UNIVERSIDADE DO PORTO Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO 2012/2013 Liberdade para ensinar e aprender Carlos Justo As perguntas “o que é ensinar”, “o que é aprender” e a sua formulação estão ligadas aos problemas específicos que decorrem da atenção que é dada à escola e à educação. O ensino deve dar resposta aos problemas dos nossos alunos. Ao ensinarmos, devemos fazer com que eles formulem as suas perguntas, a partir das suas perspectivas. Nós devemos acompanhálos dando-lhes os instrumentos necessários para que eles próprios consigam resolver os seus próprios problemas. Ensinar é fazer com que o aluno aprenda a seleccionar as várias possibilidades que se lhes apresenta, aprenda a reduzir as complexidades dos assuntos. Aprender é tomar consciência do que já se conhece. Aproximando o ensinar e o aprender, vemos que o que é dado no ensino não é o que pode ser aprendido, mas apenas a indicação que permite apanhar por si mesmo o que já se tem. Quando apenas se toma posse de algo que é oferecido, não se está a aprender, o que só se começa a fazer quando se experimenta o que se «apanha» como o que em si mesmo já se tem, ou seja, quando, exercitando-se com o que é proposto, se fará uma apropriação de algo através do uso que se faz da própria razão. Assim, o próprio ensinar só se pode fazer aprendendo: do que se trata, mais do que adquirir conteúdos de conhecimentos, é de uma prática da razão. Ensinar não é transmitir conteúdos, mas ensinar processos. Por exemplo, o ensino e a possibilidade de ensinar no caso específico da filosofia, tem a ver fundamentalmente com aquilo que se pretende ensinar, isto é, da própria natureza da filosofia, do facto de ela só poder propor, exercitar a aprendizagem do filosofar. Não será o ensino da filosofia (pela liberdade do professor e da consequente responsabilidade da sua actuação, pelo grau de autonomia que isso implica, se “fora” de um espaço pedagógico institucionalizado – criando um espaço de criatividade, improvisação, liberdade) a capacidade de assumir o risco e de dizer, de modo oportuno, aquilo que é o verdadeiro incitamento ao pensar? Ensinar é fazer com que o aluno aprenda a questionar, a colocar as questões fundamentais. As questões são caminhos para as respostas. O problema é como se colocam as questões. Centrar-se nos problemas supõe uma atitude diferente daquela que implica centrar-se nas soluções. Situarse nos problemas representa ao mesmo tempo o ensinar a perguntar, o aprender a formular questões e colocar os problemas adequados. Se conhecer é ir ao encontro das coisas e perguntar, então aquilo que conhecemos depende do modo como perguntamos. Se conhecer é distinguir, é delimitar, devemos estar sempre conscientes dos limites do nosso conhecimento. Devemos ensinar para consciencializar sobre o que ignoramos e não que para qualquer problema há uma solução. A função do professor não é ensinar um saber. O professor deve perguntar aos estudantes o que eles querem aprender, dar-lhes a possibilidade deles seleccionarem o que querem aprender. Numa escola em que o professor não pode escolher o que quer ensinar e o aluno não opta sobre o que quer aprender, como se pode falar de liberdade? Em todas as situações o professor deverá parar e ganhar tempo, perdendo tempo, ouvindo os alunos que tem à sua frente, deverá fomentar uma relação aberta, transparente, assente na preocupação pelo outro, na interdependência, na demarcação que permite ao outro crescer na sua individualidade, na auto- responsabilidade. Esta relação implica, sobretudo, comunicação e novas competências do professor: colaboração, cooperação. O professor deve ter sempre presente que o aluno é alguém com quem se pode dialogar, o que requer autenticidade, disponibilidade, respeito pela privacidade. A sua função é incentivar a procura de informação para tomar decisões, fazer com que o aluno aprenda a fazer opções. Devemos ensinar a capacidade de buscar a verdade e não ensinar a verdade, pois não há uma única racionalidade. Quanto mais possibilidades dermos, maior é a liberdade que proporcionamos. O sentimento de que se é livre proporciona uma escolha, uma oportunidade única de esclarecer o que se quer ser e o que se quer aprender; o sentimento de que se é livre leva a aceitar a possibilidade de errar e de constatar os erros, dum modo responsável, de forma a procurar as alternativas positivas. Em que condições o acto educativo deverá ser realizado, no sentido de fazer crescer essa capacidade de decisão? O professor deve ser o facilitador da aprendizagem, deve ensinar a aprender a maneira de aprender. O professor e o aluno devem ser capazes de acabar com a oposição entre o ensinar e o aprender: quando se ensina está-se a aprender e aprende-se melhor quando se ensina. Nesta dialéctica pode-se ensinar e aprender em liberdade.