FARMACOVIGILÂNCIA HOSPITALAR E A PROMOÇÃO DO USO RACIONAL DE MEDICAMENTOS Profa. Dra. Gun Bergsten-Mendes “Não existem medicamentos seguros. Existem modos seguros de usá-los.” O PROBLEMA DA PRESCRIÇÃO IRRACIONAL Inclui polifarmácia uso de medicamentos não relacionados ao diagnóstico uso de medicamentos desnecessariamente caros uso inadequado de antibióticos automedicação irracional ( HV Hogerzeil. Br J Clin Pharmacol 1995; 39:1-6) USO RACIONAL DE MEDICAMENTOS Conceito: Utilizar medicamentos de modo racional é utilizá-los de modo a maximizar a eficácia e a minimizar o risco de reações adversas, a um custo razoável (Report of the WHO DURG. Copenhagen, EUR/ICP/DSE 127 II, 1989 POLÍTICA NACIONAL DE MEDICAMENTOS Propósito Garantir a necessária segurança, eficácia e qualidade dos medica-mentos, a promoção do uso racional e o acesso da população àqueles considerados essenciais. ( Portaria n° 3.916 de 30 de outubro de 1998 ,Ministério da Saúde ,Secretaria de Políticas de Saúde, Departamento de Formulação de Políticas de Saúde). Entre as DIRETRIZES propostas para que os objetivos definidos na Portaria, sejam alcançados, estão: Promoção do uso racional de medicamentos Garantia da segurança, eficácia e qualidade dos medicamentos A promoção do uso racional de medicamentos deverá envolver, Farmacoepidemiologia e de Farmacovigilância entre outras medidas, ações de As ações de Farmacovigilância, além de tratar dos efeitos adversos, serão utilizadas, também, para assegurar o uso racional de medicamentos. Para tanto, deverão ser desenvolvidos estudos, análises e avaliações decorrentes dessas ações, de modo a reorientar procedimentos relativos a registros, formas de comercialização, prescri-ção e dispensação dos produtos Quanto à farmacoepidemiologia, deverão ser incentivados estudos sobre a utilização de produtos como forma de contribuir para o uso racional de medicamentos. Farmacoepidemiologia Conceito: É a disciplina que aplica os métodos e / ou os raciocínios epidemiológicos para avaliar a eficácia, o risco e o uso de medicamentos, geralmente em grandes populações. (B Bégaud & LHM Arias. Diccionario de farmacoepidemiología. 1997 ) É a aplicação do raciocínio, do método e do conhecimento epidemiológicos ao estudo dos usos e dos efeitos, benéficos e adversos, de medicamentos em populações humanas Porta, Hartzema & Tilson, 1998 FARMACOEPIDEMIOLOGIA ABRANGÊNCIA A farmacoepidemiologia compreende: 1. Estudos de Utilização de medicamentos 2. Farmacovigilância Estudos de utilização de medicamentos (EUM) abordam a comercialização, a distribuição, a prescrição, a dispensação e o uso de medica-mentos na sociedade, e suas consequencias sanitárias, sociais e econômicas. Podem ser quantitativos e qualitativos. Estudos de utilização de medicamentos quantitativos Estudos de consumo de medicamentos (unidades ou custo), em vários níveis do sistema de saúde nacional, regional, local, institucional Possibilitam descrever o uso de medicamentos segundo sexo, idade, classe social, perfil de morbidade, etc. Estudos de utilização de medicamentos qualitativos Estudos da oferta de medicamentos Estudos sobre a qualidade da prescrição Estudos sobre adesão ao tratamento Vigilância orientada para problemas específicos Estudos de utilização de medicamentos qualitativos Por exemplo, podem Identificar o uso abusivo Identificar o uso insuficiente Identificar o uso excessivo Identificar o uso inadequado ESTUDOS DE UTILIZAÇÃO DE MEDICAMENTOS: EXEMPLOS DE DESENHOS DE ESTUDOS 1. EUM transversais 2. EUM prospectivos, internações completas 3. EUM retrospectivos 4. EUM no contexto de intervenções 5. EUM e Farmacovigilância EUM TRANSVERSAIS Prevalência no ponto 1. Focalizando grupos especiais de pacientes: a.Idosos b.Crianças 2. Focalizando classes terapêuticas ou determinados medicamentos: a.Fármacos com ação no SNC; b.Ranitidina; c.Interações medicamentosas EUM RETROSPECTIVOS 1. Focalizando grupos especiais de pacientes. Ex: Gestantes 2. Focalizando um determinado serviço do hospital. Ex: Emergência psiquiátrica 3. Focalizando o consumo anual de medicamentos. Ex: antibióticos em um hospital privado de atenção terciária. 4. Identificando a ocorrência de reações adversas a medicamentos. EUM PROSPECTIVOS AVALIANDO INTERNAÇÕES COMPLETAS 1.Grupos especiais de pacientes a. Crianças 2.Determinados medicamentos b. Antibióticos EUM E INTERVENÇÕES EUM antes e depois de uma intervenção: a. Antibiótico-profilaxia cirúrgica em uma clínica ortopédica b. Antibiótico-profilaxia cirúrgica em um hospital geral EUM qualitativos da oferta de medicamentos Valor intrínseco de um medicamento é a sua capacidade potencial para modificar o curso clínico de uma doença, à luz do conhecimento sobre sua eficácia e segurança. Capellà & Laporte. Principios de epidemiologia del medicamento, 1993 CATEGORIAS DE VALOR INTRÍNSECO POTENCIAL . 1. Medicamentos comuns. de eficácia demonstrada e que são possível primeira escolha em situações Exemplos: analgésicos e antitérmicos como paracetamol, salicilatos e dipirona por VO; diuréticos tiazídicos e clortalidona; furosemida; digoxina; penicilina, etc 2. Medicamentos de eficácia demonstrada porém, ou não são primeira escolha em situações comuns, ou têm indicações limitadas Incluem-se aqui os medicamentos de uso hospitalar e os de uso especializado. Exemplos de medicamentos do grupo 2 cefalosporinas, exceto as de primeira geração por VO; ciprofloxacina; clindamicina; lincomicina; cloranfenicol; analgésicos e antitérmicos parenterais aminofilina hipoglicemiantes orais anestésicos e outros medicamentos de uso hospitalar 3. Medicamentos que segundo ECC e segundo estudos farmacoepidemiológicos têm uma relação benefício/risco desfavorável Exemplos: cinarizina, flunarizina, dihidropiridinas bloqueadoras de canais de cálcio; alguns AINE; fenoterol; albumina 4. Medicamentos irracionais. Ou são associações em dose fixa irracionais, ou são apresentações inadequadas. 5. Medicamentos de eficácia não demonstrada e / ou com efeitos indesejáveis desconhecidos ou mal estudados Ex: metilbrometo de hioscina VO; bromexina e outros mucolíti-cos, etc 6. Medicamentos irracionais, com relação benefício/risco desfavorável, e não têm indicação médica justificada. Ex: laxantes c/ fenolftaleína (carcinogênico) metanfetamina combinações em dose fixa de vitaminas para uso parenteral FARMACOVIGILÂNCIA Conceito: É a disciplina que tem por objetivo a detecção, a avaliação, a compreensão e a prevenção dos riscos das reações adversas a medicamentos. B Bégaud & LHM Arias. Diccionario de farmacoepidemiología. 1997 CLASSIFICAÇÃO DE RAM Quanto à natureza Tipo A (augmented). Relacionadas à dose. Ocorrem em todos os indivíduos Tipo B (bizarre). Ocorrem em alguns indivíduos. Exemplos: idiossincrasia, alergia Tipo C (continuous). Ocorrem após uso prolongado. Ex: discinesia tardia Tipo D (delayed). Manifestam-se tardiamente. Exemplos: carcinogênese, teratogênese Tipo E (ending of use). Manifestam-se quando o medicamento é suspenso Reações adversas tipo A Conceito. São efeitos indesejáveis intimamente relacionados à ação farmacológica do medicamento. Representam uma resposta farmacológica normal porém exagerada. Comentário. Usualmente são previsíveis. São dose-dependentes. São frequentes. Baixa mortalidade. Exemplos. Boca seca por medicamentos antimuscarínicos. Arritmias cardíacas por digitálicos. Mielossupressão por drogas antineoplásicas. Reações adversas tipo B Conceito. São efeitos não relacionados à ação farmacológica conhecida. Usualmente ocorrem em uma pequena proporção de indivíduos Comentário. São imprevisíveis. Nem sempre dose-dependentes. Baixa incidência. Às vezes muito sérias Exemplos. Agranulocitose por cloranfenicol. Rash cutâneo por fenitoína. Anafilaxia por penicilina CLASSIFICAÇÃO DE RAM QUANTO À SEVERIDADE LEVES. Reações de pequena importância e de curta duração. Podem não requerer tratamento Não afetam substancialmente a vida normal do paciente. Ex: náusea, cefaléia, desconforto epigástrico, etc. MODERADAS. Alteram a atividade normal do paciente (falta ao trabalho ou à escola). Provocam hospitalização, ou requerem atenção em serviços de emergência. Ex: hepatite, parkinsonismo, convulsões, etc. Graves Ameaçam diretamente a vida do paciente. Ex: choque anáfilático . Fatais EVENTOS ADVERSOS PREVENÍVEIS A resposta SIM a qualquer das perguntas que se seguem caracteriza um evento adverso prevenível 1. O Medicamento envolvido é inadequado para a condição clínica do paciente? 2. A dose, a via, a freqüência de administração são inadequados à idade, ao peso ou à doença do paciente? 3. A monitorização terapêutica do Medicamento ou outros exames de laboratório necessários deixaram de ser feitos? 4. Há história de alergia ou de prévia reação adversa ao Medicamento? 5. Há uma interação medicamentosa envolvida no evento adverso? 6. Foi documentada uma concentração sanguínea do Medicamento em nível tóxico? 7. O evento adverso decorre de falta de adesão ? Fonte:K Gholami & G Shalviri - Annals of Pharmacotherapy 1999; 33:236-40 FARMACOVIGILÂNCIA EM CONTEXTO HOSPITALAR Métodos Notificação espontânea Monitorização intensiva ou busca ativa Notificação espontânea Inconvenientes Subnotificação Notificação seletiva Notificação incompleta FARMACOVIGILÂNCIA HOSPITALAR MONITORAMENTO INTENSIVO ESTRATÉGIAS Medicamentos como causa da internação (motivo principal, ou contribuiu para a internação) Reações adversas a medicamentos administrados durante a internação Medicamentos contribuindo para ou causando óbitos FARMACOVIGILÂNCIA HOSPITALAR MONITORAMENTO INTENSIVO ABORDAGENS Por medicamento • medicamentos novos • medicamentos de baixo índice terapêutico • determinados grupos terapêuticos Por paciente sub-populações mais suscetíveis a RAM, identificadas por idade, sexo, patologias, características genéticas, etc Por reação adversa, por exemplo: reações oculares, dermatológicas, hematológicas (púrpura, anemia hemolítica, agranulocitose) Por enfermaria : clínica, cirurgia, pediatria, psiquiatria, obstetrícia, oncologia, etc Valor educativo Pode identificar RAMs ainda não descritas Detecta RAMs agudas de baixa frequência Identifica populações com alto risco de apresentar determinados efeitos adversos Pode ser objeto de uma análise tipo caso-controle para confirmação e quantificação do risco POR QUE AS RAM NÃO SÃO NOTIFICADAS? 1. Ingenuidade (“se o medicamento está sendo comercializados ele é seguro”) 2. Medo de ser processado pelo paciente 3. Culpa por ter sido responsável pela prescrição que causou uma RAM 4. Ambição de reunir e publicar uma série de casos 5. Desconhecimento sobre como notificar 6. Receio de a suspeita de RAM não se confirmar 7. Apatia : falta tempo, interesse, formulário, etc Profa. Dra. Gun Bergsten-Mendes