- Associação Paulista de Medicina

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Editorial
A especialidade médica e
o mercado de trabalho*
Paulo Manuel Pêgo-FernandesI
Benoit Jacques BibasII
A escolha profissional é fruto de motivações conscientes e
inconscientes. São muitos os fatores determinantes, como a influência familiar, a identificação pessoal com o curso e o status
social conferido pela profissão. Aliados a esses fatores, somamse os de natureza inconsciente.1 É possível que o fascínio que
a medicina continua a exercer sobre a juventude não se deva
apenas às questões de natureza consciente. A imagem e o status
que o título de médico confere, conquistado, principalmente,
a partir do século XIX, devem ser ainda a razão mais forte.2
A representação de prestígio e poder da medicina, aliado ao
mercado de trabalho, onde há dificuldades, mas sem taxas de
desemprego, pode colocar a profissão como símbolo de ascensão social.2
Estudo realizado com estudantes do quinto ano de medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) mostra
que a maior parte dos alunos (55%) optou pelo curso médico
devido à identificação com a profissão (vocação, realização pessoal). Os motivos altruístas e a busca do conhecimento atingiram 25% e 20%, respectivamente. A inserção no mercado de
trabalho não foi apontada como fator importante para a escolha da profissão.2 Estudo semelhante com estudantes do sexto
ano de medicina da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte (UFRN) identificou como fatores principais para a escolha da carreira: (1) a possibilidade de independência financeira,
(2) a identificação pessoal com a profissão e (3) o altruísmo.
A inserção no mercado de trabalho não foi citada como fator
determinante.1
Uma vez terminado o curso médico, o profissional deve escolher se vai prestar concurso para residência médica e a especialidade ou subespecialidade que pretende seguir. O número
de vagas de residência médica oscila de acordo com cada instituição e com as necessidades de cada serviço. A quantidade
de vagas para determinada especialidade não acompanha as
necessidades do mercado de trabalho de cada localidade. Independentemente da carência de determinado especialista em um
estado ou município, o número de vagas de residência para tal
cargo não é alterado.
A tendência à especialização, excessiva no caso da medicina,
pode ser percebida desde o curso médico. Apenas 15,5% dos
alunos do quinto período, e 16,7% do internato da UFMG
pretendem seguir uma especialidade generalista, como medicina interna (< 2%), pediatria geral (< 5%), cirurgia geral (< 8%)
e ginecologia e obstetrícia (< 5%).2
Esta predisposição não ocorre somente em território nacional. Desde o fim da década de 80, o número de médicos norteamericanos seguindo carreiras generalistas vem diminuindo.3
Em 1987, 49,2% dos estudantes planejavam uma carreira em
medicina interna, medicina de família ou pediatria. Essa porcentagem decaiu de maneira contínua até 43,1% em 1991, e
atingiu seu nível mais baixo em 2002, com 21,5%.3 De maneira similar, uma coorte com médicos do Reino Unido mostrou
que, 10 anos após a graduação, metade dos médicos trabalha
em áreas diferentes das suas especialidades, sendo que grande
parte atua com medicina geral ou de família.4
Isso leva a um questionamento. Cada vez mais os estudantes e médicos residentes pretendem se especializar e rejeitam
carreiras generalistas. Todavia, não há espaço no mercado de
trabalho, e muitos desses indivíduos acabam trabalhando
como médicos de família, clínicos gerais, cirurgiões gerais e
pediatras gerais. Um levantamento da Associação Americana dos Residentes de Cirurgia Cardiotorácica (www.ctsnet.
org) mostrou que 20% dos médicos terminando a residência
em cirurgia torácica e cardiovascular não tinham emprego na
especialidade.5 Quarenta e quatro por cento dos indivíduos
aceitaram o atual emprego por que era o melhor disponível,
25% por questões familiares e 30% disseram que era o único
emprego que conseguiram encontrar.5 Quando perguntados
se o número de cirurgiões cardiotorácicos sendo treinados deveria refletir as mudanças do mercado de trabalho, 87% dos
indivíduos concordaram.5
Dorsey e cols.6 demonstraram que um estilo de vida controlável havia sido determinante na escolha profissional de 55%
dos estudantes de escolas médicas norte-americanas. Especilidades como medicina interna eram preteridas devido ao estilo
I
Professor associado da Disciplina de Cirurgia Torácica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).
Médico preceptor da Disciplina de Cirurgia Torácica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).
* Este artigo foi publicado no periódico São Paulo Medical Journal/Evidence for Health Care, volume 129, edição número 1, de janeiro e fevereiro de 2011.
II
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A especialidade médica e o mercado de trabalho*
de vida incontrolável, excesso de horas de trabalho e pacientes
com múltiplas comorbidades e baixa expectativa de melhora.6
Exemplo similar é visto em território nacional. Em levantamento da Associação Brasileira dos Residentes em Cirurgia
cardiovascular,7 de 321 vagas disponíveis para residência e estágio em cirurgia cardiovascular no Brasil em 2009, apenas 53
(16,51%) foram preenchidas.
Em 2009, foi instituído o Programa Nacional de Apoio à
Formação de Médicos Especialistas em Áreas Estratégicas para
o Sistema Único de Saúde (SUS) (Pró-Residência).8 O objetivo do programa é favorecer a formação de médicos em especialidades e regiões prioritárias, definidas em comum acordo
com gestores do SUS. O estímulo é feito através da concessão
de bolsas para residentes em programas de residência médica
(PRM) já credenciados e que busquem expansão. Também serão concedidas bolsas para novos PRM que demonstrem que
a abertura do programa dependa exclusivamente da bolsa para
residentes. Constam no programa áreas básicas como Clínica
Médica, Cirurgia Geral, Pediatria, Ginecologia e Obstetrícia;
áreas prioritárias como Medicina de Família e Comunidade,
Psiquiatria, Geriatria, Cancerologia Clínica e Cirúrgica, Radioterapia, Anestesiologia, Patologia, Medicina Intensiva, Neurologia, Neurocirurgia e Ortopedia e Traumatologia, e áreas de
atuação Neonatologia, Psiquiatria Infantil, Cirurgia do Trauma
e Medicina de Urgência.
Segundo dados da Comissão Nacional de Residência Médica, há atualmente cerca de 27.000 vagas de residência médica,
disponíveis para residentes de todos os anos.9 Para residentes de
primeiro ano (R1), há aproximadamente 7.000 vagas. Todavia, existe uma disparidade muito grande na concorrência para
as especialidades. Enquanto residências como Dermatologia e
Cirurgia Plástica têm um número excessivo de candidatos, sobram vagas para especialidades como Medicina de Família e
Comunidade, tida como primordial pelo governo. O mercado
de trabalho dita as formas de inserção do profissional. Isso, porém, cria uma defasagem em relação às necessidades do país.
É necessária uma avaliação criteriosa das reais necessidades
do mercado de trabalho nacional. A abertura de vagas para especialidades prioritárias é válida, porém, são necessários programas para estímulo e perpetuação das especialidades deficitárias
em cada localidade, associado a um plano de carreira que permita que o jovem mantenha-se na sua área de atuação após o
término da sua formação.
REFERÊNCIAS
1. Moreira SNT, Nogueira e Silva CA, Tertulino FF, et al. Processo de significação
de estudantes do curso de medicina diante da escolha profissional e das
experiências vividas no cotidiano acadêmico [Motivations for career-choice
and experiences of the academic day-to-day life of medical students]. Rev
Bras Educ Med. 2006;30(2):14-9.
2. Ferreira RA, Peret Filho LA, Goulart EM, Valadão MM. O estudante de medicina
da Universidade Federal de Minas Gerais: perfil e tendências [Undergraduate
students of “Universidade Federal de Minas Gerais”: profile and trends]. Rev
Assoc Med Bras (1992). 2000;46(3):224-31.
3. Newton DA, Grayson MS. Trends in career choice by US medical school
graduates. JAMA. 2003;290(9):1179-82.
4. Goldacre MJ, Laxton L, Lambert TW. Medical graduates’ early career choices
of specialty and their eventual specialty destinations: UK prospective cohort
studies. BMJ. 2010;341:c3199.
5. Salazar JD, Lee R, Wheatley GH 3rd, Doty JR. Are there enough jobs
in cardiothoracic surgery? The thoracic surgery residents association
job placement survey for finishing residents. Ann Thorac Surg.
2004;78(5):1523-7.
6. Dorsey ER, Jarjoura D, Rutecki GW. Influence of controllable lifestyle
on recent trends in specialty choice by US medical students. JAMA.
2003;290(9):1173-8.
7. Associação Brasileira dos Residentes de Cirurgia Cadiovascular. II Censo
Nacional de Residentes e Estagiários em Cirurgia Cardiovascular. Disponível
em: http://www.sbccv.org.br/residentes/Censos.asp. Acessado em 2010 (2
dez).
8. Brasil. Ministério da Educação. Residências em saúde. Programa nacional
de apoio à formação de médicos especialistas em áreas estratégicas - próresidência. Disponível em; http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_c
ontent&view=article&id=12263&Itemid=506. Acessado em 2010 (21 out).
9. Brasil. Ministério da Educação. Residências em saúde. Relação de programas
de residência médica. Available from: http://portal.mec.gov.br/index.
php?option=com_content&view=article&id=12263&Itemid=506. Acessado
em 2010 (21 out).
INFORMAÇÕES:
Endereço para correspondência:
Paulo Manuel Pêgo-Fernandes
Instituto do Coração (InCor)
Secretaria do Serviço de Cirurgia Torácica
2o andar — bloco 2 — sala 9
Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44
Cerqueira César — São Paulo (SP) — Brasil
CEP 05403-000
Tel. (+55 11) 3069-5248
E-mail: [email protected]
E-mail: [email protected]
Fonte de fomento: nenhuma
Conflito de interesse: nenhum
Data de entrada: 20 de outubro de 2010
Data da última modificação: 4 de novembro de 2010
Data de aceitação: 2 de dezembro de 2010
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Relato de caso
Encefalopatia espongiforme e príon
inseridos em discussão de caso como
decorrência do interrogatório meticuloso
consecutivo à anamnese
Arary da Cruz TiribaI
Manoel Reinardo SchmalII
Universidade Federal de São Paulo — Escola Paulista de Medicina (Unifesp-EPM)
INTRODUÇÃO
Faz parte da complementação da anamnese o interrogatório
abrangente sobre aspectos diversos: comportamento pessoal,
hábitos, passatempos, exposição em ambientes incomuns e fatos extraordinários. O futuro profissional, em geral, não está
preparado para o tipo de análise clínica por não ter, ainda, experimentado que aí pode estar a chave do diagnóstico. O paciente, da mesma forma, não está advertido sobre as circunstâncias
particulares que podem estar associadas ao seu padecimento; só
as referirá se a interlocução for bem conduzida.
No interrogatório meticuloso, respostas surpreendentes se
ajustam como elos entre o paciente e a doença. Tais informes
não surgem espontaneamente. É necessário que o aluno, guiado pelo professor, seja instado a esmiuçar por detalhes, os quais
abrirão opções diagnósticas de outra forma insuspeitadas. Confirmadas ou não, é fundamental comentá-las, o que enriquece
o conhecimento clínico.
OBJETIVO
Chamar a atenção para a importância de interrogatório
abrangente para inscrição no prontuário médico e consideração
dos diagnósticos suportáveis.
RELATO DO CASO
Homem de 40 anos, peão profissional, empregado especificamente como cuidador de rebanhos, queixa de dor de cabeça
e confusão mental. Foi admitido por possível síndrome meníngea, prontamente afastada. Trabalhara nos estados de São
Paulo, Paraná e Mato Grosso. Assinalou ao interrogatório a
preferência alimentar, miolo de boi, sendo a matéria cerebral
eficiente veículo oral da encefalopatia espongiforme bovina
(EEB), ligada à epizootia.
Foram consideradas as antropozoonoses: brucelose, cisticercose, leptospirose, tuberculose de origem bovina, equinococose, toxoplasmose, toxocaríase; ainda assim, o diagnóstico não
foi esclarecido. Alta foi obtida após melhoria do quadro clínico,
sem retorno para reexame.
RESULTADO
Além da consideração das doenças relacionadas à atividade profissional, foi debatida a nova variante da Doença de
Creutzfeldt Jakob (nvDCJ).
DISCUSSÃO
A preferência alimentar, se não levou ao aclaramento do diagnóstico, encaminhou a discussão para a doença da vaca louca
(DVL), surgida na Inglaterra, em 1986,1 e disseminada por países
da Comunidade Europeia. Desavisados, britânicos alimentavam
o rebanho bovino com ração de proteína animal (farinha de carcaça, reciclada, de carne, osso, sangue e vísceras de ovinos). À ocasião, permitira-se baixar a temperatura do processamento industrial, a fim de preservar a qualidade orgânica. A doença dizimou
rebanhos na Grã-Bretanha, chegando a ser detectada no Canadá
e Estados Unidos. Gado leiteiro era o mais vulnerável. Centenas
de milhares de reses apresentaram desordens de comportamento,
da marcha e da força muscular. Sem meios de cura, definhavam,
restando a eutanásia. A doença passou à divulgação internacional
pelo acrônimo BSE (bovine spongiform encephalopathy).
A partir daí, ocorreram casos humanos decorrentes do consumo de vacum derivados; lácteos, carne, produtos industria-
I
Médico livre-docente e professor titular da Universidade Federal de São Paulo — Escola Paulista de Medicina (Unifesp-EPM) (aposentado, em atuação voluntária). Emérito da Cadeira 81 (Adolpho Lutz) e Diretor Científico
da Academia de Medicina de São Paulo.
II
Professor adjunto doutor da Disciplina de Doenças Infecciosas e Parasitárias do Departamento de Medicina da Universidade Federal de São Paulo — Escola Paulista de Medicina (Unifesp-EPM). Médico do Instituto de
Infectologia Emilio Ribas. Disciplina de Doenças Infecciosas e Parasitárias do Departamento de Medicina da Universidade Federal de São Paulo — Escola Paulista de Medicina (Unifesp-EPM).
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Encefalopatia espongiforme e príon inseridos em discussão de caso como decorrência do interrogatório meticuloso consecutivo à anamnese
lizados da mesma origem estiveram sob suspeita de contaminação, com riscos para a população da Inglaterra, da Europa
Central e de países importadores.
O padrão patológico da EEB não está restrito ao ruminante.
Foram descritas com anterioridade, no humano, não derivadas
da DVL, a saber:2 1. Doença de Creutzfeldt Jakob (DCJ), a
clássica [Hans Gerhard Creutzfeldt (1885-1964); Alfons Maria
Jakob (1834-1931), psiquiatras alemães3]. Conhecida desde os
anos 20 do século passado, a DCJ clássica é desordem neurodegenerativa de características peculiares. Rápida progressão,
sempre letal, não vai além de um ano; 2. A síndrome de Gerstmann-Straussler-Scheinker (SGSS) assemelha-se clinicamente
à DCJ; 3. Insônia familial fatal e 4. kuru. Derivada do bovino
contaminado: 5. nvDCJ.
Enquanto a DCJ clássica se apresenta à meia idade, a nvDCJ
se instala no jovem, após período de incubação de 4-6 anos. A
partir da configuração mórbida, evolui para a morte em poucos
meses.1
Elas são caracterizadas por demência, perda da memória, alteração da personalidade, alucinações, desordem da fala, ataxia,
marcha errática, riso sem propósito. São modos de apresentação:
esporádica ou aleatória, inata, familial, digestória, iatrogênica.
Descritas em animais: doença debilitante crônica (no
continente norte-americano observada em cervídeos); encefalopatia espongiforme felina; encefalopatia espongiforme
de ungulados. Scrapie, tremblante du mouton (tremulação do
carneiro), é identificado nos continentes; na Europa, há mais
de 200 anos. O animal perde peso, enfraquece, esfrega-se em
superfícies rústicas, destruindo o pelame. Não sobrevive além
de meses.2
Mal similar, entre aborígenes primitivos de Papua, Nova
Guiné, é o kuru (no dialeto local, “morte que ri”, por exteriorizar riso sem razão, incontido). Em cumprimento do ritual de
canibalismo funerário, os nativos comiam cadáveres dos parentes. Crianças e mulheres eram as mais atingidas. Ora! Porque
lhes eram oferecidas generosas porções do miolo. Após 1950,
quando o rito foi coibido, a alta letalidade que dizimava a tribo
passou à redução.2,3
O tema deu origem a dois “nobeis” de Fisiologia/Medicina.
1. Daniel Carleton Gajdusek (1923-2008),4 clínico e pesquisador americano, auxiliado por Baruch Samuel Blumberg,
ganhou o Nobel 1976, por trabalho sobre kuru, a primeira
das encefalopatias humanas adquiridas por transmissão. Foi
provada a transmissibilidade pela inoculação em primatas, os
quais apresentaram o mal após alguns anos de incubação. 2.
Stanley B. Prusiner,5 neurologista e bioquímico americano, foi
ganhador, em 1997, por sua pesquisa sobre a causa, comum,
das mencionadas encefalopatias.
O bizarro agente não se enquadra entre os vírus, bactérias,
fungos, parasitas, não possui RNA nem DNA, resiste aos antissépticos, às temperaturas de esterilização, aos raios UV, mas
é hábil a multiplicação dentro do organismo, desorganizando a
estrutura do tecido nervoso, prestando-se, ademais, à mutação.
Trata-se de prion (contração de proteinaceous infectious particle),
partícula de proteína, infecciosa, transformada em anormal.
Prusiner arrostou a implicância de cientistas que relutaram
em aceitar sua demonstração, comparada à heresia. Seu currículo é admirável exemplo aos jovens médicos e pesquisadores.
Gajdusek, ao contrário, é personagem imoral, pois foi condenado por abuso sexual de jovens nativos.
Fato histórico − recontado de Victor Hugo − em meados
do século XIX:6 ossadas humanas e equinas de força montada,
do Continente, provenientes das batalhas do imperador francês, foram remetidas a Yorkshire, Inglaterra, transformadas em
pó e vendidas em Doncaster como adubo. Estranhamente, no
mesmo condado inglês foi identificado um foco da nvDCJ, à
ocasião dos últimos acontecimentos. Elo remoto? Subsistiria na
pastagem? A causa da doença? O que favoreceria a transmissão,
por contágio, entre ovelhas...
Doenças priônicas são neurodegenerativas e progressivas. No
homem, caracterizadas por limitação motora, alteração da fala,
riso frio, amimia, demência... No cérebro, do animal como do
homem, instala-se a vacuolização − degeneração esponjosa −, e
destruição de neurônios.
DVL, tema congressual, alvoroça estudiosos: pesquisador
científico, psiquiatra, neurologista, patologista, infectologista,
epidemiologista, imunologista, geneticista, veterinário, biólogo, neurocientista, obviamente, pecuarista. Questão diplomática, a Inglaterra chegou a responsabilizar a Índia como foco de
irradiação do mal. A reação asiática foi imediata; gado indiano
preservado do mal. A área de agronegócio e de industrialização
de ração animal sofreu efeitos. À ocasião, foi proibida a inclusão de miúdos [miolo] no popular hambúrger. Para desfazer o
mal-estar, ministro inglês e filha comeram hambúrger diante
da TV.
Diagnóstico de certeza para a espécie humana, em vida, é
pouco acessível. Biópsia cerebral, método invasivo, tem limitações. Exame neuropatológico, meio viável de diagnóstico.
Pop star da fatalidade, alcunhada por mad Cow, vache folle,
mucca pazza, rinderwahnsinn, alheia à globalização, impassível,
a vaca não manifesta interesse idiomático. Sem tradutor eletrônico, sua oralidade permanece... muh-muh.
No Brasil, a probabilidade da ocorrência da DVL é diminuta. Pasto de braquiária, colonião, capim gordura, ração de
forragem, soja... nada de proteínas animais, o que a inviabiliza.
Mas volta e meia fala-se em aftosa.
E a pergunta: além das zoonoses enunciadas, estamos livres de raiva bovina, carbúnculo, hidatidose, listeriose, varíola bovina? Momento propício de reestudo da estratégia para
eliminação das manchas endozoóticas. Pessoal qualificado, em
número suficiente, de veterinários, biólogos, biomédicos, deve
ser incorporado aos quadros municipais do país para a inspeção
sanitária dos produtos de origem animal, para análise de rações
e alimentos embalados, para a interdição dos abatedouros clan-
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Arary da Cruz Tiriba | Manoel Reinardo Schmal
7
Quadro 1. Busca sistematizada realizada em 30 de setembro de 2010, e resultados encontrados.
Base de dado
Estratégia de busca
Resultado
Lilacs
(Creutzfeldt-Jakob Syndrome) OR (Encephalopathy, Bovine Spongiform) OR (Síndrome de CreutzfeldtJakob) OR (New Variant Creutzfeldt-Jakob Disease) OR (Spongiform Encephalopathy Subacute) OR
(Encefalopatía Espongiforme Bovina) OR (Encefalopatia Espongiforme Bovina) [Palavras] and “CASOS
JULGADOS” or “RELATOS DE CASOS” [Tipo de publicação]
PubMed
(Creutzfeldt-Jakob Syndrome) OR (Encephalopathy, Bovine Spongiform).
35
1.200
Limits: Humans, Case Reports
SciELO
(Creutzfeldt-Jakob Syndrome) OR (Encephalopathy, Bovine Spongiform)
Scirus
(Creutzfeldt-Jakob Syndrome) OR (Encephalopathy, Bovine Spongiform) (“humans”)
10
4.071
Limits: Information types (Abstracts, Articles, Company homepages, Theses and Dissertations);
Subject areas (Medicine)
destinos que desovam nas feiras irregulares. Resultantes as contravenções da falta de formação profissional, do desemprego, da
perversa distribuição de renda.
Trate-se com seriedade da saúde dos quadrúpedes, assim se
estará cuidando do peão, do lavrador, do consumidor das ruas.
A ação mais valiosa é sempre a preventiva. Para ser cumprida
com seriedade.
Conveniente que se examine com rigor sobre a origem e inocuidade de matérias para transplantes e implantes, sobretudo,
se provenientes de regiões onde DVL esteja em curso.
Bernard Debré, médico, pensador e político francês, expõe
ponderação de implicação bioética.6 À contemporaneidade,
a medicina e a indústria farmacêutica teriam proporcionado
a reprodução kuru-símile. De que forma? Por volta dos anos
1983-85, hospitais americanos utilizaram em larga escala somatropina − hormônio do crescimento −, obtida de hipófises de
cadáveres frescos. Adiante, lotes contaminados por prion causaram o que seria a ocidentalização do kuru: DCJ em dezenas
de crianças! Claro que não se tratou de igual canibalismo [via
oral], mas do consumo por injeção...
Segue exposta no Quadro 1 uma busca sistematizada nas
bases de dados eletrônicas Lilacs (Literatura Latino-Americana
e do Caribe em Ciências da Saúde), PubMed, SciELO (Scientific Electronic Library Online) e Scirus sobre relatos de casos
de DVL ou encefalopatia espongiforme bovina ou doença de
Creutzfeldt-Jakob.
CONCLUSÕES
No interrogatório do doente, o detalhe poderá servir de viés
na discussão clínica. Discussões de casos − presentes docentes
e alunos − com a doença ainda sob investigação, constituem
forma do ensino na disciplina clínica.
A comunicação sobre a DVL e EEB originou-se da informação prestada por cuidador de rebanhos, que adoecera com
sintomas de sofrimento cerebral. Hábito de comer miolo de
boi deu origem à consideração do tema. Pelo caráter agudo da
doença e melhora clínica, o campeiro sob observação estaria
isento de doença por prion; nvDCJ não figurou como primeira
suspeita de diagnóstico nem foi confirmada, mas prestou-se à
consideração − de doença priônica −, durante exercício prático
de educação médica. Contato com rezes e consumo de miolo
de boi se prestaram à advertência.
Pela frequência à enfermaria, aprendem, lado a lado, aluno e
professor. Professor, o aluno mais avançado em idade.
REFERÊNCIAS
1. Centers for Disease Control and Prevention. BSE (Bovine Spongiform
Encephalopathy, or Mad Cow Disease). Disponível em: http://www.cdc.gov/
ncidod/dvrd/bse. Acessado em 2010 (5 out).
2. Centers for Disease Control and Prevention. Prions diseases. About prion
diseases. Disponível em: http://www.cdc.gov/ncidod/dvrd/prions/. Acessado
em 2010 (5 out).
3. Dorland’s Illustrated Medical Dictionary. 28th ed. Philadelphia: W.B Saunders;
1994.
4. Wikipedia. The Free Encycolpedia. Daniel Carleton Gajdusek. Disponível em:
http://en.wikipedia.org/wiki/Daniel_Carleton_Gajdusek. Acessado em 2010
(5 otu).
5. Wikipedia. The Free Encycolpedia. Stanley B. Prusiner. Disponível em: http://
en.wikipedia.org/wiki/Stanley_B._Prusiner. Acessado em 2010 (5 out).
6. Debré B. Dictionnaire Amoureux de la Medicine. France: Plon; 2008.
INFORMAÇÕES
Endereço para correspondência:
Academia de Medicina de São Paulo
Av. Brig. Luís Antonio, 278 — 6o andar
Bela Vista — São Paulo (SP)
CEP 01318-901
Tel. (11) 3105-4402
E-mail: [email protected]
Fontes de fomento: nenhuma declarada
Conflitos de interesse: nenhum declarado
Data de entrada: 11 de agosto de 2010
Data da última modificação: 29 de setembro de 2010
Data de aceitação: 3 de dezembro de 2010
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Encefalopatia espongiforme e príon inseridos em discussão de caso como decorrência do interrogatório meticuloso consecutivo à anamnese
PALAVRAS-CHAVE:
Encefalopatia espongiforme bovina.
Kuru.
Canibalismo.
Síndrome de Creutzfeldt-Jakob.
Educação superior.
RESUMO
Contexto e objetivo: Revelações surpreendentes resultam do interrogatório, consecutivo à anamnese, promovendo
considerações que enriquecem o conhecimento de professor e aluno.
Estudo e local: Ensino curricular de Doenças Infecciosas e Parasitárias na Enfermaria do Departamento de Medicina da
Escola Paulista de Medicina — Universidade Federal de São Paulo.
Método: Programa para ensino de doutorandos e residentes sobre possíveis diagnósticos de pacientes recém-admitidos,
com participação dos docentes ativos e dos aposentados, em atuação voluntária.
Resultado: Exemplificação de como um pormenor na história do doente pode ampliar o ensino.
Conclusão: É conveniente proceder interrogatório detalhista que direcione a diagnose.
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Dermatologia
Hidrosadenite da vulva – caso exuberante
com resolução cirúrgica
Lívia de Vasconcelos Nasser CaetanoI
Victor Pavan PasinI
Mauro Yoshiaki EnokiharaII
Benjamin GolcmanIII
Departamento de Dermatologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)
INTRODUÇÃO
A hidrosadenite é uma doença cutânea crônica e recorrente, caracterizada pelo acometimento das regiões que abrigam
as glândulas apócrinas, com a formação de nódulos inflamatórios e abscessos, que evoluem com cicatrização e fistulização.1
A axila é o local mais frequentemente acometido, seguida pela
região anogenital.2 Tem uma prevalência estimada de 1%,1 com
predileção pelo sexo feminino, e uma relação de três mulheres
para cada homem acometido.2
O diagnóstico é estabelecido com base em três critérios: lesões
típicas, como nódulos dolorosos nas lesões iniciais até abscessos,
fístulas e ulcerações nos casos tardios; localização típica, como
axila, virilha, regiões perineal, urogenital, perianal, glúteos, inframamária e intermamária e, por fim, cronicidade e recorrência.3
Acredita-se que a fisiopatologia esteja relacionada a um defeito no epitélio folicular, com consequente obstrução, acúmulo
de secreção, proliferação bacteriana e inflamação. Ocorre rotura
local e acometimento do tecido adjacente, com liberação de
fatores quimiotáticos.2 Outros autores defendem um mecanismo de auto-agressão, baseados no comportamento recorrente e
progressivo e na resposta parcial a corticosteroides, imunossupressores e imunobiológicos.1
Apesar de se tratar de entidade há muito tempo conhecida,
a dificuldade terapêutica ainda é uma realidade. Apresentamos
uma paciente com hidrosadenite exuberante de grandes lábios,
na qual se optou por exérese com fechamento por primeira intenção, com resultado estético e funcional satisfatório.
RELATO DE CASO
Paciente de 49 anos, sexo feminino, solteira, natural do Paraná, procedente de São Paulo há 48 anos, faxineira, tabagista
há 30 anos. Há três anos, iniciou quadro de nódulos dolorosos
nos grandes lábios, que evoluíram com supuração recorrente e
resposta pobre à antibioticoterapia e múltiplas drenagens. Ao
exame, apresentava grande aumento do volume da região dos
grandes lábios, maior à esquerda, com nódulos palpáveis, alguns coalescentes, com áreas de fibrose e orifícios de fistulização
(Figura 1A).
A paciente foi submetida a abordagem cirúrgica local em
dois tempos: primeiro à esquerda e depois à direita. Em ambas
as etapas, foi realizada anestesia local com lidocaína a 2% diluída em soro fisiológico a 0,9% na proporção 1:4, seguida de
exérese ampla, com retirada do subcutâneo envolvido (Figura
1B) e posterior fechamento primário com pontos simples usando mononylon 4.0 (Figura 1C). Um curso de cefalexina, 500
miligramas a cada seis horas por sete dias, foi prescrito nos pósoperatórios. A paciente evoluiu com boa qualidade de cicatrização, sem recidivas até o momento (18 meses) (Figura 1D).
DISCUSSÃO
A hidrosadenite é causa de grande transtorno psicológico e
social com prejuízo na qualidade de vida.1 O arsenal terapêutico é diverso e, ao mesmo tempo, limitado. Foi realizada uma
busca sistematizada com os termos “hidradenitis OR hidradenitis suppurativa AND treatment OR therapy OR therapeutics” e “hidradenitis OR hidradenitis suppurativa AND vulva
OR genitalia, female” nas bases de dados Cochrane Library,
Embase, PubMed e Lilacs. Nesta última, os termos também
foram pesquisados em português. Das publicações encontradas
com texto disponível em inglês ou português, foram selecionados artigos de revisão publicados nos últimos três anos e ensaios
clínicos, na primeira pesquisa, e trabalhos com ênfase na terapêutica da hidrosadenite da vulva, na segunda (Tabela 1).
O tratamento da hidrosadenite pode variar desde o uso de
antibióticos e outras medicações para alívio de sintomas até a
cirurgia radical, indicada nos casos extensos.1,2 O abandono do
tabagismo deve ser sempre orientado, devido à possível relação
causal entre a nicotina e a hidrosadenite.3,4
I
Residente em Dermatologia pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Mestre e doutor em Dermatologia, responsável pelo Setor de Cirurgia Dermatológica do Departamento de Dermatologia da Universidade Federal de São Paulo — Escola Paulista de Medicina (Unifesp-EPM).
III
Doutorado pela Universidade de São Paulo (USP), cirurgião plástico e professor voluntário do Departamento de Dermatologia da Universidade Federal de São Paulo — Escola Paulista de Medina (Unifesp-EPM).
II
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Tabela 1. Resultados da busca sistematizada nas bases de dados médicas com os descritores em saúde
Base de dados
Cochrane Library
25/11/2010*
Estratégia de busca
(hidradenitis OR hidradenitis suppurativa)
AND (treatment OR therapy OR therapeutics)
PubMed
20/11/2010*
(hidradenitis OR hidradenitis suppurativa) and
(vulva OR genitalia, female)
(hidradenitis OR hidradenitis suppurativa)
AND (treatment OR therapy OR therapeutics)
(hidradenitis OR hidradenitis suppurativa) and
(vulva OR genitalia, female)
Total
11
7
632
Estudos relacionados
9 ensaios clínicos
Nenhuma revisão
7 ensaios clínicos
18 ensaios clínicos (1 em alemão: excluído)
6 ensaios controlados e randomizados
20
8 revisões nos últimos 3 anos (1 em norueguês: excluído)
1 estudo retrospectivo
11 relatos de casos
13 artigos
Embase
2/12/2010*
(hidradenitis or hidradenitis suppurativa) AND
(treatment OR therapy OR therapeutics)
(hidradenitis OR hidradenitis suppurativa) and
(vulva OR genitalia, female)
663
1 carta
31 ensaios clínicos (1 em francês e 1 em espanhol: excluídos)
6 ensaios controlados e randomizados
70
15 revisões nos últimos 3 anos (1 em holandês, 1 em
espanhol, 1 em turco, 1 em alemão: excluídos)
3 estudos retrospectivos
2 revisões
8 relatos de caso
Lilacs
25/11/2010*
(hidradenitis OR hidradenitis suppurativa)
AND (treatment OR therapy OR therapeutics)
13
2 cartas
1 ensaio clínico (espanhol : excluído)
(hidrosadenite OR hidradenite supurativa)
AND (tratamento OR terapia)
15
Nenhuma revisão nos últimos 3 anos
Nenhum ensaio clínco
7
Nenhuma revisão nos últimos 3 anos
3 estudos retrospectivos
(hidradenitis OR hidradenitis suppurativa) and
(vulva OR genitalia, female)
(hidrosadenite OR hidradenite supurativa)
AND (vulva OR genitalia, feminina)
1 revisão
13
2 relatos de caso
3 estudos retrospectivos
2 revisões
1 relato de caso
* As datas referem-se ao dia em que foi realizada a busca nas bases de dados.
A radioterapia foi utilizada no passado com resultados variáveis.3 Um relato de caso recente mostrou sucesso em uma
paciente com recidivas após várias abordagens cirúrgicas.26
Quadros clínicos crônicos e recorrentes, com ulcerações e
trajetos fistulosos, merecem abordagem mais agressiva.1 Ainda
hoje a cirurgia é a modalidade terapêutica com maior evidência de resposta. A extensão e a profundidade da área a ser
ressecada e o manejo da úlcera resultante são controversos e
parecem ter impacto na recidiva.27,28 A abordagem incisional
com drenagem de secreção para alívio rápido dos sintomas e a
remoção dos nódulos e trajetos fistulosos podem ser realizados
antes da cirurgia definitiva, com altos índices de recorrência.
Ressecção ampla com margem e profundidade adequadas é
considerada o melhor método por diversos autores, porém,
também não impede a recidiva da doença no local ou em outra região.2
A cicatrização por segunda intenção é a preferida da maioria dos autores, com menor índice de recorrência, apesar de
recuperação mais prolongada.2 Um estudo comparando o fe-
chamento por segunda intenção com o uso de enxertos de
pele parcial mostrou que o segundo reduz o tempo de cicatrização, mas sem significar maior satisfação dos pacientes.
A necessidade de imobilização da área receptora e a dor na
região doadora tornam o pós-operatório menos confortável.29
Entretanto, muitos autores descreveram bons resultados com
enxertos,2 inclusive em casos de localização vulvar30,31 Outra
alternativa de fechamento são os retalhos livres, pediculados
e fasciocutâneos.32
Em casos de envolvimento limitado, a exérese local com fechamento primário pode ser adequada, com menor morbidade
e maior risco de recidiva.2 Nesses casos, curativos com gentamicina parecem diminuir o número de complicações na primeira
semana após a cirurgia.33
Casos de hidrosadenite de localização vulvar muitas vezes
são subdiagnosticados e tornam-se extensos e crônicos.34 Podem evoluir com linfedema, pólipos fibrosos e carcinomas
espinocelulares.35-38 A cirurgia precoce está indicada na profilaxia destas complicações. Menção especial deve ser feita às
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Hidrosadenite da vulva – caso exuberante com resolução cirúrgica
neoplasias: um trabalho39 mostrou que, exceto por um caso de
localização escapular, todos os casos de carcinoma espinocelular associados à hidrosadenite até então descritos localizavam-se
nas regiões perineal, perianal e glútea, e sugeriu uma correlação
com infecção pelo papilomavírus humano (HPV).
No caso acima relatado, a exérese ampla foi indicada devido à resposta insatisfatória ao tratamento clínico e drenagens,
com o objetivo de diminuir a recidiva local. O fechamento
por primeira intenção permitiu excelente resultado estético, sem comprometer o objetivo primário da cirurgia. É um
exemplo de que cada caso deve ser avaliado individualmente,
principalmente nas doenças de difícil manejo, em busca da
satisfação do paciente.
CONCLUSÃO
Apesar dos diversos estudos, a hidrosadenite continua sendo motivo de grande sofrimento por parte de seus portadores.
Não existem tratamentos padronizados e com resposta clínica
previsível. A cirurgia atualmente é a principal arma no combate
à doença avançada, com grande variedade de técnicas descritas.
Cabe ao médico conseguir individualizar cada paciente na busca do melhor tratamento, baseando-se nas evidências existentes
até hoje na literatura.
REFERÊNCIAS
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13
INFORMAÇÕES:
Endereço para correspondência:
Lívia de Vasconcelos Nasser Caetano
Departamento de Dermatologia da Unifesp
Rua Borges Lagoa, 508
São Paulo (SP)
CEP 04038-001
Tel. (11) 5576-4804
E-mail: [email protected]
Fonte de fomento: nenhuma
Conflito de interesse: nenhum
Data e o local do evento no qual foi apresentado como pôster: 21 a 25 de
abril de 2010 no XXII Congresso Brasileiro de Cirurgia Dermatológica, realizado no Centro de Convenções Sul América, na cidade do Rio de Janeiro
Data de entrada: 24 de novembro de 2010
Data da última modificação: 21 de janeiro de 2011
Data de aceitação: 11 de fevereiro de 2011
PALAVRAS-CHAVE:
Cirurgia geral.
Genitália feminina.
Hidradenite.
Terapêutica.
Vulva.
RESUMO
Contexto: A hidrosadenite é uma doença cutânea crônica e recorrente, com prevalência estimada de 1% e mais
comum no sexo feminino. Apesar de se tratar de entidade há muito tempo conhecida, a dificuldade terapêutica ainda
é uma realidade. Relato de caso: Apresenta-se um caso de hidrosadenite em paciente de 49 anos envolvendo os
grandes lábios bilateralmente, a qual foi submetida à exérese ampla com fechamento por primeira intenção, obtendose excelente resultado terapêutico e estético.
Discussão: A hidrosadenite é causa de grande transtorno psicológico e social, com prejuízo na qualidade de vida. As
possibilidades terapêuticas variam desde antibióticos tópicos e sistêmicos, medicamentos com ação antiandrogênica,
retinoides sistêmicos, imunossupressores e, mais recentemente, os antagonistas do fator de necrose tumoral, o uso
de tecnologias como o laser e a terapia fotodinâmica até drenagens intermitentes, exéreses parciais e cirurgia radical.
A abordagem cirúrgica ampla com margens, associada à cicatrização por segunda intenção, é a preferida de vários
autores, porém, o fechamento primário pode estar indicado em casos selecionados.
Conclusões: Apesar dos diversos estudos, ainda não existem tratamentos padronizados e com resposta clínica previsível.
Cabe ao médico conseguir individualizar cada paciente na busca do melhor tratamento, baseando-se nas evidências
existentes até hoje na literatura.
Diagn Tratamento. 2011;16(1):9-13.
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Nutrologia
Alho
Hernani Pinto de Lemos JúniorI
André Luis Alves de LemosII
Disciplina de Medicina de Urgência e Medicina Baseada em Evidências da Universidade Federal de São Paulo —
Escola Paulista de Medicina (Unifesp-EPM), Centro Cochrane do Brasil
São conhecidas como alho as plantas do gênero Allium,
embora o nome se aplique particularmente ao Allium sativum, uma planta cujo bulbo, conhecido como a “cabeça
do alho”, é formado por folhas escamiformes, denominadas
popularmente como os “dentes do alho”. É conhecido milenarmente tanto pelo seu uso como tempero na culinária,
como na composição de vários medicamentos. Atribui-se ao
alho propriedades antimicrobianas, efeitos benéficos para o
coração e circulação sanguínea e diminuição das taxas de
colesterol no sangue.
Pesquisa in vitro realizada nos Estados Unidos comprovou
ação vasodilatadora do alho,1 reforçando a hipótese de suas
ações benéficas ao nível cardiovascular. Outra pesquisa in vitro
realizada no Brasil, na Universidade de São Paulo, mostrou diferenças quanto às formas do consumo do alho e seus benefícios
à saúde, pelos seus poderes antioxidantes. A conclusão deste
estudo é de que os melhores poderes antioxidantes do alho existem quando ele é consumido frito, embora outras formas de
preparo também tenham essas propriedades.2
Uma experimentação animal feita na Índia e publicada eletronicamente em uma revista britânica de nutrição mostrou
diminuição dos cálculos de colesterol localizados na vesícula
biliar de ratos submetidos a uma dieta rica em gordura e suplementados com alho e cebola.3
Propriedades anticancerígenas também são atribuídas ao
alho, tendo como referência uma reunião anual da Associação
Americana de Pesquisa de Câncer em Houston, em 1991. O
alho poderia prevenir alguns tipos de câncer, de acordo com
evidência em estudos com experimentação animal realizados
por cientistas norte-americanos. Eles expuseram hamsters a um
carcinógeno com e sem a suplementação de alho. O grupo experimental teve 46% de tumores, enquanto no grupo controle
a incidência de tumores foi entre 14% e 19%.4
Procuramos estudos clínicos não experimentais, de preferência controlados e randomizados, isolados ou contidos em
revisões sistemáticas, que nos dessem subsídios consistentes
para indicar o uso terapêutico do alho, visto que seu uso na alimentação é inquestionável e já comprovado pelo tempo de uso.
Um estudo epidemiológico de 22 ensaios clínicos com revisão
sistemática e metanálise foi realizado nos Estados Unidos para
verificar os hábitos de ingerir alho na alimentação e o câncer
de estômago e colorretal. Este estudo encontrou uma taxa menor de câncer colorretal e gástrico para as pessoas que ingeriam
alho, com significância estatística, risco relativo (RR) de 0,69,
intervalo de confiança (IC) de 0,55 a 0,89 e RR 0,53, IC de
0,31 a 0,92, respectivamente.5
Em uma população chinesa, em Xangai, foi realizado um
estudo de caso controle que investigou a associação entre a
ingestão de vegetais do gênero Allium, incluindo o alho, cebola, cebolinha e alho-poró, e o risco de câncer de próstata.
Foram aplicadas entrevistas e as informações foram coletadas
em 122 itens alimentares de 238 indivíduos (casos), histologicamente confirmados com câncer de próstata, e 471 indivíduos controles da população masculina. Homens no mais
alto consumo de vegetais do gênero Allium (> 10,0 g/dia)
tiveram uma taxa menor de risco, estatisticamente significativa, de câncer de próstata, do que aqueles na categoria de
consumo mais baixo (< 2,2 g/dia), odds ratio (OR) de 0,51,
IC de 0,34 a 0,76.6
Um estudo de caso-controle foi feito na Itália para verificar
a correlação entre o consumo de alho e cebola e a incidência
de câncer. Este estudo mostrou uma associação inversa entre
a frequência do uso desses vegetais e o risco de vários tipos de
câncer mais frequentes.7
Em 1993 foi realizado um estudo randomizado, duplo-cego
em 42 adultos com mais de 50 anos e com hipercolesterolemia.
Os pacientes foram submetidos a 900 mg de alho por dia ou
placebo, por 12 semanas. Houve uma redução significativa do
colesterol total e do LDL-colesterol, sem alteração do HDLcolesterol, glicemia e níveis pressóricos.8
Duas revisões sistemáticas foram realizadas em 1994 por
dois autores. A primeira, com oito estudos (415 pacientes),
I
Médico, mestre e doutor em Medicina Interna e Terapêutica e Medicina Baseada em Evidências da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina (Unifesp-EPM). Médico pesquisador do Centro de
Pesquisas em Revisões Sistemáticas do Centro Cochrane do Brasil. Professor de Semiologia e Clínica Médica na Universidade Nove de Julho em São Paulo. E-mail: [email protected]
II
Médico, mestre e doutorando em Medicina Interna e Terapêutica e Medicina Baseada em Evidências da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina (Unifesp-EPM). Professor de Medicina Baseada
em Evidências da Faculdade de Medicina do Centro Universitário São Camilo E-mail: [email protected]
Diagn Tratamento. 2011;16(1):14-6.
RDTv16n1.indb 14
05.04.11 15:22:17
Hernani Pinto de Lemos Júnior | André Luis Alves de Lemos
verificou o efeito do alho na pressão arterial, com resultados
estatisticamente significantes, favoráveis ao grupo de pacientes
que ingeriram alho (redução da pressão arterial sistólica de 7,7
mmHg, IC de -4,3 a -11,0, e para a pressão arterial diastólica
foi de -5,0 mmHg, IC de - 2,9 a -7,1 mmHg). A segunda, com
16 estudos e 952 pacientes, verificou o efeito da suplementação do alho no colesterol total e frações. Esta revisão mostrou
uma diminuição estatisticamente significante no colesterol total, IC -0,65 a -0,89, e nos triglicérides, IC -0,14 a -0,49. Os
autores concluem que os resultados devem ser interpretados
com cautela devido às deficiências metodológicas de alguns dos
estudos.9,10
Outra revisão sistemática realizada com cinco estudos em pacientes tratados com alho mostrou diminuição média de 9% nos
níveis de colesterol total em comparação com aqueles que receberam placebo. A metanálise mostrou uma redução do colesterol de 23 mg, IC de 17 a 29, estatisticamente significante.11
Uma revisão sistemática da Colaboração Cochrane foi realizada visando evidenciar o benefício da suplementação de alho
em pacientes com claudicação intermitente. Esta revisão sistemática só encontrou um estudo com 78 participantes cuja análise não demonstrou benefício algum aos pacientes suplementados, IC de 34,78 a 42,78, em um tempo de acompanhamento
relativamente curto de 12 semanas.12
Não desprezamos os estudos experimentais porque suas
comprovações é que dão sustentação às realizações de estudos
controlados e randomizados em humanos. Entretanto, parece
existir uma desproporção muito grande entre o grande número
de ensaios experimentais e o de ensaios clínicos. O baixo custo, facilidade de aquisição e a não necessidade de fornecimento
pela indústria tornam a cointervenção pelo alho fácil e de baixo
custo em intervenções prolongadas. Esperamos que os dados
apresentados desses estudos motivem a realização de pesquisas
com boa qualidade metodológica, aumentando o número de
participantes, diminuindo as incertezas e aumentando o poder
estatístico das conclusões.
No momento, diante dos estudos existentes, concluímos
que a ingestão diária de alho é benéfica para a saúde como
coadjuvante importante na vasodilatação, na hipertensão arterial, na dislipidemia e como preventivo de câncer do aparelho
digestivo.
15
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6. Hsing AW, Chokkalingam AP, Gao YT, et al. Allium vegetables and
risk of prostate cancer: a population-based study. J Natl Cancer Inst.
2002;94(21):1648-51.
7. Galeone C, Pelucchi C, Levi F, et al. Onion and garlic use and human cancer.
Am J Clin Nutr. 2006;84(5):1027-32.
8. Jain AK, Vargas R, Gotzkowsky S, McMahon FG. Can garlic reduce levels of
serum lipids? A controlled clinical study. Am J Med. 1993;94(6):632-5.
9. Silagy CA, Neil HA. A meta-analysis of the effect of garlic on blood pressure.
J Hypertens. 1994;12(4):463-8.
10. Silagy C, Neil A. Garlic as a lipid lowering agent--a meta-analysis. J R Coll
Physicians Lond. 1994;28(1):39-45.
11. Warshafsky S, Kamer RS, Sivak SL. Effect of garlic on total serum cholesterol.
A meta-analysis. Ann Inter Med. 1993;119(7 Pt 1):599-605.
12. Keisewetter H, Jung F, Jung EM, et al. Effects of garlic coated tablets in
peripheral arterial occlusive disease. Clin Investig. 1993;71(5):383-6.
INFORMAÇÕES
Endereço para correspondência:
Centro Cochrane do Brasil
Rua Pedro de Toledo, 598
Vila Clementino – São Paulo (SP)
CEP 04039-001
Tel./Fax. (11) 5575-2970/5579-0469
E-mail: [email protected]
Fonte de fomento: nenhuma declarada
Conflito de interesse: nenhum declarado
Data de entrada: 22 de novembro de 2010
Data da última modificação: 24 de novembro de 2010
Data de aceitação: 30 de novembro de 2010
Diagn Tratamento. 2011;16(1):14-6.
RDTv16n1.indb 15
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16
Alho
PALAVRAS-CHAVE:
Alho.
Doenças do colo.
Trato gastrointestinal.
Triglicerídeos.
Neoplasias da próstata.
RESUMO
Introdução: O alho é uma planta utilizada largamente na culinária e tem sido dito que ele tem propriedades
medicinais.
Objetivo: Verificar evidências do uso do alho na saúde.
Métodos: Busca eletrônica de estudos com boa qualidade metodológica que forneçam evidências para o uso do alho
na saúde.
Resultados: Uma revisão sistemática encontrou taxa menor de câncer colorretal e gástrico para as pessoas que
ingeriram alho, com significância estatística, risco relativo (RR) de 0,69 e intervalo de confiança (IC) de 0,55 a 0,89,
e RR de 0,53, IC de 0,31 a 0,92, respectivamente. Um estudo de caso controle mostrou que homens no mais alto
consumo de vegetais do gênero allium (> 10,0 g/dia) tiveram taxa menor de risco de câncer de próstata do que aqueles
na categoria de consumo mais baixo (< 2,2 g/dia), odds ratio (OR) de 0,51, IC de 0,34 a 0,76. Uma revisão sistemática
evidenciou redução da pressão arterial sistólica de 7,7 mmHg, IC de -4,3 a -11,0, e, para a pressão arterial diastólica, foi
de -5,0 mmHg, IC de - 2,9 a -7,1 mmHg. Outra revisão mostrou diminuição estatisticamente significante no colesterol
total, IC -0,65 a -0,89, e nos triglicérides, IC -0,14 a -0,49. Outra revisão sistemática ratificou este último resultado,
mostrando uma redução do colesterol de 23 mg, IC de 17 a 29.
Conclusão: Ingestão diária de alho é benéfica para a saúde como coadjuvante importante na vasodilatação, na
hipertensão arterial, na dislipidemia e como preventivo de câncer do aparelho digestivo.
Diagn Tratamento. 2011;16(1):14-6.
RDTv16n1.indb 16
05.04.11 15:22:18
POEMs: Patients-oriented evidence that matters
Uma pergunta simples pode identificar o
abuso de droga
Autores da tradução:
Pablo Gonzáles BlascoI
Marcelo Rozenfeld LevitesII
João PratsIII
Sociedade Brasileira de Medicina de Família
QUESTÃO CLÍNICA
Uma pergunta pode identificar pacientes que abusam de
drogas?
RESUMO
A pergunta “Quantas vezes no último ano você usou drogas
ilícitas ou medicações prescritas para razões não médicas?” pode
eficazmente identificar abuso de drogas em populações de alta
prevalência.1
Nível de evidência: 2b.
DESENHO DO ESTUDO
Estudo do tipo transversal.
FINANCIAMENTO
Governo dos Estados Unidos – Fundo do Instituto Nacional
de Alcoolismo e Abuso de Álcool.
CASUÍSTICA
Foram incluídos 286 pacientes de língua inglesa acompanhados em ambulatório de atenção primária na cidade de
Boston.
DESCRIÇÃO
Uma amostra randômica de pacientes foi escolhida para
participar do estudo, mas metade recusou. Excluindo-se os
pacientes que não falavam a língua inglesa, restaram 394 pacientes elegíveis. Desses, 73% (286) completaram a entrevista
e apenas 55% fizeram exames sanguíneos para confirmar o
uso de drogas.
A idade média dos participantes era de 49 anos e aproximadamente metade deles era composta de mulheres. Mais de um
terço (34,6%) referiu uso frequente de drogas e 47% disseram
ter usado drogas em algum momento da vida. Assim, a este es-
tudo foi restrito a uma amostra que fala inglês e que apresentou
com alta taxa de uso de drogas.
Os participantes foram questionados: “Quantas vezes no último ano você usou drogas ilícitas ou utilizou medicações prescritas
para razões não médicas?” O referencial para definir “uso de drogas” foi uma versão computadorizada da Entrevista Diagnóstica
Composta Internacional (EDCI), que define o diagnóstico de
abuso ou dependência de drogas segundo o DSM-IV (Diagnostic
and Statistical Manual of Mental Disorders version IV). A resposta de uma vez ou mais foi considerada como positiva para uso de
drogas. Os pacientes que consentiram também fizeram teste de
fluido oral (Imunoensaio Intercept; OraSureTechnologies, Bethlehem, Pennsylvania) para dependência ou uso de drogas.
Comparada com a Entrevista Diagnóstica, o rastreamento
para identificar o uso de droga por meio da pergunta acima
apresentou sensibilidade de 100% (Intervalo de confiança [IC]
95%, 90,6%- 100%) e especificidade de 73,5% (IC 95%,
67,7%-78,6%).
Em relação ao teste de fluido oral, a sensibilidade da pergunta para detectar uso atual de drogas foi mais baixa (84,7%; IC
95%, 75,6%-90,8%).
COMENTÁRIO
O screening com uma só pergunta foi sensível e específico
para a detecção de uso de drogas e transtornos relacionados.
Suas características diagnósticas foram similares a uma ferramenta muito mais longa. No entanto, é importante ressaltar
a alta prevalência dos distúrbios investigados nesta amostra de
pacientes, limitando sua extrapolação.
REFERÊNCIA
1. Smith PC, Schimidt SM, Allensworth-Davies D, Saits R. A single-question
screening test for drug use in primary care. Arch Intern Med. 2010;
170(13):1155-60.
I
Médico, doutor em Medicina, diretor científico e membro fundador da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).
Médico, diretor da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).
III
Estudante de Medicina do quinto ano da Faculdade de Medicina da Fundação Lusíada.
II
Diagn Tratamento. 2011;16(1):17-8.
RDTv16n1.indb 17
05.04.11 15:22:18
POEMs: Patients-oriented evidence that matters
Sinais clínicos podem identificar pacientes
com risco aumentado para doença
cardiovascular
Autores da tradução:
Pablo Gonzáles BlascoI
Marcelo Rozenfeld LevitesII
João PratsIII
Sociedade Brasileira de Medicina de Família
QUESTÃO CLÍNICA
É possível identificar pacientes com risco aumentado para
doença cardiovascular através de sinais clínicos sem a necessidade de fazer exames laboratoriais?
RESUMO
O escore de Cambridge para risco de diabetes mostrou menor acurácia do que o score de Framingham em predeterminar
o risco cardiovascular em adultos na Inglaterra. No entanto, o
escore Cambridge é atrativo porque não requer o uso de exames
laboratoriais e poderia ser útil como um possível guia para posteriores testes e estratificação de risco.1
Nível de evidência: 2b = coorte prospectivo.
DESENHO DO ESTUDO
Coorte prospectivo observacional.
FINANCIAMENTO
Governo do Reino Unido, União Europeia.
CASUÍSTICA
Foram incluídos 21.867 participantes (9.602 homens e
12.265 mulheres) com idade entre 40 e 74 anos que não tinham
diabetes nem doença cardiovascular (DCV). Estes eram participantes de um grande estudo epidemiológico, o EPIC-Norfolk
(European Prospective Investigation of Cancer-Norfolk).
DESCRIÇÃO
Os participantes foram acompanhados por 11 anos. No começo do estudo, cada pessoa foi interrogada sobre o histórico
de doenças pessoais ou familiares, uso de medicações, estilo de
vida, incluindo hábito de fumar. Foi perguntado se eles já tinham ouvido falar que eles tinham diabetes ou que haviam tido
infarto ou derrame. Também foram feitas medidas antropométricas, de pressão arterial e medidas de glicemia. Os pesquisadores usaram os dados do Serviço de Saúde Nacional inglês
(National Health Service, NHS) e o registro nacional de mortes
para seguir cada participante até a ocorrência de um evento
cardiovascular (CV) ou até a morte. Foram acompanhados e
estudados prontuários completos de 95% dos pacientes e dados
de mortalidade de mais de 99%.
Usando a informação coletada, os pesquisadores estimaram o escore de Framingham (que necessita de medidas de
colesterol sérico) e o escore de Cambridge (que não necessita
de exames laboratoriais). Os autores conheciam os resultados
de ambos os escores dos pacientes. O escore de Framingham
utiliza as variáveis idade, gênero, tabagismo, diabetes, pressão sistólica, colesterol total e lipoproteína de alta densidade
(high-density lipoprotein, HDL). O escore Cambridge utiliza
as variáveis idade, gênero, tabagismo, história familiar de diabetes, uso de corticoide, uso de anti-hipertensivos e índice de
massa corpórea (IMC). Os pesquisadores calcularam a área
sob a curva ROC (receiver operating characteristics) para cada
modelo de predeterminação de risco. Uma área sob a curva
que se aproxima de 1 reflete maior eficácia diagnóstica. Em
uma amostra de 21.867 pessoas/ano de acompanhamento,
2.213 adultos tiveram um evento CV e 328 morreram. A área
sob a curva do escore de Cambridge (0,72) foi um pouco menor do que a de Framingham (0,77). Entretanto, o escore de
Framingham superestimou o risco de um evento CV (estimativa de 16,2% eventos comparada com 10,1% de frequência
de eventos verdadeiros).
I
Médico, doutor em Medicina, diretor científico e membro-fundador da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).
Médico diretor da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).
III
Estudante de Medicina do quinto ano da Faculdade de Medicina da Fundação Lusíada.
II
Diagn Tratamento. 2011;16(1):19-20.
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Linguagens
Equipe
Alfredo José MansurI
Unidade Clínica de Ambulatório do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
A atuação dos médicos e dos profissionais de saúde de modo
geral frequentemente se organiza por equipes. A necessidade e a
importância dessa organização são reconhecidas. Viva e presente na prática cotidiana, a “equipe” é lembrada por pacientes e
familiares e profissionais sob diferentes ângulos de visão.
A reflexão foi-me despertada — como muitas vezes acontece
aos médicos — pelo comentário do familiar de um paciente,
exatamente o avô, em uma cidade distante, ao se referir a um
conceituado hospital paulistano: “Lá vocês trabalham em equipes” — o fato de existir a “equipe” era um qualificativo denso
de significados. Como médicos fazem muitas vezes, ouvi, e não
cabia perguntar na ocasião o que se queria dizer com isso.
A etimologia do termo “equipe” nos remete ao escandinavo
antigo skipa, sobre a raiz germânica skip — navio, embarcação.1
Portanto, traz no seu significado as ideias de navegar, de embarcação, de espaço definido, e respeitadas certas regras aglutinadoras, a ideia de atuação de várias pessoas; para tanto conciliam
necessidade, aglutinação, direção e sentido.
Necessidade – A necessidade de equipes para a prática médica e para os cuidados à saúde está fora de discussão. Essa necessidade pode se impor por diferentes razões, entre elas:
a) disponibilidade no tempo e no espaço — atividades 24 horas
só são possíveis com o auxílio de equipes, pois profissionais
têm limite de capacidade operacional de trabalho. Alguns
tratamentos só se viabilizam se houver uma rede geográfica
engajada no processo (exemplo: transplante de órgãos);
b) competências — cuidados com pacientes demandam competências e especificidades técnicas diversas que podem ser
melhor atendidas por diferentes profissionais reunidos em
equipe;
c) ações complexas — a complexidade de algumas ações de
cuidado (exemplo: reabilitação), de diagnóstico (exemplo:
quando diferentes métodos são necessários) e de tratamento
(exemplo: intervenções cirúrgicas complexas) de pacientes é
melhor atendida por uma equipe;
d) decisões clínicas difíceis — casos de decisão clínica difícil podem se beneficiar das competências reunidas por uma equipe;
e) situações éticas intrincadas — muitas vezes esses casos demandam equipe ampla, incluindo profissionais que não
I
são da área médica. É interessante lembrar que a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde exige não haver
mais que metade de seus membros pertencentes à mesma
categoria profissional nos comitês de ética em pesquisa institucionais. Por exemplo, em um hospital não mais de 50%
dos integrantes dos comitês de ética em pesquisa podem ser
médicos. Aspectos específicos de cada área de atuação podem ser acrescentados pela experiência dos colegas médicos.
Aglutinação – Várias leituras são possíveis no movente que
aglutina as equipes, entre eles: a) a natureza da prática a que
se dedica – como por exemplo: serviços médicos de emergência; b) o hospital que mobiliza uma equipe; c) o serviço – por
exemplo: serviços de anestesiologia, serviço cirúrgico, serviço
de endoscopia etc.; d) o líder da equipe – a equipe é mobilizada
quando o seu líder precisa atuar, como por exemplo em algumas intervenções cirúrgicas; e) a companhia seguradora à qual
o paciente é filiado quando do sistema de saúde suplementar.
Direção e sentido – O sentido do trabalho da equipe clínica é o paciente. Nesse sentido, é subentendida uma direção.
Numa equipe, nem sempre todos os participantes do processo
atuam na sua finalização diagnóstica ou terapêutica, ainda que
o paciente possa interagir com os membros da equipe em algum momento do seu cuidado.
Interação equipe-paciente – O paciente é um indivíduo e
cada paciente é único. Na interação equipe-paciente, é necessário que o nível “processo”, no qual opera a “equipe” — conjunto de profissionais — se individualize, para alcançar por
meio de cuidados, terapêutica ou apoio à dimensão única e a
singular de cada paciente. O paciente não se comunica com
“todos”, embora receba estímulos do ambiente terapêutico no
seu entorno.
Momentos da individualidade do paciente reclamam ocasionalmente a individualidade do médico; se essa individualidade
estiver dissipada na ideia da equipe, pode haver desconcerto.
Nesse contexto, a relação equipe-paciente pode ser apreciada de
diferentes perspectivas, entre elas:
a) comunicação — diferentes integrantes de uma mesma equipe
podem transmitir informações com o mesmo conteúdo com
Livre-docente em Cardiologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Diretor da Unidade Clínica de Ambulatório do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo.
Diagn Tratamento. 2011;16(1):21-2.
RDTv16n1.indb 21
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22
Equipe
b)
c)
d)
e)
fisionomia, palavras ou entonação diferentes. Tais situações
podem modificar o entendimento, atrapalhar a compreensão
e serem entendidas como dizendo coisas diferentes ou até antagônicas;
comentários parciais — comentários ou explicações a respeito de uma função ou de um órgão, descontextualizados do
quadro clínico como um todo, podem permitir interpretações equivocadas. Por exemplo, por ocasião de exames que
avaliam a anatomia ou função de um órgão, comentários
podem permitir a impressão de que o resultado do exame
fará a decisão clínica, e não o contrário: com base no quadro
clínico é que será ponderada a contribuição que o exame
trará. Potencialmente, esse viés pode atrapalhar o entendimento por parte de pacientes e familiares e “resolver” o que
ainda não esteja resolvido;
transferência — em situações que demandam tratamento
complexo ou equipe numerosa, o paciente pode ser transferido de um membro da equipe para outro, para dar sequência aos processos de cuidado, diagnóstico ou tratamento. Por
vezes o processo fica exaustivo e pode-se ter a noção de que
não exista um interlocutor que reúna as informações frente
ao problema clínico que se apresenta.
Imagine-se: a) um membro da equipe avalia: há necessidade de um exame invasivo (realizado na sequência); b) outro
membro da equipe examina e conclui: “não é cirúrgico”; c)
outro membro da equipe prescreve medicamento e pede
exame não invasivo; d) outro membro da equipe: exame não
invasivo para avaliar efeito do medicamento com repetidos
comentários durante o exame, feitos para o paciente e para
colegas que acompanharam o exame, “não só não melhorou
como surgiu mais uma alteração”; e) retorno ao médico que
prescreveu o medicamento: não funcionou, suspender a medicação, “não tenho contribuição adicional a fazer”, “retorne ao outro especialista”; f ) outro membro da equipe: “o(a)
sr(a) está nervoso(a)”. Se essa sequência acontecesse, seria
compreensível certa perplexidade;
número — às vezes, cuidados e tratamento de pacientes mobilizam diferentes especialistas. Estes, por sua vez, podem
ter cada um a sua equipe de dois, três, quatro (ou mais) profissionais, de tal modo que em um determinado paciente
podemos ter até (n x 4 ou n x n) pessoas acompanhando o
caso, de tal modo que potencialmente pode ser mais complexo concertar as diferentes contribuições terapêuticas, bem
como monitorar os potenciais efeitos colaterais;
verificação — é possível que equipes numerosas permitam a
possibilidade de pacientes ou familiares proporem questões
parecidas para diferentes membros de uma equipe com o
objetivo de consolidar as informações que obtêm e delas se
certificarem;
f ) atribuição impessoal — em algumas situações, a atribuição
de uma etapa do cuidado ou do tratamento de pacientes
potencialmente pode incidir em um termo vago: o sujeito de
tal ação seria oculto, indeterminado ou inexistente. Seriam
situações nas quais há uma espera por algum tipo de providência ou resultado sem que fique aparente a responsabilidade por essa providência ou resultado; quase uma decorrência
do “sistema” (equipe?), seja lá o que isso pode significar;
g) expectativas infundadas – divulgações de marketing ou mesmo de divulgação pela mídia podem propiciar expectativas
infundadas para pacientes. Estes, quando se deparam com a
circunstância real dos processos de doença, cuidados, diagnóstico e tratamento, podem sentir dificuldade em conciliar
a experiência que passam com a expectativa previamente
construída e gerar um desajuste interior entre expectativas e
a realidade.
Para finalizar, lembremos que a atuação da equipe favorece o
bem-estar dos pacientes por estarem sendo cuidados por muitas
pessoas. Mas há um aspecto que pode passar despercebido que
é a dimensão econômica — os custos — de se reunir profissionais altamente especializados; mas não é esse o escopo fundamental desta reflexão.
As reflexões acima, que não têm a pretensão de esgotar o
assunto, podem ser enriquecidas com os pontos de vista ou experiências de muitos colegas médicos.
REFERÊNCIAS
1. Houaiss A, Villar MS. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de
Janeiro: Objetiva; 2001.
INFORMAÇÕES
Endereço para correspondência:
Unidade Clínica de Ambulatório do Instituto do Coração do Hospital das
Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44
São Paulo (SP)
CEP 05403-000
Tel. InCor (11) 3069-5237
Consultório: (11) 3289-7020/3289-6889
E-mail: [email protected]
Fontes de fomento: nenhuma
Conflito de interesse: nenhum
Data de entrada: 8 de dezembro de 2010
Data da última modificação: 8 de dezembro de 2010
Data de aceitação: 16 de dezembro de 2010
Diagn Tratamento. 2011;16(1):21-2.
RDTv16n1.indb 22
05.04.11 15:22:20
Residência e ensino médico
Bem-vindos, calouros!
Olavo Pires de CamargoI
Luiz Eugenio Garcez LemeII
Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP)
O início de cada ano letivo traz aos bancos escolares uma
nova leva de “calouros”. São magníficas figuras, recém-egressas
da vitória talvez mais importante de suas vidas até o momento;
ao mesmo tempo orgulhosos e temerosos, entrando muitas vezes com um respeito quase religioso nos ambientes que daqui a
poucos meses já olharão e comentarão com um estilo despreocupado e blasé.
A academia se beneficia enormemente desta renovação
anual, que traz um ar novo e refrescante ao ambiente por vezes
vicioso da universidade. Não é à toa que na língua inglesa os
calouros são denominados “freshmen”.
No caso dos calouros de medicina, algumas questões e considerações podem ser interessantes. Por que alguém escolhe fazer
o curso médico?
Em outras épocas, questões como remuneração, prestígio,
antecedente familiar poderiam ser citadas entre as mais prevalentes. Hoje em dia, a grande maioria da população já sabe
que a remuneração dos médicos é totalmente desproporcionada
à carga de trabalho e responsabilidade, e o número cada vez
maior de escolas médicas de qualidade duvidosa, para dizer o
mínimo, já se encarregou de levar o prestígio dos médicos a
patamares nada invejáveis. Por que então ainda se quer fazer
medicina?
Alguns talvez sejam estimulados pelo desafio de uma prova
difícil, um vestibular disputado, pelo “será que eu consigo?” e
outros, acreditemos, por um motivo que sempre moveu uma
parte dos candidatos: idealismo.
Sim, meus amigos, não nos escandalizemos: uma parte dos
alunos, e não pequena, ainda entra na escola médica com ideais
de apreender medicina para ajudar os que sofrem, com o objetivo de curar quando possível, melhorar se possível e consolar sempre. O que infelizmente se observa, no entanto, é que
esta carga de idealismo em muitos diminui progressivamente
na medida em que avançam para os estágios hospitalares e a
residência médica.1
É evidente que não podemos entrar na atitude simplista de
imaginar, numa crise de inocência iluminista e “Rousseauniana”
I
II
que o calouro é sempre bom, a universidade é que o deturpa”,
mas o fato é que muito mais alunos têm ideais no início do que
no fim do curso. O problema é que a perda dos ideais não representa apenas uma perda superficial, mas pode afetar toda a evolução do formando enquanto profissional e enquanto pessoa.
Em interessante artigo publicado no The American Journal of Medicine pela Association of Professors of Medicine,
Shaywitz e Ausiello2 afirmam que ideais como o alívio do sofrimento e a melhoria da qualidade de vida para toda a humanidade, medidos pelo voluntariado, serviço às populações
carentes, e preocupação com a saúde da sociedade como um
todo, são o que definem a ação médica que atrai os estudantes
de medicina. Notemos que estamos nos referindo à realidade
norte-americana, caracterizada frequentemente pelo pragmatismo. Será diferente conosco?
O ensino médico, em sua parte mais essencial, em seu “núcleo duro” não mudou radicalmente nos últimos milênios.
Apesar de todos os avanços técnicos e pedagógicos, o ensino
médico se dá por modelos. Temos a certeza de que cada um de
nós poderia citar professores que serviram de modelo positivo ou negativo e que moldaram nosso modo de ser médicos e
mesmo de ser pessoa. Só que, para a recepção desses modelos, é
necessário o substrato de ideais; daí a gravidade da perda de ideais pelos participantes da comunidade de ensino-aprendizado,
alunos e professores.
Existe ainda uma percepção totalmente equivocada de que
bom conhecimento médico, habilidade diagnóstica e terapêutica são incompatíveis com valores como compaixão, solidariedade e autodoação. Não faltam “heróis” médicos apresentados
em séries de sucesso nas televisões, em que diagnósticos pirotécnicos e improváveis convivem com agressividade e cinismo
constantes. Qualquer um de nós sabe que isso não é medicina.
Não é, pelo menos, a medicina que queremos, nós médicos,
que nos tratem e a nossos familiares.
A humanização no ensino médico é tão emergente que até
os mais empedernidos burocratas já se deram conta. Como
implantá-la?
Professor titular e chefe do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).
Professor associado, Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).
Diagn Tratamento. 2011;16(1):23-4.
RDTv16n1.indb 23
05.04.11 15:22:20
24
Bem-vindos, calouros!
O processo certamente passará pelo desenvolvimento de virtudes pessoais e o combate a vícios tão comuns como a arrogância, o cinismo e a indiferença, a começar pelos professores.
Os alunos recém-egressos poderão nos ajudar a lembrarmonos de ideais que muitos já tivemos e que necessitam urgentemente ser reanimados.
Bem-vindos, calouros!
INFORMAÇÕES
REFERÊNCIAS
Fonte de fomento: nenhuma declarada
Conflitos de interesse: nenhum declarado
1. Smith JK, Weaver DB. Capturing medical students’ idealism. Ann Fam Med.
2006;4 Suppl 1:S32-7; discussion S58-60.
2. Shaywitz DA, Ausiello DA. Global health: a chance for Western physicians to
give-and receive. Am J Med. 2002;113(4):354-7.
Endereço para correspondência:
Olavo Pires de Camargo
Rua Barata Ribeiro, 490 – 3o andar — conjunto 33
Bela Vista — São Paulo (SP)
CEP 01308-000
Tel. (11) 3123-5620
E-mail: [email protected]
Data de entrada: 3 de dezembro de 2010
Data da última modificação: 3 de dezembro de 2010
Data de aceitação: 16 de dezembro de 2010
Diagn Tratamento. 2011;16(1):23-4.
RDTv16n1.indb 24
05.04.11 15:22:20
Eletrocardiograma
Alterações do eletrocardiograma na
reperfusão do miocárdio
Antonio Américo FriedmannI
Eduardo Leal AdamII
José GrindlerIII
Carlos Alberto Rodrigues de OliveiraIV
Alfredo José da FonsecaIV
Serviço de Eletrocardiologia da Clínica Geral do Hospital das Clínicas da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo
Um indivíduo de 39 anos muito estressado começou a sentir
intensa dor precordial, procurou rapidamente assistência médica e, uma hora após, estava fazendo eletrocardiograma (ECG)
(Figura 1), que revelou elevação do segmento ST nas derivações
inferiores, indicativa de infarto agudo do miocárdio (IAM).
Averiguou-se que o paciente era tabagista, mas não foram identificados outros fatores de risco para doença arterial coronária.
Decidiu-se por tratamento com trombólise por estreptoquina-
Figura 1. Supradesnivelamento do segmento ST nas derivações D2, D3 e aVF e infradesnível de V1 a V4 sugestivo de infarto
agudo do miocárdio de parede inferior com extensão dorsal.
I
Livre-docente, diretor do Serviço de Eletrocardiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).
Médico residente de segundo ano da Clínica Geral do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).
III
Médico supervisor do Serviço de Eletrocardiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).
IV
Médico assistente do Serviço de Eletrocardiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).
II
Diagn Tratamento. 2011;16(1):25-8.
RDTv16n1.indb 25
05.04.11 15:22:20
26
Alterações do eletrocardiograma na reperfusão do miocárdio
se, e eis que uma hora após o início da infusão, a dor torácica,
que era contínua, cessou. Nesse momento, o ECG evidenciou
arritmia ventricular sustentada. O ECG durante a arritmia (Figura 2) revelou ritmo idioventricular acelerado (RIVA) com
frequência cardíaca (FC) de 93 bpm. Após alguns minutos, a
arritmia cessou espontaneamente (Figura 3) e o ECG de 12
derivações, repetido em seguida (Figura 4), mostrou regressão
parcial do supradesnivelamento do segmento ST.
Considerando a melhora clínica e eletrocardiográfica, os
médicos decidiram interná-lo na unidade de terapia intensiva
(UTI) do Hospital Geral. As dosagens de marcadores de necrose miocárdica (troponina e creatinofosfoquinase-MB) mostra-
Figura 2. Ritmo idioventricular acelerado com frequência cardíaca de 93 bpm. QRS muito aberrante, com morfologia de
bloqueio do ramo direito, mas desviado para o quadrante indeterminado no plano frontal. Ondas P retrógradas.
Figura 3. Reversão do ritmo idioventricular acelerado com frequência cardíaca (FC) de 93 bpm para ritmo sinusal com FC de
55 bpm.
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Antonio Américo Friedmann | Eduardo Leal Adam | José Grindler | Carlos Alberto Rodrigues de Oliveira | Alfredo José da Fonseca
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Figura 4. Supradesnivelamento do segmento ST nas derivações D2, D3 e aVF e infradesnivelamento de V1 a V4 menos
acentuados que na Figura 1 e ondas T achatadas tendendo a negativas.
ram valores elevados. O ecocardiograma evidenciou hipocinesia
inferior e apical. O cateterismo cardíaco, realizado após uma
semana, revelou lesão obstrutiva única da artéria coronária direita (obstrução de 70%).
DISCUSSÃO
O ECG inicial mostra supradesnivelamento de ST nas derivações D2, D3 e aVF e infradesnível de V1 a V4 sugestivo de
IAM de parede inferior com extensão dorsal. O RIVA é uma
arritmia comumente verificada durante a reperfusão. O último
eletrocardiograma mostra diminuição da amplitude do supradesnivelamento de ST (de 3,5 mm para 2,5 mm em D3), e as
ondas T, que eram positivas, tornaram-se achatadas e tendendo
a negativas.
O ECG é fundamental para a avaliação do sucesso do tratamento de reperfusão no infarto agudo do miocárdio. Os critérios1 que indicam reperfusão são os seguintes: normalização
do supradesnivelamento do segmento ST, regressão de 70% do
supradesnível de ST após 90 minutos e inversão precoce das
ondas T nas primeiras quatro horas.
A regressão do supradesnivelamento do segmento ST é um
excelente marcador de reperfusão do miocárdio após trombólise ou angioplastia, correlacionando-se com o prognóstico do
IAM.2 Quanto maior a porcentagem de redução da elevação do
segmento ST calculado no ponto J das derivações com essas alterações, melhor o prognóstico.3 Por outro lado, a ausência de
regressão do desnivelamento de ST após 90 minutos da trombólise é uma indicação importante para angioplastia de resgate.
Na evolução natural do infarto, a inversão das ondas T
nas derivações correspondentes à região acometida começa a
ocorrer em cerca de 24 horas. Entretanto, após o tratamento
bem-sucedido para reperfusão verifica-se negativação precoce
das ondas T nas primeiras quatro horas após a intervenção.1-3
Outro marcador de reperfusão é o aparecimento de ritmo
idioventricular, que foi encontrado em 51% de 110 pacientes
após trombólise ou angioplastia.4 Este ritmo é benigno e não
deve ser suprimido com medicação.
No caso apresentado, a involução das alterações do ECG
não preencheu os critérios citados provavelmente porque a administração do agente trombolítico não tinha sido ainda completada. Se o ECG fosse repetido mais tarde, talvez a melhora
fosse mais evidente. Por outro lado, a melhora parcial do ECG
associada ao aparecimento de RIVA e à remissão do sintoma sugerem que houve reperfusão. A constatação de artéria coronária
direita pérvia na angiografia indica que houve recanalização da
artéria obstruída.
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Alterações do eletrocardiograma na reperfusão do miocárdio
CONCLUSÃO
Trata-se de um caso que mostra a utilidade do eletrocardiograma para avaliar o resultado da terapêutica trombolítica do
IAM no Hospital Geral. A diminuição do supradesnivelamento
do segmento ST e o aparecimento de arritmia ventricular (ritmo idioventricular acelerado, RIVA) indicam sucesso do tratamento de reperfusão.
REFERÊNCIAS
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INFORMAÇÕES
Endereço para correspondência:
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Fontes de fomento: nenhuma declarada
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Data da última modificação: 22 de novembro de 2010
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Medicina sexual
Travestismo de duplo papel ou bivalente:
considerações gerais
Giancarlo SpizzirriI
Roberta Noronha AzevedoII
Carmita Helena Najjar AbdoIII
Programa de Estudos em Sexualidade (ProSex) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo
INTRODUÇÃO
Os primeiros estudos sobre travestismo datam do final
do século XIX, quando Richard Von Krafft-Ebing publicou
Psychopathia Sexualis. Na época, os indivíduos com orientação
sexual homossexual e aqueles com transtorno de identidade sexual eram considerados portadores de instinto sexual contrário
ou invertido.1
No início do século XX, o médico alemão Magnus Hirschfeld
cunhou o termo travestismo para uma categoria distinta dos homossexuais que incluía os indivíduos que se travestiam e aqueles
com identidade sexual invertida.2 Na primeira metade desse século foram poucos os registros de estudos na área. Por outro lado,
são dessa época os primeiros relatos de cirurgias para mudança de
sexo, atualmente denominadas redesignação sexual.1
A grande revolução nas pesquisas sobre transtorno de identidade sexual ocorreu nos anos 1960 com a participação fundamental de Harry Benjamin. As questões relativas à identidade sexual ganharam terreno e se consolidaram no campo da
medicina.1,3 Benjamin dedicou-se por décadas ao estudo dessa
área, que resultou no livro The Transsexual Phenomenon e na elaboração de uma escala para diferenciar travestis de transexuais.
Outro autor importante foi John Money, que pela primeira vez,
em 1955, conceituou sexo biológico e gênero.4
CLASSIFICAÇÕES DIAGNÓSTICAS
A Classificação Internacional de Doenças, 10a edição (CID10), elaborada pela Organização Mundial de Saúde (OMS),
inclui, na seção Transtornos de Identidade Sexual, o transexualismo, o travestismo de duplo papel ou bivalente e o transtorno
de identidade sexual na infância. O transexualismo é definido
como desejo de viver e ser aceito como pessoa do gênero oposto, acompanhado pelo sentimento de mal-estar em relação ao
próprio sexo anatômico e pela vontade de submeter-se à in-
tervenção cirúrgica e tratamento hormonal, a fim de tornar o
corpo tão conforme quanto possível ao gênero desejado. O travestismo de duplo papel ou bivalente caracteriza-se pelo uso de
vestimentas do gênero oposto durante parte da existência, de
modo a satisfazer a experiência temporária de pertencer a outro
gênero, mas sem o intuito de mudança cirúrgica do gênero de
nascimento. Não há excitação sexual nessa experiência.5,6
O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 4a edição, texto revisado (DSM-IV-TR) da Associação
Psiquiátrica Americana (APA), agrupa os Transtornos de Identidade de Gênero numa única entidade diagnóstica. Para que
um indivíduo seja diagnosticado com esse transtorno, é necessário o preenchimento de quatro critérios: identificação com
o gênero oposto, desconforto com seu próprio sexo, presença
de sofrimento clinicamente significativo e prejuízo no funcionamento de alguma área da vida desse indivíduo, aspecto esse
não contemplado pela CID-10.6-9
O termo travestismo fetichista ou fetichismo transvéstico
é utilizado para se referir a uma condição que não apresenta
questões concernentes à identidade e sim é classificado como
transtorno de preferência sexual ou parafilia. Nessa categoria
o indivíduo se gratifica sexualmente pelo uso de vestimentas
do gênero oposto e, na maioria dos casos, a orientação sexual é
heterossexual.5,7
OBJETIVO
Este artigo se pauta na apresentação daqueles que se percebem ambivalentes quanto ao gênero (masculino ou feminino),
os quais podem ou não vestir e utilizar adornos do sexo oposto
e/ou fazer uso de próteses e hormônios, mas não têm desejo de
se submeter à cirurgia de redesignação sexual.10,11 Essa condição
se aproxima do que a CID-10 caracteriza como travestismo de
duplo papel ou bivalente, termo este que será aqui empregado.
I
Psiquiatra, mestre em Medicina e professor do curso de Especialização em Sexualidade Humana da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).
Psicóloga, especialista em Sexualidade Humana pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).
III
Psiquiatra, livre-docente e professora associada do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Fundadora e coordenadora do Programa de Estudos em Sexualidade
(ProSex) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas (IPq-HC) da FMUSP.
II
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Travestismo de duplo papel ou bivalente: considerações gerais
ETIOLOGIA
A origem dos transtornos de identidade sexual permanece
pouco esclarecida, particularmente os fatores etiológicos relacionados ao travestismo bivalente. A maioria dos estudos aborda as possíveis causas do transexualismo, entretanto, algumas
hipóteses têm sido aventadas. Pesquisas realizadas com pares
familiares, em que há concordante para transtorno de identidade sexual, apontam para a possibilidade de fatores genéticos
envolvidos nessa gênese.12,13
Padrões atípicos de uso da mão (canhotos) entre aqueles
com transtorno de identidade sexual têm maior incidência,
quando comparados com a população geral, refletindo a possibilidade de alteração no padrão de organização dos hemisférios
cerebrais, possivelmente em função de exposição pré-natal a
andrógenos.14
ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E CLÍNICOS
Consumo abusivo de álcool e drogas e maior exposição a situações de risco para doenças sexualmente transmissíveis (DST)
são mais elevados na população com transtorno de identidade
sexual (entre eles os bivalentes), quando comparada à população geral. As drogas mais utilizadas são cocaína, maconha,
crack, anfetamina e heroína. Em relação às DST, os fatores de
risco são práticas sexuais sem uso de preservativo, prostituição e
reutilização de agulhas para injeção de hormônios. Baixo nível
socioeconômico, falta de moradia fixa, educação precária, depressão, envolvimento em situações de violência e experiências
de discriminação precipitam e agravam tal situação.15-20
Estudo que avaliou longitudinalmente 1.032 indivíduos do
sexo masculino que se travestiam mostrou, ao longo do tempo, que 45% buscaram tratamento psicológico, e desses, 5%
manifestaram o desejo de viverem integralmente como pertencentes ao gênero feminino.21 Por meio da internet, pesquisadores investigaram experiências de vida de travestis bivalentes e
salientaram a importância desse meio de comunicação para a
expressão e ruptura de isolamento social.22
O grau de desconforto de jovens universitários em relação aos
travestis bivalentes foi avaliado, antes e após esses travestis terem
participado das aulas, como colegas de classe. Alunas se sentiam
menos desconfortáveis que os alunos, desde o início. No entanto,
após a interação com os travestis, os alunos foram os que mais
referiram mudança em sua percepção.23 A investigação sobre a
interação entre jovens com transtorno de identidade sexual e seus
pares demonstra que esses jovens sofrem bullying, têm dificuldades em estabelecer amizades e vivem isolamento afetivo, embora
com frequência encontrem apoio de ao menos um colega.24
Esse grupo frequentemente não confia na polícia. Há divergência entre o número oficial e o número real de casos de
violência contra os portadores de travestismo e certa resistência dos policiais para registrar ocorrências e da justiça para punir os culpados foram constatadas. Além disso, travestis que
se prostituem são frequentemente extorquidos pelos policiais,
obrigados a praticar sexo desprotegido e são física e psicologicamente agredidos.25,26
A avaliação de pacientes em tratamento para transtorno de
identidade sexual apontou que 71% apresentam alguma comorbidade psiquiátrica.27 A frequência de ideação ou comportamento suicida é aspecto relevante; na avaliação de 55 indivíduos com
transtornos da identidade sexual, foi verificado que metade deles
pensou seriamente em suicídio e 25% relataram, pelo menos,
uma tentativa de suicídio.27 Experiências de violência física e/ou
psicológica, baixa autoestima corporal, falta de esperança, dificuldades de moradia e vitimização escolar, são os fatores de risco
mais associados à ideação suicida.27-29 A comparação de variáveis
psicossociais da população sem teto heterossexual com a população sem teto homossexual, bissexual, travesti bivalente e transexual concluiu que o segundo grupo é mais vitimizado, apresenta
maior índice de uso de substâncias psicoativas, de transtornos
psiquiátricos e de parcerias sexuais.16
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com frequência os artigos empregam a mesma nomenclatura para categorias distintas ou usam termos distintos para uma
mesma categoria. Isto é, indivíduos que se percebem desconfortáveis com o seu sexo e que insistem em adquirir características
sexuais do gênero desejado são igualados àqueles que não têm a
intenção de se submeterem à cirurgia de redesignação sexual.
Além disso, há divergência entre o significado dos termos
utilizados em cada país. A expressão “travesti” no Brasil e em
países de língua espanhola, por exemplo, costuma identificar
indivíduos que se vestem com roupas do sexo oposto e podem
ou não utilizar-se de próteses e hormônios, mas não desejam
cirurgia de redesignação sexual. Por sua vez, na língua inglesa o
termo “travestism” é utilizado tanto para fetichistas transvésticos
quanto para travestis. Nesse idioma, a expressão “transgender”
é a que mais equivale ao que se denomina travesti em nosso
país. Entretanto, por definição, o termo transgênero abrange
grande variedade de indivíduos que expressam sua identidade
de modos distintos, como drag queens, transexuais, travestis bivalentes, travestis fetichistas, crossdressers, entre outros.
Outro aspecto importante é que a maioria dos estudos se
caracteriza por metodologias quantitativas e investiga DST, uso
e abuso de substâncias psicoativas, comorbidade psiquiátrica,
perfil psicossexual e preconceito social.
Um número expressivo de artigos se volta para a questão das
políticas públicas para a população de transgêneros. Embora
partam de investigações sobre aspectos clínicos, o maior interesse parece ser a vulnerabilidade psicossocial desses indivíduos
e a importância da implementação de intervenções voltadas
para as reais necessidades deles. Apontam, tais artigos, para a
fragilidade e a escassez dessas políticas e para o compromisso
ético com a diversidade sexual.
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Giancarlo Spizzirri | Roberta Noronha Azevedo | Carmita Helena Najjar Abdo
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INFORMAÇÕES
Endereço para correspondência:
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Travestismo de duplo papel ou bivalente: considerações gerais
PALAVRAS-CHAVE:
Transtornos sexuais e da identidade sexual.
/etiologia.
Travestismo.
Transexualismo.
Comportamento sexual.
RESUMO
A Classificação Internacional de Doenças, 10a edição (CID-10), inclui, na seção Transtornos de Identidade Sexual, o
transexualismo, o travestismo de duplo papel ou bivalente e o transtorno de identidade sexual na infância. Este artigo
se pauta na apresentação daqueles que se percebem ambivalentes quanto ao gênero (masculino ou feminino), os quais
podem ou não vestir e utilizar adornos do sexo oposto e/ou fazer uso de próteses e hormônios, mas não têm desejo de
se submeter à cirurgia de redesignação sexual. Essa condição se aproxima do travestismo de duplo papel ou bivalente
pela CID-10. Não há excitação sexual nessa experiência.
A origem dos transtornos de identidade sexual bivalente permanece pouco esclarecida.
Consumo abusivo de álcool e drogas e maior exposição a situações de risco para doenças sexualmente transmissíveis
(DST) são mais elevados na população com transtorno de identidade sexual (entre eles os bivalentes), quando comparada
à população geral. A frequência de comorbidades psiquiátricas e, entre elas, a ideação suicida, é alta nessa população.
Um número expressivo de artigos se volta para a questão das políticas públicas para a população de transgêneros.
Embora partam de investigações sobre aspectos clínicos, o maior interesse parece ser a vulnerabilidade psicossocial
desses indivíduos e a importância da implementação de intervenções voltadas para as reais necessidades deles. Apontam,
tais artigos, para a fragilidade e a escassez dessas políticas e para o compromisso ético com a diversidade sexual.
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Orientações baseadas em evidências para os pacientes
Orientações de dieta e mudança de hábitos
de vida para pacientes com diabetes tipo 2
Orsine ValenteI
O diabetes mellitus (DM) é uma síndrome de etiologia múltipla, decorrente da falta de insulina e/ou da incapacidade da
insulina de exercer adequadamente os seus efeitos. Caracterizase por hiperglicemia crônica. com distúrbio do metabolismo
dos carboidratos, lipídeos e proteínas. As consequências do
DM a longo prazo incluem acometimento de vários órgãos,
especialmente rins, olhos, nervos, coração e vasos sanguíneos.
Com frequência os sintomas clássicos estão ausentes, porém,
poderá existir hiperglicemia de grau suficiente para causar alterações funcionais ou patológicas por um período antes que o
diagnóstico seja estabelecido.1
Orientações dietéticas
A dieta mais indicada para o paciente diabético deve incluir
carboidratos de frutas, vegetais, grãos integrais e legumes.
As hortaliças (alface, escarola, repolho, acelga, agrião, espinafre, rúcula, almeirão, couve, brócolis, couve-flor, cenoura,
beterraba, chuchu, abobrinha, berinjela, pimentão, rabanete)
são fontes de vitaminas, sais minerais e fibras e têm função reguladora do organismo. São as melhores fontes de vitamina A
e flavonoides, que são antirradicais livres, ou seja, previnem as
complicações crônicas do diabetes.2-4
A gordura saturada deve ser menos do que 7% das calorias2,3. O
colesterol total recomendável deve ser menos que 200 mg/dia.2,3
A dieta de proteína usual para diabetes tipo 2 deve ser de
15% a 20% das calorias para um paciente sem significantes
alterações no rim. Em indivíduos nos estágios iniciais da doença renal crônica a redução da ingestão proteica é de 0,8 a
1 g/kg de peso corporal por dia e 0,8 kg/dia em estágios mais
avançados da nefropatia diabética.3 As melhores fontes vegetais de proteínas são as leguminosas (feijão, ervilha, lentilha,
grão de bico, soja).2 Estes alimentos, ricos em fibras solúveis,
devem compor a dieta, já que além das fibras, que reduzem
a resposta glicêmica pós-prandial, apresentam baixo teor de
gorduras e sódio, o que não se verifica nos alimentos proteicos de origem animal.2
A ingestão de fibra deve ser de pelo menos 14 g por 1.000
calorias diárias.2 A ingestão mais alta de fibras pode melhorar o
controle glicêmico.2
I
O controle do sódio dietético deve ser considerado na prevenção da hipertensão arterial, da coronariopatia e na nefropatia diabética.5,6 É conveniente reduzir a ingestão de sódio para
2,3 g por dia ou 6 g de cloreto de sódio por dia.4
A ingestão de alimentação líquida substituindo as refeições em DM tipo 2 provoca maior perda de peso e menores
níveis de glicemia de jejum quando comparada com a dieta
convencional.2,3
Atividade física
Recomenda-se, para prevenção para diabetes tipo 2, pelo
menos 150 minutos de atividade física aeróbica por semana.1,7
A atividade deve ser distribuída por pelo menos três dias cada
semana, com não mais do que dois dias consecutivos de inatividade.
A orientação inicial de exercícios é de 10 minutos de alongamento e aquecimento, seguido por 20 minutos de exercício
aeróbico.
O exercício deve ser realizado preferencialmente no mesmo
horário em relação às refeições e injeção de insulina nos pacientes tratados com insulina.
A duração e a intensidade do exercício devem ser aumentadas gradualmente.
Antes de iniciar a prática regular de exercícios físicos é recomendável avaliação cardiológica em todo paciente diabético
acima de 35 anos e com diabetes há mais de 10 anos.
Ingestão de líquido deve ser mantida em níveis altos antes,
durante e após o exercício físico.
O exercício físico deve ser adaptado ao gosto e às condições
físicas de cada paciente.
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Professor associado da Disciplina de Medicina de Urgência da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e professor adjunto da Disciplina de Endocrinologia da Faculdade de Medicina do ABC.
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34
Orientações de dieta e mudança de hábitos de vida para pacientes com diabetes tipo 2
4.
5.
6.
7.
recommendations and interventions for diabetes: a position statement
of the American Diabetes Association. Diabetes Care. 2008;31 Suppl 1:
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Smith SR. A look at the low-carbohydrate diet. N Engl J Med.
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Buse JB, Ginsberg HN, Bakris GL, et al. Primary prevention of cardiovascular
diseases in people with diabetes mellitus: a scientific statement from
the American Heart Association and the American Diabetes Association.
Circulation. 2007;115(1):114-26.
INFORMAÇÕES
Endereço para correspondência:
Orsine Valente
Av. Moema, 265 — 3o andar — conjunto 33/34
Moema — São Paulo (SP)
CEP 04077-020
Tel. (11) 5051-1904/5052-2670
E-mail: [email protected]
Fontes de fomento: nenhuma declarada
Conflitos de interesse: nenhum declarado
Esta seção é um serviço público da Revista Diagnóstico &
Tratamento. As informações e recomendações contidas neste
artigo são apropriadas na maioria dos casos, mas não substituem o diagnóstico do médico. Esta página pode ser fotocopiada não comercialmente por médicos e outros profissionais de
saúde para compartilhar com os pacientes.
Data de entrada: 24 de agosto de 2010
Data da última modificação: 5 de outubro de 2010
Data de aceitação: 6 de outubro de 2010
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Destaques Cochrane
Oxigênio terapia para infarto
agudo do miocárdio
Autora da tradução:
Rachel RieraI
Autor dos comentários independentes:
Bráulio Luna FilhoII
RESUMO
Introdução: O oxigênio (O2) é amplamente recomendado
para pacientes com infarto do miocárdio ainda que uma revisão
narrativa tenha sugerido que seu uso poderia fazer mais mal
do que bem. As revisões sistemáticas concluíram que não havia
provas suficientes para saber se o oxigênio reduzia, aumentava
ou não tinha efeito sobre o tamanho da isquemia ou do infarto
miocárdicos.
Objetivo: Analisar as evidências de ensaios clínicos randomizados (ECR) controlados para determinar se o uso rotineiro
de oxigênio inalatório em pacientes com infarto agudo do miocárdio (IAM) melhora os desfechos orientados pelos pacientes,
em particular a dor e a mortalidade.
Critérios para incluir estudos nesta revisão: As seguintes bases de dados foram pesquisadas no final de fevereiro de 2010:1
CENTRAL (Base de ECR da Biblioteca Cochrane), Medline,
Medline In-Process, Embase, CINAHL (Cumulative Index to
Nursing and Allied Health Literature), Lilacs, PASCAL, Zetoc
e Web of Science. Os peritos foram igualmente contatados para
identificar estudos. Não houve restrições de idioma.
Critério de seleção: ECR de pessoas com suspeita ou IAM
comprovado há menos de 24 horas, em que a intervenção foi
oxigênio inalado (sob pressão normal) comparado com ar ambiente, independentemente da coterapia, desde que esta tenha
sido a mesma em ambos os grupos.
Coleta e análise de dados: Dois autores revisaram independentemente os títulos e resumos dos estudos identificados para
ver se preenchiam os critérios de inclusão e, de forma independente, também fizeram a extração de dados. A qualidade
dos estudos e o risco de viés foram avaliados de acordo com
a orientação do Cochrane Handbook. Os desfechos primários
foram morte, dor e complicações. A medida de efeito utilizada
foi o risco relativo (RR).
Principais resultados: Três estudos envolvendo 387 pacientes foram incluídos e ocorreram 14 óbitos. O RR de óbito foi
I
II
2,88 (intervalo de confiança de 95%, IC 95%: 0,88-9,39), na
análise por intenção de tratar, e de 3,03 (IC 95%: 0,93-9,83)
em pacientes com diagnóstico confirmado de IAM. Embora
sugestivo de dano, o pequeno número de óbitos registrados significou que este poderia ser ao acaso. A dor foi medida pelo uso
de analgésicos. O RR combinado para o uso de analgésicos foi
de 0,97 (IC 95%: 0,78-1,20).
Conclusão dos autores: Não há evidências conclusivas
oriundas de ECR que suportem o uso rotineiro de oxigênio
inalado em pacientes com IAM. Um estudo randomizado controlado definitivo é urgentemente necessário, dada a incompatibilidade entre a evidência clínica sugestiva de possíveis danos
e as recomendações para o uso do oxigênio em diretrizes de
prática clínica.
REFERÊNCIA
1. Cabello JB, Burls A, Emparanza JI, Bayliss S, Quinn T. Oxygen therapy for acute
myocardial infarction. Cochrane Database Syst Rev. 2010;(6):CD007160.
INFORMAÇÕES:
Centro Cochrane do Brasil
Rua Pedro de Toledo, 598
Vila Clementino — São Paulo (SP) — Brasil
CEP 04039-001
Tel. (+55 11) 5579-0469/5575-2970
E-mail: [email protected]
http://www.centrocohranedobrasil.org.br/
Responsável pela edição desta seção: equipe do Centro Cochrane do Brasil
A revisão completa está disponível gratuitamente para a América Latina e
Caribe em: http://cochrane.bvsalud.org/cochrane/show.php?db=reviews&mf
n=4055&id=CD007160&lang=pt&dblang=&lib=COC&print=yes
COMENTÁRIOS
Algumas condutas médicas ainda hoje se baseiam em hábitos, costumes e experiências. Todavia, na era da medicina
baseada em evidência, não basta uma conduta parecer lógica
Assistente de pesquisa do Centro Cochrane do Brasil.
Coordenador Científico do Departamento de Cardiologia da Associação Paulista de Medicina
Diagn Tratamento. 2011;16(1):35-6.
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Oxigênio terapia para infarto agudo do miocárdio
e apresentar fundamentos fisiopatológicos. O desenvolvimento científico demanda que se prove sua eficácia e efetividade.
Habitualmente, isso só é possível através de estudo tipo intervenção (ensaio clínico) e, quando há divergência entre esses estudos, recomenda-se combiná-los por meio de uma metanálise
decorrente de uma revisão sistemática.
Pois bem, Cabello e cols.,1 em revisão sistemática sobre o uso
da terapia de oxigênio no infarto agudo do miocárdio, descortina um cenário em que uma conduta clássica, utilizada ainda
hoje sem questionamento, revela-se sem fundamentação científica e com risco potencial. Após exaustiva procura na literatura,
identificou apenas três trabalhos, totalizando uma amostra de
387 pacientes. Devido a problemas metodológicos — critérios
de seleção, identificação dos desfechos primários e secundários
(morte, dor precordial e tamanho de infarto), drop out e randomização inadequada —, conclui que existe alta possibilidade de
viés. Consequentemente, a metanálise dos dados não permite
nenhuma conclusão categórica, exceto que não há evidência
que convalide essa conduta, ainda hoje, disseminada nas unidades coronarianas. Por conseguinte, urge a realização de estudo
que possa esclarecer a utilidade da oxigenioterapia no IAM. O
impacto imediato dessa revisão é que, se não houver indicação
clínica para o uso de O2, não se deve prescrevê-lo.
REFERÊNCIA
1. Cabello JB, Burls A, Emparanza JI, Bayliss S, Quinn T. Oxygen therapy
for acute myocardial infarction. Cochrane Database Syst Rev.
2010;(6):CD007160.
Diagn Tratamento. 2011;16(1):35-6.
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Destaques Cochrane
Acamprosato para dependência de álcool
Autora da tradução:
Rachel RieraI
Autor dos comentários independentes:
Frederico Cúrio de Carvalho JuniorII
RESUMO
Introdução: A dependência do álcool está entre os principais
fatores de risco à saúde na maioria dos países desenvolvidos e
em desenvolvimento. O sucesso terapêutico dos programas psicossociais para a prevenção de recaída é moderado, mas poderia
ser melhorado com o acréscimo do acamprosato (antagonista
do glutamato) como tratamento adjuvante.
Objetivo: Determinar a eficácia e a tolerabilidade do acamprosato em comparação com placebo e outros agentes farmacológicos.
Critérios para considerar estudos para esta revisão:1 Foram
pesquisadas as seguintes bases de dados: Registro Especializado
do Grupo de Drogas e Álcool da Cochrane (Cochrane Drugs
and Alcohol Group, CDAG Specialized Register), PubMed,
Embase e CINAHL (Cumulative Index to Nursing and Allied
Health Literature) em janeiro de 2009. Fabricantes da medicação e pesquisadores foram contatados para buscar estudos não
publicados.
Critérios de seleção: Todos os ensaios clínicos randomizados
(ECR) duplo-cegos que compararam os efeitos do acamprosato
com placebo ou controle ativo.
Coleta de dados e análise: Dois autores extraíram independentemente os dados. A qualidade dos estudos foi avaliada por
um autor e checada por um segundo autor. Metanálises de dados individuais dos pacientes foram utilizadas para verificar a
eficácia dos desfechos primários.
Principais resultados: 24 ECRs com 6.915 participantes
preencheram os critérios de inclusão e foram incluídos na revisão. Comparado ao placebo, o acamprosato reduziu significativamente o risco de beber (risco relativo (RR): 0,86 (intervalo de
confiança de 95% (IC 95%): 0,81-0,91); com número necessário para tratar (NNT) 9,09 (IC 95%: 6,66-14,28), e aumentou
significativamente a duração cumulativa total de abstinência,
com duração média de 10,94 (IC 95%: 5,08-16,81). Para os
desfechos secundários (gama-glutamiltransferase, beber pesado) não foi atingida significância estatística. A diarreia foi o
único efeito colateral mais frequente no grupo acamprosato que
no grupo placebo, com RR: 0,11 (IC 95%: 0,09-0,13); númeI
II
ro necessário para causar dano (NNH): 9,09 (IC 95%: 7,6911,11). Efeitos dos ensaios patrocinados pela indústria (RR:
0,88; IC 95%: 0,80-0,97) não diferiram significativamente daquelas não financiados (RR: 0,88; IC 95%: 0,81-0,96). Além
disso, o teste de regressão linear não mostrou risco significativo
de viés de publicação (P = 0,861).
Conclusão dos autores: O acamprosato parece ser uma estratégia de tratamento eficaz e segura para manter a abstinência
contínua, após a desintoxicação em pacientes dependentes de
álcool. Mesmo que o tamanho do efeito do tratamento pareça
ser bastante moderado em sua magnitude, ele deve ser valorizado no contexto da natureza recidivante do alcoolismo e das
limitadas opções terapêuticas disponíveis atualmente para o seu
tratamento.
REFERÊNCIA
1. Rösner S, Hackl-Herrwerth A, Leucht S, et al. Acamprosate for alcohol
dependence. Cochrane Database Syst Rev. 2010;(9):CD004332.
INFORMAÇÕES:
Tradução e adaptação:
Rachel Riera
Centro Cochrane do Brasil
Rua Pedro de Toledo, 598
Vila Clementino — São Paulo (SP)
CEP 04039-001
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E-mail: [email protected]
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Responsável pela edição desta seção: equipe do Centro Cochrane do Brasil.
A revisão completa está disponível gratuitamente para América Latina e
Caribe em: http://cochrane.bvsalud.org/cochrane/show.php?db=reviews&m
fn=2492&id=CD004332&lang=pt&dblang=&lib=COC&print=yes.
COMENTÁRIOS
O artigo em tese demonstra os resultados obtidos com o
acamprosato em estudo duplo-cego realizado em 24 centros envolvendo a Europa, Estados Unidos, Coreia do Sul, Austrália e
Brasil. Os sujeitos investigados, em número superior a 6.000,
Assistente de pesquisa do Centro Cochrane do Brasil.
Psiquiatra do Centro de Saúde I Pinheiros “Dr. Victor de Araújo Homem de Mello” da Secretaria de Estado da Saúde. Coordenador Científico do Departamento de Psiquiatria da Associação Paulista de Medicina.
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Acamprosato para dependência de álcool
mostraram boa tolerância à droga e redução, estatisticamente
significante, do risco de recorrência imediata do uso de álcool,
entretanto, a droga não evitou a recorrência tardia. Trata-se, portanto, de mais um recurso terapêutico com baixo índice de eventos adversos, mas deve ser comprovada a sua superioridade em
relação às outras drogas utilizadas para o mesmo fim.
O desenvolvimento de novas drogas para o tratamento da
dependência etílica é de valor inestimável decorrente das altas
incidência e prevalência da doença e das comorbidades dela
decorrentes, elevando os índices de morbidade e mortalidade,
sobretudo na população jovem. As novas drogas devem apresentar características farmacocinéticas (maneira que o organismo absorve, metaboliza, liga-se às proteínas e elimina a droga) e
farmacodinâmicas (ação da droga no organismo, seu efeito nos
receptores e interação com outras drogas) favoráveis e preferencialmente de custo acessível.
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Carta ao editor
A saúde nos BRICs:
progresso e perspectivas para 2011
André Cezar MediciI
INTRODUÇÃO
Nos últimos anos, Brasil, Rússia, Índia e China, países que
passaram a ser conhecidos sob a sigla BRICs, contornaram e
sobreviveram à crise que o mundo desenvolvido amarga desde
2008 e têm sido mencionados como futuros líderes da economia e da sociedade mundial. Nesse futuro próximo, o mundo
deixaria de ser conduzido pela liderança da Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (Organization for
Economic Co-operation and Development, OECD) e passaria
a ser realinhado numa perspectiva multicêntrica, com um diálogo mais equilibrado e influente vindo dos países emergentes.
O G7 passaria a ser substituído pelo G20 e organismos multilaterais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o
Banco Mundial, passariam a ter mais influência dos gigantes
emergentes na sua condução. A classe média, antes minoria nos
países do Sul pobre, passaria progressivamente a ser maioria
nesses países, com impactos fortes na eliminação da pobreza e
na qualidade de vida mundial.
Como parte do processo de desenvolvimento com inclusão
social, os BRICs passariam a implementar políticas de saúde
universais, eliminando as doenças associadas à pobreza e criando sistemas de saúde eficientes que conduziriam suas populações para um ideal de felicidade que, na literatura corrente, tem
sido associada a uma melhor saúde.1 Caberia, portanto, saber
como esses países estão desenhando seu caminho para uma saúde universal, equitativa e de boa qualidade para sua população.
ALGUNS DADOS BÁSICOS SOBRE A SOCIEDADE E A
SAÚDE NOS BRICS
Os BRICs nem de longe podem ser considerados homogêneos. A história de cada um e suas características etno-culturais,
geografia e indicadores socioeconômicos e demográficos são
totalmente diferentes. Apresentam em comum o fato de que
suas economias têm crescido aceleradamente nos últimos anos.
Considerando a dinâmica do produto interno bruto (PIB),
em 2009 e em 2010, o Brasil cresceu -0,2% e 7,5%, a China,
9,1% e 10,2%, a Índia 7,7% e 8,8% e a Rússia, na lanterna,
-7,9% e 4,0% respectivamente, de acordo com dados do Banco
Mundial.2 A Rússia tem tido pior desempenho dado que sua
economia é influenciada pela zona do Euro, a qual teve débil performance econômica nos últimos dois anos, conforme
apontam dados do Fundo Monetário Internacional. Mas em
anos anteriores, a economia russa também cresceu a taxas mais
elevadas que a verificada na média dos países desenvolvidos.3
Se considerarmos o tamanho da população, países como a
China e a Índia são sete a nove vezes maiores que o Brasil e a
Rússia. Em 2009, a população chinesa e indiana era estimada
em 1,3 e 1,2 bilhão, enquanto a brasileira e russa, em 191 e
142 milhões de habitantes, respectivamente. Todos os BRICs
já ajustaram sua fecundidade. A maior taxa de fecundidade
total (TFT) continua sendo a da Índia (2,1 filhos por mulher
em idade fértil). Brasil, China e Rússia têm taxas inferiores ao
nível de reposição. A menor TFT dos quatro países é a da Rússia, com 1,5 filho por mulher em idade fértil, mas essa taxa
vem se elevando progressivamente em função de programas
explícitos de aumento de natalidade implementados na última década. Desde 2007, por exemplo, o governo aumentou o
auxílio para mulheres que cuidam de seus filhos no primeiro
ano, correspondente a um pagamento único de US$ 10.000
por filho antes da idade pré-escolar.1,4,5
A Tabela 16 mostra alguns dados sobre as diferenças socioeconômicas entre os BRICs em 2009. As condições socioeconômicas dos BRICs se refletem igualmente nas suas condições de
saúde, com algumas nuances de diferença. A Tabela 26 mostra
alguns indicadores de saúde dos BRICs de acordo com as estatísticas do Banco Mundial. Fica claro que a Índia, como reflexo
de sua elevada pobreza e baixo nível de renda per capita, apresenta as piores condições de saúde, com taxas de mortalidade
infantil e materna várias vezes superiores a dos outros BRICs.
O gasto em saúde na Índia é quase 16 vezes menor que o do
Brasil e cerca de 12 vezes mais baixo que o da Rússia. O gasto
público em saúde na Índia é também claramente insuficiente,
dado que com US$ 10 per capita/ano não se pode sequer oferecer cuidados básicos de saúde pública necessários à redução da
mortalidade infantil e materna, quando se compara os custos
de um conjunto básico de serviços essenciais materno-infantis,
com base nas estimativas da Organização Mundial da Saúde.7
É por esse motivo que menos da metade dos nascimentos no
I
Economista da Saúde sênior do Banco Mundial.
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A saúde nos BRICs: progresso e perspectivas para 2011
país tem sido atendida por pessoal qualificado, de acordo com
as Estatísticas do Banco Mundial.8
A China, com um gasto em saúde quase seis vezes menor que
o brasileiro e cinco vezes menor que o da Rússia, tem a maior expectativa de vida e a menor taxa de mortalidade materna entre os
quatro países. Apresenta ainda uma taxa de mortalidade infantil
menor do que a brasileira, apesar de ter um gasto público em saúde mais de cinco vezes menor que o realizado pelo Brasil. No que
se refere, portanto, a saúde básica, a China definitivamente alcançou melhores resultados com menores custos entre os BRICs.8
A Rússia se notabiliza por investimentos públicos mais elevados em saúde, resultando em baixas taxas de mortalidade infantil e materna. No entanto, sua esperança de vida é menor
que a da China e Brasil, notadamente pela mortalidade adulta
precoce por doenças crônicas, associada a elevados fatores de
risco como o alcoolismo e o tabagismo.5
Já o Brasil teve progressos recentes na redução da mortalidade
infantil e na melhoria das condições básicas de saúde com a implementação de programas iniciados no final dos anos 90, como o
de Saúde da Família (PSF), que progressivamente tem aumentado
o acesso dos mais pobres a cuidados básicos e preventivos e a medidas de promoção que reduzem os fatores de risco associados a
doenças crônicas.9 No entanto, ainda apresenta altas taxas de mortalidade materna e o acesso aos serviços básicos ainda é desigual. O
gasto em saúde no Brasil é o mais elevado entre os BRICs e o gasto
público é mais de cinco vezes superior ao da China. Mesmo assim,
o Brasil ainda não alcançou os mesmos resultados que a China em
temas como a redução da mortalidade materna, por exemplo.
Por tudo o que foi descrito, não se pode dizer que os BRICs
têm estratégias similares para alcançar a universalização em saúde. A distância desse objetivo e as estratégias para alcançar são
muito distintas, assim como a eficiência das políticas implementadas, os recursos gastos e seus resultados.
Se classificarmos os BRICs quanto a duas características,
magnitude dos gastos (maiores ou menores) e resultados básicos alcançados (melhores ou piores), vamos encontrar quatro situações distintas (Figura 1). O Brasil pode ser classificado
como um país onde os gastos são maiores e os resultados são
melhores. A Rússia ingressa no nível onde os gastos são maiores, mas os resultados piores. A Índia tem uma situação onde
os gastos são menores e os resultados piores e a China pode ser
representada com gastos menores e resultados melhores.
Vale mencionar, no entanto, que a vantagem comparativa da
China — expressa em alcançar melhores resultados com menos
gastos — se encontra influenciada por sua forma de governo,
ainda marcada pelo controle pleno do Estado e pela falta de
liberdades civis. Com isso, o governo tem a capacidade de fixar
os preços dos serviços, controlar salários e padronizar os resultados a serem alcançados, com punições severas para aqueles que
não cumprem. Na medida em que as liberdades democráticas
forem estabelecidas, a economia política para o gerenciamento
de custos e qualidade em saúde torna-se muito mais complexa.
Gastos
Maiores
Rússia
Brasil
Menores
Índia
China
Piores
Melhores
Resultados
Figura 1. Relação entre Gastos e Resultados em Saúde nos
BRICs, ao final da primeira década do Milênio.
Tabela 1. Características socioeconômicas e demográficas dos BRICs em 2009, de acordo com estatísticas do Banco Mundial6
País
Brasil
Rússia
Índia
China
População (milhões
habitantes)
Renda per capita
em US$ PPC
191
142
1.160
1.330
10.260
18.390
3.260
6.770
% da população
abaixo da linha de
pobreza (renda de
até US$1,25 por dia)
5,2
2,0
42,0
16,0
% da renda
auferida pelos 20%
mais pobres da
população
3,0
5,6
8,1
5,7
Taxa de
fecundidade total
(filhos por mulher
em idade fértil)
1,88
1,49
2,14
1,76
Taxa de
analfabetismo da
população adulta
(maior de 18 anos)
9,9%
0,5%
27,3%
6,3%
PPC = Paridade do poder de compra
Tabela 2. Indicadores de saúde nos BRIC’s em 2008, de acordo com estatísticas do Banco Mundial6
País
Brasil
Rússia
Índia
China
Expectativa de vida
ao nascer (anos)
72,4
67,8
63,7
73,1
Taxa de
mortalidade
infantil (por 1000
nascidos vivos)
17,3
11,1
50,3
16,6
Taxa de
mortalidade
materna (por 100
mil nascidos vivos)
58
39
230
38
% nascimentos
atendidos por
pessoal qualificado
Gasto per capita
com saúde
(US$ PPC)
Gasto público per
capita com saúde
(US$ PPC)
97,0
99,5
46,0
98,4
605
492
40
108
252
316
10
48
PPC = Paridade do poder de compra
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André Cezar Medici
A medida que o tempo passa, os BRICss vão tendo mais desafios para enfrentar. O primeiro deles é o da equidade. Todos
ainda passam por sociedades divididas com contingentes expressivos de pobreza. O segundo é o da eficiência dos serviços.
Mudar a eficiência não é somente um tema de mudança cultural, mas também de arbitragem do jogo de interesses daqueles
que operam o dia a dia dos serviços. O terceiro desafio é o do
envelhecimento. Todos esses países já estão passando por uma
progressiva avalanche de doenças crônicas (em alguns casos
com mortalidade precoce, como na Rússia) sem que montem
estratégicas eficazes de promoção e prevenção que reduzam o
custo da atenção e prolonguem a vida. O quarto desafio é o
da sustentabilidade. Os países desenvolvidos, apesar de estarem em crise, têm mais flexibilidade para encontrar saídas de
médio prazo em situações difíceis. Já nos países que ainda não
construíram seu desenvolvimento pleno, que políticas fiscais
poderão garantir o financiamento do capital humano e social
básico para os sistemas de saúde maduros como os existentes
nos países desenvolvidos?
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cobertura-e-qualidade-em-saude-como.html. Acessado em 2011 (26 jan).
INFORMAÇÕES
O texto completo deste artigo foi publicado em 11 de janeiro de 2011 pelo
mesmo autor no blog http://www.monitordesaude.blogspot.com/.
Endereço para correspondência:
8207 Lilly Stone Drive, Bethesda, MD, USA
E-mail: [email protected]
Fontes de fomento: Nenhuma
Conflito de interesse: Nenhum
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Data da última modificação: 14 de janeiro de 2011
Data de aceitação: 9 de janeiro de 2011
Diagn Tratamento. 2011;16(1):39-41.
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Carta ao editor
Minha visão da prática médica na China
Lincoln Sakiara MiyasakaI
Shanghai United Family Hospitals, Shanghai, China
Prezado editor,
Durante meu curso de medicina, ouvi falar dos “médicos
dos pés descalços” na China, aqueles agentes de saúde treinados para orientar, cuidar e tratar das doenças mais comuns da
população que, na sua grande maioria, vivia na zona rural. Eles
também trabalhavam parcialmente como lavradores, nos terraços de arroz, de onde vem o nome “pés descalços”. Após a
fundação da República Popular da China, em 1o de outubro
de 1949 (aliás, a comemoração dos 60 anos foi há dois anos),
Mao Zedong criticou o desequilíbrio entre o gasto com a saúde
na zona urbana e rural. Em 1964, o gasto era maior para os 8,3
milhões que habitavam a cidade, em relação aos 500 milhões
de camponeses. Assim, em 1968, deu início ao programa dos
“médicos de pés descalços” os quais recebiam um treinamento
de cerca de seis meses após o término do curso secundário. Eles
eram pagos pelas cooperativas agrícolas, que contabilizavam o
tempo que eles gastavam no atendimento como o tempo trabalhado na agricultura. Apesar do treinamento limitado, eles
exerceram um papel importantíssimo na melhoria das condições de saúde do país continental. A mortalidade materna, que
antes de 1949 era de 150/100.000 habitantes, foi reduzida para
41.3/100.000, e a mortalidade infantil, que era de 200/1000,
passou a ser de 18.6/1000.1
Ao vir para a China em 2008, pensei em encontrar com esses
profissionais e conhecer melhor o sistema de saúde deste país,
mas, infelizmente, a tendência capitalista das últimas décadas,
que trouxe crescimento econômico, também inviabilizou as
comunidades agrícolas. Nos anos 60, 90% das vilas possuíam
cooperativas, mas em 1985 esse número estava reduzido a 5%.
Por conseguinte, elas não conseguiam sustentar aqueles saudosos profissionais da saúde, cujo título foi cancelado pelo Ministério da Saúde em 1985. No entanto, aqueles que conseguiram
passar nos exames foram reconhecidos como médicos da vila e
continuaram a dar assistência recebendo pagamento do usuário. Segundo Zhang,2 em 2007 havia 880.000 médicos rurais,
110.000 assistentes e 50.000 agentes de saúde na China.
Em 2003 foi implementado um novo sistema de cooperativa
médica, onde 10 renmimbi (RMB) (cerca de R$ 3,00) por ano
I
por pessoa coberta pela cooperativa são repassados pelo governo
para atender problemas graves de saúde.2 No entanto, sérios desafios permanecem em relação ao treinamento de profissionais,
prevenção e saúde pública.
Hoje, o que vemos na China em geral, como em muitos
países, é a assistência hospitalar em detrimento das unidades
básicas. Os grandes e renomados centros médicos superlotados, onde cada médico atende centenas de pacientes por dia,
e os centros de saúde abandonados e vazios. Naturalmente, os
alunos de medicina mais destacados buscam a especialização e
os grandes centros terciários, ficando os serviços primários com
menos qualificação.
No entanto, o Shanghai Daily de 3 de abril de 2010 nos traz
as notícias de que uma nova linhagem de médicos de pés descalços está surgindo na China: 45 alunos da Shanghai Institute
od Health Sciences partiram para o campo apos três anos de
treinamento.3
Uma trajetoria de vida espetacular foi a de Chen Zhu, que
começou a sua carreira como médico de pé descalço, mas continuou seus estudos na medicina, especializou-se em hematologia, clonagem genética, fez o doutorado em Paris, fundou
importantes instituições de pesquisa na China e hoje alcançou
a posição de ministro da Saúde do país. Ele tem em suas mãos,
agora, a monumental tarefa de reformular o sistema de saúde
para atender 1,3 bilhão de pessoas.4
O Brasil, que também tem uma extensão territorial continental e desigualdade socioeconômica importante, adotou um
sistema de saúde pública que por sua vez também foi influenciado pelo antigos “médicos dos pés descalços” da China. O
Brasil adotou um modelo chamado PSF (Programa de Saúde
da Família) que começou em 1991 com o PACS (Programa de
Agentes Comunitários da Saúde) no Ceará. É um modelo centralizado na família, na comunidade, e não no hospital. Prioriza
a prevenção e não somente a cura. Não espera que o paciente
fique doente e venha ao hospital. Vai à comunidade, à sua casa,
e trabalha para evitar que ele adoeça. Nao é um trabalho individual do médico, mas de equipe (um médico, uma enfermeira e
quatro a seis agentes de saúde. No PACS há apenas a enfermeira
e os agentes de saúde.) Cada equipe cuida por volta de 1.000
famílias ou 5.000 pessoas. Cada agente comunitário tem cadastradas cerca de 200 famílias e faz visitas periódicas, notificando
MD, PhD. Médico de família, Parkway Health, Shanghai, China.
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Lincoln Sakiara Miyasaka
os problemas de saúde e necessidade de visitas por parte do
médico ou da enfermeira, levando informações de prevenção
e cuidados com a saúde. Essa equipe resolve cerca de 85% dos
problemas da comunidade, encaminhando para os serviços especializados apenas 15%.5 Hoje, o PSF é composto de 14.770
equipes e atende 96,5 milhões de pessoas, 27,4 milhões de
domicílios, mais de 50% da população do país5 e trabalha para
alcancar 75%.
Gostaria de deixar aqui registrada a minha impressão com respeito ao sistema de saúde destes dois países nos quais tenho trabalhado, pois a troca de informações e experiências neste mundo
globalizado pode ajudar as nações a superarem os desafios e melhorar a qualidade de vida das comunidades mais carentes.
43
3. Tan W. A new breed of ‘barefoot doctor’. ShanghaiDaily.com. Disponível em:
http://www.shanghaidaily.com/search/result.asp. Acessado em 2011 (28 fev.)
4. Watts J. Chen Zhu: from barefoot doctor to China’s Minister of Health.
Lancet. 2008;372(9648):1455.
5. Tosta W, Thomé C. Programa de Saúde da Família já atende mais da metade
da população. Estadão.com.br. Disponível em: http://www.estadao.com.br/
estadaodehoje/20100401/not_imp532262,0.php. Acessado em 2010 (20 dez).
INFORMAÇÕES
Endereço para correspondência:
555 Ming Zhu rd 10-501
Qingpu District Shanghai China 201-702
Tel. 86-21-3928-2501
E-mail: [email protected]
REFERÊNCIAS
Fontes de fomento: nenhuma declarada
Conflitos de interesse: nenhum declarado
1. Weiyuan C. China’s village doctors take great strides. Bull World Health
Organ. 2008;86(12):914-5.
2. Zhang D, Unschuld PU. China’s barefoot doctor: past, present, and future.
Lancet. 2008;372(9653):1865–7.
Data de entrada: 4 de outubro de 2010
Data da última modificação: 6 de janeiro de 2010
Data de aceitação: 7 de janeiro de 2011
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Instruções aos autores
INDEXAÇÃO E ESCOPO
A Revista Diagnóstico & Tratamento (ISSN 1413-9979) tem por objetivo oferecer
atualização médica, baseada nas melhores evidências disponíveis, em artigos escritos
por especialistas. Seus artigos são indexados na base de dados Lilacs (Literatura LatinoAmericana e do Caribe em Ciências da Saúde). São aceitos artigos originais (ensaios
clínicos, estudos coorte, estudos caso-controle, revisões sistemáticas, estudos transversais, avaliações econômicas), relatos de caso, revisões narrativas da literatura (artigos
de atualização) e cartas ao editor, que devem enquadrar-se nas normas editoriais dos
manuscritos submetidos a revistas biomédicas (do International Committe of Medical
Journal Editors1).
POLÍTICAS E PROCEDIMENTOS DA REVISTA
Após o recebimento do manuscrito pelo setor de Publicações Científicas, os autores
receberão um número de protocolo que servirá para manter o bom entendimento entre
os autores e o setor. Em seguida, o artigo será lido pelo editor, que verificará se está de
acordo com a política e o interesse da revista. Em caso afirmativo, o setor de Publicações
Científicas vai verificar se o texto cumpre as normas de publicação expressas nestas Instruções para Autores. Se o texto estiver incompleto ou se não estiver organizado como
exigido, os autores deverão resolver os problemas e submetê-lo novamente.
Quando o formato estiver aceitável, o setor enviará o trabalho para a revisão por
pares, na qual os revisores não assinarão seus veredictos e não conhecerão os nomes dos
autores do trabalho. Cada manuscrito será avaliado por dois revisores: um especialista
no assunto e um consultor ad hoc (que vai avaliar aspectos metodológicos do trabalho);
as discordâncias serão resolvidas pelos editores.
Os autores então receberão a avaliação e será solicitado que resolvam os problemas
apontados. Uma vez que o setor de Publicações Científicas receba o texto novamente,
o artigo será enviado ao editor científico e revisor de provas, que identificará problemas
na construção de frases, ortografia, gramática, referências bibliográficas e outros. Os
autores deverão providenciar todas as informações e correções solicitadas e deverão
marcar , no texto, todos os pontos em que realizaram modificações, utilizando cores
diferentes ou sistemas eletrônicos de marcação de alterações, de maneira que elas
fiquem evidentes.
Quando o texto for considerado aceitável para publicação, e só então, entrará na
pauta. O setor de Publicações Científicas fornecerá uma prova, incluindo Tabelas e
Figuras, para que os autores aprovem. Nenhum artigo é publicado sem este último
procedimento.
INSTRUÇÕES PARA AUTORES
Diretriz geral: para todos os tipos de artigos
Os artigos devem ser submetidos exclusivamente pela internet para o e-mail revistas@
apm.org.br e/ou [email protected].
O manuscrito deve ser submetido em português e deve conter um resumo e cinco
palavras-chave em português, que devem ser selecionadas das listas DeCS (Descritores
em Ciências da Saúde), conforme explicado em detalhes abaixo (nenhuma outra
palavra-chave será aceita).
Artigos submetidos devem ser originais e todos os autores precisam declarar que o
texto não foi e não será submetido para publicação em outra revista. Artigos envolvendo
seres humanos (individual ou coletivamente, direta ou indireta ou indiretamente,
total ou parcialmente, incluindo o gerenciamento de informações e materiais) devem
ser acompanhados de uma cópia da autorização do Comitê de Ética em Pesquisa da
instituição onde o experimento foi realizado.
Todo artigo submetido deve cumprir os padrões editoriais estabelecidos na Convenção
de Vancouver (Requerimentos Uniformes para Manuscritos Submetidos a Revistas
Biomédicas),1 e as diretrizes de qualidade para relatórios de estudos clínicos,2 revisões
sistemáticas (com ou sem metanálises)3 e estudos observacionais.4 O estilo conhecido
como “estilo Vancouver” deve ser usado não somente quanto ao formato de referências,
mas para todo o texto. Os editores recomendam que os autores se familiarizem com
esse estilo acessando www.icmje.org.
Para a classificação dos níveis de evidência e graus de recomendação de evidências,
a Revista Diagnóstico e Tratamento adota a nova classificação elaborada pelo Centro
de Medicina Baseada em Evidências de Oxford (Centre for Evidence-Based Medicine
- CEBM) e disponível em http://www.cebm.net/mod_product/design/files/CEBMLevels-of-Evidence-2.pdf Abreviações não devem ser empregadas, mesmo as que são
de uso comum. Drogas ou medicações devem ser citadas usando-se os nomes genéricos,
evitando-se a menção desnecessária a marcas ou nomes comerciais. Qualquer produto
citado no capítulo de Métodos, tal como equipamento diagnóstico, testes, reagentes,
instrumentos, utensílios, próteses, órteses e dispositivos intraoperatórios devem ser
descritos juntamente como o nome do fabricante e o local (cidade e país) de produção
entre parênteses. Medicamentos administrados devem ser descritos pelo nome genérico
(não a marca), seguidos da dosagem e posologia.
Para qualquer tipo de estudo, todas as afirmações no texto que não sejam resultado
da pesquisa apresentada para publicação à revista Diagnóstico & Tratamento, mas sim
dados de outras pesquisas já publicadas em outros locais, devem ser acompanhadas de
citações da literatura pertinente.
Os relatos de caso e as revisões narrativas deverão conter uma busca sistematizada
(atenção: o que é diferente de uma revisão sistemática) do assunto apresentado, realizada
nas principais bases de dados (Cochrane Library, Embase, Lilacs, PubMed, outras bases
específicas do tema).
Bolsas, apoios e qualquer suporte financeiro a estudos devem ser mencionados
separadamente na última página. Agradecimentos, se necessário, devem ser colocados
após as referências bibliográficas.
A Diagnóstico & Tratamento apóia as políticas para registro de ensaios clínicos da
Organização Mundial da Saúde (OMS) e do International Committee of Medical
Journal Editors (ICMJE), reconhecendo a importância dessas iniciativas para o registro e
divulgação internacional de informação sobre estudos clínicos, em acesso aberto. Sendo
assim, somente serão aceitos para publicação, a partir de 2007, os artigos de pesquisa
clínicas que tenham recebido um número de identificação em um dos Registros de
Ensaios Clínicos validados pelos critérios estabelecidos pela OMS e ICMJE, cujos
endereços estão disponíveis no site do ICMJE (http://www.icmje.org/). O número
de identificação deverá ser registrado ao final do resumo.
FORMATO
Primeira página (capa)
A primeira página deve conter:
1) classificação do artigo (original, revisão narrativa da literatura, relato de caso e
carta ao editor);
2) o título do artigo, que deverá ser conciso, mas informativo;
3) o nome de cada autor (não abreviar), sua titulação acadêmica mais alta e a
instituição onde trabalha;
4) o local onde o trabalho foi desenvolvido;
Segunda página
Artigos originais: a segunda página, neste caso, deve conter um resumo5 (máximo
de 250 palavras) estruturado da seguinte forma:
1) contexto e objetivo;
2) desenho e local (onde o estudo se desenvolveu);
3) métodos (descritos em detalhes);
4) resultados;
5) Discussão;
6) conclusões.
Relatos de caso: devem conter um resumo5 (máximo de 250 palavras) estruturado
da seguinte forma:
1) contexto;
2) descrição do caso;
3) discussão;
4) conclusões.
Revisão da narrativa da literatura: deve conter um resumo (máximo de 250 palavras)
com formato livre.
O resumo deve conter cinco palavras-chave, que devem ser escolhidas a partir dos
Descritores em Ciências da Saúde (DeCS), desenvolvidos pela Bireme, que estão
disponíveis na internet (http://decs.bvs.br/).6
Referências
As referências bibliográficas (no estilo “Vancouver”, como indicado pelo Comitê
Internacional de Editores de Revistas Biomédicas, ICMJE) devem ser dispostas na parte
final do artigo e numeradas de acordo com a ordem de citação. Referências citadas nas
legendas de Tabelas e Figuras devem manter a sequência com as referências citadas no
texto. Todos os autores devem ser citados se houver menos de seis; se houver mais de seis
autores, os primeiros três devem ser citados seguidos de “et al.” Para livros, a cidade de
publicação e o nome da editora são indispensáveis. Para textos publicados na internet,
a fonte localizadora completa (URL) ou endereço completo é necessário (não apenas
a página principal ou link), de maneira que, copiando o endereço completo em seus
programas para navegação na internet, os leitores possam ser levados diretamente ao
documento citado, e não a um site geral. A seguir estão dispostos alguns exemplos dos
tipos mais comuns de referências:
Artigo em periódico
• Lahita R, Kluger J, Drayer DE, Koffler D, Reidenberg MM. Antibodies to nuclear
Diagn Tratamento. 2010;16(1):44-5.
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Instruções aos autores
antigens in patients treated with procainamide or acetylprocainamide. N Engl J
Med. 1979;301(25):1382-5.
Livro
• Styne DM, Brook CGD. Current concepts in pediatric endocrinology. New York:
Elsevier; 1987.
Capítulo de livro
• Reppert SM. Circadian rhythms: basic aspects and pediatric implications. In: Styne
DM, Brook CGD, editors. Current concepts in pediatric endocrinology. New York:
Elsevier; 1987. p. 91-125.
Texto na internet
• World Health Organization. WHO calls for protection of women and girls from
tobacco. Disponível em: http://www.who.int/mediacentre/news/releases/2010/
women_tobacco_20100528/en/index.html. Acessado em 2010 (8 jun).
Dissertações e teses
• Neves SRB. Distribuição da proteína IMPACT em encéfalos de camundongos,
ratos e saguis. [tese]. São Paulo: Faculdade de Medicina da Universidade Federal de
São Paulo; 2009.
Última página
A última página deve conter:
1) a data e o local do evento no qual o artigo foi apresentado, se aplicável, como
congressos ou defesas de dissertações ou teses;
2) fontes de apoio na forma de suporte financeiro, equipamentos ou drogas e número
do protocolo;
3) descrição de qualquer conflito de interesse por parte dos autores;
4) endereço completo, e-mail e telefone do autor a ser contatado quanto à publicação
na revista.
Figuras e tabelas
As imagens devem ter boa resolução (mínimo de 300 DPI) e ser gravadas em formato
“.jpg” ou “.tif”. Imagens não devem ser incluídas em documentos do Microsoft PowerPoint. Se as fotografias forem inseridas num documento Microsoft Word, as imagens
também devem ser enviadas separadamente. Gráficos devem ser preparados com o
Microsoft Excel (não devem ser enviados como imagem) e devem ser acompanhados
das tabelas de dados a partir dos quais foram gerados. O número de ilustrações não
deve exceder o número total de páginas menos um.
Todas as figuras e tabelas devem conter legendas ou títulos que descrevam precisamente seu conteúdo e o contexto ou amostra a partir da qual a informação foi obtida
(por exemplo, quais foram os resultados apresentados e qual foi o tipo de amostra e
local). A legenda ou título devem ser curtos, mas compreensíveis independentemente
da leitura do artigo.
O MANUSCRITO
# Relatos de caso devem conter Introdução, Descrição do Caso, Discussão (contendo a busca sistematizada sobre o tema) e Conclusão.
# Artigos originais e revisões narrativas devem ser estruturados de maneira que
contenham as seguintes partes: Introdução, Objetivo, Método, Resultados, Discussão e Conclusão. A Revista publica revisões narrativas desde que contenham busca
sistematizada da literatura. O texto não deve exceder 2.200 palavras (excluindo
tabelas, figuras e referências), da introdução até o final da conclusão. A estrutura do
documento deve seguir o formato abaixo:
1. Introdução: as razões para que o estudo fosse realizado devem ser explicitadas,
descrevendo-se o atual estado da arte do assunto. Deve ser descrito o contexto, o que
se sabe a respeito. Aqui não devem ser inseridos resultados ou conclusões do estudo.
No último parágrafo, deve ser especificada a principal questão do estudo e a principal
hipótese, se houver. Não se deve fazer discussões sobre a literatura na introdução; a
seção de introdução deve ser curta.
2. Objetivo: deve ser descrito o principal objetivo do estudo, brevemente. Hipóteses
pré-estabelecidas devem ser descritas claramente. De preferência deve-se estruturar
a pergunta do estudo no formato “PICO”, onde P é a população ou problema, I
é intervenção ou fator de risco, C é o grupo controle e O vem de “outcome”, ou
desfecho.
3. Métodos
3.1. Tipo de estudo: deve-se descrever o desenho do estudo, adequado para responder a pergunta, e especificando, se apropriado, o tipo de randomização, cegamento,
padrões de testes diagnósticos e a direção temporal (se retrospectivo ou prospectivo).
Por exemplo: “estudo clínico randomizado”, “estudo clínico duplo-cego controlado
por placebo”, “estudo de acurácia”, “relato de caso”
3.2. Local: deve ser indicado o local onde o estudo foi desenvolvido, o tipo de
instituição: se primária ou terciária, se hospital público ou privado. Deve-se evitar
o nome da instituição onde o estudo foi desenvolvido (para cegamento do texto
para revisão): apenas o tipo de instituição deve ficar claro. Por exemplo: hospital
universitário público.
3.3. Amostra, participantes ou pacientes: devem ser descritos os critérios de elegibilidade para os participantes (de inclusão e exclusão), as fontes e os procedimentos
de seleção ou recrutamento. Em estudos de caso-controle, a lógica de distribuição de
casos como casos e controles como controles deve ser descrita, assim como a forma
de pareamento. O número de participantes no início e no final do estudo (após
exclusões) deve ficar claro.
3.4. Tamanho de amostra e análise estatística: descrever o cálculo do tamanho da
amostra, a análise estatística planejada, os testes utilizados e o nível de significância,
e também qualquer análise post hoc. Descrever os métodos usados para o controle
de variáveis e fatores de confusão, como se lidou com dados faltantes (“missing
data”) e como se lidou com casos cujo acompanhamento foi perdido (“loss from
follow-up”).
3.5. Randomização: descrever qual foi o método usado para implementação da
alocação de sequência aleatória (por exemplo, “envelopes selados contendo sequências
aleatórias de números gerados por computador”). Adicionalmente, descrever quem
gerou a sequência aleatória, quem alocou participantes nos grupos (no caso de estudos
controlados) e quem os recrutou.
3.6. Procedimentos de intervenção, teste diagnóstico ou exposição: descrever
quais as principais características da intervenção, incluindo o método, o período e
a duração de sua administração ou de coleta de dados. Descrever as diferenças nas
intervenções administradas a cada grupo (se a pesquisa é controlada).
3.7. Principais medidas, variáveis e desfecho: descrever o método de medida do
principal resultado, da maneira pela qual foi planejado antes da coleta de dados.
Afirmar quais são os desfechos primário e secundário esperados. Para cada variável
de interesse, detalhar os métodos de avaliação. Se a hipótese do estudo foi formulada
durante ou após a coleta de dados (não antes), isso deve ser declarado. Descrever os
métodos utilizados para melhorar a qualidade das medidas (por exemplo, múltiplos
observadores, treinamento etc.). Explicar como se lidou com as variáveis quantitativas na análise.
4. Resultados: descrever os principais achados. Se possível, estes devem conter os
intervalos de confiança de 95% e o exato nível de significância estatística. Para estudos
comparativos, o intervalo de confiança para as diferenças deve ser afirmado.
4.1. Fluxo de participantes: descreva o fluxo dos participantes em cada fase do estudo
(inclusões e exclusões), o período de acompanhamento e o número de participantes
que concluiu o estudo (ou com acompanhamento perdido). Considerar usar um
fluxograma. Se houver análise do tipo “intenção de tratar”, esta deve ser descrita.
4.2. Desvios: se houve qualquer desvio do protocolo, fora do que foi inicialmente
planejado, ele deve ser descrito, assim como as razões para o acontecimento.
4.3. Efeitos adversos: devem ser descritos quaisquer efeitos ou eventos adversos
ou complicações.
5. Discussão: deve seguir a sequência: começar com um resumo dos objetivos e das
conclusões mais relevantes; comparar métodos e resultados com a literatura; enfatizar
os pontos fortes da metodologia aplicada; explicar possíveis pontos fracos e vieses;
incluir implicações para a prática clínica e implicações para pesquisas futuras.
6. Conclusões: especificar apenas as conclusões que podem ser sustentadas, junto
com a significância clínica (evitando excessiva generalização). Tirar conclusões baseadas
nos objetivos e hipóteses do estudo. A mesma ênfase deve ser dada a estudos com
resultados negativos ou positivos.
CARTAS AO EDITOR
É uma parte da revista destinada à recepção de comentários e críticas e/ou sugestões
sobre assuntos abordados na revista ou outros que mereçam destaque. Tem formato
livre e não segue as recomendações anteriores destinadas aos artigos originais, relatos
de casos e revisão da literatura.
Documentos citados
1. International Committee of Medical Journal Editors. Uniform requirements
for manuscripts submitted to biomedical journals. Disponível em: http://www.icmje.
org/urm_main.html. Acessado em 2010 (7 jun).
2. CONSORT Transparent Reporting of Trials. Welcome to the CONSORT
statement website. Disponível em: http://www.consort-statement.org. Acessado
em 2010 (7 jun).
3. Moher D, Cook DJ, Eastwood S, Olkin I, Rennie D, Stroup DF. Improving the
quality of reports of meta-analyses of randomised controlled trials: the QUOROM
statement. Quality of Reporting of Meta-analyses. Lancet. 1999;354(9193):1896900.
4. STROBE Statement Strengthening the reporting of observational studies in epidemiology. Checklist on items that should be included in reports of
observational studies. Disponível em:: http://www.strobe-statement.org/index.
php?eID=tx_nawsecuredl&u=0&file=fileadmin/Strobe/uploads/checklists/STROBE_checklist_v4_combined.pdf&t=1257007091&hash=7713ea8f7f2662b288689
b3dab40c1cb. Acessado em 2010 (7 jun).
5. Haynes RB, Mulrow CD, Huth EJ, Altman DG, Gardner MJ. More informative
abstracts revisited. Ann Intern Med. 1990;113(1):69-76.
6. BVS Biblioteca Virtual em Saúde. Descritores em Ciências da Saúde. Disponível
em:: http://decs.bvs.br/. Acessado em 2010 (7 jun).
Diagn Tratamento. 2010;16(1):44-5.
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