texto - unesp franca / sp

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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JULIO DE MESQUITA FILHO”
FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS
ELAINE FRIOZI GARCIA GUIMARÃES
O PROCESSO DE IMPLEMENTAÇÃO DO SUAS:
um estudo sobre o trabalho desenvolvido pelos CRAS no noroeste paulista
FRANCA
2015
ELAINE FRIOZI GARCIA GUIMARÃES
O PROCESSO DE IMPLEMENTAÇÃO DO SUAS:
um estudo sobre o trabalho desenvolvido pelos CRAS no noroeste paulista
Dissertação apresentada à Faculdade de
Ciências Humanas e Sociais, Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”,
como pré-requisito para obtenção do Título
de Mestre em Serviço Social. Área de
concentração: Serviço Social: Trabalho e
Sociedade.
Orientadora: Profª. Drª. Adriana Giaqueto
FRANCA
2015
Guimarães, Elaine Friozi Garcia.
O processo de implementação do SUAS : um estudo sobre o trabalho desenvolvido pelos CRAS no noroeste paulista / Elaine Friozi
Garcia Guimarães. – Franca : [s.n.],2015.
191 f.
Dissertação (Mestrado em Serviço Social). Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências Humanas e Sociais.
Orientador: Adriana Giaqueto.
1. Sistema Único de Assistência Social (Brasil). 2. Legislação
social 3. Centro de Referência de Assistência Social. I. Título.
CDD – 361.61
ELAINE FRIOZI GARCIA GUIMARÃES
O PROCESSO DE IMPLEMENTAÇÃO DO SUAS:
um estudo sobre o trabalho desenvolvido pelos CRAS no noroeste paulista
Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, como pré-requisito para obtenção do
Título de Mestre em Serviço Social. Área de concentração: Serviço Social: Trabalho e
Sociedade.
BANCA EXAMINADORA
Presidente: _________________________________________________________________
Dra. Adriana Giaqueto.
1º Examinador:_____________________________________________________________
Dra. Lucimara P. dos Santos Benatti – UNILAGO
2º Examinador:_____________________________________________________________
Dra. Nayara Hakime Dutra Oliveira - FCHS/UNESP
Franca, 25 de Setembro de 2015
Dedico esta dissertação aos trabalhadores do SUAS, que mesmo diante de
tempos difíceis, persistem na luta dia após dia...
“Por vezes sentimos que aquilo que fazemos não é senão uma
gota de água no mar. Mas o mar seria menor se lhe faltasse
uma gota”. (Madre Teresa de Calcutá)
E também, aos meus queridos alunos e ex-alunos da graduação em serviço
social da Fundação Educacional de Fernandópolis. Foi o compromisso
com a formação de qualidade que me impulsionou a cursar a Pós
Graduação. O desejo de compartilhar o conhecimento com vocês foi o que
motivou-me e fortaleceu-me ao longo deste período.
“Ensinar é um exercício de imortalidade. De alguma
forma continuamos a viver naqueles cujos olhos
aprenderam a ver o mundo pela magia da nossa
palavra. O professor, assim, não morre jamais...
(Rubem Alves)
AGRADECIMENTOS
“Trago dentro do meu coração,
Como num cofre que não se pode fechar de cheio,
Todos os lugares onde estive,
Todos os portos a que cheguei,
Todas as paisagens que vi através de janelas ou vigias,
Ou de tombadilhos, sonhando,
E tudo isso, que é tanto, é pouco para o que eu quero”.
(Álvaro de Campos)
Ao chegar ao fim desta caminhada e poder sentir o prazer de conseguir concluir mais
um ciclo, os pensamentos voam e é como se eu fizesse uma viagem no tempo.
O trabalho aqui apresentado não é nada além do resultado de todas as jornadas.
Certamente todos os que encontrei ao longo do caminho também tem um pedacinho aqui,
afinal o aprendizado é constante e inacabado, todos tem algo a nos transmitir, assim como
também transmitimos algo àqueles com os quais nos encontramos dia após dia.
Pensando assim e acreditando na dialética da vida, venho aqui agradecer a todos os
que encontrei e compartilhei partes da minha vida: professores, amigos, colegas de trabalho e
a minha família.
Nomear a todos seria algo arriscado, afinal poderia cometer a falha de me esquecer de
alguém, então nomearei etapas e consequentemente pessoas importantes que nelas ficaram
marcadas.
Tudo começou com as aulas de Sociologia no CEFAM, agradeço então em nome da
Professora desta disciplina, Rosana Borin, toda a contribuição e formação crítica que
propiciou para que eu abrisse os olhos para o mundo, afinal “a verdadeira viagem de
descobrimento não consiste em procurar novas paisagens , mas em ter novos olhos”. (Marcel
Proust)
Ao período da graduação, fase tão especial da vida, que me desfez e depois refez,
virando-me aos avessos e lapidando o meu olhar para o mundo. Nesta fase pude conhecer
pessoas especiais.
Agradeço aos mestres por todas as contribuições teóricas, especialmente à Lucimara,
orientadora de TCC tão presente e dedicada, uma professora que se sempre me incentivou a
seguir em frente. E carinhosamente à professora Mariza, jamais me esquecerei o seu esforço
para conseguir adiantar a minha colação de grau, de forma que fosse possível assumir o cargo
no concurso público da Prefeitura de São Paulo, ainda no final do ultimo ano da graduação.
Aos amigos por terem compartilhado os momentos felizes e também os mais difíceis,
especialmente: Márcia, Érika e Edinéia, companheiras de reflexões que me fizeram aprender
muito.
À equipe do CRAS Parque da Cidadania de São José do Rio Preto, especialmente:
Claudia, Luciana, Eveline, Nelcides, Rafael e Cristiano. Realizar estágio neste espaço foi o
maior presente da graduação. As vivências daqueles dois anos continuam vivas em meu
cotidiano de trabalho nos dias atuais, com vocês tive o primeiro contato com o trabalho com
grupos, que posteriormente tornou-se o tema do meu TCC e continua sendo ainda hoje, a meu
ver, a principal estratégia para a realização do trabalho social com famílias.
Agradeço a toda à equipe do CRAS – Penha de São Paulo, conviver com vocês foi
uma verdadeira escola da vida! Cada história de superação, de persistência e de sonhos
contribuíram para que eu encontrasse forças para conviver com vocês longe de toda a minha
família. Vocês foram a minha família, me acolheram e tudo isso é impagável.
Retornando para o interior, agradeço pela oportunidade de ter reencontrado a
professora Lesliane, pessoa fundamental no processo de decisão por cursar a pós-graduação.
Conviver com você no curso de Serviço Social da FEF me fez compreender a tamanha
responsabilidade em ser docente. Muito obrigada por ser esta profissional tão competente e
comprometida com a formação profissional.
Agradeço aos professores do curso de Serviço Social da FEF pela acolhida e pelo
incentivo em todas as horas, em especial a Eliane, companheira de luta, das idas à Franca, das
participações nos eventos da categoria. Com certeza, ter seu apoio e companhia foi
fundamental em todo esse processo.
Agradeço a equipe do CRAS e do Órgão Gestor de Ouroeste, pela acolhida, por
estarem prontos a me ouvirem nos momentos mais delicados, especialmente no período do
desenvolvimento da pesquisa de campo desta dissertação. Não havia nada concreto que
pudessem fazer, mas apenas por terem me ouvido, o peso certamente se tornou mais leve para
os meus ombros. Obrigada por fazerem parte da minha vida.
Agradeço de forma muito carinhosa à minha orientadora Adriana Giaqueto, um ser
humano único, que esteve presente em todos os momentos orientando e acalmando minhas
angustias. A sua contribuição foi fundamental para a efetivação deste trabalho. O seu olhar
me ensinou a olhar os desafios encarando-os como possibilidades.
Não poderia deixar de agradecer aos sujeitos da pesquisa, que proporcionaram que a
proposta do projeto de pesquisa pudesse ser efetivada. Não é fácil receber um “estranho” em
nossas casas e a ele ”confessar nossas intimidades”. Obrigada pela ousadia e principalmente
pela confiança a mim dispensada.
Agradeço também o apoio continuo que recebi da minha família. Ao meu pai,
companheiro de estrada, por ter acordado tantas madrugadas e passar dias ociosos em Franca
enquanto eu estudava. À minha mãe pela preocupação e cuidado de sempre. A vovó e aos
meus irmãos Juliano e Cleber pela torcida de todas as horas.
E, por fim, agradeço ao Willian, meu companheiro de todas as horas. Como foi
compreensível... aceitando as ausências, os dias de mau-humor, sempre escutando minhas
angustias com uma palavra acolhedora de carinho. Como diz Rubem Alves: "O que as
pessoas mais desejam é alguém que as escute de maneira calma e tranqüila. Em silêncio. Sem
dar conselhos. Sem que digam: "Se eu fosse você". A gente ama não é a pessoa que fala
bonito. É a pessoa que escuta bonito. A fala só é bonita quando ela nasce de uma longa e
silenciosa escuta. É na escuta que o amor começa. E é na não-escuta que ele termina.”
Eu sou um intelectual que não tem medo de ser amoroso. Amo as
gentes e amo o mundo. E é porque amo as pessoas e amo o mundo
que eu brigo para que a justiça social se implante antes da caridade.
Paulo Freire
GUIMARÃES, Elaine Friozi Garcia. O processo de implementação do SUAS: um estudo
sobre o trabalho desenvolvido pelos CRAS no noroeste paulista. 2015. 191 f. Dissertação
(Mestrado em Serviço Social) - Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Franca, 2015.
RESUMO
A presente pesquisa tem como objeto de estudo o processo de implementação do SUAS a
partir do trabalho desenvolvido pelos CRAS, na realidade cotidiana da região de cobertura da
DRADS de Fernandópolis. Tem como objetivo analisar o processo de implementação do
SUAS nos CRAS do noroeste paulista na busca pela efetivação da assistência social enquanto
direito social. Recorremos à abordagem qualitativa, na perspectiva de trabalhar com os
significados da realidade social a partir das vivências dos sujeitos desta pesquisa. A fim de
alcançarmos a materialização desta proposta de estudo, realizamos pesquisa bibliográfica,
pesquisa documental e pesquisa de campo, que foi desenvolvida nos CRAS dos municípios de
Macaubal, Populina, Riolândia e Rubinéia. Na pesquisa de campo utilizamos as técnicas do
questionário e do grupo focal. Desvelamos que a assistência social, historicamente concebida
como caridade e benesse, a partir da Constituição Federal de 1988 passou a ocupar um novo
lugar, agora no seio das políticas sociais, por meio do seu reconhecimento legal enquanto
direito social. Apresentamos os avanços obtidos por meio da criação da LOAS (1993), da
PNAS (2004) e da instituição do SUAS (2005), entretanto, destacamos os desafios
enfrentados cotidianamente para que este direito venha a ser efetivado em todo o território
nacional, principalmente ao considerarmos o contexto socioeconômico no qual estamos
inseridos, marcado pelo neoliberalismo, que se coloca na contramão dos avanços
constitucionais e das possibilidades de garantia da assistência enquanto um direito social.
Neste contexto, buscamos apreender sobre a perspectiva dos trabalhadores do SUAS a
respeito do trabalho desenvolvido pelos CRAS, discutindo sobre as possibilidades e desafios
cotidianos e também sobre as principais estratégias utilizadas na implantação/implementação
do SUAS, dentro da perspectiva da busca pela efetivação do direito à assistência social.
Palavras-chave: assistência social. direito social. SUAS. CRAS.
GUIMARÃES, Elaine Friozi Garcia. The Implementation processo of SUAS: a study on the
work developed by the CRAS in the northwest Paulista. 2015. 191 f. Dissertation (Master in
Social Work) - Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Estadual Paulista
“Júlio de Mesquita Filho”, Franca, 2015.
ABSTRACT
This research has as object of study the process of SUAS implementation from the work
developed by the CRAS, in the everyday reality of DRADS coverage of region
Fernandópolis. Aims to analyze the process of SUAS implementation in the Northwest of São
Paulo on CRAS quest for completion of the social assistance while social right. We use the
qualitative approach, the prospect of working with the meanings of social reality from the
experiences of the subjects of this research. In order to achieve the materialization of this
proposed study, we carried out bibliographical research, desk research and field research,
which was developed in the municipalities of CRAS Macaubal, Populina, Riolândia and
Rubinéia. In the field research we use the techniques of the questionnaire and focus group. It
is visible social assistance, historically conceived as charity and bounty, from the 1988
Federal Constitution went on to occupy a new place now within social policies, through its
legal recognition as social right. We present the progress achieved through the creation of the
LOAS (1993), the PNAS (2004) and the institution of SUAS (2005), however, we highlight
the challenges faced everyday so that this right will be effective throughout the country,
especially when we consider the socio-economic context in which we operate, marked by
neoliberalism, that arises against constitutional advances and the possibilities of assistance
assurance as a social right. In this context, we seek to learn about the prospect of SUAS
workers about the work developed by the CRAS, discussing the possibilities and challenges
of every day and also on the main strategies used in the deployment/implementation of the
SUAS, within the perspective of the search for effectiveness of the right to social assistance.
Keywords: social assistance. social right. SUAS. CRAS.
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 – Porte dos Municípios. ......................................................................................... 62
Gráfico 2 – Nível de Gestão do SUAS. .................................................................................. 63
Grafico 3 – Estrutura Administrativa do Órgão Gestor da Política de Assistência
Social..................................................................................................................64
Gráfico 4 – Nível Escolaridade dos Gestores ....................................................................... 65
Gráfico 5 – Formação Universitária dos Gestores. ............................................................. 65
Gráfico 6- Perfil dos Coordenadores dos CRAS.................................................................. 66
Gráfico 7 – Situações que não atendem os pressupostos da NOB-RH/SUAS. .................. 67
Gráfico 8 – Formação Universitária dos Coordenadores CRAS. ...................................... 68
Gráfico 9 – Esperança de vida ao nascer.............................................................................. 73
Gráfico 10 – Taxa de fecundidade total. ............................................................................... 74
Gráfico 11 – Taxa de analfabetismo da população de 18 anos ou mais de idade. ............ 75
Gráfico 12 – Percentual da população de 25 anos ou mais de idade com nível de
escolaridade de ensino superior completo. ................................................... 76
Gráfico 13 – Índice de Gini .................................................................................................... 77
Gráfico 14 – Proporção dos extremamente pobres ............................................................. 78
Gráfico 15 – Proporção de pobres ........................................................................................ 79
Gráfico 16 – Proporção de vulneráveis à pobreza ............................................................... 80
Gráfico 17 – Renda per capta média .................................................................................... 80
Gráfico 18 – Índice de Desenvolvimento Humano Municipal ............................................ 81
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Mapa da DRADS de Fernandópolis....................... Erro! Indicador não definido.1
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Defasagens na equipe mínima dos CRAS. ......................................................... 68
Tabela 2 – Função que exerce no CRAS .............................................................................. 85
Tabela 3 – Sexo, Idade e Formação Profissional ................................................................. 85
Tabela 4 – Experiência Profissional ...................................................................................... 86
Tabela 5 – Participação Política ............................................................................................ 86
Tabela 6 – Participação em Eventos Científicos .................................................................. 87
Tabela 7 – Participação em Capacitações ............................................................................ 87
Tabela 8 – Leituras ................................................................................................................. 88
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Participantes do Grupo Focal ........................................................................... 83
LISTA DE SIGLAS
BPC
Benefício de Prestação Continuada
CAPs
Caixas de Aposentadoria e Pensão
CCI
Centro de Convivência do Idoso
CFESS
Conselho Federal de Serviço Social
CLT
Consolidação das Leis Trabalhistas
CMDCA
Conselho Municipal da Criança e Adolescente
CNSS
Conselho Nacional de Serviço Social
CRAS
Centro de Referência de Assistência Social
DF
Distrito Federal
DRADS
Diretoria Regional de Assistência e Desenvolvimento Social
ECA
Estatuto da Criança e Adolescente
FEF
Fundação Educacional de Fernandópolis
FHC
Fernando Henrique Cardoso
IBGE
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDH
Índice de Desenvolvimento Humano
IPEA
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
IPEA/UNB
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada da Universidade de
Brasília
LBA
Legião Brasileira de Assistência Social
LOAS
Lei Orgânica da Assistência Social
MDS
Ministério do Desenvolvimento Social
MPAS
Ministério da Previdência e Assistência Social
NEPPOS/CEAM/UNB
Núcleo de Estudos e Pesquisas em Política Social da
Universidade de Brasília
NOB/SUAS
Norma Operacional Básica do SUAS
NOB-RH/SUAS
Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do SUAS
ONGs
Organizações Não Governamentais
PAIF
Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família
PNAIF
Programa Nacional de Atendimento Integral à Família
PNAS
Política Nacional de Assistência Social
SEDS
Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social
SENAC
Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio
SMADS
Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social
SUAS
Sistema Único de Assistência Social
UNICAMP
Universidade de Campinas
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ......................................................................................................................18
Percurso Metodológico ........................................................................................................... 24
CAPÍTULO 1 HISTÓRICO DA POLÍTICA SOCIAL NO BRASIL: UM
DESTAQUE AO LUGAR OCUPADO PELA ASSISTÊNCIA
SOCIAL ......................................................................................................... 32
1.1 A Criação do Conselho Nacional de Serviço Social (CNSS) e da Legião Brasileira de
Assistência Social (LBA): Os primeiros passos para a presença da assistência social
nas intervenções do Estado ............................................................................................. 37
1.2 A Assistência Social sob a Ótica do Direito: O Caminho que está sendo trilhado na
Busca por sua Efetivação Enquanto Política Pública. ................................................. 42
1.3 Discussões e Reflexões: A Busca pela Organização da Assistência Social no Brasil .. 55
CAPÍTULO 2 O UNIVERSO DA PESQUISA: AS PARTICULARIDADES DA
DRADS DE FERNANDÓPOLIS .............................................................. 60
2.1 Os Municípios de Pequeno Porte I Referenciados na DRADS de Fernandópolis. ..... 63
2.2 Macaubal, Populina, Riolândia e Rubinéia: Recortes do Noroeste Paulista .............. 70
2.3 Trabalhadores do SUAS: O Perfil dos Sujeitos desta Pesquisa ................................... 83
CAPÍTULO 3 O PROCESSO DE IMPLEMENTAÇÃO DO SUAS NOS MUNICÍPIOS
DE PEQUENO PORTE I: A PERSPECTIVA DOS
TRABALHADORES. ................................................................................... 90
3.1 O Sistema Único de Assistência Social: Reflexões Pertinentes ..................................... 91
3.2 O Cotidiano do CRAS: A Porta de Entrada para a Política de Assistência Social .. 101
3.3 Principais Vulnerabilidades e Riscos Sociais Presentes no Território: Demandas de
Trabalho..........................................................................................................................110
3.4 Os Usuários do SUAS e o Controle Social .................................................................... 119
3.5 O Trabalho Social com Famílias ................................................................................... 126
3.6 O Trabalho em Rede ...................................................................................................... 141
3.7 Os Caminhos da Assistência Social: Qual a Contribuição do SUAS? ....................... 149
3.8 Assistência Social: Um Direito Efetivado? ................................................................... 157
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 166
REFERÊNCIAS ... ................................................................................................................170
APÊNDICES
APENDICE A – QUESTIONÁRIO: PERFIL DOS SUJEITOS DA PESQUISA ......... 178
APENDICE B – QUESTIONÁRIO: COORDENADORES DOS CRAS. ...................... 183
APENDICE C – ROTEIRO: GRUPO FOCAL ................................................................. 185
APENDICE D – ROTEIRO: PESQUISA DOCUMENTAL JUNTO À DRADS DE
FERNANDÓPOLIS ................................................................................. 187
ANEXO
ANEXO A – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO – TCLE..... 190
18
INTRODUÇÃO
A partir do contato direto da pesquisadora com a área da Assistência Social, em
especial com o trabalho desenvolvido pelo Centro de Referência de Assistência Social
(CRAS), que ocorre desde o período de sua graduação, momento este em que realizou suas
atividades de estágio1 no primeiro CRAS implantado no município de São José do Rio Preto –
CRAS Parque da Cidadania, nos anos de 2007 e 2008, surgiu grande interesse em pesquisar e
conhecer a trajetória das Políticas Sociais em nosso país, que foi enfatizada a partir da
Promulgação da Constituição Federal de 1988, ao proporcionar parâmetros legais para uma
nova caminhada em busca pela efetivação dos direitos sociais, entre eles, a assistência social,
em nosso território nacional.
O interesse pela área da Assistência Social, despertado durante a graduação, se aguçou
ainda mais, com a oportunidade da atuação profissional nesta área, que se iniciou logo após a
conclusão do curso, no final do ano de 2008, a partir da aprovação em um concurso público
na Prefeitura Municipal de São Paulo.
Atuando na Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS),
primeiramente, como Assistente Social na secretaria e posteriormente como Técnica de Nível
Superior – Assistente Social do CRAS – Penha, a pesquisadora pôde acompanhar o difícil
processo de implantação do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) no município de
São Paulo.
Todas as dificuldades encontradas ao longo desse período (entre Novembro/2008 e
fevereiro/2011) levou a pesquisadora e se aprofundar nos estudos, e a cada dia mais, se sentir
provocada com a grande dicotomia existente entre o que é preconizado pela política de
assistência social em nosso país, com a forma como esta política estava, de fato, sendo
efetivada naquele local.
Muitos desafios existiam, o que se intensificava, principalmente, devido ao irrisório
número de CRAS no município (31, sendo 01 em cada Subprefeitura) para uma população de
11.244.369, conforme IBGE (2010).
O número de prontuários de famílias referenciadas no CRAS Penha chegou a ser
superior a 10 mil, em contraposição, havia apenas 06 (seis) técnicos de nível superior 1
O estágio supervisionado no curso de Serviço Social apresenta como uma de suas premissas oportunizar ao(a)
estudante o estabelecimento de relações mediatas entre os conhecimentos teórico-metodológicos e o trabalho
profissional, a capacitação técnico-operativa e o desenvolvimento de competências necessárias ao exercício da
profissão, bem como o reconhecimento do compromisso da ação profissional com as classes trabalhadoras,
neste contexto político-econômico-cultural sob hegemonia do capital (ABEPSS, 2010).
19
Assistentes Sociais, direcionados ao atendimento social destas. Então, outra questão se
destacava e proporcionava uma indagação:
De que forma seria possível desenvolver um trabalho de proteção social básica:
A proteção social básica tem como objetivos prevenir situações de risco por
meio do desenvolvimento de potencialidades e aquisições, e o fortalecimento
de vínculos familiares e comunitários. Destina-se à população que vive em
situação de vulnerabilidade social decorrente da pobreza, privação (ausência
de renda, precário ou nulo acesso aos serviços públicos, dentre outros) e, ou,
fragilização de vínculos afetivos – relacionais e de pertencimento social.
(BRASIL, 2009a, p. 33).
Em consonância com a Norma Operacional Básica (NOB/SUAS):
A proteção social de assistência social, ao ter por direção o desenvolvimento
humano e social e os direitos de cidadania, tem por princípios: -A
matricialidade sociofamiliar; -Territorialização; -Proteção Pró-Ativa; Integração à seguridade social; -Integração às políticas sociais e econômicas.
(BRASIL, 2009a, p. 90).
Diante das situações de trabalho e da realidade territorial do município, o trabalho
desenvolvido não podia ir além do emergencial, configurando-se em ações paliativas, muito
próximas ao antigo plantão social, que por décadas caracterizou a assistência social em nosso
país, e que em nada contribuía para que o SUAS fosse efetivado.
Após esta desafiante experiência, que proporcionou tantos momentos de inquietações
e reflexões, a pesquisadora deixou sua atuação na metrópole e assumiu em março de 2011 um
novo cargo, a partir da aprovação em outro concurso público, desta vez, em sua região de
origem, no Município do interior, Ouroeste/SP, onde atuou como Técnica de Nível Superior –
Assistente Social do CRAS (entre Março/2011 e Abril/2015) e atua (a partir de Maio/2015)
como Coordenadora do CRAS.
Por fim, cabe ainda enfatizar a experiência atual da pesquisadora com a carreira
acadêmica, visto que desde o mês de fevereiro de 2011 a mesma passou a fazer parte do corpo
docente do curso de Serviço Social da Fundação Educacional de Fernandópolis (FEF). Esta
nova experiência proporcionou momentos verdadeiramente ricos em conhecimentos, e o
envolvimento com este “meio” destinado à formação profissional aguçaram ainda mais os
desejos pelo aprofundamento e aperfeiçoamento teórico, que surgiram a partir do contato com
a prática profissional.
20
A experiência na docência vem apontando desafios constantes os quais apresentaram
diariamente à pesquisadora a necessidade da realização de uma pós-graduação strictosensu/mestrado a fim de qualificar sua atuação profissional também nesta área.
A
realidade
social
do
campo
de
atuação
profissional
se
transformou
significativamente, porém, o desejo pelo aprimoramento do conhecimento acerca da política
de assistência social no país, especialmente pelo que é preconizado pelo SUAS, continua,
afinal os desafios podem mudar, mas não deixam de estar presentes no cotidiano profissional,
seja ele qual for, uma vez que frente à conjuntura atual do nosso país, marcada pelos traços
neoliberais, que, de acordo com Couto et al (2010), traz como um dos seus principais ideários
a busca pelo desmonte e pela retração dos direitos e dos investimentos no campo social, é
possível encontrar desafios diários para que a Política Nacional de Assistência Social (PNAS)
juntamente com o SUAS, venham a ser de fato efetivados garantindo, assim, “[...] o Direito à
Assistência Social”.
Diante disso, surge a necessidade de estudos constantes sobre o que preconiza a PNAS
no Brasil, para que assim tenhamos subsídios teóricos e metodológicos que possam nos
direcionar para uma desconstrução da Assistência Social que perdurou por tantas décadas em
nosso país, marcada pelo clientelismo, pelo não-direito e situada como secundária e marginal
no conjunto das políticas públicas, conforme discute Couto et al (2010), para que enfim
possamos construir e praticar a Assistência Social enquanto direito garantido na Constituição
Federal de 1988:
São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a
segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a
assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (BRASIL, 1988,
Art. 6.º).
E, inserido no Tripé da Seguridade Social:
A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de
iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os
direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. (BRASIL,
1988, Art.194, V).
Sistema este, que traz a segurança de que o risco que o indivíduo venha correr não seja
apenas um problema individual, mas sim uma responsabilidade do Estado.
Levando em conta o percurso profissional da pesquisadora, por hora apresentado, a
presente pesquisa tem como objetivo geral: “Analisar o processo de implementação do
21
SUAS nos CRAS do noroeste paulista na busca pela efetivação da assistência social enquanto
direito social”.
Para tanto os seguintes objetivos específicos foram elencados:
 Conhecer o perfil das equipes dos CRAS.
 Identificar as estratégias utilizadas pelos CRAS para a efetivação dos pressupostos do
SUAS na perspectiva da defesa da Assistência Social enquanto direito social
 Conhecer as demandas de trabalho do CRAS, a partir das características territoriais.
Desta forma, o objeto de estudo está pautado no trabalho desenvolvido pelas equipes
dos CRAS nos municípios de pequeno porte I referenciados na Diretoria Regional de
Assistência e Desenvolvimento Social (DRADS)2 de Fernandópolis
Esta delimitação do objeto de estudo, é de suma importância, pois nos proporciona a
possibilidade de realizarmos uma discussão acerca dos trabalhos desenvolvidos nos CRAS,
que, partindo dos pressupostos do SUAS e da PNAS, estejam estruturados com as mesmas
características e recursos.
Conforme apresenta a NOB-SUAS, O SUAS é um sistema público não contributivo,
descentralizado e participativo que tem por função a gestão do conteúdo específico da
Assistência Social no campo da proteção social brasileira:
A proteção social de Assistência Social se ocupa das vitimizações,
fragilidades, contingências, vulnerabilidades e riscos que o cidadão, a cidadã
e suas famílias enfrentam na trajetória de seu ciclo de vida, por decorrência
de imposições sociais, econômicas, políticas e de ofensas à dignidade
humana. (BRASIL, 2009a, p. 89).
No que tange à gestão dos municípios, a NOB/SUAS proporciona três possibilidades,
sendo elas, a gestão inicial, a gestão básica e a gestão plena. Nesta pesquisa, abordaremos os
municípios em gestão básica, que têm como responsabilidades:
[...] organizar a proteção básica em seu município, prevenir situação de risco
por meio do desenvolvimento de potencialidades e aquisições. Por isso, deve
responsabilizar-se pela oferta de programas, projetos e serviços
socioassistenciais que fortaleçam vínculos familiares e comunitários que
promovam os beneficiários do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e
transferência de renda e que vigiem direitos violados no território. (BRASIL,
2009a, p. 99).
2
De acordo com o Decreto Estadual n. 49.688, de 17 de junho de 2005 (SÃO PAULO, 2005), destaca-se: Artigo
47 - As Diretorias Regionais de Assistência e Desenvolvimento Social têm, em suas respectivas áreas de
atuação, as seguintes atribuições: I - orientar e assistir municípios e entidades sociais na implementação e no
acompanhamento de políticas e programas de assistência e desenvolvimento social sob orientação técnica dos
Grupos que compõem a Coordenadoria;
22
A PNAS, na busca pela caracterização dos municípios, com o propósito de instituir o
SUAS, utiliza como referência a definição de municípios em pequeno porte I, pequeno porte
II, médio porte, grande porte e metrópole, sendo neste momento nosso foco de estudo os
municípios de pequeno porte I:
[...] aquele cuja população chega a 20.000 habitantes (até 5.000 famílias em
média). Possuem forte presença de população em zona rural, correspondendo
a 45% da população total. [...] possuem como referência municípios de
maior porte, pertencentes a mesma região em que estão localizados.
Necessitam de uma rede simplificada e reduzida de serviços de proteção
social básica, pois os níveis de coesão social, as demandas potenciais e redes
socioassistenciais não justificam serviços de natureza complexa. Em geral,
esses municípios não apresentam demanda significativa de proteção social
especial [...]. (BRASIL, 2009a, p. 45).
Ainda na lógica da PNAS, a assistência social deve ser desenvolvida a partir de
determinados níveis de proteção, definidas enquanto proteção social básica e proteção social
de especial, sendo elas de média complexidade e de alta complexidade.
O CRAS é responsável pela execução de serviços de proteção social básica que tem
como principal foco de atuação a prevenção e é destinada a população que vive em situação
de vulnerabilidade social:
Destina-se à população que vive em situação de vulnerabilidade social
decorrente da pobreza, privação (ausência de renda, precário ou nulo acesso
aos serviços públicos, dentre outros) e, ou, fragilização de vínculos afetivos
– relacionais e de pertencimento social (discriminações etárias, étnicas, de
gênero ou por deficiências, dentre outras). (BRASIL, 2009a, p. 33).
Conforme previsto na PNAS e descrito no Caderno de Orientações Técnicas
disponibilizado pelo Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) em 2009, o CRAS deve
ser responsável pela organização e coordenação da rede de serviços sócio assistenciais
existente em sua área de abrangência:
A articulação é o processo pelo qual se cria e mantém conexões entre
diferentes organizações, a partir da compreensão do seu funcionamento,
dinâmicas e papel desempenhado, de modo a coordenar interesses distintos e
fortalecer os que são comuns. A articulação da rede de proteção social
básica, referenciada ao CRAS, consiste no estabelecimento de contatos,
alianças, fluxos de informações e encaminhamentos entre o CRAS e as
demais unidades de proteção social básica do território. (MDS, 2009, p. 21).
23
Desenvolve um trabalho composto por uma atuação e coordenação voltada à
população em situação de vulnerabilidade social, decorrente da pobreza, privação e, ou,
fragilização de vínculos afetivos e sociais;
Para atuar com famílias e indivíduos em todo seu contexto comunitário, a equipe
responsável pela efetivação do trabalho desenvolvido deve estar devidamente capacitada a3:
Executar procedimentos qualificados para escuta individual e em grupo;
Identificar a partir dos pressupostos teóricos, metodológicos, éticos e legais, a
necessidade dos indivíduos e famílias. E assim, prestar orientações e informações pertinentes
a realidade apresentada, às famílias de toda a área de abrangência do CRAS;
Articular a rede com seus serviços e recursos para a realização do atendimento,
encaminhamento e acompanhamento das famílias e indivíduos, possibilitando assim o
desenvolvimento de ações intersetoriais que contribuam para o rompimento do ciclo de
reprodução da exclusão social e evitando que essas famílias tenham seus direitos violados,
recaindo em situações de vulnerabilidade e de riscos sociais;
Articular a rede de proteção social local e manter ativo um serviço de vigilância da
exclusão social, para que seja feito uma produção, sistematização e divulgação de indicadores
da área de abrangência do CRAS;
Promover a inserção das famílias nos serviços de assistência social local;
Desenvolver trabalho em equipe, a partir do atendimento interdisciplinar às famílias
referenciadas no CRAS;
Produzir documentos e relatórios que sejam necessários para a organização e o
aprimoramento do serviço;
E, por fim, desenvolver atividades socioeducativas de apoio, acolhida, reflexão e
participação, visando o fortalecimento familiar e a convivência comunitária.
Para tanto, a composição de uma equipe qualificada, que tenha conhecimento dos
pressupostos do SUAS e que reconheça a Assistência Social enquanto direito social é de
extrema importância para a efetivação da Política de Assistência Social no território nacional.
A NOB/SUAS, inclusive, defende a contratação dos trabalhadores do SUAS por meio
de concurso público, a existência de Planos de Cargos, Carreiras e Salários e o investimento
em qualificação e capacitação do quadro de recursos humanos. O que de fato, quando
efetivado, pode contribuir com a formação continuada destes trabalhadores e assim,
consequentemente, aprimorar a qualidade dos serviços prestados.
3
Com base no Ministério do Desenvolvimento Social. Secretaria Nacional de Assistência Social (MDS). Guia
de Orientação Técnica (2005).
24
Todo este processo normativo que direciona a efetivação da PNAS, a partir da
implantação e implementação do SUAS em nosso país, ainda é algo novo, que necessita
continuamente de aprofundamentos teóricos, como suporte para se praticar no cotidiano
profissional ações que venham colocar em prática sua lógica.
É importante ainda, destacar a escassez de publicações que abordem este processo,
especialmente no que tange à região noroeste paulista, realidade esta que pode qualificar a
realização desta pesquisa como um elemento de suma importância para a construção do
conhecimento acerca da implantação e implementação do SUAS nesta região, além de
proporcionar a disseminação das reflexões construídas a todos que possuem interesse por essa
área de atuação e encontram-se mergulhados na luta pela garantia da Assistência Social
enquanto direito social, que deve ser implementado enquanto política pública em todo o
território nacional.
Percurso Metodológico
Esta pesquisa conta com uma perspectiva metodológica pautada na visão de homem e
de mundo fundamentada nos direcionamentos do Projeto Ético-Político do Serviço Social,
que traz o conhecimento crítico enquanto um caminho essencial para a efetivação dos
princípios e valores deste Projeto Profissional.
Guerra (2009, p. 17) nos apresenta a importância da construção do conhecimento
crítico:
Se o conhecimento crítico é um dos caminhos para a liberdade, autonomia,
competência e compromisso, não se compreende os novos cenários, não se
enfrenta a barbárie social, não se combate a ofensiva neoliberal, não se
estabelece alianças com a sociedade civil organizada, não se alcança novas
legitimidades profissionais, não se efetiva os princípios e valores do projeto
profissional, não se forma profissionais críticos e competentes, sem a
pesquisa científica. Assim, há que se colocar um imperativo para a profissão:
Ousar saber para ousar transformar.
Desta forma, a matriz teórica-metodológica desta pesquisa está pautada na teoria
social crítica, o marxismo. Acreditamos que esta matriz proporciona subsídios para uma
leitura crítica da realidade social e também para uma melhor compreensão a cerca das
relações contraditórias existentes na sociedade capitalista.
25
Considerando que as teorias e a construção do conhecimento fornecem meios para o
entendimento dos fenômenos dados na realidade empírica, acreditamos que há aproximação e
relação entre teoria e realidade.
Portanto, partimos do pressuposto de que a teoria estudada nos fornece subsídios para
melhor compreensão do objeto de estudo aqui proposto.
A relação dialética entre teoria e realidade empírica se expressa no fato de
que a realidade informa a teoria que por sua vez a antecede, permite
percebê-la, formulá-la, dar conta dela, fazendo-a distinta, num processo sem
fim de distanciamento e aproximação. A teoria domina a construção do
conhecimento através de conceitos gerais provenientes do momento
anterior. Seu aprofundamento, de forma crítica, permite desvendar
dimensões não pensadas a respeito da realidade que não é evidente e que
não se dá: ela se revela a partir de interrogações elaboradas no processo de
construção teórica (MINAYO, 2004, p. 92).
Esta pesquisa analisou o processo de implementação do SUAS nos CRAS do noroeste
paulista, mais especificamente, nos municípios de pequeno porte I, referenciados na DRADS
– Fernandópolis, na busca pela efetivação da assistência social enquanto um direito social.
Com esta finalidade, optamos por abordar os profissionais dos CRAS dos municípios
que contemplem as seguintes características:
- Município de Pequeno Porte I
- Município em Gestão Básica;
- Equipe Mínima Completa;
Acreditamos que ao realizarmos este recorte, levando em conta estas características,
teremos maiores elementos para refletirmos sobre as diversas realidades apresentadas, sempre
podendo partir do pressuposto de que todos os CRAS encontram-se no mesmo nível de
gestão, possuindo os mesmos recursos e contando com um quadro de funcionários mínimo,
conforme preconizado por Brasil (2009a) e por Brasil (2009b), o que de certa forma, vem
favorecer o desenvolvimento de um trabalho pautado nos pressupostos do SUAS.
Para tanto, durante o processo de elaboração do projeto de pesquisa, no segundo
semestre do ano de 2012, entramos em contato com a DRADS – Fernandópolis, que nos
forneceu as informações pertinentes para que o projeto pudesse ser estruturado
metodologicamente de acordo com a realidade da região, naquele momento, sendo elas:
A DRADS conta com 49 municípios referenciados, sendo 45 municípios de Pequeno
Porte I, 01 município de Pequeno Porte II e 03 municípios de Médio Porte. No que tange aos
níveis de gestão, recebemos as informações de que 01 município encontrava-se em Gestão
Inicial, 45 em Gestão Básica e 03 em Gestão Plena.
26
Em relação à equipe mínima completa, segundo o levantamento da DRADS, todos os
CRAS implantados atendiam este pressuposto, porém com uma particularidade a ser
destacada: Não são todos funcionários efetivos.
Desta forma, pudemos detectar que um total de 45 CRAS possuíam as características
previamente definidas.
Por ser este um número alto, avaliamos ser de suma importância a realização de um
novo recorte, partindo do pressuposto de que com um número menor de sujeitos envolvidos,
teríamos maiores possibilidades de aprofundar nossas reflexões, o que contribuiria para que
essa pesquisa viesse alcançar seus objetivos de maneira satisfatória, através de resultados que
representem da forma mais fidedigna possível a realidade regional. Para tanto, a partir da
localização geográfica dos municípios referenciados pela DRADS Fernandópolis, elencamos
04 CRAS para comporem o universo de nossa pesquisa. A estratégia utilizada para a escolha
destes municípios se deu a partir da localização geográfica. Dividimos a área geográfica da
DRADS Fernandópolis em quatro partes, e então em cada quadrante optamos por selecionar
aleatoriamente um município (conforme as características já elencadas) para efetuarmos a
nossa pesquisa.
Cabe aqui destacar, que o processo de escolha desses municípios foi desafiante. Para
chegarmos à definição dos municípios em questão, decorreu-se um período de cerca de quatro
meses. Os municípios da região apresentaram resistência em estar participando da pesquisa.
Ressaltamos ainda que, como primeiro passo, entramos em contato com os sujeitos da
pesquisa, realizando uma visita pré-agendada aos CRAS dos municípios da região, para
apresentarmos a proposta da mesma, esclarecendo quanto ao tema, objeto de estudo, os
objetivos, a técnica a ser utilizada, o estabelecimento do Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido e assim solicitarmos a participação e a colaboração destes para a efetivação do
nosso estudo.
Entretanto, os seis primeiros municípios visitados se recusaram a participar da
pesquisa.
As justificativas para a recusa foram diversas, como por exemplo, houve
coordenador que esclareceu não estar desenvolvendo um trabalho pertinente aos pressupostos
do SUAS e portanto não se sentia a vontade para contribuir com a pesquisa, outros
coordenadores afirmaram estar com a equipe incompleta, o que estava dificultando a
realização do trabalho do CRAS e desta forma, preferiam não participar, por fim, outra
justificativa se deu por receio em expor o município, considerando a influência política ainda
presente na área da assistência social e a ausência da autonomia dos profissionais da área para
poderem expor a situação vivenciada.
27
Diante de todas essas situações, expomos aos coordenadores que a proposta da
pesquisa não estava em encontrar o CRAS perfeito, tão pouco em realizar críticas destrutivas
aos profissionais que atuam nos CRAS, mas sim em conhecer o cotidiano de trabalho destes
CRAS e ter subsídios para refletir sobre os desafios diários vivenciados por estes profissionais
na busca pela efetivação da garantia da assistência social enquanto um direito social.
Esclarecemos, ainda, que o SUAS encontra-se em processo de implementação,
processo este, que demanda estudos contínuos para que seja possível alcançar o rompimento
com os resquícios da trajetória da assistência social deste país, marcada pelo não-direito, pelo
clientelismo e pelo espontaneísmo.
Entretanto, respeitamos o posicionamento dos municípios e continuamos a busca pelos
municípios que aceitassem a contribuir com a pesquisa.
Delimitou-se, portanto, entre os CRAS dos municípios de Populina, Macaubal,
Riolândia e Rubinéia, o universo desta pesquisa.
Nesse sentido, podemos afirmar que a seleção desses quatro CRAS, com base na
localização geográfica dos municípios, constituiu-se através de uma amostragem,
considerando que a “[...] amostragem boa é aquela que possibilita abranger a totalidade do
problema investigado em suas múltiplas dimensões.” (MINAYO apud DESLANDES, 2007,
p. 43).
O próximo desafio encontrado esteve em torno da agenda dos municípios.
Pretendemos agendar data e horário conforme disponibilidade dos sujeitos da pesquisa. E,
desta forma, devido à demanda de trabalho, o período para a realização da pesquisa de campo
em todos os quatro municípios, perdurou alguns meses. Realizamos a pesquisa no município
de Populina no dia 10 de abril de 2015, no município de Riolândia no dia 08 de maio de 2015,
no município de Rubinéia no dia 29 de maio de 2015 e por fim, em Macaubal no dia 24 de
junho de 2015.
Recorremos à abordagem qualitativa, uma vez que a mesma nos proporciona a
compreensão de como os sujeitos de nossa pesquisa concebem e experimentam concretamente
a realidade vivenciada no trabalho desenvolvido pelos CRAS através do ponto de vista dos
mesmos em relação ao tema proposto, já que concordamos com Minayo (2007, p. 21), que a
pesquisa qualitativa “[...] trabalha com os significados de uma realidade social a partir da
realidade vivida pelo ser humano.” E ainda, considerando os aspectos qualitativos de uma
pesquisa que:
28
[...] implica considerar sujeito de estudo: gente, em determinada condição
social, pertencente a determinado grupo social ou classe com suas crenças,
valores e significados. Implica também considerar que o objeto das ciências
sociais é complexo, contraditório, inacabado, e, em permanente
transformação (MINAYO, 2007, p. 23).
A fim de alcançarmos os objetivos apresentados, a metodologia desta pesquisa se
fundamentou na Pesquisa Documental, Pesquisa Bibliográfica e Pesquisa de Campo.
A Pesquisa Documental, segundo Gil (1991, p. 51):
[...] assemelha-se muito à pesquisa bibliográfica. A diferença essencial entre
ambas está na natureza das fontes. Enquanto a pesquisa bibliográfica se
utiliza fundamentalmente das contribuições dos diversos autores sobre
determinado assunto, a pesquisa documental vale-se de materiais que não
receberam ainda um tratamento analítico, ou o que ainda podem ser
reelaborados de acordo com os objetos da pesquisa.
A pesquisa documental foi pautada no acesso às informações disponibilizadas pela
DRADS – Fernandópolis, referentes a realidade regional, no que tange a política de
Assistência Social e o processo de implantação/implementação do SUAS.
Realizamos ainda, estudo de documentos que contemplem informações pertinentes à
realidade demográfica dos municípios onde se inserem os CRAS em questão, em especial,
recorremos ao Atlas (PNUD; IPEA; FJP, 2013) e aos dados do IBGE.
A Pesquisa Bibliográfica “[...] desenvolvida a partir de material já elaborado,
constituído principalmente de livros e artigos científicos.” (GIL, 1991, p. 48) respaldou o
conhecimento acerca do objeto estudado, constituindo-se na leitura de livros, artigos
científicos, teses de doutorado, dissertações de mestrado, textos e resenhas que abordam a
trajetória da Assistência Social em nosso país, que a analisam enquanto política pública e
discutam o processo de implantação/implementação do SUAS no território brasileiro, além
desses, nos embasamos teoricamente nas leituras de BRASIL (2009a) , BRASIL (2009b),
BRASIL (2011b), entre outros materiais disponibilizados/publicados pelo Ministério do
Desenvolvimento Social (MDS).
Por fim, a Pesquisa de Campo, concebida por Minayo (2004) como a representação
de uma realidade empírica a ser estudada a partir das concepções teóricas que fundamentam o
objeto da investigação, foi desenvolvida nos CRAS caracterizados anteriormente, a partir da
concordância destes em contribuir com esta pesquisa.
Na realização da pesquisa de campo, utilizamos duas técnicas distintas de pesquisa: a
técnica do Questionário e a técnica do Grupo Focal.
29
Utilizamos primeiramente a técnica do Questionário, que pode ser definido “[...]
como a técnica de investigação composta por um número mais ou menos elevado de questões
apresentadas por escrito às pessoas, tendo por objetivo o conhecimento de opiniões, crenças,
sentimentos, interesses, expectativas, situações vivenciadas etc.” (GIL, 1999, p.128).
Pretendemos a partir desta técnica, abordar os profissionais dos CRAS selecionados
(coordenador, técnicos de nível superior, orientadores sociais e auxiliares administrativos que
prestem atendimento direto ao público) que se propuseram a participarem do grupo focal e
então realizamos o estudo do perfil destes trabalhadores.
Justificamos a importância deste estudo, ao considerarmos que realizamos nossas
reflexões partindo do ponto de vista destes trabalhadores em relação ao SUAS e a garantia da
Assistência Social enquanto direito social, desta forma, conhecermos quem são esses
trabalhadores, suas experiências na área da assistência social, quais são suas formações
profissionais e se encontram-se em processo de formação continuada, pode contribuir
significativamente para nossas reflexões a cerca do processo de implementação do SUAS na
região da DRADS de Fernandópolis.
A técnica do questionário também foi utilizada separadamente com os coordenadores
dos CRAS, e por meio dos dados obtidos através da aplicação deste questionário, realizamos
um estudo do processo de implantação/implementação do SUAS nos municípios
selecionados, com base nas informações da gestão.
Por fim, recorremos à técnica do Grupo Focal “O grupo focal é constituído por um
conjunto de pessoas selecionadas e reunidas por pesquisadores para discutir e comentar um
tema, que é objeto da pesquisa, a partir de suas experiências pessoais.” (GOMES, S. R.,
2005, p. 41). Almejamos com esta técnica compreender o trabalho desenvolvidos por estes
CRAS, identificar as possibilidades, os desafios e as estratégias utilizadas para a efetivação
dos pressupostos do SUAS e abordar sobre a efetivação da Assistência Social enquanto
Direito, de acordo com o ponto de vista destes trabalhadores.
Foram convidados a participarem do Grupo Focal a equipe do CRAS que realiza
atendimento ao público (coordenador, técnicos de nível superior, orientadores sociais,
auxiliares administrativos, entre outros). Entretanto, devido à demanda de trabalho destes
CRAS, nem toda a equipe pôde participar. Ao longo da caracterização dos sujeitos da
pesquisa, detalharemos sobre os participantes do Grupo Focal.
Para a realização do Grupo Focal, elaboramos um roteiro flexível, que segundo
assinala Gatti, poderá contribuir para motivar as discussões, que serão medidas pela
pesquisadora: “O roteiro elaborado como forma de orientar e estimular a discussão deve ser
30
utilizado com flexibilidade, de modo que ajustes durante o decorrer do trabalho podem ser
feitos com abordagem de tópicos não previstos.” (GATTI, 2005, p. 17).
A técnica do Grupo Focal foi desenvolvida pela pesquisadora, que considerando a
autorização dos entrevistados, utilizou o gravador para efetuar o registro das respostas e
posterior transcrição das mesmas para a realização da análise.
A análise dos dados obtidos na pesquisa de campo foi realizada a partir da criação de
categorias analíticas, uma vez que as categorias agregam “elementos ou aspectos com
características comuns ou que se relacionam entre si”, conforme discute Romeu Gomes
(2007, p. 70).
Assim, as categorias de análise criadas foram:
Categoria de análise I - O cotidiano do CRAS: a porta de entrada para a política de
assistência social;
Categoria de análise II - Principais vulnerabilidades e riscos sociais presentes no
território: Demandas de trabalho;
Categoria de análise III - Os usuários do SUAS e o controle social;
Categoria de análise IV - O trabalho social com famílias;
Categoria de análise V - O trabalho em rede;
Categoria de análise VI - Os caminhos da assistência social: qual a contribuição do
SUAS?;
VII - Assistência Social: Um direito efetivado?
A análise dessas categorias nos proporcionou subsídios para o conhecimento da
realidade vivenciada pelos sujeitos da pesquisa, o que foi possível a partir da expressão de
suas próprias falas.
A presente dissertação está organizada em três capítulos. No primeiro capitulo
apresentamos a trajetória das políticas sociais no Brasil, destacando o sobre o espaço ocupado
pela assistência social ao longo dos anos que antecederam a Constituição Federal de 1988.
Discutimos ainda sobre os avanços constitucionais, detalhando sobre o caminho que vêm
sendo trilhado para que a assistência social se torne um direito efetivado.
No capítulo dois, nos debruçamos à apresentação do universo da pesquisa.
Apresentamos dados pertinentes ao processo de implantação do SUAS nos municípios
referenciados na DRADS de Fernandópolis,, especialmente no que tange ao perfil dos
gestores e das equipes dos CRAS. Discutimos sobre a realidade dos municípios escolhidos
para a realização da pesquisa de campo e por fim, sobre o perfil dos sujeitos desta pesquisa.
31
No
terceiro
capítulo,
trouxemos
reflexões
sobre
o
processo
de
implantação/implementação do SUAS nos municípios visitados, tomando como ponto de
partida o ponto de vista dos trabalhadores do SUAS, mais especificamente as equipes dos
CRAS, destacando as possibilidades dos trabalhos desenvolvidos e os principais desafios
enfrentados para que a assistência social seja de fato um direito social.
Desta forma concluímos a presente pesquisa, com o desejo de que estas reflexões
possam contribuir com o trabalho daqueles que ainda se arriscam a acreditar nas
possibilidades de luta pela conquista de direitos, que pode se dar, inclusive, nos espaços de
trabalho da política de assistência social.
32
CAPÍTULO
1
HISTÓRICO
DA
POLÍTICA
SOCIAL
NO
BRASIL:
UM
DESTAQUE AO LUGAR OCUPADO PELA ASSISTÊNCIA
SOCIAL.
“[...] como não há ruptura definitiva com o passado, a
cada passo este se representa na cena histórica e cobra o
seu preço”. (FERNANDES, 1987 p. 202 apud ORTIZ,
1994, p. 40).
Para compreendermos o desenvolvimento da Política de Assistência Social no Brasil,
é imprescindível pontuar a concepção da qual se parte de política social.
As políticas sociais são criadas como forma de enfrentamento para as manifestações
da questão social, de forma a possibilitar a reprodução do sistema capitalista.
A questão social, aqui entendida como “[...]conjunto de expressões das
desigualdades sociais engendradas na sociedade capitalista madura.” (IAMAMOTO, 2001,
p. 16), surge primeiramente na Europa em 1830, devido a grandes mudanças econômicas,
sociais e políticas que foram desencadeadas pelo processo de industrialização, a partir das
mobilizações e reivindicações da classe operária e frente ao pauperismo e a miséria
decorrentes da exploração e exclusão social consequentes do capitalismo, que exigiram a
intervenção do Estado e o reconhecimento, por parte deste, de direitos sociais e políticos
para a classe operária.
A questão social se expressa pelo conjunto de desigualdades sociais
engendradas pelas relações sociais constitutivas do capitalismo
contemporâneo. Sua gênese pode ser situada na segunda metade do século
XIX quando os trabalhadores reagem à exploração de seu trabalho. Como
sabemos, no início da Revolução Industrial, especialmente na Inglaterra, mas
também na França vai ocorrer uma pauperização massiva desses primeiros
trabalhadores das concentrações industriais. (YAZBEK, 2008, p. 5)
No Brasil, a questão social nem sempre foi analisada como questão política:
[...] aparece escondida em meio a um processo de industrialização sob um
controle bem-articulado de importadores e empresários vinculados ao
capital estrangeiro. Permanece por várias décadas na ilegalidade; por isso
foi formulada como desordem, criminalizando o sujeito e enfrentada via
aparelhos repressivos do Estado (polícia civil, militar etc.), em resposta a
demanda por segurança. (ARCOVERDE, 2000, p. 76).
33
O próprio ex-presidente brasileiro Washington Luís, costumava afirmar que a
“Questão social é caso de polícia” durante seu governo, de cunho liberal no período de 1926 a
1930, e assim se defendia da postura adotada pelos movimentos sociais, que incomodavam
seu governo.
Apenas alguns anos mais tarde, entendeu-se que o enfrentamento às manifestações
da questão social deveria se dar por meio de intervenção do poder público.
Assim, a questão social passou a ser reconhecida enquanto uma questão política no
Brasil por volta dos anos de 1930, também pelo processo de industrialização, que se iniciou
em 1917, porém num período (100 anos depois da Europa), composto por uma realidade bem
diferente do período presenciado pelos europeus, já que aqui, recentemente, havia acabado a
escravidão (BEHRING; BOSCHETTI, 2007).
O país vive uma problemática concreta, formada por grandes massas
empobrecidas ainda em consequência da liberação dos escravos e agravadas
pelo intenso êxodo rural, pela forte imigração do início do século, pela
desqualificação e despreparo dos trabalhadores e pelo trabalho precário,
limitado e explorado da época. (MESTRINER, 2008, p. 68).
Originada pelos conflitos existentes na relação capital/trabalho, a questão social se
fazia presente como consequência de ser o Brasil um país de natureza capitalista e suas
manifestações podiam ser notadas em consequência da grande falta de igualdade aqui
presente.
Expressa o processo de “[...] formação e desenvolvimento da classe operária e de seu
ingresso no cenário político da sociedade, exigindo seu reconhecimento como classe por parte
do empresariado e do Estado.” (IAMAMOTO; CARVALHO, 1995, p. 77).
Isso se dá, pois o Brasil contou com um desenvolvimento desigual ao longo de sua
história, e, vive ainda hoje, um modelo econômico capitalista composto por marcas históricas
do momento em que o trabalho escravo foi substituído pelo trabalho livre4.
Pode-se dizer que a questão social se configura em “franjas da sociedade
capitalista”, ou seja, representa aqueles que foram excluídos dentro sistema capitalista.
No que tange à assistência social, Mestriner (2008), afirma que no período da
Primeira República (1989 – 1930) o Estado era um “Estado fraco” que não intervia, e neste
4
Segundo Behring e Boschetti (2007) esta realidade, marcada pela desigualdade, ganhou ênfase com o fim da
escravidão, momento em que o cenário brasileiro se compôs de diversas dificuldades para incluir esses libertos
ao mercado de trabalho. A maior influência deste período escravista, que se faz presente ainda hoje na história
de nosso país, pode ser encontrada nas condições de trabalho aqui existentes, as quais são marcadas pela
desqualificação.
34
caso, as ações de assistência social eram efetivadas por meio da igreja católica, sem qualquer
relação com o Estado republicano, que defendia a ideologia de que o social não era função
pública.
Desta forma, com o reconhecimento da questão social enquanto questão política, o
Estado lentamente passou a pensar sobre o papel que deveria desenvolver frente às
manifestações da questão social: “O Estado se vê na contingência de admitir sua
responsabilidade social para com os mais pobres, o que não estava na agenda liberal que
dominava o pensamento até então.” (MESTRINER, 2008, p. 68).
E assim, passou a pensar em leis, em garantias e na elaboração de políticas sociais
para intervir de forma mais explícita nas relações entre capital x trabalho.
O que se quer destacar, nesta linha argumentativa, é que o capitalismo
monopolista, pelas suas dinâmicas e contradições, cria condições tais que o
Estado por ele capturado, ao buscar legitimação política através do jogo
democrático, é permeável a demandas das classes subalternas, que podem
fazer incidir nele seus interesses e suas reivindicações imediatas. (PAULO
NETTO, 2001, p. 29).
Neste contexto, as políticas sociais tornaram-se o caminho para que a população
pudesse acessar os seus direitos: “[...] a Política Social Pública permite aos cidadãos acessar
recursos, bens e serviços sociais necessários, sob múltiplos aspectos e dimensões da vida:
social, econômico, cultural, político, ambiental entre outros.” (YAZBEK, 2008, p. 6).
Entretanto, a ideologia liberal do período não permitia que o Estado realizasse ações
de proteção social, afinal, “Proteger-se era questão do próprio indivíduo.” (MESTRINER,
2008, p. 69). Assim, os direitos, que estavam atrelados ao trabalho, foram destinados
inicialmente às categorias profissionais importantes para a economia extrativa da época,
pouco restando aos demais trabalhadores.
De acordo com Yazbek (2008), a aprovação da Lei Eloy Chaves em 1923 foi a chave
para a construção do formato da política social no Brasil, tendo sido esta legislação a
precursora de um sistema público de proteção social ao instituir a obrigatoriedade de criação
de Caixas de Aposentadoria e Pensão (CAPs) para algumas categorias estratégicas de
trabalhadores, a exemplo dos ferroviários, dos marítimos, entre outras categorias diretamente
ligadas à produção e comercialização do café.
Até então, a economia brasileira girava em torno de uma monocultura de exportação:
O café, que era responsável por cerca de 70% do PIB brasileiro, como explica Behring e
Boschetti:
35
Naquele momento o Brasil tinha uma economia basicamente fundada na
monocultura do café voltada para a exportação – eis aqui a base da nossa
heteronomia, produto responsável por cerca de 70% do PIB nacional. Por
isso os direitos trabalhistas e previdenciários foram reconhecidos para
aquelas categorias de trabalhadores inseridas diretamente nesse processo
de produção e circulação de mercadorias. (BEHRING; BOSCHETTI,
2007, p. 80).
A crise internacional de 1929-1932 trouxe transformações nas correlações de forças
dentro das classes dominantes. Isso aconteceu, pois a partir desta crise que paralisou o
mercado mundial, as oligarquias agroexportadoras cafeeiras tornaram-se frágeis, econômica e
politicamente, abrindo assim espaço para outras oligarquias, que até então estavam fora do
núcleo de poder político, como as oligarquias de gado, açúcar, entre outras (BEHRING;
BOSCHETTI, 2007)
Desta forma, chegou ao poder político, além de outras oligarquias agrárias, também o
setor industrialista, colocando então um ponto final na hegemonia cafeeira.
As mudanças que ocorreram após isso foram um tanto conservadoras, pois mesmo
com a existência de perspectivas de se obter um crescimento econômico – agora impulsionado
por diversas oligarquias agrárias e também pela indústria – por outro lado ficaram pendentes
ações que contribuíssem para a regulamentação do trabalho e a criação de meios de
enfrentamento para as manifestações da questão social.
Yazbek (2008) afirma que foi na primeira metade dos anos de 1930 que a questão
social se legitimou no Brasil, o que se deu a partir do desenvolvimento e organização da
classe operária e o do reconhecimento desta classe por parte do Estado e do setor empresarial.
Este reconhecimento impulsionou a ampliação da abordagem pública para com a questão
social, favorecendo a criação de novos mecanismos de intervenções nas relações sociais.
Ao reconhecer a “questão social”, o governo Vargas faz seu enquadramento
jurídico, intervindo no domínio das relações entre capital e trabalho. A
compreensão da natureza específica desta “questão” será colocada no
discurso governamental como dever do Estado nacional, que reconhece a sua
função de velar pelo bem-estar da sociedade e de proteger os mais fracos,
propiciando-lhes uma situação mais digna e humana (é claro de forma
ocasional e não universal). (YAZBEK, 2008, p. 74)
Conforme discute Couto et al. (2010), Getúlio Vargas, ao longo de seu mandato
presidencial (1930 a 1937) efetuou uma política de governo direcionada a organizar as
relações entre capital e trabalho e para isso criou logo no início do seu governo, em 1930 o
36
Ministério de Trabalho, com o objetivo de harmonizar as relações que envolvem o trabalho
substituindo o conceito de Luta de Classes pelo de Conciliação.
Neste período, através do Decreto 19.770, de 19 de março de 1931, foram instituídas
as condições para a formalização dos Sindicatos, os quais precisariam então da aprovação do
Ministério do Trabalho para funcionar.
Com o surgimento dos movimentos operários em 1935, Vargas passou a tomar
iniciativas políticas, investindo na formulação de legislações que pudessem regulamentar as
relações de trabalho no país e impulsionando a Construção do Estado Social (que mesmo
sendo inspirado em modelos internacionais, possuía mediações de características próprias).
Entretanto, de acordo com Yasbek (2008), o Brasil não chegou a alcançar a institucionalidade
de um Estado de Bem Estar Social.
Cabe aqui ressaltar, com base nos apontamentos de Couto et al. (2010), que o que
houve na verdade foi uma proposta de um Estado Social autoritário, que buscou se legitimar a
partir da efetivação de medidas e de benefícios de cunho regulatório e assistencialistas.
Assim, reconhecer a “questão social” e o direito à proteção social,
desatrelada do referencial “trabalho”, é quase impossível no pensamento
liberal. Ele é o eixo divisor e agregador, fazendo com que a matriz do
pensamento da assistência social, vista como amparo social privado, fique
imiscuída nesse modo de pensar. A persistência do componente liberal fará
com que se determine o equacionamento da assistência social, sempre tendo
como referência, de um lado, o trabalho e, de outro, o princípio da
subsidiariedade, que desresponsabiliza e libera o Estado dessa intervenção.
(MESTRINER, 2008, p. 73).
Seguiu-se a lógica do Seguro Social, e desta forma o acesso aos benefícios estava
atrelado à posição ocupacional, o que acabou privilegiando apenas os trabalhadores urbanos
com vínculo ao mercado formal de trabalho.
O trabalho, antes forma de escravidão, será enfocado no novo discurso
oficial como valor social. Passa a ser um direito e um dever do homem, uma
tarefa moral e um ato de realização, uma obrigação para com a sociedade e o
Estado e uma necessidade do próprio indivíduo. [...] Por meio dele o homem
conseguirá posição na sociedade e relacionamento com o Estado. E mais,
diferentemente do regime político anterior, pelo trabalho, a classe operária
será chamada a participar da emancipação econômica e dos destinos do país.
E, nesta ótica, o não trabalhador será estigmatizado e colocado como pária
do sistema, como não cidadão. (MESTRINER, 2008, p. 75).
A Constituição Federal de 1937 trouxe a necessidade do reconhecimento, por parte
do Estado, das categorias de trabalhadores – e também na criação da Consolidação das Leis
37
Trabalhistas (CLT), promulgada em 1943: “Estava, então, desenhada a arquitetura formallegal da relação do Estado com a sociedade civil, e que marcou profundamente o período
subseqüente de expansão fragmentada e seletiva das políticas sociais que segue até 1964.”
(BEHRING; BOSCHETTI, 2007, p. 108).
A Constituição de 1937, inclusive, abordava em seu artigo 136º, o trabalho enquanto
um dever de todos, tratando o não-trabalho como um crime. Desta forma, o Estado de
posicionou de forma punitiva, defendendo que aquele não trabalhava não merecia nenhuma
atenção do governo.
Partindo desta lógica, o Estado incentiva práticas marginais de atenção, baseadas na
lógica do clientelismo e do favor. Assim, a assistência social se afasta de qualquer
possibilidade de ser efetivada enquanto um direito e enquanto uma ação de proteção social e
passa a receber cada vez mais o incentivo para ser realizada por meio de benesses particulares
(MESTRINER, 2008).
Transformando as provisões que deveriam ser estatais em benesses
particulares, rebaixa a possibilidade e a qualidade desta atenção paralela que,
sempre insuficiente e precária, molda a cultura de que “para pobre basta
qualquer coisa pobre”. (MESTRINER, 2008, p. 107).
Neste contexto, o governo cria o Conselho Nacional de Serviço Social (CNSS), e
desta forma, além de incentivar a benemerência e a solidariedade, torna-se responsável por
ela, por meio de regulações específicas que controlavam as subvenções destinadas à
filantropia privada.
1.1 A Criação do Conselho Nacional de Serviço Social (CNSS) e da Legião Brasileira de
Assistência Social (LBA): Os primeiros passos para a presença da assistência social
nas intervenções do Estado
Por meio do Decreto-lei n. 525 de 01/07/1938, instituiu-se o Conselho Nacional de
Serviço Social (CNSS), com o intuito de controlar as ações da assistência social e romper com
o espontaneísmo. Pela primeira vez, de acordo com Sposati (1988, p. 107), introduziu-se “[...]
uma organização nacional e um saber no processo de ajuda [...].”
O CNSS, que passou a funcionar em parceria com o Ministério da Educação e Saúde,
tornou-se o responsável pela avaliação e decisão na concessão de auxílios e subvenções às
organizações da sociedade civil:
38
[...] formado por figuras ilustres da sociedade cultural e filantrópica e
substituindo o governante na decisão quanto às quais organizações auxiliar.
Transita, pois, nessa decisão, o gesto benemérito do governante por uma
racionalidade nova, que não chega a ser tipicamente estatal, visto que atribui
ao Conselho certa autonomia. Nesse momento, selam-se as relações entre o
Estado e segmentos da elite: homens (e senhoras) bons, como no hábito
colonial e do império, vão avaliar o mérito do Estado em conceder auxílios e
subvenções a organizações da sociedade civil. (MESTRINER, 2008, p. 58).
Mestriner (2008), ao recorrer a trechos de Atas do CNSS, traz algumas reflexões
acerca do funcionamento do Conselho, como por exemplo, o fato da utilização do termo
“amparo social” ao tratarem da assistência social, o que, segundo a autora, caracteriza a visão
de benemerência em relação às ações da assistência social.
Outra questão levantada pela autora está em torno do nome do Conselho: de “Serviço
Social” e não de “Assistência Social”, o que pode ser compreendido ao levarmos em
consideração uma possível relação com a área profissional de Serviço Social, emergente no
país naquele período. Entretanto, Mestriner (2008) expressa surpresa ao fato da não existir
nenhum assistente social em sua composição, destacando, ainda, uma possível negação à
assistência social por parte do serviço social:
[...] pela documentação disponível, não se percebe novas menções do CNSS
na histografia do Serviço Social, criado no momento do primeiro curso de
serviço social e com o qual parece não ter estabelecido nenhuma relação.
Pode ser que a atitude de negação da assistência social, típica do serviço
social por muitos anos, originou-se com o próprio surgimento da profissão.
(MESTRINER, 2008, p. 66).
Sposati et al. (2014), esclareceu que devido ao esforço de teorização do Serviço
Social, que lhe atribuiu cientificidade, uma dicotomia entre assistência social e as perspectivas
orientadoras das ações do Serviço Social foram instauradas.
São chamadas de assistência social as atividades de pronto-socorro, ou seja,
as de ajuda material ou financeira destinadas às populações com problemas
agudos de subsistência, em geral procedidas por voluntários ou auxiliares
sociais. Tais atividades passam a ser relegadas pelos profissionais do Serviço
Social, tanto pelo seu caráter paliativo e clientelístico, quanto pelas
limitações que traziam à afirmação do assistente social como profissional no
quadro institucional. (SPOSATI et al. 2014, p. 68).
Cabe destacar que nesse período a assistência social não era considerada uma política
social. Ao Estado cabia somente a responsabilidade de subsidiar as instituições privadas com
função de amparo social.
39
O CNSS foi, portanto, a primeira forma de presença da assistência social na
burocracia do Estado republicano brasileiro, ainda que na função subsidiária
de subvenção às organizações sociais que prestam amparo social. Assim,
atuou como uma forma pautada na ajuda ao setor privado, sem relação direta
com a população. (MESTRINER, 2008, p. 66-67).
Apesar de inovar com a instalação do CNSS em 1938, Vargas na verdade não traz a
responsabilidade para o setor público, pelo contrário, incentiva o amparo social privado e de
cunho filantrópico e considera a proteção social do âmbito privado e não público, reforçando
desta forma os mecanismos de clientelismo político.
De acordo com Behring e Boschetti (2007), que caracteriza o período entre 1930 –
1943, como sendo a introdução da Política Social no Brasil, a assistência começa a ter
características centralizadas, em âmbito federal, a partir de 1942, com a criação da Legião
Brasileira de Assistência (LBA).
Em 1942, buscando legitimidade junto à população pobre, o governo criou a
Legião Brasileira de Assistência (LBA), com o objetivo de assistir,
primeiramente, às famílias dos pracinhas que foram para a Guerra e logo
depois estender o seu trabalho à população pobre, principalmente com
programas na área materno-infantil. (COUTO et al., 2010, p. 103).
Com a criação da LBA, Vargas funda em nosso país o atrelamento do social às
intervenções do primeiro-damismo na figura de Darci Vargas e institui em nosso país uma
cultura que permanece presente ainda nos dias atuais.
A LBA representou o braço assistencialista do governo, que centrou na
figura da primeira-dama Darcy Vargas a coordenação da instituição. Este
traço clientelista e vinculado a benemerência apresentou-se persistente por
muitos anos na política assistencial brasileira. (COUTO et al., 2010, p. 103).
Desta forma, o papel do Estado passa a ser assumido por meio das ações das
organizações filantrópicas e através da “bondade” da primeira-dama. O governo passa a
incentivar, dentro do principio da subsidiariedade, o voluntariado, especialmente o feminino,
por meio das amigas da esposa do governante.
Outro aliado importante do governo neste período foi a Igreja Católica, por meio de
um “projeto de cristianização” da sociedade:
Segundo este projeto, a tarefa de recristianização deverá se dar pela redução
das distancias sociais, harmonização das classes em conflito, restabelecendo
entre elas relações de cooperação. Para tanto deverá livrar o proletariado de
lideranças negativas e ordenar as relações de produção a partir da
40
restauração “dos costumes cristãos”, que impeçam as explorações e a
ambição excessiva por riqueza. (MESTRINER, 2008, p. 109).
Nesse sentido à assistência social, destinou-se o papel de praticar o ajustamento
social, por meio da harmonização das classes em conflito e do incentivo aos hábitos de
trabalho. “A assistência social passa a servir de freio ao operariado, reforçando, nesse sentido,
a conduta de controle governamental.” (MESTRINER, 2008, p. 111).
Em 1945, Getúlio Vargas cai, neste período, segundo Behring e Boschetti (2007),
ocorrem diversas turbulências econômicas, sociais e políticas. O Brasil estava mais
urbanizado, e possuía um movimento popular e operário mais concentrado, com diversas
reivindicações a serem feitas.
A situação internacional, abalada pela Segunda Guerra Mundial, as novas
composições de poder, o movimento pela Constituinte, principalmente,
fazem ampliar as atividades políticas e sociais, criando uma cultura urbana
diferente e autenticamente nacional, fortalecendo, inclusive, as organizações
políticas de esquerda. Desta forma em 29 de outubro de 1945 Getúlio Vargas
é deposto por uma composição civil militar. (MESTRINER, 2008, p. 115).
O Presidente General Eurico Gaspar Dutra institui uma nova forma de relação com a
nação e promulga uma nova Constituição Federal em 1946, entretanto não leva o Estado a
atuar fortemente no setor econômico. Dutra admite a responsabilidade social do Estado e
direciona as ações, na área social, para a criação de macroorganismos sociais justificando que:
“Não bastam as organizações de benemerência e ação voluntária do primeiro-damismo. É
preciso um novo aparato social aliançado com a elite industrial emergente.” (MESTRINER,
2008, p. 117). Afinal, o Estado já havia consolidado a burguesia nacional, e então, neste
momento a burguesia tinha o dever de se apropriar também do social.
Desta forma, já no início do Governo de Dutra em 1946, O Serviço Nacional de
Aprendizagem do Comércio (SENAC), o Serviço Social do Comércio (SESC) e o Serviço
Social da Indústria (SESI) são criados com o objetivo de ofertar programas e projetos de
execução direta. Entretanto, conforme Mestriner (2008), não foi estabelecida uma política para
a área social ou para a filantropia, tão pouco se esclareceu a concepção de assistência social.
A assistência adquire, no discurso governamental, nova amplitude. Além dos
programas de pronto-socorro social, destinados aos hipossuficientes
economicamente, abarcará a prestação de serviços sociais básicos. [...] Estas
atividades destinavam-se a romper o ciclo de dependência e provocar a
integração de indivíduos e grupos no mercado de trabalho e a sociedade
vigente, com a subjacente promessa de ascensão socioeconômica.
41
Expandem-se a partir daí os programas de alfabetização de adultos,
formação de mão-de-obra, formação social e desenvolvimento comunitário.
(SPOSATI et al., 2014 p. 69).
A política social teve uma expansão lenta e seletiva nos próximos anos, devido ao
período composto por instabilidades institucionais, decorrentes do suicídio de Vargas (1954),
da renúncia de Jânio Quadros (1961) e até mesmo do Golpe Militar (1964), o que acabou
dificultando a criação de um projeto nacional que pensasse e repensasse a política social em
sua totalidade, deixando, então, um período composto por lentas expansões de direitos, os
quais continuaram no formato corporativista e fragmentado do governo de Vargas.
(BEHRING; BOSCHETTI, 2007).
Em meio à Ditadura Militar, ocorria no Brasil o “Fordismo à brasileira”, através do
conhecido Milagre Brasileiro, momento em que se expande no país a produção em massa de
eletrodomésticos e de automóveis para o consumo também em massa. A política social, por
sua vez, também se expandia, porém, conduzida de maneira tecnocrática e conservadora.
Conforme Behring e Boschetti (2007), ao mesmo tempo em que as políticas públicas,
apesar de restritas, eram impulsionadas, a ditadura também abria espaço para a educação,
saúde e previdências privadas, trazendo a dualidade no sistema de acesso, que se dividia entre
quem podia e quem não podia pagar pelos serviços.
A partir de 1974, o projeto tecnocrático conservador do regime militar começa a se
esgotar em decorrência dos impactos da economia internacional, ocasionado pelo
endividamento externo, que após o curto período do milagre brasileiro se transformou numa
grande crise econômica.
Na década de 1980, o regime começa a se abrir lentamente, dando espaço para uma
transição lenta em direção à conquista da democracia, o que foi possível a partir da população,
da sociedade:
Foi uma década pródiga em movimentos sociais e em participação da
sociedade, organizando-se, por meio de entidades, organizações não
governamentais (ONGs) e sindicatos, para participarem do movimento préConstituinte, bem como para denunciar o descumprimento das propostas por
parte do governo. Tanto que “os anos 80 foram marcados por uma notável
dinâmica associativa e organizativa que alterou o cenário político do país e
introduziu fissuras importantes no pesado legado autoritário brasileiro.
(COUTO, 2010, p. 137)
Esta organização da sociedade contribuiu para a construção de uma nova
Constituição, que pela primeira vez em nosso país, contou com a participação popular em sua
42
formulação. Desta forma em 05 de Outubro de 1988, ocorreu um marco para as políticas
sociais, que se deu com a promulgação da Constituição Federal do Brasil, a “Constituição
Cidadã” de 1988.
1.2 A Assistência Social sob a Ótica do Direito: O Caminho que está sendo trilhado na
Busca por sua Efetivação Enquanto Política Pública.
“A assistência social é uma velha prática, mas jovem política.”
(CARVALHO, 2006, p. 124).
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional
Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o
exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o
bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores
supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos,
fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e
internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob
a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA
FEDERATIVA DO BRASIL.” (BRASIL, 1988).
Em 1988, com a finalidade de se constituir um Estado Democrático, pautado nas
garantias dos direitos sociais e individuais, e tendo como valores supremos a liberdade, a
igualdade e a justiça social, foi promulgada uma nova Constituição em nosso país.
No que tange aos seus princípios fundamentais, a Constituição Federal de 1988
destaca logo em seu primeiro artigo, o princípio da Dignidade da Pessoa Humana e o
princípio da Cidadania, entre outros.
Segundo Pereira (2001), este artigo contribuiu para que os Direitos Fundamentais
ganhassem maior relevância ao longo do texto Constituinte, visto que a pessoa humana
passou a ser tratada como um valor primordial.
A Constituição Federal, também conhecida como Constituição Cidadã, representou
um grande marco para as políticas públicas no Brasil, dando início a um processo de
mudanças e de avanços na questão dos direitos, principalmente os direitos sociais, os quais
foram elencados em seu Artigo 6º:
Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho,
a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à
maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta
Constituição. (BRASIL, 1988).
43
Ao compreender que a Constituição Federal avança em relação aos direitos sociais, é
importante considerar que todas estas conquistas só foram possíveis a partir de embates
políticos e também por ações realizadas por protagonistas sociais na busca pela efetivação dos
atendimentos de suas necessidades e demandas.
Os direitos do homem são direitos históricos, que emergem gradualmente
das lutas que o homem trava por sua própria emancipação e das
transformações das condições de vida que essas lutas reproduzem [...]
enquanto direitos históricos, eles são mutáveis, ou seja, suscetíveis de
transformação e de ampliação. (BOBBIO, 1992, p. 36).
Desta forma é possível destacar que os direitos não são dádivas, tampouco (desculpa,
corrigi errado da última vez) concessões ou doações de poderosos, mas sim respostas
estratégicas utilizadas por estes, frente às novas circunstâncias histórico-sociais, conforme
explica Nogueira:
Os direitos, porém, não são uma dádiva, nem uma concessão. Foram
‘arrancados’ por lutas e operações políticas complexas. [...] não são uma
doação dos poderosos, mas um recurso com o qual os poderosos se adaptam
às novas circunstâncias histórico-sociais, dobrando-se com isso,
contraditoriamente, às exigências e pressões em favor de mais vida
civilizada. (NOGUEIRA, 2004, p. 2).
Nesse sentido, os Direitos se constituem enquanto produto das lutas sociais entre a
população e o poder, na busca pelo reconhecimento legal das necessidades sociais.
[...] a questão dos direitos espelha o mundo em que vivemos, com suas
injustiças, suas desigualdades, seus dilemas e suas contradições. A luta por
direitos, quando devidamente politizada nos coloca de novo, o tempo todo,
no olho do furacão, ou seja, no terreno dos conflitos, das lutas sociais, e
acaba por nos animar a brigar por uma ordem social justa, sem miséria, sem
exclusões e sem desigualdades (NOGUEIRA, 2004, p. 11-12).
Pereira (2008) destaca a importância da mobilização social diante de todas estas
conquistas, uma vez que proporcionou a possibilidade da criação desta nova Constituição, que
foi formulada com o objetivo de viabilizar a cidadania e o bem-estar a todos os cidadãos
através da garantia do atendimento de suas necessidades básicas para uma vida digna:
[...] graças à mobilização da sociedade, as políticas sociais tornaram-se
centrais, nessa década, na agenda de reformas institucionais que culminou
com a promulgação da Constituição Federal de 1988. Nesta Constituição, a
reformulação formal do sistema de proteção social incorporou valores e
44
critérios que, não obstante antigos no estrangeiro, soaram, no Brasil como
inovação semântica, conceitual e política. Os conceitos de “direitos sociais”,
“seguridade social”, “universalização”, “equidade”, “descentralização
político-administrativa”, “controle democrático”, “mínimos sociais”, dentre
outros, passaram, de fato, a constituir categorias-chaves norteadoras da
constituição de um novo padrão de política social a ser adotado no país.
(PEREIRA, 2008, p. 152).
Abre-se, então, espaço para a construção de um sistema de proteção social nunca visto
até então em nosso país:
[...] a Constituição de 1988 apontava para a construção – pela primeira vez
assim posta na história brasileira – de uma espécie de Estado de bem-estar
social: Não é por acaso que, no texto constitucional, de forma inédita em
nossa lei máxima, consagram-se explicitamente, como tais e para além de
direitos civis e políticos, os direitos sociais (coroamento, como se sabe, da
cidadania moderna). Com isto, colocava-se o arcabouço jurídico-político
para implantar, na sociedade brasileira, uma política social compatível com
as exigências de justiça social, equidade e universalidade. (PAULO NETTO,
1999, p. 77)
A esse respeito, Boschetti e Salvador (2009, p. 52), afirmam que:
As reivindicações e pressões organizadas pelos trabalhadores na década de
1980, em período de redemocratização no país, provocam a incorporação,
pela Constituição Federal (CF), de muitas demandas sociais de expansão dos
direitos sociais e políticos. Um dos maiores avanços dessa Constituição, em
termos de política social, foi a adoção do conceito de seguridade social,
englobando em um mesmo sistema as políticas de saúde, previdência e
assistência social. [...].
Assim, foi estabelecida a concepção de seguridade social:
Art.194 º. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações
de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os
direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.
Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a
seguridade social, com base nos seguintes objetivos:
I – universalidade da cobertura e do atendimento;
II – uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações
urbanas e rurais;
III – seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços;
IV – irredutibilidade do valor dos benefícios;
V – equidade na forma de participação no custeio;
VI – diversidade da base de financiamento;
VII – caráter democrático e descentralizado da administração, mediante
gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos
empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados.
(BRASIL, 1988).
45
O sistema de Seguridade Social, que por definição constitucional é integrada pelas
políticas de Saúde, Previdência Social e Assistência Social, expressa as necessidades
prioritárias de nosso país. Este sistema é uma segurança de que o risco que o indivíduo venha
correr não seja apenas um problema individual, mas sim responsabilidade do Estado. Cabe
aqui destacar que todos os demais direitos previstos na Constituição Federal são de
responsabilidade estatal, no entanto, a seguridade torna-se prioritária.
A seguridade social surge sob a primazia da responsabilidade do Estado, com o
objetivo de dar um sentido amplo à área social, a partir da ampliação dos direitos sociais.
Estabelece a Saúde enquanto universal, sendo direito de todos e dever do Estado; a
Previdência Social enquanto sistema de proteção ao trabalhador e sua família, por meio de
prévia contribuição do trabalhador e de toda sociedade, sendo de caráter redistributivo sob
garantia do Estado; e, a Assistência Social como dever do Estado, devendo ser prestada a
quem dela necessitar, sem necessidade de prévia contribuição.
Assim, é possível afirmar que a política de seguridade social proposta tem
como concepção um sistema de proteção integral do cidadão, protegendo-o
quando no exercício de sua vida laboral, na falta dela, na velhice e nos
diferentes imprevistos que a vida lhe apresenta, tendo para a cobertura
ações contributivas para com a política previdenciária e ações não
contributivas para com a política de saúde e de assistência social. (COUTO
et al. 2010, p. 159).
Em relação à Assistência Social, o tema central deste estudo, há muito a que se
destacar, uma vez que a Constituição Federal abriu as portas para a possibilidade de sua
efetivação enquanto política pública e proporcionou aparato legal para o rompimento com o
assistencialismo tão presente até então nas ações da assistência social no Brasil.
Inserida no campo dos direitos, da universalização dos acessos e da
responsabilidade estatal, iniciando um processo que tem como horizonte
torná-la visível como política pública e direito dos que dela necessitarem.
Sem dúvidas um avanço. Ao permitir que a assistência social, assim posta,
transite do assistencialismo clientelista para o campo da Política Social.
Como política de Estado, passa a ser campo de defesa e atenção dos
interesses dos segmentos mais empobrecidos da sociedade. (YAZBEK,
1995, p. 10).
A inclusão da Assistência Social no sistema de Seguridade Social demarca o início
de um percurso em busca da efetivação da implementação dos direitos, da universalização dos
acessos e da responsabilidade estatal:
46
[...] configura-se como possibilidade de reconhecimento público da
legitimidade das demandas de seus usuários, espaço de seu protagonismo e
exige que as provisões assistenciais sejam prioritariamente pensadas no
âmbito das garantias de cidadania sob vigilância do Estado, cabendo a este
a universalização da cobertura e garantia de direitos e de acesso para os
serviços, programas e projetos sob sua responsabilidade. (BRASIL, 2008,
p. 95).
Porém, um ponto importante a ser discutido encontra-se na dicotomia existente entre
o anúncio do Direito e a sua materialização, uma vez que a existência de garantias legais na
Carta Magna e até mesmo a criação de um Sistema de Seguridade Social não podem ser
considerados suficientes para podermos afirmar que em nosso país todo o cidadão tem os seus
direitos sociais garantidos, assim como a concretização da garantia da dignidade da pessoa
humana.
O instrumento legal, por si só, não dá conta de impor o novo nessa relação.
Esse novo é estabilizado pelo movimento social, pelas reivindicações dos
trabalhadores, pela presença das classes subalternas na luta por verem
reconhecidos seus interesses. Esse novo o tempo todo está se debatendo com
o velho. (COUTO, 2010, p. 57).
Este contexto, onde o novo debate-se com o velho, pode ser compreendido ao
retomarmos as bases históricas da assistência social no âmbito da sociedade capitalista. A
assistência social sempre encontrou resistência para se legitimar enquanto um direito social,
por estar em constante conflito com as formas capitalistas da organização do trabalho.
É muito antiga, tensa e não resolvida a relação entre o (não) trabalho e a assistência
social enquanto política pública. Ivanete Boschetti, ao refletir sobre os limites à efetivação do
direito à assistência social, nos apresenta que as primeiras expressões desta relação
conflituosa se deram no século XVII com a Lei dos Pobres.
A primeira, Lei dos Pobres, instituída em 1662, caracterizava uma clara
oposição entre trabalho e assistência. A assistência era garantida mediante
dois critérios: domicílio e incapacidade ao trabalho. Como mostra Polanyi,
(1980, p.90), sob esta lei, “os pobres eram forçados a trabalhar com qualquer
salário que pudessem conseguir e somente aqueles que não conseguiam
trabalho tinham direito a assistência social; nunca se pretendeu e nem se
concedeu qualquer assistência sob a forma de abono salarial”. O princípio
fundante desta lei era estimular o trabalho como fonte de renda.
(FERREIRA, 1999 p. 67, grifo do autor).
47
A assistência social tinha como lógica induzir o trabalhador a se manter por meio do
próprio trabalho, não se discutia sobre as condições de trabalho, nem mesmo sobre
remuneração, a ideia que prevalecia era a de que o trabalho deveria ser a fonte de renda.
A relação conflituosa entre trabalho e assistência, que se expressou por meio da Lei
dos Pobres, teve outro momento importante a partir da Lei de Speenhamland, criada na
Inglaterra, no século XVIII:
A [...] Lei de Speenhamland, instituída em 1795, ao contrário da Lei dos
Pobres, é tida como uma medida assistencial de proteção ao trabalho, ou
mais precisamente à forma de organização tradicional de trabalho. A lei
garantia um sistema de abonos, em complementação aos salários, cujo valor
baseava-se no preço do pão. (FERREIRA, 1999, p. 68, grifo do autor).
Esta lei apresentava diferenças importantes em relação à Lei dos Pobres, pois garantia
a assistência aos trabalhadores, independente das condições de moradia ou de incapacidade,
sendo “[...] considerada como a primeira iniciativa de estabelecimento legal de uma política
assistencial garantidora de um sistema de abono salarial para trabalhadores, ou o que se
denominaria hoje de renda mínima.” (FERREIRA, 1999, p. 68, grifo do autor).
De acordo com a autora, o sistema de abonos instituído pela Lei de Speenhamland,
que assegurava uma renda mínima “[...] introduziu uma inovação social e econômica que
nada mais era que o ‘direito de viver’ e, até ser abolida, em 1834, ela impediu efetivamente o
estabelecimento de um mercado de trabalho competitivo.” (FERREIRA, 1999, p. 68, grifo do
autor).
Esta segurança do “direito de viver”, marcava a primeira medida de proteção à vida
por meio dos cofres públicos, porém, estava na contra mão dos pilares do Liberalismo:
Afinal, por que alguém trabalharia por um salário se pudesse viver da
assistência? Essa pergunta sustentou um dos principais pilares do
liberalismo: o princípio moral de que assistência estimula o ócio, a preguiça
e desestimula o trabalho, devendo ser abolida, ou garantida apenas para os
pobres incapazes de manter sua sobrevivência pelo trabalho: crianças, idosos
e deficientes. (FERREIRA, 1999, p. 68).
Assim, a revogação da Lei de Speenhamland em 1834, determinou o predomínio da
lógica liberal, que apresentava o trabalho como exclusiva fonte de renda, deixando sob
responsabilidade da filantropia, todas as ações de assistência aos pobres.
Ferreira (1999) nos apresenta que estes foram os princípios que nortearam a criação
das políticas sociais nos países capitalistas a partir do final do século XIX, tendo sido também
48
incorporado pelo Sistema de Seguridade Social brasileiro, especialmente no que tange às
políticas de previdência e assistência social:
É consenso que a seguridade social fundamenta-se em duas lógicas de
proteção social – assistência e seguros sociais –, ou o que poderíamos
denominar de complexo previdenciário-assistencial. Em relação aos
benefícios que garantem complementação e/ou substituição de renda, este
complexo estabelece uma clivagem entre os trabalhadores considerados
como capazes e/ou aptos ao trabalho e os cidadãos incapacitados de exercer
um trabalho: crianças, pessoas idosas e portadores de deficiência.
(FERREIRA, 1999, p. 68).
Outro ponto importante a ser discutido, ao refletirmos sobre a efetividade do sistema
de seguridade social pode ser pautado nos pensamentos de Vianna (1998), que discute a
efetividade da seguridade social em nosso país, ressaltando que este sistema, mesmo
instituído pela Constituição Federal enquanto um conjunto integrado de ações do Estado e da
Sociedade, foi regulamentado por legislações específicas e em momentos distintos para cada
uma das áreas que a constituem.
Desta forma, surgiram legislações que criaram caminhos específicos para cada uma
das áreas, segmentando o tripé da seguridade social composto pela Saúde, Assistência Social
e Previdência Social, do ponto de vista da estrutura administrativa, dificultando, portanto, a
efetivação concreta de um sistema de Seguridade Social no Brasil.
Não garantiu a efetivação concreta de um sistema de Seguridade Social [...].
Progressivamente, efetivou-se a segmentação das áreas [...] e do ponto de
vista da estrutura administrativa, portanto, a seguridade não tem existência
formal. Pode-se também afirmar sua inexistência formal do ponto de vista do
financiamento. (VIANNA, 1998, p. 142 apud BOSCHETTI, 2009, p. 10).
Então, a proposta inicial da Seguridade Social, de redirecionar as políticas de saúde,
previdência e assistência de forma articulada com predomínio da lógica social não aconteceu:
Ao contrário, caminhou na direção do fortalecimento da lógica do contrato, o
que levou Vianna (1998) a caracterizá-la como “americanização perversa”,
visto que, em sua análise, o sistema público foi se “‘especializando’ cada vez
mais no (mau) atendimento dos muito pobres”, ao mesmo tempo em que “o
mercado de serviços médicos, assim como o de previdência, conquista
adeptos entre a classe média e o operariado” (VIANNA, 1998, p. 142 apud
BOSCHETTI, 2009, p. 10).
49
Viana (1998) acredita em uma “americanização (perversa) da Seguridade Social”,
destacando que o país incorporou padrões norte-americanos de Proteção Social:
Algumas das características sociais e políticas que nos EUA impedem
arranjos neocorporativos [...] estão claramente presentes no Brasil. O regime
presidencialista com seus conflitos latentes entre Executivo e Legislativo, a
estrutura partidária fraca e pouco enraizada na sociedade, entidades de
representações de grupos sociais segmentadas, com baixa capacidade de
interlocução, e uma disseminada cultura do privatismo, por exemplo, se
alinham como prováveis componentes de um quadro análogo ao americano,
e, pois, bastante favorável à prática lobista. (VIANNA, 1998, p. 107)
Nesse sentido, Vianna (1998, p. 111) discute sobre a chamada “crise” do Sistema de
Proteção Social no Brasil, destacando a importância de nos atentarmos a sua origem:
[...] no fato de sua orientação legal ser inspirada no chamado modelo
socialdemocrata, de caráter mais universalista, e sua vertente pragmática, ao
contrário, seguir uma tendência mais liberal, de origem norte-americana, que
estimula os indivíduos a se auto protegerem.
Desta forma, podemos compreender que à medida que o Sistema de Proteção Social
brasileiro segue a tendência norte-americana, acaba se distanciando do modelo de Walfare
State europeu:
A americanização mencionada supõe que as provisões públicas fiquem para
os pobres, e que o mercado se encarregue da oferta de proteção aos que
dispõe de alguma renda para compra-la. É a face privatista e liberalizante de
uma opção econômica e política que impõe a um desenho universalista um
perfil seletivo e escorchante. (VIANNA, 1988, p. 111).
Os desafios para a efetivação do Sistema de Seguridade Social brasileiro também
podem ser compreendidos ao analisarmos o contexto socioeconômico vivenciado pelo Brasil
no período da Promulgação da Constituição Federal vigente, marcado pela inserção do
modelo neoliberal:
[...] inclui (por definição) a informalidade no trabalho, o desemprego, a
desproteção trabalhista e, consequentemente, uma “nova” pobreza. Ao
contrário, portanto, do que se afirma, a reprodução em condições críticas de
grandes parcelas da população faz parte do modelo, não impedindo a
reprodução do capital. (SOARES, 2002, p.12).
50
Evidenciando, desta forma, uma profunda incompatibilidade entre ajustes estruturais
da economia e investimentos sociais do Estado, conforme discute Couto et al. (2010, p.34):
Pois, se por um lado os avanços constitucionais apontam para o
reconhecimento dos direitos e permitem trazer para a esfera pública a
questão da pobreza e da desigualdade social, transformando
constitucionalmente esta política social em campo de exercício de
participação popular, por outro, a inserção do Estado brasileiro na
contraditória dinâmica e impacto das políticas econômicas neoliberais coloca
em andamento processos desarticuladores, de desmontagem e retração de
direitos e investimentos no campo social.
O Governo Collor, dando início ao projeto neoliberal no Brasil no início dos anos de
1990, realizou suas ações com base nas orientações dos organismos internacionais, entre estes
o Consenso de Washington5 que objetivava ações que limitassem a intervenção do Estado e
obstruíssem a efetivação dos novos direitos sociais:
Ou seja, é na “contra mão” das transformações que ocorrem na ordem
econômica internacional, tensionado pela consolidação do modelo
neoliberal, [...] com a sua direção privatizadora e focalizadora das políticas
sociais [...] que devemos situar o início do difícil processo de construção da
Seguridade Social Brasileira. (COUTO et al., 2010, p. 35).
No que diz respeito à Assistência Social, a Constituição Federal de 1988 em seu
artigo 203º apresenta os seus objetivos:
Art. 203º. A assistência social será prestada a quem dela necessitar,
independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
I - a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;
II - o amparo às crianças e adolescentes carentes; III - a promoção da
integração ao mercado de trabalho; IV - a habilitação e reabilitação das
pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida
comunitária; V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à
pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir
meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família,
conforme dispuser a lei. (BRASIL, 1988).
Porém, é possível afirmar que, mesmo após ser garantida enquanto um direito social
e ter seus objetivos expostos na Constituição Federal de 1988, encontrou resistência por parte
5
Reunião realizada em novembro de 1989 entre os presidentes eleitos da América Latina e os representantes do
Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional e Banco Interamericano de Desenvolvimento, que entre as
reformas de cunho liberal prevê a realização de reformas estruturais para a estabilização da economia como as
privatizações, desregulamentação dos mercados, a descentralização e a retomada do desenvolvimento.
(COUTO et al., 2010, p. 35).
51
do Governo Federal para ser regulamentada e então inserida no campo das políticas sociais do
Estado, tanto que o caminho por essa regulamentação iniciou-se no governo de Sarney,
perdurou pelo governo de Collor, sendo efetivada apenas no governo de Itamar Franco. O
projeto-lei que instituía a LOAS tramitou por mais de dois anos até que fosse aprovado.
O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), enquanto responsável pela
regulamentação do Sistema de Seguridade Social, direcionou em 1989 ao Núcleo de Estudos
e Pesquisas em Política Social da Universidade de Brasília (NEPPOS/CEAM/UNB) a tarefa
de elaborar o primeiro projeto de regulamentação da assistência social (BOSCHETTI, 2006).
Mas, havia interesses políticos e econômicos opostos a este projeto. A Secretaria
Nacional de Assistência Social do Ministério da Previdência e Assistência Social (MPAS)
apresentavam interesse em reduzir a assistência social, por receio de que a assistência
absorvesse os recursos destinados à previdência social e um grupo de funcionários da LBA,
na busca pela continuidade do poder desta instituição em apontar os rumos da assistência
social, além da busca pela garantia de seus empregos, opuseram-se ao projeto de
regulamentação da assistência social (BOSCHETTI, 2006).
O governo de Sarney nem mesmo apresentou o projeto ao Congresso Nacional.
Collor, por sua vez, ignorou os direcionamentos constitucionais de tal forma, que em seu
mandato, favoreceu a manutenção da LBA, nomeando a sua esposa como presidente da
instituição. Em seu governo, as repostas às manifestações da questão social foram pautadas no
clientelismo, por meio de subvenções direcionadas à LBA (BOSCHETTI, 2006).
De acordo com Mestriner (2008), um debate sobre a situação da assistência social foi
iniciado nas universidades e ganhou forças também no seio da categoria profissional dos
assistentes sociais.
O Conselho Federal de Serviço Social (CFESS), juntamente com a categoria
profissional, começou a problematizar a questão, discutindo de forma mais ampla sobre o
papel do Estado e das políticas sociais. Assim, a assistência social passou a ser compreendida
enquanto um espaço contraditório, porém possível de concretizar direitos.
Historicamente utilizada como instrumento de clientelismo, de controle, de
adaptação e de integração social, ela foi, por longo tempo, recusada como
prática social. Foi só a partir de meados dos anos 80 que ela passou a ser
analisada como espaço contraditório e concebida como possível campo de
concretização de direitos sociais. A partir de 1988 os assistentes sociais se
interessaram pelo debate sobre a assistência social, dedicando-se mais
sistematicamente a ele e se engajando nos movimentos pela regulamentação
dessa área. (BOSCHETTI, 2006, p. 165).
52
Uma nova proposta de lei foi elaborada em 1989, a partir de debates realizados no I
Simpósio de Assistência Social, realizado na Câmara Federal entre 30/05/1989 e 01/06/1989.
Entretanto, em novembro de 1990, por meio de uma mensagem ao Senado, Collor vetou o
projeto integralmente, justificando a ausência de recursos para a efetivação de auxílio às
famílias e da implementação do benefício de prestação continuada (MESTRINER, 2008).
No ano de 1991, a assistência social voltou a surgir nas pautas do legislativo e o
projeto retoma sua forma original (elaborada pela IPEA/UNB). Diversas discussões foram
realizadas pela categoria profissional dos assistentes sociais e um seminário nacional sobre a
assistência social realizou-se em Brasília no mês de junho do ano de 1991, intitulado:
“Impasses e perspectivas da Assistência Social no Brasil”
Debatem-se questões conceituais sobre o tema, fazendo fluir as tendências
“focalistas” e “universalistas”, questões relacionadas à descentralização com
proposituras relativas à organização e gestão, definindo o papel
normatizador da União e a necessidade do comando único. (MESTRINER,
2008, p. 202-203).
Neste mesmo período, veio à tona um escândalo envolvendo a LBA, quando a primeira-dama
e presidente da instituição Rosane Collor, desviou verbas milionárias para as mãos de parentes.
Após alguns meses de gestão, em início de setembro de 1991, em duas
reportagens devastadoras, o Jornal do Brasil publica todos os desmandos
perpetrados pela mesma, comprovados por documentos oficiais, obtendo
com isso sua demissão dias depois: inúmeros favorecimentos a empresas
instituições-fantasmas, por meios dos quais fez jorras as verbas federais para
mãos de parentes. (MESTRINER, 2008, p. 204).
Desta forma, os próprios funcionários da LBA, também passaram a compor a luta
pela regulamentação da assistência social.
Em dezembro de 1992, Collor sofre o impeachment e Itamar Franco assume a
presidência do Brasil. E, quase um ano mais tarde, em outubro de 1993, aprovou-se por fim,
uma proposta para a Lei Orgânica de Assistência Social. Entretanto, de acordo com Boschetti
(2009) isso só foi possível por meio de conciliações com os interesses do governo e
incorporação de sugestões dos parlamentares.
Assim, a regulamentação do artigo 203, só se efetivou cinco anos mais tarde, com a
publicação da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) Lei n. 8742, de 07 de dezembro de
1993, que “[...] é um documento juspolítico [...] que expressa no seu conteúdo aparentemente
53
neutro toda a gama de discussões que caracterizaram a história da Assistência Social.”
(PEREIRA, 1998, p. 69-70).
Art. 1º A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política
de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais,
realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e
da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas.
(BRASIL, 1993)
A aprovação da LOAS estingue o antigo CNSS (1938-1993), de acordo com Yazbek
(2004a, p. 13) “órgão clientelista e cartorial” e:
Cria os Conselhos Municipais, Estaduais e Nacional de Assistência Social,
órgãos paritários, com representação do governo e da sociedade civil
(entidades, usuários e trabalhadores do setor) aos quais compete: aprovar a
política de assistência social, a proposta orçamentária para a área, normatizar
as ações e regular a prestação de serviços de natureza publica e privativa no
campo da Assistência Social e convocar a cada dois anos as conferencias de
Assistência Social, que tem como atribuição avaliar a situação da assistência
e propor diretrizes para seu aperfeiçoamento.
A partir de então, constituída enquanto política de Estado, a assistência social passa a
ser:
[...] um espaço para defesa e atenção aos interesses e necessidades sociais
dos segmentos mais empobrecidos da sociedade, configurando-se também,
como estratégia fundamental no combate à pobreza, à discriminação e à
subalternidade econômica, cultural e política em que vive grande parte da
população brasileira. (BRASIL, 2008, p. 95).
A LOAS assegura a política de mínimos sociais, nela prevista, através da implantação
do Benefício de Prestação Continuada (BPC):
Art. 2º. Inciso V - A garantia de 1 (um) salário mínimo de benefício mensal
à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
(BRASIL, 1993).
Prevê em suas diretrizes a construção da Assistência Social enquanto um sistema
descentralizado e participativo:
Para a implementação dessa mudança fundamental, a Assistência Social
não pode ser pensada isoladamente, mas na relação com outras políticas
sociais e em conformidade com seu marco legal no qual está garantida a
54
descentralização com a primazia do Estado, o comando único em cada
esfera do governo e a gestão compartilhada com a sociedade civil pelos
Conselhos, Conferências e Fóruns, em seu planejamento e controle.
(BRASIL, 2008, pag. 95)
A LOAS, ao estabelecer a descentralização político-administrativa enquanto
estratégia fundamental para a gestão da Assistência Social, traz avanços para a concepção de
assistência social conhecida até então, através da redefinição das funções dos governos
federal, estadual e municipal, direcionando “[...] ao Estado o papel decisivo no enfrentamento
da pobreza, de par com a sociedade.” (PEREIRA, 1998, p. 74), o que, conforme a discussão
de Vianna (2003, p. 105), pressupõe a visão de Proteção Social referenciada à universalidade
de cobertura:
Esse caráter de responsabilidade social do Estado para com os seus cidadãos
pressupõe uma visão de Proteção Social que tenha como referência a
universalidade de cobertura e de atendimento, em oposição à padrões
restritivos e seletivos de acesso a serviços e benefícios sociais.
Os desafios frente ao sistema neoliberal continuaram presentes, mesmo com a criação
da LOAS em 1993, que apesar de abordar sobre os princípio e as diretrizes da Assistência
Social, por si só, ainda não foi
suficiente para direcionar mudanças no âmbito da
consolidação da Assistência Social enquanto um direito do cidadão e responsabilidade do
Estado, prova disso encontramos ao refletirmos sobre a aprovação da primeira Política
Nacional de Assistência Social que se deu apenas no ano de 1998 (cinco anos após a
publicação da LOAS e 10 anos após a promulgação da Constituição Federal, que estabeleceu
a assistência social enquanto direito social).
A aprovação desta Política Nacional, por sua vez, não trouxe mudanças, afinal,
confrontava o Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC), que havia instituído por meio da
Medida Provisória n. 813, o Programa Comunidade Solidária no ano de 1995, programa este
que, ignorando todos os direcionamentos da LOAS, se efetivou com ações de caráter focalista e
tornou-se ao longo do governo FHC a principal estratégia de enfrentamento à pobreza no país.
Longe de ser fato episódico ou perfumaria de primeira dama, opera como um
alicate que desmonta as possibilidades de formulação da Assistência Social
como política pública regida pelos princípios universais dos direitos e da
cidadania: impede prescrições constitucionais que viabilizariam integrar a
Assistência Social em um Sistema de Seguridade Social, passa por cima dos
instrumentos previstos na LOAS, desconsidera direitos e conquistas e
esvazia as mediações democráticas construídas. (TELLES, 2004, p. 19).
55
A lógica do Programa Comunidade Solidária fragilizou qualquer possibilidade de
implantar na Política de Assistência Social os padrões de gestão estabelecidos na LOAS.
Na verdade, podemos afirmar que contribuiu para uma reiteração da Assistência Social
enquanto um dever moral e de base solidária, afastando-a do previsto na Constituição Federal,
que a definia enquanto um direito conquistado através das lutas por uma sociedade
democrática.
1.3 Discussões e Reflexões: A Busca pela Organização da Assistência Social no Brasil
No seio da categoria profissional dos assistentes sociais, juntamente com os estudiosos
da política social, muitas reflexões e muitas discussões foram realizadas sobre a conjuntura na
qual estava posta a assistência social no Brasil.
Ivanete Boschetti, ao proferir uma palestra na III Conferência Estadual de Assistência
Social, realizada em Campo Grande - MS, em 16 de dezembro de 1999, trouxe elementos
importantes, no que tange aos desafios daquele período (ou por que não, ainda atuais) para a
consolidação da assistência como direito social. Cabe destacar, que ao tratar dos desafios, a
mesma ressaltou a importância de não serem entendidos como desestímulo à defesa da
assistência social, mas, pelo contrário, no sentido de contribuir para uma leitura objetiva das
dificuldades, no intuito de construir possibilidades concretas de ação.
Em relação aos direitos assistenciais os seguintes desafios foram apontados:
[...] devem constar na agenda daqueles que se colocam na defesa da política
de assistência social, os seguintes itens: · a garantia da primazia do Estado
no financiamento e execução da política assistencial; · respeito aos critérios
de necessidades locais para formulação de benefícios, programas, projetos e
serviços; · a ampliação da capacidade de atendimento da demanda; · a
regulamentação dos benefícios eventuais e dos benefícios de prestação
continuada; · planejamento da política de assistência de modo articulado às
demais políticas sociais e · a consideração ao processo de elaboração dos
planos municipais e estaduais como um momento de participação cidadã e
como estratégia de resposta coletiva às necessidades sociais. (FERREIRA,
1999, p. 73).
E, em relação à organização e à gestão:
[...] é preciso: garantir o comando único em cada esfera de governo;
estabelecer uma relação de efetiva co-responsabilidade com organizações
não governamentais, e não de transferência de responsabilidade; · reforçar a
democracia participativa, ou seja, reforçar a autonomia dos conselhos,
garantindo-os como espaço de acompanhamento, controle e reivindicação;
56
· acompanhar o trabalho das comissões bipartites e tripartites para que não se
transformem em espaços de esvaziamento dos conselhos; · fomentar a
participação dos usuários nos conselhos e · fortalecer os fóruns de defesa
da assistência social como espaços concretos de socialização de informações
e articulação da sociedade civil. (FERREIRA, 1999, p. 73).
Carmelita Yazbek6, ao participar do XX Ciclo de Debates do Serviço Social,
promovido pelo Hospital das Clínicas da UNICAMP no ano de 2003, discutiu sobre os 10
anos de tentativa da construção de um projeto para a Assistência Social, a partir da LOAS de
1993 e questionou sobre a identificação histórica da assistência social com a filantropia, que a
seu ver ainda não havia sido superada:
A primeira constatação é que nesses 10 anos, que foram 10 anos de
questionamento do clientelismo, do padrão de gestão conservadora dessa
política e da identificação histórica da assistência social com a filantropia,
ainda me parece que essa é uma questão não superada na assistência social.
A tendência a ver a assistência social como ação filantrópica, assistencialista
e tuteladora ainda é um objeto de questionamentos e reivindicações nas
Conferências Municipais e nas Conferências Estaduais em andamento. O
que estamos percebendo é que o protagonismo da população vem sendo
muito pouco colocado nesse processo. A luta continua e na verdade sua
grande tendência ainda é lutar para que o reconhecimento do direito seja a
medida da negociação e da liberação no campo dessa política. Não há outra
medida ainda. Nossa luta é para que o direito seja a medida. Não dá para
negociar direito, esta luta então continua. (YAZBEK, 2004b, p. 27).
Destacou a focalização das ações da assistência social, encarando-a enquanto umas das
características que contribuíram para a efetivação de uma renovação desta política.
Uma outra constatação nesses 10 anos e que foi observada nas três
Conferências de Assistência Social anteriores é a presença da perspectiva
focalista dessa política que acompanhou 10 anos do governo Fernando
Henrique e que não se rompeu. A assistência social ainda é uma política
focalizada, seletiva, pobre para o pobre. Os critérios de seleção e avaliação
ainda permanecem muito focalizados nos mais pobres, nos mais vulneráveis,
o que vem restringindo projetos mais renovadores e/ou criativos para essa
política. (YAZBEK, 2004b, p. 27-28).
E expressou a importância da criação de um Sistema Unificado de Assistência Social:
Tal e qual foi apresentado hoje aqui em relação à saúde sobre o SUS que
deve ser construído a cada dia, o sistema descentralizado e participativo de
assistência social no país exige ainda a organização de um SUAS (Sistema
Unificado de Assistência Social) como parte do processo de construção de
mecanismos públicos de regulação e de controle para esta área. Como é que
6
Mesa Redonda: XX Ciclo de Debates do Serviço Social do Hospital das Clínicas da UNICAMP, 2003.
57
nós vamos fiscalizar e acompanhar? Como é que nós vamos criar
parâmetros, sobretudo lembrando que o parâmetro é o direito. Não tem outra
medida de negociação dos interesses dessa população que é uma população
sem voz, que não existe. (YAZBEK, 2004b, p. 28).
Por fim, afirmou acreditar que a IV Conferência Nacional de Assistência Social seria
fundamental para que mudanças pudessem acontecer:
Nós passamos 10 anos construindo um projeto para área da Assistência
Social no país. E, na atual conjuntura vemos esse projeto emperrar e pior,
aos poucos ser substituído por uma visão conservadora sobre a assistência
social, sobre as famílias pobres, culpando-as pela sua pobreza. Ou seja,
aquilo que se construiu ao longo de 10 anos, parece estar em uma posição
bastante complicada. Esse ano nós temos a IV Conferência Nacional de
Assistência Social e eu acho que esta Conferência vai ser crucial do ponto de
vista da nossa sociedade civil organizada que deverá colocar claramente as
suas posições. (YAZBEK, 2004b, p. 27).
Muito do que estava sendo discutido pelos estudiosos da política social no Brasil, nos
próximos anos, com o governo Lula, começou a ganhar espaço na agenda política.
Com o objetivo de romper com as ações que até então vinham sido desenvolvidas e
redesenhar a Política de Assistência Social no Brasil, em 23 de janeiro de 2004 foi criado o
Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), “[...] responsável pela
política nacional de assistência social com ênfase na integração entre serviços e benefícios
socioassistenciais e as ações de segurança alimentar e nutricional.” (BRASIL, 2008, p. 17).
De acordo com Lopes (2006, p.80):
[...] a criação do MDS pretendeu alterar a situação até então vivida pelas
políticas de proteção social no Brasil, que existiam sem lócus institucional
próprio e limitadas à implantação de poucas e fragmentadas ações,
desarticuladas, de baixa cobertura e reduzida efetividade social, centralizadas
nacionalmente e desrespeitando a realidade e as necessidades locais e com o
parco e pulverizado orçamento [...]. O MDS constituiu-se pela decisão de
possibilitar integrar áreas estratégicas para o cumprimento do plano de
governo no que diz respeito às políticas de combate á pobreza [...].
Neste mesmo ano, o MDS juntamente com a Secretaria Nacional de Assistência Social
(SNAS)7 e Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS)8 elaborou e aprovou a Política
7
8
Secretaria Nacional de Assistência Social (SNAS) é o órgão do Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate à Fome (MDS) responsável pela gestão nacional da Política Nacional de Assistência Social.
O Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) foi instituído pela Lei Orgânica da Assistência Social –
LOAS (Lei 8742, de 07 de dezembro de 1993), como órgão superior de deliberação colegiada, vinculado à
estrutura do órgão da Administração Pública Federal responsável pela coordenação da Política Nacional de
Assistência Social.
58
Nacional de Assistência Social – a qual foi construída a partir de discussões que ocorreram
em todos os Estados brasileiros, por meio de fóruns e conferências.
A decisão do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome –
MDS, por intermédio da Secretaria Nacional de Assistência Social – SNAS
e do Conselho Nacional de Assistência Social - PNAS, demonstra a
intenção de construir coletivamente o redesenho desta política, na
perspectiva de implementação do Sistema Único de Assistência Social –
SUAS. Esta iniciativa, decididamente, traduz o cumprimento das
deliberações da IV Conferência Nacional de Assistência Social, realizada
em Brasília, em dezembro de 2003, e denota o compromisso do
MDS/SNAS e do CNAS em materializar as diretrizes da Lei Orgânica da
Assistência Social – LOAS. (BRASIL, 2009a, p. 11).
Conforme já previa Yazbek (2004b), a IV Conferencia Nacional de Assistência
realizada em Brasília em dezembro de 2003 foi de suma importância para que a assistência
social ganhasse novos rumos no patamar nacional. Uma nova Política Nacional de Assistência
Social (PNAS), em conformidade com as propostas presentes nas deliberações da IV
Conferencia Nacional de Assistência realizada em Brasília em dezembro de 2003 foi
aprovada em 22 de setembro de 2004 pelo CNAS, com o objetivo de materializar os
princípios e diretrizes da LOAS, mantendo a descentralização político-administrativa, a
participação popular e a primazia da responsabilidade do Estado na condução da política de
assistência social.
Diante do importante desafio de implantar a PNAS no Brasil e organizar a efetivação
das ações da assistência social em todo o território nacional um instrumento-chave foi
elaborado enquanto estratégia para a viabilização desta política de proteção social: O Sistema
Único de Assistência Social (SUAS).
No dia 15 de julho de 2005 o CNAS aprovou a Norma Operacional Básica da
Assistência Social (NOB/SUAS) e instituiu o SUAS.
A partir de então, uma nova configuração para a Assistência Social foi colocada em
pauta, o SUAS, que tem como eixos estruturantes a matricialidade sócio-familiar; a
descentralização político-administrativa e a territorialização, direciona a implantação da
Política de Assistência Social em todo o território nacional, considerando as particularidades
territoriais e tendo como principal foco a realização de ações que viabilize a garantia dos
direitos sociais e proporcione a proteção social e o fortalecimento dos vínculos familiares e
comunitários a todo o público usuário da Assistência Social.
59
Inicia-se então, um percurso pela busca da organização da assistência social em todo o
território nacional, com o objetivo de efetiva-la enquanto política pública e enquanto um
direito social garantido Constitucionalmente.
Recentemente, no ano de 2011, temos a mais atual conquista: a criação e aprovação da
Lei nº 12.435, que alterou a Lei nº 8.742 de 1993 – LOAS e instituiu legalmente o SUAS,
garantindo no ordenamento jurídico brasileiro a permanência e continuidade das conquistas
efetivadas ao longo dos últimos anos.
Apresentaremos a seguir, nossas reflexões acerca dos direcionamentos dados pela
Política Nacional de Assistência Social de 2004 e pelo SUAS, relacionando este conteúdo
normativo com a realidade regional da DRADS de Fernandópolis, em especial no que tange à
proteção social básica, mais especificamente ao papel desempenhado pelos Centros de
Referência de Assistência Social (CRAS) no processo de implantação/implementação desta
política pública.
60
CAPÍTULO 2 O UNIVERSO DA PESQUISA: AS PARTICULARIDADES DA DRADS
DE FERNANDÓPOLIS
As Diretorias Regionais de Assistência e Desenvolvimento Social – DRADS têm entre
as suas atribuições o papel de monitorar e avaliar as ações sociais desenvolvidas pelos
municípios do Estado de São Paulo.
São Paulo conta atualmente com o funcionamento de 26 DRADS que funcionam como
órgãos descentralizados, garantindo assim, maior cobertura da presença do Governo Estadual
em todo o território do Estado.
A DRADS de Fernandópolis, que realiza a cobertura de parte da região noroeste
paulista, conta com a presença de 49 municípios referenciados.
Conforme Brasil (2009a), o SUAS deverá pautar-se na territorialização para formular
suas intervenções, tomando como referência a caracterização dos grupos territoriais a partir de
uma definição dos municípios também utilizada pelo IBGE.
Município de Pequeno Porte:
[...] aquele cuja população chega a 20.000 habitantes (até 5.000 famílias em
média). Possuem forte presença de população em zona rural, correspondendo
a 45% da população total. [...] possuem como referência municípios de
maior porte, pertencentes a mesma região em que estão localizados.
Necessitam de uma rede simplificada e reduzida de serviços de proteção
social básica, pois os níveis de coesão social, as demandas potenciais e redes
socioassistenciais não justificam serviços de natureza complexa. Em geral,
esses municípios não apresentam demanda significativa de proteção social
especial [...]. (BRASIL, 2009a, p. 45).
Município de Pequeno Porte 2:
[...] aquele cuja população varia de 20.001 a 50.000 habitantes (cerca de
5.000 até 10.000 famílias em média). Diferenciam-se dos pequeno porte 1
especialmente no que se refere à concentração da população rural que
corresponde a 30% da população total. Quanto às suas características
relacionais mantém-se as mesmas dos municípios pequenos 1. (BRASIL,
2009a, p. 45-46).
Municípios de Médio Porte:
[...] aqueles cuja população está entre 50.001 e 100.000 habitantes (cerca de
10.000 a 25.000 famílias). Mesmo precisando contar com a referência de
municípios de grande porte para questões de maior complexidade, já
possuem mais autonomia na estruturação de sua economia [...]. Esses
61
municípios necessitam de uma rede mais ampla de serviços de assistência
social, particularmente na rede de proteção social básica. Quanto a proteção
especial, a realidade de tais municípios se assemelha a dos municípios de
pequeno porte, no entanto, a probabilidade de ocorrerem demandas nessa
área é maior, o que leva a se considerar a possibilidade de sediarem serviços
próprios dessa natureza ou de referência regional, agregando municípios de
pequeno porte no seu entorno. (BRASIL, 2009a, p. 46).
Municípios de Grande Porte:
[...] aqueles cuja população é de 101.000 habitantes até 900.000 habitantes
(cerca de 25.000 a 250.000 famílias). São mais complexos na sua
estruturação econômica, pólos de regiões e sedes de serviços mais
especializados. Concentram mais oportunidades de emprego [...]. [...] por
congregarem o grande número de habitantes e, pelas suas características em
atraírem grande parte da população que migra das regiões onde as
oportunidades são consideradas mais escassas, apresentam grande demanda
por serviços de várias áreas de políticas públicas. Em razão dessas
características, a rede socioassistencial deve ser mais complexa e
diversificada, envolvendo serviços de proteção social básica, bem como uma
ampla rede de proteção especial ( nos níveis de média e alta complexidade).
(BRASIL, 2009a, p. 46).
Metrópoles:
Entende-se por metrópole os municípios com mais de 900.000 habitantes
(atingindo uma média superior a 250.000 famílias cada). Para além das
características dos grandes municípios, as metrópoles apresentam o
agravante dos chamados territórios de fronteira, que significam zonas de
limite que configuram a região metropolitana e normalmente com forte
ausência dos serviços do Estado. (BRASIL, 2009a, p. 46).
No caso da DRADS de Fernandópolis, o território é formado majoritariamente por
municípios pequenos. A região não conta com a presença de nenhum município de Grande
Porte ou Metrópole, como podemos observar no Gráfico 1 a seguir:
62
Gráfico 1 – Porte dos Municípios
Fonte: DRADS (2015).
A Norma Operacional Básica do SUAS – NOB/SUAS esclarece que a Gestão
Municipal do SUAS pode se dar no âmbito de 03 níveis, sendo eles: Gestão Inicial, Gestão
Básica e Gestão Plena.
A Gestão Inicial, conforme (BRASIL, 2009a, p.99) deve ser o nível de gestão dos
municípios que não se habilitarem à Gestão Básica ou à Gestão Plena, Estes, “receberão
recursos da União, conforme série histórica, [...] por intermédio do Fundo Nacional de
Assistência Social.”
A Gestão Básica cabe ao município que assume a gestão da proteção social básica da
assistência social em seu território:
[...] devendo o gestor, ao assumir a responsabilidade de organizar a proteção
básica em seu município, prevenir situação de risco por meio do
desenvolvimento de potencialidades e aquisições. Por isso, deve
responsabilizar-se pela oferta de programas, projetos e serviços
socioassistenciais que fortaleçam vínculos familiares e comunitários que
promovam os beneficiários do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e
transferência de renda e que vigiem direitos violados no território. (BRASIL,
2009a, p. 99-100).
E, inserem-se na Gestão Plena os municípios que assumem a gestão total das ações de
Assistência Social no seu território de abrangência:
O gestor, ao assumir a responsabilidade de organizar a proteção social básica
e especial em seu município, deve prevenir situações de risco, por meio do
desenvolvimento de potencialidades e aquisições, além de proteger as
situações de violação de direitos ocorridas em seu município. Por isso deve
63
responsabilizar-se pela oferta de programas, projetos e serviços que
fortaleçam vínculos familiares e comunitários, que promovam os
beneficiários do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e transferência de
renda; que vigiem os direitos violados no território; que potencializem a
função protetiva das famílias e a auto organização e conquista de autonomia
de seus usuários. (BRASIL, 2009a, p. 100).
Na região da DRADS de Fernandópolis, identificamos que uma grande maioria dos
municípios encontram-se no nível de Gestão Básica do SUAS, o que certamente pode ser
compreendido ao consideramos o número de municípios de pequeno porte neste região, que
desenvolvem apenas a gestão da proteção social básica em seus territórios de abrangência.
Destacamos ainda, que apenas um município ainda não se habilitou para a Gestão Básica ou
Plena, permanecendo portanto na Gestão Inicial
Gráfico 2 – Nível de Gestão do SUAS
Fonte: DRADS (2015).
2.1 Os Municípios de Pequeno Porte I Referenciados na DRADS de Fernandópolis.
Considerando ser os municípios de Pequeno Porte I o foco desta pesquisa, realizamos
junto à DRADS de Fernandópolis, uma pesquisa documental que nos permitiu conhecer
algumas particularidades da gestão do SUAS nos municípios de Pequeno Porte I desta região.
Esclarecemos que os dados nos foram disponibilizados no dia 24 de Agosto de 2015,
entretanto, são referentes a um estudo realizado no mês de abril de 2015.
64
Dentre os 49 municípios referenciados à DRADS de Fernandópolis, 45 municípios são
de Pequeno Porte I. Destes, 44 municípios estão em nível de Gestão Básica e 01 município
encontra-se em nível de gestão inicial.
Em relação ao Órgão Gestor da Política de Assistência Social destes municípios, foi
possível identificar estruturas administrativas diversificadas, com a presença de Secretarias,
Coordenadorias, Departamentos, Diretoriais, Seções/Setores e Divisão.
Grafico 3 – Estrutura Administrativa do Órgão Gestor da Política de Assistência Social
Fonte: DRADS (2015).
De acordo com o conteúdo da Constituição Federal de 1988 materializado na LOAS,
estabeleceu-se a diretriz da descentralização político-administrativa para a organização da
assistência social e garantindo o comando único das ações em cada esfera do governo.
(BRASIL, 2009a).
Entretanto, de acordo com o estudo realizado pela equipe da DRADS esta não vem
sendo uma realidade concreta, pois, dos 45 municípios de pequeno porte I, 33% deles contam
com a existência de mais de um cargo para desenvolver o papel da gestão, como por exemplo:
Gestor, Secretário, Diretor, Chefe de Setor, entre outros. Há municípios com 02 destes cargos
e também municípios com 03 destes cargos, o que na verdade se configura na inexistência do
comando único.
Em relação ao nível de escolaridade dos gestores municipais, identificamos que a
maioria deles possui nível superior, entretanto, existem gestores sem formação universitária.
65
Gráfico 4 – Nível Escolaridade dos Gestores
Fonte: DRADS (2015).
Entre os gestores que possuem nível superior, destacamos ainda um vasto leque de
formações, entre as quais, algumas que não contemplam o quadro de profissionais do SUAS.
Gráfico 5 – Formação Universitária dos Gestores
Fonte: DRADS (2015).
66
A Resolução n. 17 de 20 de junho de 2011, publicada pelo CNAS, delibera sobre o
quadro de profissionais do SUAS:
Art. 3º - São categorias profissionais de nível superior que,
preferencialmente, poderão compor a gestão do SUAS: Assistente Social;
Psicólogo;
Advogado;
Administrador;
Antropólogo;
Contador;
Economista; Economista Doméstico; Pedagogo; Sociólogo; Terapeuta
ocupacional. (MDS, 2011).
Sendo assim, é possível destacar a presença de gestores graduados em nutrição, letras,
jornalismo, historia e ciências biológicas, que se encontram em desacordo com o perfil de
profissionais solicitado pelo SUAS.
Direcionando o nosso estudo para a equipe dos CRAS, apresentamos o perfil dos
coordenadores:
Gráfico 6- Perfil dos Coordenadores dos CRAS
Fonte: DRADS (2015).
Como podemos observar, 60% dos CRAS não contam com o perfil de coordenador
estabelecido pela NOB-RH/SUAS:
As equipes de referência para os Centros de Referência da Assistência Social
- CRAS devem contar sempre com um coordenador, devendo o mesmo,
independentemente do porte do município, ter o seguinte perfil profissional:
ser um técnico de nível superior, concursado, com experiência em trabalhos
comunitários e gestão de programas, projetos, serviços e benefícios
socioassistenciais. (BRASIL, 2009b, p. 19).
67
Elencamos a seguir os motivos pelos quais estes coordenadores não estão cumprindo o
estabelecido pela NOB-RH/SUAS:
Gráfico 7 – Situações que não atendem os pressupostos da NOB-RH/SUAS
Fonte: DRADS (2015).
De acordo com o Gráfico 7, podemos observar que entre os CRAS que não possuem o
perfil de coordenador exigido pela NOB-RH/SUAS, uma parcela significativa (33%) estão
em discordância por nem mesmo contarem com a figura do coordenador na composição das
equipes, seguido pela presença de 15% municípios que indicaram profissionais não efetivos
para assumir o cargo de coordenação e de 22% dos CRAS com o coordenador cumprindo
jornada de trabalho semana inferior à 40 horas. O gráfico nos apresenta ainda que 30% dos
CRAS contam com coordenadores que possuem formação universitária incoerente com o
quadro de profissionais do SUAS,
Apresentamos a seguir a formação universitária dos coordenadores dos CRAS.
68
Gráfico 8 – Formação Universitária dos Coordenadores CRAS
Fonte: DRADS (2015).
Como é possível visualizar, um pouco mais da metade dos CRAS contam com um
assistente social desenvolvendo a função de coordenador (53%), entretanto há um índice
considerável de municípios que contrataram profissionais que não contemplam o quadro de
profissionais do SUAS para realizar esta função.
No que tange ao vinculo empregatício dos profissionais que compõem a equipe dos
CRAS, identificamos que 11% dos trabalhadores destes municípios ainda não são
funcionários efetivos, ou seja, ainda há municípios que não realizaram concurso público para
contratação da equipe mínima do CRAS.
Por fim, elencamos na Tabela 1, as defasagens encontradas na composição das equipes
dos 45 CRAS de pequeno porte I referenciados na DRADS de Fernandópolis.
Tabela 1 – Defasagens na equipe mínima dos CRAS
Defasagens na equipe mínima do CRAS
Ausência do coordenador
Ausência do assistente social
Apenas um técnico de nível superior
Nenhum técnico de nível superior
Apenas um técnico de nível médio
Nenhum técnico de nível médio
Equipe mínima completa - de acordo com a NOB-RH/SUAS
Fonte: DRADS (2015).
Qtd
9
4
8
2
18
3
6
%
20%
9%
18%
4%
40%
7%
13%
69
Somente seis (06) CRAS encontram-se em consonância com os pressupostos da NOBRH/SUAS no que tange a composição da equipe mínima, o que significa um índice de apenas
13%.
Entre as defasagens, destacamos as que apresentam os maiores índices, sendo elas:
40% dos CRAS contam com a presença de apenas 01 técnico de nível médio na equipe; 20%
dos CRAS realizam suas atividades sem a presença de um coordenador na equipe e; 18%
contam com apenas um técnico de nível superior na equipe.
Com base nos documentos disponibilizados, foi possível elaborar um panorama sobre
o processo da implantação do SUAS na região da DRADS de Fernandópolis, especialmente
no que tange ao perfil dos gestores da política de assistência social e da composição das
equipes dos CRAS dos municípios de pequeno porte I.
Este retrato aqui apresentado, nos leva a refletir sobre como são amplos os desafios
para a implantação do SUAS, que está neste ano completando uma década.
Vivenciamos um período de avaliar o Plano Decenal 2005-2015 elaborado a partir dos
resultados da V Conferência Nacional de Assistência Social em 2003. Naquela oportunidade,
milhares de pessoas se uniram para elaborar uma proposta, um plano com metas que deveriam
ser alcançadas dentro dos próximos 10 anos.
O Plano Nacional da Assistência Social, projetando a operação da política
para 10 anos, resulta, portanto, do envolvimento de milhares de pessoas num
processo de planejamento participativo de grande escala, o que lhe confere
um caráter singular na história inovadora do planejamento brasileiro.
Deliberações como essa fluem de um processo consistente de
amadurecimento que reflete sólidos compromissos ligados à urgência de
uma política de assistência social de natureza pública, superando o caráter
mais imediatista no patamar de reivindicações. (BRASIL, 2007, p. 10).
No que tange à gestão do trabalho, as metas para o Plano Decenal, foram elaboradas
com base no seguinte objetivo:
Investir na gestão do trabalho na Assistência Social e na proposição de
mecanismos reguladores da relação entre gestores e trabalhadores e os
prestadores de serviços socioassistenciais visando influenciar decisivamente
a profissionalização do setor, a desprecarização do trabalho das equipes de
referências e a conseqüente melhoria dos serviços socioassistenciais
prestados à população. (BRASIL, 2007, p. 57).
Sendo assim, os municípios teriam 10 anos, a partir de 2005, para se adequarem aos
direcionamentos do Sistema Único de Assistência Social. No caso do conteúdo aqui discutido,
70
teriam uma década para realizarem concursos públicos para a efetivação da equipe do CRAS,
para adequarem o perfil dos profissionais da assistência social ao quadro de profissionais do
SUAS, para garantirem o comando único na gestão da politica de assistência social municipal
e para garantirem a presença da equipe mínima em todos os CRAS.
Entretanto, de acordo com a realidade apresentada, podemos identificar que o
cumprimento destas metas continuam sendo um desafio, este objetivo do Plano Decenal ainda
não foi alcançado nos municípios de pequeno porte I desta região.
Realidade esta que nos leva a refletir sobre como esta política pública ainda precisa
avançar e sobre como os governantes ainda precisam lapidar seus olhares no que tange à
politica de assistência social, de forma que possam compreender que recursos humanos e
perfil profissional adequado são requisitos mínimos para a efetivação de uma política pública
de qualidade.
Esta realidade precisa ser considerada ao direcionarmos nosso olhar ao resultado da
análise das informações adquiridas a partir da realização dos grupos focais com as equipes de
04 CRAS desta região: Macaubal, Populina, Riolândia e Rubinéia, que serão apresentados a
seguir.
2.2 Macaubal, Populina, Riolândia e Rubinéia: Recortes do Noroeste Paulista
Com o intuito de realizar um estudo do processo de implementação do SUAS nos
municípios de pequeno porte I, referenciados na DRADS de Fernandópolis, localizada na
região do noroeste paulista, selecionamos, de acordo com a localização geográfica, quatro
municípios para compor o universo desta pesquisa.
Realizamos um quadrante do mapa da DRADS de Fernandópolis e optamos por
selecionar um município de cada quadrante, garantindo desta forma, a representatividade da
região como um todo, conforme apresentamos na figura 1.
71
Figura 1 – Mapa da DRADS de Fernandópolis
Fonte: SEDS.
Macaubal
Primeiramente denominado Macaúbas, este distrito foi crido por meio da Lei Estadual
de nº 2338 em 28 de dezembro de 1928, no município de Monte Aprazível. Apenas alguns
anos mais tarde, por meio da Lei Estadual nº 233 de 24 de dezembro de 1948 o mesmo foi
elevado à categoria de município, desmembrando-se de Monte Aprazível e passou a ser
denominado de Macaubal.
Macaubal possui, de acordo com o IBGE, uma estimativa de 8.006 habitantes,
conforme dados publicados em 28 de agosto de 2014 no Diário Oficial da União e conta com
uma área territorial de 248,125 km².
Populina
Tornou-se um povoado com a chegada das primeiras familias por volta de 1915, mas
apenas 28 mais tarde passou a ser conhecida como a Vila da Populina. A vila foi se
72
desenvolvendo e tornou-se o Distrito da Paz de Populina vinculado ao Município de Estrela
D’Oeste. O município de Populina foi instaruado somente em 1º de janeiro de 1960 através da
Lei nº 5.285 de 18 de Fevereiro de 1959.
Conforme dados do IBGE publicados no ano de 2014, estima-se que Populina tem
uma população de 4.284 habitantes, tendo 315.938 km² de área territorial,
Riolândia
Região indígena, estas terras passaram a receber familias paulistas após a pacificação
dos indios no final do século XX. Em março de 1935 criou-se o Distrito de Paz, pertencente
ao município de Olimpia, o nome do distrito foi alterado em 1944 para Veadinho do Pôrto e
por fim em 1953 passou a ser Município, obtendo a denominação atual – Riolândia.
Riolândia conta com uma área territorial de 613.902 km² e uma estimativa de 11.600
habitantes em 2014, de acordo com os estudos do IBGE.
Rubinéia
Rubinéia surgiu a partir da doação das terras do casal Rubem e Néia, que tinham o
sonho de erguer uma cidade. Os primeiros moradores chegaram por volta de 1951. No ano
seguinte, por contar com mais de 600 eleitores, tornou-se Distrito de Santa Fé do Sul e anos
mais tarde foi emancipada politicamente, tornando se o Município de Rubinèia pela Lei nº
8092 de 28 de Fevereiro de 1964.
O município possui uma estimativa de 3039 habitantes (2014), de acordo com o IBGE
e tem como área territorial 242.877 km².
Para apresentarmos a conjuntura atual destes municípios, suas evoluções ao longo dos
anos e compará-las com as realidades estadual e nacional, recorremos ao Atlas do
Desenvolvimento Humano no Brasil e selecionamos os principais indicadores de demografia,
educação, renda, trabalho e vulnerabilidade, com dados extraídos dos Censos Demográficos
de 1991, 2000 e 2010.
O Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil é um instrumento destinado aos
gestores, à sociedade civil como um todo e aos pesquisadores de diversas áreas do
conhecimento, com o objetivo de subsidiar o conhecimento de um território específico, o
mapeamento dos principais desafios e oportunidades territoriais, além de estimular a
participação social dos cidadãos brasileiros, a partir do acesso à informação (PNUD; IPEA;
FJP, 2013).
Desta forma, com base no Atlas (PNUD; IPEA; FJP, 2013), iniciamos a análise da
conjuntura socioeconômica pela expectativa de vida ao nascer. De acordo com as informações
apresentadas no gráfico 1, podemos identificar que todos os municípios apresentaram, entre
73
os anos de 1991 e 2010, um crescimento em relação ao número médio de anos que as pessoas
viverão a partir do nascimento.
Gráfico 9 – Esperança de vida ao nascer
Fonte: PNUD, IPEA e FJP (2013).
Ao considerarmos as informações da pesquisa de 2010, verificamos que, comparados
a média nacional de 73,9 anos, apenas o município de Populina encontra-se com uma média
abaixo da nacional, com 73,3 anos. Já o índice estadual, o qual corresponde a 75,7 anos, é
superior a média de anos de todos os municípios pesquisados, sendo Macaubal e Rubinéia os
municípios que mais se aproximam da média estadual.
Em relação à taxa de fecundidade, ou seja, ao número de filhos que cada mulher
deverá ter ao terminar o período reprodutivo, que é entendido entre os 15 e 49 anos de idade
(PNUD; IPEA; FJP, 2013), podemos observar no gráfico 2 que todos os municípios
apresentaram uma queda entre os anos de 1991 e 2010.
74
Gráfico 10 – Taxa de fecundidade total
Fonte: PNUD, IPEA e FJP (2013).
Ao realizarmos uma comparação entre os municípios, nota-se que o município de
Riolândia apresentou a maior taxa de fecundidade ao longo dos anos, e que, mesmo tendo
apresentado a maior queda em termos absolutos, caindo de 3,5 em 1991 para 2,4 em 2010,
continua com a maior média de filhos por mulher.
Ao compararmos estes dados com a realidade estadual e nacional, observamos que os
municípios de Populina com 2,2 e Riolândia com 2,4, de acordo com a pesquisa de 2010,
apresentam uma taxa de fecundidade superior a media estadual de 1,7 e nacional de 1,9, em
contraposto, os municípios de Macaubal e Rubinéia apresentam uma taxa de fecundidade
inferior a média nacional, e uma taxa bem próxima a média estadual, estando Macaubal com a
mesma taxa do Estado e Rubinéia com uma taxa inferior.
No que se refere à taxa de analfabetismo, conforme pode ser observado no gráfico 3,
ocorreu uma redução da taxa de analfabetismo para a população com 18 anos de idade ou
mais entre os anos de 1991 e 2010. Entretanto, as taxas de analfabetismo ainda presentes nos
municípios pesquisados, de acordo com a pesquisa de 2010, são superiores a taxa de
analfabetismo do Estado de São Paulo que apresenta um índice de 4,5%.
75
Gráfico 11 – Taxa de analfabetismo da população de 18 anos ou mais de idade
Fonte: PNUD, IPEA e FJP (2013).
As taxas de analfabetismo mais altas encontram-se nos municípios de Populina e
Riolândia, ambos com um índice de 13,8%, superior inclusive ao índice nacional, que se
encontra em 10,2%.
Os municípios de Macaubal e Rubinéia contam em 2010 com o índice de 8,3% e 7,4%
respectivamente, ambos inferiores ao índice nacional (10,2%).
De acordo com o gráfico 3, podemos identificar que o Estado de São Paulo encontrase com um nível de taxa de analfabetismo (4,5%) bastante inferior à media nacional (10,2%),
porém, em contraposição, identificamos que no
caso dos municípios estudados, os
percentuais estão mais próximos da média nacional.
No que tange ao percentual de pessoas com nível superior completo, identificamos no
gráfico 4, que os municípios estudados apresentaram ao passar dos anos, crescimento no
percentual de pessoas com nível de superior completo, porém de acordo com as informações
do Atlas
(PNUD; IPEA; FJP, 2013, o porcentual destes municípios são inferiores ao
porcentual do Estado de São Paulo e do Brasil.
76
Gráfico 12 – Percentual da população de 25 anos ou mais de idade com nível de
escolaridade de ensino superior completo
Fonte: PNUD, IPEA e FJP (2013).
As informações apresentadas apontam o Estado de São Paulo com uma porcentagem
elevada de pessoas com nível superior completo (15,1%) ao compararmos a porcentagem de
abrangência nacional (11,3%).
Destacamos, ainda, assim como ocorre em relação à realidade do nível de
analfabetismo, os pequenos municípios visitados encontram-se novamente em desvantagem
ao serem comparados com a realidade estadual e nacional, o que revela uma questão de
vulnerabilidade no que tange à educação nesta região.
Rubinéia é o município que apresenta o percentual mais alto (10,3%) de pessoas com
25 anos ou mais com nível superior completo, tendo apresentado um crescimento
considerável desde 1991, quando apresentava um percentual 4,6%,
Na sequência, temos o município de Populina, que apresentou inclusive o maior índice
de crescimento, com um percentual de 3,5% em 1991 e uma ascensão para 9,4% em 2010.
Macaubal, em 1991, apresentava o maior percentual (4,9%), porém, não acompanhou
o crescimento dos municípios de Populina e Rubinéia, apresentando em 2010 um percentual
de 7,6%.
Riolândia, por sua vez, apresenta o menor percentual relativo à pessoas com ensino
superior completo (5,9%), tendo apresentado uma trajetória interessante, de baixo
crescimento, ou até mesmo retrocesso ao longo dos anos, apresentando em 1991 o percentual
de 3,7%, tendo uma pequena recaída no ano 2000, apresentando um percentual de 3,2 e por
fim, apresentando um crescimento nos próximos anos até o ano de 2010.
77
O Índice de Gini é um cálculo utilizado para medir a desigualdade social segundo a
renda domiciliar per capta. De acordo com o Atlas (PNUD; IPEA; FJP, 2013) “Seu valor
varia de 0, quando não há desigualdade (a renda domiciliar per capita de todos os indivíduos
tem o mesmo valor), a 1, quando a desigualdade é máxima (apenas um indivíduo detém toda a
renda)”.
Gráfico 13 – Índice de Gini
Fonte: PNUD, IPEA e FJP (2013).
Com base no gráfico 5, é possível identificar que o Índice de Gini apresentou uma
queda ao longo dos anos (entre 1991 e 2010), o que representa uma diminuição gradativa da
desigualdade social em todos os municípios visitados. Com base na pesquisa de 2010, temos o
município de Rubinéia com o menor índice (0,39), seguido por Riolândia (0,40), Populina
(0,41) e Macaubal (0,43).
Identificamos, ainda, que estes municípios apresentam índices de desigualdade social
menores que os índices do Estado de São Paulo e do Brasil. O Brasil, apresenta o índice de
gini de 0,60, enquanto o Estado de São Paulo apresenta um índice de 0,56, tendo portanto um
índice de desigualdade social inferior a média nacional.
O gráfico 6 nos apresenta os índices proporcionais à população extremamente pobre,
representados pelas pessoas com a renda per capta domiciliar igual ou inferior à R$70,00 no
mês de agosto de 2010.
78
Gráfico 14 – Proporção dos extremamente pobres
Fonte: PNUD, IPEA e FJP (2013).
Conforme os dados apresentados, podemos identificar que o Estado de São Paulo
possui uma proporção de pessoas extremamente pobres de 1,2%, inferior à média nacional,
que se encontra em 2010 com 6,6%.
Os municípios estudados acompanham a média estadual, apresentando dados
proporcionais de pessoas extremamente pobres abaixo da média nacional, destacamos os
municípios de Rubinéia (0,6%), Macaubal (0,7%) e Populina (1,0%) que apresentam
proporções inferiores até mesmo à média estadual (1,2%).
Riolândia apresenta a proporção de 1,9% de pessoas extremamente pobres, estando
um pouco acima da proporção estadual, entretanto consideravelmente inferior à proporção
nacional (6,6%).
Analisando a evolução destas informações ao longo dos anos, é possível identificar
que alguns municípios apresentaram uma queda nesta proporção, como é o caso de Macaubal
que contava com uma proporção de 5,9% em 1991, tendo apresentado uma queda
significativa em 2000, apresentando 0,8% e 0,7% em 2010 e de Rubinéia que apresentava
uma proporção de 10,6% de pessoas extremamente pobres em 1991 (a maior proporção
apresentada ao longo dos anos entre os municípios estudados), e também apresentou uma
queda bastante considerável, chegando à 3,2% em 2000 e 0,6% em 2010 (a menor proporção
apresentada entre os 04 municípios), ou seja, ao longo de 19 anos, Rubinéia que apresentava,
entre os municípios estudados, a maior proporção de extremamente pobres, chega em 2010
apresentado a menor proporção entre estes mesmos municípios.
Populina, que apresentava uma proporção de 3,3% em 1991, contou com um aumento
desta proporção no ano de 2000, alcançando 5,0%, porém, nos próximos anos também
79
apresentou queda, chegando em 2010 com 1,0%. Por fim, Riolândia não apresentou muitas
alterações proporcionais entre os anos de 1991 e 2000, tendo apresentados dados de 6,8% e
6,9% respectivamente, apresentando uma queda apenas na pesquisa de 2010, alcançando
1,9%.
Em relação à proporção de pobres, representada pelas pessoas com a renda per capta
domiciliar igual ou inferior à R$140,00 em agosto de 2010, identificamos também que os
municípios estudados apresentam proporções mais próximas aos índices do Estado de São
Paulo (4,7%), que se encontra com uma proporção consideravelmente mais baixa que a média
proporcional do país (15,2%).
Gráfico 15 – Proporção de pobres
Fonte: PNUD, IPEA e FJP (2013).
Todos os municípios apresentaram queda nas proporções das pessoas pobres ao longo
dos anos (entre 1991 e 2010) e de acordo com o gráfico identificamos que os municípios de
Rubinéia (2,3%), Macaubal (2,7%) e Populina (4,4%) apresentaram em 2010, proporções
inferiores inclusive à proporção estadual (4,7%), enquanto Riolândia apresenta a maior
proporção de pessoas pobres entre os municípios entrevistados (6,2%), estando porém,
abaixo da média nacional (15,2%).
Em relação à proporção de pessoas vulneráveis à pobreza, representada pelas pessoas
com a renda per capta domiciliar igual ou inferior à R$255,00 em agosto de 2010 (meio
salário mínimo vigente naquele período), assim como nos gráficos anteriores que apresentam
informações de pessoas extremamente pobres e de pessoas pobres, identificamos que os
municípios estudados também apresentam proporções inferiores à media proporcional do país,
que apontava em 2010 32,6% de pessoas vulneráveis à pobreza.
80
Gráfico 16 – Proporção de vulneráveis à pobreza
Fonte: PNUD, IPEA e FJP (2013).
Todos os quatro municípios apresentaram uma queda significativa em relação à
proporção de vulneráveis à pobreza entre a pesquisa realizada em 1991 e a realizada em 2010.
Entretanto, encontram-se um pouco acima da média proporcional do Estado de São Paulo que
apresentou em 2010 16,1%, estando Rubinéia com 17,1%, Macaubal com 18,2%, Populina
com 19,3% e Riolândia com uma média proporcional um pouco mais elevada, de 26,3%.
De acordo com o Gráfico 17, que retrata a média da renda per capta da população,
podemos identificar que o Estado de São Paulo possui uma população que conta com uma
renda per capta de R$1084,00, superior à media nacional de R$794,00, no ano de 2010.
Gráfico 17 – Renda per capta média
Fonte: PNUD, IPEA e FJP (2013).
81
Os quatro municípios estudados, apesar de terem registrado crescimento nesta média
da per capta entre os anos de 1991 e 2010, contam na ultima pesquisa, com uma média per
capta bastante inferior à media estadual, apresentando inclusive, um valor inferior até mesmo
à media da per capta do país.
Identificamos, na pesquisa do ano de 2010, o município de Macaubal com a média per
capta de R$705,00, Rubinéia com R$676,00, Populina com R$621,00 e Riolândia com
R$539,00, per capta esta que representa um pouco menos que a metade da média per capta do
Estado de São Paulo.
O Índice de Desenvolvimento Humano é calculado a partir da média geométrica dos
índices das dimensões de Renda, Longevidade e Educação, com pesos equivalentes.
Gráfico 18 – Índice de Desenvolvimento Humano Municipal
Fonte: PNUD, IPEA e FJP (2013).
A partir do gráfico 10, é possível identificar que ambos os municípios visitados
apresentaram crescimento em seu IDH municipal entre os anos de 1991 e 2010. Em 2010, o
município de Rubinéia apresentou o maior índice (0,76), seguido por Macaubal (0,74),
Populina (0,71) e por fim, Riolândia (0,70) com o menor índice.
Identificamos, com base na pesquisa de 2010, que o IDH do Estado de São Paulo
(0,78) é superior ao IDH do país (0,73). Entretanto, todos os quatro municípios apresentaram
índices inferiores ao Estadual (0,78). Por sua vez ao serem comparados ao índice nacional
(0,73), consideramos que os municípios de Populina e Riolândia encontram-se com índices
inferiores (0,71 e 0,70 respectivamente) enquanto Macaubal (0,74) e Rubinéia (0,76) estão
superando este índice.
82
A análise destes gráficos nos leva a identificar algumas questões relevantes. De forma
geral, comparando a realidade dos municípios entre os anos de 1991 e 2010, podemos afirmar
que todos eles apresentaram evolução e avanços significativos no que tange à esperança de
vida ao nascer, à renda per capta média e ao índice de desenvolvimento humano.
Ao compararmos a realidade atual (dados de 2010) dos municípios com a realidade
estadual e nacional, observamos que na maioria dos casos os municípios apresentam índices
mais favoráveis que a realidade nacional, entretanto em alguns casos encontram-se em
desvantagem em relação aos índices estaduais. Esta situação pode ser identificada ao
analisarmos os índices de Proporção de Extremamente Pobres, Pobres e Vulneráveis à
pobreza.
Os dados nos apontam ainda que as famílias dos municípios visitados possuem um
índice de renda per capta média significativamente inferior à média per capta do restante do
Estado e até mesmo à média nacional. Dados estes que se complementam ao observarmos que
o índice de desigualdade nestes municípios são inferiores ao índice Estadual e nacional.
Assim, podemos compreender que na região estudada as famílias possuem rendimentos
familiares inferiores à media nacional e estadual, o que contribui para que o índice de
desigualdade entre aquele que possui a renda per capta familiar maior e aquele que possui a
renda per capta familiar menor também seja inferior.
Ao direcionarmos o olhar para os índices relacionados à educação, é possível
identificar uma desvantagem dos municípios em relação aos índices nacionais e
principalmente estaduais, como por exemplo, no que tange ao índice de pessoas com nível de
superior completo. Apesar de ter registrado avanços ao longo dos anos, estes municípios
possui índices bastante inferiores. O mesmo acontece com relação ao índice de analfabetismo,
apesar da queda deste índice nos municípios, eles continuam superiores ao restante do Estado
e bem próximos aos índices nacionais, estando superiores em dois dos municípios, os que nos
mostra uma vulnerabilidade significativa no que tange ao acesso à política de educação nesta
região.
Por fim, podemos concluir que esta é uma região em desenvolvimento, uma vez que os
índices apresentaram avanços importantes no espaço de quase 20 anos.
Entretanto, é uma região que ainda enfrenta vulnerabilidades em razão dos baixos
índices de escolaridades, que resultam na falta de qualificação profissional e consequente nas
menores chances de conquistarem espaço no mercado de trabalho formal, que proporcione
segurança e proteção, na perspectiva da lógica do seguro, que conforme já foi discutido no
83
Capítulo 1, possui na organização atual do Sistema de Seguridade Social brasileiro, um peso
significativo.
Outra característica relevante a ser considerada, está relacionada a media da renda per
capta (significativamente inferior a media do restante do Estado) o que nos leva a
compreender sobre a existência da prevalência de baixos rendimentos para a grande massa da
população, situação esta que certamente pode contribuir para a exposição de parte
significativa da população à inúmeras vulnerabilidades sociais e até mesmo à situações de
dificuldades para suprir as necessidades básicas de seus núcleos familiares.
2.3 Trabalhadores do SUAS: O Perfil dos Sujeitos desta Pesquisa
Considerando a importância da preservação da identidade dos profissionais e dos
municípios onde estão inseridos os CRAS visitados, em consonância com os princípios da
ética em pesquisa, não identificaremos os nomes dos municípios. Desta forma, nos
reportaremos aos CRAS dos municípios apresentados no capítulo 2.2 desta dissertação a
partir da denominação CRAS I, CRAS II, CRAS III e CRAS IV.
Ao realizamos os contatos com os coordenadores dos CRAS para apresentarmos a
proposta metodológica desta pesquisa e seus objetivos, informamos que poderiam participar
do grupo focal todos os trabalhadores do SUAS que realizam atendimento ao público no
CRAS.
Apresentamos a seguir, no Quadro 1, os profissionais que participaram do grupo focal
em cada um dos CRAS visitados.
Quadro 1 – Participantes do Grupo Focal
CRAS
CRAS I
Coordenador
CRAS II
Coordenador
CRAS III
Coordenador
CRAS IV
Assistente
Social
PARTICIPANTES DO GRUPO FOCAL
Assistente
Auxiliar
Psicólogo
Social
Administrativo
Assistente
Assistente
Assistente
Social
Social
Social
Psicólogo
Auxiliar
Administrativo
Fonte: Elaborado por Elaine Friozi G Guimarães em 2015.
Estagiário de
Serviço Social
Terapeuta
Ocupacional
84
De acordo com a tabela, é possível identificar que não foram todos os trabalhadores
que atendem ao público que participaram dos grupos focais, o que ocorreu devido às diversas
dificuldades encontradas ao longo da pesquisa. Alguns imprevistos impossibilitaram que a
proposta inicial tivesse êxito.
O CRAS I foi o único entre os quatro CRAS visitados que proporcionou a participação
de toda a sua equipe na realização do grupo focal.
O CRAS II proporcionou a participação do coordenador e dos profissionais de nível
superior, entretanto, não participaram os profissionais que ocupam os cargos de recepcionista,
auxiliar administrativo e orientador social.
O CRAS III possibilitou a participação do coordenador, psicólogo e auxiliar
administrativo. A coordenação até sugeriu que aguardássemos o retorno do assistente social
(que encontrava-se afastado por licença-médica) para a realização do grupo focal, porém,
devido aos prazos para a conclusão da pesquisa, não foi possível. Dos profissionais que
atendem ao público, não participaram, portanto, o assistente social e o recepcionista.
O CRAS IV contribuiu com a participação apenas do assistente social. Esclarecemos
que aguardamos alguns meses até conseguirmos agendar a visita para a realização do grupo
focal neste CRAS, devido dificuldades para falar com o coordenador, que já havia aceitado
participar desta pesquisa. Na data agendada, ao chegarmos ao CRAS fomos informados que
devido a um imprevisto o coordenador não iria trabalhar naquela data, então o assistente
social nos recebeu e respondeu ao roteiro do grupo focal, de acordo com as suas
possibilidades, deixando sem respostas alguns conteúdos, principalmente os relacionados à
gestão, por não ter as informações necessárias.
Aos profissionais participantes do grupo focal, descritos no Quadro 1, solicitamos que
respondessem o questionário que foi elaborado com o objetivo de realizar mos um estudo do
perfil dos sujeitos dessa pesquisa. Porém, dos treze profissionais que contribuíram, apenas
nove devolveram os questionários respondidos, o que acabou prejudicando o alcance do
objetivo inicial. Desta forma, apresentamos a seguir o perfil dos sujeitos desta pesquisa, a
partir do conteúdo dos questionários que nos foram entregues devidamente respondidos.
85
A tabela 2 nos indica quais profissionais responderam ao questionário:
Tabela 2 – Função que exerce no CRAS
Função que exerce no CRAS
Total
Administrativo
1
Assistente Social
4
Coordenador
1
Psicólogo
2
Terapeuta Ocupacional
1
Total Geral
Fonte: Elaborado por Elaine Friozi G Guimarães em 2015.
9
A tabela 3 traz informações sobre o sexo, idade, titulação, curso e ano de conclusão:
Tabela 3– Sexo, Idade e Formação Profissional
Função que
exerce no
Sexo
CRAS
Administrativ
M
o
Assistente
Social
Coordenador
Psicólogo
Terapeuta
Ocupacional
F
F
F
F
Idade Titulação
Nome da
Instituição
Curso
Ano de
Conclusão
Total
35
Graduado
UNIJALES
Letras
2002
1
27
Graduado
UNIFEV
Serviço Social
2008
1
32
Graduado
FEF
Serviço Social
2011
1
33
Graduado
UNIFEV
Serviço Social
2007
1
40
Graduado
UNIFEV
Serviço Social
2011
1
30
Graduado
FUNEC
Serviço Social
2007
1
24
Graduado
FEF
Psicologia
2013
1
36
Graduado
UNIP
2002
1
34
Graduado
FEF
Psicologia
Terapia
Ocupacional
2013
1
Total Geral
Fonte: Elaborado por Elaine Friozi G Guimarães em 2015.
9
É possível destacar que os sujeitos desta pesquisa se constituem em um público jovial,
com uma faixa-etária de idade entre 24 e 40 anos de idade. Todos cursaram a graduação em
faculdades particulares da região e são majoritariamente do sexo feminino. Ressalto que
apenas um homem participou dos grupos focais.
No que tange à experiência profissional na área da assistência social, observamos que
nenhum dos sujeitos desta pesquisa atuaram no período anterior à criação do SUAS,
entretanto, a maioria deles possuem tempo de experiência nesta política social há mais de 03
86
anos, o que nos leva a supor que os mesmos conhecem a organização da assistência social em
nosso país.
Tabela 4 – Experiência Profissional
Tempo de
Função que exerce atuação na área
no CRAS
da assistência
social
7 anos
Administrativo
Assistente Social
Coordenador
Vínculo
empregatício
Carga Horária
Semanal
Total
Estatutário
40
1
Estatutário
Contrato
Temporário
30
1
6 meses
6 meses
3 anos
3 anos
6 anos
Estatutário
40
7 anos
4 anos
2 anos e
meio
Estatutário
40
6 anos
4 anos
Estatutário
40
1
3 anos
Estatutário
40
1
4 anos e meio
3 anos
1 ano e
meio
Estatutário
30
3 anos
3 anos
Estatutário
30
Psicólogo
Terapeuta
Ocupacional
Tempo de
atuação
nesta
função
7 anos
1
40
1
1
1
1
9
Total Geral
Fonte: Elaborado por Elaine Friozi G Guimarães em 2015.
Em relação ao engajamento e a participação política, é possível observar que os
profissionais vêm ocupando os espaços dos conselhos de direitos, neste caso, alguns dos
sujeitos que responderam aos questionários compõem o Conselho Municipal da dos Direitos
da Criança e do Adolescente e também o Conselho Municipal dos Direitos do Idoso.
Tabela 5 – Participação Política
Função que exerce no CRAS
Participação Política
Administrativo
Não
1
Não
1
Assistente Social
Sim
Qual
Total
CMDCA
1
CMDI
2
Coordenador
Sim
CMDCA
1
Psicólogo
Sim
CMDCA
2
Terapeuta Ocupacional
Sim
CMDCA
1
Total Geral
Fonte: Elaborado por Elaine Friozi G Guimarães em 2015.
9
87
Em relação à participação em eventos científicos, foi possível identificar que esta não
costuma ser uma atividade rotineira dos sujeitos, uma vez não participaram de nenhum evento
científico nos últimos 12 meses.
Tabela 6 – Participação em Eventos Científicos
Função que exerce no CRAS Participação Eventos Científicos
Não
Administrativo
Total
1
Assistente Social
Não
4
Coordenador
Não
1
Psicólogo
Não
2
Não
Terapeuta Ocupacional
Total Geral
Fonte: Elaborado por Elaine Friozi G Guimarães em 2015.
1
9
Realizaram, como podemos visualizar na Tabela 7, apenas capacitações.
Tabela 7 – Participação em Capacitações
Função que exerce
no CRAS
Participou de
Capacitações
Administrativo
Não
Auxilio Financeiro da
Instituição
Nome
1
2
Não
Assistente Social
Coordenador
Sim
Sim
Sim
Sim
CRAS - A Porta de
entrada do SUAS
Diversas Ofertadas
pela DRADS
Diversas Ofertadas
pela DRADS
Sim
Terapeuta
Ocupacional
Sim
1
1
1
1
Não
Psicólogo
Total
Sim
Sim
Total Geral
Fonte: Elaborado por Elaine Friozi G Guimarães em 2015.
Capacitação
Conselho Tutelar
Diversas Ofertadas
pela DRADS
1
1
9
Cabe aqui destacar que, geralmente, as capacitações ofertadas pelo governo,
proporcionam apenas aprendizados técnicos para a aplicação ou aprimoramento de alguma
ação específica.
A fundamentação teórica, por sua vez, acaba não encontrando espaço para ser
discutida nestes espaços. Daí então, reforçamos a relevância do engajamento e participação
profissional nos eventos científicos de suas categorias profissionais específicas, uma vez que,
88
à luz da teoria é possível encontrar possibilidades e subsídios para enfrentar os desafios do
cotidiano do trabalho profissional.
E, por fim, no que tange ao acesso às leituras de materiais específicos da área da
assistência social, podemos destacar que apenas um profissional elencou alguns livros, outros
se restringiram a citar legislações e guias técnicos, enquanto a maioria nem mesmo vêm
realizando este tipo de leitura.
Tabela 8 – Leituras
Leituras de
livros sobre
Função que exerce no CRAS
conteúdo
específico
Sim
Administrativo
Assistente Social
Qual?
Qual 2?
Qual 3?
Gestão de
Benefícios –
SIBEC
1
Não
Sim
Coordenador
4
LOAS - ECA Cartilha PAIF I
e II
1
Não
Psicólogo
Sim
Total
1
Psicologia
comunitária X
assistencialismo:
possibilidades e
limites.
Solidariedade,
política e
Transferência
poder: o
de renda no
desafio às
Brasil.
políticas
sociais.
1
Não
1
Total Geral
Fonte: Elaborado por Elaine Friozi G Guimarães em 2015.
9
Terapeuta Ocupacional
Ao olharmos para o perfil destes sujeitos, podemos identificar que se trata de
profissionais formados dentro dos últimos 10 anos, mas que se encontram ausentes dos
espaços de discussões teóricas de suas categorias profissionais.
Esta realidade pode ser compreendida ao considerarmos as condições de trabalho
destes profissionais, que majoritariamente estão cumprindo 40 horas de trabalho semanais,
entre eles, até mesmo alguns assistentes sociais, que possuem por direito a garantia da
redução da carga horária para 30 horas semanais, sem redução salarial (e que não estão
usufruindo deste direito).
Podemos ainda destacar a grande demanda de trabalho, somada à precarização do
quadro de recursos humanos, conforme já foi apresentado no início deste capítulo (ao
89
apresentarmos os dados da região da DRADS de Fernandópolis), situação esta que acaba
sobrecarregando os profissionais.
Desta forma, os profissionais acabam sendo “engolidos” pelo cotidiano árduo de
trabalho e assim não encontram espaço ou disponibilidade para exercitarem a reflexão teórica.
Esta situação deve ser levada em conta ao discutirmos sobre o processo de implantação e
implementação de uma política social, que apesar de inovadora, é marcada por contradições,
que só poderão ser discutidas e analisadas a partir do momento que os profissionais do SUAS
se apegaram à fundamentação teórica e juntos passarem a propor mudanças na base
organizativa deste sistema, de forma que possam caminhar ainda mais na busca pelo alcance
da assistência social enquanto direito.
90
CAPÍTULO 3
O
PROCESSO
DE
IMPLEMENTAÇÃO
DO
SUAS
NOS
MUNICÍPIOS DE PEQUENO PORTE I: A PERSPECTIVA DOS
TRABALHADORES.
Há exatamente uma década, no ano de 2005, a assistência social vivenciou um marco
histórico com a criação do Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Naquela
oportunidade, depositava-se na implantação de um sistema unificado para a assistência social,
a possibilidade para efetivá-la enquanto política pública, garantida sob a ótica do direito em
todo o território nacional.
O SUAS nascia com o legado de organizar as ações na área da assistência social.
Instituiu a descentralização política e administrativa e a territorialização com a finalidade de
garantir que as realidades regionais pudessem ser consideradas no âmbito da gestão para o
planejamento das ações, entretanto, trouxe um direcionamento, uma estrutura para a
assistência social que deveria nortear todo o território nacional na condução desta política
pública.
Porém, nos dias atuais, mesmo completando dez anos de SUAS, será possível afirmar
que este sistema encontra-se implantado em nosso país e que os municípios estão
conseguindo organizar e efetivar as ações da assistência social para além das “concessões
materiais aos necessitados”, mas na busca pela garantia do acesso aos direitos sociais por
meio do trabalho intersetorial? Será possível afirmar que a lógica do trabalho social com as
famílias rompeu com as antigas práticas “de controle” e estão proporcionando informações e
possibilidades de lutas coletivas pelos interesses coletivos dentro do território? Será possível
afirmar que nesta década a assistência social enfim conquistou o seu espaço no bojo das
políticas públicas e conseguiu romper com sua trajetória histórica marcada pelo
espontaneísmo, pelo não direito, pelo favoritismo? Por fim, será possível afirmar, que mesmo
considerando a conjuntura atual marcada pela exploração, pela desigualdade social, pelo
ataque aos direitos e pela lógica da redução do papel do Estado a política de assistência social
vem ofertando, ou melhor, tem possibilidade de ofertar Proteção Social às famílias em
situação de vulnerabilidade social?
Considerando a magnitude do nosso país, não pretendemos com esta pesquisa
apresentar dados que possam retratar a realidade nacional, tampouco pretendemos retratar a
realidade do noroeste paulista – recortado pela DRADS de Fernandópolis, no que tange à
implantação do SUAS.
91
Pretendemos aqui, abordar a organização da política de assistência social atual,
prevista pela PNAS e norteada pelo SUAS, e então, apresentar a perspectiva dos trabalhadores
do SUAS - que contribuíram com esta pesquisa – em relação a esta política pública e seu
processo de implantação/implementação.
Identificamos elementos importantes do cotidiano destes trabalhadores, que nos
levam a refletir sobre como eles apreendem a realidade vivenciada cotidianamente e sobre
como os pressupostos do SUAS podem ser identificados nas ações concretas do dia-a-dia,
além de compreendermos sobre como estão sendo criadas estratégias para efetivar a política
de assistência social nos territórios de abrangência dos CRAS, considerando os desafios
diários e os resquícios da trajetória história da assistência social.
3.1 O Sistema Único de Assistência Social: Reflexões Pertinentes
De acordo com a PNAS, o SUAS enquanto um sistema descentralizado e participativo
regula e organiza as ações assistenciais de caráter permanente ou eventual existentes em todo
o território nacional.
O SUAS é constituído pelo conjunto de serviços, programas, projetos e
benefícios no âmbito da assistência social prestados diretamente – ou
através de convênios com organizações sem fins lucrativos –, por órgãos e
instituições públicas federais, estaduais e municipais da administração
direta e indireta e das fundações mantidas pelo poder público. (BRASIL,
2008, p. 97).
Este Sistema Único conta com alguns pilares para nortear a organização da política de
assistência social no Brasil. Trataremos sobre alguns deles, de modo a instigar uma reflexão a
respeito das bases que direcionaram a elaboração da política nacional de assistência social
tanto sob a ótica dos formuladores da política, quanto sob a ótica de estudiosos que trazem um
olhar crítico a respeito dos seus fundamentos.
Segundo a PNAS, o SUAS deverá partir da territorialização para formular suas
intervenções.
Levando em conta a extensão de nosso país, suas áreas urbanas, suas significativas
áreas rurais e suas metrópoles, podemos ter em mente o quanto este país é desigual, e esta
realidade torna equivocada qualquer tentativa de homogeneizar realidades tão distantes, como
as encontradas no Brasil.
92
A PNAS traz, então, como referência, a caracterização dos grupos territoriais a partir
de uma definição dos municípios como de Pequeno Porte I, Pequeno Porte II, Médio Porte,
Grande Porte e Metrópole, que também é utilizada pelo IBGE.
Esta classificação tem o objetivo de instituir o SUAS de acordo com a realidade local,
implantando as ações de proteção básica em todos os municípios do território brasileiro e
ações de proteção especial – de média e alta complexidade nos municípios de médio, grande
porte e nas metrópoles.
Para a realização desta pesquisa, optamos pelo recorte dos municípios de pequeno
porte I, conforme a apresentação realizada no capítulo 2 desta dissertação.
De acordo com a NOB-SUAS (2005) os municípios de pequeno porte I, em
consonância com o seu perfil, devem ofertar os serviços de proteção social básica e a cada
2.500 famílias referenciadas, devem contar com pelo menos 1 CRAS implantado.
No que tange à proteção especial, fica a critério da gestão a sua oferta, que pode se dar
por meio da instalação de equipamentos no próprio município ou por meio de serviços de
referência regional (ofertados pelo Estado) e consórcios públicos pactuados entre municípios
de determinada região.
Nos municípios visitados, podemos constatar que todos eles contam com apenas 01
CRAS implantado para atender o território com a oferta dos serviços de proteção social
básica.
Em relação à proteção especial, verificamos que para a oferta de algumas ações há o
estabelecimentos de consórcios intermunicipais e a oferta de serviços regionais, como é o
caso do atendimento com as Medidas Socioeducativas previstas pelo ECA (semiliberdade e
internação) e a Medida de Proteção de Acolhimento Institucional. Entretanto, as demais ações
de proteção Social especial são ofertadas de acordo com as possibilidades de cada município,
no próprio Órgão Gestor da Política de Assistência Social.
O SUAS propõe a organização das ações socioassistenciais a partir das seguintes
referências: Vigilância Social, Proteção Social e Defesa Social e Institucional.
A Vigilância Social é compreendida pela PNAS como “[...] mecanismo essencial para
a prevenção do risco, do quase risco e das situações de vulnerabilidades social existentes nos
territórios e micro-territórios.” (BRASIL, 2008, p. 51).
A vigilância socioassistencial deve buscar conhecer o cotidiano da vida das
famílias, a partir das condições concretas do lugar onde elas vivem e não só
as médias estatísticas ou números gerais, responsabilizando-se pela
identificação dos “territórios de incidência” de riscos no âmbito da cidade,
93
do Estado, do país, para que a Assistência Social desenvolva política de
prevenção e monitoramento de riscos. (BRASIL, 2009a, p. 93).
De acordo com a PNAS, a vigilância social:
[...] refere-se à produção, sistematização de informações, indicadores e
índices territorializados das situações de vulnerabilidade e risco pessoal e
social que incidem sobre famílias/pessoas nos diferentes ciclos da vida
(crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos); pessoas com redução da
capacidade pessoal, com deficiência ou em abandono; crianças e adultos
vítimas de formas de exploração, de violência e de ameaças; vítimas de
preconceito por
etnia, gênero e opção pessoal; vítimas de apartação social que lhes
impossibilite sua autonomia e integridade, fragilizando sua existência;
vigilância sobre os padrões de serviços de assistência social em especial
aqueles que operam na forma de albergues, abrigos, residências, semiresidências, moradias provisórias para os diversos segmentos etários. Os
indicadores a serem construídos devem mensurar no território as situações
de riscos sociais e violação de direitos. (BRASIL, 2009a, p. 39-40).
Sendo assim, o principal objetivo do desenvolvimento da vigilância social está em
“[...] conhecer o cotidiano da vida dos usuários da política de assistência social, detectando
situações de precarização, vulnerabilidade e risco social que ameaçam cidadãos e suas
famílias.” (BRASIL, 2008, p. 51).
No que tange à Proteção Social, esta “[...]tem por direção o desenvolvimento humano
e social e os direitos de cidadania, e seus serviços, programas, projetos e benefícios devem
estar articulados com as demais políticas sociais para efetivamente se constituir um sistema
público.” (BRASIL, 2008, p. 45).
O SUAS, ao considerar que as necessidades sociais são diversas e complexas,
configurou a proteção social em duas modalidades: proteção social básica e proteção social
especial.
A Proteção Social Básica engloba as ações preventivas, de convivência,
socialização, inserção e acolhida, voltadas prioritariamente para as famílias e
indivíduos em situação de vulnerabilidade social, visando desenvolver
potencialidades, aquisições e fortalecimento de vínculos familiares e
comunitários. Nessa modalidade, estão incluídos os serviços, programas e
projetos, locais de acolhimento, convivência e socialização e os benefícios
de prestação continuada, eventuais e outras formas de tranferência de renda
como, por exemplo, os benefícios pagos pelo Programa Bolsa Família.
(BRASIL, 2008, p. 47).
94
As ações de proteção social básica devem ser concretizadas no Centro de Referência
de Assistência Social (CRAS) ou estarem a ele referenciadas.
A proteção social especial divide-se entre a proteção social especial de média
complexidade e a proteção social especial de alta complexidade.
A proteção social especial tem por objetivos prover atenções
socioassistenciais a famílias e indivíduos que se encontram em situação de
risco pessoal e social, por ocorrência de abandono, maus tratos físicos e/ou
psíquicos, abuso sexual, uso de substâncias psicoativas, cumprimento de
medidas socioeducativas, situação de rua, situação de trabalho infantil, entre
outras. (BRASIL, 2009a, p. 92).
As ações de proteção especial de média complexidade devem ser concretizadas no
Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) ou estarem a ele
referenciadas.
Para a Proteção Especial de Média Complexidade são considerados os
serviços que ofertam atendimentos às famílias e indivíduos com seus direitos
violados em maior grau que os de proteção básica, cujos vínculos familiar e
comunitário, embora fragilizados, não foram rompidos. Os serviços de
acolhida, escuta, atendimento psicossocial a indivíduos, grupos e famílias,
referência e contra-referência com a rede socioassistencial, com as demais
políticas sociais e com as instituições que compõem o Sistema de Garantias
de Direitos. (BRASIL, 2008, p. 48)
Já a proteção social de alta complexidade é destinada às famílias cujos membros
tiveram rompimento de vínculos. Todas essas ações, que preveem assistência integral, devem
estar referenciadas no CREAS.
A Proteção Especial de Alta Complexidade prevê assistência integral
(moradia, alimentação, higienização e trabalho protegido) a famílias e
indivíduos que se encontram sem referência e/ou sob ameaça, necessitando a
sua retirada do núcleo familiar ou comunitário. (BRASIL, 2009a p. 38).
A proteção social prevista pelo SUAS deve ser norteada pelos princípios da
matricialidade sociofamiliar, da territorialização, da proteção pró-ativa, da integração ao
sistema de seguridade social e da integração às políticas sociais e econômicas.
A proteção social de Assistência Social consiste no conjunto de ações,
cuidados, atenções, benefícios e auxílios ofertados pelo SUAS para redução
e prevenção do impacto das vicissitudes sociais e naturais ao ciclo de vida, à
dignidade humana e à família como núcleo básico de sustentação afetiva,
biológica e relacional. (BRASIL, 2009a, p. 92)
95
Desta forma, deve propiciar a garantia das seguintes seguranças: Segurança de
acolhida, segurança social de renda, segurança de convívio familiar, comunitário e social,
segurança do desenvolvimento da autonomia individual, familiar e social e a segurança de
sobrevivência a riscos circunstanciais.
Por fim, a Defesa Social e Institucional, prevê que as ações da proteção social, seja
ela básica ou especial, devem ser organizadas de forma que os usuários tenham acesso ao
conhecimento acerca dos direitos socioassistenciais assegurados pelo SUAS, que são:
• Direito ao atendimento digno, atencioso e respeitoso, ausente de
procedimentos vexatórios e coercitivos. • Direito ao tempo, de modo a
acessar a rede de serviço com reduzida espera e de acordo com a
necessidade. • Direito à informação, enquanto direito primário do cidadão,
sobretudo àqueles com vivência de barreiras culturais, de leitura, de
limitações físicas. • Direito do usuário ao protagonismo e manifestação de
seus interesses. • Direito do usuário à oferta qualificada de serviço. • Direito
de convivência familiar e comunitária. (BRASIL, 2009a, p. 40).
A referência da defesa social e institucional tem como objetivo criar oportunidades
para que a assistência seja reconhecida enquanto um direito social. Então, as ações ofertadas
devem ter como perspectiva a acessibilidade, a autonomia e o protagonismo do usuário, de
forma que em nenhum momento, o usuário venha a ser submetido às relações de tutela e
subalternização (BRASIL, 2008).
Para tanto, os usuários precisam ser incentivados a se manifestarem sobre as situações
de violações de direitos. De acordo com a NOB-SUAS, os principais mecanismos e espaços
para a defesa de direitos são as ouvidorias, os centros de referência, os conselhos de direito,
entre tantos outros.
Desse modo, considerando as referências da vigilância social, da proteção social e da
defesa social e institucional, o SUAS prevê que a rede de serviços socioassistenciais se
reorganize, por meio de um reordenamento dos serviços ofertados.
Ao abordarmos sobre as referencias indicadas pelo SUAS para pautar a organização da
política de assistência social, a discussão sobre alguns conceitos, torna-se relevante.
As expressões “riscos sociais” e “vulnerabilidade social” aparecem diversas vezes no
conteúdo da PNAS e ganham destaque no âmbito da vigilância social, apresentada
anteriormente, o que nos leva a compreender que estes são conceitos importantes a serem
discutidos.
Na política de assistência social, o conceito de vulnerabilidade social não pode estar
atrelado apenas à questão econômica, conforme explicam Mestriner e Nery (2009), a
96
vulnerabilidade social deve ser compreendida como um conceito multifacetado com várias
dimensões. Os materiais de capacitação sobre o SUAS apresentam as seguintes características
que a vulnerabilidade social compreende:
[...] a ausência ou precariedade de renda; o desemprego e o trabalho informal
e inseguro; o acesso frágil ou inexistente aos serviços sociais públicos; a
perda ou fragilização de vínculos de pertencimento e de relações sóciofamiliares; as mais diversas discriminações e preconceitos a que estão
sujeitos indivíduos, famílias, coletividades, grupos e classes sociais.
(BRASIL, 2009a, p. 45).
Desta forma, a PNAS destaca as situações que deverão ser cobertas por ela:
A opção que se construiu para exame da política de assistência social na
realidade brasileira parte então da defesa de um certo modo de olhar e
quantificar a realidade, a partir de: [...]Uma visão social de proteção, o que
supõe conhecer os riscos, as vulnerabilidades sociais a que estão sujeitos,
bem como os recursos com que conta para enfrentar tais situações com
menor dano pessoal e social possível. Isto supõe conhecer os riscos e as
possibilidades de enfrentá-los. (BRASIL, 2009a, p. 15).
O SUAS estabelece que é tarefa da vigilância social associar as situações de
fragilidades identificadas no território com as informações e indicadores sobre o acesso aos
direitos sociais e aos serviços socioassistenciais disponíveis.
Recorre-se, então, ao conceito de território desenvolvido pelo Geógrafo Milton Santos,
que aborda sobre a exposição aos riscos sociais às quais as famílias podem se encontrar, de
acordo com o território no qual esteja inserida.
[...] permite compreender a forma como as relações sociais se materializam
num dado espaço, conformando em um local específico as estruturas de
oportunidade e ambientes de exposição a riscos, fazendo emergir na análise
as potencialidades e vulnerabilidades próprias da dimensão territorial. Isto
significa dizer que as potencialidades ou vulnerabilidades de uma mesma
família ou indivíduo podem apresentar variações significativas, conforme o
território em que está inserida. (SANTOS apud BRASIL, 2010, p. 74).
Compreendendo a lógica da vigilância social, é possível afirmar que a Política
Nacional de Assistência Social foi elaborada a partir de uma visão social de prevenção, que
supõe identificar os riscos e as vulnerabilidades sociais a que estão sujeitos os destinatários da
Assistência Social, considerando ser o cotidiano da vida das pessoas o espaço onde os riscos e
as vulnerabilidades se constituem. Ao longo do seu texto, a PNAS trata de forma significativa
97
sobre os riscos sociais, seja no âmbito da prevenção dos riscos, como também no âmbito da
intervenção nas situações de risco.
Considerando tamanha atenção destinada aos riscos e às situações de vulnerabilidade
social, alguns estudiosos apresentam uma leitura crítica deste conceito de risco, pois
acreditam que ele está fundado na percepção da Sociedade de Riscos.
Ulrick Beck, um dos filósofos de maior destaque em relação aos estudos da Sociedade
de Riscos, em seus livros defende que atualmente, a sociedade industrial marcada pela
produção, está sendo substituída pela sociedade de riscos, onde a exposição aos riscos sociais
independe das condições econômicas e sociais. Este sociólogo relaciona a sociedade de risco
com a globalização, defendendo que na modernidade atual os riscos são democráticos e
podem afetar a qualquer um, independentemente de classe social ou de qualquer tipo de
fronteira (GUIVANT, 2001).
Anthonny Giddens, filósofo britânico que também discute sobre a sociedade de riscos,
aponta diferenças entre a sociedade de riscos e a sociedade de classes, afirmando que a
Sociedade de Riscos introduz novos tipos de perigos para a humanidade além de afirmar que
nesta sociedade existe um equilíbrio entre perigo e oportunidade (JANCZURA, 2012).
Ao discutirmos sobre os riscos sociais, a partir da perspectiva da sociedade de riscos,
estamos automaticamente deixando de lado a existência da sociedade de classes e suas
contradições, advindas principalmente da relação capital x trabalho.
Quando pensamos numa sociedade de riscos, estamos tratando de riscos enquanto uma
questão individual, que pode ser vivenciada por qualquer sujeito, o qual, neste caso deverá
encontrar meios para enfrentá-los, de acordo com as suas possibilidades.
A partir desta concepção pode-se dizer que não há mais pobres e ricos –
todos estão expostos aos mesmos riscos, estes afetam a todos igualmente,
que se tornam vulneráveis aos mesmos. Portanto, a sociedade do risco põe
em xeque a sociedade de classes. Quando na verdade o que ocorre, de fato, é
que a sociedade de classes centrada na acumulação ampliada do capital é que
propicia inúmeros “riscos”. (MUSTAFA, 2013, p. 8)
Mustafa (2013) acredita que é esta a concepção de risco presente no sistema de
proteção social do Brasil. E, de acordo com a sua linha de raciocínio, isso contribui para que a
política de assistência social deixe de lado o debate sobre a existência das classes sociais e
suas desigualdades, e consequentemente deixe de olhar para os riscos sociais enquanto uma
questão coletiva, societária, que deve ser enfrentada pela sociedade, já que se trata de um
produto da sociedade desigual em que vivemos.
98
Assim, é possível compreender, sob esta ótica, que quando a assistência social objetiva
que o sujeito consiga superar a situação de risco vivenciada a partir do fortalecimento dos
vínculos afetivos e até mesmo do desenvolvimento de suas potencialidades, acaba por seguir a
lógica da sociedade de riscos, uma vez que, neste caso, o usuário torna-se o principal
responsável pela superação da situação de risco vivenciada.
Nesse sentido, cabe aqui reforçar sobre a importância de não nos esquecermos da
existência da sociedade de classes ao olharmos para o território, para as situações de
vulnerabilidades, para os riscos aos quais as famílias estão expostas cotidianamente,
principalmente em razão da grande desigualdade social presente em nosso país.
Precisamos sempre frisar que deixando de lado a sociedade de classes, a política de
assistência social deixaria de olhar para a contraditoriedade advinda da relação conturbada
existente entre capital x trabalho e consequentemente se tornaria impotente para intervir de
fato nas desigualdades e alcançar a transformação social, afinal toda a realidade contraditória
e suas consequências no cotidiano acabariam não sendo consideradas ao longo da construção
das estratégias de intervenção e assim, as intervenções profissionais acabariam ficando no
campo do imediatismo.
Outro conceito muito relevante e bastante utilizado, que também carece ser discutido
encontra-se em um dos princípios norteadores da proteção social no âmbito do SUAS: a
matricialidade sociofamiliar.
O SUAS apresenta a família como principal foco da proteção social. O que não pode
ser considerado como uma inovação, principalmente ao nos atentarmos ao fato de que a
família, que tem sua importância explícita na Constituição Federal de 1988, passou a estar
presente nos últimos anos em importantes estatutos do nosso pais, como o Estatuto da Criança
e do Adolescente, o Estatuto do Idoso e também na LOAS.
Há de se chamar atenção, também, para o fato de que, na última década, a
família tornou-se o elemento central da intervenção das políticas de
assistência social. Sobre isto, é importante lembrar que a LOAS considera
como objetivo a proteção à família, e a determina como um dos focos de
atenção da política de assistência social. Em suma, a proteção à família se
tornou uma estratégia a ser considerada pela política de assistência social,
enquanto alvo privilegiado dos programas sociais e é, nesse sentido, que se
tem a articulação de alguns programas de garantia de renda mínima, por
exemplo, que toma a família como unidade de intervenção. (ALENCAR,
2006, p. 63).
99
Parte-se do princípio de que não existe um modelo único de família:
[...] não existe família enquanto modelo idealizado e sim famílias resultantes
de uma pluralidade de arranjos e rearranjos estabelecidos pelos integrantes
dessas famílias. Nesse sentido, a família é concebida “como núcleo afetivo,
vinculada por laços consangüíneos, de aliança ou afinidade, onde os vínculos
circunscrevem obrigações recíprocas e mútuas, organizadas em torno de
relações de geração e de gênero. (BRASIL, 2008, p. 58).
Independente do formato que possui, a família, de acordo com a PNAS, é a mediadora
das relações entre os sujeitos e a sociedade, é a mantenedora do cuidado de seus membros e,
portanto, ela também precisa ser “cuidada”. Principalmente ao levarmos em consideração o
espaço contraditório onde se encontra a família, marcado por conflitos e por desigualdades. A
família, na contemporaneidade, dentro do sistema capitalista, vive em uma luta cotidiana para
prover suas necessidades básicas e torna-se público-alvo fundamental da proteção social
prevista no SUAS.
Com a crise no mundo do trabalho, a abordagem sobre os temas de família
ganha, necessariamente, novos contornos e especificidades. Famílias inteiras
veem-se abaladas pelo desemprego estrutural. Os pais perdem seus postos de
trabalhos, muitas vezes de maneira irrecuperável. Mulheres voltam ao
mercado, não mais na figura de complementadoras da renda familiar, mas
como principais responsáveis pelo orçamento doméstico. Os filhos, por sua
vez, vivem o assombro de uma sociedade que ameaça não lhes abrir espaço
no mercado formal de trabalho, a despeito de toda a dedicação e
investimentos, eventualmente, realizados pela família em sua formação
educacional e profissional. (ALMEIDA; GUIMARÃES, 2007, p. 129)
Sob esta perspectiva, a PNAS traz a assistência social com centralidade na família
como ponto importante para o desenvolvimento de uma política de cunho universal, em
consonância com os princípios do SUAS.
[...] a centralidade na família com vistas à superação da focalização, tanto
relacionada a situações de risco como a de segmentos, sustenta-se a partir da
perspectiva postulada. Ou seja, a centralidade da família é garantida à
medida que na Assistência Social, com base em indicadores das
necessidades familiares, se desenvolva uma política de cunho universalista,
prioritariamente, em redes socioassistenciais que suportem as tarefas
cotidianas de cuidado e que valorizem a convivência familiar e comunitária.
(BRASIL, 2009a, p. 42).
100
A matricialidade familiar se torna, portanto, um dos eixos estruturantes do SUAS:
Por reconhecer as fortes pressões que os processos de exclusão sociocultural
geram sobre as famílias brasileiras, acentuando suas fragilidades e
contradições, faz-se primordial sua centralidade no âmbito das ações da
política de assistência social, como espaço privilegiado e insubstituível de
proteção e socialização primárias, provedora de cuidados aos seus membros,
mas que precisa também ser cuidada e protegida. (BRASIL, 2009a, p.41).
Entretanto, alguns estudiosos da política de assistência social trazem outro olhar para
esta perspectiva da matricialidade familiar proposta pela PNAS.
As questões que se colocam, hoje, são: como as famílias (em especial as
famílias pobres) se auto-protegerão diante de uma conjuntura adversa – em
que sobrevivem em condições precárias de moradia, trabalho, etc.? É preciso
considerar que as mulheres (até então tidas como as principais cuidadoras)
estão lutando no mercado de trabalho pela sobrevivência que não raras
vezes, no caso brasileiro, depende exclusivamente destas. Sendo assim como
esperar que estas continuem desempenhando o mesmo papel de protetoras da
família? O que ocorre quando a família não é “capaz” de proteger os seus
membros? (MUSTAFA, 2013, p. 14-15).
É preciso refletir até que ponto esta família está sendo protegida e cuidada o suficiente
para se tornar um espaço privilegiado e insubstituível de proteção e socialização primárias.
Afinal, a realidade com a qual nos deparamos cotidianamente nos aponta uma conjuntura
adversa, como bem apontou Mustafa, que em nada contribui para que as famílias possam se
autoproteger.
Sendo assim, caso direcionemos um olhar acrítico para a formulação da política de
assistência social em nosso país, corremos o risco de vir a classificar as famílias entre as que
são “capazes” e as que são “incapazes” de proteger os seus próprios membros:
Esta concepção de que as famílias, independentemente de suas condições
objetivas de vida e das próprias vicissitudes da convivência familiar, devem
ser capazes de proteger e de cuidar de seus membros, está profundamente
arraigada no âmbito da sociedade e tem certamente desdobramentos
importantes na operacionalização de uma política de assistência social. Ela
alimenta o estabelecimento de uma distinção básica entre famílias capazes e
famílias incapazes, mais capazes ou menos incapazes. (CAMPOS; MIOTO,
2003, p. 184 apud MUSTAFA, 2013, p. 15).
Compreendemos então, a necessidade de não deixarmos de lado a complexidade do
lugar ocupado pela família na sociedade em que vivemos, e assim ficarmos atentos aos nossos
101
posicionamentos profissionais ao tratarmos do papel da família frente às situações precárias
que a maioria está exposta nessa sociedade capitalista, evitando assim, qualquer possibilidade
de culpabilização das mesmas, pelas dificuldades enfrentadas.
A partir destas reflexões, é possível identificar que o SUAS traz uma proposta de
ampliação dos direitos e do acesso a estes, traz orientações importantes para um novo
direcionamento das ações socioassistenciais, considerando as especificidades territoriais e
também as complexidades e as diversidades das necessidades sociais. Entretanto, existem
desafios a serem superados.
Nesse sentido, apresentamos a seguir a perspectiva dos sujeitos desta pesquisa a
respeito do SUAS, a partir do trabalho desenvolvido pelos CRAS, dentro de uma conjuntura
composta por mudanças, avanços, persistências e resistências, mas que tem como objetivo o
alcance da efetivação da assistência social enquanto um direito.
Almejando maior clareza na realização de nossas reflexões e análises, optamos pelas
criação de categorias analíticas. Para tanto, estabelecemos sete categorias de análises, sendo
elas:
Categoria de análise I - O cotidiano do CRAS: a porta de entrada para a política de
assistência social;
Categoria de análise II - Principais vulnerabilidades e riscos sociais presentes no
território: Demandas de trabalho;
Categoria de análise III - Os usuários do SUAS e o controle social;
Categoria de análise IV - O trabalho social com famílias;
Categoria de análise Categoria de análise V - O trabalho em rede;
Categoria de análise VI - Os caminhos da assistência social: qual a contribuição do
SUAS?;
Categoria de análise VII - Assistência Social: Um direito efetivado?
3.2 O Cotidiano do CRAS: A Porta de Entrada para a Política de Assistência Social
O CRAS é uma unidade pública estatal responsável pela oferta dos serviços de
proteção social básica. Por ser considerado referência para o desenvolvimento dos serviços
socioassistenciais em todo o seu território de abrangência, podemos afirmar, de acordo com a
PNAS (2004) que o CRAS é a principal porta de entrada do SUAS.
102
Sendo assim, indagamos os profissionais sobre o conhecimento que a população tem
acerca do trabalho desenvolvido pelo CRAS, com a finalidade de identificarmos se é possível
afirmar que o CRAS vem sendo uma referência para a população.
Eu acredito. Primeiro por que é feito um trabalho de divulgação do direito da
assistência social. Então desde que começou em 2009 a gente já sabia do
trabalho que era feito e hoje todo cidadão tem conhecimento que existe um
CRAS, que está localizado no centro do município. E assim, devem ser
muitas poucas pessoas que não teve acesso ainda, que não conhece o
trabalho. Porque a gente sempre faz um trabalho não só voltado para o nosso
público, mas para toda a comunidade. Então a gente leva isso pra população,
nas buscas ativas que a gente faz, nos eventos que a gente faz. Que o CRAS
está aqui e que nós estamos de portas abertas para o que eles tiverem
duvidas, ou para orientações, ou para qualquer outro serviço que eles
quiserem ter acesso, que procurem a gente e que se não for competência
nossa, a gente encaminha para onde tem que ser encaminhado. Jamais um
usuário vai entrar por essa porta sem orientação e a gente vai deixar ele ir
embora perdido, a gente vai encaminhar, orientar certinho o que ele deve
fazer, aonde ele deve buscar essa solução. (CRAS I, 2015)
Sim, eu acho que sim, com certeza. Porque assim, todo nosso trabalho é
divulgado, e nós [...] sabemos da grande responsabilidade em executar né?
Cada um sabe do compromisso que é trabalhar no CRAS e executar essa
política né? de assistência social, então, eu acredito que temos executado e
temos assim divulgado bastante o nosso trabalho, ele é bem conhecido na
cidade. (CRAS III, 2015)
Para população é sim, a com certeza, eu acredito que sim. Considera muito...
não só eles como todo política né? No município toda política pública: a
saúde, a educação... É tudo no CRAS. (CRAS II, 2015)
Eu acredito que sim, todo mundo conhece, todo mundo vem procurar a gente
e, às vezes não vem procurar só às vezes, o atendimento do CRAS eles vem
tirar outras informações com a gente também, que a gente pode estar
ajudando, a gente sempre ajuda. Todo mundo conhece, é bem visado, ele é
um pouco afastado da cidade, mas todo mundo conhece, sabe do trabalho
sim. (CRAS IV, 2015)
De acordo com a perspectiva dos trabalhadores do SUAS, sujeitos desta pesquisa, é
possível afirmar que o CRAS é uma referência para a população, pois os munícipes sempre
procuram pela equipe do CRAS para obter informações sobre os direitos sociais, para ter
acesso aos serviços, aos programas, aos projetos e aos benefícios ofertados e também para
acessar a rede intersetorial.
No que tange às principais demandas do CRAS, solicitadas pelos usuários,
encontramos realidades diversas. O CRAS I apontou como principal demanda apresentada
pelos usuários o acesso às informações sobre os seus direitos.
103
Parte de orientação. As pessoas procuram no CRAS uma orientação, muito
mais do que benefício eventual. Ela quer saber qual o direito que ela tem, de
qual benefício do INSS, por que ela quer ser esclarecida. Tem sim
rompimento de vínculos, tem várias demandas, mas a busca por orientações
é a maior delas. Acesso ao BPC, acesso ao auxílio-doença, elas buscam
ondem tem que ir, o que tem que fazer, elas tem essa visão, de que ela vão
vir aqui e sair com uma resposta, sabendo aonde tem que ir, com quem tem
que falar, o que eu preciso. (CRAS I, 2015)
Depararmo-nos com realidades como esta é bastante significativo. Por tantos anos a
assistência social esteve atrelada ao assistencialismo, à concessão de bens materiais, então, ao
identificarmos que em alguns lugares esta visão sobre a assistência social vem sendo
modificada é algo positivo que nos leva a acreditar que o SUAS está contribuindo para
mudanças, especialmente, por meio do trabalho dos CRAS.
Ao considerarmos o CRAS como a porta de entrada para o SUAS e identificarmos que
a principal demanda posta pelos usuários está relacionada à informações sobre o acesso aos
direitos, é possível afirmar que estão sendo construídos vínculos entre a equipe de referência e
a população e que, conforme expôs o CRAS 1, o CRAS vêm sendo a ponte entre o usuário e o
direito social.
Então a gente sabe que está ali de pivô entre o usuário e o direito e toda a
rede em volta, então é você que tem que fazer a articulação alí para poder
levar esse direito até o usuário. (CRAS I, 2015)
Entretanto, esta não é a realidade de todos os CRAS, tanto que os demais CRAS que
participaram desta pesquisa ainda contam com outras demandas por parte dos usuários.
Relataram que as principais demandas por parte dos usuários estão relacionadas ao
acesso aos Programas Sociais, aos Benefícios Eventuais e aos cursos que são ofertados.
Inclusão em programas sociais né? Bolsa, renda e ação. Ultimamente que a
energia aumentou eles buscam a tarifa social de energia, que é para ter o
desconto, encaminhamentos esporádicos para INSS, BPC e participar dos
cursos. (CRAS III, 2015)
Benefício eventual ou participação em algum programa, ou é bolsa família,
ou é renda cidadã, ou é ação jovem, um programa de moradia, mas é sempre
no âmbito do benefício social mesmo, do benefício em si, não é nem o
trabalho sócio educativo. (CRAS II, 2015)
É a questão dos programas e cursos também, cursos eles sempre procuram,
às vezes eles até procuram cursos que a gente não oferece aqui, mas eles
sempre vêm aqui procurar cursos. (CRAS IV, 2015)
104
Considerando a existência dos programas de transferência de renda enquanto “carro
chefe” do governo atual, é possível compreender esta demanda que surge por parte dos
usuários.
Desta forma, é possível refletir sobre a possibilidade do CRAS utilizar estas demandas
de forma estratégica, utilizando os Programas Sociais para além de meio de “transferência de
renda”, mas também como alternativa importante para o desenvolvimento do trabalho de
proteção social básica, ou seja, para o desenvolvimento do trabalho social com as famílias, o
que pode “[...] funcionar como uma espécie de alavanca para incluir no circuito dos bens,
serviços e direitos existentes na sociedade, grupos sociais injustamente impedidos dessa
participação.” (PEREIRA, 2001, p. 226). Afinal:
Acredita-se que qualquer estratégia que busque a superação da pobreza passa
necessariamente pelas pessoas, e que para desenvolver estratégias
sustentáveis e efetivas é necessário alterar [...] condições limitadoras,
investir no empoderamento das pessoas, no desenvolvimento de sua
autonomia, competência e capacidade de autodesenvolvimento, visando a
ampliação de sua capacidade de ação. Sem alterar essa dimensão, não é
suficiente alterar condições objetivas, prover bens e serviços, investir em
infra-estrutura ou alterar condiçõesmacroeconômicas, uma vez que os
resultados não serão efetivos ou sustentáveis no longo prazo (CARNEIRO,
2005, apud RAMOS, 2008, p. 45).
Nesse sentido ressaltamos sobre a importância de utilizarmos os espaços existentes no
cotidiano do trabalho do CRAS para se efetivar uma intervenção profissional crítica,
Consideramos que o trabalho com os grupos de familias beneficiárias dos Programas Sociais
pode ser estrategicamente caracterizado enquanto um desses espaços. Dentro desta
perspectiva, destacamos a relevância da dimensão educativa do trabalho desenvolvido com as
familias beneficiárias dos programas sociais, conforme detalharemos mais adiante quando
abordaremos o trabalho social com as famílias.
Em relação às principais demandas que chegam ao CRAS por parte da gestão, o
CRAS afirmou que estão relacionadas à parte burocrática.
A parte burocrática. Os relatórios. Todo procedimento gera um papel. Então
o burocrático dos grupos, o burocrático dos atendimentos, o burocrático
mensal para o Órgão Gestor, fora o que a DRADS solicita, a alimentação de
sistema, registro em prontuário. Então é muita coisa para ser registrada e as
vezes você perde muito tempo registrando. Você se enrola no registro e as
vezes fala: Amanha tenho que executar tal grupo, eu tenho que planejar a
atividade. Então, às vezes você se atropela para executar. É muito
105
desgastante. E a gente tem mais dificuldade para fazer o burocrático do que a
prática. (CRAS I, 2015).
Estas demandas estão relacionadas ao sistema de avaliação e monitoramento das ações
da assistência social, previsto pelo SUAS. Desta forma, o registro dos atendimentos e a
alimentação dos sistemas são de suma importância para que se tenha um retrato concreto da
realidade da assistência social no município, o que poderá contribuir para a avaliação e o
aprimoramento de todas as ações desenvolvidas.
Já o CRAS III e o CRAS II acreditam que a principal demanda da gestão está
relacionada à qualidade do serviço prestado, além da realização do acompanhamento familiar.
Há... Que a gente execute bem né? Nosso trabalho que atenda... Um serviço
qualificado né? Que ofereça um serviço de qualidade, que os usuários saiam
satisfeitos né? satisfeitos e que realmente tenha impactos né? na vida de
quem vem procurar nossos serviços. (CRAS III, 2015).
Acompanhamento né? Eu acho que para a lei valer o que é mais necessário é
o acompanhamento. O que mais a gestão pede para nós? No caso até esses
dias eu estava em visita né? Então seria essa questão de visita, mas agora,
agora como esta mudando a gente está em mudança aqui no CRAS, seria
acompanhamento familiar né? [...] Seria o atendimento, benefício né..
acompanhamento para que a pessoa volte sempre, a questão do atendimento
CAD único que até a um tempo atrás estava bem tumultuado, bem difícil [...]
e não da tempo de atender a todo mundo, e a gente tem que se desdobrar,
isso é o que a gestão mais pede, para que a gente não deixe o usuário ir
embora sem ser atendido, que atenda todo mundo, fazer acolhimento né? E
uma coisa que frisa muito é para que todo mundo saiba o serviço de todo
mundo para que todo mundo entenda um pouquinho de cada coisa aqui
dentro para a hora que a pessoa pedir uma informação a gente não deixe a
pessoa ir embora sem uma resposta, [...] mesmo que não seja eu a
responsável por aquele serviço, mas eu tenho pelo menos que saber o que é,
para informar a pessoa a gente tem que saber... (CRAS II, 2015).
E o CRAS IV apronta como principal demanda da gestão, a inclusão nos programas
sociais.
É sempre inclusão em programa social, que eles mandam assim para cá, da
gestora quase não tem, quase não vem nenhum encaminhamento, mas da
coordenadora ela sempre pede para alguém me procurar para inclusão em
programa social mesmo. (CRAS IV, 2015).
Logo após a criação da PNAS em 2004 e a instituição do SUAS em 2005, no ano de
2006 foi publicada a Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do SUAS – NOBRH/SUAS.
106
De acordo com a NOB-RH/SUAS os CRAS com até 2500 famílias referenciadas
(como é o caso dos CRAS visitados) devem contar com a seguinte equipe mínima: 01
coordenador, 02 técnicos de nível médio e 02 técnicos de nível superior, sendo 01 assistente
social e o outro, preferencialmente, 01 psicólogo. A NOB-RH/SUAS trata também do perfil
e das atribuições de cada um dos integrantes desta equipe mínima.
Considerando os direcionamentos normativos do SUAS, solicitamos aos sujeitos da
pesquisa que apresentassem as atribuições dos componentes da equipe mínima do CRAS,
para que fosse possível conhecer a organização do trabalho dos CRAS visitados.
Ao abordarmos sobre o papel desenvolvido pelo Coordenador do CRAS:
Direcionar a equipe, estudar junto com a equipe, planejar junto com a
equipe. Conhecer o território, quais as necessidade do território, do nosso
público. É tanta coisa, envolve capacitação constante, a busca de solução de
problemas junto com a equipe. Entender a necessidade de cada profissional e
a diferença de cada profissional enquanto formação, enquanto personalidade
e saber lidar com isso, tentar tirar o máximo de cada um. Aproveitar o
máximo, porque às vezes um não tem facilidade em algo que o outro tem lá
suas dificuldades, mas que ambos se complementam, então, isso é o mais
difícil, eu acredito: tentar levar o clima de trabalho confortável, que seja
harmônico. (CRAS I, 2015).
Um elemento interessante destacado pelo CRAS I está no trabalho em equipe,
conforme podemos observar na fala acima, o coordenador direciona a equipe, mas não
escolhe sozinho a direção a ser tomada, o trabalho se dá por meio de uma construção
conjunta.
Na organização né, como que vai funcionar o trabalho da equipe, e na
organização mesmo, nessa dimensão, porém, isso seria o que deveria ser,
mas de fato não é isso, de fato eu tenho essa... Esse nome de coordenação,
mas dai eu tenho atribuição de execução, de secretária, é isso. [...] acabo
fazendo trabalho administrativo [...] atendo, sou assistente social [...] (CRAS
II, 2015).
Neste caso, é possível identificar que o coordenador encontra-se com uma sobrecarga
de tarefas, devido ao acúmulo de funções. Além das demandas da coordenação, o
coordenador também realiza trabalho administrativo e o atendimento ao público.
Ham... é muita mistura, porque é muita coisa ao mesmo tempo, assim, às
vezes eu me sinto... é... Não sufocada, porque eu gosto do que eu faço, só
que quando eu sento para ver, parece que eu não consigo fazer como eu
gostaria de fazer entendeu? Não fica tudo do jeito que eu gostaria que fosse.
(CRAS II, 2015).
107
O MDS elaborou alguns materiais que direcionaram a implantação dos CRAS no
território, nestes recomenda-se que o coordenador seja um profissional com funções
exclusivas:
Uma das funções principais do coordenador é articular as ações junto à
política de Assistência Social e às outras políticas públicas visando
fortalecimento da rede de serviços de Proteção Social Básica. Assim,
recomenda-se que seja um profissional com funções exclusivas. Se este
profissional tiver de articular e pensar estratégias para que a equipe possa
trabalhar bem, e ainda, trabalhar direto com as famílias haverá uma
sobrecarga de funções e, conseqüentemente, uma queda na qualidade dos
serviços prestados, o que justifica a impossibilidade do coordenador ser da
equipe técnica. (MDS, 2009, p. 64).
Desta forma, o acumulo de funções do coordenador do CRAS II, podem influenciar na
qualidade do trabalho desenvolvido.
No tocante ao papel desenvolvido pela equipe técnica de nível superior:
Na verdade é assim, quando a gente chega pra trabalhar na política de
assistência, cada profissional com cada graduação a gente acha: Eu sou a
assistente social do CRAS (antes de conhecer a política). Aí você vem pra
política, passa se interagir com esta política e se coloca no lugar de Técnico
de Nível Superior da Política. Aí você percebe que o psicólogo trabalha
junto com você para fazer o mesmo papel, que um necessita do outro, que eu
não tenho todo aquele conhecimento que eu precisaria ter para poder atender
uma demanda que chega aqui e ai é ela que me completa. (CRAS I, 2015)
Então eu trabalho com grupos nas oficinas que são implementadas aqui, a
gente tem muitas oficinas, eu faço grupo com eles, trabalho em atendimento
individual com as pessoas que entram e deixam os programas que têm aqui.
Também faço, eu executo palestras, visitas domiciliares, busca ativa junto
com a assistente social, visitas junto com a assistente social, pessoas novas
que entram nos programas a gente faz visita, acompanhamento familiar
também a gente faz. (CRAS III, 2015).
A perspectiva da interdisciplinaridade é uma das orientações do SUAS, os materiais
disponibilizados pelo MDS trazem informações e direcionamento sobre este tipo de trabalho,
de forma que os técnicos de nível superior venham a realizar um trabalho conjunto, sem
segmentar o atendimento prestado à população.
A interdisciplinaridade é um processo de trabalho recíproco, que
proporciona um enriquecimento mútuo de diferentes saberes, que elege uma
plataforma de trabalho conjunta, por meio da escolha de princípios e
conceitos comuns. Esse processo integra, organiza e dinamiza a ação
cotidiana da equipe de trabalho e demanda uma coordenação, a fim de
organizar as linhas de ação dos profissionais em torno de um projeto comum.
(MDS, 2009, p. 65).
108
Porém, “[...] salienta-se que o trabalho em equipe não pode negligenciar a definição de
responsabilidades individuais e competências. Deve-se buscar identificar papéis, atribuições,
de modo a estabelecer objetivamente quem, dentro da equipe interdisciplinar, encarrega-se de
determinadas tarefas.” (MDS, 2009, p. 65).
Desta forma a formação de cada profissional que compõe a equipe técnica é de suma
importância, pois cada um com os seus conhecimentos específicos, poderão contribuir para a
compreensão das demandas que chegam até o CRAS e então colaborar com o planejamento
das estratégias para o atendimento às famílias.
Em relação aos técnicos de nível médio, nos deparamos com diversas nomenclaturas e
funções:
Eu sou técnico de nível médio e trabalho com o cadastramento para os
programas sociais, as vezes também na recepção. O usuário chega aqui,
mesmo que ele tenha o conhecimento apenas de um benefício social, que ele
tem o interesse, a gente sempre faz o cadastramento no Cadastro Único e no
Pró-Social, sempre orientando também né, sobra a Carteira do Idoso, a
Tarifa Social, sempre assim, o que puder fazer, a gente orienta o usuário.
(CRAS I, 2015).
Agente administrativo, e fico no acolhimento das famílias aqui, realizo o
cadastro único, entrevistadora, e operadora de sistema e dentre outras coisas,
faço oficio, inscrições. Auxílio os técnicos também, nos cadastros
únicos.(CRAS III, 2015).
Temos dois auxiliares administrativos, que é assim: eles fazem as listas de
presença né? Tiram fotos e fazem atendimento ao público também no caso,
além de fazer todas essas coisas elas fazem entrevistas do CAD único. E tem
a digitadora, que é uma das auxiliares. Tem um entrevistador especifico
também do Cadastro Único, ele só faz isso, só faz as entrevistas do CAD
único. [..] Aí tem a recepcionista que ela faz antes de qualquer pessoa vim
aqui com a gente ela vai conversar com eles, vai perguntar o que eles
querem, e vai orientar, se necessário ela manda para a gente, caso contrário
não. Ela já orienta ali mesmo. (CRAS IV, 2015)
Em consonância com as orientações do MDS, os técnicos de nível médio, dentro das
diversas funções apresentadas, auxiliam a equipe técnica e realizam o trabalho administrativo,
em especial os cadastramentos das famílias. Por estarem em constante contato com a
população, os técnicos de nível médio também orientam as famílias sobre os seus direitos, ao
longo dos atendimentos.
Entretanto, é preciso refletir sobre o relato a respeito das atribuições da recepcionista
do CRAS IV. Para tanto recorremos ao material publicado pelo MDS de Orientações técnicas
sobre o Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (PAIF).
109
A recepção é o momento no qual a família recebe a primeira atenção ao
adentrar no CRAS. [...] Ela pode ser realizada por funcionários (as) de nível
médio. Esses técnicos devem ser capacitados, de forma continuada, para que
compreendam esse momento como um direito da família, respondendo suas
demandas de forma solícita e respeitosa. [...] Nessa etapa, o funcionário,
devidamente capacitado, pode repassar algumas informações básicas [...],
coletar algumas informações essenciais sobre a família ou algum de seus
membros que está em busca de atendimento (exemplo: nome do responsável
familiar, nº dos documentos de identificação, nº do NIS, composição
familiar, endereço, entre outros), agendar atendimento com os técnicos de
nível superior, entre outros. [...] Todas essas informações subsidiarão a
acolhida realizada pelo técnico de nível superior, da equipe de referência do
CRAS, que poderá ocorrer em seguida à recepção ou ser agendada para
momento posterior, conforme urgência que o atendimento requer e o fluxo
de atendimento que deve ser estabelecido pelo Serviço, em cada CRAS.
(MDS, 2012b, p. 20).
Cabe aqui destacar, que “[...] a acolhida das famílias, dada às características e
responsabilidades, compõe atividade exclusiva dos profissionais de nível superior da equipe
de referência do CRAS.” (MDS, 2012b, p. 19), pois deve se constituir numa oportunidade para
conhecer a realidade da família que buscou pelo atendimento do CRAS, além de proporcionar
uma possibilidade para o estabelecimento de vínculos entre a família e a equipe técnica de
referência.
A acolhida é, na maioria das vezes, o processo de contato inicial de um
indivíduo ou famílias - não raras vezes é o primeiro contato “qualificado” da
família com o SUAS. Consiste no processo inicial de escuta das
necessidades e demandas trazidas pelas famílias, bem como de oferta de
informações sobre as ações do Serviço, da rede socioassistencial, em
especial do CRAS e demais políticas setoriais. (MDS, 2012b, p. 17).
Desta forma, o espaço da recepção não pode ser considerado o melhor lugar para que
este atendimento aconteça. “Destaca-se que o espaço reservado para a recepção e a postura do
profissional responsável por este primeiro atendimento [...] deve ser conduzido de modo a não
se transformar em um momento vexatório aos usuários, preservando o sigilo das informações
prestadas.” (MDS, 2012b, p. 20).
A recepção desenvolve um papel muito importante no CRAS, entretanto deve-se
garantir uma acolhida qualificada, realizada pelos técnicos de nível superior, evitando que a
família venha expor sua situação diante dos demais usuários que estão aguardando pelo
atendimento e possibilitando que o processo de escuta qualificada contribua para a melhor
qualidade do serviço prestado.
Dentre os técnicos de nível médio, encontram-se também as funções de orientador
social e facilitador de oficinas:
110
É feito toda uma preparação, um estudo da função e do que deve ser
passado, no caso do Ação Jovem, a gente segue os cadernos, que é estar
passando sobre cidadania, sobre o meio ambiente, sobre cultura, história e
lazer de forma didática, que não seja cansativa para os usuários que estejam
aqui, por que por mais que eles recebem um benefício, eles não tem essa
obrigação de estar ouvindo o tempo todo algo que seja muito teórico. Então
a gente passa o mais lúdico possível. [...] O Orientador Social do Serviço de
Convivência faz o trabalho com aquele público que ele é destinado, porque
têm vários públicos: tem o das crianças de 06 a 09 anos, de 10 a 12 anos, de
13 à 14 anos, de 15 à 17 anos e tem também o orientador do PAIF, que ele
abrange a família. Cada orientador tem o seu grupo. (CRAS I, 2015)
Nas realidades dos municípios visitados, quando há a presença de orientador social e
facilitador de oficinas, estes são contratados por meio de processo seletivo. Entretanto, há
municípios, como é o caso do CRAS III, onde quem realiza todo o trabalho com os grupos e
coletivos específicos, são os técnicos de nível superior.
3.3 Principais Vulnerabilidades e Riscos Sociais Presentes no Território: Demandas de
Trabalho
Retomando a discussão sobre a territorialização, é importante ressaltar que o estudo do
território é indispensável para que o município possa conhecer melhor a realidade local, suas
características, os principais pontos de vulnerabilidade e as principais potências; porém, para
que se alcance este resultado, é necessário ter clareza de que a territorialidade representa
muito mais do que um espaço geográfico.
Os territórios são espaços de vida, de relações, de trocas, de construção e
desconstrução de vínculos cotidianos, de disputas, contradições e conflitos,
de expectativas e de sonhos, que revelam os significados atribuídos pelos
diferentes sujeitos. É também o terreno das políticas públicas, onde se
concretizam as manifestações da questão social e se criam os
tensionamentos e as possibilidades para seu enfrentamento. (BRASIL, 2008,
p. 53, grifo do autor).
Abordamos os coordenadores dos CRAS sobre a existência de um estudo do território
que norteie as ações na área da assistência social, ou até mesmo que nortearam o processo de
implantação dos CRAS.
Durante o processo de implantação foi realizado um mapeamento com base
nos dados do IBGE e dos Cadastros para Programas Sociais (Cadastro Único
e Prosocial) tabulando os dados com base nos indicadores disponíveis
111
(renda, serviços e políticas existentes no território, condições de habitação,
entre outros). (Coordenador do CRAS I, 2015).
Existe um diagnóstico parcial da área de abrangência do CRAS, refere-se
aos programas sociais. As ações de monitoramento e avaliação do CRAS são
realizadas por meio do controle de frequência, acompanhamento das ações e
da qualidade do serviço ofertado. (Coordenador do CRAS III, 2015).
Em relação ao monitoramento e a avaliação das atividades:
Sim. As ações são monitoradas e avaliadas por meio reuniões técnicas
mensais e semestrais para reavaliação do Plano de Ação, além de visitas nos
serviços. Para o mapeamento do município utilizamos as informações do
Cadastro Único identificando qual a porcentagem de usuários por rua e qual
região concentra a maioria dos beneficiários. Ainda, definimos com base nas
informações das listas de pagamento quais famílias são prioritárias para a
atualização cadastral; através do censo suas avaliamos e estabelecemos
metas para melhoria na oferta dos serviços e as principais deficiências das
unidade. (Coordenador do CRAS I, 2015).
O município utiliza os dados da gestão de informação do SUAS para
planejar, monitorar e avaliar as ações. O atendimento individualizado, as
visitas domiciliares, a busca ativa, o trabalho socioeducativo e os cursos são
realizados com base nas vulnerabilidades sociais levantadas por meio do
Cadastro Único, do Programa Bolsa Família, do BPC, da Rede SUAS e do
Censo SUAS. (Coordenador do CRAS III, 2015).
A partir da territorialização é possível realizar uma análise crítica do cotidiano e um
estudo cultural sobre a população do território. Tal procedimento pode contribuir para que a
formulação das políticas públicas venha ao encontro das reais necessidades locais, podendo,
assim, contribuir com a inclusão social, com a qualidade de vida, com a resolução dos
problemas concretos da população, existentes em determinado território, além de contribuir
para a construção da divisão territorial que identifique conjuntos populacionais em situação
similar.
Conforme apresentado na PNAS:
Dirce Koga afirma que “os direcionamentos das políticas públicas estão
intrinsecamente vinculados à própria qualidade de vida dos cidadão. É no
embate relacional da política pública entre governo e sociedade que se dará a
ratificação ou o combate ao processo de exclusão social em curso. Pensar na
política pública a partir do território exige também um exercício de revista à
história, ao cotidiano, ao universo cultural da população que vive neste
território [...]. A perspectiva de totalidade, de integração entre os setores para
uma efetiva ação pública... vontade política de fazer valer a diversidade e a
inter-relação das políticas sociais” (KOGA, 2003, p. 25 apud BRASIL, 2005,
p. 44).
112
Partindo desta lógica, pedimos aos sujeitos da pesquisa que relacionassem o perfil dos
usuários do CRAS com a realidade territorial, tentando identificar quais as principais
vulnerabilidades e riscos sociais existentes.
Quando a gente começa a analisar o território e a gente vê o que a gente tem
nesse território em questão de vulnerabilidade, a gente tem uma
característica, como é um município pequeno e ele tem uma infraestrutura
muito boa, o acesso ao saneamento é muito bom, o acesso à saúde tem suas
mazelas, mas ainda assim é bom, a educação também, tem lá os seus
problemas na questão de vagas de acesso à creche... Só que assim,
analisando o território, a questão de emprego, a nossa região aqui é
composta por usina, cana de açúcar, agropecuária, comércio é muito pouco,
prefeitura, então o nosso publico, o que vem aqui no CRAS ou é para acesso
a algum direito mesmo, ou é aquele trabalhador que está em período de
entressafra e ele precisa de vir aqui para acesso a algum benefício, ou algum
auxílio. (CRAS I, 2015).
Por se tratar de uma região com a instalação de muitas usinas sucroalcooleiras, de
acordo com os relatos, é possível identificar que estas usinas são de grande importância para a
geração de empregos não só nos municípios onde estão instaladas, mas para os municípios
vizinhos também, porém, no período entressafra, estas famílias, devido à ausência de trabalho,
acabam recorrendo aos serviços da assistência social.
Ao mesmo tempo, os empregos gerados não vêm sendo suficientes para atender toda a
demanda por emprego e a situação do desemprego é algo marcante na região. Podemos
observar que as oportunidades de empregos são restritas, com algumas possibilidades nas
usinas, no comércio local, na zona rural ou nas prefeituras.
É a falta de emprego né? Porque as maiorias dos empregos estão vinculados
a prefeitura, comercio tem pouco, então assim, ou eles saem para fora, para
cidades vizinhas... é as cidades vizinhas que tem usina né? ou é um
trabalhador do campo. (CRAS III, 2015).
Prefeitura... né? O comércio local e usina, as usinas da região... É o que tem,
porque aqui não tem nenhum distrito industrial, não tem indústria não é mais
isso mesmo, não tem muita opção. (CRAS IV, 2015).
A presença dos imigrantes também é uma característica em destaque. Na busca por
melhor qualidade de vida, muitas pessoas deixam o seu Estado de origem para trabalhar nas
usinas sucroalcooleiras, conforme discutem estudiosos do assunto:
[...] entendendo a região Sudeste, ou mais especificamente o estado de São
Paulo, como área de atração para o migrante devido à grande demanda por
força de trabalho exigida no corte da cana-de-açúcar; e na medida em que
esta ocupação possa oferecer uma remuneração superior a qual este
trabalhador poderia receber na área de onde provém. E a região Nordeste,
113
[...] como área de expulsão, devido à falta de alternativas de emprego a
vários trabalhadores rurais [...] que se veem obrigados a vender sua força de
trabalho no corte da cana-de-açúcar no Estado de São Paulo. (ALMEIDA;
LACERDA; SILVA, 2009, p. 4-5).
Porém, em alguns casos, acabam perdendo o emprego e com a ausência da proteção
social vinculada ao trabalho, tornam-se público-alvo da política de assistência social.
O que mais tem aqui é, até que eles comentam, é falta de emprego, né?
Desempregado. E falta de moradia é o que mais tem. E aqui acontece pela
população ser um pouco flutuante, vim gente do nordeste, então isso traz
muito prejuízo acho que para o município, não sei se seria essa a fala
“prejuízo” né? É porque eles vêm... ai hora fica desempregado, ai começa a
aparecer né? Ai não tem dinheiro para o aluguel, alimentação, então assim
isso é um ponto forte que acontece porque aqui na cidade mesmo não tem
usina, tem na região, nas cidades vizinhas, e mesmo assim vêm imigrantes
para cá. (CRAS II, 2015).
Compreendemos que estas situações acabam sendo, por muitas vezes, analisadas
pelos governantes enquanto situações que geram “custos” ao município onde o imigrante
nordestino está residindo, mas é preciso compreender esta realidade enquanto uma
manifestação da questão social:
É necessário deixar claro que a migração é um movimento determinado pela
expulsão, isto é, os trabalhadores migram quando as condições de
reprodução em seus locais de origem encontram-se comprometidas.
Considera-se expulsão todo e qualquer fenômeno social, econômico, étnicoracial, religioso, político, natural ou de gênero que comprometa as condições
de reprodução do grupo social, colocando a busca por outro local como
única alternativa para sobrevivência. (ALVES, 2007, p. 47, apud COSTA;
CLEPS, 2009, p. 11).
Desta forma, juntamente com a rede intersetorial, cabe também à política de
assistência social proporcionar proteção social a esse trabalhador e sua família, de modo a
prevenir que este processo de “expulsão” venha a ser reproduzido.
Outra característica territorial está relacionada à existência de uma Penitenciária, o que
contribui, de acordo com os participantes da pesquisa, para que algumas famílias se mudem
para o município para ficarem mais próximos ao detento, tornando-se então público-alvo da
política de assistência social.
Devido ao presidio também nós temos essa dificuldade, porque vem tudo
né? O detento está aqui ai vem às famílias depois o detento vai embora, ai
muitos não vão embora fica aqui, ai depende do CRAS para ir fazer a visita,
porque tem o ônibus municipal que leva uma vez por mês essas famílias a
outros presídios para visita [...]. (CRAS II, 2015).
114
Identificamos também a questão do trabalho informal. Em um país como o Brasil,
onde o sistema de seguridade social está muito mais atrelado à lógica do seguro, que à logica
social, encontramos na informalidade laborativa uma vulnerabilidade social muito forte nos
territórios.
Tem os pescadores também, é aqui tem as famílias que trabalham com a
geração de renda com a pesca, e o trabalho informal né? É o trabalho
informal que da muita abertura, por exemplo, hoje tem renda, amanha não
tem, e ai eles estão assim, eles procuram o setor por essa insegurança.
(CRAS III, 2015).
A informalidade laborativa acaba colocando a família em situação de riscos, pois o
trabalhador, por estar desprotegido da cobertura previdenciária não terá nenhuma proteção
caso venha a sofrer algum imprevisto com a sua saúde ou até mesmo com a ausência de
oportunidades de trabalho para ter acesso à renda.
Com base nas falas dos sujeitos desta pesquisa, podemos compreender, de acordo com
o ponto de vista dos mesmos, que as principais vulnerabilidades sociais presentes nos
territórios de abrangência dos CRAS estão diretamente relacionadas com o mercado de
trabalho, ou seja, pela questão da informalidade e até mesmo pelo desemprego.
Estas vulnerabilidades se agravam ao considerarmos as especificidades dos territórios
em questão, como é o caso da existência de penitenciárias e até mesmo a presença dos
imigrantes nordestinos, que acabam contribuindo para um crescimento do número de
habitantes desses pequenos municípios, sem que os mesmos tenham infraestruturas adequadas
para garantir o acesso aos direitos sociais a todos os munícipes.
Ao tratarmos das demandas para a assistência social, considerando as características
regionais e nos depararmos com a questão do desemprego, da informalidade, por fim, da
ausência da proteção social que é legalmente garantida por meio do Sistema de Seguridade
Social Brasileiro, encontramos elementos importantes que precisam ser discutidos.
Conforme já abordamos no capítulo 1, o Sistema de Seguridade Social Brasileiro não é
suficientemente capaz de garantir a universalidade da proteção social. Behring e Boschetti
(2007), nesse sentido, acreditam que em nosso país, a Seguridade Social foi pensada sob a
perspectiva do pleno emprego.
Sendo assim, considerando a realidade apresentada nas falas dos sujeitos, marcada
pelo desemprego, nos deparamos com uma parcela da sociedade que fica excluída da proteção
social garantida pelo Estado, pois, enquanto a política de previdência social protege os
trabalhadores que contribuem, a política de assistência social, no que se refere à oferta da
115
segurança de rendimentos tem como público prioritário os idosos, a partir dos 65 anos de
idade e as pessoas com deficiência, incapacitados para o trabalho, a partir da instituição do
Benefício de Prestação Continuada (BPC), que tem como critério a renda familiar per capta
inferior à ¼ do salário mínimo e garante 1 salário mínimo de benefício mensal.
Nesta lógica de proteção social existe uma lacuna, composta por uma parcela da
população que fica às margens das duas políticas públicas, tanto da previdência como da
assistência social, que são as pessoas em situação de desemprego, de emprego informal,
enfim, pessoas em idade ativa, com a faixa-etária entre 16 e 64 anos de idade, aptos ao
trabalho, entretanto, sem acesso ao emprego.
A este público a política de assistência social oferta a segurança de acolhida e a
segurança de convivência, por meio dos serviços assistenciais e restringe o acesso integral à
segurança de rendimentos, que acaba sendo efetivada apenas por meio da oferta de benefícios
eventuais, que precisam ser regulamentados por meio de Lei Municipal e os programas de
transferência de renda, que não possuem caráter permanente, nem mesmo aparato legal, sendo
apenas um Programa de governo.
Em um dos grupos focais realizados, identificamos uma fala que retrata um pouco
deste perfil de público da assistência social, mas que acaba sendo compreendido de outra
forma:
A maioria foi como eu te falei, eles vêm por causa do desemprego, eles vêm
sempre procurando algum beneficio social [...]A gente sabe também que tem
gente que não gosta de trabalhar né? Que fica dependente de beneficio
social, infelizmente é a realidade, eles se acomodam e não querem trabalhar,
mas a maioria do pessoal é pelo desemprego ou aqueles que acham que tem
direito de receber também, às vezes tem uma condição boa, mas acha que
porque outra pessoa recebe, acha que tem o direito e quer vir aqui receber
também. (CRAS IV, 2015).
Este conteúdo nos leva a refletir sobre até que ponto a assistência social é
compreendida enquanto um direito social nos dias atuais, e sobre este questionamento,
encontramos um conteúdo interessante:
A especificidade do direito constitucional de assistência social brasileiro é a
medida (peso) em que tal direto é regido pela Lógica Contributiva da
Seguridade Social e pela Lógica não Contributiva da Seguridade Social. Se
regido pela Lógica Contributiva da Seguridade Social, a proteção social do
indivíduo estará no mercado participando das relações mercantis de trabalho
para comprar produtos e serviços, ou quando da ausência de tais meios,
estará nas formas tradicionais de proteção social (caridade, tutela, família).
Se regida pela Lógica não Contributiva da Seguridade Social, independente
do trabalho ou da contribuição prévia, o indivíduo terá a sua proteção social
116
assegurada pela sociedade, por meio do Estado. O peso de cada uma dessas
lógicas irá determinar a universalização ou seletividade do direito.
(FREITAS; CARIAGA, 2014, p. 65).
Destacamos a importância desta “medida (peso)” tão bem apresentada pelo autor.
Precisamos ter clareza de que no Brasil não existe o pleno emprego, e desta forma,
consequentemente, existe uma parcela da sociedade que não tem acesso ao trabalho, o que
não pode ser denominado como “acomodação” ou simplesmente como escolha da população
em depender da política de assistência social. Ao lançarmos este olhar ao usuário que se
encontra em idade ativa para o trabalho, estamos na verdade reforçando o papel histórico da
assistência social, voltado para a caridade, para o favor, pois estaremos acreditando que o
indivíduo tem o dever de trabalhar para ter acesso a produtos e serviços por meio do mercado.
É preciso destinar maior peso à lógica não contributiva da Seguridade Social quando
tratamos da política de assistência social, assim, fortaleceremos a garantia da proteção social
por parte do Estado, independente da situação do cidadão no mercado de trabalho, o que
certamente contribuirá para que a assistência social seja efetivada enquanto um direito do
cidadão e dever do Estado.
Discutindo ainda sobre territorialização, a PNAS (2004) aponta que os municípios de
pequeno porte I contam, geralmente, com uma ampla área de zona rural, nesse sentido,
indagamos às equipes dos CRAS sobre a cobertura do atendimento, no intuito de
identificarmos se está sendo possível atender a todo o território de abrangência do CRAS, ou
seja, no caso dos municípios de pequeno porte I, toda a zona urbana, zona rural e os distritos,
quando for o caso.
Não consegue enxergar tudo, mas tudo que chega até nós, ou que a gente
busca lá fora a gente consegue atender. Lógico, nossa cidade é pequena, mas
a demanda de trabalho é grande e na questão do atendimento, a gente faz o
possível para atender todo o território, seja zona rural ou urbana. A
facilidade de trabalhar em um município pequeno é que todo mundo conhece
todo mundo. As vezes a gente não consegue enxergar o que está acontecendo
pela busca ativa e a pessoa não vem até aqui, mas o vizinho dela vem, ou o
parente dela vem, então de uma maneira ou de outra a gente sempre acaba
sabendo. (CRAS I, 2015).
Olha, sim, [...] sim em partes, porque tem casos que a gente não chega a
tomar conhecimento por questão de equipe, porque é equipe mínima né?
Mas assim mesmo que seja um município pequeno a gente não consegue
acompanhar todos os casos, não conseguimos enxergar toda a
vulnerabilidade, porque é muito trabalho, tem que acompanhar os programas
sociais, fazer grupos, e para acompanhar, se a gente for por na ponta do
lápis, se torna assim, um trabalho muito extenso para poucos profissionais,
que no caso seria o psicólogo e o assistente social. (CRAS III, 2015).
117
Eu acho que consegue, eu acho que quem chega aqui é atendido, é uma
demanda espontânea, pode ser em qualquer bairro, qualquer lugar... A gente
vai, mas busca ativa não, na verdade busca ativa não tem a gente ainda não
conseguiu né? [...] Acho que às vezes pode acontecer de a gente não chegar
numa pessoa, mas a gente recebeu uma denuncia de que aquela pessoa tá
precisando né? Tá. Ai a gente vai, mas não que a gente tenha diagnostico de
território, isso a gente não tem. Mas a gente trabalha a cidade como um todo,
mas se chega até nós, à gente vai até a situação. (CRAS II, 2015).
De forma geral, os CRAS estão conseguindo abranger todo o território e o fato de ser
um município pequeno acaba contribuindo para isso. Entretanto, foi destacado que quando o
CRAS conta apenas com a equipe mínima, estabelece-se um ponto dificultador para o
desenvolvimento do trabalho.
Outro ponto dificultador para que o CRAS possa atender todo o território de
abrangência, pode ser identificado na ausência de transporte próprio.
Não, não consegue, porque muitas vezes a gente não tem o transporte para ir
né? Falta esse recurso do transporte à gente não tem um carro próprio então,
não te como, às vezes não tem como ir, agora que eles começaram a liberar
de novo o transporte para a gente, mas eu fiquei muito mais de um mês
parada, que nem, tem um bairro aqui que é próximo, as vezes tinha alguma
visita eu ia fazer a pé, porque é pertinho, que é aqui do lado eu ia, mas caso
contrário não, quando era muito longe não, por falta de transporte mesmo
que a prefeitura não estava fornecendo. (CRAS IV, 2015).
Como já foi abordado anteriormente, os municípios de pequeno porte I possuem uma
característica que é a presença de uma ampla área de zona rural no território. Nesse sentido,
abordamos sobre as estratégias para atender a este público.
Falando da zona rural, no começo do CRAS em 2009, a gente fez um
levantamento na zona rural e não tinha nada. As técnicas na época fizeram
visita na zona rural todinha para montar um grupo das mulheres da zona
rural, para elas destinarem um tempo para elas [...] e aí a gente conseguiu
montar esse grupo lá na zona rural, que terminou em 2012, porque muitas se
mudaram, uma veio para cidade, a outra foi embora e aí o custo de
profissional para manter lá uma vez por semana era inviável. Mas a gente
tinha esse trabalho e elas não faltavam, elas gostavam muito, agora a gente
não tem mais. (CRAS I, 2015).
Esta é uma experiência interessante, o fato de a equipe de referência se deslocar até os
pontos mais distantes e de difícil acesso do território certamente é um ponto facilitador para
que o trabalho com as famílias seja efetivado.
Eles vêm ate aqui... Acho que eles vêm mais que nós vamos, eles vêm sim, e
quando há algum tipo de trabalho a ser realizado a gente vai até eles sim,
mas... Mas aí é igual a gente está falando, sempre quando aparece o caso, ai
118
a gente vai até lá, agora para atender mesmo de maneira espontânea, isso ai..
Não acontece. (CRAS II, 2015).
Entretanto, nem sempre acontece um trabalho direcionado aos moradores da zona rural, ou no
próprio território rural, como explanou o CRAS II, o atendimento “in loco” acaba sendo efetivado
apenas por meio de algum encaminhamento, na maioria das vezes os usuários se deslocam até o
espaço físico do CRAS.
Outra característica da região é a presença de distritos, ou povoados ligados
administrativamente aos municípios. Neste caso o CRAS também precisa atendê-los, pois se
encontra dentro da área de abrangência, considerando que devido a existência de apenas um
CRAS nestes municípios, todo o território torna-se área de abrangência.
Aqui a gente tem povoado. A gente tem o grupo de convivência lá, que é um
grupo de artesanato que acontece todas às terças-feiras. No serviço de
convivência da Terceira Idade no CCI, a prefeitura busca eles para estarem
participando aqui. Tudo que a gente vai fazer, a gente da acesso ao
transporte para eles estarem participando. Toda a busca ativa que a gente faz
aqui no município a gente faz lá! É como se estivesse aqui, não é separado.
Todo o nosso trabalho abrange lá também. Eles não têm resistência em vir
para cá, eles adoram. Até no domingo tem que ter um ônibus para trazer eles
na feira. (CRAS I, 2015).
Tem uma assistente social lá também, uma assistente social só lá e a
psicóloga é a daqui. (CRAS III, 2015).
Em relação aos povoados e distritos, identificamos que algumas atividades são
realizadas em conjunto com o município e neste caso, disponibiliza-se transporte e outras
atividades acontecem especificamente para os moradores dos povoados ou distritos.
O CRAS III por sua vez, apontou que o município disponibiliza 01 assistente social
para atender o distrito e no caso a psicóloga do CRAS contribui com a execução das
atividades.
Uma das ações que deve ser desenvolvida pelo CRAS no seu território de abrangência
é a busca-ativa. “A busca ativa refere-se à procura intencional, realizada pela equipe de referência do
CRAS, das ocorrências que influenciam o modo de vida da população em determinado território.”
(MDS, 2009, p. 31)
Quando se busca, se busca algo, tem o seu objetivo. O município faz busca
ativa. Quando chega uma listagem de cartões não sacados do Bolsa Família e
o meu objetivo é buscar estas famílias para que elas retirem esse cartão e eu
vou atrás, e eu ligo, e eu faço a visita, eu estou fazendo busca ativa, estou
buscando um usuário para atender aquele meu objetivo, ou eu preciso fazer
um levantamento de quantos idosos estão lá no serviço de convivência e
quantos no município não estão, quantos tem cadastro e quantos não tem.
(CRAS I, 2015).
119
Rubinéia: Sim, constantemente. (CRAS III, 2015).
Entretanto, identificamos realidades em que a realização da busca ativa nem sempre é
possível:
Não... Trabalha o tempo todo, o tempo todo atrás das famílias que já estão já
com vínculos né... É porque não tem o CREAS né? Faz falta. Então tudo
chega para a gente, agora dentro do CAD único a gente está começando a
fazer a busca ativa, das famílias que estão em descumprimento, das famílias
que estão sem atualizar cadastros e ai a gente está tentando né? Esta andando
um passinho ai. (CRAS II, 2015).
Não, porque não temos transporte próprio. (CRAS IV, 2015).
Por se tratar de municípios de pequeno porte I, onde a instalação do CREAS não é
obrigatória, muitas vezes, dependendo da realidade territorial, principalmente quando esta é
marcada por diversas demandas que deveriam ser atendidas pela proteção especial, o CRAS
pode encontrar dificuldades para atender toda a demanda que recebe, e desta forma, o trabalho
de proteção social básica, acaba sendo prejudicado, como é o caso da realidade do CRAS 2.
Já a ausência de transporte próprio, também é algo que dificulta todo o trabalho do
CRAS. Considerando que a equipe do CRAS deve estar em constante contato com o
território, para conhecer sua realidade, sua cultura, as principais vulnerabilidades sociais
presentes e os recursos existentes, a utilização do veículo para acessar toda a área de
abrangência é fundamental, do contrário, a qualidade do serviço ofertado será prejudicada.
3.4 Os Usuários do SUAS e o Controle Social
A PNAS define o público usuário da assistência social enquanto um ser dotado de
direitos, diferindo da visão assistencialista que o colocava enquanto um ser “carente” e
“necessitado”:
Os usuários da assistência social são cidadãos e sujeitos de direitos. Sendo
assim, rejeita-se a noção de “carente”, “necessitado” e a tutela sobre os
usuários, e assume-se a perspectiva de estímulo ao desenvolvimento da
autonomia dos indivíduos, famílias, coletividade e o respeito às suas formas
próprias de organização coletiva e de intervenção social e política.
(BRASIL, 2008, p. 67).
O SUAS traz como perspectiva a acessibilidade, a autonomia, a sustentabilidade e o
protagonismo. De forma que em nenhum momento o usuário seja alvo de relações de tutela
ou subalternização.
120
Este é um momento de concretização do SUAS, a partir do paradigma da
universalização do direto, a proteção social fundado na cidadania,
abandonando idéias tutelares e subalternas, que (sub) identificam brasileiros
como carentes, necessitados, pobres, mendigos, miseráveis, discriminandoos e apartando–os do reconhecimento como “ser de direito”. (SPOSATI,
2004, p. 172).
Esta perspectiva se reforça ao recorrermos ao texto da Carta Magna de 1988, que
inovou, garantindo pela primeira vez na história da legislação do nosso país, a participação da
sociedade no controle, acompanhamento e avaliação das políticas públicas, a partir do que
denomina Controle Social.
O Controle Social surge para dar voz à sociedade civil, levando em consideração a
vivência desta frente à eficácia e as fragilidades dos serviços prestados pelo Poder Público,
conforme explica Souza:
O controle social não é apenas uma lei geral por um direito adquirido. Tratase de potencializar a criatividade da sociedade civil na elaboração das
políticas publicas, uma vez que é ela quem percebe no cotidiano dos serviços
prestados a efetividade ou não das suas políticas, e principalmente as lacunas
deixadas pelos serviços públicos. (SOUZA, 2006, p.82).
A Constituição prevê um espaço legal constituído para o exercício do Controle Social
das políticas públicas, visando a efetivação dos direitos garantidos, que é a criação de
Conselhos de Políticas Públicas, que segundo Raichelis (2008, p. 83): “[...] são canais
importantes de participação coletiva e de criação de novas relações políticas entre governo e
cidadãos, e, principalmente, de construção de um processo continuado de interlocução
pública.”
[...] a constituição estabelece bases jurídicas para a construção de um novo
formato de cidadania, agora contemplando o ramo social como direito do
cidadão e dever do Estado. Mas não apenas isto, agora a cidadania política
transcende aos limites da delegação de poderes da democracia representativa
e, expressa-se através da democracia participativa, através da constituição de
conselhos paritários, que se apresentam como novo lócus de exercício
político. (CAMPOS; MACIEL, 1997, p. 145, grifo do autor)
Os Conselhos, que devem ser constituídos nas esferas da União, Estado e Município,
apresentam-se como espaços públicos de composição plural e paritária entre Estado e
sociedade civil e tornam-se instituições da democracia participativa como meio legítimo de
expressão da cidadania e controle social.
121
A implementação de políticas públicas capazes de concretizar o Sistema de Proteção
Social Brasileiro e garantir a efetivação dos direitos sociais está relacionada com a
concretização do Controle Social por meio da sociedade, conforme discute Nogueira, por
meio da efetivação da política dos cidadãos:
[...] a política dos cidadãos, concentrada na busca do bem comum, no
aproveitamento civilizado do conflito e da diferença, na valorização do
diálogo, do consenso e da comunicação, na defesa da crítica e da
participação, da transparência e da integridade, numa operação que se volta
para uma aposta na inesgotável capacidade criativa dos homens. É a "política
com muita política". Ela frequenta, em lugar de destaque, o vasto e rico
imaginário da modernidade, que a vê como expressão do desejável, um valor
maior, uma meta a ser alcançada. (NOGUEIRA, 2001, p. 75).
Nesse sentido, o SUAS traz como sendo um dos principais desafios do seu novo
modelo de gestão, a criação de mecanismos que possam garantir a participação dos usuários
nos espaços públicos enquanto sujeitos de direitos e não apenas como cidadãos subrepresentados, em conformidade com o previsto na LOAS: “Participação da população, por
meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em
todos os níveis.” (BRASIL, 2011b, Art. 5º. Inciso II).
O SUAS defende a existência de espaços como os Conselhos, para que esta
participação em busca do controle social seja efetivada.
[...] espaço fundamental de diálogo entre a sociedade civil e o governo é o
Conselho de Assistência Social. Os Conselhos são organismos públicos,
compostos por representantes dos governos, dos trabalhadores, da sociedade
cível e dos usuários e tem um papel importante nas deliberações sobre os
rumos da política em cada esfera do governo e também na fiscalização da
execução dos serviços socioassistenciais. (BRASIL, 2008, p. 118).
Entretanto, o “chão social” ainda vivencia obstáculos para que este espaço seja efetivo.
Os sujeitos da pesquisa nos apresentaram uma realidade desafiadora, que nos leva a refletir
sobre o quanto ainda estamos distantes da efetivação do controle social nas políticas públicas.
A importância se dá na participação efetiva da população na busca por uma
Assistência Social que atenda a sua função de proteção. Entretanto, é
cômodo para os governantes manter os usuários alienados, facilmente
manipuláveis e este é um espaço de construção para garantias e direitos. A
relação ainda é de dependência administrativa e funcional, não há a cultura
de participação e acaba que são sempre os mesmos que se dispõe a participar
do controle social. (Coordenadora do CRAS I, 2015)
122
Em relação à participação dos usuários nos Conselhos de Direitos, identificamos que
em alguns municípios ainda não há a garantia da representação do segmento usuário no
âmbito da sociedade civil:
Eu acho que não tem, não sei posso estar falando coisa errada, mas eu acho
que agora é que eles estão mais abertos a isso, eu já escutei falar que tem que
ter [...] No da assistência acho que não. Tem só representante da sociedade
civil, agora usuário mesmo não tem não. (CRAS II, 2015)
Apesar de garantir a paridade representativa na composição dos Conselhos (Poder
Público x Sociedade Civil), alguns municípios não preveem a presença do segmento usuário e
contam com a sociedade civil representada apenas pelas entidades religiosas, sociais ou clubes
de serviços.
Desta forma, não é possível garantir o envolvimento da população ou a ampliação da
cidadania. Para a construção de uma representação democrática é preciso garantir a presença
dos usuários nos espaços de participação, pois é um direito deste segmento.
Deparamo-nos, ainda, com a questão de Conselhos que ainda não desenvolvem o
papel que lhes é cabido.
Se eu te falar que eu não sei te responder isso, eu não sei [...] o conselho ele
não é ativo no município, ele não é um conselho ativo, tem o multi... é
multiuso [...], que tem as salas do conselho, que não estão sendo usadas para
o conselho tá? É o pessoal da saúde que está lá, e o conselho ele não é ativo
no município, ele tem no papel, no papel ele existe, mas na prática... (CRAS
IV, 2015).
Este relato pode ser relacionado com os dizeres de Campos e Maciel:
Pensar o Conselho Paritário como “lócus” do fazer político, é pensá-lo como
espaço contraditório. Como uma nova modalidade de participação. Diz
respeito a um formato de exercício democrático que questiona, tanto a
tradição elitista do fazer político no âmbito da sociedade quanto sugere
repensar as práticas de precária experiência democrática, predominantes na
sociedade civil. (CAMPOS; MACIEL, 1997, p. 150).
Ou seja, sem a efetivação das ações do Conselho, como será possível questionar a
tradição elitista das ações políticas? Como garantir o controle e a participação social na
formulação e avaliação das políticas públicas?
Quando pensamos na implantação do SUAS, a garantia da efetividade do Conselho de
Assistência Social é extremamente necessário, pois ele tem, entre suas atribuições, o papel de
deliberar sobre a política de assistência social municipal, além de fiscalizar o fundo municipal
123
de assistência social. Então, quando o Conselho não existe “para além do papel”, não é
possível afirmar que haja a transparência e que as ações desenvolvidas estejam indo ao
encontro das reais necessidades do território.
Outro espaço privilegiado para a efetivação são as Conferências Municipais, Estaduais
e Nacionais que avaliam as ações de determinada política pública e propõe melhorias.
Na
área da assistência social, as conferências devem acontecer a cada dois anos.
Na conformação com o SUAS, os espaços privilegiados de participação no
controle social são as conferências e os conselhos. O espaço das
Conferências é aquele que se avalia a situação da assistência social e se
definem as diretrizes para a política. (BRASIL, 2008, p. 118).
Este ano de 2015 é um ano de realização de Conferências e os CRAS visitados
estavam vivenciando este momento tão importante para a efetivação do controle social.
Então foi positivo, nós tivemos só do CMDCA até agora, do idoso nós
vamos ter agora em junho, dia nove de junho, e da assistência em julho, mas
assim a que teve com a criança e adolescente foi muito boa, eles são
participativos, é mas nessa parte esses são participativos, nós fizemos o CCI,
chamou a escola estadual, foi bem... Muito legal o encontro, teve muita
participação. (CRAS III, 2015).
Teve a conferência municipal dos direitos da criança e do adolescente, nós
realizamos junto com outro município, é... Alguns acho que, dois
adolescentes foram, acho que vão participar como delegados, foi bem legal a
forma como eles se expressaram lá [...]. (CRAS IV, 2015).
A participação popular pode ocorrer também em outros espaços, espaços mais
permeáveis e menos formalizados, e que sejam capazes de constituírem canais mais diretos
para a ação popular, podendo também somar força a esse processo participativo de controle
social:
As comissões de bairros, os conselhos de gestão de serviços e programas, os
núcleos comunitários e grupos de cidadania, entre tantas outras formas de
organização, estão se desenvolvendo nos municípios por todo o País e
precisam ser avaliadas e socializadas. (BRASIL, 2008, p. 69).
Porém, de acordo com o CRAS III, a sociedade civil apresenta resistência em seu
papel no controle social, especialmente no caso da participação dos Conselhos.
[...] os representantes da sociedade civil não vem cumprindo de forma
efetiva suas funções. Existe uma grande resistência na participação das
reuniões do Conselho [...] o principal desafio para a efetivação do controle
social no âmbito da política de assistência social no município é motivar os
124
membros do CMAS, representantes da sociedade civil a participarem
continuamente das ações de planejamento e monitoramento. (CRAS III,
2015).
Nesse sentido, é imprescindível a existência de cidadãos comprometidos com os
interesses coletivos e dispostos a se engajarem nas lutas diárias.
A democracia participativa somente pode produzir bons frutos se dispuser de
cidadãos e de associações com disposição política para experimentar
dinâmicas decisionais coletivas e cooperativas, isto é, “destinadas não a
promover destruições recíprocas, mas a compor unidades da diversidade”
(NOGUEIRA, 2003, p. 164).
Para tanto, é indispensável refletir sobre isso com os usuários, de forma que estimule o
envolvimento dos mesmos de forma ativa e direta, na busca pela conferência de maior
visibilidade e transparência às suas reivindicações e expectativas, conforme prevê a PNAS:
Assim, há que se produzir uma metodologia que se constitua ao mesmo
tempo em resgate de participação de indivíduos dispersos e desorganizados,
e habilitação para que a política de assistência social seja assumida na
perspectiva de direitos publicizados e controlados pelos seus usuários.
(BRASIL, 2009a, p. 52).
Sobre este aspecto, o trabalho do CRAS, em especial, é de grade valia para estimular
os usuários da assistência social a lutarem pelos seus direitos e se apropriarem dos espaços
legalmente instituídos para a efetivação do controle social.
Vejo que evoluímos muito com relação a consciência da população sobre o
acesso e a proteção aos seus direitos, hoje os usuários já se enxergam como
titulares de direitos e não se sujeitam a humilhações e esmolas. .
(Coordenadora do CRAS I, 2015).
Consegue bastante, eles mesmos já cobram os próprios direitos deles, que
eles conhecem bastante. É... é uma grande responsabilidade nossa em tentar
fazer com que eles apoderem né? Porque isso aí só tem a melhorar para eles,
a participação deles, a fiscalização dos serviços, eu acho que assim, ainda
não entenderam ainda esse papel, mas se eles se apropriarem, eles vão ver
que assim, é muito importante. (CRAS III, 2015).
Torna-se para tanto, de suma importância a promoção de espaços e eventos temáticos
através de seminários, encontros, palestras, entre outros, que propiciem aos usuários
discussões políticas, que os levem a reconhecer-se enquanto sujeitos sociais, com o poder de
tornarem-se protagonistas no processo do controle social.
125
A realização do trabalho social com família pode ser considerada um momento
estratégico para orientar os usuários sobre o controle social e sobre o papel que cada um pode
desenvolver no âmbito das políticas públicas, avaliando as ações desenvolvidas e lutando por
melhorias, seja nos espações legalmente instituídos (como nos Conselhos e Conferências) seja
nos demais espaços coletivos que participam, como por exemplo, os grupos de famílias que
são desenvolvidos nos CRAS.
[...] isso está sendo mais procurado agora nessa ultima conferência que teve,
na época das conferencias sempre divulga, sempre faz, ai faz as préconferências, convida, manda convite [...] E essa ultima conferencia que teve
mandou para as escolas, chamou os pais teve uma boa participação dos pais
e teve boa participação dos adolescentes, foi divulgado na rádio. (CRAS II,
2015).
Não, não, não faz. (CRAS IV, 2015).
Entretanto, este trabalho de conscientização e empoderamento das famílias precisa ser
realizado pelas equipes dos CRAS de forma contínua e não apenas nos anos em que
acontecem as conferências. O tema controle social é de extrema importância e quando
presente no planejamento das atividades a serem desenvolvidas, poderá contribuir para a
organização coletiva dos usuários e pela criação de possibilidades de lutas pelos direitos
sociais.
Estratégia esta que podemos considerar como desafiadora, pois nem sempre este
trabalho é realizado com as famílias atendidas, o que acaba distanciando as possiblidades da
existência do controle social.
Pensando no controle social para além dos espaços legalmente instituídos e no CRAS
enquanto espaço propício para instigar os cidadãos a lutarem por seus direitos,
questionamentos as equipes sobre como este controle social vem sendo realizado dentro dos
próprios CRAS, se há espaço para a população se posicionar avaliando e trazendo propostas
para os programas, projetos e benefícios ofertados.
Ali na entrada tem uma caixinha, estão usando agora. (CRAS II, 2015).
Tem uma caixinha de sugestões, não de sugestão, de avaliação né? Só tem de
avaliação, para colocar sugestão não tem,, eu acho que deveria, mas não tem,
só tem para avaliar se o atendimento é bom, se é ruim, tem uma caixinha ali,
é uma pesquisa que a gente faz. (CRAS IV, 2015).
Olha, nunca deixamos lá na frente, por exemplo, um questionário para...
[...]mas assim, eles participam, não é sempre, é esporadicamente, para os
programas sim, para os programas faz, às vezes a gente levanta, teve um
126
questionário que o ano passado eu fiz com o ação jovem, o que que eles
gostariam que melhorasse, o que que tinha que eles gostariam que voltasse
ou que não tem que eles gostaria, então com os programas a gente fez assim.
(CRAS III, 2015).
Quando tratamos de controle social, podemos observar que este é um eixo estruturante
do SUAS que se encontra em construção.
Identificamos uma carência no trabalho direcionado para a ampliação da cidadania, no
sentido de fortalecer os usuários e contribuir para que os mesmos se reconheçam enquanto
sujeitos de direitos. Em alguns CRAS esse trabalho de conscientização acontece apenas nos
períodos das Conferências, momento em que a explicitação do controle social se torna mais
visível, entretanto em outro CRAS não acontece em momento algum.
Cabe aqui destacar que esta realidade pode estar sendo regada pelos resquícios
históricos, que por ser marcada pelas características do favor e da caridade, à assistência
social não restava espaço para as reivindicações.
3.5 O Trabalho Social com Famílias
O CRAS, que é capacitado para uma atuação junto às famílias e indivíduos em seu
contexto comunitário, visando a orientação e o convívio social familiar e comunitário, é
responsável pela oferta do Programa de Atenção Integral à Família
(PAIF), principal
programa de proteção básica do SUAS.
Criado em 18 de abril de 2004 (Portaria nº78), pelo MDS, o Programa de Atenção
Integral a Família (PAIF), veio para aprimorar o Programa Nacional de Atendimento Integral
à Família (PNAIF), implantado pelo governo federal no ano de 2003.
A partir do dia 19 de maio de 2004, quando foi reconhecido pela PNAS como parte
integrante da Proteção Básica, tornou-se “ação continuada da assistência social”, passando a
integrar a rede de serviços de ação continuada financiada pelo Governo Federal (Decreto
5085/2004), desenvolvendo ações e ofertando serviços básicos continuados para as famílias
em situação de vulnerabilidade social em toda a área geográfica de abrangência do CRAS.
Desta
forma,
com
a
aprovação
da
Tipificação
Nacional
dos
Serviços
Socioassistenciais no ano de 2009, enfatizando o conceito de ação continuada estabelecida
anteriormente, o Programa de Atenção Integral à Família passou a ser denominado de Serviço
de Proteção e Atendimento Integral à Família, entretanto a sigla PAIF foi mantida.
Conforme os direcionamentos do PAIF e em consonância com a PNAS, o trabalho
social com família trata-se de um:
127
Conjunto de procedimentos efetuados a partir de pressupostos éticos,
conhecimento teórico-metodológico e técnico-operativo, com a finalidade
de contribuir para a convivência, reconhecimento de direitos e
possibilidades de intervenção na vida social de um conjunto de pessoas,
unidas por laços consanguíneos, afetivos e/ou de solidariedade – que se
constitui em um espaço privilegiado e insubstituível de proteção e
socialização primárias, com o objetivo de proteger seus direitos, apoiá-las
no desempenho da sua função de proteção e socialização de seus membros,
bem como assegurar o convívio familiar e comunitário, a partir do
reconhecimento do papel do Estado na proteção às famílias e aos seus
membros mais vulneráveis. Tal objetivo materializa-se a partir do
desenvolvimento de ações de caráter “preventivo, protetivo e proativo”,
reconhecendo as famílias e seus membros como sujeitos de direitos e tendo
por foco as potencialidades e vulnerabilidades presentes no seu território
de vivência. (MDS, 2012b, p. 12).
Cabe ressaltar aqui, que o trabalho social com famílias tem como referência um dos
princípios norteadores do SUAS: a matricialidade familiar, que já foi abordada anteriormente,
no capítulo 3.1 da dissertação.
A PNAS traz avanços importantes ao tratar do conceito de família, “[...] estamos
diante de uma família, quando encontramos um conjunto de pessoas que se acham unidas por
laços consanguíneos, afetivos e/ou de solidariedade.” (BRASIL, 2009a, p. 28). Entretanto,
ainda apresenta resquícios do pensamento liberal, pois parte do princípio de que a família
possui funções clássicas, que precisam ser cumpridas.
[...] partindo do suposto de que são funções básicas das famílias: prover a
proteção e a socialização dos seus membros, constituir-se como referências
morais, de vínculos afetivos e sociais; de identidade grupal, além de
mediadora das relações dos seus membros com outras instituições sociais e
com o Estado. (BRASIL, 2009a, p. 35).
Nesse sentido, Teixeira trás uma reflexão pertinente, apontando que, no seu ponto de
vista, a noção de matricialidade familiar presente na PNAS, na verdade, objetiva que
possamos a partir do trabalho social, apoiar a família para que ela desenvolva o seu papel
autoprotetivo.
Embora essa concepção supere o conceito de família como unidade
econômica (NOB/SUAS), mera referência de cálculo de rendimento per
capita, e parta de uma visão ampliada de família, com formatos plurais,
historicamente situada, e inclua a ideia de que esta deve ser apoiada, o
objetivo, na verdade, é apoiar para que esta possa desempenhar o seu papel
de sustento, na guarda, na socialização e na educação de suas crianças,
adolescentes, no cuidado de seus idosos e portadores de deficiência. Logo, a
noção de matricialidade sociofamiliar desvela seu verdadeiro significado, de
ampliar e contar – mediante estratégias de racionalização e orientação – com
128
a proteção da família, reforçando a tendência familista da política social
brasileira. (TEIXEIRA, 2010, p. 10).
Continua ainda sua reflexão, destacando que “Assim, apesar de o reconhecimento da
pluralidade de formas familiares, as homogeneízam em suas funções, papéis e relações
internas, trata-a, a priori, como o lócus da felicidade, do refúgio da vida desumana do
mercado, da proteção social.” (TEIXEIRA, 2010, p. 10)
Ao abordarmos os sujeitos da pesquisa sobre a importância do trabalho social com as
famílias, foi possível identificar em algumas falas, o como esta lógica apresentada por
Teixeira encontra-se embutida no cotidiano dos trabalhadores.
Acho que o fortalecimento de vinculo né? Porque a gente pensa assim numa
família, onde ela tenha consciência [...], eu digo assim, para eles manterem
uma boa convivência... Para nós no futuro, vão gerar menos problemas, eu
acredito! Então eu acho que o trabalho na família é prevenção.. É prevenção,
eu acho que é um espaço dos direitos também né? Porque quando ele vem a
nós ele busca alguma coisa, acho que a gente tem que... Pode contribuir com
o que a gente tem né? Com o pouquinho de conhecimento que a gente tem
para poder ajudar aquela família, aquela pessoa. (CRAS II, 2015).
De acordo com o CRAS II, um trabalho preventivo, que apoie a família a manter uma
boa convivência e que proporcione conhecimento acerca dos direitos, pode prevenir futuros
riscos, futuras vulnerabilidades e consequentemente, prevenirá futuras demandas de trabalho.
Esta lógica de pensamento acaba reproduzindo o que Teixeira denomina de “redução
dos gastos sociais”.
É essa ambiguidade de reforço das funções protetivas da família de um lado;
e, de outro, como alvo de proteção social que denota a dimensão da parceria
público/privada na proteção social, e sua dimensão estratégica em contexto
de redução de gastos sociais, posto que se pode contar com a parceria da
família para potencializar a proteção social oferecida, mesmo quando não
ocorre em quantidade nem qualidade suficiente para suprir todas as atenções
necessárias e demandadas. (TEIXEIRA, 2010, p. 10).
O CRAS I, por sua vez, trás um elemento muito importante para a discussão sobre a
importância do trabalho social com as famílias.
É a base. É a base do serviço, porque é lá na família que é a estrutura da
sociedade. Então se a família, independente de qual família seja, se a família
está desestruturada, reflete na sociedade né. Então é o fortalecimento com
essa família que é o mais importante. Nos aspectos enquanto cidadão,
enquanto provedor, enquanto pessoa emancipada. (CRAS I, 2015).
129
Neste caso, podemos notar que a concepção de trabalho social com famílias ainda está
arraigada de antigas práticas. Partir do princípio de que “se a família está desestruturada,
reflete na sociedade” está na contramão de todo o arcabouço teórico, de toda a trajetória
teórica que está sendo construída para chegarmos até aqui, pois este pensamento pode
direcionar para práticas profissionais coercitivas, disciplinadores, corretivas que tenham como
finalidade “estruturar a família que se encontra desestruturada”. Por muitos anos, o trabalho
social utilizou o paradigma da patologia social para intervir nessas situações e desta forma, as
intervenções eram realizadas por meios de recursos terapêuticos e do trabalho psicossocial
individual.
Iniciamos esta dissertação apresentando que as políticas públicas foram criadas
enquanto estratégias para o enfrentamento das manifestações da questão social. Ao partirmos
do pressuposto da existência da Questão Social, que se manifesta de inúmeras formas dia após
dia, compreenderemos também que ela está relacionada à reprodução do sistema capitalista,
fundado na relação capital x trabalho, que estabelece a sociedade de classes sociais, composta
por desigualdades a ela inerente.
Nesta linha de pensamento, não é possível planejar um trabalho com famílias, sem
compreender que são as desigualdades sociais, a exploração, o não acesso aos direitos, entre
outros, que refletem no cotidiano da família e não o contrário: a desestrutura da família que
reflete na sociedade.
A PNAS traz em seu conteúdo este direcionamento:
Assim, o fazer cotidiano da equipe de referência do CRAS, ao
operacionalizar o PAIF, deve fugir das práticas do senso comum, que sem
nenhum tipo de contestação ou indagação, tornam-se crenças imutáveis, que
reproduzem ideias carregadas de preconceitos, culpabilizam as famílias por
sua situação social e mantêm o status quo, impossibilitando movimentos de
transformação da realidade. Neste sentido, o trabalho social com famílias
deve ter por pressuposto basilar a responsabilidade estatal na proteção às
famílias e assumir como embasamento de sua prática o conhecimento
científico, que requer profissionais qualificados, aptos a compreender a
realidade dada e construir conhecimento, com os quais questionam as
estruturas sociais injustas, elaborando estratégias para modificá-las. (MDS,
2012b, p. 13).
De forma ampla, é possível destacar também, que o trabalho social com famílias,
ainda encontra-se na lógica individualizadora dos problemas sociais. Os sujeitos se remetem a
este trabalho, como sendo a possibilidade para orientar direitos e realizar os encaminhamentos
necessários, acompanhando a trajetória do usuário.
130
É de grande importância, porque muitas vezes algumas famílias não têm
nem noção né? Dos direitos que elas têm, e assim, nós trabalhadores né?
Temos essa responsabilidade, de ver se a pessoa está com seu direito
violado, auxiliar, fazer uma análise do caso né? E encaminhar as pessoas, ter
acesso aos direitos, então seja lá qual for a demanda que a pessoa necessita,
porque muitas vezes elas mesmo não sabem nem como fazer, em
determinadas situações e aí a nossa parte é essa, orientar, auxiliar. (CRAS
III, 2015).
Nossa muito importante, o ano passado a gente tinha, toda semana, às vezes
tinha pouca pessoa sabe? Mas a gente vê que influencia bastante no dia a dia
das pessoas mesmo, eles vem procurar a gente, às vezes, para dar resultado
das coisas que estão acontecendo, ou mesmo nos grupos na próxima reunião
né? A gente fez também reunião com os pais das crianças da creche, é bem
importante, influencia bastante eu acho que na vida deles, no dia a dia, é
importante sim [...]. (CRAS IV, 2015).
Não que esta intervenção não seja coerente e relevante, mas o trabalho social com
famílias precisa ir além. É preciso compreender os problemas sociais enquanto problemas
coletivos, que precisam ser enfrentados coletivamente.
O CRAS I trouxe esta visão do coletivo, da importância de não responsabilizar as
famílias pelas situações vivenciadas.
Fundamental. Porque você orientando essa família, entendendo essa família,
fazendo ela entender que o que ela vivencia hoje não é culpa dela, ou que os
problemas dela não existem só com ela, que ela é fruto de um território, de
um conjunto de situações, de um ciclo, de um sistema, você consegue uma
resposta. Se você conseguir colocar isso na família, embutir naquela família
que ela não está em uma situação porque é única e exclusivamente
responsabilidade dela, mas que ela faz parte de um contexto, você consegue
mudanças na sociedade, você consegue o reflexo dessa família ou desse filho
dessa família amanha, e com certeza, é uma forma de transformar a
realidade, se você conseguir desenvolver esse trabalho social com esta
família. (CRAS I, 2015).
Porém, retomam a lógica apresentada anteriormente, de que a mudança na sociedade
advém das famílias. Novamente, colocam que o trabalho social com as famílias deve
proporcionar mudanças, superações nos núcleos familiares que futuramente refletirão na
sociedade.
Esta inversão na compreensão do lugar ocupado pela família pode influenciar no foco
dado ao trabalho social com as famílias. Pois, buscará o fortalecimento das famílias para
superar as situações de vulnerabilidades e riscos sociais enfrentadas, sem que se realize a
discussão sobre a organização da sociedade capitalista, sobre as desigualdades, sobre a
exploração e o como tudo isso influencia e trás riscos para os núcleos familiares.
131
Dando continuidade à discussão sobre o trabalho social com famílias, abordamos
sobre as estratégias que os CRAS vêm utilizando para a sua efetivação.
Então a nossa estratégia é trazer esses cursos, cursos para que a psicóloga
atraia o trabalho dela, social com famílias. Porque é uma estratégias de trazer
os cursos, e por traz dos cursos, eles saem com informação, tem aquele
trabalho informativo. [...]. É assim, [...] a estratégia e antes de começar ou
depois e quando é um de culinária, por exemplo, que eles têm que esperar
alguma coisa, ai eu já entro com o grupo, quando é um artesanato eu falo
antes, ou quando termina. Porque assim, ainda eles não vêm por
espontaneidade pra participar dos grupos, aí a gente tem essa dificuldade,
então usa essa estratégia, porque às vezes eles querem só benefício, só assim
participar de programas, e ai eles não conseguem visualizar se eles tiverem
mais informações eles vão.. eles poderão sair da situação que se encontram e
buscar autonomia deles. (CRAS III, 2015).
O CRAS III apresenta a oferta dos cursos como estratégia para a efetivação do
trabalho social com famílias, especialmente o de abordagem grupal.
A questão da oferta de cursos e do investimento em capacitação profissional, realizada
pela política de assistência social nos últimos anos, nos trazem elementos importantes para o
debate. Conforme discute Yazbek, a promulgação da Constituição Federal de 1988 inscreveu
a assistência social na agenda dos direitos sociais, entretanto, esta lógica encontra-se na
contramão da política econômica neoliberal vigente.
Como evidenciam as avaliações do desempenho da Assistência Social
brasileira pós-LOAS, sua construção como direito tem sido uma difícil
tarefa, plena de ambigüidades e de profundos paradoxos. Pois, se por um
lado os avanços constitucionais apontam para o reconhecimento de direitos e
permitem trazer para a esfera pública a questão da pobreza e da exclusão,
transformando constitucionalmente essa política social em campo de
exercício de participação política, por outro, a inserção do Estado brasileiro
na contraditória dinâmica e impacto das políticas econômicas neoliberais,
coloca em andamento processos desarticuladores, de desmontagem e
retração de direitos e investimentos públicos no campo social, sob a forte
pressão dos interesses financeiros internacionais. (YAZBEK, 2004a, p. 2324, grifo do autor).
O que de certa forma acabou contribuindo para a formulação de uma política social de
assistência social composta por perspectivas teóricas ecléticas, que em alguns momentos
aproxima a assistência social da lógica da universalização dos direitos e em outros momentos
apresenta resquícios da ideologia liberal, com o objetivo de inserir as famílias no mercado
para que possam satisfazer as suas necessidades (MUSTAFA, 2013), como podemos conferir
no próprio texto da PNAS, ao tratar das possibilidades e capacidades das famílias que devem
ser exploradas.
132
- Uma visão social capaz de entender que a população tem necessidades, mas
também possibilidades ou capacidades que devem e podem ser desenvolvidas.
Assim, uma analise de situação não pode ser só das ausências, mas também
das presenças até mesmo como desejos em superar a situação atual; – Uma
visão social capaz de identificar forças e não fragilidades que as diversas
situações de vida possua. (BRASIL, 2009a, p. 15).
Nesta lógica, a oferta de cursos acaba sendo uma possibilidade para que o Estado
invista nas capacidades das famílias, para que estas venham superar a situação atual de
vulnerabilidade, relacionada à existência de rendimentos insuficientes ou até mesmo de
ausência de rendimentos, o que podemos identificar no cotidiano prático da política de
assistência social, a partir da fala do CRAS III:
[...] a gente faz uma busca ativa, pergunta o que, quais cursos elas gostariam
e também pela demanda né? A gente vê que estão precisando de emprego, a
gente faz bastante relacionado a isso, que nem a gente teve curso de pães,
por exemplo, culinária, elas podem fazer e estar vendendo e acrescentando
na renda familiar, vai ter o de bordado, que é para elas também ter uma
renda, como elas são donas de casa, costura, que elas sempre pediram, então
tem, né? O de crochê a gente acabou de fazer também elas fazem para
revender, então assim tudo para a gente trazer uma renda, que é o que mais
tem de preocupação no município, mas assim é uma parceria, elas falam o
que querem e a gente vê o que gostaria de oferecer para acrescentar na vida
delas né? (CRAS III, 2015).
Destacamos ainda, conforme o conteúdo da PNAS, que estas ações podem contribuir
para a individualização dos problemas sociais enfrentados:
- Uma visão social inovadora, dando continuidade ao inaugurado pela
Constituição Federal de 1988 e pela Lei Orgânica da Assistência Social de
1993, pautada na dimensão ética de incluir “os invisíveis”, os transformados
em casos individuais, enquanto de fato são parte de uma situação social
coletiva; as diferenças e os diferentes, as disparidades e as desigualdades;
(BRASIL, 2009a p. 15).
Mustafa, em suas reflexões sobre a política de assistência social, nos chama a refletir
sobre a importância de não depositarmos na família toda a responsabilidade por superar as
situações vivenciadas.
Observa-se aqui a presença do pensamento de Amartya Sen – sua
formulação da Teoria das Capacidades. [...] O que Sen (1999) preconiza é a
expansão das capacidades e, estas podem ser aumentadas pelas políticas
públicas ou a política pública pode ser efetivada e expandida pela capacidade
de participação da população. Aí tem-se o indivíduo desempenhando o papel
de agente (na medida em que tem suas capacidades ampliadas consegue
133
cuidar de si e influir no mundo)! [...] O que se precisa deixar claro é que [...]
não se pode imaginar (acreditar) que a população brasileira (a sua maioria)
sairá do pântano da pobreza, do desemprego, do trabalho desprotegido por
suas próprias forças ou pela força de suas famílias [...]. Sem condições
objetivas favoráveis como é possível desenvolver capacidades, desfrutar de
real liberdade?[...]. (MUSTAFA, 2013, p. 11-13).
Nesse sentido, é possível compreender que ao investir em capacitação profissional e
incentivando a inserção no mercado de trabalho, muitas vezes de forma precária, sem a
garantia dos direitos trabalhistas, em razão da informalidade, acabamos não realizando o
enfrentamento da questão social e deixamos de lado a discussão sobre a exploração advinda
do sistema capitalista, o que acaba gerando limitação para as práticas da política de assistência
social.
Entretanto, é importante identificar as possibilidades nas ações desenvolvidas. No caso
do CRAS III, o que sabemos ser a realidade de muitos CRAS pelo país, a oferta dos cursos
acaba sendo, contraditoriamente, uma estratégia para a realização do trabalho social com
família, por meio do desenvolvimento dos grupos.
A realização dos grupos é um grande desafio quando tratamos do trabalho social com
famílias. Fala-se tanto dos grupos do PAIF, dos grupos dos CRAS, entretanto, esses são
desenvolvidos das mais variadas formas, com os mais variados objetivos.
O CRAS I nos apresentou um pouco de suas vivências, destacando que nos últimos
tempos a equipe vem modificando a compreensão acerca do trabalho com grupos:
Primeiro a gente começou a estudar. Eu lembro que estávamos em uma
apresentação sobre o trabalho com grupos, que a DRADS organizou, com
relatos de experiências, ai depois daquele evento a gente começou a refletir
mais sobre a questão do grupo e o quanto a gente estuda pouco pra prática.
Porque até então todo o conceito de grupo que se ouvia dos relatos dos
profissionais era trabalho em grupo, mas era artesanato. A pessoa vinha e
queria fazer artesanato e era grupo, a pessoa vinha e queria fazer culinária e
era grupo, tudo era grupo. Na verdade não deixava de ser um grupo, mas não
tinha o conceito do “GRUPO” que se pede e nem o objetivo que a gente tem
em trabalhar o grupo. Porque lá está ensinando um ofício não está realizando
um trabalho SOCIAL com o grupo. E ai você começa a estudar mais sobre a
questão de grupos: Que tipo de grupo que existe? Quantas pessoas podem ter
nesse grupo para configurar esse grupo? É grupo de convivência? O que é
que eu vou trabalhar em um grupo de convivência? O que é que eu vou
trabalhar em um grupo socioeducativo? E ai a gente começou a reorganizar o
trabalho. Eu lembro que a gente fazia reunião mensal com o grupo dos
Programas Sociais. Era um grupo só, mas ai já não é grupo, é quase uma
ação comunitária, porque envolve quase o município inteiro. Ai eu falei:
Vamos mudar! Ai a gente sentou e organizou: Vamos trabalhar grupos de
famílias de programas sociais no formato socioeducativo... ai gente começou
a trabalhar grupos, mais ou menos de acordo, porque até então a gente
134
também trabalha grupos de artesanato, com intervenções, a única diferença é
que a gente faz a intervenção. Então, durante a semana, durante o mês, os
profissionais desenvolviam atividades no grupo, ou durante os encontros
permanecia com o grupo, mas era um grupo de artesanato, a pessoa vinha
para fazer o artesanato. O artesanato não era o meio para desenvolver o
grupo... Que de primeiro impacto, com a implantação do CRAS, era essa a
visão que a sociedade tinha: de escola profissionalizante! O CRAS ensina
fazer artesanato e na realidade não é isso, e isso vem se transformando. Não
que não tenha curso... Tem! Mas não é o papel do CRAS ser uma escola de
qualificação. Ai conforme você vai participando dos cursos, ouvindo outros
profissionais, pra mudar esse conceito de que o CRAS não é para fazer
cursos, as pessoas tem resistência, não falo só a comunidade, mas as pessoas
que estão envolvidas, porque digamos assim: O que marcou o CRAS no
nosso município? A quantidade de cursos que tinham no começo. Para você
falar para a pessoa que o trabalho social com famílias se dá por meio de
grupos que faz ela refletir sobre os direitos, sobre as situações de vivências
dela, sobre a emancipação dela, as capacidades que ela tem, as
potencialidades que ela tem e não para colocar na cabeça dela que ela tem
que trabalhar e ganhar dinheiro, que a vida não é só isso... mas fazer ela
refletir sobre a vida dela de forma critica, mas é difícil! Por que elas falam
assim: nossa, mas não vai ter curso esse ano? Mas não vai ter nada esse ano
no CRAS então? Então é difícil mudar esse conceito de trabalho. Eles não
entendem que o curso é uma forma de chamar eles para o trabalho, que é
uma parte do trabalho. E às vezes o usuário nem percebe essa intervenção no
curso. Por que eles vêm com o objetivo de aprender aquele ofício: Vou lá
aprender a pintar tela. Mas ai a intervenção que é feita, mexe com a
realidade da pessoa, com o interior da pessoa, com as potencialidades da
pessoa e ela nem percebe que esse trabalho é o objetivo do CRAS. (CRAS I,
2015).
Desde que o PAIF foi criado, o governo federal não investiu em capacitações para
orientar as equipes dos CRAS sobre a efetivação do trabalho social com famílias. Alguns
materiais foram publicados, entretanto, a aprendizagem coletiva, com trocas de experiências e
espaço para que as dúvidas fossem sanadas não existiu. Desta forma, cada município precisou
interpretar o PAIF à sua maneira, e consequentemente, inúmeras formas para o trabalho social
com famílias foram sendo instauradas, enquanto em alguns municípios, o trabalho social com
família nem mesmo foi efetivado até os dias atuais.
Um ponto interessante a ser destacado da fala do CRAS I encontra-se no conceito de
“grupo”, conforme foi exposto, tudo o que se faz no coletivo, dentro do CRAS, passou a ser
denominado grupo: Grupo de Artesanato, Grupo de Culinária, entre outros, e desta forma, o
trabalho em grupo, proposto pelo PAIF, que deve ser considerado espaço privilegiado para a
efetivação do trabalho com famílias, acabou não sendo realizado por muitos CRAS.
O CRAS I destacou ainda a importância de ter se dedicado aos estudos para poder
compreender o real significado do trabalho com famílias, pois a partir desta compreensão foi
135
possível repensar o trabalho que vinha sendo desenvolvido e então pensar em estratégias para
reorganizá-lo de acordo com os direcionamentos do PAIF.
Antes o CRAS, quando ele começou, a gente na época focou muito na
questão de cursos, de qualificação, que a gente tinha muito pedido antes e ai
foi o que marcou mais o início do CRAS. Depois a gente mudou o foco né,
conforme a gente foi se capacitando mais ainda sobre a política, a gente
compreendeu que o curso deveria ser uma “forma” de trabalho e não o “fim”
do trabalho. (CRAS I, 2015).
No ano de 2012 o MDS publicou um material interessante sobre o PAIF, com um
volume (2) específico sobre o trabalho social com famílias. Este material traz direcionamentos
para a efetivação do trabalho, entretanto, novamente, não houve espaços para o estudo
coletivo, não se investiu em capacitações para os trabalhadores do SUAS que efetivam o
trabalho do PAIF, e desta forma, novamente, não se tem a garantia de que todas as equipes
estudaram o material e que conseguiram apreender o conteúdo disponibilizado, tão pouco
tem-se a garantia de que todas as equipes tiveram acesso a este material.
A publicação, intitulada “Orientações Técnicas sobre o PAIF (Vol. 2) – Trabalho
Social com Famílias do Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família” trata, em seu
5º capítulo, das abordagens metodológicas para o desenvolvimento do trabalho social com
famílias no âmbito do PAIF.
De modo rápido, apreende-se abordagem metodológica como o conjunto de
fundamentos e pressupostos que embasa a ação profissional, à luz das
correntes epistemológicas do conhecimento científico. Portanto, a opção por
uma abordagem metodológica influi diretamente no alcance dos objetivos da
ação realizada. (MDS, 2012b, p.95).
Destaca-se ainda a importância de não confundir abordagem metodológica com
procedimentos metodológicos:
É preciso evitar a banalização do termo “abordagem metodológica”. Não é
adequado confundi-lo com a realização de procedimentos metodológicos,
ligados aos métodos, à operacionalização de atividades, tais como
entrevistas, visitas domiciliares, entre outros. (MDS, 2012b, p. 96).
Orienta-se que a equipe do CRAS escolha a abordagem metodológica, de acordo com
a realidade territorial, entretanto, ressalta-se a importância da escolha de uma abordagem que
venha ao encontro do paradigma dos direitos sociais:
136
Assim, cabe aos técnicos de nível superior e ao coordenador do CRAS a
escolha das abordagens metodológicas mais adequadas para responder às
demandas postas para o PAIF em determinado território. Destaca-se que as
abordagens metodológicas devem ser apropriadas à política de assistência
social, baseada desde 1988 no paradigma dos direitos. (MDS, 2012b, p. 97).
O texto publicado vai além, apresentando componentes importantes que devem conter
na abordagem metodológica escolhida.
Nesse sentido, precisam apresentar componentes que estimulem a
participação das famílias e seus membros, contribuam para a reflexão sobre
suas condições de vida, valorizem os saberes de cada um, propiciem uma
visão crítica do território, permitam o reconhecimento do dever estatal em
assegurar direitos, possibilitem a vivência de experiências, fortaleçam suas
capacidades para construir alternativas de ação e, assim, auxiliem no
processo de conquista de cidadania. (MDS, 2012b, p. 97).
E, logo em seguida, traz, enquanto uma das possibilidades de abordagens
metodológicas para o trabalho social com famílias, a Pedagogia da Problematização,
compreendida a partir do resultado das obras Pedagogia do Oprimido (1970), Pedagogia da
Autonomia (1996) e Pedagogia da Esperança (1992), todas de Paulo Freire.
A Pedagogia da Problematização, foi pensada para o uso na educação popular,
entretanto, pode ser utilizada em outros contextos, como por exemplo, na área da assistência
social, por meio de adaptações.
Esta abordagem metodológica ressalta a importância do diálogo e reconhece os seres
humanos enquanto sujeitos e não meros objetos, podendo dessa forma serem autores da
transformação social.
Outro pressuposto da pedagogia da problematização é o constante ato de
desvelamento da realidade, mediado pelo diálogo, que reconhece homens e
mulheres como seres históricos e, por isso, capazes de lutar contra a
acomodação ao mundo da opressão. É por meio desse entendimento que
Paulo Freire questiona e problematiza a percepção fatalista de que “as coisas
são assim mesmo”, “não há nada que se possa fazer” ou “o sistema é assim”
– insumos para as práticas assistencialistas. (MDS, 2012b, p. 98).
Abordados sobre as abordagens metodológicas e os procedimentos metodológicos
utilizados para o desenvolvimento do trabalho social com famílias, os sujeitos se restringiram
a responderem sobre os procedimentos metodológicos:
São rodas de bate papo, dinâmicas, às vezes eu aplico avaliação de nível de
depressão para saber qual nível de depressão, ansiedade que elas estão, faço
uma devolutiva, se precisar de encaminhamento eu encaminho, então eu faço
137
essas avaliações também no final, mas quando é um tema que dá para ser
avaliado né? No caso da depressão eu fiz assim um trabalho com elas para
saber assim, qual grau, se era leve, moderado, grave, os que deram caso
grave eu encaminhei, para saúde para ser atendido. (CRAS III, 2015).
É... Palestra, roda de conversa mesmo, de bate papo e as oficinas. (CRAS II,
2015).
Detalharam, ainda, sobre o que vêm desenvolvendo como grupos atualmente:
[...] de Planejamento familiar; Grupo de gestante; Pais e Filhos; de
Programas Sociais [...] tem as oficinas de artesanato, tem as oficinas do
serviço de convivência, [...] e agora de idosos, que antes, como a cultura não
era de serviço de convivência, mas apenas de encontro, agora a gente está
formatando o grupo, não tirando as características dele, mas fazendo com
que a gente insira o serviço de convivência no que já existe. (CRAS I, 2015).
Bom, tem vários grupos, tem grupo de benefício eventual né? Que é a
mesma coisa, a gente faz palestra socioeducativa, e oficina.[...] tem o grupo
do BPC de deficiente que é também realizado dessa forma de palestra, mas é
mais dinâmica porque a gente trabalha mais com a deficiente deles né? Vem
a pessoa, às vezes vem à família, às vezes aquela pessoa que não consegue
vir sozinha, ai vem acompanhado da família, alguém da família. E também é
realizado oficinas, porque como ele tem a deficiência, ele vai melhorar
alguma parte do desenvolvimento dele, né? Coordenação alguma coisa, e
como uma pessoa com deficiência geralmente ela tem depressão, então isso
ai vai ajudar também, porque a gente resgatou pessoas que não saiam de
casa, esse grupo foi montado faz pouco tempo. A gente tem o grupo de
reeducando, que é de familiares de reeducando, que é essas famílias que a
gente leva para as unidades prisionais, para visitar, então a gente tem esse
grupo também, que é um grupo que faz tempo que já está aqui, e esse rodaroda, porque às vezes a pessoa sai né? o filho, sei lá.. ou algum parente, fica
em liberdade, e as vezes ele chega a voltar ou às vezes, mesmo ele estando
em liberdade ela continua frequentando o grupo porque elas gostam muito, o
grupo é bem... (CRAS II, 2015).
E sobre os assuntos/temas que são discutidos:
[...] esse grupo de reeducando, assim elas falam muito sobre o que elas
passam lá né? Elas contam histórias que já aconteceu, já viveram lá... E às
vezes quando eles saem, já aconteceu, delas trazerem eles para contar como
que foi a situação, é um grupo meio de apoio mesmo para elas porque assim
sempre que elas precisam “a eu preciso ligar lá para saber como que ele
está?” elas vêm aqui, entendeu? “ha preciso mandar a alguma coisa para
lá...” né? Então tudo elas procuram a gente, então esse grupo é mais nesse
sentido assim. Elas são bem unidas né? Talvez uma não pode ir e manda pela
outra, porque as despesas se tornam caras, porque tem alimentação né? Não
por parte do transporte, mas chegando lá elas têm que se alimentar, fica o dia
fora, elas são bem unidas assim, é um grupo bem gostoso de trabalhar, ai
pede para a outra levar. Ai tem o grupo do Bolsa família, esse a gente vai
mudar agora, vai trabalhar as condicionalidades, a gente, na verdade já
tentou trabalhar as condicionalidades só que ai, foi muita procura e no final
estava trabalhando tudo! Ai tem do Renda cidadã. O do Renda é reunião mês
sim mês não, ai agora vai montar um novo grupo para trabalhar com as
138
famílias né? Que dá mais preocupação, porque tem umas famílias assim que
elas vêm em reunião, sempre aparece, e têm outras que já não vai tem aquela
dificuldade, você vê que precisa do benefício, então ai vai trabalhar com
essas né? com mais dificuldades. O Ação jovem, também parece que vai
formar um grupo com os pais, que vai montar também com os meninos que
estão mais precisando, não é de todo mundo não, mas ainda não começou
esses dois grupos não. (CRAS II, 2015).
Busca temas né? Do cotidiano. Agente busca temas através das
vulnerabilidades que eles apresentam né? vejo quais que são os temas que
são mais necessitados e faço o grupo através desses temas e os que elas
pedem também, às vezes elas pedem para trabalhar algum tema. Olha esse
ano eu trabalhei, eu acabei de trabalhar a questão de como você usar o tempo
que você tem para melhorar a sua qualidade de vida, eu trabalhei esse tema
agora num curso que teve de crochê, bom já trabalhei com stress, depressão,
já trabalhei com pais e filhos assim na educação, como melhorar a educação,
em relacionamento conjugal, como melhorar o relacionamento conjugal,
porque elas pediram muito esse e dos filhos, como por limite nos filhos, os
perigos da internet, trabalhei bastante que hoje é um tema muito atual, né? a
gente teve problema com vídeos que as pessoas soltaram aqui, e depois você
não tem a dimensão do que pode proporcionar, então foi trabalhado até no
ação jovem, trabalhei com esses temas, nossa tem um monte, bastante.
(CRAS III, 2015).
Questionamos os sujeitos sobre o ponto de vista deles a respeito dos grupos enquanto
espaço estratégico para orientar sobre os direitos sociais e todos apresentaram que acreditam
que o trabalho com os grupos contribui para o acesso às informações sobre os direitos.
Muito, sim, sim, eles têm acesso a informações que antes nem tinham né?
Porque eles ficam nas casas deles, assistem televisão, conversam com os
vizinhos, muitas vezes não tem esse acesso aos direitos, porque a maioria
das mulheres são donas de casa, do lar, então elas ficam um tempo ociosas,
então quando tem esse momento é importante para elas, é porque na verdade
assim a palestra a gente abrange de uma forma geral, no grupo eu já sou
mais específica né? Então no grupo eu trabalho bem especifico a vivencia
delas, que elas estão ali e que elas me trazem e me dão essa liberdade de
fazerem isso né? De trabalhar, então às vezes elas até trazem um caso e a
gente trabalha o caso ali no grupo. Quarta, a gente terminou um curso, aí vai
começar um novo na semana que vem, aí eles já falam “Oh! semana que
vem eu quero que você trabalhe tal assunto” aí eu já tinha planejado vou lá
desplanejo e faço outro com o assunto o que eles me deram, eles pedem
bastante, são bem participativos. (CRAS III, 2015).
acho que sim, contribui porque na medida do possível, a gente faz palestras
sobre temas relacionados aos direitos, eu acho que contribui. (CRAS II,
2015).
É importante, é o momento que a gente tem que está mais próximos deles,
que eles tem a liberdade de tirar as duvidas e a gente tem a oportunidade de
esclarecer a eles quanto o acesso à direitos, quanto ao acesso à serviço, que
se foi negado o acesso você não tem que se conformar, se é um direito seu.
Lembrando que direito é tudo que não pode ser negado, que é um direito seu,
139
não é um favor que eu posso retirar a qualquer momento. Então a gente
trabalha muito essa questão, seja qual for o direito, no grupo a gente trabalha
muito sobre direito, o acesso ao direito, seja saúde, seja de alimentação, seja
de programa social, de benefício, seja qual for o direito. Tem pessoas que
não tem conhecimento do direito, por exemplo no grupo de gestante, sobre o
auxilio maternidade, tinha pessoa dali que tinha o direito mas não sabia.
Então foi devido ao grupo que teve acesso. (CRAS I, 2015).
Analisando a dinâmica do trabalho com os grupos nos municípios visitados, é possível
identificar que na maioria das vezes, o trabalho é desenvolvido com o objetivo de alcançar
resolutividade para os problemas sociais “individuais” dos participantes. Não surgiram
elementos nas falas, que nos levassem a identificar a realização de um trabalho social que tem
como perspectiva a organização coletiva, a luta de classes, o empoderamento coletivo das
famílias atendidas, o que de acordo com Teixeira, poderia contribuir para que o trabalho
social fugisse do imediatismo.
Nessa perspectiva, o trabalho socioeducativo com famílias ultrapassa a
indução de reflexões internas e o uso do grupo como troca de experiências e
ajuda mútua, para se transformar em instrumento de construção de um novo
conhecimento, partilhado e crítico, que os leva a sair do imediatismo de suas
necessidades, para entendê-las enquanto coletivas, enquanto necessidades
sociais de classe, que devem ser atendidas pelo poder público, como
condição fundamental para a garantia de direitos e de qualidade de vida. ”
(TEIXEIRA, 2010, p. 16).
A autora esclarece, ainda, que isso não significa que “[...] os temas relacionados às
vivências, sofrimentos, violências, decorrentes da situação de vulnerabilidade ou risco social
que compartilham não sejam debatidos, refletidos.” (TEIXEIRA, 2010, p. 16), mas é preciso
ir além e é preciso cautela para não depositarmos nas famílias toda a responsabilidade pelas
situações vivenciadas
Esse fechamento da família em si mesma e nas soluções domésticas
aumentaria o sofrimento de não poder cumprir os papéis sociais exigidos por
ela, como, por exemplo, tirar os filhos da rua, da criminalidade, da
delinquência, das drogas, além de dar sustentabilidade material, afetiva,
proteção e cuidados a seus membros, sem compreender o porquê da redução
de seu poder e autoridade perante as gerações mais jovens, da redução do
tempo dedicado ao lar, do endurecimento das relações afetivas e até da
violência no seio familiar. (TEIXEIRA, 2010, p. 16).
Para a efetivação do trabalho social com as famílias, é de suma importância que os
grupos discutam os assuntos que anseiam, reflitam sobre os problemas do território, debatam
140
sobre as angústias do cotidiano. Ou seja, as experiências coletivas devem ser valorizadas,
conforme acredita Freire e Nogueira.
[...] os conteúdos surgem vestidos de problemas. [...] As pessoas então fazem
de seus discursos um panorama do que é possível fazer. Não se limitam
àquilo que deve ser feito. As pessoas descobrem com a prática as suas
possibilidades. Mesmo dentro dos limites analisados, as pessoas organizam
esforços para viabilizar o que está sendo difícil de ser feito. Penso que esse
processo amadurece politicamente os intelectuais e os grupos populares.
Penso que nesse processo as pessoas não se limitam a discutir sobre
conteúdos, mas as pessoas discutem sobre as dimensões e os momentos da
prática. [...] As pessoas que, em grupo, procedem nesses rumos estão
compondo sua (delas) compreensão coletiva sobre as dificuldades e sobre as
soluções. (FREIRE; NOGUEIRA, 2007, p. 40-41).
A este respeito, as Orientações Técnica sobre o PAIF publicada em 2009, com base
nos dizeres de Paulo Freire em Pedagogia do Oprimido, trazem a seguinte orientação, em
relação à escolha dos temas a serem discutidos com as famílias na realização das atividades
com grupos:
Investigar o universo temático das famílias usuárias do PAIF, a fim de eleger
“temas geradores” a serem com elas trabalhados. A investigação temática
envolve a investigação do próprio pensar das famílias, por meio da
observação compreensiva – captar o não dito, os elementos simbólicos,
explícitos e implícitos nas ações sociais. Isso significa que: “não posso
pensar pelos outros, nem para os outros, nem sem os outros...” (MDS,
2012b, p. 100).
É possível afirmar ainda, que esta metodologia de trabalho contribui para o
desenvolvimento da conscientização dos participantes, conforme defende Paulo Freire:
A consciência se reflete e vai para o mundo que conhece: é processo de
adaptação. A consciência é temporalizada. O homem é consciente e, na
medida em que conhece, tende a se comprometer com a própria realidade. A
conscientização é mais que uma simples tomada de consciência. Supõe, por
sua vez, o superar da falsa consciência, quer dizer, o estado de consciência
semi-intransitivo ou transitivo-ingênuo, e uma melhor inserção crítica da
pessoa conscientizada numa realidade desmitificada. (FREIRE apud
MARINHO, 2009 p. 94).
Por meio desta conscientização, objetiva-se construir a consciência de classe, e então,
os interesses defendidos por cada um dos participantes, passarão a ser interesses do grupo.
Assim, nesta perspectiva, o trabalho social com família poderia contribuir para a
realização de discussões coletivas, onde certamente surgiriam as possibilidades de
141
organização e mobilização do povo, na busca coletiva pela concretização de seus interesses
coletivos.
3.6 O Trabalho em Rede
Partindo do pressuposto de que as ações da política de assistência social causam
impacto às demais políticas sociais, assim como as ações das demais políticas sociais também
podem impactar as ações da assistência social, o SUAS foi criado com
a
perspectiva
da
intersetorialidade dentro do território.
[...] a Assistência Social, enquanto política pública que compõe o tripé da
Seguridade Social, [...] considerando as características da população
atendida por ela, deve fundamentalmente inserir-se na articulação
intersetorial com outras políticas sociais, particularmente, as públicas de
Saúde, Educação, Cultura, Esporte, Emprego, Habitação, entre outras, para
que as ações não sejam fragmentadas e se mantenha o acesso e a qualidade
dos serviços para todas as famílias e indivíduos. (BRASIL, 2009a, p. 42).
O principal objetivo do desenvolvimento do trabalho em rede está na busca pela não
fragmentação das ações, para que a família possa ser atendida em sua totalidade, garantindo,
assim, a qualidade de vida da população (BRASIL, 2009a).
Assim, é possível afirmar, de acordo com a PNAS, que a intersetorialidade requer um
rompimento com a lógica das práticas segmentadas, de forma que a proteção social seja
priorizada em detrimento da segmentação das intervenções pelos diversos setores atuantes.
Trabalhar em rede, nessa concepção territorial significa ir além da simples
adesão, pois há necessidade de se romper com velhos paradigmas, em que as
práticas se construíram historicamente pautadas na segmentação, na
fragmentação e na focalização, e olhar para a realidade, considerando os
novos desafios colocados pela dimensão do cotidiano, que se apresenta sob
múltiplas formatações, exigindo enfrentamento de forma integrada e
articulada. (BRASIL, 2009a, p. 44-45).
Em relação ao trabalho intersetorial, os CRAS apresentaram suas experiências:
Não. Ainda não, ainda não consegue. Consegue assim, é um problema da
educação, a educação vem, a gente senta, a gente discute problemas assim.
Mas a gente se encontra às vezes, reunião de conselho municipal [...]. É a
oportunidade que a gente se encontra. [...]então é só esses eventos eventuais
né? . (CRAS I, 2015).
142
Olha nós temos o contato, ainda há muito o que se avançar né? [...] pode-se
dizer que não semanal, mas a cada quinze dias pode-se dizer que sim,
quando surge um caso novo a gente senta e discute, quando surge
necessidade. [...] muito contato também com a gestora né? Ela que faz esses
contatos com a educação, algumas vezes, saúde, mas às vezes diretamente,
ontem mesmo a gente teve uma reunião com a educação... Assim, não a
reunião aqui, eles não vem até nós, mas eu e a gestora formos na saúde,
conversamos com o gestor lá da saúde, ontem fomos na educação, é mais
quando tem assim alguns casos, que nem a gente está com um caso na
educação, ai a gente vai até lá, faz reuniões [...].(CRAS III, 2015).
É no caso a comissão Intersetorial né? Acho que é um momento que tem a
comissão dos direitos da criança e do adolescente, a gente acaba tratando de
todos os casos, mas em especifico de criança e adolescente, é onde a gente
trabalha junto com a saúde, e a educação, né? Todas as políticas públicas,
que giram em torno da criança e da família, então nessa comissão é muito
bacana. (CRAS II, 2015).
Na verdade quem tem mais contato com a rede é a psicóloga, ela até faz essa
parte, do trabalho em rede, tem um projetinho de violência também que é ela
que faz parte, ela que tem mais contato, toda quarta feira também ela vai no
fórum, é um grupo de estudo na verdade [...] Saúde, assistência, educação,
conselho tutelar também faz parte, acho que até a polícia, a polícia militar
também...eu acho que vai fazer cerca de um ano e meio mais ou menos que
tem, e no caso quem vai aqui do CRAS e participa das reuniões é a
psicóloga. (CRAS IV, 2015).
Entretanto, a intersetorialidade proposta pelo SUAS, requer que possamos ir além das
discussões de casos isolados, além das comunicações cotidianas com os demais setores,
conforme contextualiza Bronzo e Veiga:
[...] mais do que a articulação ou a comunicação entre os diversos setores
sociais, tais como saúde, educação, habitação, emprego e renda, saneamento
e urbanização, por exemplo. Ela aponta para uma visão integrada do
problema da exclusão, em uma perspectiva que situa a pobreza como um
problema coletivo, algo que diz respeito ao conjunto da sociedade e que deve
ser coletivamente enfrentado. (BRONZO; VEIGA, 2007, p. 11, grifo do
autor).
Nesse sentido, de acordo com os sujeitos desta pesquisa, para a existência de um
trabalho em rede, que possa proporcionar uma visão integrada da realidade social e que
possibilite a criação de estratégias para um enfrentamento coletivo destes problemas sociais,
ainda há muito que avançar:
Mas marcar um encontro para discutir. Discutir, por exemplo, a gente sabe
que no município a gravidez está com o índice lá em cima... Sentar, falar
mensalmente para discutir esse assunto, ai não senta, não senta, não senta. .
(CRAS I, 2015).
143
Entretanto, existe o reconhecimento da importância do trabalho intersetorial:
Não senta, é complicado, mas isso não acontece de fato. Mas seria tão bom
se acontecesse né? Seria ótimo... . (CRAS I, 2015).
Recorrendo à Yasbek, podemos compreender que as dificuldades para a efetivação do
trabalho interdisciplinar estão relacionadas ao modo como as políticas sociais são organizadas
e gerenciadas em nosso país, sob a lógica da centralização e da hierarquização.
A não efetivação dessa intersetorialidade decorre, dentre outros fatores da
própria condução da política no cenário brasileiro em que as “políticas
públicas [sociais] (educação, assistência social, saúde, habitação, cultura,
lazer, trabalho, etc.) apresentam-se setorizadas e desarticuladas, respondendo
a uma forma de gestão com características centralizadoras e hierarquizadas”
(YAZBEK, 2014, p. 99).
De acordo com Pereira (2014) a compreensão do termo intersetorialidade é complexo,
e muitas vezes acaba sendo confundido com outros termos, o que também pode causar
incoerência no trabalho intersetorial.
Mas assim, a gente faz o encaminhamento, a rede às vezes atende nossas
demandas, eles também fazem encaminhamentos para gente, eu acho que
tem uma parceria sim, mas ainda precisa avançar bastante. (CRAS III, 2015).
[...] mas assim, sempre quando a gente precisa né? Pega o telefone da uma
ligadinha, a gente está sempre se falando. (CRAS IV, 2015).
Neste caso, quando há apenas os encaminhamentos ou trocas de informações, não
podemos afirmar que houve o rompimento com a setorialização, nem mesmo com a
segmentação do atendimento.
O trabalho interdisciplinar requer espaço para discussões dos problemas sociais, pois
parte do princípio de que sua efetivação pode criar uma visão integrada dos problemas sociais
e consequentemente de suas soluções.
A qualidade de vida demanda uma visão integrada dos problemas sociais. A
gestão intersetorial surge como uma nova possibilidade para resolver esses
problemas que incidem sobre uma população que ocupa determinado
território. Essa é uma perspectiva importante porque aponta uma visão
integrada dos problemas sociais e de suas soluções. Com isso busca-se
otimizar os recursos escassos procurando soluções integradas, pois a
complexidade da realidade social exige um olhar que não se esgota no
âmbito de uma única política social. (JUNQUEIRA, 2004, p. 27).
144
Junqueira defende ainda que a intervenção de apenas uma política social não é capaz
de efetivar o trabalho intersetorial, até porque não existe uma única solução para as demandas
que chegam à rede.
Portanto, a ação intersetorial não se esgota no âmbito de uma organização ou
de uma política social, mas de várias organizações públicas, sejam privadas
ou estatais [...]. Os problemas sociais emergem da interação do sujeito com o
mundo, e sua percepção não é única, depende dos valores de cada ator social
envolvido, e, como tal, sua solução também não será única, inclusive porque
as certezas absolutas perderam consistência. (JUNQUEIRA, 2004, p. 29).
A Política Nacional de Assistência Social foi elaborada com esta mesma linha de
pensamento, como podemos identificar no trecho a seguir:
[...], ao invés de metas setoriais a partir de demandas ou necessidades
genéricas, trata-se de identificar os problemas concretos, as potencialidades e
as soluções, a partir de recortes territoriais que identifiquem conjuntos
populacionais em situações similares, e intervir através das políticas públicas
[e sociais], com o objetivo de alcançar resultados integrados e promover
impacto positivo nas condições de vida. (BRASIL, 2009a, p. 38).
Um trabalho intersetorial, em consonância com os direcionamentos da PNAS (2004) e
com as fundamentações teóricas elaboradas pelos estudiosos do assunto, somente acontece a
partir de uma interação satisfatória entre os diversos setores que compõem a rede do território.
Para tanto, é indispensável uma relação de respeito e confiança:
Supõe vontade, decisão, que tem como ponto de partida o respeito à
diversidade e às particularidades de cada setor ou participante. Envolve,
portanto estruturação de elementos de gestão que materializem princípios e
diretrizes, a criação de espaços comunicativos, a capacidade de negociação
e também trabalhar os conflitos para que finalmente se possa chegar, com
maior potência, às ações. (YASBEK , 2014, p. 98).
Além disso, cabe também destacar a importância da horizontalidade na tomada de
decisões.
Na estrutura organizacional em rede – horizontal – todos têm o mesmo poder
de decisão, porque decidem somente sobre sua própria ação e não sobre a
dos outros. Não há dirigentes nem dirigidos, ou os que mandam mais e os
que mandam menos. E todos têm o mesmo nível de responsabilidade – que
se transforma em co-responsabilidade – na realização dos objetivos da rede
(WHITAKER, 2000, p. 2 apud GIAQUETO, 2010, p. 97).
145
Abordando sobre a visão dos sujeitos desta pesquisa em relação ao contato que o
CRAS mantém com a rede intersetorial no território, questionamos se é possível atender todos
os encaminhamentos que recebem.
O CRAS IV relatou que o trabalho em rede ainda é recente no município e portanto
recebem poucos encaminhamentos.
Olha, se eu te falar que sempre tem alguém que é mandado para cá, alguma
coisa, não tem, é muito difícil, é mais a busca espontânea mesmo, é... acho
que foram poucas pessoas hoje que foram encaminhadas pela rede, está
muito novo aqui no município, esse trabalho também da rede. (CRAS IV,
2015).
Já os CRAS I e II responderam que estão conseguindo atender a demanda da rede.
Sim, sim, a gente tá, a saúde é que mais encaminha, a gente tem um contato
bom com a saúde, na saúde o NASF, que agora foi implantado no município,
é nosso parceiro, a gente trabalha muito junto, está dando muito certo, muito
mesmo. Nós encaminhamos para os grupos deles, e eles encaminham para os
nossos grupos, tá tendo bastante contato. (CRAS I, 2015).
A gente tenta né? A gente tenta.. da melhor maneira possível, porque a gente
tem um olhar diferenciado para o cidadão, para o usuário [...].(CRAS II,
2015).
No que tange a este contato com a rede e ao atendimento das demandas que recebem,
um elemento interessante, relacionado à falta de compreensão do papel desempenhado pela
assistência social no atendimento das demandas do território precisa ser destacado, pois como
veremos a seguir, esta realidade está prejudicando o acesso aos direitos pelos usuários.
Não, porque com essa questão deles acharem que tudo é aqui, às vezes não
depende de nós, alguma necessidade, não está vinculada a nós, mas assim é
feito o diálogo, a orientação, e ai é encaminhado pro.... até porque tem
necessidade que não depende né? Nós somos limitados às vezes, muitas
vezes na nossa atuação. (CRAS III, 2015).
Já foi pior. É a questão de entender qual é o papel da assistência e do CRAS
né... Que o CRAS não está aqui para resolver problema de indisciplina de
aluno, que não é função do CRAS dar medicamento e nem fralda geriátrica,
que a gente não interna ninguém, não faz internação psiquiátrica, que a gente
não tem que ir lá limpar a casa da pessoa, que é invasão, não tem que abrir o
armário dela pra ver se realmente esta faltando alimentação, que ela não está
mentindo. Então as pessoas da rede intersetorial não compreendiam. Porque
a gente veio de um período de mudanças: tipificação, a NOB. Quando a
gente entrou era uma fase de transição mesmo e isso causou um atrito
políticas. (CRAS I, 2015).
146
[...] só que saiu da comissão é um jogo de empurra, isso não é meu, isso vai
para o CRAS o pessoal quebrou o pé, é problema do CRAS, a pessoa... tudo
é dentro do CRAS. Esse nosso momento é muito por conta disso, aquela
pessoa precisa ir no médico, não tem condições de ir não tem o transporte, a
saúde não vê que é dever deles acham que a pessoa se vira, e ela acaba vindo
para o CRAS. (CRAS II, 2015).
Só que eu entendo as vezes que a saúde ainda não entendeu nosso papel, essa
questão assim, eu percebo que.. Tem alguns encaminhamentos né? Que eles
poderiam resolver lá, não precisaria trazer para cá, é sempre para a
assistência social [...] eu acho que todo município tem esse problema né? Da
saúde não entender... Tudo é assistência, então eu acho que é um passo a se
avançar nesse sentido. (CRAS III, 2015).
Giaqueto acredita que esta falta de conhecimento sobre a Política de Assistência Social
acaba contribuindo para a não efetivação do trabalho intersetorial.
Um dos entraves para a concretização do trabalho intersetorial, portanto, é a
dificuldade do diálogo entre as diversas áreas de atendimento, que tem como
uma de suas causas, a falta de informação sobre a Política de Assistência
Social por parte dos outros órgãos e secretarias da prefeitura. (GIAQUETO,
2010, p. 91).
Diante desta realidade, destacamos uma fala em especial:
Muitas vezes a rede não sabe qual é o papel do CRAS. Até o medicamento a
gente se pega muitas vezes debatendo, e sendo que o medicamento teria que
ser da saúde. Mas como que faz ela não toma? [...] Vamos dizer assim, que
ai você tem que ver a melhor forma daquela pessoa conseguir aquele
medicamento na hora, porque ela não tem condições de esperar um mês para
conseguir uma lata de leite, dependendo da situação então, ainda a muito
conflito com relação a isso sim. Mesmo a gente sabendo que não é da gente
a gente faz, para atender eles[...] Eu falo assim que a realidade daqui, ela é
muito diferente dos municípios vizinhos, assim das cidades pequenas, é
muita complicado[...]. É muito diferente, é gritante. (CRAS II, 2015).
O CRAS II traz elementos para uma reflexão interessante neste momento. Afinal, o
que fazer diante destas situações onde o setor responsável pela efetivação de um determinado
direito não está garantindo-o? Neste exemplo, o CRAS optou por fazer o atendimento,
pensando na proteção social do usuário, justificando que o importante foi garantir o acesso ao
direito que vinha sendo negado.
A assistência social, historicamente, atendeu as demandas reprimidas pelos demais
setores. Que trabalhador da assistência social nunca ouviu a antiga fala de que “tudo o que
não é de ninguém, torna-se da assistência social”?. Realidade esta, que pode ser compreendida
147
devido à própria natureza contraditória da política de assistência, marcada, pela ausência de
normatizações e de direcionamentos técnicos sobre o papel da assistência
O SUAS, por sua vez, foi idealizado também com este compromisso, o de organizar as
ações na área da assistência social.
A partir da criação da PNAS em 2004 a da instituição do SUAS em 2005, a assistência
passou a caminhar na busca pela conquista do seu espaço no bojo das políticas públicas, desde
então, diversas portarias, guias técnicos e normatizações vêm sendo elaboradas pelo
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) e pelo Conselho Nacional
da Assistência Social (CNAS), no intuito de proporcionar clareza sobre esta política pública e
o seu papel no atendimento do território.
Nesse sentido, é importante que nos posicionemos sobre o que já temos claro no que
tange à política de assistência social.
Explicar para o setor “poxa a pessoa vai demorar uma mês, aguardar o
processo de licitação, ou então ela vai ter que entrar no judiciário, para
conseguir esse medicamento?”, então muitas vezes há esse... a gente tem que
bater de frente né? (CRAS II, 2015).
Conforme expôs a equipe do CRAS II e é reforçado pela equipe do CRAS I, é preciso
realizar um trabalho de orientação ao usuário sobre o papel específico de cada política pública
e se posicionar em relação aos encaminhamentos indevidos da rede, contatando o setor
responsável e esclarecendo sobre as normatizações/portarias existentes que esclarecem sobre
determinado tipo de atendimento. Como bem frisou a equipe, é fundamental ser firme, neste
aspecto.
Quando teve a mudança de benefícios, da assistência é da assistência e da
saúde é da saúde9, quando teve essa transição de que não é função da
assistência fornecer óculos, próteses, remédios, a gente teve um desgaste
muito grande, mas a gente se manteve muito firme. E na hora de atender esse
usuário, ainda que a política de saúde não aceitasse que isso era função dela,
a gente reforçava com o usuário que medicamento era obrigação, era função
da saúde atender e não do CRAS e a gente explicava, a gente fazia reunião
informando, para o usuário não ficar de um lado pro outro. E ainda é uma
luta muito grande hoje para consolidar essa situação, porque quando a saúde
para de dar medicamento lá, o usuário volta aqui pra gente, seja porque não
fez licitação, ou porque não tem mais recurso para gastar, mas devemos lutar
9
Aqui, refere-se ao conteúdo da Resolução n. 39, de 09 de dezembro de 2010, que dispõe sobre o
processo de reordenamento dos Benefícios Eventuais no âmbito da Política de Assistência Social em
relação à Política de Saúde.
148
para que ele seja informado da situação e não que ele seja jogado para outro
setor tentar resolver. (CRAS I, 2015).
Ainda em relação ao contato com a rede, abordamos sobre a continuidade do
acompanhamento familiar, no caso dos encaminhamentos recebidos e realizados.
O CRAS I destacou manter um vínculo favorável com os usuários, que possibilita que
eles mesmos retornem ao CRAS, mas que a devolutiva por parte dos setores também
acontece.
Conseguimos... Se não a rede não der a devolutiva a gente cobra (risos), se
for preciso às vezes por telefone. Mas a gente sempre orienta o usuário, a
voltar, “você vem aqui e me fala o que aconteceu”. Mesmo se for o BPC, ele
foi no INSS, normalmente assim, ele volta e fala “deu certo, não deu certo,
preciso disso, preciso daquilo” [...] Ele vai lá na saúde e fala assim: “fulano,
falou assim, fala até as virgulas, é meu direito, e assim, assim, assim”, aí o
fulano fala: “a então está bom” e a gente acaba fincando sabendo. (CRAS I,
2015).
Identificamos, ainda, que na perspectiva dos trabalhadores, o fato de se tratar de
trabalharem em município de pequeno porte I, contribuiu para a continuidade do
acompanhamento às famílias encaminhadas.
A gente continua em contato com eles, continua... acredito que por ser
município de pequeno porte, então a gente ainda consegue acompanhar,
[...]por exemplo, quando a gente aciona o conselho tutelar, sempre tem o
retorno, a gente faz o acompanhamento, da saúde, a gente sempre tem...
(CRAS III, 2015).
Em contraposição, o CRAS IV expôs que em alguns casos não há a devolutiva dos
encaminhamentos, o que impossibilita a continuidade do acompanhamento.
Nem sempre, nem sempre acontece, às vezes a gente encaminha e nunca
mais fica sabendo, ou às vezes eles encaminham também e a gente acaba
deixando passar batido, então nem sempre tem essa devolutiva não. (CRAS
IV, 2015).
Por fim, partindo dos elementos obtidos em relação ao trabalho em rede, identificamos
que os CRAS vêm conseguindo ter um contato com as demais políticas públicas, realizando
encaminhamentos e atendendo as demandas recebidas, entretanto, ainda existe uma falta de
clareza, por parte da rede intersetorial, sobre o lugar ocupado pela política de assistência
social.
149
Um desafio importante encontra-se na efetivação do trabalho intersetorial. As
vivencias dos sujeitos nos apontaram elementos importantes que nos levam a compreender os
entraves para que a intersetorialidade aconteça no território.
3.7 Os Caminhos da Assistência Social: Qual a Contribuição do SUAS?
Partindo do pressuposto de que o SUAS está completando 10 anos neste ano de 2015,
suponha-se que a organização e a prática da assistência social tenham sofrido muitas
mudanças ao longo deste período.
Sendo assim, discutimos com os participantes dos grupos focais e questionamos os
coordenadores dos CRAS sobre a perspectiva dos mesmos acerca desta caminhada, de forma
que fosse possível compreender como os mesmos identificam as principais mudanças, os
desafios enfrentados, os avanços conquistados e a relação desta realidade vivenciada no
cotidiano do trabalho com a implantação do SUAS.
Em relação à efetivação da assistência social no período anterior à implantação do
SUAS, muitos trabalhadores não puderam contribuir, pois ainda não trabalhavam na área e
não têm, portanto, conhecimento de como a assistência social era realizada. Entretanto, foi
possível absorver algumas informações:
Era assistencialista né? Isso aí já vem lá desde o princípio né? Mas assim, a
gente percebe que tem avançado. Eram os benefícios eventuais, não tinha
equipe mínima concursada, era tudo contratado, nós não tínhamos espaço
né? Era menor, [...] era executado numa casa com pouco espaço. Só tinha
uma assistente social, acho que um coordenador e um auxiliar
administrativo, então a equipe bem mínima não dava para executar o que
tinha realmente para executar, então mudou, nós não tínhamos carro, carro
era uma dificuldade tremenda né? Na realização das visitas, ou o que tivesse
que fazer. (CRAS III, 2015).
Era bem mais assistencialista, nossa era demais, eu lembro que esse serviço
de benefício... Tinha de tudo... Era bem mais [...] Ai parece que a primeira
dama ajudava, era uma assim coisa bem, mas eu acho que avançou sim
naquela época eu fazia estágio. (CRAS II, 2015).
Era uma assistente social da prefeitura né? Antes, lá em 2004/ 2005 tinha
uma assistente social na prefeitura, uma só, trabalhava se não me engano era
20 horas, e fazia toda a parte de plantão social e atendimento para concessão
de beneficio. Então ela doava auxilio... Era mais auxilio financeiro e cesta
básica que dava, era só isso que fazia e visita pra conceder, ou quando o
prefeito pedia para ela ir na casa do fulano, ou quando queria que fizesse um
mutirão para limpar a casa de alguém, aí... ela não fazia a limpeza não, mas
aí arrumava alguém para fazer a limpeza, aí ia para fazer. (CRAS I, 2015).
150
Podemos identificar que há alguns anos atrás, antes da implantação do SUAS, a
assistência social era realizada principalmente por meio da concessão de benefícios eventuais.
Alguns termos utilizados nas falas como “ela doava auxílio”, “a primeira dama ajudava”, “o
prefeito pedia para ir na casa de fulano” nos remete à história da assistência social, marcada
por ações assistencialistas e clientelistas. O vínculo com o governante e sua esposa estava
explícito e a benevolência se fazia presente como pano de fundo das ações.
Foi destacado também a ausência de concursos públicos e a existência de uma
infraestrutura inadequada para a efetivação do trabalho, uma vez que os funcionários não
contavam com espaço adequado, tampouco com transporte próprio para estar em contato com
as famílias.
A partir da criação da Política Nacional de Assistência Social em 2004 e da
implantação do SUAS no ano de 2005, algumas mudanças passaram a acontecer, entretanto,
cabe destacar que na perspectiva dos trabalhadores estas mudanças não aconteceram de forma
imediata, tanto que eles destacam o ano de 2009 (CRAS I) e o ano de 2011 (CRAS III) como
sendo os anos que marcaram o rompimento de um ciclo:
O Centro de Referência, antes do ano de 2009, exercia suas funções no
mesmo local em que atuava o Órgão Gestor da Assistência Social o que
gerava a confusão de papéis. A equipe que o compunha não atendia as
exigências estabelecidas pela NOB-RH e seu funcionamento estava
comprometido, pois os técnicos de nível superior cumpriam uma carga
horária semanal de apenas 20 horas. No ano de 2009 com a mudança da
gestão do Poder Executivo foi realizado um estudo sobre as necessidades de
adequação de estrutura física, funcionamento e a equipe necessária para
prestar o serviço. O CRAS foi implantado definitivamente em março de
2009 após adequação da estrutura física e contratação da equipe mínima
através de Processo Seletivo. [...]e ai mudou por duas vezes a equipe e agora
as meninas estão como efetivas. A equipe redondinha sem um
administrativo, que o outro administrativo pediu afastamento, a partir de
2014, só o órgão gestor que não, ainda as meninas não são efetivas.
(Coordenador do CRAS I, 2015).
A prefeitura realizou concurso público para formar a equipe do CRAS em
2011, adequando os perfis profissionais às necessidades do SUAS.
(Coordenador do CRAS III, 2015).
Cabe ressaltar a importância dada pelos trabalhadores à efetivação dos profissionais
por meio de concurso público.
Foi muito importante! Depois do concurso público, foi um grande avanço,
porque agora todas que trabalham são concursadas. Havia o primeiro
damismo, é bem menos essa influência, nós conseguimos planejar um
trabalho entre órgão gestor e CRAS, e executar, não tem assim muita
151
influência na questão de querer, por exemplo, a prefeita querer executar
alguma coisa aqui, nesse caso tem avançado, tem liberdade para planejar e
executar as atividades. E quando ela questiona que ela quer alguma
intervenção, a gente tem as leis, mostra né? A gente senta, conversa, mostra
a lei, fala dos critérios, e pelo menos tem entendido, e não temos feito né,
tentamos tá sendo um trabalho de formiguinha, mas com sucesso, porque
temos conseguido avançar muito nesse sentido, muito mesmo. (CRAS III,
2015).
O CRAS III ressalta que a efetivação do quadro de funcionários proporcionou maior
autonomia para a realização do trabalho, o que contribuiu para o rompimento com o primeiro
damismo10, perpetuado por tantos anos no município, assim como no restante do país.
Já o CRAS I destaca que um avanço importante está na continuidade do serviço
ofertado:
É a maior dificuldade aqui no município é a questão da mudança né? Eu
estou já há seis anos ai e já é a terceira equipe que passa, então é assim,
quando você está encaminhando o seguimento no seu serviço, muda, aí entra
outro profissional, aí quando está encaminhando de novo, que ele está
entrando, aí muda novamente, então é aonde que o trabalho sempre dá uma
brecada, mas agora graças a Deus, as meninas estão aí passou né? Da adição
à assistência né? Então não vai ter mais essa mudança, então o trabalho vai
ter continuidade, eu acho que até a questão da união também né?
(Coordenador do CRAS I, 2015).
E complementam afirmando sobre o compromisso do servidor público para com a
efetivação da política pública.
[...] então agora eu tenho que ter consciência assim: “eu sou servidora
pública, trabalho com a assistência social, então eu tenho que entender da
política de assistência social.” (CRAS I, 2015).
Cabe aqui destacar que a PNAS em seu conteúdo já abordava a necessidade da
valorização dos profissionais que efetivam o serviço público:
Valorizar o serviço público e seus trabalhadores, priorizando o concurso
público, combatendo a precarização do trabalho na direção da
universalização da proteção social, ampliando o acesso aos bens e serviços
sociais, ofertando serviços de qualidade com transparência e participação na
perspectiva da requalifição do Estado e do espaço púbico, esta deve ser a
10
A expressão primeiro damismo surgiu na era Vergas quando a Primeira-Dama do país, Darcy Vargas, assumiu
a presidência da LBA. A partir de então, estabeleceu-se a cultura de que as primeiras damas deveriam ser
responsáveis pelas ações de assistência social nos Estados e Municípios. Enfrenta-se, ainda nos dias atuais,
desafios para o rompimento com esta cultura, na busca da afirmação da assistência social enquanto política
pública, que deve ser realizada por meio de trabalho profissional, na perspectiva do acesso aos direitos e não da
realização de assistencialismo (MESTRINER, 2008).
152
perspectiva de uma política de recursos humanos na assistência social, com
ampla participação nas mesas de negociações. (BRASIL, 2009a p. 55).
Desta forma em 26 de dezembro de 2006 foi aprovada a NOB-RH/SUAS
publicada em 25 de janeiro de 2007, que em seu conteúdo, especificou sobre a composição
das equipes de referência dos serviços, programas, projetos e benefícios.
Equipes de referência são aquelas constituídas por servidores efetivos
responsáveis pela organização e oferta de serviços, programas, projetos e
benefícios de proteção social básica e especial, levando-se em consideração
o número de famílias e indivíduos referenciados, o tipo de atendimento e as
aquisições que devem ser garantidas aos usuários. (BRASIL, 2009b, p. 19).
No tocante as equipes de referência dos CRAS instalados nos municípios de Pequeno
Porte I, para até 2.500 famílias ficou definido enquanto equipe de referência: dois técnicos de
nível superior, sendo um profissional assistente social e outro preferencialmente psicólogo,
dois técnicos de nível Médio e um coordenador (BRASIL, 2009b).
A NOB-RH/SUAS trata ainda em sua Introdução, no item 12, sobre a importância da
criação de um Plano de Carreira, Cargos e Salários para os trabalhadores do SUAS.
PCCS é uma questão prioritária a ser considerada. Ele, ao contrário de
promover atraso gerencial e inoperância administrativa, como alguns
apregoam, “se bem estruturado e corretamente executado é uma garantia de
que o trabalhador terá de vislumbrar uma vida profissional ativa, na qual a
qualidade técnica e a produtividade seriam variáveis chaves para a
construção de um sistema exeqüível” (Plano Nacional de Saúde, 2004, p 172
- 173 e PNAS, 2004, apud BRASIL, 2009b, p. 13).
Porém, os municípios visitados ainda estão lutando para a efetivação desta conquista.
O Gestor da assistência social requereu à prefeitura a instituição do Plano de
Cargos carreiras e salários, mas ainda está sendo avaliado pela gestão
municipal. (Coodenador do CRAS III, 2015).
Não. Ainda é uma meta que não alcançamos. (Coordenador do CRAS I,
2015).
Outro conteúdo discutido foi a questão da capacitação continuada. A NOB-RH/SUAS
direciona para a existência de uma política nacional de capacitação dos trabalhadores do
SUAS:
4. A capacitação dos trabalhadores da área da Assistência Social deve ser
promovida com a finalidade de produzir e difundir conhecimentos que
devem ser direcionados ao desenvolvimento de habilidades e capacidades
153
técnicas e gerenciais, ao efetivo exercício do controle social e ao
empoderamento dos usuários para o aprimoramento da política pública.
5. A capacitação dos trabalhadores da Assistência Social tem por
fundamento a educação permanente e deve ser feita de forma:
a) sistemática e continuada: por meio da elaboração e implementação de
planos anuais de capacitação;
b) sustentável: com a provisão de recursos financeiros, humanos,
tecnológicos e materiais adequados;
c) participativa: com o envolvimento de diversos atores no planejamento,
execução, monitoramento e avaliação dos planos de capacitação, aprovados
por seus respectivos conselhos;
d) nacionalizada: com a definição de conteúdos mínimos, respeitando as
diversidades e especificidades;
e) descentralizada: executada de forma regionalizada, considerando as
características geográficas dessas regiões, Estados e municípios.
f) avaliada e monitorada: com suporte de um sistema informatizado e com
garantia do controle social. (BRASIL, 2009b).
Porém, questionados sobre a existência de capacitação continuada para os
trabalhadores, os sujeitos afirmaram que em alguns momentos realizam capacitações técnicas
organizadas pela DRADS, sobre algum assunto específico.
Entendemos que a capacitação continuada é um elemento primordial na busca pela
garantia da assistência social enquanto um direito social. Os trabalhadores precisam vivenciar
momentos onde possam relacionar teoria x prática e desta forma pensarem em estratégias para
superarem as dificuldades enfrentadas no dia-a-dia do trabalho.
Todavia, estes cursos precisam ir além de simples direcionamentos técnicos sobre a
execução de determinado projeto, serviço ou programa. Os trabalhadores do SUAS precisam
ser instigados a pensar a assistência social enquanto política pública, a compreenderem o
contexto social e econômico no qual esta política está inserida, é preciso que tenham
momentos para pensar a política de assistência social no seu sentido macro, para identificarem
os conceitos utilizados na base de sua formulação, suas contradições dentro do sistema
capitalista e assim encontrarem elementos consistentes para discutirem o como toda essa
conjuntura se materializa no cotidiano profissional.
Ao realizarmos um levantamento sobre os materiais disponibilizados pelo governo
federal sobre a assistência social, nos deparamos com uma série de cartilhas e orientações
técnicas para a efetivação do trabalho da assistência social, mas, a política de capacitação
continuada prevista pela NOB/SUAS precisa ir além, precisa, de acordo com o que já foi
apontado, considerar as características regionais e mais que isso, precisa proporcionar espaços
coletivos para o debate.
154
Em razão da ausência de cursos e capacitação continuada, ofertadas pelo governo, os
CRAS precisam encontrar estratégias para que as equipes tenham momentos de reflexões:
No intuito de nos capacitarmos e refletirmos a prática, realizamos todas as
sextas-feiras reunião para planejamento e estudo dirigido com as técnicos de
nível médio e superior da equipe mínima e nas segundas com os orientadores
sociais. (Coordenador do CRAS I, 2015).
Ao tratarmos sobre o Sistema Único de Assistência Social - SUAS, abordamos os
sujeitos desta pesquisa sobre qual a importância deste sistema para a política de assistência
social.
É... Tornou-se política pública né? Tornou-se um direito, não é um favor que
a gente está fazendo, o serviço que a gente oferece é um direito deles né? É..
e assim sobre essa questão, organizou muito bem a política de assistência
social e ai é onde contribuiu também para o rompimento do clientelismo e
passou a ser mesmo o direito de cada um, eu acho, eu acredito que avançou
muito. (CRAS III, 2015).
Um sistema único né? Terminou aquele assistencialismo, a partir da
efetivação, então assim, separou o que era da assistência e o que não era da
assistência, para cada política, então ele fortaleceu a política, pra fazer
realmente aquilo que é papel dela, não fazer o que é papel do outro fazer. O
SUAS eu acho que, assim, hoje, hoje o SUAS é uma... É a organização né? É
a organização da forma de trabalho, é a diretriz máxima de como a gente
deve funcionar e atuar, que dá segurança para gente atuar enquanto
profissional desse sistema né? Que organiza e oferta essa assistência, essa
política pública, que faz com que os trabalhadores, uma vez que eles
compreendam o que é o sistema único, o que ele deve e como ele deve ser
implantado, organizado, no município, faz com que ele atue de forma
independente, autônoma, segura, sem ingerência política né? (CRAS I,
2015).
Eu acho que é a nossa vertente de trabalho hoje o SUAS né? Eu acho que é o
nosso trabalho como ele deve ser realizado, é um norte para a gente, é
realmente, eu acho que a gente tem que pelo menos tentar seguir alguma
coisa, tudo a gente não vai conseguir colocar em prática, mas eu acho que o
que a gente conseguir é o que vai ser válido é o que é importante para a
gente. (CRAS IV, 2015).
É ele que é o articulador, que organiza, é nossa, vamos falar assim, é nossa
diretriz. Avanço... é nosso avanço. Assim, como que eu vou falar, como se
fosse a política de... de... normas, direcionamento, de norte, então é a base
mesmo. (CRAS II, 2015).
É possível identificar que na perspectiva dos trabalhadores, o SUAS surgiu com a
tarefa de organizar a política de assistência social no território, norteando as ações
155
profissionais nesta área. Desta forma, o usuário da assistência social passou a ter uma
referência para o acesso a esta política em qualquer lugar do território nacional.
Sabendo que se ele for para outro município, [...] ele tem a quem recorrer,
porque é um padrão nacional, todo mundo faz de acordo com esse sistema e
não cada um, cada qual faz da sua maneira. Hoje tem uma diretriz, hoje tem
regulamentação, que ele pode atuar com segurança né? (CRAS I, 2015).
Um avanço a ser destacado encontra-se na tipificação das ações. A partir de 2009, com
a publicação da Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais, as ações desta política
pública passaram a ser organizadas por níveis de complexidade do SUAS: Proteção Social
Básica e Proteção Social Especial de Média e Alta Complexidade. Esta organização vem
contribuindo para o fim do espontaneísmo, tão presente ao longo da história da assistência
social.
Outros avanços foram elencados pelas equipes dos CRAS:
A eu acredito que trouxe sim, principalmente na parte do assistencialismo,
embora ainda exista, mas eu acho que é bem pouco, mas eu acho que ele
trouxe sim bastante mudança. (CRAS IV, 2015).
... eu acho que trouxe. Há... Esse trabalho com grupo mesmo né? Que
antigamente não tinha, é a parte de normativa que vem a ação né? O que eu
falo, por mais que eu acho que está bem aquém, assim está construindo
agora, ainda está novo, mas assim, demorou um tempo para a gente
entender, aliás, eu estou entendendo ainda né? Eu acho que assim, trouxe
mudanças? Sim. Significativas? Sim, só que, ainda... ainda é assim um
passo de formiga ainda. Ainda é muito novo. (CRAS II, 2015).
Essa relação de direito mesmo, o direito, a equipe né? . A equipe, se não eu
acredito que a gente ainda estaria na equipe mínima, no espaço físico
também contribuiu, porque se não estaríamos lá no... Então contribuiu,
temos espaço físico ótimo, tem a parte de atendimento e de palestra né?
Onde a gente realiza os cursos, as oficinas, a gente tem o espaço de culinária,
de cabelereiro, temos um norte teórico para executar nossas atividades
diárias né? Então foi um avanço muito grande na assistência, facilitou muito,
o SUAS. (CRAS III, 2015).
A partir da implantação do SUAS e das diretrizes do Plano os usuários
tinham a sua disposição um sistema que ofertava o acesso a direitos e rompia
com a ideia de favor e benesse, isso fortaleceu a Assistência Social que
durante esses 08 anos de adesão possibilitou uma mudança muito grande na
cultura de acesso a direitos pela população, pois organizou e estabeleceu
padrões, diretrizes, que qualificaram o atendimento. (Coordenador do CRAS
I, 2015).
A PNAS e o SUAS oportunizaram vários avanços, o primeiro é que o
município pode planejar suas ações de acordo com o seu território,
respeitando suas características. A gestão municipal regulamentou a provisão
156
de benefícios eventuais no âmbito da política pública de assistência social
delegando a responsabilidade do fornecimento de medicamentos para a
política municipal de saúde e definiu que os benefícios eventuais ficassem
sob a responsabilidade do Órgão Gestor. E o suporte técnico da Secretaria
Estadual de Assistência Social por meio da equipe da DRADS de
Fernandópolis. (Coordenador do CRAS III, 2015).
A nível de município posso citar a destinação de espaço exclusivo para o
CRAS, a separação do Órgão Gestor do CRAS e a edição de Lei Municipal
que define quais os benefícios eventuais podem ser concedidos no âmbito da
Assistência Social. Com relação às normas editadas, acredito que a
Tipificação Nacional de Serviços e a NOB RH SUAS foram fundamentais
para esse avanço. (Coordenador do CRAS I, 2015).
Em relação aos desafios enfrentados pelos trabalhadores no cotidiano da implantação e
implementação do SUAS, surgiram alguns elementos, que já foram explorados anteriormente,
como a falta de clareza sobre o papel da política de assistência social pelas demais políticas
públicas; a realização da busca ativa e acompanhamento familiar, que está relacionado aos
desafios da efetivação do trabalho social com as famílias; a existência de um diagnóstico
social sobre a área de abrangência dos CRAS e o alcance de todo o território; e, por fim
romper com a cultura clientelista, ainda presente no território.
Aprimorar e ampliar a oferta dos serviços sem que assumamos o papel de
outras políticas públicas como saúde, educação, cultura e lazer.
(Coordenador do CRAS I, 2015).
Fazer acompanhamento familiar e busca ativa devido a demanda de trabalho
existente. Garantir a equivalência no aceso ao atendimento à população
urbana e rural. Fazer diagnóstico social da área de abrangência do CRAS (no
momento existe apenas o perfil das famílias atendidas pelos programas
sociais). (Coordenador do CRAS III, 2015).
[...] eu acho que é romper com a cultura clientelista aqui, eu acho que é o
ponto crucial, ainda é muito de cesta básica, aquela visão mesmo de
paternalismo de clientelismo, eu acho que é isso. Eu acho que é cultural. Eu
acho que é até um conhecimento da politica pelas outras politicas. (CRAS II,
2015).
Pensando nestes desafios, algumas estratégias foram elencadas como possibilidades
para enfrentá-los:
Estudo constante para que tenhamos clareza de papeis e atribuições, bem
como desenvolver através dos profissionais que atuam junto a Assistência
Social a conscientização dos usuários como forma de fortalecer a Política de
Assistência Social. (Coordenador do CRAS I, 2015).
157
O CRAS I destaca duas estratégias de suma importância para o enfrentamento dos
desafios diários, destacando a relevância da capacitação profissional dos trabalhadores do
SUAS e da conscientização dos usuários. Estes dois segmentos (trabalhadores e usuários) são
sujeitos essenciais para que esta política seja efetivada, e com certeza, a partir do
conhecimento e reconhecimento da assistência social e seus objetivos, eles terão condições de
aderir e contribuir com a luta conjunta pela garantia da assistência social enquanto direito
social, em meio ao cenário contraditório, no qual está posta.
3.8 Assistência Social: Um Direito Efetivado?
É sabido que a Constituição Federal de 1988 inovou ao inserir a assistência social no
bojo das políticas sociais a partir de sua garantia enquanto direito social. Desde então,
trabalhadores, usuários, estudiosos da área e representantes da sociedade civil percorrem uma
árdua caminhada para que este direito, hoje garantido legalmente, seja efetivado.
Mas, o que seria garantir a assistência enquanto um direito social? Sobre este
conteúdo, Sposati contribui teoricamente, ressaltando a primazia da responsabilidade do
Estado para a sua garantia.
A perspectiva de constituí-la como política pública exige a introdução em
sua aplicação da racionalidade republicana na gestão dessa política para
além da concepção de gestão humanista (de solidariedade ou de
benemerência). O Estado, na gestão da política de assistência social, não
pode permanecer no papel de coadjuvante que concede ajudas financeiras,
subvenções a ações, trabalhos ou projetos comunitários de organizações da
sociedade civil. Ele precisa alcançar o estatuto de regulador e responsável
por garantir proteção social como política de cidadania, isto é, nem
compensatória, nem residual, nem caritativa, nem assistencialista, mas sim
política pública de direitos. (SPOSATI, 2007, p. 446-447).
Buscamos a compreensão dos trabalhadores do SUAS a respeito:
Levar informação, primeiro o usuário ele tem que saber que a politica existe,
porque que ela existe, que ele e contribuinte para que ela exista, que e direito
dele, que é dever do Estado. E nós profissionais, a responsabilidade está em
cima da gente, fazer essa ponte entre o direito e o usuário, entender também
que o usuário não é raso, que ele tem conhecimento, que ele tem o seu
conhecimento, o que a gente precisa fazer nesse sistema, é fazer com que ele
compreenda o funcionamento, que ele saiba fazer valer o direito dele, que
ele seja realmente protagonista da vida dele, que ele consiga direcionar a
vida dele para onde ele queira ir, e não agir como, antes a gente trabalhava
muito a questão, de eu levar para o usuário, [...] como se o usuário não
soubesse, como se o usuário não entendesse, bom, partindo de uma premissa
158
de que eu sei o que é melhor para meu usuário, mas é ele que sabe o que é
melhor para ele, ele que tem que conhecer que é direito dele, se ele quer
acessar esse direito no momento ou não, o que é prioridade para ele. E assim,
hoje tem muita gente esclarecida, tem, a população está esclarecida, é por
isso que o profissional tem que estar assim em constante estudo, porque às
vezes você fala uma coisa errada que o usuário lá da plateia te corrige,
porque hoje com o avanço da tecnologia, todo mundo tem acesso à
informação. (CRAS I, 2015).
Garantir a assistência como um direito social? é você executar uma política
não como se você estivesse fazendo um favor para a pessoa, mas sim
analisar ela né? A pessoa na sua conjuntura, no total, na sua conjuntura, é
respeitar a cultura, é você contribuir para ela sem achar que está fazendo um
favor, garantir seus direitos. É realmente garantir seus direitos, efetivar.[...]
Fundamentar a prática dos trabalhadores do SUAS nas legislações. Fazer
com que as famílias conheçam seus direitos e a forma de acesso aos
mesmos. Garantir a equidade na oferta de serviços. (CRAS III, 2015).
Os sujeitos compreendem a assistência social enquanto direito na perspectiva da oferta
de informação e possibilidade de acesso aos direitos existentes. Para eles, garante-se o direito
à assistência social à medida que se efetiva um trabalho de orientação acerca dos direitos, sob
a ótica da universalização do acesso. Para tanto, ressaltaram a importância do trato ao usuário
da política de assistência social enquanto cidadão dotado de direitos.
O CRAS IV, por sua vez, após um período de silêncio, apresentou dificuldade para
responder nosso questionamento:
Ixi [...] Essa é difícil, bem difícil, (silencio...pensativa) repete a pergunta?
[...] Porque hoje a assistência é para quem dela necessitar, independente eu
acho, da classe social, como é um direito... (silêncio... pensativa). Se eu te
falar que eu nunca parei para pensar nisso... não sei, como garantia eu não
sei, fazer ela ser um direito né? (CRAS IV, 2015 – grifo nosso).
E logo em seguida, ao perguntarmos se acredita que os profissionais não realizam esse
exercício de pensar sobre o conceito de assistência social, recebemos um desabafo:
Não faz, não pensa e nem coloca em prática. (CRAS IV, 2015).
E continuou apresentando o seu ponto de vista
Eu acredito que faltam discussões, porque a gente às vezes fica um pouco
perdido sabia? Nos projetos que eles mandam para a gente, cada hora é de
uma maneira, cada hora é de uma forma, a gente não sabe o que faz, Às
vezes a gente está fazendo, “não, não está certo, está errado, tem que ser
assim” então a gente fica até meio perdida, na verdade, eu acho que falta
mais discussão porque nem eu sei te responder. (CRAS IV, 2015).
159
Então, tentamos instigar a discussão, questionando sobre como ficariam os usuários
neste contexto, pois se na sua perspectiva os profissionais não pensam, não discutem a
respeito do que é o direito à assistência social, como é possível garantir que o restante da
população tenha esse conhecimento? Porém, o CRAS IV limitou-se ao silêncio.
Ao discutirmos sobre os principais desafios enfrentados para que o direito à assistência
social seja efetivado, o CRAS I relatou acreditar que o principal desafio está no
empoderamento do usuário, uma vez que, os governantes e o próprio poder público, em
alguns casos, temem que a população tenha conhecimento de todos os seus direitos, pois desta
forma, teriam propriedade para reivindicá-los.
Aqui, fazer as pessoas que trabalham com os usuários entender que o usuário
tem potencia, que ele tem condições de buscar os seus direitos, e atuar para
que essa pessoa tenha acesso a esses direitos, porque muitas vezes é muito
melhor ter um “usuariozinho” alienado, para você dominar, “não fala não, há
é direito dele, mas não precisa falar” né? Esse é o desafio maior, as pessoas
tem medo do que a população... os governantes tem medo do que a
população pode ter de conhecimento e a assistência é parte do poder público,
mas ela não está do lado do poder público, ela está do lado da população. Ela
é vista como desafiadora, [...] Por isso que eu falo, quando a gente fala com
propriedade, as pessoas elas sabem que você esta falando com propriedade.
Você sabe o que você está fazendo, então ela não vai ter coragem de te
questionar sobre algo que ela sabe que está correto. Na verdade a assistência
tem que ser uma cobra que o estado criou para picar ele (risos). Exatamente,
não é não? É... Por isso que a gente tem que trabalhar com autonomia,
porque agente tem que fazer com que o usuário conheça seu direito, saiba
onde está esse direito e como ele deve acionar esse direito, e ai a gente tem
que ir contra quem emprega a gente, quem trabalha na rede conosco, porque
as pessoas que trabalham não tem essa visão do usuário, muitas vezes é
melhor, lá na saúde, falar para o usuário que não tem medicamento, e não
explicar para ele, que não tem o medicamento, mas o medicamento é direito
dele, que e ele quiser ele pode acessar a via tal, a via tal, a via tal. Mas ai
quando ele chega aqui à gente fala, mas é direito seu você volta lá fala pra...
Aí você acaba criando indisposição com pessoas que não querem que o
usuário tenha esse conhecimento, eu acho que esse é o principal desafio, é
fazer as pessoas compreender que o usuário ele tem direito e que nós
estamos aqui para ofertar o serviço público, ofertar o direito com qualidade.
(CRAS I, 2015).
O rompimento com a cultura clientelista foi apontada pelo CRAS II, como sendo o
principal desafio encontrado.
Eu acho que é romper com a cultura clientelista aqui, eu acho que é o ponto
crucial, ainda é muito de cesta básica, aquela visão mesmo de paternalismo,
de clientelismo, eu acho que é isso. Eu acho que é cultural. Eu acho que é até
um conhecimento da politica pelas outras politicas. (CRAS II, 2015).
160
De fato, enquanto o paternalismo e o clientelismo estiverem presentes na política de
assistência social, a sua efetivação enquanto um direito não será possível, pois, o benesse, o
favor, a tutela e o favoritismo anulam qualquer possibilidade de rompimento com a trajetória
histórica desta política, que sempre foi praticada como não-direito, mas sim como ação que
necessita da “boa vontade” dos governantes, que por questões morais, decidem dispensar
recursos para a sua efetivação.
Outro desafio apontado, desta vez pelo CRAS III, encontra-se na existência dos
critérios.
Eu acho que precisa entender melhor os critérios né? Eu acho que os
critérios do governo [...] vamos supor, nordeste poderia ter tido esse critério,
região sul outro... Nossa região aqui, outro... [...] porque ficou um padrão e
não é padrão, a qualidade de vida lá, não é o mesmo que a qualidade de vida
aqui, a gente se sente assim, é uma coisa que a gente fica... O Bolsa família
em especial, eles não entendem muito bem, a gente tem essa dificuldade
deles entenderem né? (CRAS III, 2015).
Para este CRAS, é contraditório falar em direito quando o acesso a ele depende de
enquadramento em critérios pré-estabelecidos, como é o caso do acesso aos programas de
transferência de renda.
Quem criou o bolsa família, esses critérios, assim, utilizou para o Brasil
inteiro, e esqueceu que cada um tem sua particularidade, perdeu um pouco a
essência, então assim, às vezes eu vou assim para minha casa e me sinto
assim, às vezes, fiscalizando o usuário e eu não gosto entendeu? Pela
questão [...] Que a gente recebeu a polícia federal, que veio fiscalizar os
municípios, [...] a gente tornou pública a lista, tá lá a lista, Então assim, aí a
gente fica: “nossa será que tem alguém né?”. Aí você fica assim, já sai um
pouco dessa de efetivar o direito. É que aqui, por ser um município pequeno,
a gente conhece a realidade das famílias, mas se é um município maior a
gente trabalha com o que a pessoa traz aqui entendeu? Então aqui tem essa
questão, a fulano tá mentindo, ciclano tá mentindo, e a gente consegue
averiguar, mas e a cidade maior? E acontece muito aqui, de fulano denunciar
o outro. [...] Porque às vezes fulano mentiu, mas a gente tem declaração de
renda que a pessoa assina, tem essa questão assim deles entenderem assim os
critérios do governo e a gente mesmo fica sem saber o que fazer... [...] E eu
me sinto frustrada por que o governo coloca um critério só para o Brasil
inteiro, ai dificulta muito. Então essa parte eu sinto dificuldade. (CRAS III,
2015).
Já o CRAS IV acredita que um dos desafios encontra-se na ausência de valorização
dos trabalhadores.
Hii... Falta tanta coisa, eu acho que falta às vezes empenho até por parte da
gente, dos próprios profissionais também para que isso aconteça, eu acho
que falta às vezes, falta incentivo para a gente também, se eu te falar que,
161
tipo assim, às vezes o salário que a gente recebe influência muito, que não é
valorizado né? Eu acho que falta às vezes força de vontade da gente, falta
incentivo para a gente também, eu acho que, eu acho que é isso. [...] Às
vezes, os serviços que a gente oferece, a gente não consegue concretizar ele,
que nem as visitas às vezes, porque não tem carro, falta recurso, tem projeto
parado porque não está vindo dinheiro, a gente não tem resposta porque que
não vem, então você acaba desanimando infelizmente você acaba
desanimando, você não sabe o que fazer, qual atitude tomar. (CRAS IV,
2015).
Para eles, os profissionais encontram-se desmotivados em razão dos baixos salários,
da ausência de incentivo e até mesmo da inexistência de infraestrutura adequada para a
realização do trabalho, o que está diretamente relacionado com a qualidade do serviço
prestado, que por ser precário, contribui para a não efetivação da assistência social enquanto
direito.
Outro desafio importante a ser superado, na visão do CRAS II, encontra-se no fato de
as pessoas reconhecerem a assistência social enquanto política social destinada aos pobres.
[...] porque infelizmente a área da assistência social no Brasil foi feito para
baixa renda, eu acho que a gente tem que quebrar isso ai, porque o SUS é de
todo mundo, é universal do rico e do pobre e a assistência não, é para quem
dela necessitar, a gente se prende a renda, renda, renda. Então eu acho que
esse preconceito da área da assistência tem que mudar. Porque gente, não se
faz propaganda, não se fala da assistência, que é para todos, não, não se fala,
né? Como que é, como que procede, mesmo na televisão, a gente não vê
propaganda, parece que o governo não tem interesse em mudar essa
realidade. (CRAS II, 2015).
Apresentam ainda um exemplo a este respeito:
Eu lembro uma vez, que um professor vinha pedir ajuda com medicamento,
nossa, todo mundo caia matando, “onde já se viu aquele homem lá, ele tem
condição de comprar”, entendeu, é essa a visão, e assim medicamento é para
todos é universal. Já hoje, se ele vai no SUS pegar uma medicação, ele vai
ter a mesma renda tal, e lá tudo bem... então olha o tanto que muda a visão
das pessoas, no SUS pode todo mundo e a assistência é para pobre, e sempre
para pobre, eu vejo muito essa visão também. (CRAS II, 2015).
Este exemplo nos remete a uma das reflexões de Sposati, que também faz uma leitura
crítica sobre o olhar dispensado às ações da assistência social:
A exemplo, se o leite é distribuído pela política da saúde, ele tem sua entrega
ao usuário como parte de um programa nutricional baseado em assegurar
nutrientes, calorias e padrões saudáveis de alimentação materno-infantil. Se
o mesmo leite é distribuído ao usuário pelo serviço público de assistência
social, essa entrega é entendida como doação, auxílio ou ajuda para dar de
162
comer à criança pobre ou faminta, filha de pais carentes. Transmuta-se a
mesma ação de garantias de resultados a uma ação de ordem moral e
emergencial, direcionada a carentes, sem qualquer relação ou menção a
direitos ou deveres. Passa a ser uma atitude do governante (ou de sua
mulher em particular), e não uma responsabilidade de Estado. É
interessante notar que a criança pode ser a mesma — como a mesma
poderá ser sua família —, todavia, o guichê estatal da assistência social
transmuta na versão conservadora, o direito à nutrição em ajuda ao pobre,
pelos usos e costumes da cultura institucional brasileira, mesmo após a CF88. (SPOSATI, 2007, p. 441).
De acordo com a autora, esta visão que a sociedade tem acerca da assistência social,
afasta-a da lógica do direito. Sposati é clara ao afirmar que a mudança de perspectiva acerca
desta política pública é fundamental para que ela se torne uma política pública de direito.
Considero que um dos fatores que gera essa transmutação é a atribuição
indevida da assistência social ao campo “dos pobres e da pobreza”. É este o
campo das culpas, das vítimas e sofredores, dos coitados e dos não cidadãos.
[...] A condição de ser pobre não gera direitos. É a condição de ser cidadão
que os gera. Por conseqüência, enquanto for atribuída a responsabilidade da
assistência social ao trato do pobre, ela não será uma política de direito de
cidadania. Esta é uma das questões mais difíceis a ser enfrentada, pois muda
o “pólo energético” da assistência social. (SPOSATI, 2007, p. 441).
O CRAS I, também traz esta necessidade de mudar o conceito atribuído à assistência
social:
Que não está vinculada apenas ao critério de renda, que tem direito todo
aquele que necessitar, porque, às vezes a pessoa, ela não tem vergonha de ir
na saúde, mas às vezes fala de assistência social acha que tem que estar em
estado de pobreza, e não é assim, a gente tem que mudar esse conceito das
pessoas, que é direito dela, que ela é quem financia a política. (CRAS I,
2015).
Por fim, questionamos se é possível afirmar que a assistência social é um direito
efetivado hoje.
O CRAS IV foi claro ao afirmar que acredita que o direito não acontece e o CRAS III
afirmou acreditar que ainda é preciso avançar.
Eu acho que não, eu acho que não é direito efetivado, ele está lindo no papel,
mas eu acho que na prática ele não acontece, eu acho que não acontece.
(CRAS IV, 2015).
É um direito efetivado, mas precisa avançar bastante, totalmente acredito
que não, estamos tentando avançar, mas assim, já está em lei, já está
garantido, o desafio é romper mesmo, e é um processo continuo, é uma luta
163
diária, e a gente não consegue assim, transformar do dia para noite é uma
luta mesmo. (CRAS III, 2015).
Como podemos observar, na perspectiva de alguns trabalhadores, aqui representados
pelo CRAS III, a busca pela efetivação da assistência social enquanto um direito é uma luta
diária.
Todos sabemos que este direito foi garantido em 1988 pela Constituição Federal (há
27 anos) e que em 2005 (há 10 anos) um sistema único, o SUAS, foi instituído para organizar
a assistência social enquanto política pública.
A princípio pode parecer muito tempo, entretanto, ao considerarmos a quantidade de
décadas e por que não séculos, pelos quais a assistência social foi efetivada sem nenhum tipo
de direcionamento técnico ou suporte legal, sob a perspectiva da “ajuda ao próximo”, por
meio de ações espontâneas, fica mais fácil compreendermos a existência de tantos desafios e
resistências para que esta lógica secular seja modificada. Afinal, como explicita Carvalho
(2006, p. 124): “A assistência social é uma velha prática, mas jovem política.”
Sposati (2007, p. 438), nos esclarece sobre isso:
Analisar a especificidade/particularidade da política de assistência social no
Brasil significa entender que estamos tratando de um objeto sócio-histórico,
econômica e geograficamente situado, e que, portanto, se está tratando de
uma dada relação de forças sociais, econômicas e políticas que, no caso,
constrói o formato do regime brasileiro de assistência social.
Nesse sentido, de fato, a luta deve ser diária. Os trabalhadores do SUAS trabalham em
parceria com trabalhadores de outras políticas públicas que, por muitas vezes, nunca
estudaram sobre a formulação da política de assistência social e seus fundamentos, trabalham
com governantes que, por muitas vezes, ainda dispensam à assistência social o olhar de que
esta deve ser destinada aos necessitados e desamparados.
Enfim, se deparam com resquícios da trajetória histórica diariamente. “Há um
simbólico arraigado à cultura social e política brasileira que sugere ser a assistência social a
área de governo que autoriza aos necessitados, de preferência aos mais necessitados dentre os
necessitados, o ‘acesso gratuito’ a bens para sua subsistência.” (SPOSATI, 2007, p. 441). E,
sendo assim, precisam estar firmes, lutando para que as mudanças aconteçam, exigindo da
gestão que a lei seja cumprida.
O CRAS II ficou dividido sobre ser ou não a assistência social um direito efetivado.
Por fim, chegaram ao consenso de que estão caminhando para isso (para a efetivação do
164
direito), conquistando avanços importantes, portanto não podem dizer “não, de jeito nenhum”,
acreditam que a melhor resposta seria “estamos no caminho”.
Acho que sim, [...] na minha interpretação entender que a assistência existe e
para que ela serve, a gente vem trabalhando isso esse ano pesado nos grupos,
só vem falando sobre isso, então assim, entender, eles entendem que a
assistência existe e eles procuram, então a partir dai a gente começa... Então
eu penso que sim, eu penso que está funcionando, eu penso que está sendo
efetivado eles entendem... Porque se eu falasse: não está. Então assim, seria
de jeito nenhum no meu entendimento, entendeu o que eu quis dizer? (CRAS
II, 2015).
E continuou a reflexão:
Nossa que pergunta difícil gente, não sei, muito difícil, às vezes eu acho que
sim, às vezes eu acho que não. Que é o que eu acabei de falar, a gente está
no caminho, então os usuários eles sabem que existe a política de assistência,
não está direcionado ainda na cabeça deles, que vai demorar, até para nós
né? O que seria, para que veio a assistência, e a gente esta construindo,
assim, reforço na minha fala que a gente tá trabalhando pesado sobre isso
nos grupos. Até porque assim: a gente falou de clientelismo e paternalismo,
ai se a gente começa a analisar, a história da assistência dentro do nosso
município [...] agora que a gente está construindo, a gente está realmente
numa fase de transição, e assim, eu não sei se as meninas viram, ouviram, se
prestaram atenção no dia da conferencia da criança e do adolescente, a fala
do prefeito em relação a assistência, vocês lembram o que ele falou? Ele
falou um negocio lá de assistencialismo e ainda disse: “as meninas da
assistência social vão me matar porque vou falar isso” então, eu percebi na
fala dele que ele também está desconstruindo, então, eu vejo que a gente tá
numa fase de transição mesmo. (CRAS II, 2015).
Apenas o CRAS I respondeu acreditar que hoje a assistência social é um direito
efetivado, entretanto, ressaltaram que esta resposta positiva está relacionada com a realidade
do município.
A assistência em nosso município eu acho que é um direito efetivado. Não
consolidado ainda, totalmente, efetivado, tá efetivado, porque a gente
trabalha com autonomia para o usuário né? Sem ter medo, sem medo, sem
ficar por baixo de ordens, sem fazer algo que não é correto, então à gente faz
o que é correto, se é direito, se é o nosso papel, a gente não vai deixar de
fazer porque o prefeito ou vereador veio falar que não é para fazer, não, o
nosso papel a gente exerce, independente de qualquer outra rede, se e o
nosso dever a gente vai fazer, então por isso que ele está consolidado sim.
(CRAS I, 2015).
O CRAS I afirma ser a assistência social um direito efetivado no município,
justificando que os trabalhadores do SUAS realizam suas ações com autonomia, se
posicionando e fazendo valer o direito do usuário, independentemente das vontades políticas.
165
Ao longo de toda entrevista, foi possível identificar nas falas do CRAS I um
posicionamento claro em favor do rompimento com as antigas práticas e a busca por
aprofundamentos teóricos para que as mudanças pudessem ser realizadas. Desta forma, a
concretização desse rompimento, certamente contribuiu para que a equipe construísse a
perspectiva de que estão conseguindo efetivar o direito à assistência social.
Ao refletirmos sobre ser ou não ser a assistência social um direito efetivado hoje,
torna-se relevante ressaltar o quanto são mínimas ou praticamente nulas as possibilidades de
efetivar a assistência social enquanto direito no seio de uma sociedade capitalista.
Podemos encontrar ações importantes que deem vida, que fortaleçam o direito à
assistência social, assim como podemos identificar intervenções relevantes que garantam o
acesso aos direitos sociais. Entretanto, ao considerarmos a estrutura das políticas sociais e
todos os interesses econômicos que temos como pano de fundo das intervenções políticas,
deparamo-nos com uma realidade contraditória, a qual não contempla a lógica da
universalização dos direitos, não permite a divisão da riqueza socialmente produzida e,
portanto, não garante a igualdade social, tampouco garante que as necessidades básicas de
todo o cidadão sejam supridas.
Porém, esta leitura crítica sobre as frágeis possibilidades da efetivação do direito à
assistência social, não nos deve direcionar para a sua negação. Pelo contrário, precisamos ter
clareza de todos os entraves existentes, reconhecendo-os e discutindo-os, mas, acima disso,
precisamos considerar os avanços e ressaltar as possibilidades que ela nos apresenta.
A luta pela efetivação deste direito não pode parar e para isso precisamos acreditar
nesta política, afinal ela é o caminho, é a possibilidade que temos neste momento histórico.
166
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A oportunidade de poder realizar este estudo constituiu-se numa aprendizagem impar,
que proporcionou a construção de novos conhecimentos ao longo de todo o processo.
Há quem diz que o pesquisador precisa se apaixonar pelo seu objeto de estudo, e neste
caso, o objeto de estudo é mais que uma paixão, é algo que faz parte da trajetória profissional
da pesquisadora.
A assistência social, que por tanto tempo foi praticada sem nenhum direcionamento
teórico, apenas pautado na ajuda e na boa vontade, conquista a partir de 1988 uma esperança,
pois passa a dividir o mesmo chão com diversas outras políticas sociais, sob a lógica da
primazia da responsabilidade estatal.
Legalmente, a assistência social tornou-se um direito social, entretanto, este foi apenas
o primeiro passo de uma longa caminhada, que se estende até os dias atuais. Na contramão
dos interesses econômicos vigentes, pautados no neoliberalismo que adentrou o Brasil na
década de 1990, a assistência social caminhou a passos lentos, tendo o artigo 203 da
Constituição Federal, que trata dos objetivos da assistência social, regulamentado apenas em
1993 com a publicação da LOAS.
O próximo avanço se deu com a criação da PNAS em 2004 e com a instituição do
SUAS em 2005. Agora, a assistência social estava regulamentada e possuía um norte para a
sua efetivação em todo o território nacional.
Entretanto, no chão social, todos estes avanços legislativos nem sempre vêm
conseguindo garantir o seu espaço.
Os trabalhadores do SUAS enfrentam desafios dia após dia para romper com os
resquícios da trajetória histórica desta política pública, seja por parte da sociedade, seja por
parte dos governantes. A cultura da benevolência perdurou por tanto tempo que não é tarefa
simples convencer a todos de que estamos tratando de direitos quando tratamos da assistência
social.
Todos estes desafios se tornam ainda mais complexos quando direcionamos um olhar
crítico à própria organização da política de assistência social, que foi construída sobre pilares
um tanto quanto contraditórios. Desta forma, caso nos afastemos das reflexões teóricas,
colocamo-nos sob o risco de reproduzir, mesmo que inconscientemente, os interesses da
burguesia, olhando para os problemas sociais e tentando compreendê-los enquanto problemas
individuais, que devem ser superados pelas famílias e não como problemas da sociedade
capitalista que é naturalmente desigual e conflituosa.
167
Analisando toda esta estrutura que temos como pano de fundo para a política de
assistência social, poder conhecer a perspectiva dos trabalhadores sobre esta política e sobre o
trabalho que o CRAS vêm desenvolvendo na busca pela implantação do SUAS, foi algo
extremamente rico.
A realidade passou a ser avaliada já no processo de seleção dos municípios, que foi um
tanto quanto desafiador. Diferente do que prevíamos, muitos municípios se recusaram a
contribuir com a presente pesquisa. Entretanto, o contato realizado para a apresentação da
proposta já nos proporcionou um conhecimento imenso. Ouvir os coordenadores justificarem
a recusa na participação, nos levou a compreender o quanto ainda precisamos avançar para
conquistar o espaço que é de fato garantido para a política de assistência social.
Deparamo-nos com realidades, onde o primeiro damismo ainda é tão presente, a ponto
de não permitir que os profissionais venham “expor” a realidade do município. E, com
realidades onde o trabalho desenvolvido pelos CRAS está tão “defasado” que o coordenador
foi direto ao afirmar que não participaria, pois não tinha nenhuma atividade em
desenvolvimento no momento e que nada poderia declarar sobre a implantação do SUAS
naquele território. Além destes casos, encontramos também realidades onde a equipe mínima
do CRAS não estava garantida, ora por falta de assistente social, ora por falta de coordenador,
ora por falta de ambos os profissionais.
Todos estes elementos já nos permitiram identificar o quão grande são os desafios
desta região para que o SUAS venha a ser implementado, uma vez que, nem implantado ainda
podemos afirmar que ele está.
Após a seleção dos municípios, a possibilidade de conhecer o cotidiano destes CRAS e
as perspectivas das equipes foi além das expectativas iniciais, nos deparamos com realidades
diversas, entretanto, com profissionais, que mesmo diante de tantas dificuldades, são
comprometidos com o desenvolvimento do trabalho realizado.
Poder conhecer a dinâmica de trabalho de cada equipe, nos levou a compreender o
quanto o Sistema Único de Assistência Social ainda é eclético. Em diversos momentos
identificamos que cada local interpreta a política à sua maneira, e assim, cada um enfatiza o
que lhes parece melhor. As estratégias de intervenção são diversas e ainda existe falta de
clareza sobre o que de fato cabe à política de assistência social.
Por meio das categorias de análises criadas para a realização da análise dos dados,
enfatizamos os elementos mais importantes que surgiram a partir dos grupos focais.
Na perspectiva dos trabalhadores, o CRAS constitui-se em um espaço de referência
para a população, porém, as principais demandas apresentadas são distintas nos municípios.
168
Há municípios que já conseguiram fazer com que a população veja o papel do CRAS para
além das concessões materiais, como espaço de trocas e de acesso à informações, enquanto
em outros, o que prevalece é a inclusão em programas sociais e acesso à benefícios eventuais.
No que tange ao controle social, podemos destacar que ainda há muito que avançar.
Identificamos realidades em que a composição dos conselhos não passam de algo meramente
formal, que não consegue ir além do papel, como também nos deparamos com situações em
que há tentativas para que os conselhos sejam ativos, mas, falta o engajamento dos seus
membros.
Em relação ao trabalho social com famílias, cada município o realiza à seu modo.
Cabe aqui destacar o quanto ainda precisa-se de esclarecimentos a respeito do objetivo deste
trabalho e das possíveis abordagens metodológicas existentes.
O trabalho em rede é algo bastante desafiador, a falta de clareza do papel da política de
assistência social acaba sendo um ponto dificultador. As possibilidades para a efetivação de
um trabalho intersetorial são pequenas, ainda se prevalece a lógica individualista, onde cada
política social faz o seu trabalho. A ideia de que “vamos atender juntos, sob a perspectiva da
totalidade” ainda tem muito para avançar.
Mesmo com tantos entraves, os trabalhadores acreditam que o SUAS contribuiu
significativamente, eles acreditam que estamos no caminho para a efetivação do direito à
assistência social.
Pensar a assistência enquanto um direito social requer alcançar a superação de
diversos desafios com os quais nos deparamos.
Acreditamos que primordialmente os recursos humanos precisam estar garantidos e
atendendo ao perfil pré-estabelecido pelo SUAS. Uma política pública só pode ser efetivada
de forma qualificada com a presença de profissionais qualificados e isto requer investimento.
Vivenciamos uma realidade marcada pela precarização do trabalho, e isso rebate na prática
profissional, pois não podemos fazer política pública com trabalhadores multifuncionais, que
realizam de tudo a qualquer modo, pelo contrário, está lógica nos remete à antiga visão de que
“para pobre qualquer coisa basta”.
É preciso investimento em educação permanente. O governo tem a responsabilidade
de capacitar os trabalhadores, entretanto o plano nacional de educação permanente no SUAS,
ainda continua sendo uma utopia.
E é necessário, ainda, discutir a estrutura da política de assistência social atual, que
conforme explanamos ao longo da dissertação, foi elaborada sobre pilares contraditórios. Os
trabalhadores do SUAS precisam se debruçar nos estudos e buscar compreender a fundo estes
169
pilares que vêm sustentando a política de assistência social, para então se engajarem, por meio
de luta coletiva, para que haja diálogos e reflexões construtivas a respeito de possibilidades de
mudanças em sua base organizacional.
Por fim, acreditamos que mesmo diante de tantas contradições e desafios, não cabe
simplesmente recusar a efetivar esta política. É preciso apropriarmos dela, ressaltando as
possibilidades que a mesma nos apresenta. Por mais que seja contraditória, a política de
assistência social nos proporciona acesso à população, acesso à classe que vive do trabalho,
acesso à parcela da sociedade que mais sofre com a relação conflituosa entre capital x
trabalho. Por que não utilizar este acesso de maneira estratégica?
Temos consciência de que no âmbito da sociedade capitalista não é possível garantir a
universalização do acesso aos direitos sociais e de que sob a ótica do modelo neoliberal tornase desafiador levar o Estado a tomar para si a responsabilidade pela proteção social dos
cidadãos, entretanto, precisamos caminhar pelas lacunas, elaborando estratégias na busca pela
efetivação dos direitos.
Esta é a política de assistência social que temos posta hoje, negá-la neste momento não
nos levará a lugar algum, sejamos, então, estrategistas, e engajemo-nos em uma luta coletiva
por mudanças.
170
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APÊNDICES
178
APENDICE A – QUESTIONÁRIO: PERFIL DOS SUJEITOS DA PESQUISA
I – PERFIL PROFISSIONAL E VINCULO EMPREGATÍCIO
1)
SEXO:
2)
IDADE:
( ) F
____
) M
anos
3)
ESTADO CIVIL:
( ) Solteiro(a)
( ) Divorciado(a)
4)
ESCOLARIDADE:
( ) Ensino Fundamental Completo
( ) Ensino Médio Incompleto
( ) Ensino Médio Completo
( ) Ensino Superior Incompleto
5)
TITULAÇÃO
( ) Graduado
( ) Especialista
(
(
(
) Casado(a)
) União Estável
(
( ) Viúvo(a)
) Separado
( ) Ensino Superior Completo
( ) Pós Graduação Incompleto
( ) Pós Graduação Completo
( ) Mestre
( ) Doutor
6)
INSTITUIÇÃO EM QUE SE GRADUOU
( ) Pública ( ) Privada
Local/Estado:
___________________________________________________________________________
Graduação em:
___________________________________________________________________________
Ano de conclusão da Graduação:
___________________________________________________________________________
7)
INSTITUIÇÃO EM QUE CURSOU PÓS GRADUAÇÃO
( ) Pública ( ) Privada
Local/Estado:
___________________________________________________________________________
Pós Graduação em:
___________________________________________________________________________
Ano de conclusão da Pós Graduação:
___________________________________________________________________________
8)
FUNÇÃO QUE EXERCE NO CRAS ____________________________________
9)
HÁ QUANTO TEMPO ESTÁ ATUANDO NESTA FUNÇÃO?
Anos/Meses
_______
10)
HÁ QUANTO TEMPO ESTÁ ATUANDO NA ÁREA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL?
_______Anos/Meses
11)
VÍNCULO EMPREGATÍCIO NO CRAS
( ) CLT
( ) Estatutário(a)
( ) Informal
( ) Contrato Temporário
12)
SALÁRIO QUE VOCÊ RECEBE DO CRAS _________________ (em R$)
13)
CARGA HORÁRIA DE TRABALHO SEMANAL NO CRAS ______ (EM HORAS)
14)
VOCÊ EXERCE OUTRA ATIVIDADE DE TRABALHO REMUNERADA?
( ) NÃO Se a resposta for não, pule para a pergunta 17.
( ) SIM Qual?________________________________________
TIPO DE VÍNCULO DESTA OUTRA ATIVIDADE?
( ) CLT
( ) Estatutário(a)
( ) Informal
( ) Contrato Temporário
15)
CARGA HORÁRIA DE TRABALHO SEMANAL NESTA OUTRA ATIVIDADE
_________________(EM HORAS)
16)
SALÁRIO
QUE
VOCÊ
_________________ (em R$)
RECEBE
DESTA
OUTRA
ATIVIDADE
II – PARTICIPAÇÃO POLÍTICA, EVENTOS CIENTÍFICOS E CAPACITAÇÕES
17)
PARTICIPAÇÃO EM EVENTOS CIENTÍFICOS NOS ULTIMOS 12 MESES?
( ) Não
( ) Sim. Elenque os eventos, se possível:
1._______________________________________________________________________
( ) Obteve algum recurso/auxilio financeiro da Instituição
( ) Apresentou trabalho
2._______________________________________________________________________
( ) Obteve algum recurso/auxilio financeiro da Instituição
( ) Apresentou trabalho
3._______________________________________________________________________
( ) Obteve algum recurso/auxilio financeiro da Instituição
( ) Apresentou trabalho
18)
REALIZOU CAPACITAÇÕES NOS ULTIMOS 12 MESES?
( ) Não
( ) Sim. Elenque os eventos, se possível:
1._______________________________________________________________________
( ) Obteve algum recurso/auxilio financeiro da Instituição
2._______________________________________________________________________
( ) Obteve algum recurso/auxilio financeiro da Instituição
3._______________________________________________________________________
( ) Obteve algum recurso/auxilio financeiro da Instituição
19)
EXERCE PARTICIPÇÃO POLÍTICA? (Membro de Conselhos, Sindicatos,
Associações, Órgãos da Categoria Profissional entre outros)
( ) Não
(
) Sim/Qual(is)?
*Detalhar se possui algum cargo.
180
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
20)
LEU ALGUM LIVRO/ARTIGO CIENTÍFICO DE CONTEÚDO ESPECÍFICO NOS
ÚLTIMOS 12 MESES?
( ) Não
( ) Sim. Qual/Quais?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
21)
RECORRE A ALGUM(S) AUTOR(ES) ESPECÍFICO(S) e/ou REFERENCIAL
TEÓRICO ESPECÍFICO PARA APRIMORAR SEU CONHECIMENTO TEÓRICO E/OU
PARA PAUTAR SUA AÇÃO PROFISSIONAL?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
III – A IMPLEMENTAÇÃO DO SUAS.
22)
VOCÊ ACREDITA QUE A IMPLEMENTAÇÃO DO SUAS CONTRIBUI PARA A
GARANTIA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL ENQUANTO DIREITO SOCIAL E POLÍTICA
PÚBLICA?
( ) Sim
( ) Não
Por que?
________________________________________________________________
________________________________________________________________
________________________________________________________________
________________________________________________________________
________________________________________________________________
________________________________________________________________
________________________________________________________________
181
23)
CONSIDERANDO OS PRESSUPOSTOS DO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA
SOCIAL, DA POLITICA NACIONAL DE ASSISTENCIA SOCIAL E O TRABALHO
DESENVOLVIDO PELO CRAS DESTE MUNICÍPIO, ELENQUE, SE POSSÍVEL, 03 PONTOS
FACILITADORES E 03 PONTOS DIFICULTADORES NA BUSCA PELA GARANTIA E
EFETIVAÇÃO DA ASSISTENCIA SOCIAL ENQUANTO UM DIREITO DO CIDADÃO E
DEVER DO ESTADO.
PONTOS FACILITADORES:
1__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
2-________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
3-_______________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
PONTOS DIFICULTADORES:
1-________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
2-________________________________________________________________________________
182
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
3- ________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
APENAS PARA O COORDENADOR DO CRAS:
ESTE CRAS CONTA COM A EQUIPE MÍNIMA COMPLETA?
( ) SIM. HÁ QUANTO TEMPO? ___________________
( ) NÃO.QUAL(S) INTEGRANTE(S) NECESSÁRIO(S) PARA A FORMAÇÃO DA EQUIPE
MINIMA ESTÁ FALTANDO NA EQUIPE?
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
TODOS OS INTEGRANTES DA EQUIPE MÍNIMA SÃO FUNCIONÁRIOS EFETIVOS
CONTRATADOS POR MEIO DE CONCURSO PÚPLICO?
( ) SIM. HÁ QUANTO TEMPO? ___________________
( ) NÃO.
INTEGRANTE NÃO EFETIVO _______________________________________________________
__________________________________________________________________________________
OBS:______________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
183
APENDICE B – QUESTIONÁRIO: COORDENADORES DOS CRAS.
1-
Histórico da Implantação do CRAS

Data

Existiram estudos sobre o território, seus riscos e vulnerabilidades, como base para a
implantação?
2-
Funcionamento











Horário
Espaço Físico
Placas de identificação
Equipe
Condições Materiais
Condições orçamentárias (recursos federais, estaduais e municipais)
Ações de proteção básica em execução
Existência/articulação com rede – (qual o papel do CRAS)
Facilitadores e Bloqueadores da dinâmica de funcionamento do CRAS
Número de Famílias acompanhadas/mês
Numero de Familias cadastradas
3-
Vigilância Socioassistencial

Existe um diagnóstico social da área de abrangência do CRAS?

São efetivadas ações de monitoramento e avaliação?

O município utiliza dados da gestão da informação do SUAS para planejar, monitorar
e avaliar suas ações? (Rede SUAS, CAD Único, Base de dados do Bolsa Família e BPC,
Censo SUAS, entre outros). Apresente exemplos.
4-
Gestão do Trabalho no SUAS




Realizou-se concurso público?
Houve adequação dos perfis profissionais às necessidades do SUAS?
Existe capacitação continuada?
Foi instituído plano de cargos, carreiras e salários?
5-
Controle Social

Qual a importância do Conselho Municipal de Assistência Social? De que forma você
avalia a relação/articulação do Conselho com a gestão municipal?

Quais os principais desafios para a efetivação do Controle Social no âmbito da política
de assistência social no município?
6-
Avaliação do Coordenador sobre o SUAS

Comente sobre o processo de implantação do SUAS. O município teve
suporte/orientações necessárias do Estado e/ou Governo Federal?

Quais foram as medidas adotadas para a implantação do SUAS?
184




O que mudou com PNAS e SUAS na realidade local?
Quais os principais avanços?
Quais as principais desafios?
Quais as estratégias utilizadas para lidar com os desafios?
7-
Você tem autonomia para planejar e executar as ações deste CRAS?
8Considerando a trajetória histórica da assistência social, marcada por ações paliativas,
não-continuadas, clientelistas e de benevolência, de que forma você avalia a Assistência
Social nos dias atuais neste território? Ainda existem resquícios desta trajetória?
9-
O que seria garantir a assistência social enquanto Direito Social?
10-
Apresente as estratégias utilizadas para a garantia deste direito.
11Quais as principais desafios a serem superados nos dias atuais, para que a assistência
social se efetive enquanto Direito Social, considerando a realidade do município.
185
APENDICE C – ROTEIRO: GRUPO FOCAL
1-
O Cotidiano do CRAS






Como descrevem o cotidiano do CRAS?
Cotidiano de trabalho/atribuições do coordenador
Cotidiano de trabalho/atribuições dos técnicos
Cotidiano de trabalho/atribuições dos Orientadores Sociais
Cotidiano de trabalho/atribuições dos auxiliares administrativos
Cotidianos de trabalho/atribuições dos demais profissionais que realizam atendimento
ao público
2-
Atendimento ao público

De que forma é possível descrever o perfil do público atendido? Quais as principais
características territoriais e a relação destas com o perfil do público atendido?

Apresentem a dinâmica de atendimento.

O CRAS consegue atender todo o território de abrangência?

Realizam busca-ativa?

Qual a estratégia para atender as comunidades, bairros distantes ou zona rural?

Vocês acreditam que o CRAS é uma referência para a população? Por que?
3Principais vulnerabilidades e riscos sociais presentes no território: Demandas de
trabalho

Apresentem sucintamente as características do município e se possível for, relacioneas com as vulnerabilidades e riscos sociais presentes no território.

Quais as principais demandas que chegam até a equipe por parte dos usuários?

Quais as principais demandas que chegam até a equipe por parte da gestão?

Há demandas não atendidas? Quais os desafios?
4-
Trabalho Social com Famílias

Quais as estratégias para a realização do trabalho social com famílias previsto pelo
PAIF?

De que forma acontece o atendimento com Benefícios Eventuais? Quais os critérios?

Para a equipe, qual é a relevância do trabalho social com famílias?

O trabalho com famílias previsto pelo PAIF pode contribuir de alguma forma para que
a assistência social seja compreendida enquanto um direito social? Por que?

Uma das estratégias do trabalho social com famílias se dá por meio da realização de
grupos. De que forma este CRAS vêm efetivando este trabalho? Qual a abordagem
metodológica utilizada/Fundamentação teórica utilizada? É realizado por quem?

Os grupos contribuem de alguma forma para a conscientização e o acesso dos usuários
aos direitos sociais?
5-
O Contato com a rede socioassistencial e intersetorial
186

Como é o contato com a rede? Há reuniões sistemáticas?

Existe Referência/contra-referência? A equipe do CRAS consegue acompanhar a
trajetória do usuário pela rede socioassistencial ou Intersetorial quando realiza ou recebe
encaminhamentos?

É possível atender as demandas da rede?
6-
Controle Social

Os usuários participam das instâncias deliberativas como Conselho e Conferências?

O CRAS realiza algum trabalho para estimular os usuários a se apropriarem destes
espaços?

O CRAS proporciona espaço para que os usuários possam avaliar o trabalho
desenvolvido e apresentar sugestões? De que forma?
7-
As características da Assistência Social no município

Como é possível descrever as características da Assistência Social neste município?
Quais foram as estratégias utilizadas no decorrer dos anos, antes da implantação do SUAS?

É possível identificar resquícios da trajetória histórica da Assistência Social marcada
pelo clientelismo, favor, não-direito, ainda nos dias atuais?
o
Nas ações desenvolvidas:
o
Na visão de vocês, trabalhadores do SUAS:
o
Na visão da população:
o
Na visão dos governantes:

O CRAS têm autonomia para realizar as suas ações dentro do território?
o
Existe o Primeiro-Damismo?
o
Existe Influência Política?
o
É possível apontar alguma interferência por parte dos governantes?

Vocês acreditam que a Cultura Política, a história deste município/região, influenciam
na efetivação da Política de Assistência Social de alguma forma? Por que?
8-
O SUAS e a Assistência Social enquanto direito

De que forma vocês analisam o SUAS? (O que é o SUAS, qual a sua importância)

O SUAS trouxe mudanças para a Assistência Social no município? Aponte-as.

O que seria garantir a Assistência Social enquanto Direito Social?

De que forma este Direito vêm sendo garantido? Quais as estratégias?

Há desafios para a efetivação da assistência social enquanto Direito Social no
território? Quais?

Atualmente, com a implementação do SUAS, é possível afirmar que a assistência
social é um direito efetivado? Por que?
187
APENDICE D – ROTEIRO: PESQUISA DOCUMENTAL JUNTO À DRADS DE
FERNANDÓPOLIS
1Dos Municípios Referenciados:
1.1 Porte do Município:

Pequeno Porte I. _________

Pequeno Porte II. _________

Médio Porte. _________

Grande Porte. _________
1.2 Nível de Gestão:

Gestão Inicial. _________

Gestão Básica. _________

Gestão Plena. _________
2-
Estudo direcionado aos Municípios de Pequeno Porte I
2.1 Nível de Gestão:

Gestão Inicial. _________

Gestão Básica. _________

Gestão Plena. _________
2.2 Comando Único da Gestão do SUAS.

Municípios que contemplam. _________

Municípios que contam com a existência de mais de um cargo para a efetivação da
Gestão do SUAS no município. _________

Quais são os cargos genéricos responsáveis pela gestão?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________

Se possível detalhar o numero de municípios que contam com:
02 cargos para a gestão. _________
03 cargos para a gestão. _________
Mais de 03 cargos para a gestão. _________
2.3 Perfil dos Gestores Municipais.

Municípios com gestores que tem formação acadêmica conforme o quadro de
categorias profissionais do SUAS. _________
Destes:
Municípios com Assistentes Sociais assumindo cargo da gestão. _________
188

Municípios com gestores que não atendem ao quadro de profissionais do SUAS.
_________
Destes:
Municípios com formação acadêmica que não atendem ao quadro de categoriais profissionais
do SUAS. _________
Municípios com gestores sem formação de nível superior. _________
Municípios com Primeira Dama assumindo cargo de gestão. _________

No caso dos municípios com Primeira Dama assumindo cargo de gestão, apresentar o
perfil:
Possuem nível superior com formação que atende ao quadro de categorias profissionais do
SUAS. __________
São assistentes sociais. __________
Possuem nível superior com outras formações. _________
Possuem Ensino Médio Completo. _________
Possuem Ensino Médio Incompleto
Possuem Ensino Fundamental Completo. _________
Possuem Ensino Fundamental Incompleto. _________
2.4 Equipe mínima do CRAS

Municípios com a equipe mínima completa, conforme o perfil estabelecido pela
NOB/SUAS/RH. _________

Municípios com a equipe mínima completa, porém composta por profissionais não
efetivos. _________
Destes:
Coordenador não efetivo_________
Técnico de nível superior não efetivo_________
Técnico de nível médio não efetivo _________

Municípios sem a equipe mínima completa. _________
Dos municípios sem a equipe mínima completa:
Ausência de Coordenador. _________
Ausência de 01 dos técnicos de nível superior. _________
Ausência dos 02 técnicos de nível superior. _________
Ausência de 01 dos técnicos de nível médio. _________
Ausência dos 02 técnicos de nível médio. _________
2.5 Perfil dos coordenadores dos CRAS

CRAS com coordenadores que tem formação conforme o quadro de categoriais
profissionais do SUAS. _________
Destes, coordenadores com formação em Serviço Social. _________

Coordenadores com outras formações acadêmicas, não contempladas pelo quadro de
categorias profissionais do SUAS. _________
ANEXOS
190
ANEXO A – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO – TCLE
191
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