pagas em 30 anos em parcelas
mensais. Como contrapartida, conseguiu evitar que os estados
burlassem a regra de pagamento.
3) Você poderá explicar esse desgaste enfatizando os seguintes fatos:
(i) a deteriorização da conta‑corrente estava gerando um aumento
acelerado dos passivos externos do país; (ii) a necessidade de
compensar esse déficit externo, com a entrada de capital estrangeiro
atraído pelas elevadas taxas de juros oferecidas no mercado, passou a
gerar uma despesa financeira significativa; (iii) essa despesa financeira,
por sua vez, pressionava as contas públicas e contribuía para piorar
a trajetória da relação dívida pública/PIB, além de se constituir um
entrave para o crescimento econômico.
Unidade 3
1)
a. As políticas defendidas pelo partido dos trabalhadores anteriormente
à eleição colocavam em dúvida o compromisso com a estabilidade e
incertezas em relação à preservação dos contratos, contribuindo para
agravar o quadro de instabilidade de 2002. Você pode lembrar‑se das
medidas defendidas pelo partido, tais como: redução das despesas
com juros (pela queda acelerada dos juros e/ou pela renegociação da
dívida); redução do superávit primário; repulsa ao acordo com o FMI;
críticas ao regime de metas de inflação.
b. A ideia de dominância fiscal relacionou‑se à necessidade do novo
governo de sinalizar que este geraria um superávit primário superior
aos 3,75% do PIB do governo FHC, em nível suficiente para estabilizar e
reverter a tendência de crescimento da dívida, e, os questionamentos
relacionados à privatização e do papel das agências reguladoras. Para
aquele nível de juros, crescimento econômico e montante de dívida,
o superávit primário prometido pelo governo era insuficiente para
estabilizar a dívida.
2) Você poderá apontar três aspectos centrais que podem justificar a
manutenção de elevadas taxas de juros:
162
„„
A convivência com um longo período de alta inflação, com
elevados custos para o desenvolvimento social e econômico,
ajuda a explicar a adoção de medidas mais conservadoras
(o Banco Central reage de forma mais forte quando da
ocorrência de desvios entre a meta e a expectativa de inflação).
„„
A relação existente entre política monetária e as finanças
públicas. A necessidade de rolagem da dívida pública impõe
limites para a queda de juros real, além do que o governo
Lula não utilizou instrumentos fiscais na contenção da
demanda agregada.
Economia Brasileira Contemporânea
„„
A ocorrência de uma verdadeira explosão do crédito,
especialmente ao consumidor. “Em janeiro de 2003, a relação
operação de crédito (setores público e privado) /PIB era de
23,94%. Em outubro de 2010, esta relação atingiu 47,25%.”
3)
a. A evolução da dívida líquida do setor público experimentou um
processo contínuo de redução. Caiu de 60% do PIB em 2003, para 40%
do PIB em 2010, e chegou a 35% do PIB durante o ano de 2012.
b. O aluno poderá apontar os seguintes pontos que podem explicar esse
comportamento:
„„
A apreciação cambial verificada a partir de 2002 (incidia sobre
uma dívida pública ainda fortemente atrelada à taxa de câmbio).
„„
A tendência de redução do juro real entre os governos
Fernando Henrique e Lula (reduzindo as despesas financeiras
e evoluindo favoravelmente os ajustes patrimoniais).
„„
Além disso, a melhoria da relação Dívida/PIB, especialmente
no triênio 2002/2005, se deveu não à desaceleração do
crescimento da dívida em valores absolutos, mas ao
crescimento do PIB alavancado pelas exportações.
163
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