AC-2975-43/13-P

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TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 021.201/2013-7
GRUPO I – CLASSE V – Plenário
TC nº 021.201/2013-7.
Natureza: Relatório de Levantamento.
Órgãos: Secretaria de Estado de Saúde de Mato Grosso e Secretarias
Municipais de Saúde de Cuiabá, Várzea Grande, Barra do Bugres e
Barra do Garças.
Interessado: Ministério da Saúde.
Advogado constituído nos autos: não há.
SUMÁRIO: RELATÓRIO DE LEVANTAMENTO. SUBSÍDIOS
PARA A ELABORAÇÃO DO RELATÓRIO SISTÊMICO DA
SAÚDE. COLETA DE DADOS SOBRE ENTIDADES
PÚBLICAS QUE ATUAM NA ÁREA DE SAÚDE NO ESTADO
DO MATO GROSSO. VISITAS A QUATRO HOSPITAIS DA
REDE PÚBLICA. IDENTIFICAÇÃO DE PROBLEMAS DE
ORDEM MATERIAL, ESTRUTURAL E DE RECURSOS
HUMANOS. ATINGIMENTO DOS OBJETIVOS QUE
ENSEJARAM
A
ATUAÇÃO
DESTE
PROCESSO.
APENSAMENTO AO PROCESSO NO QUAL SERÃO
CONSOLIDADAS AS INFORMAÇÕES ORIUNDAS DOS
DIVERSOS LEVANTAMENTOS.
RELATÓRIO
I - Introdução
O presente levantamento operacional foi realizado com vistas à produção de diagnóstico
sobre a assistência hospitalar no Sistema Único de Saúde (SUS) no Estado do Mato Grosso.
2.
Conforme exposto no Memorando-Circular nº 23/2013 - Segecex, de 06/06/2013, por
determinação do Presidente Augusto Nardes, serão elaborados em 2013 relatórios sistêmicos sobre
funções de governo específicas. Entre esses relatórios, figura o Relatório Sistêmico da Saúde, que
conterá um capítulo sobre a assistência hospitalar no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS. O
referido capítulo será elaborado a partir da consolidação dos diversos levantamentos sobre o tema
realizados em todos os estados da federação e no Distrito Federal.
3.
Determinei a realização deste levantamento por meio de despacho exarado no dia
12/07/2013 (TC nº 019.167/2013-0). Objetivou-se conhecer a organização e o funcionamento dos
programas, órgãos e entidades da assistência hospitalar no Mato Grosso, bem como identificar seus
principais problemas, objetos e instrumentos de fiscalização, avaliando a viabilidade de atuação do
Tribunal.
4.
A equipe de auditoria participou de reuniões com a Secretaria Estadual de Saúde de Mato
Grosso, a Auditoria Geral do Estado, o Ministério Público Estadual de Mato Grosso, o Conselho
Regional de Medicina de Mato Grosso, a Defensoria Pública Estadual de Mato Grosso e as Secretarias
Municipais de Saúde de Cuiabá, Várzea Grande, Barra do Garças e Barra do Bugres.
5.
Foram visitados os seguintes hospitais:
a) Hospital e Pronto Socorro Municipal de Cuiabá;
b) Hospital Municipal de Barra do Bugres;
c) Hospital e Pronto Socorro Municipal de Várzea Grande;
d) Hospital e Pronto Socorro Municipal Milton Pessoa Morbeck.
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6.
Nas visitas aos hospitais, foram realizadas entrevistas estruturadas abrangendo as
principais áreas e serviços daquelas unidades. Os questionários contendo o extrato das entrevistas
constam à peça 18. Além das informações obtidas nas entrevistas, o presente processo contempla
informações constantes de relatórios de fiscalizações do Conselho Regional de Medicina e da
Auditoria Geral do Estado, os quais foram integralmente juntados às peças 15, 16, e 19.
7.
A unidade técnica frisou que não apresentaria propostas de encaminhamento para os
problemas por ela apontados, em função da configuração peculiar do trabalho a ser consolidado e das
orientações expedidas pela Secex Saúde (peças 21 e 22). De acordo com tais orientações, devem ser
propostos o apensamento destes autos ao processo que trata do relatório consolidado (TC nº
026.797/2013-5) e o envio de cópia do Acórdão que vier a ser proferido, bem como do Relatório e do
Voto que o fundamentarem, aos órgãos e entidades contemplados neste levantamento.
8.
Em 2012, foram repassados R$ 502,7 milhões para o estado de Mato Grosso com a finalidade
de custear as ações de saúde de média e alta complexidade. Até o mês de julho de 2013, o governo federal
repassou R$ 273,5 milhões com essa mesma finalidade. Desse montante, R$ 211,2 milhões foram
aplicados nos municípios visitados pela equipe de auditoria: Cuiabá, Várzea Grande, Barra do Garças e
Barra do Bugres.
II – Serviços Hospitalares
II.1 – Superlotação
9.
Dos quatro hospitais visitados, em dois foram observados pacientes internados nos
corredores ou acomodados precariamente em macas, cadeiras e mesas, o que é uma evidência nítida de
superlotação. Os gestores desses hospitais admitiram que a taxa de ocupação dos leitos de emergência
ou urgência sempre ultrapassa 100%. Os gestores de outro hospital afirmaram que, com muita
frequência, essa taxa fica acima de 100%, embora, no dia da visita, essa situação não tenha sido
observada. Por fim, os gestores do quarto hospital informaram que poucas vezes ocorre a superlotação.
10.
No principal hospital visitado, o gestor informou que na sala vermelha havia trinta leitos
ocupados, embora ela tenha capacidade para somente cinco leitos. Essa sala deveria servir apenas para
a estabilização de casos urgentes, uma vez que os pacientes cuja condição estivesse estável deveriam
ser encaminhados para a enfermaria ou a UTI. Contudo, a ausência de vagas nesses dois últimos
setores acaba por represar pacientes na mencionada sala vermelha.
11.
Os dois principais hospitais visitados também foram inspecionados pelo Conselho
Regional de Medicina do Mato Grosso – CRM/MT, em novembro de 2012, que identificou “evidente
superlotação” na internação e casos de pacientes internados há um ano aguardando vagas em UTI ou
transferência. Na sala vermelha do principal hospital, o CRM/MT constatou a indisponibilidade de
leitos para recebimento de pacientes trazidos pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência
(SAMU). Nesse contexto, o atendimento desses pacientes era realizado no chão.
12.
Além disso, o CRM/MT verificou a falta de medicamentos, monitores para pacientes em
estado grave e ventiladores mecânicos (na ocasião da visita, havia um paciente sob ventilação manual
há quase quatro horas). Também foi apontada a ausência de isolamento de pacientes portadores de
moléstias contagiosas, a carência de médicos visitadores e a falta de exames com imagens.
13.
Tais problemas decorrem da baixa resolutividade dos atendimentos, da carência de leitos e
de deficiências do sistema de regulação e da estrutura física. Segundo a Secretaria Municipal de Saúde
de Cuiabá, 85% das internações reguladas entre janeiro a julho de 2013 foram para casos supostamente
de urgência ou emergência, o que caracteriza o fenômeno denominado “urgencialização”. A referida
Secretaria informou ainda que, enquanto alguns hospitais extrapolam o teto de internações autorizado
pela Central de Regulação, outros não o atingem, o que aponta para a necessidade de reavaliar o
encaminhamento dos casos de urgência e emergência e a real capacidade para realizar cirurgias
eletivas.
14.
A superlotação dos hospitais aumenta a mortalidade, prejudica a qualidade do atendimento
e sobrecarrega os profissionais.
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II.2. Insuficiência de leitos
15.
Os gestores das secretarias de saúde e o Defensor Público Estadual responsável pelas
demandas nessa área destacaram a quantidade insuficiente de leitos de UTI como um dos maiores
problemas da assistência hospitalar no estado. O Defensor mencionou que nem sempre a obtenção de
uma liminar garante o acesso a leitos, devido à falta de vagas. Em alguns casos, a condição do paciente
evolui para o óbito.
16.
A Portaria GM-MS nº 1.101/2002 estima, de modo geral, a necessidade de 2,5 a 3 leitos
hospitalares por mil habitantes, dos quais 4 a 10% devem direcionados para as UTI. No Mato Grosso,
há 2,22 leitos por mil habitantes, parâmetro que cai para 1,87 quando comparada a quantidade de leitos
SUS com a parcela da população sem plano de saúde. Portanto, a disponibilidade de leitos públicos
para a população que efetivamente necessita da cobertura do SUS é 25% inferior ao parâmetro geral.
Quantidade de leitos para
internação (Cadastro Nacional de
Entidades de Saúde - CNES)
Leitos
Leitos
Leitos
existentes
SUS
não SUS
6.927
4.906
1.976
Dados da população (IBGE e ANS)
População
total
3.115.336
População
com plano de
saúde
441.660
População
sem plano de
saúde
2.673.676
Leito por
mil
habitantes
Leitos SUS
por mil
habitantes sem
planos de
saúde
2,22
1,87
17.
Segundo dados do IBGE, a quantidade de leitos por habitante no Brasil e no Mato Grosso
vem sendo reduzida ao longo dos anos, como se observa na tabela abaixo.
Mato Grosso
Brasil
1990
3,40
3,71
1992
3,65
3,66
1999
3,35
2,96
2002
2,99
2,70
2005
2,39
2,41
2009
2,00
2,26
18.
Importa ressaltar que a redução da quantidade de leitos por habitante, por si só, não indica
deficiência ou carência da rede hospitalar, pois diversos fatores devem ser considerados na estimativa
do quantitativo adequado de leitos. Assim sendo, até mesmo o declínio desse indicador pode ser
justificado, por exemplo, pela melhoria e ampliação da assistência básica. Contudo, no caso específico
do estado de Mato Grosso, restou nítida a carência de leitos nos dois maiores hospitais públicos do
estado.
19.
Por outro lado, os gestores dos hospitais visitados afirmaram que a maioria dos
atendimentos realizados nessas instituições poderia ter sido efetuada nas unidades básicas de saúde.
Logo, o quadro atual de déficit de leitos hospitalares e de superlotação é agravado pela deficiência da
atenção básica e por uma cultura hospitalocêntrica arraigada na população.
20.
Essa situação adversa deriva da baixa resolutividade do atendimento, da insuficiência de
recursos para ampliar o atendimento, da atribuição de um caráter urgente à maioria das internações, da
cultura hospitalocêntrica e da deficiência da atenção básica. Aduz-se que essa conjuntura prejudica a
qualidade do atendimento, aumenta a mortalidade e sobrecarrega os profissionais de saúde.
II.3. Discrepância entre a quantidade de leitos existente e a constante do Cadastro
Nacional de Entidades de Saúde - CNES
21.
Três dos quatro hospitais diligenciados informaram quantidades de leitos discrepantes dos
quantitativos cadastrados no CNES (p. 25 da peça 18). Por exemplo, o maior hospital do estado
noticiou a existência, em agosto de 2013, de 235 leitos (p. 2 da peça 24), já no CNES constava que
naquele mês essa unidade hospitalar possuiria 395 leitos, o que caracteriza uma divergência de 40%
(pp. 1 e 2 da peça 30). Ainda em relação a essa unidade, a quantidade de leitos de UTI Adulto à
disposição do SUS registrada no CNES é o dobro da efetivamente existente. Questionado sobre a razão
dessas discrepâncias, o hospital ratificou suas informações, afirmou que os dados do CNES estão
equivocados e informou que o referido cadastro não é alimentado pelo hospital, mas pela central de
regulação do estado.
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22.
Considerando que o CNES auxilia gestores da saúde de diversas esferas de governo no
gerenciamento e na formulação de políticas públicas, além da regulação, é necessário revisar as
informações nele contidas e detectar as causas dessas inconsistências, a fim de tornar fidedigno o
referido banco de dados.
II.4. Bloqueio de leitos
23.
Os gestores de dois hospitais informaram que sempre há leitos bloqueados ou indisponíveis
para uso. Num terceiro hospital, essa circunstância ocorre muitas vezes. Apenas em um foi informado
que nunca ocorreu o bloqueio de leitos. Entre as causas desse bloqueio foram citados problemas de
manutenção ou estrutura predial e a falta dos equipamentos mínimos necessários.
24.
Leitos de UTI, da enfermaria e de observação foram os mais afetados pelo bloqueio. Em
um dos hospitais, o setor de pediatria está interditado desde 2011 devido a problemas sanitários que
resultaram no bloqueio de 15 leitos. Em outro hospital, quatro dos dez leitos de UTI estavam
indisponíveis, aguardando há mais de três anos a reforma da sala.
25.
As causas desse problema são a manutenção tardia e ineficaz, a necessidade de ampliar a
estrutura predial e a falta de equipamentos. Esses bloqueios colaboram para a ampliação da
superlotação dos hospitais e, por via de consequência, prejudicam o atendimento aos pacientes.
II.5. Subutilização de leitos hospitalares
26.
Considera-se subutilização de leitos hospitalares a utilização de leito de maior
complexidade para a prestação de atendimentos abaixo da respectiva complexidade projetada.
Verificou-se que em um dos hospitais visitados isso nunca ocorreu, em dois outros essa é uma situação
pouco frequente e no último ela é muito frequente.
27.
A subutilização ocorre porque os leitos de enfermaria (de menor complexidade) estão
todos ocupados e ainda há demanda por esses leitos ou porque o hospital precisa acomodar pacientes
provisoriamente antes de encaminhá-los para as policlínicas, que não funcionam durante as 24 horas
do dia. Cabe ressaltar que ela contribui para a superlotação dos hospitais.
II.6. Sobreutilização de leitos hospitalares
28.
Em todos os hospitais visitados, é muito frequente a sobreutilização de leitos, ou seja, o
uso de leitos de menor complexidade para prestar atendimentos de maior complexidade. Em um dos
hospitais, essa situação é permanente, uma vez que é sempre necessário improvisar leitos de UTI. Em
outro, costuma haver cerca de 10 pacientes na fila de espera por vaga em UTI em decorrência de
decisões judiciais liminares. O terceiro hospital, que é referência em média e baixa complexidade,
recebe pacientes que necessitam de atendimento de alta complexidade. O quarto hospital está operando
com apenas seis leitos de UTI, dos 10 existentes, pois os demais foram desativados para a reforma da
sala da Unidade de Tratamento Intensivo. Como a reforma prevista não ocorreu, há uma fila de espera
e os pacientes aguardam em leitos de menor complexidade.
29.
A utilização indevida desses leitos se deve à quantidade insuficiente de leitos de maior
complexidade, sobretudo de UTI, e às deficiências detectadas na estrutura física dos hospitais. Ela
aumenta o risco de agravamento do quadro do paciente.
II.7. Acomodação inadequada de pacientes
30.
A utilização de corredores para acomodar pacientes foi mencionada como uma situação
frequente em dois dos hospitais visitados, sendo que há profissionais escalados para prestarem o
atendimento nesses locais. Em um deles, chegou a haver 114 pacientes nos corredores.
31.
Esses dois hospitais costumam acomodar nos quartos uma quantidade de pacientes
superior à capacidade máxima desses cômodos. Em um deles, excetuando a enfermaria, todos os
setores estavam com mais leitos do que a capacidade original projetada, ou seja, o quarto era
reorganizado para caber mais leitos.
32.
Em outro hospital, no qual o excesso de pacientes não é tão frequente, quando o número de
pacientes supera a capacidade instalada, eles ficam na sala de soroterapia em poltronas reclináveis.
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33.
A acomodação inadequada é causada pela estrutura insuficiente para atender à demanda e
pelas deficiências dos sistemas de regulação e de atenção básica. Ela aumenta o risco de agravamento
do quadro do paciente.
II.8. Pacientes com alta médica que permanecem internados
34.
Em três dos hospitais visitados, verificou-se essa ocorrência, sobretudo por motivos
sociais. Em geral, esses pacientes não possuem moradia e suas famílias não têm interesse em cuidar
deles ou não possuem as condições necessárias para prestar no ambiente doméstico os cuidados por
eles demandados.
II.9. Dificuldade para referenciar pacientes
35.
Em todos os hospitais visitados, foi constatada grande dificuldade para referenciar
pacientes, sobretudo nas seguintes especialidades: cardiologia, neurologia, oncologia,
otorrinolaringologia e UTI. Em um dos hospitais, foi citada a dificuldade para contrarreferenciar
pacientes. Em outro, mencionou-se que o tempo de espera médio para referenciar se situa entre 6 e 8
meses. Num terceiro hospital, que não possui unidade de tratamento intensivo, apenas sala de
estabilização, informou-se haver grande dificuldade para referenciar pacientes para UTI, o que deveria
ocorrer logo após a estabilização do paciente.
36.
As possíveis causas dessas dificuldades são a insuficiência de leitos e as deficiências do
sistema de regulação e de organização da rede de atendimento, que ocasionam uma distribuição
ineficiente da demanda. O referenciamento intempestivo aumenta o risco de agravamento do quadro
do paciente.
II.10. Exames
37.
O tempo de espera pela realização de exames varia de acordo com o hospital e o tipo de
exame. Os gestores dos hospitais visitados afirmaram que:
a) em uma unidade hospitalar, a maior espera é pela realização de uma tomografia
computadorizada (uma semana);
b) em outra, os exames realizados na própria entidade não demoram mais do que 24h, já os
realizados fora da unidade, em particular os cardiológicos, com destaque para o cateterismo, têm
espera mínima de um mês;
c) no terceiro hospital, os exames realizados na própria unidade são feitos no mesmo dia.
Contudo, os exames de alta complexidade são realizados fora da unidade, sendo que os cardiológicos
têm espera de 60 a 90 dias;
d) no quarto hospital, não tem havido problemas com espera, mas é necessário requerer
alguns exames à rede privada, os quais são custeados pelo SUS.
38.
A Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá apresentou um retrato mais problemático da
situação. Ela informou que a maior demanda na central de regulação é por exames, em especial, estudo
urodinâmico, polissonografia, US doppler transcraniano, retinografia, otoneurológico, embolização,
jag laser e biópsia. Aduziu que o tempo de espera e a demanda reprimida têm gerado grande número
de processos judiciais (p. 15 da peça 20).
39.
A Secretaria Estadual de Saúde de Mato Grosso – SES/MT, por sua vez, informou a oferta
e a demanda reprimida para os principais exames na rede estadual. Foram utilizados dados do Sistema
de Regulação do SUS - Sisreg, o qual registra informações de apenas três dos seis hospitais estaduais,
pois, nos outros três, esse sistema está em fase de implementação. Destacam-se dados de demanda
reprimida e de oferta dos seguintes exames (pp. 7 a 15 da peça 29):
Exame
Endoscopia digestiva alta
Diagnóstico por ultrassonografia
Colonoscopia
Biópsia de tireoide
Tomografia computadorizada
Demanda reprimida até agosto de 2013
2.553
1.177
435
286
745
Oferta em agosto de 2013
276
290
101
0
500
5
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40.
Por outro lado, a relação fornecida pela SES/MT também relacionou exames para os quais
a oferta é substancialmente superior à demanda reprimida, a saber:
Exame
Radiodiagnóstico
Eletrocardiograma
Mamografia bilateral
Eletroencefalograma
Ecocardiograma com fluxo e cores
Demanda reprimida até agosto de 2013
2.553
1.177
435
286
745
Oferta em agosto de 2013
276
290
101
0
500
41.
As possíveis causas da realização intempestiva de alguns exames são as seguintes: carência
de estrutura, equipamentos e recursos e deficiências do sistema de regulação e organização da rede de
atendimento, o que ocasiona a distribuição ineficiente da demanda. Além de provocar prejuízos para a
qualidade, tempestividade e eficácia do tratamento, esses problemas colaboram para a judicialização
do atendimento.
II.11. Consultas eletivas
42.
Em dois hospitais visitados, os gestores informaram que as respectivas unidades não
realizam consultas eletivas. Em um terceiro, essas consultas são realizadas apenas em setores
específicos como queimados e ortopedia. Em um desses hospitais, os pacientes que necessitam se
consultar são encaminhados às policlínicas ou aos centros de especialidades técnicas e as consultas são
agendadas por meio da regulação. Nos outros dois, as consultas eletivas são realizadas nas policlínicas
e unidades básicas do Programa Saúde da Família, as quais são reguladas, ou realizadas no centro de
especialidades do município.
43.
No único hospital que realiza consultas eletivas, a clínica médica exige o maior tempo de
espera, cerca de 3 horas. O procedimento não é regulado, de modo que o atendimento é realizado por
ordem de chegada.
44.
A Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá informou que para várias especialidades
médicas a oferta de consultas é insuficiente ou inexistente (pp. 9 a 12 da peça 20). As especialidades
com maior fila de espera, em fevereiro de 2013, eram oftalmologia (demanda reprimida de 5.279
consultas), cardiologia (2.355 consultas), urologia (1.785 consultas) e ortopedia (1.725 consultas). No
total, a demanda reprimida da rede cuiabana atingia 22.206 consultas, das quais 75% oriundas de
Cuiabá e 25% do interior.
45.
As informações prestadas pela Secretaria Estadual de Saúde de Mato Grosso estão
sintetizadas na tabela abaixo:
Especialidade de consulta
Ortopedia - joelho
Cirurgia geral
Ortopedia - ombro
Ortopedia adulto - mão
Otorrinolaringologia
Demanda reprimida até agosto de 2013
772
470
254
137
106
Oferta em agosto de 2013
16
160
24
25
60
46.
As dificuldades detectadas para marcar tempestivamente consultas eletivas decorrem da
carência de estrutura e de especialistas; da deficiência do sistema de regulação da rede de atendimento,
que ocasiona a distribuição ineficiente da demanda, e da deficiência do sistema de atenção básica.
Além de prejudicar a qualidade, tempestividade e eficácia do tratamento, esses problemas contribuem
para a judicialização do atendimento.
II.12. Cirurgias eletivas
47.
Em um dos hospitais visitados, o gestor informou que a unidade não realiza cirurgias
eletivas, mas apenas as emergenciais. Os outros três hospitais realizam essas intervenções, sendo que
as especialidades de cirurgia geral, ortopedia e laqueadura apresentam os maiores tempos de espera:
um mês e meio, 10 a 15 dias e dois meses, respectivamente.
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48.
Em dois hospitais que realizam cirurgias eletivas, essas intervenções são reguladas pela
central do município. Na terceira unidade hospitalar, essas cirurgias são agendadas por meio do
Sistema de Regulação do SUS - Sisreg.
49.
O Defensor Público Estadual que atua na área de saúde afirmou que as maiores demandas
são pelas cirurgias ortopédicas, cardiológicas, neurológicas e oftalmológicas.
50.
Novamente, a Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá - SMS/Cuiabá apresentou um
quadro mais grave que aquele sugerido pelos gestores dos hospitais visitados. Ela informou que, em
fevereiro de 2013, havia uma demanda reprimida de 5.194 cirurgias eletivas, incluindo procedimentos
de média e alta complexidade. Aduziu que o menor tempo de espera era de 297 dias e o maior de 554
dias (p. 7 da peça 20). As maiores filas eram para cirurgias de parede e cavidade abdominal (1.051);
membros inferiores (984); útero e anexos (666); pele, mucosa e tecido subcutâneo (496) e vascular
(442).
51.
A SMS/Cuiabá ressaltou que, em razão da dificuldade de gestão de leitos e de
gerenciamento da fila de espera, bem como da mudança do sistema informatizado utilizado para gerir a
regulação (passará a utilizar o sistema Sisreg), será revista a situação de cada paciente em espera.
52.
As possíveis causas desse problema são a carência de estrutura e de especialistas e a
deficiência do sistema de regulação e organização da rede de atendimento, que ocasiona a distribuição
ineficiente da demanda. Além de prejudicar a qualidade, tempestividade e eficácia do tratamento, esses
problemas contribuem para a judicialização do atendimento.
III - Regulação
53.
Ao apreciar auditoria operacional destinada a avaliar a eficácia e eficiência de complexos
reguladores e centrais de regulação de âmbito municipal e estadual, o Tribunal apontou diversas falhas
no sistema de regulação do SUS no Estado do Mato Grosso e expediu determinações com vistas a
saná-las (Acórdão nº 635/2010 - Plenário).
54.
Em julho de 2013, no âmbito do TC nº 010.822/2010-0, foi realizado o último
monitoramento do referido acórdão. Naquela oportunidade, rememorou-se o histórico da implantação
do complexo regulador do estado de Mato Grosso, caracterizado por avanços pontuais e temporários
seguidos de grandes retrocessos, notadamente em virtude da rotatividade de gestores, da baixa
capacidade de governança e de instabilidades políticas na secretaria de saúde estadual.
55.
De acordo com a unidade técnica, a situação observada em 2013 não diferia
substancialmente da verificada em 2009, que ensejou a prolação do Acórdão nº 635/2010 - Plenário. A
Secex/MT destacou a inadequação do sistema informatizado de regulação da Secretaria Municipal de
Saúde de Cuiabá/MT (sistema Aghos), o qual estava sendo substituído pelo Sistema de Regulação do
SUS - Sisreg. O cronograma de implantação previa sua instalação completa em setembro de 2013.
56.
Na instrução da unidade técnica, foi ressaltado que a estruturação da regulação se dá, em
grande parte, por meio da adequada informatização, que viabiliza o fluxo de informações. Afinal, sem
contar com informação em tempo real sobre a disponibilidade dos serviços e as filas existentes, como
ocorria na época do monitoramento, não há como o complexo regulador cumprir adequadamente o seu
papel.
57.
No dia 17/09/2013, representantes da Secretaria Estadual de Saúde de Mato Grosso e da
Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá participaram de seminário, a convite da Rede de Controle de
Mato Grosso. Nesse evento, foi apresentado o seguinte diagnóstico sobre o sistema de regulação de
serviços de saúde em Cuiabá:
a) Sistema de informação inoperante;
b) Processos internos destruídos;
c) Equipe fragmentada e desmotivada;
d) Rede insuficiente e ineficiente;
e) Perda de governabilidade;
f) Estrutura física deteriorada;
g) Forte influência de políticos;
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h) Ausência de cogestão entre secretarias estadual e municipais;
i) Programação Pactuada Integrada – PPI desatualizada e não utilizada como instrumento
norteador da regulação;
j) Contratação dos prestadores de serviços desatualizada;
k) Falta de informação da capacidade instalada;
l) Necessidade de aperfeiçoar o controle e o monitoramento dos serviços regulados;
m) Ausência de projeto para implantar o complexo regulador, o que viola a Política
Nacional de Regulação do SUS e dificulta o acesso da população aos procedimentos de internação
hospitalar e ambulatorial;
n) Desconhecimento do fluxo de informação do processo de regulação assistencial pelos
usuários e profissionais da rede.
58.
Nesse seminário, a Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá – SMS/Cuiabá apresentou as
seguintes providências que estariam sendo implementadas ou a implementar:
a) Contratação de consultoria para reorganizar os processos de trabalho;
b) Realização de visita técnica para consolidar diagnóstico, de dois seminários e de uma
oficina de trabalho;
c) Elaboração do Plano de Reestruturação do Complexo Regulador;
d) Elaboração do novo conceito de Regulação e ordenamento dos fluxos - implantação de
protocolos;
e) Aprimoramento do conhecimento da demanda e da oferta;
f) Atualização da Programação Pactuada Integrada - PPI e sua utilização como instrumento
gerencial e de informação para a tomada de decisão;
g) Reorganização e integração dos processos entre rede, regulação, controle e avaliação;
h) Melhoria da comunicação interna da SMS/Cuiabá;
i) Implantação do Sistema de Regulação do SUS – SISREG, fornecido pelo Ministério da
Saúde;
j) Elaboração e implantação dos protocolos de regulação que ordenem os fluxos
assistenciais;
k) Utilização da Programação Pactuada Integrada como instrumento de avaliação e
monitoramento;
l) Contratualização dos serviços de saúde;
m) Implantação de política de comunicação e informação da regulação, tendo como
público alvo usuários, movimentos sociais, trabalhadores, Conselho de Secretarias Municipais de
Saúde - COSEMS, Comissão Intergestores Bipartite - CIB, gestores e órgãos de controle externo;
n) Gerenciamento dos processos de judicialização e das ouvidorias do SUS - indicadores
de monitoramento da fila e do acesso;
o) Gestão da Rede de Atenção à Saúde, integrando Cuiabá, Regional da Baixada Cuiabana
e Secretaria Estadual de Saúde/CIB;
p) Implantação das Redes Temáticas: Urgência e Emergência, Rede Cegonha, Psicossocial,
Reabilitação, Condições Crônicas e outras de interesse de Cuiabá;
q) Elaboração e desenvolvimento de plano de trabalho para a gestão compartilhada secretarias estadual e municipal.
59.
Importa ressaltar que tal diagnóstico refere-se à regulação do sistema hospitalar de Cuiabá,
cujas deficiências têm grande impacto na regulação de todo o estado de Mato Grosso, pois compreende
o principal hospital público do estado, para onde flui expressiva parcela da demanda por atendimento
de alta complexidade. A esse quadro, deve-se acrescentar informação prestada pela Secretaria Estadual
de Saúde de Mato Grosso (p. 7 da peça 29), no sentido de que, dos seis hospitais do estado, a secretaria
somente tinha controle via Sisreg de três. Nos demais, esse sistema estava em implantação.
8
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 021.201/2013-7
60.
Por fim, a unidade técnica ressaltou que, na aludida instrução do monitoramento do
Acórdão nº 635/2010 - Plenário, foi proposta a realização do acompanhamento da implantação do
complexo regulador, com duração prevista de dois anos.
61.
As deficiências detectadas no sistema de regulação derivam da ausência de priorização de
esforços para sanear, integrar, estabilizar e aperfeiçoar esse sistema e da alta rotatividade dos
Secretários de Saúde (estadual e do município de Cuiabá) e de gestores desse sistema. Esse problemas
prejudicam a tempestividade, a eficácia e a impessoalidade do atendimento; favorecem a judicialização
da saúde e colaboram para a ineficiência da distribuição da demanda.
IV – Recursos Humanos
62.
Segundo os gestores de três unidades hospitalares visitadas, a quantidade de profissionais
lotados nessas unidades estava um pouco abaixo do que seria necessário. Contudo, os entrevistados
também afirmaram que esses hospitais conseguiam atender a demanda, ainda que com algumas
deficiências. O gestor do quarto hospital, por seu turno, relatou que a quantidade de profissionais
estava adequada, com exceção dos fisioterapeutas, cuja contratação era mais difícil.
63.
Por outro lado, dois secretários de saúde entrevistados apontaram a carência de médicos
especialistas e a alta remuneração exigida por esses profissionais como dois dos principais problemas
da saúde hospitalar (pp. 5 e 9 da peça 23).
64.
Três hospitais visitados dispunham de controle eletrônico para aferir a frequência dos
servidores. No único hospital que utilizava livro de ponto, o sistema digital estava em fase de
implantação (já havia dispositivo de ponto eletrônico instalado).
65.
Em três hospitais visitados, mencionou-se a ocorrência de absenteísmo. Os respectivos
gestores aduziram que muitas ausências são justificadas por atestados. Além disso, é promovido um
remanejamento de servidores de modo a não prejudicar o atendimento. Contudo, os entrevistados no
principal hospital visitado relataram o absenteísmo de médicos e profissionais de enfermagem e
salientaram a ocorrência de graves prejuízos ao atendimento quando a ausência é de plantonistas.
66.
Em dois hospitais, os gestores informaram que a maioria dos médicos e enfermeiros
cumpre a respectiva jornada e acrescentaram que todos os outros profissionais a cumprem. O gestor de
outro hospital mencionou que os médicos plantonistas não cumprem integralmente sua escala.
Entretanto, ele esclareceu que haveria certa flexibilidade devido aos baixos salários ofertados, a qual
não acarretaria prejuízos para o atendimento, pois, uma vez requisitados, eles chegavam ao hospital em
no máximo uma hora.
67.
Dos quatro hospitais visitados, um registrou que não efetuava pagamento de horas extras
aos profissionais de saúde. Em um dos três hospitais que informaram a existência desse pagamento, o
percentual de remuneração por serviço extraordinário atingiu aproximadamente 19% do total da folha
de pagamento. Num segundo hospital, foi identificado um aumento de 82% no valor médio mensal do
pagamento de horas extras em 2013 em relação a 2012. Por fim, o terceiro hospital informou dados
inconsistentes e, até a conclusão deste relatório, não conseguiu afastar essas inconsistências.
68.
Em três hospitais visitados, a escala médica estava acessível ao público. No outro hospital,
o quadro de avisos para exposição dessa escala já havia sido adquirido, mas ainda não estava instalado.
V – Equipamentos, medicamentos e insumos
V.1. Equipamentos
69.
Em todos os hospitais visitados, foi constatada a falta de equipamentos considerados
necessários para o atendimento adequado da demanda. Aduz-se que existem equipamentos antigos e
desatualizados que precisam ser substituídos. Os gestores dos hospitais citaram a necessidade de
adquirir os seguintes bens: respiradores, monitores, autoclaves, capnógrafos (medidores de CO2), Raio
X, cardiotoco (monitor da frequência cardíaca do feto), ultrassom, bomba de infusão, aspirador,
encefalograma, intensificador de imagem RX, endoscópio e aparelho de colonoscopia.
70.
A carência de tais equipamentos, bem como o consequente prejuízo ao atendimento, foi
um dos principais problemas ressaltados pelos entrevistados.
9
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 021.201/2013-7
71.
A dificuldade para repor equipamentos inservíveis foi relatada em todos os hospitais, bem
como os transtornos no atendimento que essa circunstância ocasiona. Em dois hospitais, peças desses
equipamentos são extraídas para serem utilizadas em outras máquinas, num processo denominado
“canibalização”. Nos outros dois hospitais, os equipamentos quebrados são enviados para o
almoxarifado da prefeitura para que lhes sejam dada destinação.
72.
Em dois dos hospitais visitados, foi mencionada a existência de equipamentos de alto custo
ociosos. Em um deles, uma autoclave ainda não havia sido instalada porque a rede de energia existente
não suportaria essa ligação. Visando resolver esse problema, foi requisitada a compra de mais um
gerador. No outro hospital, havia um aparelho para cirurgias oftalmológicas que estava ocioso, devido
à ausência de pessoal qualificado para operá-lo. Segundo o entrevistado, esse aparelho é utilizado
esporadicamente, quando da realização de campanhas para ofertas de cirurgias, nessas ocasiões sua
operação é terceirizada.
73.
Nenhum gestor dos hospitais visitados registrou a existência de equipamentos de alto custo
que não estavam sendo utilizados por falta de insumos.
74.
As possíveis causas desses problemas são a insuficiência de recursos para adquirir e
manter equipamentos, principalmente os de alto custo; a gestão deficiente dessas aquisições e o uso
inadequado desses bens, que reduz as respectivas vidas úteis.
75.
Os gestores de todos os hospitais visitados apontaram a dificuldade de manutenção dos
equipamentos de alto custo como outro problema muito sério. Nenhum desses hospitais tem contrato
de manutenção continuada. Assim sendo, a manutenção é sempre corretiva, nunca preventiva, as
contratações são realizadas a cada necessidade de intervenção e pequenos serviços são realizados pelo
pessoal dos próprios hospitais.
76.
Foram relatados graves problemas de manutenção, que causaram substanciais transtornos e
prejuízos ao atendimento, quais sejam: reduzida oferta de serviços de manutenção, morosidade nas
contratações, altos preços cobrados, demora no atendimento e insuficiência de recursos para custear a
manutenção. Em um dos hospitais, por exemplo, a única autoclave estava indisponível há mais de uma
semana na ocasião da visita, pois uma peça havia sido enviada à Goiânia para reparo. Essa
circunstância trazia sérios transtornos, pois era preciso enviar os materiais para serem esterilizados em
hospitais de municípios vizinhos.
V.2. Medicamentos e insumos
77.
Apenas no maior hospital público do estado, a falta de medicamentos foi apontada como
um problema grave. Na verdade, essa falta foi considerada o principal problema desse hospital, tendo
em vista o grave prejuízo causado ao atendimento. O gestor dessa entidade afirmou que, com certa
frequência, é necessário adquirir medicamentos e insumos com seus próprios recursos, a fim de evitar
óbitos de pacientes. Em sua opinião, a causa do problema é a burocracia envolvida nas aquisições dos
fármacos aliada à dinâmica peculiar dos hospitais. Nesse contexto, por maior que seja o esforço de
planejamento das aquisições, é imprescindível criar mecanismos que possibilitem realizar essas
compras com a agilidade demandada pelos casos urgentes. Mesmo a contratação emergencial por
dispensa de licitação não é adequada à dinâmica de hospitais, pois demanda tempo para realizar as
formalidades, o que pode ocasionar o óbito de pacientes.
78.
Nos outros três hospitais visitados, os gestores não consideraram a falta de medicamentos
como um dos problemas mais graves. Algumas explicações para esses entendimentos divergentes são
o menor fluxo de pacientes nesses hospitais, o que facilita o planejamento das compras; a fixação de
preços de referência mais altos, o que desperta maior interesse dos fornecedores; o descumprimento de
formalidades legais nesses três hospitais, o que torna o procedimento de aquisição mais ágil, e
planejamento mais adequado das aquisições.
79.
As possíveis causas da falta de medicamentos no maior hospital público do estado são:
ineficiência do setor de compras, que não domina os mecanismos legais que possibilitam aquisições
mais céleres; a existência de formalidades legais para a aquisição de medicamentos que são
incompatíveis com a necessidade específica dos hospitais; o planejamento de compras deficiente; o
10
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 021.201/2013-7
eventual desinteresse dos fornecedores tendo em vista os preços de referência fixados para aquisição
de fármacos para esse hospital em especial. Essa falta de medicamentos prejudica a qualidade e a
eficácia do atendimento e provoca o aumento da mortalidade, além de gerar tensão e frustração na
equipe assistencial.
80.
Os gestores de todos os hospitais visitados também informaram que o controle de estoque e
da distribuição de medicamentos e insumos é manual e pouco confiável. Esse problema, que decorre
da carência de recursos de informática e de deficiências na gestão do hospital, pode causar descontrole
do estoque, prejudicar o planejamento das aquisições e facilitar o desperdício de medicamentos e a
distribuição ineficiente dos mesmos.
V.3. Observações adicionais
81.
Em três dos quatro hospitais visitados, foi registrada a falta de instrumentos e mobiliário
básicos para a prestação dos serviços, tais como, banco giratório, foco, máscara laríngea, máscara de
Venturi, laringoscópio, suporte de soro, esfigmomanômetros, camas e material de sutura. Essa falta,
que pode derivar da insuficiência de recursos, da gestão deficiente das aquisições ou do uso
inadequado que reduz a vida útil, reduz a tempestividade e qualidade do atendimento.
82.
Em apenas um dos hospitais inspecionados, verificou-se que a sistemática de estocagem de
insumos e medicamentos dificulta o seu compartilhamento. Assim mesmo, os problemas relatados são
eventuais e não chegam a causar grandes transtornos.
83.
Em três dos hospitais, os entrevistados afirmaram que chegam a utilizar medicamentos de
alto custo por falta dos fármacos de menor custo. Em dois deles, foi registrado que essa prática
indesejada ocorre muitas vezes. Essa situação, que ocasiona o desperdício de recursos, ocorre devido à
falta de conscientização dos profissionais quanto ao uso adequado dos remédios e à gestão deficiente
de medicamentos e insumos.
84.
Por outro lado, somente em um hospital, foi registrada a utilização pouco frequente de
medicamentos ou insumos de menor custo devido à falta do fármaco que seria adequado. Essa
situação, que prejudica a qualidade e a eficiência do atendimento, também ocorre devido à falta de
conscientização dos profissionais quanto ao uso adequado dos remédios e à gestão deficiente de
medicamentos e insumos.
85.
Em dois dos hospitais visitados, os entrevistados relataram desperdício de medicamentos.
Em um deles, mencionou-se, a título de exemplo, a utilização errônea do catéter intravenoso, que
ocasionou a perda do material. No outro, registrou-se que o desperdício foi mais frequente no passado,
mas que hoje a apuração e a responsabilização inibem essas ocorrências. De todo modo, foi citado
como exemplo que já foi encontrada no lixo nutrição enteral que deveria ter sido dada ao paciente.
Essas falhas decorrem da falta de conscientização dos profissionais quanto ao uso adequado de
medicamentos ou insumos.
VI – Sistemas Informatizados
86.
Ficou patente a falta de informatização dos hospitais, o que dificultou a obtenção de dados
sobre desempenho e qualidade do atendimento. Dois hospitais visitados declararam não possuir
sistemas informatizados próprios, apenas aqueles disponibilizados pelo Ministério da Saúde, tais como
DATASUS, SIA, AIH, internação, óbito, sendo que o SISREG (sistema de regulação) estava em fase
de implantação. Os outros dois hospitais registraram que alguns setores (recepção, laboratório,
faturamento, sistema de classificação de risco e farmácia) apresentavam um certo grau de
informatização. Porém, os sistemas existentes não eram capazes de gerar dados que pudessem orientar
a administração no processo decisório.
87.
Problemas com a utilização de recursos de tecnologia da informação foram relatados pelos
hospitais: inadequação do sistema, baixa velocidade de processamento, instabilidade do sistema e da
rede, falta de adequado suporte técnico e de treinamento da equipe e inserção inadequada de
informações no sistema. Tais problemas, que decorrem da insuficiência de recursos e da gestão
deficiente da tecnologia da informação, prejudicam a qualidade, eficiência e eficácia do atendimento,
11
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 021.201/2013-7
além de ensejar o desperdício de recursos e a fragilidade de controles e dificultar o gerenciamento, a
fixação e a avaliação de metas.
VII – Estrutura Física
88.
Em apenas um dos hospitais visitados, os entrevistados afirmaram que a estrutura física
estava adequada à demanda, sendo necessário realizar somente algumas pequenas reformas, sem
comprometer o atendimento.
89.
Por outro lado, nos outros três hospitais, foi registrado que existiam diversos problemas
relacionados à estrutura física, tais como projetos de arquitetura inadequados (em especial em relação
à cozinha e à lavanderia), ausência de salas de higienização (para aplicação de medicamentos e
curativos), inadequação da cozinha e lavanderia, problemas de impermeabilização, pinturas velhas,
portas estragadas e falta de rede de esgoto sanitário. Em um dos hospitais com problemas, por
exemplo, foi necessário deslocar pacientes para os corredores devido a um alagamento ocorrido há
pouco tempo. Nesses hospitais, há prejuízos evidentes para o atendimento, além de maiores riscos de
infecção e incremento do tempo de espera.
90.
Nenhum hospital visitado contava com contratos de manutenção predial, a qual era
realizada por equipe própria e limitava-se a pequenos serviços. Para intervenções mais complexas,
eram efetuadas contratações específicas.
91.
Todos os hospitais inspecionados contavam com gerador. Mas, em um deles, o
equipamento não estava adequado à manutenção dos serviços essenciais. Nesse caso, a despeito de o
gerador atender a somente cerca de 40% do imóvel, não foram registrados problemas graves devido à
interrupção do fornecimento de energia.
92.
Em todos os hospitais, havia local para a guarda de cadáveres, porém, em nenhum deles o
ambiente era refrigerado, o que dificulta a conservação do corpo por um tempo maior que o usual.
93.
Os serviços da lavanderia foram considerados adequados em três hospitais. No quarto,
foram relatados problemas no fornecimento de roupas e toalhas. Em uma das unidades visitadas, foi
informado que os pacientes têm o hábito de levar o vestuário hospitalar para casa.
94.
Tais problemas, que decorrem da insuficiência de recursos e da gestão deficiente da
estrutura física dos hospitais, prejudicam o atendimento.
VIII – Obras paralisadas
95.
Há duas obras públicas paralisadas que são consideradas de grande relevância para a
assistência hospitalar no estado do Mato Grosso. A primeira é a do Centro de Nefrologia do Hospital
Universitário Júlio Müller (hospital federal), que deveria ser referência na especialidade, mas não está
em funcionamento. Essa obra, que está paralisada desde 2010, foi objeto de representação versando
sobre supostas irregularidades na sua execução (TC nº 010.523/2013-8). O referido processo está na
fase de diligências.
96.
A segunda obra é a construção do Hospital Central de Cuiabá (hospital estadual), que está
paralisada desde meados da década de 90. Foi instaurada tomada de contas especial a respeito de
irregularidades nos pagamentos referentes à citada obra, a qual foi apreciada por meio do Acórdão nº
457/2002 - Plenário, alterado parcialmente pelo Acórdão nº 780/2004 - Plenário (TC nº 425.022/19960). Notícias recentemente veiculadas nos meios de comunicação do estado informam que ainda se
cogita a retomada da obra, sobretudo em razão das manifestações ocorridas em meados deste ano.
Além disso, o Ministério Público Federal tem instado o Governo estadual a concluir o
empreendimento, com base em decisão proferida em ação civil pública.
IX – Inexistência de Comissão de Controle de Infecção Hospitalar
97.
Em dois hospitais, não havia Comissão de Controle de Infecção Hospitalar - CCIH. Em um
deles, faltavam profissionais para compor essa comissão. No outro, o processo de constituição da
CCIH estava em andamento. Nos hospitais em que a CCIH estava instalada, ela estava ativa, no
entanto, verificou-se que era necessário um trabalho maior de sensibilização dos profissionais de saúde
12
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 021.201/2013-7
para a importância do controle das infecções, pois os cuidados necessários ainda não eram plenamente
adotados.
X - Gestão de hospitais públicos por organizações sociais
98.
A partir de 2011, a gestão dos principais hospitais públicos da rede estadual foi transferida
para organizações sociais, mediante a celebração de contratos de gestão, o que tem gerado críticas e
questionamentos por alguns setores da sociedade.
99.
No TCU, tramita o TC nº 032.493/2011-8, ainda não julgado, que trata de auditoria
realizada em um desses contratos de gestão, com vistas a verificar sua conformidade com as normas e
os princípios gerais de contratação da administração pública. A Auditoria-Geral do Estado também
tem realizado fiscalizações com o objetivo de avaliar a consecução das metas dos hospitais geridos por
organizações sociais (peça 19).
XI – Conclusão e proposta de encaminhamento
100.
Em vista do exposto, a Secex/MT concluiu que os principais problemas da assistência
hospitalar no estado de Mato Grosso são os seguintes:
a) Superlotação dos setores de urgência, emergência e internação;
b) Insuficiência de leitos;
c) Alta demanda reprimida e elevado tempo de espera para a realização de exames,
consultas e cirurgias;
d) Sistema de regulação deficiente;
e) Insuficiência e dificuldades de manutenção de equipamentos de alto custo;
f) Falta de medicamentos;
g) Deficiência de sistemas e da infraestrutura de informática;
h) Inadequação e dificuldades de manutenção da estrutura física.
101.
O titular da Secex/MT ressaltou que:
a) foi realizada fiscalização, em 2012, em hospitais públicos estaduais do Mato Grosso
geridos por organizações sociais de saúde, a qual se encontra no Gabinete do Relator (TC nº
032.493/2011-8);
b) no que concerne às questões relativas a medicamentos, foi autuado processo de
acompanhamento por 2 anos das licitações a serem realizadas pela SES/MT (TC nº 028.227/2013-1).
Ademais, no TC nº 016.547/2013-6 examinam-se ocorrências de perda de prazo de validade de
medicações, tendo sido adotada medida cautelar;
c) no TC nº 010.822/2010-0, foi determinado o acompanhamento por 2 anos das atividades
desenvolvidas pelas centrais de regulação estadual e da capital, Cuiabá.
102.
Em seguida, a unidade técnica propôs apensar o presente processo ao TC nº 026.797/20135 e encaminhar cópia deste relatório à Secretaria Estadual de Saúde de Mato Grosso e às Secretarias
Municipais de Saúde de Cuiabá, Várzea Grande, Barra do Garças e Barra do Bugres.
É o Relatório.
VOTO
I - Introdução
Versa o presente processo sobre relatório de levantamento realizado com vistas à produção
de diagnóstico sobre a assistência hospitalar no Sistema Único de Saúde (SUS) no Estado do Mato
Grosso. O referido diagnóstico subsidiará a elaboração, pela Secex Saúde, de um Relatório Sistêmico
da área da Saúde.
2.
Este trabalho originou-se de determinação da Presidência desta Corte de Contas no sentido
de que, durante o exercício de 2013, fossem elaborados relatórios sistêmicos sobre funções de governo
específicas, inclusive aquele relativo à área da Saúde.
13
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 021.201/2013-7
3.
O referido relatório deverá contemplar informações sobre a assistência hospitalar no
âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Visando obter subsídios para a elaboração desse
documento, está sendo realizado um levantamento, de abrangência nacional, coordenado pela
Secretaria de Controle Externo da Saúde (Secex Saúde), a quem cabe orientar os trabalhos e consolidar
as informações coletadas pelas unidades estaduais.
4.
A realização do presente levantamento foi determinada por mim, por meio de despacho
exarado, no dia 12/07/2013, no âmbito do TC nº 019.167/2013-0.
5.
Em conformidade com uma das diretrizes básicas fixadas para a execução deste
levantamento, deveriam ser visitadas em cada estado pelo menos quatro unidades hospitalares, com
capacidade mínima individual de cinquenta leitos.
6.
No caso vertente, foi analisada a assistência hospitalar no estado do Mato Grosso.
Observou-se no critério de seleção da amostra a relevância do hospital para a rede daquela unidade da
Federação, com vistas a alcançar um diagnóstico abrangente e identificar os principais problemas da
assistência hospitalar.
7.
Visando coletar informações, a equipe de auditoria participou de reuniões com a Secretaria
Estadual de Saúde de Mato Grosso, a Auditoria Geral do Estado, o Ministério Público Estadual de
Mato Grosso, o Conselho Regional de Medicina de Mato Grosso, a Defensoria Pública Estadual de
Mato Grosso e as Secretarias Municipais de Saúde de Cuiabá, Várzea Grande, Barra do Garças e Barra
do Bugres. Também foram considerados dados constantes de relatórios de fiscalizações realizados pelo
Conselho Regional de Medicina e pela Auditoria Geral do Estado
8.
Considerando a limitação do tempo para a realização do presente trabalho, a unidade
técnica optou por visitar quatro hospitais. Com fulcro em orientação exarada pela Secex Saúde, não
foram selecionados entes privados, filantrópicos ou administrados por organizações sociais ou pela
Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares. Foram visitados os seguintes hospitais:
a) Hospital e Pronto Socorro Municipal de Cuiabá;
b) Hospital Municipal de Barra do Bugres;
c) Hospital e Pronto Socorro Municipal de Várzea Grande;
d) Hospital e Pronto Socorro Municipal Milton Pessoa Morbeck, em Barra do Garças.
9.
Com fulcro nos dados coligidos por meio desse levantamento, a Secex/CE ressaltou que,
em 2012, foram transferidos para o Mato Grosso recursos federais no montante de R$ 502,7 milhões,
com o fito de custear atendimentos de média e alta complexidade. Neste ano, até o mês de julho, o
Governo Federal havia transferido R$ 273,5 milhões com essa mesma finalidade. Desse montante, R$
211,2 milhões foram aplicados nos municípios visitados pela equipe de auditoria.
II – Serviços Hospitalares
10.
A seguir, são apresentados os principais problemas constatados pela equipe de auditoria:
II.1 – Superlotação
11.
Dos quatro hospitais visitados, em dois foram observados pacientes internados nos
corredores ou acomodados precariamente em macas, cadeiras e mesas, o que é uma evidência nítida de
superlotação. Os gestores desses hospitais admitiram que a taxa de ocupação dos leitos de emergência
ou urgência sempre ultrapassa 100%. Os gestores de outro hospital afirmaram que, com muita
frequência, essa taxa fica acima de 100%, embora, no dia da visita, essa situação não tenha sido
observada. Por fim, os gestores do quarto hospital informaram que poucas vezes ocorre a superlotação.
12.
No principal hospital visitado, o gestor informou que na sala reservada para atendimentos
de emergência havia trinta leitos ocupados, embora ela tenha capacidade para somente cinco leitos.
Essa sala deveria servir apenas para a estabilização de casos urgentes, uma vez que os pacientes cuja
condição estivesse estável deveriam ser encaminhados para a enfermaria ou a UTI. Contudo, a
ausência de vagas nesses dois últimos setores acaba por represar pacientes na mencionada sala.
13.
Os dois principais hospitais visitados também foram inspecionados pelo Conselho
Regional de Medicina do Mato Grosso – CRM/MT, em novembro de 2012, que identificou “evidente
14
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 021.201/2013-7
superlotação” no setor de internação e casos de pacientes internados há um ano aguardando vagas em
UTI ou transferência. Além disso, verificou a falta de medicamentos, monitores para pacientes em
estado grave e ventiladores mecânicos (na ocasião da visita, havia um paciente sob ventilação manual
há quase quatro horas). Também foi apontada a ausência de isolamento de pacientes portadores de
moléstias contagiosas, a carência de médicos visitadores e a falta de exames com imagens.
14.
Segundo a Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá, 85% das internações reguladas entre
janeiro a julho de 2013 foram para casos supostamente de urgência ou emergência, o que caracteriza o
fenômeno denominado “urgencialização”. A referida Secretaria informou ainda que, enquanto alguns
hospitais extrapolam o teto de internações autorizado pela Central de Regulação, outros não o atingem,
o que aponta para a necessidade de reavaliar o encaminhamento dos casos de urgência e emergência e
a real capacidade para realizar cirurgias eletivas.
II.2. Insuficiência de leitos
15.
Os gestores das secretarias estadual e municipais de saúde e o Defensor Público Estadual
responsável pelas demandas nessa área destacaram a quantidade insuficiente de leitos de UTI como um
dos maiores problemas da assistência hospitalar no estado. O Defensor mencionou que nem sempre a
obtenção de uma liminar garante o acesso a leitos, devido à falta de vagas. Em alguns casos, a
condição do paciente evolui para o óbito.
16.
A Portaria GM-MS nº 1.101/2002 estima, de modo geral, a necessidade de 2,5 a 3 leitos
hospitalares por mil habitantes, dos quais 4 a 10% devem ser direcionados para as UTI. No Mato
Grosso, há 2,22 leitos por mil habitantes, parâmetro que cai para 1,87 quando comparada a quantidade
de leitos disponíveis para o SUS com a parcela da população sem plano de saúde. Portanto, a
disponibilidade de leitos públicos para a população que efetivamente necessita da cobertura do SUS é
25% inferior ao parâmetro geral, como se observa na tabela abaixo:
Quantidade de leitos para
internação (Cadastro Nacional
de Entidades de Saúde - CNES)
Leitos
Leitos
Leitos
existente
SUS
não SUS
s
6.927
4.906
1.976
Dados da população (IBGE e ANS)
Populaçã
o total
3.115.33
6
População
com plano
de saúde
441.660
População
sem plano
de saúde
2.673.676
Leito por
mil
habitante
s
Leitos SUS
por mil
habitantes
sem planos
de saúde
2,22
1,87
17.
Segundo dados do IBGE, a quantidade de leitos por habitante no Brasil e no Mato Grosso
vem sendo reduzida ao longo dos anos, como se observa na tabela a seguir:
Mato
Grosso
Brasil
1990
3,40
Quantidade de leitos por habitante
1992
1999
2002
3,65
3,35
2,99
2005
2,39
2009
2,00
3,71
3,66
2,41
2,26
2,96
2,70
18.
A redução da quantidade de leitos por habitante não indica necessariamente deficiência ou
carência da rede hospitalar. Um eventual declínio desse indicador pode ser justificado, por exemplo,
pela melhoria e ampliação da assistência básica, que acarreta a diminuição da demanda por leitos
hospitalares. Contudo, no caso específico de Mato Grosso, restou nítida a carência de leitos nos dois
maiores hospitais públicos do estado.
19.
Por outro lado, os gestores dos hospitais visitados afirmaram que a maioria dos
atendimentos realizados nessas instituições poderia ter sido efetuada nas unidades básicas de saúde.
Logo, o quadro atual de déficit de leitos hospitalares e de superlotação é agravado pela deficiência da
atenção básica e por uma cultura hospitalocêntrica arraigada na população.
15
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 021.201/2013-7
II.3. Discrepância entre a quantidade de leitos existente e a constante do Cadastro
Nacional de Entidades de Saúde - CNES
21.
Três dos quatro hospitais diligenciados informaram quantidades de leitos discrepantes dos
quantitativos cadastrados no CNES. Por exemplo, o maior hospital do estado noticiou a existência, em
agosto de 2013, de 235 leitos, já no CNES constava que naquele mês essa unidade hospitalar possuiria
395 leitos, o que caracteriza uma divergência de 40%. Ainda em relação a essa unidade, a quantidade
de leitos de UTI Adulto à disposição do SUS registrada no CNES é o dobro da efetivamente existente.
Questionado sobre a razão dessas discrepâncias, o hospital ratificou suas informações, afirmou que os
dados do CNES estão equivocados e informou que o referido cadastro não é alimentado pelo hospital,
mas pela central de regulação do estado.
22.
Considerando que o CNES auxilia gestores da saúde de diversas esferas de governo no
gerenciamento e na formulação de políticas públicas, além da regulação, é necessário revisar as
informações nele contidas e detectar as causas dessas inconsistências, a fim de tornar fidedigno o
referido banco de dados.
II.4. Bloqueio de leitos
23.
Os gestores de dois hospitais informaram que sempre há leitos bloqueados ou indisponíveis
para uso. Num terceiro hospital, essa circunstância ocorre muitas vezes. Apenas em uma unidade
hospitalar foi informado que nunca ocorreu o bloqueio de leitos. Entre as causas desse bloqueio foram
citados problemas de manutenção ou estrutura predial e a falta dos equipamentos mínimos necessários.
24.
Leitos de UTI, da enfermaria e de observação foram os mais afetados pelo bloqueio. Em
um dos hospitais, o setor de pediatria está interditado desde 2011 devido a problemas sanitários que
resultaram no bloqueio de 15 leitos. Em outro hospital, quatro dos dez leitos de UTI estavam
indisponíveis, aguardando há mais de três anos a reforma da sala.
II.5. Subutilização de leitos hospitalares
25.
Considera-se subutilização de leitos hospitalares a utilização de leito de maior
complexidade para prestar atendimentos abaixo da respectiva complexidade projetada. Verificou-se
que em um dos hospitais visitados isso nunca ocorreu, em dois outros essa é uma situação pouco
frequente e no último ela é muito frequente. A subutilização ocorre porque os leitos de enfermaria
estão todos ocupados e ainda há demanda por esses leitos ou porque o hospital precisa acomodar
pacientes antes de encaminhá-los para as policlínicas, que não funcionam durante as 24 horas do dia.
II.6. Sobreutilização de leitos hospitalares
26.
Em todos os hospitais visitados, é muito frequente a sobreutilização de leitos, ou seja, o
uso de leitos de menor complexidade para prestar atendimentos de maior complexidade. Em um dos
hospitais, essa situação é permanente, uma vez que é sempre necessário improvisar leitos de UTI. Em
outro, costuma haver cerca de 10 pacientes na fila de espera por vaga em UTI em decorrência de
decisões judiciais liminares. O terceiro hospital, que é referência em média e baixa complexidade,
recebe pacientes que necessitam de atendimento de alta complexidade. Finalmente, o quarto hospital
está operando com apenas seis leitos de UTI, dos 10 existentes, pois os demais foram desativados para
a reforma da sala da Unidade de Tratamento Intensivo. Como a reforma prevista não ocorreu, há uma
fila de espera e os pacientes aguardam em leitos de menor complexidade.
II.7. Acomodação inadequada de pacientes
27.
A utilização de corredores para acomodar pacientes foi mencionada como uma situação
frequente em dois dos hospitais visitados, sendo que há profissionais escalados para prestarem o
atendimento nesses locais. Em um deles, chegou a haver 114 pacientes nos corredores. Esses dois
hospitais costumam acomodar nos quartos uma quantidade de pacientes superior à capacidade máxima
desses cômodos. Em outro hospital, no qual o excesso de pacientes não é tão frequente, quando o
número de pacientes supera a capacidade instalada, eles ficam na sala de soroterapia em poltronas
reclináveis.
16
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 021.201/2013-7
II.8. Pacientes com alta médica que permanecem internados
28.
Em três dos hospitais visitados, verificou-se essa ocorrência, sobretudo por motivos
sociais. Em geral, esses pacientes não possuem moradia e suas famílias não têm interesse em cuidar
deles ou não possuem as condições necessárias para prestar no ambiente doméstico os cuidados
demandados por eles.
II.9. Dificuldade para referenciar pacientes
29.
Em todos os hospitais visitados, foi constatada grande dificuldade para referenciar
pacientes, sobretudo em algumas especialidades. O tempo de espera pode alcançar 8 meses. Em um
dos hospitais, foi citada a dificuldade para contrarreferenciar pacientes. Em outro hospital, que não
possui unidade de tratamento intensivo, apenas sala de estabilização, há grande dificuldade para
encaminhar pacientes para UTI, o que deveria ocorrer logo após a respectiva estabilização. Note-se
que o referenciamento intempestivo aumenta o risco de agravamento do quadro do paciente.
II.10. Exames
30.
Segundo os gestores dos hospitais visitados, o tempo de espera pela realização de exames
varia, de acordo com o hospital e o tipo de exame, entre 24 horas e 90 dias. Em geral, os exames de
alta complexidade que são realizados fora da unidade demandam um período de tempo maior,
31.
A Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá apresentou um retrato mais problemático da
situação. Ela informou que a maior demanda na central de regulação é por exames mais sofisticados e
que o tempo de espera e a demanda reprimida têm gerado grande número de processos judiciais.
32.
A Secretaria Estadual de Saúde de Mato Grosso – SES/MT informou a oferta e a demanda
reprimida para os principais exames na rede estadual, conforme estabelecido na tabela abaixo:
Exame
Demanda reprimida até agosto de
2013
2.553
1.177
Oferta em agosto de 2013
Endoscopia digestiva alta
276
Diagnóstico por
290
ultrassonografia
Colonoscopia
435
101
Biópsia de tireoide
286
0
Tomografia computadorizada
745
500
33.
A SES/MT também relacionou exames para os quais a oferta é substancialmente superior à
demanda reprimida, a saber:
Exame
Radiodiagnóstico
Eletrocardiograma
Mamografia bilateral
Eletroencefalograma
Ecocardiograma com fluxo e
cores
Demanda reprimida até agosto de
2013
2.553
1.177
435
286
745
Oferta em agosto de
2013
276
290
101
0
500
II.11. Consultas eletivas
34.
Em dois hospitais visitados, os gestores informaram que as respectivas unidades não
realizam consultas eletivas. Em um terceiro, essas consultas são realizadas apenas em setores
específicos como atendimento a queimados e ortopedia. As referidas consultas são realizadas nas
policlínicas, nos centros de especialidades e nas unidades básicas do Programa Saúde da Família.
35.
No único hospital que realiza consultas eletivas, a clínica médica exige o maior tempo de
espera, cerca de 3 horas. O procedimento não é regulado, de modo que o atendimento é realizado por
ordem de chegada.
17
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 021.201/2013-7
36.
A Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá informou que para várias especialidades
médicas a oferta de consultas é insuficiente ou inexistente. As especialidades com maior fila de espera,
em fevereiro de 2013, eram oftalmologia (demanda reprimida de 5.279 consultas), cardiologia (2.355
consultas), urologia (1.785 consultas) e ortopedia (1.725 consultas). No total, a demanda reprimida da
rede cuiabana atingia 22.206 consultas, das quais 75% oriundas de Cuiabá e 25% do interior.
37.
As informações prestadas pela Secretaria Estadual de Saúde de Mato Grosso estão
sintetizadas na tabela abaixo:
Especialidade de consulta
Ortopedia - joelho
Cirurgia geral
Ortopedia - ombro
Ortopedia adulto - mão
Otorrinolaringologia
Demanda reprimida até agosto de
2013
772
470
254
137
106
Oferta em agosto de
2013
16
160
24
25
60
38.
As dificuldades detectadas para marcar tempestivamente consultas eletivas decorrem da
carência de estrutura e de especialistas e das deficiências dos sistemas de regulação da rede de
atendimento e de atenção básica. Além de prejudicar a qualidade, tempestividade e eficácia do
tratamento, esses problemas contribuem para a judicialização do atendimento.
II.12. Cirurgias eletivas
39.
Apenas um dos hospitais visitados não realiza cirurgias eletivas, apenas emergenciais. Os
outros três hospitais realizam essas intervenções, sendo que as especialidades de cirurgia geral,
ortopedia e laqueadura apresentam os maiores tempos de espera: um mês e meio, 10 a 15 dias e dois
meses, respectivamente. O Defensor Público Estadual que atua na área de saúde afirmou que as
maiores demandas são pelas cirurgias ortopédicas, cardiológicas, neurológicas e oftalmológicas.
40.
Em dois hospitais que realizam cirurgias eletivas, essas intervenções são reguladas pela
central do município. Na terceira unidade hospitalar, essas cirurgias são agendadas por meio do
Sistema de Regulação do SUS - Sisreg.
41.
A Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá - SMS/Cuiabá apresentou um quadro mais
grave que aquele sugerido pelos gestores dos hospitais visitados. Ela informou que, em fevereiro de
2013, havia uma demanda reprimida de 5.194 cirurgias eletivas, incluindo procedimentos de média e
alta complexidade. Aduziu que o menor tempo de espera era de 297 dias e o maior de 554 dias.
42.
A SMS/Cuiabá ressaltou que, em razão da dificuldade de gestão de leitos e de
gerenciamento da fila de espera, bem como da mudança do sistema informatizado utilizado para gerir a
regulação (passará a utilizar o sistema Sisreg), será revista a situação de cada paciente em espera.
43.
As possíveis causas desse problema são a carência de estrutura e de especialistas e a
deficiência do sistema de regulação e organização da rede de atendimento, que ocasiona a distribuição
ineficiente da demanda. Além de prejudicar a qualidade, tempestividade e eficácia do tratamento, esses
problemas contribuem para a judicialização do atendimento.
III - Regulação
44.
Ao apreciar auditoria operacional destinada a avaliar a eficácia e eficiência de complexos
reguladores e centrais de regulação de âmbito municipal e estadual, o Tribunal apontou diversas falhas
no sistema de regulação do SUS no Estado do Mato Grosso e expediu determinações com vistas a
saná-las por meio do Acórdão nº 635/2010 - Plenário.
45.
Em julho de 2013, no âmbito do TC nº 010.822/2010-0, foi realizado o último
monitoramento do referido acórdão. Naquela oportunidade, rememorou-se o histórico da implantação
do complexo regulador do estado de Mato Grosso, caracterizado por avanços pontuais e temporários
seguidos de grandes retrocessos, notadamente em virtude da rotatividade de gestores, da baixa
capacidade de governança e de instabilidades políticas na secretaria de saúde estadual.
18
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 021.201/2013-7
46.
De acordo com a unidade técnica, a situação observada em 2013 não diferia
substancialmente da verificada em 2009, que ensejou a prolação do Acórdão nº 635/2010 - Plenário. A
Secex/MT destacou a inadequação do sistema informatizado de regulação então utilizado pela
Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá/MT (sistema Aghos), o qual estava sendo substituído pelo
Sistema de Regulação do SUS - Sisreg. O cronograma de implantação previa a instalação completa do
novo sistema em setembro de 2013.
47.
Na instrução da unidade técnica, foi ressaltado que a boa regulação se dá, em grande parte,
por meio da adequada informatização, que viabiliza o fluxo de informações. Afinal, sem contar com
informação em tempo real sobre a disponibilidade dos serviços e as filas existentes, como ocorria na
época do monitoramento, não há como o complexo regulador cumprir adequadamente o seu papel.
48.
Por meio do Acórdão nº 2.686/2013 – Plenário, o Tribunal considerou que não foram não
cumpridas as determinações e recomendações constantes do Acórdão nº 635/2010 – Plenário. Por via
de consequência, autorizou o acompanhamento, por 2 anos, da implantação do complexo regulador, da
central de regulação em regime de cogestão pela SES/MT e SMS/Cuiabá e do SISREG. Por fim,
deferiu o pedido de prorrogação de prazo formulado pela Prefeitura de Cuiabá para a entrega do plano
de ação que deverá ser apreciado no processo de acompanhamento a ser constituído.
49.
No dia 17/09/2013, representantes da Secretaria Estadual de Saúde de Mato Grosso e da
Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá participaram de seminário, no âmbito do qual foram
apontados os principais problemas enfrentados pela regulação do sistema hospitalar de Cuiabá. Notese que as deficiências verificadas na capital produzem grande impacto na regulação de todo o estado
de Mato Grosso. Os referidos problemas são os seguintes: sistema de informação inoperante; equipe
fragmentada e desmotivada; perda de governabilidade; estrutura física deteriorada; ausência de
cogestão entre secretarias estadual e municipais; contratação ineficaz dos prestadores de serviços;
necessidade de aperfeiçoar o monitoramento dos serviços regulados e desconhecimento pelos usuários
e profissionais do processo de regulação.
50.
As deficiências detectadas no sistema de regulação prejudicam a tempestividade, eficácia e
impessoalidade do atendimento; favorecem a judicialização da saúde e colaboram para a ineficiência
da distribuição da demanda.
IV – Recursos Humanos
51.
Segundo os gestores de três unidades hospitalares visitadas, a quantidade de profissionais
lotados nessas unidades estava um pouco abaixo do que seria necessário. Contudo, os entrevistados
também afirmaram que esses hospitais conseguiam atender a demanda, ainda que com algumas
deficiências. O gestor do quarto hospital, por seu turno, relatou que a quantidade de profissionais
estava adequada, com exceção dos fisioterapeutas, cuja contratação era mais difícil.
52.
Contudo, dois secretários de saúde apontaram a carência de médicos especialistas e a alta
remuneração exigida por esses profissionais como dois dos principais problemas da saúde hospitalar.
53.
Em três hospitais visitados, foi mencionada a ocorrência de absenteísmo. Os respectivos
gestores aduziram que muitas ausências são justificadas por atestados. Além disso, é promovido um
remanejamento de servidores de modo a não prejudicar o atendimento. Por outro lado, os entrevistados
no principal hospital visitado relataram o absenteísmo de médicos e profissionais de enfermagem e
salientaram a ocorrência de graves prejuízos ao atendimento quando a ausência é de plantonistas.
54.
Em dois hospitais, os gestores informaram que a maioria dos médicos e enfermeiros
cumpre a respectiva jornada e acrescentaram que todos os outros profissionais a cumprem. O gestor de
outro hospital mencionou que os médicos plantonistas não cumprem integralmente sua escala. Ele
afirmou que haveria certa flexibilidade devido aos baixos salários ofertados e que isso não acarretava
prejuízos para o atendimento, pois, uma vez convocados, eles chegavam ao hospital em até uma hora.
55.
Dos quatro hospitais visitados, um registrou que não pagava horas extras aos profissionais
de saúde. Em um dos três hospitais que informaram a existência desse pagamento, o percentual de
remuneração por serviço extraordinário atingiu aproximadamente 19% do total da folha de pagamento.
Num segundo hospital, foi identificado um aumento de 82% no valor médio mensal do pagamento de
19
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 021.201/2013-7
horas extras em 2013 em relação a 2012. Por fim, o terceiro hospital informou dados inconsistentes e,
até a conclusão deste relatório, não conseguiu afastar essas inconsistências.
56.
Em três hospitais visitados, a escala médica estava acessível ao público. No outro hospital,
o quadro de avisos para exposição dessa escala já havia sido adquirido, mas ainda não estava instalado.
V – Equipamentos, medicamentos e insumos
V.1. Equipamentos
57.
Em todos os hospitais visitados, foi constatada a falta de equipamentos considerados
necessários para o atendimento adequado da demanda. Além disso, existem equipamentos antigos e
desatualizados que precisam ser substituídos. A carência de tais equipamentos, bem como o
consequente prejuízo ao atendimento, foi um dos principais problemas ressaltados pelos entrevistados.
58.
A dificuldade para repor equipamentos inservíveis foi relatada em todos os hospitais, bem
como os transtornos no atendimento que essa circunstância ocasiona. Em dois hospitais, peças desses
equipamentos são extraídas para serem utilizadas em outras máquinas, num processo denominado
“canibalização”. Nos outros dois hospitais, os equipamentos quebrados são enviados para o
almoxarifado da prefeitura para que lhes sejam conferida destinação.
59.
Em dois dos hospitais visitados, foi mencionada a existência de equipamentos de alto custo
ociosos. Em um deles, uma autoclave ainda não havia sido instalada porque a rede de energia existente
não suportaria essa ligação. Visando resolver esse problema, foi requisitada a compra de mais um
gerador. No outro hospital, havia um aparelho para cirurgias oftalmológicas que estava ocioso, devido
à ausência de pessoal qualificado para operá-lo. Segundo o entrevistado, esse aparelho é utilizado
esporadicamente, quando da realização de campanhas para ofertas de cirurgias, nessas ocasiões sua
operação é terceirizada. Nenhum gestor dos hospitais visitados registrou a existência de equipamentos
de alto custo que não estavam sendo utilizados por falta de insumos.
60.
Os gestores de todos os hospitais visitados apontaram a dificuldade para manter os
equipamentos de alto custo como outro problema muito sério. Nenhum desses hospitais tem contrato
de manutenção continuada. Assim sendo, a manutenção é sempre corretiva, nunca preventiva, as
contratações são realizadas a cada necessidade de intervenção e pequenos serviços são realizados pelo
pessoal dos próprios hospitais.
61.
Foram relatados graves problemas de manutenção, que causaram substanciais transtornos e
prejuízos ao atendimento, quais sejam: reduzida oferta de serviços de manutenção, morosidade nas
contratações, altos preços cobrados, demora no atendimento e insuficiência de recursos para custear a
manutenção. Em um dos hospitais, por exemplo, a única autoclave estava indisponível há mais de uma
semana na ocasião da visita, pois uma peça havia sido enviada à Goiânia para reparo. Essa
circunstância trazia sérios transtornos, pois era preciso enviar os materiais para serem esterilizados em
hospitais de municípios vizinhos.
V.2. Medicamentos e insumos
62.
Apenas no maior hospital público do estado, a falta de medicamentos foi apontada como
um problema grave. Na verdade, essa falta foi considerada o principal problema desse hospital, tendo
em vista o grave prejuízo causado ao atendimento. O gestor dessa entidade afirmou que, com certa
frequência, é necessário adquirir medicamentos e insumos com seus próprios recursos, a fim de evitar
óbitos de pacientes. Nesse contexto, por melhor que seja o planejamento das aquisições, é
imprescindível criar mecanismos que possibilitem realizar essas compras com a agilidade demandada
pelos casos urgentes. Ainda segundo o gestor, mesmo a contratação emergencial por dispensa de
licitação não seria adequada à dinâmica de hospitais, pois demandaria tempo excessivo para realizar as
formalidades.
63.
Nos outros três hospitais visitados, os gestores não consideraram a falta de medicamentos
como um dos problemas mais graves. Algumas explicações para esses entendimentos divergentes são
o menor fluxo de pacientes nesses hospitais, o que facilita o planejamento das compras; a fixação de
preços de referência mais altos, o que desperta maior interesse dos fornecedores; o descumprimento de
20
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 021.201/2013-7
formalidades legais nesses três hospitais, o que torna o procedimento de aquisição mais ágil, e o
planejamento mais adequado das aquisições.
64.
Os gestores de todos os hospitais visitados também informaram que o controle de estoque e
da distribuição de medicamentos e insumos é manual e pouco confiável. Esse problema pode causar
descontrole do estoque, prejudicar o planejamento das aquisições e facilitar o desperdício de
medicamentos e a distribuição ineficiente dos mesmos.
V.3. Observações adicionais
65.
Em três dos quatro hospitais visitados, foi registrada a falta de instrumentos e mobiliário
básicos para a prestação dos serviços. Essa falta, que pode derivar da insuficiência de recursos, da
gestão deficiente das aquisições ou do uso inadequado que reduz a vida útil, reduz a tempestividade e
qualidade do atendimento.
66.
Em apenas um dos hospitais inspecionados, verificou-se que a sistemática de estocagem de
insumos e medicamentos dificulta o seu compartilhamento. Assim mesmo, os problemas relatados são
eventuais e não chegam a causar grandes transtornos.
67.
Em três dos hospitais, os entrevistados afirmaram que chegam a utilizar medicamentos de
alto custo por falta dos fármacos de menor custo. Em dois deles, foi registrado que essa prática
indesejada ocorre muitas vezes. Por outro lado, somente em um hospital foi registrada a utilização
pouco frequente de medicamentos ou insumos de menor custo devido à falta do fármaco que seria
adequado. Essas situações, que prejudicam a qualidade e a eficiência do atendimento, ocorrem devido
à falta de conscientização dos profissionais quanto ao uso adequado dos remédios e à gestão deficiente
de medicamentos e insumos.
68.
Por fim, em dois hospitais visitados, os gestores relataram o desperdício de medicamentos,
principalmente devido à falta de conscientização dos profissionais quanto ao uso adequado de
medicamentos ou insumos.
VI – Sistemas informatizados
69.
Ficou patente a falta de informatização dos hospitais, o que dificultou a obtenção de dados
sobre desempenho e qualidade do atendimento. Dois hospitais visitados declararam não possuir
sistemas informatizados próprios, apenas aqueles disponibilizados pelo Ministério da Saúde, sendo que
o SISREG (sistema de regulação) estava em fase de implantação. Os outros dois hospitais registraram
que alguns setores (recepção, laboratório, faturamento, sistema de classificação de risco e farmácia)
apresentavam um certo grau de informatização. Porém, os sistemas existentes não eram capazes de
gerar dados que pudessem orientar a administração no processo decisório.
70.
Problemas com a utilização de recursos de tecnologia da informação foram relatados pelos
hospitais, tais como: inadequação do sistema, baixa velocidade de processamento, instabilidade do
sistema e da rede, falta de adequado suporte técnico e de treinamento da equipe e inserção inadequada
de informações no sistema. Tais problemas, que decorrem da insuficiência de recursos e da gestão
deficiente da tecnologia da informação, prejudicam a qualidade, eficiência e eficácia do atendimento,
além de ensejar o desperdício de recursos e a fragilidade de controles e dificultar o gerenciamento, a
fixação e a avaliação de metas.
VII – Estrutura física
71.
Em apenas um dos hospitais visitados, os entrevistados afirmaram que a estrutura física
estava adequada à demanda, sendo necessário realizar somente algumas pequenas reformas, sem
comprometer o atendimento. Nos outros três hospitais, foi registrado que existiam diversos problemas
relacionados à estrutura física. A título de exemplo, pode-se citar que em um dos hospitais com
problemas, foi necessário deslocar pacientes para os corredores devido a um alagamento, o que
prejudicou o atendimento e gerou maiores riscos de infecção.
21
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 021.201/2013-7
72.
Nenhum hospital visitado contava com contratos de manutenção predial, que era realizada
por equipe própria e limitava-se a pequenos serviços. Para intervenções mais complexas, eram
efetuadas contratações específicas.
73.
Todos os hospitais inspecionados contavam com gerador. Mas, em um deles, o
equipamento não estava adequado à manutenção dos serviços essenciais. Nesse caso, a despeito de o
gerador atender a somente cerca de 40% do imóvel, não foram registrados problemas graves devido à
interrupção do fornecimento de energia.
74.
Em todos os hospitais, havia local para a guarda de cadáveres, porém, em nenhum deles o
ambiente era refrigerado, o que dificulta a conservação do corpo por um tempo maior que o usual.
75.
Os serviços da lavanderia foram considerados adequados em três hospitais. No quarto,
foram relatados problemas no fornecimento de roupas e toalhas.
VIII - Obras paralisadas
76.
Há duas obras públicas paralisadas que são consideradas de grande relevância para a
assistência hospitalar no estado do Mato Grosso. A primeira é a do Centro de Nefrologia do Hospital
Universitário Júlio Müller (hospital federal), que deveria ser referência na especialidade, mas não está
em funcionamento. Essa obra, que está paralisada desde 2010, foi objeto de representação versando
sobre supostas irregularidades na sua execução (TC nº 010.523/2013-8). O referido processo está na
fase de diligências.
77.
A segunda obra é a construção do Hospital Central de Cuiabá (hospital estadual), que está
paralisada desde meados da década de 90. Foi instaurada tomada de contas especial a respeito de
irregularidades nos pagamentos referentes à citada obra, a qual foi apreciada por meio do Acórdão nº
457/2002 - Plenário, alterado parcialmente pelo Acórdão nº 780/2004 - Plenário (TC nº 425.022/19960). Naquela oportunidade foi imputado débito solidário à construtora e a diversos agentes públicos
estaduais.
78.
Notícias recentemente veiculadas nos meios de comunicação do estado informaram que
ainda se cogita a retomada da obra, sobretudo em razão das manifestações ocorridas em meados deste
ano. Além disso, o Ministério Público Federal tem instado o Governo estadual a concluir o
empreendimento, com base em decisão proferida em ação civil pública.
IX – Inexistência de Comissão de Controle de Infecção Hospitalar
79.
Em dois hospitais, não havia Comissão de Controle de Infecção Hospitalar - CCIH. Em um
deles, faltavam profissionais para compor essa comissão. No outro, o processo de constituição da
CCIH estava em andamento. Nos hospitais em que a CCIH estava instalada, ela estava ativa, no
entanto, verificou-se que era necessário um trabalho maior de sensibilização dos profissionais de saúde
para a importância do controle das infecções, pois os cuidados necessários ainda não eram plenamente
adotados.
X - Gestão de hospitais públicos por organizações sociais
80.
A partir de 2011, a gestão dos principais hospitais públicos da rede estadual foi transferida
para organizações sociais, mediante a celebração de contratos de gestão, o que tem gerado críticas e
questionamentos por alguns setores da sociedade.
81.
No TCU, tramita o TC nº 032.493/2011-8, ainda não julgado, que trata de auditoria
realizada em um desses contratos de gestão, com vistas a verificar sua conformidade com as normas e
os princípios gerais de contratação da administração pública. A Auditoria-Geral do Estado também
tem realizado fiscalizações com o objetivo de avaliar a consecução das metas dos hospitais geridos por
organizações sociais.
XI – Considerações finais
82.
Considerando que este trabalho visou levantar informações para subsidiar a elaboração do
Relatório Sistêmico da Saúde e que não foram apontados indícios de irregularidades que devam ser
22
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 021.201/2013-7
apurados neste momento, avalio que ele atingiu seus objetivos. Assim sendo, julgo que os presentes
autos devem ser apensados ao processo no âmbito do qual vão ser consolidados os levantamentos
produzidos em nível nacional na área de assistência hospitalar (TC nº 026.797/2013-5).
83.
Finalmente, entendo que deve ser encaminhada cópia do relatório de levantamento
elaborado pela Secex/MT, deste Voto, do Relatório que o precedeu e do Acórdão que vier a ser
proferido à Secretaria de Saúde do Estado do Mato Grosso, às Secretarias Municipais de Saúde de
Cuiabá, Várzea Grande, Barra do Garças e Barra do Bugres, ao Conselho Estadual de Saúde do Mato
Grosso, ao Conselho Regional de Medicina do Mato Grosso, ao Ministério Público Estadual de Mato
Grosso, ao Departamento Nacional de Auditoria do SUS – Denasus, à Defensoria Pública do Estado
do Mato Grosso e ao Núcleo Estadual do Ministério da Saúde no Mato Grosso. A partir do
recebimento desses documentos, cada um desses órgãos ou entidades poderá adotar as medidas que
julgar cabíveis.
Diante do acima exposto, VOTO por que o Tribunal adote o Acórdão que ora submeto à
apreciação deste Plenário.
TCU, Sala das Sessões Ministro Luciano Brandão Alves de Souza, em 6 de novembro de
2013.
BENJAMIN ZYMLER
Relator
ACÓRDÃO Nº 2975/2013 – TCU – Plenário
1. Processo nº TC 021.201/2013-7.
2. Grupo I – Classe de Assunto: V – Relatório de Levantamento.
3. Interessado: Ministério da Saúde.
4. Órgãos Secretaria de Estado de Saúde de Mato Grosso e Secretarias Municipais de Saúde de Cuiabá,
Várzea Grande, Barra do Bugres e Barra do Garças.
5. Relator: Ministro Benjamin Zymler.
6. Representante do Ministério Público: não atuou.
7. Unidade Técnica: Secretaria de Controle Externo - MT (SECEX-MT).
8. Advogado constituído nos autos: não há.
9. Acórdão:
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de relatório de levantamento realizado em
entidades públicas que atuam na área de saúde no Estado do Mato Grosso, com o objetivo de conhecer
a organização, o funcionamento e os principais problemas dessas entidades, além de subsidiar a
elaboração do Relatório Sistêmico da Saúde.
ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão Plenária,
diante das razões expostas pelo Relator, em:
9.1. considerar cumpridos os objetivos que motivaram a autuação deste processo;
9.2. apensar os presentes autos ao processo no âmbito do qual serão consolidados os
levantamentos produzidos em nível nacional na área de assistência hospitalar (TC nº 026.797/2013-5);
9.3. encaminhar cópia do relatório de levantamento elaborado pela Secex/MT e deste
Acórdão, bem como do Relatório e do Voto que o fundamentaram, à Secretaria de Saúde do Estado do
Mato Grosso, às Secretarias Municipais de Saúde de Cuiabá, Várzea Grande, Barra do Bugres e Barra do
Garças, ao Conselho Estadual de Saúde do Mato Grosso, ao Conselho Regional de Medicina do Mato
23
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO
TC 021.201/2013-7
Grosso, ao Departamento Nacional de Auditoria do SUS – Denasus, à Defensoria Pública do Estado do
Mato Grosso, ao Ministério Público Estadual de Mato Grosso e ao Núcleo Estadual do Ministério da
Saúde no Mato Grosso, para a adoção das medidas que esses órgãos e entidades entenderem cabíveis.
10. Ata n° 43/2013 – Plenário.
11. Data da Sessão: 6/11/2013 – Ordinária.
12. Código eletrônico para localização na página do TCU na Internet: AC-2975-43/13-P.
13. Especificação do quorum:
13.1. Ministros presentes: Valmir Campelo (na Presidência), Walton Alencar Rodrigues, Benjamin
Zymler (Relator), Raimundo Carreiro e José Múcio Monteiro.
13.2. Ministros-Substitutos convocados: Marcos Bemquerer Costa e Weder de Oliveira.
(Assinado Eletronicamente)
(Assinado Eletronicamente)
VALMIR CAMPELO
na Presidência
BENJAMIN ZYMLER
Relator
Fui presente:
(Assinado Eletronicamente)
PAULO SOARES BUGARIN
Procurador-Geral
24
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