- Associação Paulista de Medicina

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Sumário
Expediente
166
Editorial
167
Nutrologia
170
Sistemas de saúde: o que queremos?
Paulo Manuel Pêgo-Fernandes, Benoit Jacques Bibas
Tribulus terrestris
Hernani Pinto de Lemos Júnior, André Luis Alves de Lemos, Ligia Mara Dolce de Lemos
Recidiva de tromboembolismo é mais comum em homens
174
POEMs: Patients-oriented evidence
that matters
176
Linguagens
177
Residência e ensino médico
180
Autores da tradução: Pablo Gonzáles Blasco, Marcelo Rozenfeld Levites, Cauê Mônaco
Insights sobre o prognóstico da síndrome da angústia respiratória do adulto
Autores da tradução: Pablo Gonzáles Blasco, Marcelo Rozenfeld Levites, Cauê Mônaco
Recente
Alfredo José Mansur
Quem quer ser um milionário?
Olavo Pires de Camargo, Luiz Eugênio Garcez Leme
Pré-síncope em atleta jovem
Eletrocardiograma
Medicina sexual
182
Antonio Américo Friedmann, José Grindler, Carlos Alberto Rodrigues de Oliveira,
Alfredo José da Fonseca
Psicoterapia para a saúde sexual: resultados com um grupo de mulheres
na transição menopáusica
184
Heloisa Junqueira Fleury, Carmita Helena Najjar Abdo
Probióticos para o tratamento de diarreia infecciosa aguda
188
Autora da tradução: Rachel Riera. Autor dos comentários: Flavio Steinwurz
Revascularização transmiocárdica a laser versus tratamento clínico para
angina refratária
Destaques Cochrane
190
Autora da tradução: Rachel Riera. Autor dos comentários: José Henrique Andrade Vila,
José Pedro da Silva
Institutos pomposos
192
Milton Augusto de Toledo Barros
Troca de plantão e a verbalização do estado mental dos pacientes
Carta ao editor
194
Marcus Vinicius Henrique de Carvalho, Priscila Nasser de Carvalho
Resumos
195
VIII Congresso Paulista de Neurologia
206
Instruções aos autores
Dennis Steves
Senhor do tempo
2008
Nanquim sobre papel
57 x 40 cm
Acervo da Associação Paulista de Medicina
Expediente
A Revista Diagnóstico & Tratamento (Indexada na base LILACS)
é uma publicação trimestral da Associação Paulista de Medicina
Editores
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Assistente Editorial
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Assessora Editorial
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Auxiliar Editorial
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Heráclito Barbosa de Carvalho
José Antonio Rocha Gontijo
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Jornalista Científica e Editora
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Palavra Impressa Editora – Fone (11) 3032-6117
Revisão de Provas
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Tiragem
30.000 exemplares
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Milton de Arruda Martins (Clínica Médica)
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5o diretor distrital
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7o diretor distrital
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9a diretora distrital
10o diretor distrital
11o diretor distrital
12o diretor distrital
13o diretor distrital
14o diretor distrital
Alfredo de Freitas Santos Filho
Nelson Álvares Cruz Filho
Denise Barbosa
Yvonne Capuano
Guido Arturo Palomba
Carlos Alberto Monte Gobbo
José Luiz Bonamigo Filho
João Carlos Sanches Anéas
Tomás Patrício Smith-Howard
Jarbas Simas
Airton Gomes
Arnaldo Duarte Lourenço
Lauro Mascarenhas Pinto
Wilson Olegário Campagnone
José Renato dos Santos
José Eduardo Paciência Rodrigues
Eduardo Curvello Tolentino
Helencar Ignácio
José do Carmo Gaspar Sartori
Paulo Roberto Mazaro
José de Freitas Guimarães Neto
Marco Antônio Caetano
Marcio Aguilar Padovani
Wagner de Matos Rezende
Diagn Tratamento. 2011;16(4):166.
Editorial
Sistemas de saúde: o que queremos?*
Paulo Manuel Pêgo-FernandesI, Benoit Jacques BibasII
Os Estados Unidos não têm um sistema público de saúde
com cobertura universal. Há alguns programas financiados
pelo governo, como o Medicare, destinado a pessoas com
mais de 65 anos, ou o Medicaid, para indivíduos de baixa
renda.1-3 Logo, a maioria dos americanos precisa adquirir o
próprio plano de saúde, seja por meio de empregadores ou
por conta própria.1,2 O atual sistema de saúde é criticado
por ser caro e ineficaz. Em 2007, os Estados Unidos gastaram US$ 2,2 trilhões − o equivalente a 16,2% do Produto
Interno Bruto (PIB) − em assistência médica.1 No mesmo
período, a Espanha gastou 8% do PIB em saúde.2
As carências do sistema de saúde dos Estados Unidos
ficaram expostas em um estudo realizado em 2010,4,5 no
qual se comparou a situação atual em 11 nações desenvolvidas, o que deixou o país mal posicionado com relação a
outros, como Austrália, França e Reino Unido. Após consultar 19.700 adultos de Estados Unidos, Alemanha, Austrália, Canadá, França, Holanda, Noruega, Nova Zelândia,
Reino Unido, Suécia e Suíça, a conclusão foi a de que o
povo norte-americano é o que mais precisa sobreviver sem
procurar um médico, devido à dificuldade para pagar pelos
atendimentos de saúde.
Devido aos custos, os adultos americanos são muito mais
inclinados que os das outras 10 nações industrializadas a viver
sem cobertura médica, ter maiores problemas para enfrentar
as faturas, pagar preços elevados, mesmo quando têm seguro
médico, e discutir com as seguradoras por sua cobertura.4,5
Os Estados Unidos sobressaem entre os outros países por ter
as piores experiências de saúde, já que 33% dos americanos
adultos reconhecem que evitaram procurar um médico quando estiveram doentes e que também não tomaram os remédios
receitados devido a seu preço.4,5 Na Holanda, o índice é de
5% e, no Reino Unido, de 6%.4,5 Além disso, 20% dos americanos enfrentaram “graves problemas” para pagar suas faturas
médicas, contra 9% na França (o segundo país da lista), 4%
na Holanda, 3% na Alemanha e 2% no Reino Unido.4,5
O sistema de saúde canadense, conhecido como um modelo de pagamento único, é diferente do sistema norte-ameI
ricano, principalmente na forma como é financiado.6 Em vez
de basear a maior parte do sistema em torno de seguros privados, como os Estados Unidos, o governo canadense atua
como uma fonte única de pagamento, coletando dinheiro
por meio de impostos, negociando com prestadores de cuidados de saúde para chegar a um acordo sobre as despesas
e, em seguida, desembolsa os honorários de um fundo público central.6 Este sistema pode melhor ser descrito como
um conjunto entrelaçado de 10 planos de seguro de saúde
provinciais e três territoriais.7 Conhecido pelos canadenses
como o “Medicare”, o sistema fornece acesso a uma cobertura universal e abrangente de serviços médico-hospitalares
internos e externos clinicamente necessários.6,7
O papel do governo federal na assistência médica envolve
a fixação e administração de princípios ou normas nacionais
do sistema de assistência médica (ou seja, o Canada Health
Act), assistindo no financiamento dos serviços de assistência
médica provinciais, por meio de transferências fiscais e do
exercício das funções que constitucionalmente lhe competem.7 O sistema de assistência médica canadense é focado
nos médicos de assistência primária, que representam cerca
de 51% de todos os médicos ativos no Canadá.7 Esses médicos constituem, geralmente, o contato inicial com o sistema
de assistência médica convencional, sendo eles que controlam o acesso à maioria dos especialistas, dos profissionais
afins, das admissões hospitalares, das análises de diagnósticos e da prescrição de medicamentos.7
O Canadá não possui um sistema de medicina socializada com médicos empregados pelo governo.7 A maioria dos
médicos é profissional privado que trabalha em consultórios,
independentemente ou em grupos, e desfruta de elevado nível de autonomia. Os médicos privados são geralmente remunerados numa base de pagamento por serviços prestados,
após apresentarem suas notas de honorários diretamente ao
plano de seguro provincial para pagamento.7
Quando os canadenses necessitam de assistência médica,
dirigem-se, na maioria dos casos, ao médico ou clínica da sua
preferência, onde apresentam o cartão de seguro de saúde emi-
Professor associado da Disciplina de Cirurgia Torácica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Médico estagiário em Cirurgia de Traqueia e Endoscopia Respiratória Terapêutica da Disciplina de Cirurgia Torácica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
II
* Este artigo foi publicado na versão em inglês no periódico São Paulo Medical Journal/Evidence for Health Care, volume 129, edição número 4, de julho e agosto de 2011.
Diagn Tratamento. 2011;16(4):167-9.
168
Sistemas de saúde: o que queremos?
tido a todos os residentes de cada província.7 O cidadão não
paga diretamente pelos serviços segurados de hospitais e médicos, tampouco lhe é exigido que preencha formulários pelos
serviços segurados.7
O sistema de saúde canadense tem algumas vantagens significativas: os gastos per capita com saúde, por exemplo, são
menores do que nos Estados Unidos, e a cobertura é universal.6 A expectativa de vida (79 anos) é maior do que nos Estados Unidos. Desvantagens do sistema canadense incluem
menos médicos por 1.000 habitantes que a média do G7
(embora não substancialmente menor do que nos Estados
Unidos), e menos aparelhos como tomógrafos e aparelhos
de ressonância magnética.6 Há também tempo ligeiramente
grande de espera para realização de determinados procedimentos de alta complexidade.6
Os sistemas canadense e americano diferem sobremaneira
do setor francês. Na França, a saúde é um dos componentes do
sistema de seguridade social, sob a base da cotização obrigatória de empregados e empregadores.8 Tem como princípios de
organização a coexistência do setor público ao lado do privado,
com ou sem fins lucrativos, a livre escolha de profissionais e
estabelecimentos de saúde, a autonomia para a instalação de
consultórios, o pagamento direto, pelos usuários, aos profissionais e serviços de saúde, com reembolso parcial das despesas e a
liberdade de prescrição.8
Na prática, representa um programa de seguro público compulsório, que tanto remunera médicos particulares pela assistência quanto exerce relativo controle regulador sobre o valor
de consultas e procedimentos.8 Por sua característica mista,
disponibiliza ainda serviços de natureza pública e privada aos
usuários. A rede de saúde possuía aproximadamente 3.000 estabelecimentos hospitalares em 2000, sendo um terço público e
dois terços privados. Entre os privados, predominavam os hospitais com fins lucrativos.8
A tabela de honorários dos profissionais de saúde é negociada pelos órgãos sindicais com o sistema de seguridade social e baseia-se em pagamento por atos realizados, o que tende
ao incremento dos custos. Em 2000, como exemplo, uma
consulta médica efetuada por generalista custava 20 euros; 46
euros por cardiologista e 36 euros por psiquiatra.8 Desde a
implantação do tíquete moderador, instrumento destinado ao
controle de despesas e à responsabilização parcial do usuário
pelos custos do sistema, fica a cargo do usuário 30% do valor
das consultas médicas, 40% dos atos dos auxiliares, 40% dos
exames laboratoriais, 35% dos gastos com transportes médicos e óculos, além de um montante variável de 0 a 100%
com medicamentos prescritos, conforme a natureza do medicamento e da doença envolvida.8
A remuneração da atividade médica é dividida em três setores. No setor 1, os honorários são fixados pelos acordos estipulados com a Seguridade Social. No setor 2, os médicos,
principalmente os das grandes cidades e devido às suas espe-
cializações e títulos, negociam os honorários com a Seguridade
Social acrescidos de um adicional.8 Esse adicional é de inteira
responsabilidade do usuário. Em 2000, 13,8% dos generalistas
e 37% dos especialistas seguiam as normas do setor 2. Por último, há um pequeno grupo de médicos no setor 3 que pratica
honorários livres.8
A regulação estatal no setor saúde abrange diferentes campos. Por exemplo, o controle e limitação do número de profissionais de determinadas especialidades em exercício no país,
mediante a instituição de um numerus clausus, a partir de 1971.
Na época de sua implantação, havia 8.588 de estudantes/ano
de medicina no país, número que caiu para 4 mil no início do
novo século.8
O Sistema Único de Saúde (SUS) foi criado no Brasil em
1988 pela Constituição Federal para ser o sistema de saúde universal da população.9 No entanto, o SUS real está ainda muito
longe do SUS constitucional, ou seja, há uma enorme distância
entre o sonho dos constituintes e da reforma sanitária brasileira
e a prática social de nosso sistema público de saúde.10 Enquanto
o SUS constitucional propõe um sistema público universal para
todos os brasileiros, expresso na saúde como direito de todos
e dever do Estado, o SUS real se consolida como um espaço
destinado aos que não têm acesso aos planos de saúde.10 Dessa forma, vem se desenvolvendo no país um sistema de saúde
em que convivem três grandes subsistemas: (1) o SUS, o subsistema público, destinado a 130 milhões de brasileiros; (2) o
subsistema privado de atenção médica suplementar, destinado
a 40 milhões de brasileiros que pagam, por si ou através de
empregadores, diferentes operadoras de planos de saúde; e (3) o
subsistema privado de desembolso direto, ao qual recorrem os
brasileiros, ricos e pobres, para a compra de serviços por meio
de pagamento direto.10
A questão do financiamento público é a base da construção do sistema social brasileiro.10 Dados da Organização
Mundial da Saúde para o ano de 2001 mostram que o Brasil
gasta pouco e mal com saúde. O gasto com saúde total per
capita brasileiro, naquele ano, foi de US$ 222,00, contra
US$ 603,00 do Uruguai e US$ 679,00 da Argentina, o que
atesta baixo gasto com saúde frente a outros países sul-americanos.10 Além disso, o gasto no sistema de saúde brasileiro
é de baixa qualidade porque a proporção do gasto público
em relação ao gasto total é de apenas 41,6%; nos países que
construíram sistemas públicos universais, essa proporção é
superior a 70%.10
A questão do financiamento público da saúde depende de
qual sistema de saúde se quer construir: deve-se investir em valores individualistas ou auto-interessados, como os da sociedade norte-americana, o que levará à consolidação do SUS como
segmento para os pobres, ou investir em valores solidaristas, o
que tornará o SUS um sistema público universal.10 Uns e outros
valores formarão o SUS do futuro. A sociedade brasileira não
fez ainda uma opção definitiva.10
Diagn Tratamento. 2011;16(4):167-9.
Paulo Manuel Pêgo-Fernandes | Benoit Jacques Bibas
REFERÊNCIAS
1. Corrêa A. Entenda a reforma no sistema de saúde nos EUA. BBC BRASIL.
Disponível em: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2010/03/100322_
reforma_saude_entenda_dg.shtml. Acessado em 2011 (20 mai).
2. Instituto de Estudos de Saúde Suplementar. Saúde Suplementar em Foco. A
reforma da saúde norte-americana. Universalização do acesso à saúde via
seguros privados. Informativo eletrônico. 2010:1(2). Disponível em: http://
www.iess.org.br/html/ano1n2.pdf. Acessado em 2011 (20 mai).
3. Ugá MAD. Gasto, acesso e condições de saúde: tendências nos países da
OCDE. Rev Assoc Med Bras. 2001;47(3):171-2.
4. The Commonwealth Fund. A Private Foundation Working Toward a High
Perfomance Health System. 2010 Commonwealth Fund International
Health Policy Survey. Disponível em: http://www.commonwealthfund.org/
Content/Surveys/2010/Nov/2010-International-Survey.aspx. Acessado em
2011 (20 mai).
5. Médicos na mídia. O que se fala de medicina nos meios de comunicação.
Estudo em 11 países expõe carências do sistema de saúde americano.
Disponível em: http://cbc-df.org.br/medicosnamidia/2010/11/estudo-em11-paises-expoe-carencias-do-sistema-de-saude-americano/. Acessado em
2011 (20 mai).
6. Ashford J. American, Canadian, British Health Care Systems. Health Field.
Disponível em: http://www.suite101.com/content/american-canadianbritish-health-care-systems-a73595. Acessado em 2011 (20 mai).
7. O sistema de cuidados de saúde do Canadá. Health System and Policy
Division. Disponível em: http://dsp-psd.pwgsc.gc.ca/Collection/H39-5021999Por.pdf. Acessado em 2011 (20 mai).
Diagn Tratamento. 2011;16(4):167-9.
8. Fontes PAC. A medicina no sistema de saúde francês. Conselho Regional de
Medicina do Estado de São Paulo. Disponível em http://www.cremesp.org.
br/?siteAcao=Revista&id=417. Acessado em 2011 (20 mai)
9. Brasil. Ministério da Saúde. O que é o SUS. Disponível em: http://portal.saude.gov.
br/portal/saude/cidadao/area.cfm?id_area=1395. Acessado em 2011 (20 mai).
10.Mendes EV. O dilema do SUS. Disponível em: http://www.gices-sc.org/
ArtigoEugenioVilacaDilemaSUS.pdf. Acessado em 2011 (20 mai).
INFORMAÇÕES
Endereço para correspondência:
Paulo Manuel Pêgo-Fernandes
Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44
Instituto do Coração (InCor)
Secretaria do Serviço de Cirurgia Torácia — bloco II — 2o andar — sala 9
Cerqueira César — São Paulo (SP) — Brasil
CEP 05403-000
Tel. (+55 11) 3069-5248
E-mail: [email protected]
E-mail: [email protected]
Fonte de fomento: nenhuma declarada
Conflito de interesse: nenhum declarado
Date de entrada: 13 de maio de 2011
Data da última modificação: 14 de maio de 2011
Data de aceitação: 27 de maio de 2011
169
Nutrologia
Tribulus terrestris
Hernani Pinto de Lemos JúniorI, André Luis Alves de LemosII, Ligia Mara Dolce de LemosIII
Disciplina de Medicina de Urgência e Medicina Baseada em Evidências da Universidade Federal de São Paulo —
Escola Paulista de Medicina (Unifesp-EPM), Centro Cochrane do Brasil
INTRODUÇÃO
A procura do melhor desempenho parece incessante nos nossos dias: a mídia proclama o melhor desempenho físico, a melhor alimentação, a melhor performance sexual, o melhor controle das doenças e assim por diante. A pretensa homogeneidade de
desempenho entre as pessoas pressupõe uma negativa de características genéticas, constitucionais, cronológicas e ambientais que
têm de ser aceitas, nos outros e pessoalmente.
Dentro desse contexto, surgem as soluções para melhorar o
desempenho nas mais diversas áreas e, uma delas, por meio da
planta Tribulus terrestris. É dito pela voz popular, através de séculos, que essa planta tem propriedades afrodisíacas, cardiocirculatórias, metabólicas etc. Apesar de sua origem ser constantemente citada como asiática, na verdade ela existe na Europa
e na África. Tribulus terrestris é uma erva natural comumente
conhecida como a videira da punctura (picada ou ferimento feito com punção), que tem sido usada durante séculos na Europa
para tratamento da impotência e como estimulante para ajudar
a aumentar o impulso e o desempenho sexual.
OBJETIVO
Verificar evidências do uso do Tribulus terrestris na saúde.
MÉTODOS
Foi realizada uma busca eletrônica nas bases de dados Medline (via Bireme e PubMed), Lilacs e Cochrane Library (Bireme). Dos estudos encontrados, foram selecionados aqueles
com maior relevância (considerando o desenho do estudo e a
situação clínica) que poderiam contribuir para a prática clínica
ou para pesquisas futuras.
RESULTADOS
Procurando na literatura médica os dados consistentes
que substanciem as propriedades do Tribulus terrestris (TT),
foram encontrados inúmeros estudos experimentais. Um
deles, realizado na China, sobre a propriedade hipoglicêmica
do TT, foi realizado em ratos e mostrou uma redução da
glicemia de 26,25% e 40,67% em animais sem e com diabetes,
respectivamente. Nesse mesmo estudo foi demonstrada redução
de 23,35% dos triglicérides.1
Um efeito adverso grave, em experimentação animal, foi
constatado pela administração de uma extrato de alcaloides do
TT a ovelhas, na dose de 54 mg/kg. Após meses, observouse que os animais apresentavam paresia de membros e marcha
cambaleante. O estudo das ovelhas afetadas mostrou que esses
alcaloides interagiram de forma irreversível com uma sequência
de DNA neuronal gene-específico.2
Na Universidade Nacional de Singapura, foi realizado estudo em 24 coelhos visando comprovar a propriedade próeréctil da protodioscina, um componente do TT. Os animais
foram divididos aleatoriamente em quatro grupos de seis, ficando um grupo para controle e os demais submetidos a diferentes doses do TT por um período de oito semanas. Depois,
os coelhos foram sacrificados e seus pênis isolados para serem
submetidos a estímulos com drogas relaxantes e constritoras e
estimulação num campo elétrico. Os órgãos dos animais submetidos ao TT tiveram uma resposta significantemente melhor do que o grupo controle. Os pesquisadores atribuíram a
ação pró-eréctil da protodioscina à liberação maior de óxido
nítrico do endotélio.3
Efeitos hormonais da TT foram avaliados em primatas,
coelhos e ratos para identificar sua utilidade no tratamento da
disfunção erétil (DE). Extrato de TT foi administrado em primatas por via intravenosa, em doses de 7,5 mg/kg, 15 mg/kg
e 30 mg/kg, para estudo de toxicidade aguda. Coelhos e ratos
normais foram tratados com 2,5 mg/kg, 5 mg/kg e 10 mg/kg
de extrato de TT por via oral durante oito semanas para estudo crônico. Além disso, ratos castrados foram tratados com
cipionato de testosterona (10 mg/kg, por via subcutânea; quinzenal por oito semanas) ou TT por via oral (5 mg/kg ao dia
durante oito semanas). Amostras de sangue foram analisadas
para níveis de testosterona (T), dihidrotestosterona (DHT) e
sulfato de dehidroepiandrosterona (DHEA) usando radioimunoensaio. Nos primatas, o aumento da T (52%), DHT (31%)
Médico, mestre e doutor em Medicina Interna e Terapêutica e Medicina Baseada em Evidências da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina (Unifesp-EPM). Médico pesquisador do Centro de
Pesquisas em Revisões Sistemáticas do Centro Cochrane do Brasil. E-mail: [email protected].
Médico, mestre e doutorando em Medicina Interna e Terapêutica e Medicina Baseada em Evidências da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina (Unifesp-EPM). Coordenador adjunto e professor
titular B da Faculdade de Medicina do Centro Universitário São Camilo .E-mail: [email protected].
III
Enfermeira, mestre em Ciências da Saúde. Professora assistente I da Universidade Federal de Sergipe. E-mail: [email protected].
I
II
Diagn Tratamento. 2011;16(4):170-3.
Hernani Pinto de Lemos Júnior | André Luis Alves de Lemos | Ligia Mara Dolce de Lemos
e DHEA (29%) foi, para a dose de 7,5 mg/kg, estatisticamente
significativo. Em coelhos, T e DHT aumentaram em relação ao
controle, no entanto, só os aumentos na DHT (em 30% e 32%
aos 5 mg/kg e 10 mg/kg) foram estatisticamente significativos.
Em ratos castrados, o aumento dos níveis de T em 51% e 25%
foi observado com T e extrato de TT, respectivamente, como
estatisticamente significativo. O estudo experimental conclui
que esses aumentos dos hormônios qualificam o TT para ser
utilizado em DE.4
Com a finalidade de verificar atividade antifúngica de oito
alcaloides extraídos do TT, 40 ratas foram infectadas com Candida albicans na vagina. Todos os animais foram avaliados micologicamente três dias após a infecção e o número de infectados
diminuiu de forma significativa após o TT ser administrado na
dose de 30 mg/kg e 60 mg/kg, com uma diferença estatisticamente significante entre o controle e os grupos de tratamento.5
Para comprovar o efeito anti-hipertensivo do extrato aquoso
da fruta do TT, foi realizada pesquisa em 32 ratos, nos quais foi
feito o grampeamento da artéria renal para induzir hipertensão
arterial. Somente oito desses animais com hipertensão arterial
induzida foram submetidos ao uso diário de TT por quatro
semanas. A pressão arterial sistólica dos ratos hipertensos alimentados com TT foi significantemente menor que a dos ratos
hipertensos sem TT. A atividade da enzima conversora de angiotensina (ECA) na aorta, coração, rins e pulmões e soro estava
significantemente aumentada quando comparada aos ratos não
hipertensos. Quando se comparou a atividade da ECA somente
entre os ratos hipertensos, constatou-se uma atividade maior
da ECA nos tecidos e soro daqueles que não haviam tomado o
TT. A conclusão do estudo é que o efeito anti-hipertensivo do
extrato aquoso da fruta do TT se faz por inibição da ECA no
soro e em vários tecidos.6
Outro estudo visando determinar o efeito anti-hipertensivo
do TT foi realizado no Kuwait, também em ratos, porém espontaneamente hipertensos. O interessante nesse estudo foi a
constatação de que o efeito de redução da pressão arterial dos
extratos não foi atenuado pelo bloqueio dos gânglios autônomos ou por bloqueio beta-adrenérgico ou de receptores da histamina H1. Este fato descarta a ação do TT nestas vias e põe em
relevo a conclusão do estudo anterior (diminuição da atividade
da ECA), assim como a hipótese de relaxamento muscular por
liberação de óxido nítrico e hiperpolarização de membrana.7
Para verificar a ação diurética do TT, um estudo foi realizado
em 30 ratos alocados para cinco grupos de seis animais e tratados por via oral com um dos seguintes materiais: 1. controle:
solução salina; 2. furosemida, 120 mg/kg, como um diurético
padrão; 3. TT, 5 g/kg; 4. extrato de Z. mays (cabelo de milho),
5 g/kg; 5. a combinação de TT e Z. mays, 5 g/kg de cada um.
O extrato aquoso das folhas e frutos de TT resultou em diurese marcante durante as 24 horas do teste. O volume de urina
aumentou em 189% a mais que o controle, um pouco mais
do que a produzida pela furosemida (179%). As concentrações
Diagn Tratamento. 2011;16(4):170-3.
de sódio, potássio e cloreto na urina também aumentaram. O
extrato de Z. mays não mostrou significativa diurese quando
administrado isoladamente (22% de aumento) e não conseguiu
potencializar a atividade diurética do TT.8
Um estudo avaliou os níveis de dihidroepiandrosterona
(DHEA) de 30 pacientes não diabéticos do sexo masculino
diagnosticados com disfunção erétil (DE), 30 pacientes não diabéticos sem disfunção erétil e 15 pacientes diabéticos sem disfunção erétil. O grupo dos não diabéticos com disfunção erétil,
assim como o grupo de diabéticos com disfunção erétil, foram
tratados com TT três vezes ao dia durante três semanas. Houve
uma diferença significante (P < 0,01) nos níveis plasmáticos
de DHEA nos homens não diabéticos (101,5 ± 14,3) quando comparado aos pacientes diabéticos sem DE (77,5 ± 28,7);
também houve uma diferença significante (P < 0,01) nos níveis
de DHEA de homens não diabéticos sem DE com os de DE
(41,8 ± 22,6). Além disso, houve uma diferença significante
nos níveis de DHEA dos pacientes diabéticos sem DE quando
comparado com os com DE (32,2 ± 22,6). Houve um aumento significante na frequência de relações sexuais em 60% dos
pacientes diabéticos e não diabéticos com DE, a partir do décimo dia de tratamento.9
Um estudo na Bulgária investigou a influência do extrato de
TT sobre o metabolismo andrógeno em homens jovens de 20
a 36 anos. Eles foram separados aleatoriamente em três grupos:
dois experimentais (sete cada) e um controle (placebo, n = 7).
Os grupos experimentais foram nomeados TT1 e TT2 e os sujeitos foram atribuídos a consumir 20 mg/kg e 10mg/kg de
peso corporal por dia de extrato de TT, respectivamente, em
três doses diárias durante quatro semanas. A testosterona, o rostenedione e os níveis de hormônio luteinizante no soro foram
medidos 24 horas antes da suplementação e às 24 horas, 72
horas, 240 horas, 408 horas e 576 horas, desde o início da suplementação. Não houve diferença significativa entre os grupos
suplementados com TT e controles nos níveis de testosterona
(TT1 = 15,75 ± 1,75 nmol/l; TT2 = 16,32 ± 1,57nmol/l; controles = 17,74 ± 1,09 nmol/l, P > 0,05), nos níveis de rostenedione (TT1 = 1,927 ± 0,126 ng/ml; TT2 = 2,026 ± 0,256 ng/ml;
controles = 1,952 ± 0,236 ng/ml, P > 0,05) ou nos níveis do
hormônio luteinizante (TT1 = 4,662 ± 0,274 U/l; TT2 = 4,103
± 0,869 U/l; controles = 4,170 ± 0,406 U/l, P > 0,05). Todos
os resultados foram dentro da normalidade. Os achados desse
estudo mostram que os esteroides do TT não possuem propriedades nem direta nem indireta de aumentar os andrógenos.10
O dito efeito hormonal do TT é controverso: alguns fabricantes referem que o uso da droga não levará a um teste
hormonal positivo em atletas, outros dizem que seu uso pode
aumentar a taxa de testosterona/epitestosterona urinária (T/E),
relação que pode colocar os atletas a risco de um teste hormonal
positivo. Na Austrália, foi feito estudo em 22 jogadores de rúgbi em treinamento de pré-temporada. O objetivo do estudo foi
determinar o efeito de TT em força, massa livre de gordura e a
171
172
Tribulus terrestris
relação T/E urinário durante cinco semanas. Os jogadores foram divididos aleatoriamente num estudo duplo-cego em dois
grupos de 11 e foram submetidos a cápsulas de TT (450 mg/dia)
ou placebo. A força muscular, composição corporal e a relação
T/E urinário foram monitorados antes e após a suplementação.
Após cinco semanas de treinamento, força e massa magra aumentaram significativamente sem diferenças entre os grupos.
Também não houve diferenças entre os grupos na relação T/E
urinário. Este estudo concluiu que a suplementação de TT não
contribui para o aumento da massa muscular e não tem efeito
androgênico.11
Na China, 406 pacientes com doença cardíaca coronária foram tratados com TT tendo como controle 67 pacientes. Os
resultados mostraram que a taxa total de remissão da angina
pectoris foi de 82,3%, bem maior que no grupo controle, que
foi de 67,2% (P < 0,05). A melhora eletrocardiográfica foi de
52,7% no grupo experimental e de 35,8% no grupo controle.
Não foram relatados efeitos colaterais e não houve alteração nas
funções hepáticas e renal.12
DISCUSSÃO
Sentir e supor não são ciência, porém levantam questões que
motivam pesquisadores a elaborar estudos que possam avaliar
a eficácia de determinada intervenção quando usada para uma
situação clínica específica. Para dirimir todas as dúvidas, esses
estudos devem ter boa qualidade metodológica, um número
adequado de participantes, ou seja, devem ser ensaios clínicos
randomizados e duplo-cegos capazes de fornecer evidências do
mais elevado nível.
CONCLUSÕES
A maioria dos estudos foi realizada na Ásia e não forneceu
dados suficientes para permitir avaliar sua qualidade metodológica. A maioria dos estudos foi feita com animais. Todos os estudos feitos com humanos têm um pequeno número de participantes. É muito discrepante a diferença entre o estudo animal,
que mostra que a suplementação de TT aumenta os níveis de
hormônios circulantes, e o estudo em humanos, que referenda
o uso de TT em atletas profissionais sem risco de serem penalizados em um exame antidoping. Enfim, ao ler esses artigos, e
muitos outros, é possível supor uma ação benéfica do TT na
libido e na DE por meios não hormonais. Considerando a ação
anti-hipertensiva demonstrada em animais, esses benefícios poderiam existir devido a uma ação vasodilatadora por meio de
liberação de óxido nítrico e pela diminuição da atividade da
enzima conversora da angiotensina (ECA).
REFERÊNCIAS
1. Li M, Qu W, Wang Y, Wan H, Tian C. [Hypoglycemic effect of saponin from
Tribulus terrestris]. Zhong Yao Cai. 2002;25(6):420-2.
2. Bourke CA, Stevens GR, Carrigan MJ. Locomotor effects in sheep of alkaloids
identified in Australian Tribulus terrestris. Aust Vet J. 1992;69(7):163-5.
3. Adaikan PG, Gauthaman K, Prasad RN, Ng SC. Proerectile pharmacological
effects of Tribulus terrestris extract on the rabbit corpus cavernosum. Ann
Acad Med Singapore. 2000;29(1):22-6.
4. Gauthaman K, Ganesan AP. The hormonal effects of Tribulus terrestris and
its role in the management of male erectile dysfunction--an evaluation
using primates, rabbit and rat. Phytomedicine. 2008;15(1-2):44-54.
5. Zhang JD, Xu Z, Cao YB, et al. Antifungal activities and action mechanisms of
compounds from Tribulus terrestris L. J Ethnopharmacol. 2006;103(1):76-84.
6. Sharifi AM, Darabi R, Akbarloo N. Study of antihypertensive mechanism of
Tribulus terrestris in 2K1C hypertensive rats: role of tissue ACE activity. Life
Sci. 2003;73(23):2963-71.
7. Phillips OA, Mathew KT, Oriowo MA. Antihypertensive and vasodilator
effects of methanolic and aqueous extracts of Tribulus terrestris in rats. J
Ethnopharmacol. 2006;104(3):351-5.
8. Al-Ali M, Wahbi S, Twaij H, Al-Badr A. Tribulus terrestris: preliminary study
of its diuretic and contractile effects and comparison with Zea mays. J
Ethnopharmacol. 2003;85(2-3):257-60.
9. Adimoelja A, Adaikan PG. Protodioscin from herbal plant Tribulus terrestris
L improves the male sexual functions, probably via DHEA. International
Journal of Impotence Research. 1997;9(Suppl 1):S64. Available from: http://
www.libilov.com/en/clinical_studies/study_Adimoelja_Adaikan_1997.htm.
Accessed in 2011 (Ago 31).
10.Neychev VK, Mitev VI. The aphrodisiac herb Tribulus terrestris does not
influence the androgen production in young men. J Ethnopharmacol.
2005;101(1-3):319-23.
11. Rogerson S, Riches CJ, Jennings C, et al. The effect of five weeks of Tribulus
terrestris supplementation on muscle strength and body compostition
during preseason training in elite rugby league players. J Strength Cond Res.
2007;21(2):348-53.
12.Wang B, Ma L, Liu T. [406 cases of angina pectoris in coronary heart disease
treated with saponin of Tribulus terrestris]. Zhong Xi Yi Jie He Za Zhi.
1990;10(2):85-7, 68.
INFORMAÇÕES
Endereço para correspondência:
Hernani Pinto de Lemos Júnior
Centro Cochrane do Brasil
Rua Pedro de Toledo, 598
Vila Clementino – São Paulo (SP)
CEP 04039-001
Tel./Fax. (11) 5575-2970/5579-0469
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Fonte de fomento: nenhuma declarada
Conflito de interesse: nenhum declarado
Data de entrada: 12 de agosto de 2011
Data da última modificação: 23 de agosto de 2011
Data de aceitação: 14 de setembro de 2011
Diagn Tratamento. 2011;16(4):170-3.
Hernani Pinto de Lemos Júnior | André Luis Alves de Lemos | Ligia Mara Dolce de Lemos
PALAVRAS-CHAVE:
Tribulus terrestris.
Disfunção erétil.
Pressão arterial.
17-hidroxiesteróide desidrogenases.
Doping nos esportes.
RESUMO
Introdução: O Tribulus terrestris é uma planta utilizada há séculos e com propriedades medicinais variadas e amplamente
conhecidas.
Objetivo: Verificar evidências do uso do Tribulus terrestris na saúde.
Métodos: Busca sistematizada da literatura por meio de busca eletrônica nas bases Medline, Lilacs e Biblioteca
Cochrane, incluindo estudos com boa qualidade metodológica que avaliem os efeitos do Tribulus terrestris em
qualquer situação clínica.
Resultados: Oito estudos em animais mostraram ações diversas do Tribulus terrestris, sobressaindo dois estudos que
mostram ação anti-hipertensiva. Entre os estudos em humanos, destacam-se aqueles que demonstraram a ausência de
efeito do Tribulus terrestris na produção dos hormônios masculinos.
Conclusão: Estudos em animais mostraram possíveis efeitos do Tribulus terrestris como anti-hipertensivo, antianginoso
e na disfunção erétil. No entanto, não há evidências suficientes de sua eficácia e segurança no tratamento ou na
prevenção de doenças, incluindo hipertensão arterial sistêmica, angina e disfunção erétil. Ensaios clínicos randomizados
com boa qualidade metodológica ainda são necessários para avaliar os efeitos do Tribulus terrestris e sustentar seu uso
na prática clinica.
Diagn Tratamento. 2011;16(4):170-3.
173
POEMs: Patients-oriented evidence that matters
Recidiva de tromboembolismo
é mais comum em homens
Autores da tradução:
Pablo Gonzáles BlascoI, Marcelo Rozenfeld LevitesII, Cauê MônacoIII
Sociedade Brasileira de Medicina de Família
QUESTÃO CLÍNICA
Os homens estão sob maior risco de terem um tromboembolismo venoso profundo recorrente do que as mulheres?
RESUMO
Em um período de três anos após um tromboembolismo
venoso profundo (trombose venosa profunda ou tromboembolismo pulmonar) sem causa definida, quase um de cada cinco homens (19,7%) desenvolveu um segundo episódio. Essa
taxa é duas vezes maior do que a recidiva em mulheres (9,1%).
Apesar de atualmente ser recomendado manter anticoagulação por três meses após o primeiro episódio,1-3 a opção de
uma anticoagulação mais prolongada poderia ser considerada
para os homens.
DESENHO DO ESTUDO
Revisão sistemática com metanálise de dados individuais
incluindo ensaios clínicos aleatórios e estudos de coorte prospectivos.
Nível de evidência: 1a.4
CASUÍSTICA
Pacientes adultos, em acompanhamento ambulatorial após
primeiro episódio de tromboembolismo venoso profundo e
que já não estavam mais em uso de anticoagulantes.
DISCUSSÃO
Essa revisão5 inclui sete estudos (n = 2.554) através da busca
em diversas bases de dados — incluindo o registro Cochrane de
ensaios controlados (CENTRAL) — que recrutaram pacientes
em um primeiro episódio de tromboembolismo venoso profundo sintomático, não associado a câncer, imobilidade ou coagulopatias e que foram tratados com heparina e depois receberam
anticoagulação oral por pelo menos três meses. Todos os estudos foram considerados como tendo boa qualidade metodoló-
gica. Os dados originais de cada estudo incluído foram obtidos
e utilizados na metanálise (metanálise de dados individuais).
Os pacientes foram seguidos por 27 meses, em média, após o
tratamento. A incidência de um novo episódio de tromboembolismo venoso profundo dentro de um ano foi de 9,5% nos
homens e 5,3% nas mulheres (P < 0,05). Em três anos, quase
um de cada cinco homens teve uma recidiva em comparação
com uma em cada dez mulheres (19,7% versus 9,1%, risco relativo [RR]: 2,16, intervalo de confiança [IC95%]: 1,46–3,20).
A probabilidade de um tromboembolismo subsequente associado a fatores de risco como cirurgia ou imobilidade foi similar
entre homens e mulheres.
COMENTÁRIO
Essa revisão sistemática com metanálise de dados individuais
incluiu dois ensaios clínicos aleatórios e sete estudos de coorte
prospectivos considerados de alta qualidade (pontuações mínimas de seis em sete possíveis) segundo a escala de NewcastleOttawa modificada. Os autores controlaram, por regressão de
Cox, a idade dos pacientes e o fato de o tromboembolismo ter
sido ou não provocado por causa identificada e ter sido proximal ou distal.
REFERÊNCIA
1. Kearon C, Kahn SR, Agnelli G, et al. Antithrombotic therapy for venous
thromboembolic disease: American College of Chest Physicians EvidenceBased Clinical Practice Guidelines (8th Edition). Chest. 2008;133(6
Suppl):454S-545S.
2.Institute for Clinical Systems Improvement (ICSI). Antithrombotic
therapy supplement. Bloomington (MN): Institute for Clinical Systems
Improvement (ICSI); 2010. Disponível em: http://www.guideline.gov/content.
aspx?id=16003. Acessado em 2011 (18 ago).
3.Scottish Intercollegiate Guidelines Network (SIGN). Prevention and
management of venous thromboembolism. A national clinical guideline.
Edinburgh (Scotland): Scottish Intercollegiate Guidelines Network (SIGN);
2010. Disponível em: http://www.guideline.gov/content.aspx?id=25639.
acessado em 2011 (18 ago).
Médico de família, doutor em Medicina, diretor científico e membro-fundador da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).
Médico de família e diretor da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).
Médico de família, professor de Medicina de Família do Centro Universitário São Camilo, membro ativo da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).
I
II
III
Diagn Tratamento. 2011;16(4):174-5.
Pablo Gonzáles Blasco | Marcelo Rozenfeld Levites | Cauê Mônaco
4. Centre for Evidence Based Medicine. Oxford Centre for Evidence-based
Medicine - Levels of Evidence (March 2009). Disponível em: http://www.
cebm.net/index.aspx?o=1025. Acessado em 2011 (15 ago).
5. Douketis J, Tosetto A, Marcucci M, et al. Risk of recurrence after venous
thromboembolism in men and women: patient level meta-analysis. BMJ.
2011;342:d813.
EDITORES RESPONSÁVEIS POR ESTA SEÇÃO
Pablo Gonzáles Blasco. Médico de família, doutor em Medicina, diretor
científico e membro-fundador da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).
Marcelo Rozenfeld Levites. Médico de família e diretor da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).
Cauê Mônaco. Médico de família, membro ativo da Sociedade Brasileira de
Medicina de Família (Sobramfa).
Diagn Tratamento. 2011;16(4):174-5.
INFORMAÇÕES
Tradução e adaptação:
Sobramfa (Sociedade Brasileira de Medicina de Família)
Rua Silvia, 56
Bela Vista — São Paulo (SP)
CEP 01331-000
Tel. (11) 3253-7251/3285-3126
E-mail: [email protected]
http://www.sobramfa.com.br
Data de entrada: 12 de agosto 2011
Data da última modificação: 12 de agosto de 2011
Data de aceitação: 26 e agosto de 2011
Responsável pela edição desta seção: Sobramfa
175
POEMs: Patients-oriented evidence that matters
Insights sobre o prognóstico da síndrome
da angústia respiratória do adulto
Autores da tradução:
Pablo Gonzáles BlascoI, Marcelo Rozenfeld LevitesII, Cauê MônacoIII
Sociedade Brasileira de Medicina de Família
QUESTÃO CLÍNICA
Qual o prognóstico dos pacientes que sobrevivem à síndrome da angústia respiratória do adulto?
RESUMO
Apesar de a maioria dos pacientes que têm síndrome da angústia respiratória do adulto (SARA, também chamada de síndrome da angústia respiratória aguda) se recuperar de maneira
significativa após três a cinco anos, a mortalidade é alta no primeiro ano e algumas sequelas persistem no longo prazo.
DESENHO DO ESTUDO
Estudo de coorte prospectivo.
Nível de evidência: 1a.1
CASUÍSTICA
Pacientes internados com acompanhamento ambulatorial
posterior.
DISCUSSÃO
Os autores desse estudo2 identificaram 109 pacientes que sobreviveram a um episódio de síndrome da angústia respiratória
do adulto em um hospital de Toronto entre 1998 e 2001. Os
pacientes foram avaliados em intervalos regulares por até cinco
anos. A idade mediana dos pacientes foi 44 anos à data da alta.
Após um ano, 12 pacientes tinham ido a óbito (11%) e, após
quatro anos, outros nove faleceram. À época da internação,
83% trabalhavam em tempo integral e, cinco anos depois, 83%
dos sobreviventes também trabalhavam em tempo integral. A
média de distância de marcha em seis minutos foi menor do
que o predito para controles pareados por sexo e idade (436 m
versus 574 m) e os pacientes com síndrome da angústia respiratória aguda (SARA) tiveram uma pontuação menor em qualidade de vida (41 versus 50 pontos aferidos pelo questionário
Short-Form-36 Medical Outcomes Study). Os resultados dos
testes de função pulmonar acabaram retornando ao normal ou
próximo do normal, mas isso demorou de três a cinco anos.
REFERÊNCIA
1. Centre for Evidence Based Medicine. Oxford Centre for Evidence-based
Medicine - Levels of Evidence (March 2009). Disponível em: http://www.
cebm.net/index.aspx?o=1025. Acessado em 2011 (18 ago).
2. Herridge MS, Tansey CM, Matté A, et al. Functional disability 5 years after
acute respiratory distress syndrome. N Engl J Med. 2011;364(14):1293-304.
EDITORES RESPONSÁVEIS POR ESTA SEÇÃO
Pablo Gonzáles Blasco. Médico de família, doutor em Medicina, diretor
científico e membro-fundador da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).
Marcelo Rozenfeld Levites. Médico de família e diretor da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).
Cauê Mônaco. Médico de família, membro ativo da Sociedade Brasileira de
Medicina de Família (Sobramfa).
INFORMAÇÕES
Tradução e adaptação:
Sobramfa (Sociedade Brasileira de Medicina de Família)
Rua Silvia, 56
Bela Vista — São Paulo (SP)
CEP 01331-000
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Data de entrada: 12 de agosto de 2011
Data da última modificação: 12 de agosto de 2011
Data de aceitação: 25 de agosto de 2011
Responsável pela edição desta seção: Sobramfa
Médico de família, doutor em Medicina, diretor científico e membro-fundador da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).
Médico de família e diretor da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).
Médico de família, professor de Medicina de Família do Centro Universitário São Camilo, membro ativo da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).
I
II
III
Diagn Tratamento. 2011;16(4):176.
Linguagens
Recente
Alfredo José MansurI
Unidade Clínica de Ambulatório do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas
da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
O adjetivo recente significa, segundo o dicionário, aquilo
que aconteceu recentemente, fresco, com pouco tempo de existência; sinonímia: novo; antonímia: gasto. Ensina a etimologia
que o termo vem do latim recens, -entis “ocorrido há pouco”.
Cita-se uma fórmula histórica rezente no século XIII. Não resistindo ao trocadilho, o adjetivo recente não é recente.1 No
dicionário de latim, em sentido próprio recens, -entis, significa
fresco, acabado de chegar, recente, novo.2
O termo recente é parte das qualificações empregadas na linguagem cotidiana, usado tanto por pacientes quanto por médicos e profissionais de saúde, para situar no tempo experiências
pessoais e apreciações sobre as múltiplas dimensões da prática
médica. O emprego do termo permite exercícios de interpretação a partir de usos na prática clínica.
Definição – Participando regularmente de seminários para
discussão de artigos da literatura médica com colegas mais jovens, vez por outra surge referência de que o artigo publicado
em um importante periódico de alto fator de impacto não seja
atual ou recente por ter poucos anos decorridos da sua publicação. De fato, como a transmissão de informação atual é rápida
e periódicos científicos disponibilizam a publicação virtual antes da publicação impressa (ahead of print), é compreensível a
influência dessa velocidade na percepção do que seja o novo e
que surjam indagações sobre o que é, de fato, recente. Muitas
publicações alcançam divulgação rápida na imprensa leiga antes
que haja tempo suficiente para apreciação técnica.
A transmissão veloz de informação pode influir na percepção do tempo e permitir interessantes cotejos entre as mútuas
influências, semelhanças e as diferenças entre a velocidade da
transmissão da informação, que pode ser automática e computacional, e a velocidade da geração do conhecimento, sua
inserção na prática e resultados no longo prazo. O processo de
geração de conhecimento tem menor velocidade do que a sua
transmissão, e depende do reiterado encadeamento no tempo
da complexa sequência: formulação de hipóteses, realização de
estudos experimentais ou clínicos, interpretação dos resultados
e avaliação dos resultados da aplicação prática.
Qualidade – o que é mais recente é frequentemente considerado “melhor” e superior ao que é menos recente. Talvez a
nossa cultura de modo geral tenha mesmo maior apreço pelas
coisas recentes.
Há, entretanto, limitações inerentes ao que é recente: falta tempo de observação no longo prazo para confirmação ou
eventual negação de novos conceitos. Para medicamentos,
intervenções médico-cirúrgicas, novos equipamentos e novas
tecnologias recentes, não houve tempo para avaliação de eficácia, de relação custo-benefício ou de efeitos colaterais. Pode-se
acrescentar o aspecto farmacoeconômico – em geral equipamentos ou medicamentos mais recentes tendem a ser de custo
mais alto.
Há intervenções diagnósticas ou terapêuticas – recentes e
atuais quando lançadas – e que, no decorrer do tempo, não
confirmaram as hipóteses iniciais de melhor resultado no tratamento de pacientes ou necessitaram de revisão de efeitos colaterais. Há exemplos dessa ocorrência na aplicação de tecnologia
diagnóstica,3-6 em intervenções cirúrgicas (intervenções placebo7) e no uso de medicamentos8,9 – alguns deles bem recentes.
Pode-se dizer que tais ocorrências sejam uma etapa da busca de
conhecimento.
Clássico – por vezes usa-se o adjetivo clássico como antinomia de recente, como algo antigo e que não faz mais parte
da realidade cotidiana atual. Talvez fosse interessante exercitar
sobre o conceito de que clássico pode ser aquilo que permanece
sempre recente, atual e eficiente; daí a ser considerado clássico.
Representa uma grande aquisição da cultura. É claro que o clássico não pode abarcar toda a realidade contemporânea; nesse
caso seria exigir do conhecimento clássico mais do que seria da
sua alçada constitutiva no conhecimento médico-científico.
Contexto – o termo recente pode ter acepções de caráter afetivo tanto para pacientes como para médicos. Às vezes pacientes narram acontecimentos como próximos e contemporâneos
no tempo linear cronológico, mas que de fato transcorreram
décadas atrás. Modula essa acepção anamnésica de recente a
densidade emocional da vivência do que se descreve ou se reporta. E para médicos, uma interpretação recente, espirituosa
e brilhante, sugeriu o nível de evidência IV para manter como
recentes diversas experiências clínicas há muito ocorridas ou
que felizmente são raras.10
Livre-docente em Cardiologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Diretor da Unidade Clínica de Ambulatório do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo.
I
Diagn Tratamento. 2011;16(4):177-9.
178
Recente
Mudanças – mudanças no amplo domínio da prática clínica
podem fazer com que, após a mudança, tudo seja considerado
recente e novo. Métodos de investigação ou diagnóstico, quando
se modificam, tornam muitas experiências de fato novas, ainda
que se dediquem a examinar questões conhecidas. Mudanças no
perfil epidemiológico da população criam necessidades novas
que podem ser características daquela população. Mudanças no
perfil clínico se verificam na medida em que evoluem processos
diagnósticos e terapêuticos. Também se modificam prevenção,
expressão clínica, diagnóstico, tratamento e prognóstico de doenças. É necessário reconhecer essas ocorrências e a demanda da
prática médica e científica recentes que representam.
Novidade – o termo recente pode ser aplicado, entre outras
circunstâncias, para uma realidade nova até então desconhecida, como uma doença não conhecida previamente ou para
releitura de algo supostamente conhecido.
Pacientes consideram recentes sintomas experimentados pela
primeira vez. Médicos, para se reportarem à experiência pessoal
vivida ou narrada pela primeira vez: quem já não ouviu a expressão “nunca vi isso” ou, em ambientes mais acadêmicos, “em
nossa experiência não vimos” ou “na literatura não há relatos a
respeito”. Ou ainda o imodesto “demonstramos pela primeira
vez” de algumas conferências ou manuscritos científicos.
Substituição ou soma – dados, informações, conhecimentos ou competências recentes nascem continuamente na prática
médica. Uma pergunta implícita em nossa relação com o conhecimento é se os conhecimentos ditos recentes substituem ou
se somam aos previamente existentes. Muito frequentemente se
somam ao cabedal anteriormente disponível, de tal modo que
o processo leva ao desenvolvimento da cultura médica de um
modo geral.
Métodos – o adjetivo recente pode ser também aplicado aos
métodos. Todos nós buscamos novos métodos de cuidado de
pacientes, diagnóstico e tratamento, particularmente quando
os novos métodos são mais ergonômicos, de custo mais acessível, mais eficientes para estudo e pesquisa ou para a terapêutica.
As pesquisas são muito ativas. Como exemplo interessante e
atual, podemos citar o sequenciamento gênico com ferramentas
de nanotecnologia.11
Tratamentos – o caráter recente pode influir na apreciação
de diferentes tratamentos em virtude de não haver tempo suficiente de observação no longo prazo:
Medicamentoso – apesar de todos os cuidados por ocasião do
lançamento dos medicamentos, eventuais ajustes de indicações,
administração, dose8 ou até de efeitos colaterais9 podem se tornar necessários, às vezes com suspensão do medicamento.12,13
Aspectos de mercado também podem influir.14 Medicamentos
recentes são mais facilmente incorporados, particularmente em
situações para as quais não há tratamento ou para as quais os
tratamentos disponíveis são pouco eficazes. Por outro lado, em
situações nas quais há tratamentos eficazes, a introdução do
novo tratamento depende de outras vantagens, como menor
custo, melhor perfil farmacológico ou conforto posológico, ainda que possam não trazer maior eficiência terapêutica.
Cirúrgico – algumas intervenções cirúrgicas recentes que
foram consideradas salvadoras e tecnicamente sofisticadas
com o passar do tempo não se confirmaram como sempre
superiores15,16 e foram recomendadas somente às indicações
mais precisas e específicas17 e, em algumas situações, estudadas
e comparadas com tratamentos medicamentosos.
Radiação – houve estudos do uso de raios X para o tratamento da acne. Na época, era um método recente e tecnológico.18
Indisponibilidade – a informação científica recente e esclarecedora sobre algum tema de interesse para pacientes e para a
prática médica é sempre bem-vinda. Entretanto, às vezes não há
estudos recentes sobre muitas questões médicas cotidianas, por
várias razões, entre elas: a) mudança do perfil epidemiológico,
de tal modo que a condição mais prevalente naquela população
no passado tornou-se menos prevalente no presente; b) o estudo que não é recente respondeu satisfatoriamente à pergunta;
c) o método empregado foi superado e por isso abandonado,
de modo a não ser mais aplicado; d) não há informação nova
e mais recente que mude o conceito já estabelecido; e) não há
novo tratamento disponível para ser avaliado; f ) não há interesse
de pesquisadores ou financiadores de estudo governamentais ou
empresariais para estudos do assunto. Nesses casos, demandas
clínicas são atendidas com base em dados que não são recentes.
Tendo examinado as acepções acima apresentadas, finalizamos o artigo tendo em mente que as experiências de outros
colegas podem enriquecer as observações feitas.
REFERÊNCIAS
1. Houaiss A, Villar MS. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de
Janeiro: Objetiva; 2001.
2. Faria E. Dicionário escolar latino-português. 5a ed. Rio de Janeiro: MEC/
Fename; 1975.
3. Harvey SE, Welch CA, Harrison DA, Rowan KM, Singer M. Post hoc insights
from PAC-Man--the U.K. pulmonary artery catheter trial. Crit Care Med.
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4. National Heart, Lung, and Blood Institute Acute Respiratory Distress
Syndrome (ARDS) Clinical Trials Network, Wheeler AP, Bernard GR, Thompson
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acute coronary syndromes: insights from the GUSTO IIb and GUSTO III trials.
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6. Friese RS, Shafi S, Gentilello LM. Pulmonary artery catheter use is associated
with reduced mortality in severely injured patients: a National Trauma Data
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simvastatin. Disponível em: http://www.fda.gov/downloads/ForConsumers/
ConsumerUpdates/UCM257911. Acessado em 2011 (10 ago).
9. Singh S, Loke YK, Spangler JG, Furberg CD. Risk of serious adverse
cardiovascular events associated with varenicline: a systematic review and
meta-analysis. CMAJ. 2011 [Epub ahead of print].
10. Stuebe AM. Level IV evidence--adverse anecdote and clinical practice. N Engl
J Med. 2011;365(1):8-9.
Diagn Tratamento. 2011;16(4):177-9.
Alfredo José Mansur
11. Maglia G, Heron AJ, Stoddart D, Japrung D, Bayley H. Analysis of single nucleic
acid molecules with protein nanopores. Methods Enzymol. 2010;475:591-623.
12.Nissen SE, Wolski K. Effect of rosiglitazone on the risk of myocardial infarction
and death from cardiovascular causes. N Engl J Med. 2007;356(24):2457-71.
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risk for myocardial infarction and cardiovascular mortality. Arch Intern Med.
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with left ventricular dysfunction. N Engl J Med. 2011;364(17):1607-16.
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18.Fox H. The roentgen ray versus vaccines in the treatment of acne. JAMA.
1923;81(17):1417-23.
Diagn Tratamento. 2011;16(4):177-9.
INFORMAÇÕES
Endereço para correspondência:
Unidade Clínica de Ambulatório do Instituto do Coração do Hospital das
Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44
São Paulo (SP)
CEP 05403-000
Tel. InCor (11) 3069-5237
Consultório: (11) 3289-7020/3289-6889
E-mail: [email protected]
Fontes de fomento: nenhuma
Conflito de interesse: nenhum
Data de entrada: 6 de agosto de 2011
Data da última modificação: 6 de agosto de 2011
Data de aceitação: 23 de agosto de 2011
179
Residência e ensino médico
Quem quer ser um milionário?
Olavo Pires de CamargoI, Luiz Eugênio Garcez LemeII
Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP)
Recentemente um filme indiano de grande sucesso mostrava o drama de um rapaz, Jamal K. Malik, que, de uma vida
pobre, servindo chá em uma empresa, vê a possibilidade de se
tornar rico em um concurso, a partir de seu conhecimento não
necessariamente acadêmico, mas acaba caindo no descrédito e
na infelicidade que ele maneja através do amor a uma jovem.
A pergunta singela do título não está em nenhum momento
alheia aos alunos de medicina e a todos nós.
Diversos são os fatores que levam determinada pessoa a
escolher uma carreira e uma especialidade. O retorno financeiro é, com certeza, um deles, e não há qualquer problema
que assim o seja.
Um primeiro cuidado deve ser evitar aqueles que afirmam
que a medicina é um sacerdócio (e, de fato, é) para imaginar,
a seguir, que os médicos devem ter voto de pobreza, o que
não é verdade.
De fato é não apenas justo, mas desejável que cada um busque suporte financeiro que permita o sustento digno da família
e é certo que a retribuição financeira seja proporcional à quantidade e à qualidade do trabalho realizado e oferecido. O problema aparece quando a busca de retorno financeiro passa a ser
a única ou a mais importante variável de uma equação perversa
em que perdem o médico, o paciente e a sociedade.
No início do curso médico, quando se questionam os motivos que levaram um jovem a escolher medicina, pode-se observar um mix de motivos que talvez inclua a expectativa financeira, mas que também incorpora em muitos casos outros
motivos, como interesse na saúde e nas pessoas e no bem comum. O que se observa, em diversos alunos é que, no decorrer
do curso, esta carga de idealismo diminui progressivamente na
medida em que eles avançam para os estágios hospitalares e a
residência médica.1
Tal condição não é exclusiva de nossos dias. Marañón cita
uma referência de conhecido médico francês do início do século XX segundo o qual, naquela época em Paris, “para cada
rapaz que se matriculava no curso médico pensando na glo-
riosa, mas austera vida de Pasteur, havia 10 que só sonhavam
em ir algum dia à Faculdade em uma carruagem como a do
professor Dieulafoy*, com lacaio de libré e um par de cavalos
castanhos que faziam inveja aos grãos duques”.2 Alguém vê
alguma relação com os “carrões” de alguns de nossos mais conhecidos profissionais?
É evidente que este tipo de expectativa é prejudicial ao aluno
e ao profissional por diversos motivos. Em primeiro lugar porque esse acesso à fortuna e à facilidade financeira nem de longe
representa a realidade da vida do médico. A associação de horas seguidas de plantão, pouco contato com a família e salários
abaixo da média para profissionais com formação ou dedicação
equivalentes não é desconhecida a nenhum de nós.
É o mesmo Marañón quem nos afirma: “Na história das
grandes fortunas não há uma só que tenha sido elaborada com o
exercício médico. O esplendor econômico dos doutores de mais
fama tem muito mais de brilho do que de efetiva solidez”.2
No entanto, não só o futuro e o atual médico ficam prejudicados. Algumas especialidades cada vez mais necessárias são
comprometidas pela redução da demanda de candidatos. Todos
recordam a queda de demanda pela Pediatria há alguns anos
e a necessidade premente de profissionais dessa área em nossa
realidade. Outra área que, em países como os Estados Unidos,
ressente essa limitação é a Geriatria.
Em matéria do The New York Times, o professor Leo Cooney, da Universidade de Yale, afirma que, em um ano bom,
de 45 alunos apenas um escolhe Geriatria, o que é um grande
problema numa sociedade que envelhece rapidamente.3 O mais
curioso é que, no caso da mesma Geriatria, trata-se da atividade
médica que, nos próprios Estados Unidos, mais leva à satisfação do profissional segundo estudo de Leigh e colaboradores de
2002: um paradoxo.4
Qual o motivo desse aparente paradoxo? O próprio artigo
do jornal nos dá uma pista: os médicos mais bem pagos são
aqueles que fazem a maioria dos procedimentos; radiologistas
e cirurgiões ortopédicos no topo da lista, com média de rendi-
*Paul Georges Dieulafoy (1839-1911) foi um famoso médico e cirurgião francês com importantes contribuições à cirurgia abdominal, incluindo a descrição da apendicite aguda.
Professor titular e chefe do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).
Professor associado, Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).
I
II
Diagn Tratamento. 2011;16(4):180-1.
Olavo Pires de Camargo | Luiz Eugênio Garcez Leme
mentos anuais de US$ 400.000. Por outro lado geriatras, com
formação que inclui dois anos de residência em Clínica Médica
e, a seguir, dois a três anos de residência em Geriatria, estão
com US$ 150.000 por ano.3
Essa realidade manifesta-se também nos próprios curricula
das escolas médicas. No caso dos Estados Unidos, das 145 escolas médicas existentes, apenas nove têm um departamento
de Geriatria, poucas escolas têm cursos de geriatria durante a
graduação e os estágios em hospitais de ensino têm em média apenas seis horas de treinamento específico em pacientes
idosos. É fácil perceber que a lógica exclusivamente econômica
levará países como os Estados Unidos a situações difíceis.
Por outro lado, países como a Inglaterra, em que o sistema
de saúde tem uma dependência maior do estado, têm uma situação diferente no tocante à escolha e distribuição de atividades médicas. Naquele país existem áreas de treinamento em
atenção a idosos em todas as escolas médicas e a geriatria é a
terceira área mais escolhida pelos estudantes. Certamente contribui para isso o fato de o reembolso ao médico ser progressivo
com a idade do paciente.3
O Brasil é um caso peculiar, em que 70% da população
dependem do sistema de saúde estatal, mas o ensino médico
é estruturado, em muitas escolas, como se estivéssemos numa
realidade próxima à dos Estados Unidos. É possível que este
tipo de estruturação do ensino médico seja um dos responsáveis pela distorção na escolha da especialidade e da distribuição
geográfica dos médicos, visível na pletora de profissionais,
muitos subempregados, nos grandes centros, enquanto regiões
amplas do país ainda têm carência de profissionais. A outra responsável é, com certeza, a política de remuneração do Sistema
Diagn Tratamento. 2011;16(4):180-1.
Único de Saúde (SUS) que aparentemente é dos que acreditam
que os médicos tenham voto de pobreza.
Uma política de remuneração diferenciada por paciente e
por região e uma adequação dos curricula médicos à realidade
brasileira talvez pudesse nos colocar numa situação de melhoria
de saúde da população, ainda que nenhum de nós venha a se
tornar um milionário.
REFERÊNCIAS
1. Smith JK, Weaver DB. Capturing medical students’ idealism. Ann Fam Med.
2006;4 Suppl 1:S32-7; discussion S58-60.
2. Marañón G. La medicina y nuestro tiempo (Colección Austral no 1201). 2a
edición. Madrid: Espasa-Calpe; 1957.
3. Griffin L. Geriatrics Lags in Age of High-Tech Medicine. The New York Times
(October 18/2006) disponível em: http://www.nytimes.com/2006/10/18/
health/18aged.html. Acessado em 2011 (08 ago).
4. Leigh P, Kravitz RL, Schembri M, Samuels SJ, Mobley S. Physician Career
Satisfaction Across Specialties Arch Intern Med. 2002;162(14):1577-84.
INFORMAÇÕES
Endereço para correspondência:
Olavo Pires de Camargo
Rua Barata Ribeiro, 490 – 3o andar — conj. 33
Bela Vista — São Paulo (SP)
CEP 01308-000
Tel. (11) 3123-5620
E-mail: [email protected]
Fonte de fomento: nenhuma declarada
Conflitos de interesse: nenhum declarado
Data de entrada: 15 de agosto de 2011
Data da última modificação: 30 de agosto de 2011
Data de aceitação: 5 de setembro de 2011
181
Eletrocardiograma
Pré-síncope em atleta jovem
Antonio Américo FriedmannI, José GrindlerII,
Carlos Alberto Rodrigues de OliveiraIII, Alfredo José da FonsecaIII
Serviço de Eletrocardiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP)
Uma jovem esportista de 26 anos resolveu aprimorar seu
condicionamento físico a fim de participar de competições
de corrida. Entretanto, quando intensificava seu treinamento, apresentava forte tontura que a obrigava interromper o
exercício.
Atendida no ambulatório de Clínica Geral do Hospital
das Clínicas, ao exame físico, apresentava pressão arterial
de 120 mmHg x 80 mmHg e a presença de sopro sistólico
de intensidade leve no bordo esternal esquerdo. O eletrocardiograma (Figura 1) revelou ritmo sinusal regular, sobrecarga do átrio esquerdo e hipertrofia ventricular esquerda acentuada, com alterações secundárias da repolarização
ventricular (strain).
Na monitoração dinâmica pelo sistema Holter (Figura 2),
registrou-se taquicardia ventricular não sustentada após exercício físico, correlacionada com o sintoma tontura.
O ecocardiograma (Figura 3) mostrou dilatação do átrio esquerdo (4,6 cm) e ventrículo esquerdo com diâmetro da cavidade e
contratilidade normais, porém, aumento importante da espessura
miocárdica (espessura da parede posterior de 1,4 cm e do septo interventricular de 3,2 cm). Ao Doppler, verificou-se refluxo da valva
mitral e gradiente sistólico intraventricular de 84 mmHg.
Estabelecido o diagnóstico de cardiomiopatia hipertrófica
assimétrica com predomínio septal, a paciente foi aconselhada
a interromper suas atividades físicas e encaminhada ao ambulatório de Cardiologia.
Figura 1. Eletrocardiograma (ECG) de 12 derivações, evidenciando sobrecarga do átrio esquerdo e acentuada hipertrofia
ventricular esquerda com alterações secundárias da repolarização ventricular (strain).
Livre-Docente, Diretor do Serviço de Eletrocardiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).
Médico Supervisor do Serviço de Eletrocardiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).
Médico Assistente do Serviço de Eletrocardiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).
I
II
III
Diagn Tratamento. 2011;16(4):182-3.
Antonio Américo Friedmann | José Grindler | Carlos Alberto Rodrigues de Oliveira | Alfredo José da Fonseca
Figura 2. Traçado do Holter registrando taquicardia ventricular
não sustentada.
O diagnóstico é confirmado pelo ecocardiograma, mais adequado para determinar as alterações anatômicas e dinâmicas,
como o grau de hipertrofia das paredes do ventrículo esquerdo
e o gradiente de pressão intraventricular.
No caso apresentado, o ECG mostra sobrecarga ventricular
esquerda muito acentuada, mas não há ondas Q nem ondas R em
V1, apesar do aumento do septo comprovado pelo ecocardiograma. Como a hipertrofia septal é desproporcional e assimétrica, a
não visualização dessas ondas deve ser decorrência da orientação
espacial do vetor resultante da ativação elétrica septal, mais paralelo em vez de oposto ao SAQRS. O aumento do átrio esquerdo
é consequência do refluxo causado pelo movimento anterior sistólico da valva mitral, também característico da doença.3
Portadores de miocardiopatia hipertrófica podem cursar assintomáticos e exibir ECG normal, sendo o diagnóstico suspeitado pela ocorrência da doença em parentes próximos. O
aumento da voltagem pode também ser confundido com a hipertrofia fisiológica decorrente do exercício (coração de atleta).
Todavia, quando a hipertrofia causa obstrução significativa da
via de saída do ventrículo esquerdo, como na paciente estudada, o ECG é uma ferramenta útil para a triagem diagnóstica.4
CONCLUSÃO
Este caso mostra a importância do eletrocardiograma no
diagnóstico de cardiomiopatia hipertrófica, causa mais comum
de morte súbita em atletas jovens.
REFERÊNCIAS
Figura 3. Ecocardiograma exibindo acentuada hipertrofia do
septo interventricular e dilatação do átrio esquerdo.
DISCUSSÃO
A cardiomiopatia hipertrófica é uma doença genética que
compromete o sarcômero levando ao desarranjo estrutural das
miofibrilas que produzem tensões desiguais na parede ventricular causando hipertrofia miocárdica e fibrose. A hipertrofia,
predominando na região do septo interventricular, determina
estenose da via de saída do ventrículo esquerdo com repercussão
hemodinâmica. Os pacientes são propensos a arritmias atriais e
ventriculares, mas a complicação mais temida é a ocorrência de
taquiarritmias ventriculares causadoras de síncope e de morte
súbita, desencadeadas por esforço físico.1
A doença pode ser diagnosticada pelo eletrocardiograma
(ECG) quando se encontram sinais de hipertrofia ventricular
esquerda inapropriada, isto é, na ausência de uma causa evidente de sobrecarga como, por exemplo, hipertensão arterial sistêmica ou estenose da valva aórtica. Os achados mais característicos são as ondas Q em derivações anterolaterais ou inferiores e
as ondas R em V1, indicativas de hipertrofia da parede septal.2
Diagn Tratamento. 2011;16(4):182-3.
1. Wigle ED, Rakowski H, Kimball BP, Williams WG. Hypertrophic cardiomyopathy.
Clinical spectrum and treatment. Circulation. 1995;92(7):1680-92.
2. Friedmann AA. O ECG em doenças não cardíacas. In: Pastore CA, Grupi CJ,
Moffa PJ, editores. Eletrocardiologia atual. 2a ed. São Paulo: Atheneu; 2008.
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3. Nishimura RA, Holmes DR Jr. Clinical practice. Hypertrophic obstructive
cardiomyopathy. N Engl J Med. 2004;350(13):1320-7.
4.Friedmann AA. ECG no Hospital Geral. In: Friedmann AA, editor.
Eletrocardiograma em 7 aulas: temas avançados e outros métodos. São
Paulo: Editora Manole; 2010. p. 95-118.
INFORMAÇÕES
Endereço para correspondência:
Hospital das Clínicas da FMUSP
Prédio dos Ambulatórios
Serviço de Eletrocardiologia
Avenida Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 155
São Paulo (SP)
CEP 05403-000
Tel. (11) 2661-7146
Fax. (11) 2661-8239
E-mail: [email protected]
Fontes de fomento: nenhuma declarada
Conflito de interesse: nenhum declarado
Data de entrada: 15 de agosto de 2011
Data da última modificação: 15 de agosto de 2011
Data de aceitação: 29 de agosto de 2011
183
Medicina sexual
Psicoterapia para a saúde sexual:
resultados com um grupo de mulheres
na transição menopáusica
Heloisa Junqueira FleuryI, Carmita Helena Najjar AbdoII
Programa de Estudos em Sexualidade (ProSex) do Instituto de Psiquiatria do
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
INTRODUÇÃO
Estudos epidemiológicos apontam alta prevalência de dificuldades sexuais, sendo a idade uma variável importante.1,2
Alterações na resposta sexual acentuam-se no climatério,
para a maioria das mulheres,3 enquanto a história sexual prévia
define a percepção delas sobre esse aspecto, ao longo do processo de envelhecimento.4 Aquelas que valorizaram a atividade
sexual, quando mais jovens, tendem a manter padrão satisfatório, apesar da idade.5
As principais influências sobre o comportamento sexual de
mulheres na transição menopáusica são os sentimentos e conflitos com o parceiro, o bem-estar subjetivo, assim como a intensidade dos sintomas menopausais. Falta de lubrificação vaginal
e dispareunia são influenciadas pelo estado menopausal, mas há
outras condições a se considerar.5
O modelo de resposta sexual formulado por Masters e
Johnson6 e modificado por Kaplan7 serviu de base à conceituação do ciclo de resposta sexual proposto pelo Manual
Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 4a edição,
texto revisado (Diagnostic and Statistical Manual, Fourth
Edition, Text Revision, DSM-IV-TR),8 o qual considera
quatro fases, a saber: desejo, excitação, orgasmo e resolução.
Basson,9 no início da década de 2000, acrescentou ao modelo tradicional as particularidades femininas da experiência
sexual. Nesse novo modelo, o desejo por intimidade, em vez
de um impulso biológico, desencadearia a resposta sexual.
Além disso, o resultado emocional e físico do relacionamento desempenharia importante papel na disponibilidade da
mulher para uma próxima experiência sexual. A pesquisadora sistematizou um modelo circular, que valoriza não só a
responsividade física (fundamentada nas alterações vasculares e neuroendócrinas), mas a receptividade (fundamentada
nos aspectos relacionais e psicossociais).
Esse modelo, confirmado no II Encontro Internacional
para Consensos10 relativos às disfunções sexuais, compõe-se
de cinco fases e considera que a atividade sexual pode iniciarse com motivação não necessariamente sexual, podendo não
haver consciência do desejo sexual. A receptividade ao estímulo sexual, em contexto adequado, favorece a identificação de
uma excitação sexual potencial (excitação subjetiva e resposta
física), desencadeando a responsividade biológica. A vivência
da excitação subjetiva pode também deflagrar a consciência
do desejo sexual, aumentando a intensidade da excitação e do
desejo responsivo, e atingindo ou não o alívio orgásmico. A
experiência de satisfação física e emocional favorece a receptividade para iniciar a atividade sexual numa próxima vez, o
que fecha, portanto, um modelo circular. Havendo insatisfação, a motivação futura diminui.10
O desejo inato ou espontâneo pode algumas vezes estar presente desde o início, desencadeando o ciclo da resposta sexual
e substituindo as duas primeiras fases. Nesse caso, o ciclo se
caracteriza pela combinação com o modelo tradicional.10
Em vista do acima exposto, conclui-se que: a ausência do
desejo espontâneo não define necessariamente a presença de
disfunção sexual na mulher; a expressão sexual feminina envolve múltiplas dimensões e exige condições físicas satisfatórias
e parceiro disponível, também saudável. Além disso, implica
na articulação de condições psicossocioculturais e identidade
sexual desenvolvida para uma experiência relacional favorável
ao desencadeamento da atividade sexual.10 Essa complexidade
de fatores amplia o conceito de resposta sexual para o de saúde
e satisfação sexual, contemplando a subjetividade feminina em
inter-relação com o seu contexto biopsicossociocultural.
Considerando-se a alta prevalência de disfunção sexual, além
das evidências de que a saúde mental influi na qualidade do
relacionamento e na capacidade de adaptação à transição me-
Psicóloga, mestre em Ciências pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).
Psiquiatra, livre-docente e professora associada do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Fundadora e coordenadora do Programa de Estudos em Sexualidade
(ProSex) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da FMUSP.
I
II
Diagn Tratamento. 2011;16(4):184-7.
Heloisa Junqueira Fleury | Carmita Helena Najjar Abdo
nopáusica, torna-se relevante a valorização desses aspectos sobre
a sintomatologia subjetiva da mulher menopausada.
A Psicoterapia de Grupo Tematizada e de Tempo Limitado
para disfunções sexuais11 é uma modalidade psicoterapêutica
com resultados comprovados na abordagem das disfunções sexuais, favorecendo a evolução das várias dimensões envolvidas
no desempenho sexual, além do desenvolvimento pessoal dos
pacientes.12
As mulheres têm maior adesão à terapia, bem como melhor
desenvolvimento em grupo, na medida em que emoções como
carinho, dor, medo e vergonha tendem a ser mais facilmente
expressas nesse contexto.12 Habilidades para relação empática
e manifestação das emoções são valorizadas nessa socialização,
favorecendo um ambiente seguro à ação terapêutica.13
OBJETIVO
O objetivo deste artigo é apresentar os resultados de intervenção psicoterapêutica para a promoção da saúde sexual de
mulheres na transição menopáusica, comparando antes e após a
intervenção, os índices de função sexual e qualidade de vida.
MÉTODO
Seleção da amostra
As pacientes foram recrutadas na Clínica Ginecológica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Os seguintes critérios de inclusão foram utilizados na seleção da amostra:
ser heterossexual, ter vida sexual ativa e parceiro estável, manter
relacionamento de pelo menos dois anos, ser alfabetizada, estar
iniciando a transição para a menopausa (comprovada por idade
e sintomatologia específica) e disponibilidade de comparecimento semanal. Os critérios de exclusão foram: doença psiquiátrica
ou física incapacitante anterior ou atual, utilização de medicação
que interfira na função sexual, sintomas ginecológicos diferentes
daqueles característicos da menopausa, terapia de reposição hormonal anterior (em período de três meses) e doenças sistêmicas
não compensadas. O estudo foi realizado de setembro de 2004 a
maio de 2005, com pacientes consecutivas, desde que preenchessem os critérios de inclusão e exclusão.
As pacientes foram submetidas a entrevista inicial, seguida
pela aplicação dos seguintes instrumentos diagnósticos de avaliação sexual: Índice de Função Sexual Feminina (Female Sexual
Function Index, FSFI)14 e instrumento abreviado de avaliação da
qualidade de vida – QV (WHOQOL Brief, versão brasileira).15
Os mesmos questionários foram reaplicados ao final do programa terapêutico. Além disso, as pacientes preencheram uma ficha
com dados sobre periodicidade menstrual e medicamentos utilizados durante o programa terapêutico e sua presença nas datas
agendadas para os atendimentos foi registrada.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Análises de Projetos
de Pesquisa da Universidade de São Paulo. Todas as pacientes
assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.
Diagn Tratamento. 2011;16(4):184-7.
Análise estatística
As pacientes selecionadas foram comparadas quanto às variáveis de interesse por meio do teste Mann-Whitney. Para avaliar
se as variáveis de interesse (escores de qualidade de vida, função
sexual e domínios da função sexual) estavam correlacionadas,
foram calculados coeficientes de correlação de Spearman. Para
verificar se as medidas do estudo, incluindo as medidas iniciais
e finais, estavam correlacionadas, foram calculados coeficientes
de correlação de Spearman. Os testes foram realizados ao nível
de significância de 5%, utilizando os softwares Statistical Analysis System (SAS) 8.0 e Statistical Package for the Social Sciences
(SPSS) 13.0.
O modelo de intervenção
O modelo de intervenção foi a Psicoterapia de Grupo Tematizada e de Tempo Limitado para disfunções sexuais,11 com
adaptações para abordagem de aspectos específicos da transição
menopáusica. Esse modelo consta de 16 sessões, com 90 minutos de duração cada e frequência semanal.11
Tal proposta psicoterápica fundamenta-se em temas selecionados a partir da identificação de aspectos importantes para a
saúde sexual no climatério. O planejamento temático e a finalidade das sessões é o que segue:16
Função sexual: ampliação do conceito de sexualidade, identificação de aspectos de disfunção sexual e construção de parâmetros individuais e grupais para avaliação da função sexual.
Comunicação e intimidade sexual: identificação de padrões
pessoais de comunicação, com foco nos impedimentos para a
intimidade sexual.
Autoimagem: identificação da autoimagem geral e autoimagem sexual.
Sexualidade feminina: reconhecimento das fases do ciclo de
resposta sexual feminino e as peculiaridades de cada gênero,
detalhando o conceito de desejo espontâneo e responsivo, excitação, orgasmo e satisfação sexual.
Climatério/menopausa: identificação de recursos pessoais
para lidar com perdas e ganhos específicos da transição menopáusica, inclusive a sintomatologia característica e as alterações
no funcionamento sexual.
Papel psicossocial da mulher: identificação da dimensão sociocultural da sexualidade feminina (padrões sociais, gênero,
idealizações e desafios).
Vínculo conjugal: reconhecimento de padrões disfuncionais
do relacionamento conjugal e/ou sexual. Identificação de padrões assertivos e de recursos pessoais para o fortalecimento
do vínculo.
RESULTADOS
Foram selecionadas 14 pacientes que atenderam aos critérios
de inclusão e exclusão.
No final da intervenção psicoterapêutica, o índice total e os
domínios desejo, orgasmo e satisfação no FSFI apresentaram
185
186
Psicoterapia para a saúde sexual: resultados com um grupo de mulheres na transição menopáusica
alterações positivas estatisticamente significantes (P < 0,05).
Houve aumento não significativo (P = 0,191) no índice de função sexual, porém, a não significância é provavelmente devido
ao baixo tamanho da amostra. O domínio excitação subjetiva
correlacionou-se positivamente (P < 0,001) com todos os domínios da função sexual. Os domínios excitação subjetiva e lubrificação correlacionaram-se positivamente com a diminuição
da dor no intercurso (P < 0,05). O índice de QV não sofreu alterações significantes (P > 0,05).
As correlações de Spearman mostraram que, além daquelas
já esperadas entre os índices iniciais e finais, por exemplo, QV
inicial e QV final (r = 0,736; P < 0,001), houve correlação estatisticamente significante (r = 0,524 e P = 0,015) entre QV e
FSFI, no final do estudo.
DISCUSSÃO
Observou-se, neste estudo, uma tendência de aumento no
índice médio de função sexual, o que sugere fortalecimento da
saúde sexual decorrente da psicoterapia.
Conforme salienta Basson,17 componentes cognitivos e afetivos, potencialmente positivos ou negativos, influenciam a resposta sexual, liberando ou inibindo o “gatilho” excitatório da
medula espinal. A atenção sobre a sexualidade pode ter tido
participação importante na maior disponibilidade das pacientes para a atividade sexual. Essa tendência de aumento também pode ter sido influenciada pela atenção à responsividade
genital,18 trabalhada durante o processo grupal, que mobilizou
a participação da mulher no acompanhamento e na adaptação
às alterações na excitação. Foi valorizada a identificação da excitação como importante componente do desejo sexual e consequente envolvimento na atividade sexual.
Um elemento fundamental da função psicoeducativa do grupo psicoterapêutico foi a sensibilização das participantes para o
reconhecimento da região genital e dos componentes do complexo erótico,19 por meio de atividades grupais com desenhos,
discussões dirigidas e movimentos corporais. A participação
da mulher na construção do contexto sexual foi enfatizada na
maioria das sessões, com destaque para a necessidade de maior
proximidade dos parceiros e de atividades que facilitem a transição de um estado mais neutro para a intimidade.19
O resultado favorável do domínio orgasmo (P < 0,05) no
FSFI também pode ter sido influenciado pela ênfase na consciência dos sinais fisiológicos do orgasmo.20
A correlação positiva observada entre os domínios excitação subjetiva e lubrificação com diminuição da dor confirma
a influência negativa da dispareunia. Condições desfavoráveis
próprias do envelhecimento reprodutivo feminino, caracterizadas por alterações hormonais sobre o epitélio e a musculatura
vaginal, acrescidas de diminuição na lubrificação genital, resultam em secura vaginal. A dispareunia21 tem sido responsabilizada pelo prejuízo à sexualidade nesse período.6 No entanto, van
Lunsen e Laan22 não identificaram o estado estrogênico como o
principal fator no desencadeamento de desordens sexuais, mas
processos cognitivos e afetivos que impediam a continuidade
da atividade sexual. Por outro lado, em estudo populacional e
prospectivo,4 não foi confirmado impacto significativo da dispareunia, com a ressalva de que essa condição pode tornar-se
progressivamente relevante pela continuidade do envelhecimento cronológico e reprodutivo da mulher. Foi atribuída ao
funcionamento sexual prévio a maior influência sobre a função
sexual nesta população.
Ao longo do processo psicoterápico, os impedimentos para
uma experiência sexual plena e os fatores facilitadores foram
abordados. Como o questionário FSFI14 exige o reconhecimento de detalhes do funcionamento sexual, sua aplicação foi útil
para a focalização na sexualidade.
A correlação identificada entre aumento do FSFI e aumento
da QV confirma as condições emocionais como fatores de risco
para as disfunções sexuais.5,23 Da mesma forma, os resultados
favoráveis da intervenção psicoterapêutica endossam uma
atuação direcionada aos elementos psicológicos, socioculturais
e relacionais, além da função psicoeducativa.
CONCLUSÃO
Após a psicoterapia, os índices de função sexual feminina,
mas não de qualidade de vida, apresentam variação estatisticamente significante, havendo também correlação positiva entre
aumento dos índices de função sexual e de qualidade de vida,
entre mulheres na transição menopáusica.
REFERÊNCIAS
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functioning: a review of the population-based studies. Annu Rev Sex
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midlife and older women: personality factors, psychosocial development,
present sexuality. Menopause. 2004;11(6 Pt 2):726-40.
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Heloisa Junqueira Fleury | Carmita Helena Najjar Abdo
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professionals. New York: Brunner-Routledge; 2003. p. 167-85.
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individual differences. J Consult Clin Psychol. 1995;63(6):891-906.
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23.Bancroft J, Loftus J, Long JS. Distress about sex: a national survey of women
in heterosexual relationships. Arch Sex Behav. 2003;32(3):193-208.
INFORMAÇÕES
Endereço para correspondência:
Heloisa Junqueira Fleury
Rua Sergipe, 401 — conjunto 808
São Paulo (SP)
CEP 01243-906
Tel. (11) 3256-9928
E-mail: [email protected]
Fonte de fomento: nenhuma
Conflito de interesse: nenhum
Data de entrada: 12 de agosto de 2011
Data da última modificação: 20 de setembro de 2011
Data de aceitação: 29 de setembro de 2011
PALAVRAS-CHAVE:
Menopausa.
Sexualidade.
Qualidade de vida.
Psicoterapia.
Educação.
RESUMO
Introdução: Estudos epidemiológicos apontam alta prevalência de dificuldades sexuais na população geral. Alterações
na resposta sexual são acentuadas com a idade.
Objetivo: Avaliar resultados de intervenção psicoterapêutica na saúde sexual, comparando, antes e após a intervenção,
a qualidade de vida e a função sexual de mulheres na transição menopáusica.
Método: Participaram 14 pacientes, que responderam aos questionários Índice de Função Sexual Feminina (Female Sexual
Function Index, FSFI) e instrumento abreviado de avaliação da qualidade de vida (QV). O modelo de intervenção foi psicoterapia
de grupo tematizada e de tempo limitado para disfunções sexuais, com adaptações para a transição menopáusica.
Resultados: FSFI e seus domínios desejo, orgasmo e satisfação apresentaram alterações estatisticamente significantes
(P < 0,05), enquanto o índice de QV não teve alterações significantes (P > 0,05). Houve tendência de aumento no índice
de função sexual e correlações positivas entre escores do FSFI e QV, após a psicoterapia.
Discussão: Tendência de melhora na função sexual sugere fortalecimento da saúde sexual. Componentes cognitivos e
afetivos, atenção à atividade sexual e à região e responsividade genital, bem como a construção de contexto e habilidades
relacionais podem ter influído na maior disponibilidade das pacientes para tal atividade. A correlação entre melhora da
função sexual e qualidade de vida confirma condições emocionais como fatores de risco para as disfunções sexuais.
Conclusão: Os índices de função sexual feminina, mas não o de qualidade de vida, apresentam variação
estatisticamente significante após intervenção psicoterapêutica. Houve correlação positiva entre melhora da
função sexual e da qualidade de vida.
Diagn Tratamento. 2011;16(4):184-7.
187
Destaques Cochrane
Probióticos para o tratamento
de diarreia infecciosa aguda
Autora da tradução:
Rachel RieraI
Autor dos comentários independentes:
Flavio SteinwurzII
RESUMO
Introdução: Probióticos podem ser uma intervenção segura
para diarreia infecciosa aguda ao reduzir a duração e a gravidade
da doença.
Objetivos: Avaliar os efeitos dos probióticos na diarreia infecciosa
aguda comprovada ou presumida.
Estratégia de busca: Foram pesquisados ensaios clínicos no Diseases Group’s Trials Register (julho 2010), Cochrane Controlled
Trials Register (The Cochrane Library Edição 2, 2010), Medline
(1966 a julho de 2010), Embase (1988 a julho de 2010) e listas
de referência dos estudos. Também foram contatados indivíduos e
organizações que trabalham na área e empresas farmacêuticas que
fabricam agentes probióticos.
Critérios de seleção: Ensaios clínicos randomizados e quasirandomizados comparando um determinado agente probiótico
com placebo ou ao “não uso” de probiótico em pessoas com diarreia aguda comprovadamente ou presumidamente causada por um
agente infeccioso.
Coleta e análise dos dados: Dois revisores avaliaram a qualidade
metodológica do estudo e extraíram os dados. Os desfechos primários foram: duração média da diarreia, frequência de evacuações no
segundo dia após a intervenção e presença de diarreia em curso no
quarto dia. Um modelo de efeito randômico foi utilizado.
Principais resultados: 63 estudos preencheram os critérios de
inclusão com um total de 8.014 participantes. Destes, 56 ensaios
recrutaram lactentes e crianças na primeira infância. Os ensaios variaram quanto às definições da diarreia aguda e do término da doença
diarreica, bem como no risco de viés. Os ensaios foram realizados
em diferentes situações e também variaram muito quanto aos organismos testados, à dosagem dos probióticos e às características dos
participantes. Nenhum evento adverso foi atribuído ao uso do probiótico. Os probióticos reduziram a duração da diarreia, embora o
tamanho do efeito tenha variado consideravelmente entre os estudos.
A média do efeito foi significativa para: a) duração média da diarreia
(diferença média de 24,76 horas; intervalo de confiança 95% = 15,9 33,6 horas; n = 4.555, ensaios = 35); b) diarreia com duração ≥ 4 dias
(razão de risco = 0,41; intervalo de confiança 95% = 0,32 - 0,53;
n = 2.853, ensaios = 29) e c) frequência de evacuações no dia 2 (diferença média = 0,80; intervalo de confiança 95% = 0,45 - 1,14;
n = 2.751, ensaios = 20). As diferenças no tamanho do efeito entre os
estudos não foram explicadas pela qualidade do estudo, cepa probiótica, número de cepas diferentes, viabilidade dos organismos, dosagem de organismos, causas ou gravidade da diarreia, ou se os estudos
foram feitos em países desenvolvidos ou em desenvolvimento.
Conclusões dos autores: Usado juntamente com a terapia de
reidratação, os probióticos parecem ser seguros e ter claros efeitos
benéficos na redução da duração e da frequência de evacuações em
casos de diarreia infecciosa aguda.1 No entanto, mais pesquisas são
necessárias para orientar o uso de esquemas diferentes de probióticos
para grupos específicos de pacientes.
REFERÊNCIA
1. Allen SJ, Martinez EG, Gregorio GV, Dans LF. Probiotics for treating acute
infectious diarrhoea. Cochrane Database Syst Rev. 2010;(11):CD003048.
INFORMAÇÕES
Este é um resumo de uma Revisão Cochrane publicada na Cochrane Database of Systematic Reviews (CDSR) 2010, Issue 11, DOI: 10.1002/14651858.
CD003048.pub3. (www.thecochranelibrary.com). Para ver citação completa e
detalhes dos autores, por favor veja a referência 1.
Tradução e adaptação:
Centro Cohrane do Brasil
Rua Pedro de Toledo, 598
Vila Clementino — São Paulo (SP)
CEP 04039-001
Tel. (11) 5579-0469/5575-2970
E-mail: [email protected]
http://www.centrocochranedobrasil.org.br/
O texto completo desta revisão está disponível gratuitamente para toda a
América Latina e Caribe em: http://www.thecochranelibrary.com/userfiles/
ccoch/file/Water%20safety/CD003048b.pdf.
Responsável pela edição desta seção: Equipe do Centro Cochrane do Brasil
Assistente de Pesquisa do Centro Cochrane do Brasil.
Coordenador Científico do Departamento de Gastroenterologia da Associação Paulista de Medicina (APM).
I
II
Diagn Tratamento. 2011;16(4):188-9.
Rachel RieraI | Flavio SteinwurzII
COMENTÁRIOS
Probióticos são micro-organismos vivos, não patogênicos que
promovem ação benéfica na saúde do hospedeiro. Nos últimos anos
têm sido utilizados para o tratamento da diarreia infecciosa, já que
alguns estudos mostraram que o seu uso pode reduzir a intensidade
e a duração do quadro. Os probióticos ajudam a restaurar o balanço
da microflora intestinal, mas o mecanismo de ação terapêutica ainda
não está claro. Talvez seja pela redução do crescimento e do poder invasivo das bactérias patogênicas ou aumentando a capacidade protetora da barreira da parede intestinal ou ainda por algum mecanismo
imunológico. A literatura mostra ação benéfica em alguns casos de
diarreia por rotavírus, principalmente em crianças.
Os autores1 revisaram a literatura de forma interessante,
com avaliação de 63 estudos que abrangeram mais de 8.000
Diagn Tratamento. 2011;16(4):188-9.
pacientes e com excelente análise científica. A grande maioria
dos casos de diarreia infecciosa apresenta quadro autolimitado
e não requer qualquer tratamento. Levando-se em conta que
antieméticos e antidiarreicos não são indicados nesses casos,
principalmente em crianças com diarreia aguda infecciosa, os
probióticos podem ser uma opção nos casos leves, em que não
há indicação para intervenção mais agressiva.
É muito importante ressaltar que nem toda bactéria não
patogênica pode ser considerada um probiótico. Há regras e
características para isso. Apenas algumas cepas mostraram benefício em testes clínicos para tratar diarreia e, portanto, somente estas podem ser recomendadas com algum critério. Mais
estudos são necessários para assegurar a melhor indicação e uso
dos probióticos.
189
Destaques Cochrane
Revascularização transmiocárdica a laser versus
tratamento clínico para angina refratária
Autora da tradução:
Rachel RieraI
Autor dos comentários independentes:
José Henrique Andrade VilaII
José Pedro da SilvaIII
RESUMO
Introdução: Angina crônica e formas avançadas da doença
coronariana são cada vez mais frequentes. Apesar do aumento
da eficácia dos tratamentos de revascularização disponíveis, um
subgrupo de pacientes apresenta angina refratária. A revascularização transmiocárdica a laser (RTML) tem sido proposta para
melhorar a situação clínica desses pacientes.
Objetivos: Avaliar a eficácia e a segurança da RTML quando
comparada ao tratamento clínico otimizado quanto à melhora
da gravidade da angina, da sobrevida e da função cardíaca em
pacientes com angina refratária.
Estratégia de busca: Foram pesquisados ensaios clínicos
no Cochrane Controlled Trials Register (CENTRAL), Medline (January 2006 to June 2007), Embase (2004 to June
2007) e estudos em andamento registrados nas bases metaRegister of Controlled Trials Database (mRCT) e ClinicalTrials.gov. Listas de referências de artigos relevantes também
foram checadas.
Critérios de inclusão dos estudos: Estudos foram selecionados se cumpriram os seguintes critérios: ensaios clínicos randomizados de RTML, por toracotomia, em pacientes com angina
classe III-IV que foram excluídos de outros procedimentos de
revascularização. De um total de 181 referências, 20 artigos foram selecionados relatando dados de sete estudos.
Coleta e análise dos dados: Dois revisores extraíram os dados dos estudos selecionados. Os revisores realizaram, de forma
independente, tanto a extração de dados quanto a avaliação da
qualidade metodológica dos estudos. Os estudos selecionados
apresentaram deficiências metodológicas e nenhum deles preencheu todos os critérios de qualidade.
Principais resultados: Sete estudos (1.137 participantes dos
quais 559 randomizados para RTML) foram incluídos. No geral, 43,8% dos pacientes no grupo de tratamento baixaram dois
níveis na classificação da angina em comparação com 14,8% no
grupo controle (odds ratio, OR = 4,63; intervalo de confiança
95% = 3,43-6,25; heterogeneidade estatisticamente significativa). A mortalidade (análise por intenção de tratar) em 30 dias
(4,0% no grupo RTML e 3,5% no grupo controle) e em um
ano (12,2% no grupo RTML e 11,9% no grupo controle) foi
semelhante nos dois grupos. A mortalidade (analisando apenas
os pacientes que receberam a intervenção até o final do estudo)
foi de 6,8% no grupo RTML e de 0,8% no grupo controle,
mostrando uma diferença estatisticamente significativa.
Conclusões dos autores: Não há evidências suficientes para
concluir que os benefícios clínicos da RTML superam os riscos
potenciais.1 O procedimento está associado a uma mortalidade
precoce significativa.
REFERÊNCIA
1. Briones E, Lacalle JR, Marin I. Transmyocardial laser revascularization
versus medical therapy for refractory angina. Cochrane Database Syst Rev.
2009;(1):CD003712.
INFORMAÇÕES
Este é um resumo de uma Revisão Cochrane publicada na Cochrane Database of Systematic Reviews (CDSR) 2009, Issue 1, DOI: 10.1002/14651858.
CD003712.pub2. (www.thecochranelibrary.com). Para ver citação completa e
detalhes dos autores, por favor veja a referência 1.
Tradução e adaptação:
Centro Cohrane do Brasil
Rua Pedro de Toledo, 598
Vila Clementino — São Paulo (SP)
CEP 04039-001
Tel. (11) 5579-0469/5575-2970
E-mail: [email protected]
http://www.centrocochranedobrasil.org.br/
O texto completo desta revisão está disponível gratuitamente para toda a América Latina e Caribe em: http://cochrane.bvsalud.org/cochrane/show.php?db=re
views&mfn=2037&id=CD003712&lang=pt&dblang=&lib=COC&print=yes.
Assistente de Pesquisa do Centro Cochrane do Brasil.
Chefe da Área Clínica de Transplante Cardíaco e Unidade de Terapia Intensiva da equipe do professor doutor José Pedro da Silva no Hospital Beneficência Portuguesa.
Cirurgião cardiovascular e chefe de Equipe no Hospital Beneficência Portuguesa.
I
II
III
Diagn Tratamento. 2011;16(4):190-1.
Rachel Riera | José Henrique Andrade Vila | José Pedro da Silva
Responsável pela edição desta seção: Equipe do Centro Cochrane do Brasil
COMENTÁRIOS
Concordamos com os autores desta revisão,1 de que não
há provas na literatura indicando ter a revascularização transmiocárdica a laser benefícios clínicos que compensem os riscos
potenciais do procedimento. Como a cirurgia de Vineberg no
passado, a perfusão distal através da microcirculação pode ser
bastante variável de paciente para paciente e hematoma intramiocárdico pode ter consequências graves.
Diagn Tratamento. 2011;16(4):190-1.
Técnicas mais sofisticadas de revascularização miocárdica das
artérias epicárdicas, usando artéria torácica interna em anastomose sequencial para dois ou três ramos ou em ponte com
veias safenas, para atingir porções bastante distais de artérias
coronárias doentes, e também o uso de outros enxertos arteriais usualmente resolvem a angina em pacientes com função
ventricular aceitável. Para pacientes com doença extremamente
grave e difusa do leito coronariano distal ou função ventricular gravemente comprometida, o transplante cardíaco deve ser
considerado.
191
Carta ao editor
Institutos pomposos
Milton Augusto de Toledo BarrosI
De início, afirmo que tenho gabarito para escrever sobre o
título acima. Tenho informação e formação que vêm de longos
anos. Quero esclarecer que não me move nenhum sentimento
de vindita ou de acusação, ao contrário, sei que a profissão de
médico, a qual vivi até minha justa aposentadoria, é difícil, embora compensadora sob inúmeros aspectos.
Presto algumas informações que julgo serem úteis ao nosso
tema. Sou formado pela Faculdade Nacional de Medicina (Rio
de Janeiro, ano de 1951). No início de minha carreira, existiam
poucas especialidades médicas pelo interior. Após alguns anos,
voltei-me para a psiquiatria, da qual obtivera bons conhecimentos em meu estágio e trabalho, durante três anos, em uma casa
de saúde especializada. Considero ter sido boa minha formação
médica. Sempre fui dedicado e regularmente estudioso. Acho
que passei muito mais por acertos com meus clientes do que
por resultados insatisfatórios.
Na ocasião em que estudava para o vestibular, passei pela
tristeza do falecimento de minha mãe. Sem dúvida, ocorrera
grave erro em uma cirurgia a que ela fora submetida, mas sobre
a qual falei e descrevi com detalhes no livro de minha autoria
“Crônicas de um Psiquiatra”.1 Resumindo, esclareço que o colega cirurgião esqueceu uma pinça de Kocher dentro da cavidade
abdominal. Mamãe passou por cruciantes problemas, vindo a
falecer por peritonite após nova cirurgia.
Sem delongas, passo agora ao significado da palavra “instituição”. É de meu conhecimento, porém para confirmar consultei dicionários e a “wikipédia” na internet. Não há dúvida de
que essa palavra significa um conjunto de ações com sentido
social ou um conjunto de apoios em uma pesquisa ou mesmo
interconsultas entre profissionais do mesmo ramo ou afins. No
caso de médicos, significa a possibilidade de ação conjunta em
benefício de um paciente para melhor terapêutica ou esclarecimento diagnóstico. Tudo bem claro, não é?
Entretanto, na realidade não é isso que acontece, mas
sim encontram-se edifícios que se constituem em construções suntuosas, em geral cheias de vidro “blindex”, com teto
alto, meios de conforto para os clientes, incluindo sanitários,
água, café etc. Estacionamentos e, na frente do prédio, em
letras garrafais, o nome e qualificação técnica do tal instituto.
E mais ainda, com consultórios da mesma especialidade que,
entretanto, são praticamente isolados, com cada profissional
agindo só com seu critério. É claro que sem o intuito de enganar os clientes, mas tudo está longe do que poderia ser melhor. Não existe uma intercooperação entre os especialistas
no que concerne às possíveis dificuldades de um caso mais
delicado. As exceções são raras. O cliente ou seus familiares se sentem intimidados, o médico é sempre colocado num
posto muito acima, quase ninguém reclama e fica por isso
mesmo. Quando os profissionais se unem é porque em geral
necessitam de aparelhos caros, donde a conveniência de um
uso econômico.
Procedimento diferente ocorre nas unidades de terapias
intensivas (UTI), onde os médicos que, em geral, são de boa
competência, recebem o plantão com informações necessárias, e depois as transmitem ao seu sucessor quando vence seu
turno.
Quando conversei com um colega amigo sobre esse delicado
assunto, ele me aprovou e elogiou minha intenção desta publicação, mas salientando que isso é uma verdade, e que se teria de
ter coragem para se tocar nessa questão.
Como disse antes, tenho larga experiência e observação acurada, noto muito bem quando uma enfermeira ou técnica do
ramo entra no quarto e afoitamente mete o dedo no botão da
luz. O paciente vai reclamar? Coitado. Mas esse assunto não
está incluído para agora. E o paciente do Sistema Único de Saúde (SUS), que necessita ser operado de uma hérnia inguinal.
Fica para quando?
Há cinco meses minha esposa faleceu. Não incluí nada sobre
o assunto nem sobre a peritonite que desencadeou o óbito.
No que concerne à medicina existe muita coisa boa, mas
também existe muita coisa que poderia melhorar. Sei que estamos caminhando. Nós, os médicos, com razão, responsabilisamos bastante os políticos, mas temos discernimento que
muito poderiam auxiliar ao nosso próximo e ao nosso país.
Não existem fronteiras onerosas para conversações úteis; estamos ainda longe dos limites de nossa inteligência, quando
unida e bem dirigida. É uma dádiva e prerrogativa que poderíamos usar melhor.
Médico psiquiatra aposentado.
I
Diagn Tratamento. 2011;16(4):192-3.
Milton Augusto de Toledo Barros
Envio este trabalho para a revista médica “Diagnóstico e Tratamento”, editada pela Associação Paulista de Medicina, que já
me honrou em outra ocasião com a publicação de artigo sobre
o tabagismo, intitulado “Experiência desastrosa”.
Antecipadamente agradeço.
INFORMAÇÕES
REFERÊNCIA
Fonte de fomento: nenhuma declarada
Conflitos de Interesse: nenhuma declarada
1. Barros MAT. Crônicas de um Psiquiatra. São Paulo: Raízes; 1999.
Endereço para correspondência:
Rua Érico de Abreu Sodré, 220
Centro — Lins (SP)
CEP 16400-502
E-mail: [email protected]
Data de entrada: 11 de julho de 2011
Data da última modificação: 11 de julho de 2011
Data de aceitação: 1o de agosto de 2011
Diagn Tratamento. 2011;16(4):192-3.
193
Carta ao editor
Troca de plantão e a verbalização do estado
mental dos pacientes
Marcus Vinicius Henrique de CarvalhoI, Priscila Nasser de CarvalhoII
O exame vestibular para entrar na faculdade de medicina é
um dos mais concorridos, razão pela qual a pessoa que consegue matricular-se no curso teve de demonstrar competência,
inclusive no conhecimento da língua portuguesa. Durante os
anos em que estão na faculdade, os alunos são obrigados a estudar em livros escritos principalmente na língua inglesa. Por ser
um curso em horário integral, torna-se difícil encontrar tempo
para leitura de livros, jornais e revistas escritos em português
correto. Após formar-se, tal situação não muda para o profissional médico. A medicina é uma carreira que exige, além de
dedicação, um número elevado de horas de trabalho por dia e
muito estudo para atualização científica, em geral, feita em língua inglesa. Isso faz com que o profissional médico vá perdendo
o “contato” com a língua portuguesa erudita e vá tendo muito
“contato” com a língua inglesa escrita.
Nesse contexto, vão sendo incorporados ao vocabulário
novos termos no ambiente hospitalar, como angina “severa”,
“score” de pancreatite, “maximização” da medicação, “checar”
os exames etc. A capacidade de a pessoa criar novas palavras,
ampliar o vocabulário e trazer às palavras novos sentidos é
uma demonstração de vivacidade da língua. Entretanto, gera
curiosidade como ficará a situação de palavras como o verbo
“contatar” para o qual tem se observado entre os médicos uma
conjugação inexistente. Na transmissão do plantão de um profissional para outro colega, aquele que está deixando o serviço,
vai zelosamente relatando a situação clínica dos pacientes dos
quais cuidou durante o período de trabalho. O relato começa
I
II
pelo nível de consciência do paciente e aí vai: “o Sr. João não
está “contaCtUando...”. Contato é um substantivo derivado do
latim “contactu”, que significa o estado de objetos que se tocam
ou proximidade, relação, comunicação.1 A grafia correta do verbo no português do Brasil é “contatar”. Na língua inglesa, o
verbo é “to contact”, e certamente é de tanto estudar em livros
escritos em língua inglesa que os médicos brasileiros gostam de
preservar a letra C e ainda acrescentam a letra U. De qualquer
maneira, desejamos que, na próxima transmissão de plantão, o
Sr. João esteja “contatando” melhor!
REFERÊNCIA
1. Dicionário Priberam da Língua Portuguesa. Disponível em: http://www.
priberam.pt/dlpo/default.aspx?pal=contacto. Acessado em 2011 (10 ago).
INFORMAÇÕES
Endereço para correspondência:
Faculdade de Medicina de Jundiaí
Departamento de Cirurgia
Rua Francisco Telles, 250
Vila Arens — Jundiaí (SP)
CEP 13202-550
E-mail: [email protected]
Fonte de fomento: nenhuma
Conflitos de interesse: nenhum
Data de entrada: 26 de julho de 2011
Data da última modificação: 26 de julho de 2011
Data de aceitação: 10 de agosto de 2011
Professor adjunto, doutor do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina de Jundiaí.
Especialista em Clínica Médica pela Sociedade Brasileira de Clínica Médica.
Diagn Tratamento. 2011;16(4):194.
Resumos do VIII Congresso
Paulista de Neurologia
Realizado de 23 a 25 de junho de 2011
Comissão:
Presidente do Congresso
Flávio Guimarães Fernandes
Presidente do Comitê Multidisciplinar
de Acadêmicos da APM
Flávio Taniguchi
Presidente do Comitê Científico
Prof. Dr. Paulo Manuel Pêgo Fernandes
Presidente do Comitê Organizador
Patrícia Carvalho Silva
Realização
Comitê Multidisciplinar de Acadêmicos
da Associação Paulista de Medicina
196
Miopatia metabólica – lipidose
Daniella Dias Arçari, Viviana Palou, Alzira Alves de Siqueira
Carvalho
Setor de Neurologia – Ambulatório Neuromuscular - Faculdade de Medicina do ABC
Mulher de 36 anos, natural de São Paulo, orçamentista gráfica, casada,
apresentou-se ao serviço com queixa principal de fraqueza em membros inferiores. Referia fraqueza proximal e dor em membros inferiores há dois anos,
com piora progressiva. Há um mês, evoluiu com fraqueza proximal em membros superiores. Relatava piora da fraqueza e da dor nos quatro membros com
exercício prolongado.
Como antecedentes pessoais, relatava fratura joelho esquerdo há 14 anos;
negava hipertensão arterial sistêmica, diabetes, dislipidemia, tabagismo e etilismo. Sua história gestacional era de duas gestações, dois partos e nenhum aborto
(GII PII A0), sem intercorrências. Tinha pais saudáveis, não consanguíneos,
sem história semelhante na família.
A revisão de sistemas não demonstrou alterações. Ao exame físico geral,
mostrou-se corada, hidratada, acianótica, anictérica. Aparelho cardiovascular
com ritmo cardíaco regular em dois tempos, bulhas normofonéticas, sem sopro.
Aparelho respiratório com murmúrio vesicular presente, sem ruídos adventícios. Abdome: globoso, sem visceromegalias. Extremidades: sem edema, bem
perfundidas. À inspeção (Figura 1), notou-se presença de padrão lipodistrófico,
hipertrofia de panturrilhas, fácies atípica.
Ao exame neurológico, a paciente mostrou-se vigil, consciente, orientada no
tempo e no espaço. Motricidade: força muscular grau IV proximal e V distal nos
quatro membros; tônus normal; reflexos tendinosos profundos presentes e simétricos; reflexo cutâneo plantar em flexão bilateral; sensibilidade superficial e profunda
preservada; coordenação preservada; equilíbrio preservado; marcha miopática.
Os exames laboratoriais apresentaram os seguintes resultados: hemoglobina 13,5 g/dL, leucócitos: 7800, aldolase: 11,9 U/L (< 7,6), transaminase glutâmico-oxalacética: 97 U/L (< 32), transaminase glutâmico pirúvica: 93 U/L
(< 31), creatinofosfoquinase: 1.283 U/L (< 180), TSH (hormônio estimulante
da tireoide) e T4L (T4 livre) normais. As sorologias para hepatite B e C eram
não reagentes. A eletroforese de proteína estava normal. O anticorpo antimitocôndria estava não reagente.
Ultrassonografia de abdome mostrou esteatose hepática grau I. A eletroneuromiografia demonstrou padrão miopático.
Biópsia muscular foi solicitada e revelou miopatia vacuolar com acúmulo
de lípides na coloração oil red o (Figura 2). Após a biópsia muscular, ficou
definido o diagnóstico de miopatia metabólica (lipidose). Em busca da etiologia, foi solicitada dosagem de carnitina livre, que estava em 6,7 mcg/ml (valor
normal 6,5-12).
Apresentamos um caso em que a clínica e a eletromiografia foram compatíveis com miopatia. Realizamos biópsia muscular para definição da etiologia.
Diante de biópsia mostrando acúmulo de lípides, foi solicitada dosagem de
carnitina sistêmica. Mesmo com esta dosagem estando normal, não podemos
excluir deficiência de carnitina muscular. Diante da dificuldade para dosagem
de carnitina muscular, optou-se por reposição de carnitina, 500 mg, dois comprimidos por dia. A paciente evoluiu com melhora parcial da fraqueza muscular. Segue em uso da medicação e estável.
Figura 1. Padrão lipodistrófico no aspecto geral da paciente
e hipertrofia de panturrilhas.
A
b
c
d
Biópsia muscular: A - coloração hematoxilina-eosina: variação no calibre das fibras e fibras
vacuolizadas; B - coloração oil red o: vacúolos com acúmulos de lípides; C- coloração PAS: PAS
negativo; D - coloração tricrômio de Gomori: ausência de ragged red fibers.
Figura 2. Biópsia muscular.
Síndromes neurovasculares: sempre sintoma
deficitário?
Alberto Rolim Muro Martinez, Wagner Mauad Avelar, Fabrício
Lima, Vanessa Hashiman, Silvia Stahl Merlin, Anelyssa D’Abreu
Departamento de Neurologia, Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp)
Relato do caso: Paciente de 61 anos, parda, sexo feminino, natural de
Rio Claro (SP), procedente de Campinas (SP), com Ensino Fundamental incompleto, auxiliar de limpeza, três filhos, católica e destra, foi encaminhada
ao Ambulatório de Distúrbios do Movimento por quadro de movimentos involuntários em membros superior e inferior à direita há cinco meses, de início
súbito em 16 de novembro de 2010 após estresse emocional. Por ocasião do
início do quadro, procurou atendimento em unidade básica de saúde, sendo
verificados níveis de pressão arterial sistólica que variavam entre 190 e 170
mmHg, associados a movimentação involuntária de membro superior direito
(dedos, mão, antebraço e braço). Após dois dias, percebeu movimentação involuntária de membro inferior ipsilateral (artelhos, pé, perna e coxa). Concomitantemente, queixava-se de engasgos eventuais e dificuldade de articulação
de palavras em períodos de grande estresse psicológico. Refere que a amplitude
dos movimentos piorava durante períodos de maior ansiedade desde o início
do quadro. Negava cefaleia, paresia, parestesia, alterações da coordenação motora e alterações de marcha. Referia períodos de ansiedade extrema desde o
início do quadro.
Antecedente pessoal: Ex-tabagista (parou de fumar há dois anos), 19 maços/ano. Etilista de duas latas de cerveja aos finais de semana. Nega qualquer
outra comorbidade. Nega fazer uso de medicações.
Antecedente cirúrgico: Duas cesarianas.
Antecedente familiar: Nega antecedente de doenças neurológicas ou
coreia.
Exame físico geral: Pressão arterial de 120/80 mmHg; frequência cardíaca
de 82 bpm; frequência respiratória de 20 rpm; temperatura de 36,2 ºC. Bom
estado geral, corada, hidratada, anictérica, acianótica. Ritmo cardíaco regular
em dois tempos, bulhas normofonéticas sem sopros. Murmúrio vesicular fisiológico sem ruídos adventícios. Abdômen semigloboso com ruídos hidroaéreos
presentes, flácido, sem visceromegalias. Pulsos cheios, simétricos. Extremidades
sem edemas ou sinais de trombose venosa profunda.
Exame neurológico
Estado mental: Vigil, orientada auto e alopsiquicamente, pensamento de
curso e conteúdo preservados.
Diagn Tratamento. 2011;16(4):195-205.
197
Nervos cranianos: Pupilas isocóricas e fotorreagentes. Motilidade ocular
extrínseca preservada. Fácies atípica. Véu palatino simétrico, úvula centrada,
língua simétrica com motricidade mantida. Sacadas hipométricas.
Sensibilidade: Preservada em suas quatro modalidades.
Equilíbrio: Dinâmico e estático sem alterações.
Coordenação motora: Decomposição de movimento à prova índex-nariz
à direita. Eudiadococinesia.
Motor: Movimentos coreicos em membro superior e inferior à direita.
Presença de impersistência motora. Sinal da ordenha positivo à direita. Força
muscular grau V global. Manobra de Grasset: aumento de tônus pronador à
direita. Manobra Mingazzini sem alterações. Reflexos de estiramento muscular
presentes e simétricos. Reflexo cutâneo plantar em flexão. Marcha discretamente alterada devido à presença de movimentos coreicos.
Exames complementares:
Hemoglobina: 13,2 g/dL (12-16 g/dL); hematócrito: 39,8% (37-47%); leucócitos: 6.970/mm3 (4.000-10.000/mm3); plaquetas: 213.000/mm3 (150.000400.000/mm3) velocidade de hemossedimentação 14 mm na primeira hora
(até 14 mm na primeira hora); sódio: 138 mEq/L (136-145 mEq/L); potássio:
4,2 mEq/L (3,1-5,1 mEq/L); cálcio: 9,2 mg/dL (8,4-9,7 mg/dL); magnésio:
1,9 mEq/L (1,3-2,1 mEq/L); cobre: 125 µg/dL (70-140 µg/dL); vitamina
B12: 353 pg/mL (202-900 pg/mL); fator antinuclear: não reagente; hormônio tireoestimulante: 1,88 µUI/mL (0,41-4,5 µUI/mL); T4 livre: 1,2 ng/dL
(0,9-1,8 ng/dL); hormônio paratireoideano: 45,2 pg/mL (15-65 pg/mL).
Funções renal e hepática normais. Sorologias para hepatites B e C, anti-HIV
e sífilis negativas.
Líquor: proteína: 42 mg/dL (até 42 mg/dL); glicose: 64 mg/dL (glicemia
sérica: 92 mg/dL) (até 2/3 da glicemia sérica); leucócitos: 1/mm3 (até 3/mm3);
hemácias: 14/mm3. Culturas negativas.
Tomografia computadorizada de crânio: normal.
Eco-Doppler de carótidas: presença de placa aterosclerótica hipoecogênica
de superfície irregular desde sua origem, acometendo terço proximal da artéria
carótida interna esquerda. Análise do fluxo sanguíneo ao Doppler demonstra
aumento da velocidade sistólica (402 cm/seg, relação ACI/ACC = 6), evidenciando uma estenose suboclusiva (Figura 1).
Angiotomografia computadorizada de crânio e vasos cervicais: presença
de placa com componente calcificado na origem da artéria carótida interna
esquerda, causando estenose de 90% (critério NASCET - North American
Symptomatic Carotid Endarterectomy Trial) (Figura 2).
Ressonância magnética de crânio: normal (Figura 3).
SPECT (Single-Photon Emission Computed Tomography) cerebral: normal (Figura 4).
Evolução: Paciente apresentou melhora parcial do quadro coreico após a
prescrição de risperidona na dose de 2 mg/dia. Foi submetida a endarterectomia, com remissão completa dos movimentos coreicos já no primeiro dia de
pós-operatório.
Discussão: O caso clínico aqui exposto é extremamente interessante do
ponto de vista semiológico. Muitos ainda acreditam que síndromes neurovasculares são sinônimo de sintomas negativos, o oposto do observado neste
caso. A presença de movimentos coreicos constitui um desafio à pratica
neurológica. As etiologias são variadas e, muitas vezes, não encontram substrato puramente neurológico. Exemplos são estados hiperglicêmicos não
cetóticos, a policitemia vera e as alterações de fluxo cerebral, como é o caso
dos acidentes vasculares cerebrais (AVC) isquêmicos. Desta forma, etiologias metabólicas, vasculares, estruturais, autoimunes e genéticas devem
ser levadas em consideração frente a pacientes que apresentam coreia. A
avaliação diagnóstica deve incluir história familiar, informações detalhadas
sobre uso de medicamentos, exame físico, neurológico, laboratorial e de
neuroimagem.
Grandes séries envolvendo pacientes com AVC identificaram 0,4% a 1,3%
de incidência de coreia no seguimento evolutivo. O fluxo sanguíneo na região dos núcleos da base é derivado dos ramos da artéria carótida interna. A
fisiopatologia da coreia nos casos subsequentes ao AVC encontra suporte na
verificação de lesões isquêmicas nos núcleos da base. Todavia, evidências vindas
de estudos envolvendo pacientes com diagnóstico de coreia de Sydenham e utilizando SPECT (single-photon emission computed tomography) cerebral mostram
disfunções neuronais transitórias no estriado e tálamo.
No contexto isquêmico, estudos experimentais envolvendo modelos animais demonstram uma vulnerabilidade do estriado a estados de isquemia e
hipóxia, que por sua vez induzem a liberação de neurotransmissores, incluindo a dopamina, a qual tem papel fundamental na lesão neuronal em estados
hipóxicos. Essa vulnerabilidade estriatal deve-se à sua peculiar sensibilidade
à falha nos mecanismos metabólicos envolvidos na produção de energia, levando à referida liberação dopaminérgica. Sendo assim, a hemicoreia pode
ser advinda de lesões nas vias subtalâmicas ou subtalamopálidas que levam à
Diagn Tratamento. 2011;16(4):195-205.
perda de excitação subtalâmica ao pálido medial seguida por desinibição dos
neurônios talâmicos.
A literatura demonstra poucos casos de hemicoreia relacionados ao hipofluxo cerebral secudários a estenose carotídea, os quais apresentaram reversão
do sintoma ou melhora após correção da estenose.
Conclusão: Nos casos de hemicoreia, de início relativamente súbito,
causas hemodinâmicas devem ser consideradas mesmo na ausência de sintomas negativos associados. O estudo dos vasos extra e intracranianos é de
fundamental importância nesse contexto, uma vez que a correção das causas
do hipofluxo implica na reversibilidade dos sintomas, como exposto no caso
clínico acima.
Figura 1. Ecodoppler de carótidas mostrando estenose
carotídea esquerda.
Figura 2. Angiotomografia evidenciando estenose carotídea
esquerda (carótida esquerda).
Figura 3. Ressonância nuclear magnética de crânio nas
ponderações T1 e T2 flair de aspecto normal.
198
Figura 4. SPECT (single-photon emission computed
tomography) cerebral normal.
O II nervo craniano (óptico) mostrava edema de papila bilateral, mais
acentuado no olho direito (OD, 360°), com exsudatos duros na região macular
somente do OD, dispostos conforme demonstrado na imagem (Figura 1). A
paciente não tinha alterações dos campos visuais ao exame de confrontação,
pupilas isocóricas e fotorreagentes. Os demais nervos cranianos estavam sem
alterações.
Como exame complementar, foi obtida ressonância magnética de crânio e
órbita, sem alterações (exame realizado no momento da admissão nas duas internações). A análise do líquido cefalorraquidiano (LCR) à primeira internação
estava sem alterações. À segunda internação, o LCR constava: P-inicial = 22
cm H2O P-final: 15 cm H2O; 15 células, com predomínio linfomonocitário, 4
hemácias, 65 mg/dl glicose, 45 mg/dl proteína.
Hemograma, função renal e hepática, eletrólitos, velocidade de hemossedimentação e proteína C-reativa sem alterações. Fator antinuclear (FAN) negativo. Raio x de tórax e eletrocardiograma (ECG) normais.
As sorologias constavam: HIV não reagente; HBSAg não reagente. AntiHCV não reagente; VDRL sérico + 1/128. FTABS (Fluorescent treponemal antibody adsorption) +; VDRL LCR + 1:16 FTABS +.
Diante das sorologias séricas positivas para sífilis e LCR, foi confirmado
diagnóstico de neurossífilis. Cabe ressaltar que o VDRL no LCR é altamente
específico para o diagnóstico de neurossífilis, ao contrário do VDRL sérico,
que sabidamente é um teste não treponêmico, menos específico que o FTABS
sérico. O FTABS positivo no LCR não é um teste tão específico para o diagnóstico de neurossífilis quanto o sérico, porém, tem valor preditivo negativo
no LCR relevante.
A paciente, após cinco dias de tratamento com penicilina cristalina 4.000.000
UI endovenosa de 4 em 4 horas, estava completamente assintomática. Completou 14 dias de tratamento. Retornou após um mês no ambulatório de neurologia
com acuidade visual normal e sem alterações ao exame neurológico.
Desafio diagnóstico: neurorretinite por sífilis
Michel Elyas Jung Haziot, Vanessa Albuquerque Paschoal Aviz
Bastos, Guilherme Sciascia Olival, André Luís Borba
Paciente de 39 anos, mulher, branca, casada, natural de Pernambuco, reside em São Paulo (SP) há 12 anos, operadora de caixa de supermercado, católica, apresentou-se tendo como queixa principal: “minha vista está ruim de
novo.” No dia 12/02/2011, acordou pela manhã para trabalhar com quadro de
baixa acuidade visual bilateral. “Só consigo ver vultos, pois a vista está muito
embaçada”. Referia que a baixa acuidade era pior no olho direito, onde parecia
haver um “ponto negro no meio da visão”. Na noite anterior, não havia tido
qualquer queixa visual. Negava cefaleia, dor ocular ou qualquer outra queixa
álgica associada ao quadro. Não havia história de febre, trauma, manipulação
ocular ou outros sintomas associados ao quadro.
A paciente também havia acordado pela manhã com baixa acuidade visual,
mas somente no olho direito, quatro semanas antes. “Enxergo embaçado com
esse olho”, um episódio também não associado a dor ou a qualquer outro sintoma. Negava qualquer tipo de evento ou pródromo infeccioso anterior ao quadro
que, permanecendo inalterado após três dias, levou-a a procurar atendimento
oftalmológico. Foi encaminhada para avaliação neurológica de urgência, com
descrição de edema de papila em olho direito e hipótese diagnóstica de neurite
óptica. Foi então internada e submetida à terapia com solumedrol, 1 g/dia,
com melhora total do quadro, recebendo alta assintomática após o terceiro
dia de terapia, para complementar investigação e seguimento ambulatorial.
Realizou, na admissão, ressonância magnética de crânio e órbita, análise de
líquido cefalorraquidiano. Foi prescrita prednisona, com retirada gradual em
duas semanas.
A paciente nega, na tomada de história patológica pregressa, hipertensão
arterial sistêmica, diabetes melito, dislipidemia, doença sexualmente transmissível ou qualquer outro antecedente mórbido. Negava qualquer doença oftalmológica ou neurológica conhecida anteriormente. Negava também tabagismo
ou uso de álcool e outras drogas recreacionais. Como história familiar, relatou
que pai e mãe eram hipertensos.
Ao exame, verificou-se pressão arterial de 110 x 70 mmHg; frequência
cardíaca de 70 bpm e temperatura axilar de 36 °C. O exame físico geral e de
diferentes aparelhos estava sem alterações. Ao exame neurológico, apresentouse vigil, orientada no tempo e espaço, com fala e linguagem sem alterações.
A força muscular foi classificada como Grau V nos quatro membros. Tônus
e trofismo estavam sem alterações. Reflexos osteotendíneos normoativos e simétricos. A sensibilidade estava preservada. Marcha, coordenação e equilíbrio
estavam sem alterações. Foi verificada ausência de sinais de irritação meníngea
e reflexo cutâneo plantar em flexão bilateral.
Figura 1. Oftalamoscopia do olho direito (A). Edema
de papila no centro da imagem e a direita mácula com
visualização parcial. (B) Mácula no centro da imagem, com
exsudatos duros ao seu redor: “estrela macular”.
Movimentos oculares a esclarecer
Tenille Bernardino, Lorena Broseghini
Paciente de 28 anos, sexo masculino, natural e residente de Assis (SP),
casado, segundo grau incompleto, auxiliar de serviços gerais, católico, apresentou-se com quadro de dificuldade para andar e enxergar. Há 60 dias, ao acordar,
percebeu embaçamento visual bilateral: “Parecia que todos os dias eram nublados”. Após três dias, sem melhora, iniciou com descoordenação do membro inferior predominante, com grande dificuldade para andar, associada a tonturas e
vômitos pós-prandiais: “Me sentia como se estivesse tomado todas”. Após dois
dias, somaram-se ao quadro tremores da cabeça. Familiares referiam alteração
da voz, como se estivesse “bêbado” e “gago”. O paciente também referia perda
ponderal de 10 kg em 3 meses. Negava febre, quadros virais ou infecciosos ou
qualquer outro sintoma em cabeça e olhos. Nada havia digno de nota ao interrogatório sobre os diversos aparelhos. Nada digno de nota.
Como antecedentes pessoais, relatou apenas doenças próprias da infância, negando internações, cirurgias prévias ou vacinações recentes. Declarava
ter sido usuário de drogas ilícitas (cocaína e crack), mas parou o uso há
quatro anos.
Como antecedentes familiares, relatou que a mãe, de 54 anos, era hipertensa e portadora de miomatose uteriana. Tinha pai, de 52 anos, dois irmãos e
filha de quatro anos, todos hígidos.
Diagn Tratamento. 2011;16(4):195-205.
199
Ao exame físico, apresentava pressão arterial de 128 x 76 mmHg (milímetros de mercúrio); frequência cardíaca de 68 bpm (batimentos por minuto);
frequência respiratória de 14 rpm (incursões por minuto); dextro 89 mg/ml;
saturação capilar em ar ambiente: 98%.
Ao exame geral, apresentava-se com bom estado geral, lúcido e orientado
no tempo e espaço, corado, hidratado, eupneico, afebril, anictérico, eutrófico.
O exame do aparelho respiratório revelou murmúrio respiratório presente e
simétrico sem ruídos adventícios. O aparelho cardiovascular tinha bulhas normofonéticas em dois tempos com ritmo regular e sem sopros. O abdome estava
flácido, indolor, sem visceromegalias. Membros inferiores estavam sem edema,
com panturrilhas livres.
Ao exame neurológico, o paciente mostrava-se vigil, com pupilas fotorreagentes, direta e consensual, movimentação ocular extrínseca preservada, com
movimentos oculares multidirecionais rápidos e erráticos, linguagem preservada, fala discretamente empastada, mioclonias de segmento cefálico preferencialmente para a esquerda. A marcha era atáxica. A força tinha classe G5 global.
Sensibilidade estava preservada. Os reflexos normoativos, reflexo cutaneoplantar em flexão bilateralmente em flexão bilateral. Havia discreto tremor de ação
em membros superiores em sinais meníngeos.
Os exames laboratoriais tinham os seguintes resultados: hemoglobina:
13 g/dl; sódio: 139 mmol/l; potássio: 4,1 mmol/l; ureia: 31 mg/dl; creatinina:
1 mg/dl; glicemia: 96 mg/dl; TGO (transaminase glutâmico oxalacética): 45 U/l;
TGP (transaminase glutâmico pirúvica): 65 U/l colesterol total: 164 mg/dl; HDL
(lipoproteína de alta densidade): 75 mg/dl; LDL (lipoproteína de baixa densidade): 105 mg/dl; triglicerídeos: 121 mg/dl; hormônio estimulante da tireoide:
14 mUI/l; T4L (T4 livre): 0,8 mUI/l. Era negativo para antiTPO (anticorpos
antiperoxidase tireoidiana) e anti TG (antitireoglobulina). Ferro total: 85 mcg/dl;
ferritina: 150 mcg/l; transferrina: 253 mg/dl. As sorologias para HIV (vírus da
imunodeficiência humana) e hepatites B e C estavam negativas.
O exame do líquido cefalorraquidiano (LCR) demonstrou células: 0,6 número absoluto; proteínas: 39,9 mg/ml; glicose: 68 mg/ml; cloreto: 117 mg/ml.
O exame para VDRL (venereal disease research laboratory) era não reagente;
Gram ausente. Os BAAR (bacilos álcool-ácido resistentes) estavam não reagentes.
Os exames de tomografia computadorizada de tórax e abdome estavam
normais; e o exame físico e a ultrassonografia Doppler testicular estavam normais também.
O antígeno carcinoembrionário negativo (CEA) foi negativo, assim como a
alfafetoproteína: normal e a gonadotrofina coriônica humana (BHCG): normal.
A conclusão diagnóstica foi de síndrome opsoclonus mioclonus a esclarecer.
após duas semanas do início do quadro por falência respiratória, devido a broncopneumonia. A autópsia não evidenciou presença de neoplasia.
Discussão: As miopatias inflamatórias são doenças musculares primárias,
que se caracterizam por fraqueza muscular proximal simétrica, de evolução insidiosa. A associação entre polimiosite/dermatomiosite e neoplasias é sugerida
desde 1916. Há relato do aumento de ocorrência de neoplasias de ovário, mama,
pulmão, útero, estômago, cólon e doenças linfoproliferativas nessa população.
A pesquisa exaustiva de neoplasia está indicada nos dois a três anos após o diagnóstico (período de maior risco). O diagnóstico de câncer pode preceder, vir
em paralelo ou posteriormente ao diagnóstico de miosite. O mais comum é o
câncer diagnosticado após o início da miosite. A biópsia muscular revela caracteristicamente infiltrado inflamatório, sinais de degeneração/regeneração muscular
ou atrofia perifascicular (característico da dermatomiosite). Em pacientes com
miopatia inflamatória (polimiosite ou dermatomiosite) e neoplasia (de forma
concomitante ou diagnóstico durante seguimento), não há descrição na literatura
de achados de biópsia muscular específicos que as diferenciem da doença primária. O setor de patologia neuromuscular da Unifesp, possuindo um dos maiores
acervos mundiais de patologia muscular (10.000 biópsias com estudo istoquímico), tem percebido a ocorrência íntima entre a inflamação epimisial e neoplasias.
Sabemos que o infiltrado inflamatório na polimiosite é composto predominantemente de células T CD8 e macrófagos, no entanto, estudo imunoistoquímico
ainda se faz necessário para determinar a origem do infiltrado celular epimisal.
Diante da observação dessa frequente associação, acreditamos que a demonstração de inflamação epimisial poderá ser usada como marcador para investigação da presença de neoplasias concomitantes.
Polimiosite com inflamação epimisial
Mariana Lacerda Santos Reis, Lorena Broseghini Barcelos, Jamile
Seixas, Thiago Fukuda, Renata Amaral Andrade
Introdução: É relatado caso de paciente com polimiosite em fase avançada
e idade incomum, com achados particulares de biópsia muscular compatíveis
com polimiosite com inflamação epimisial.
Relato de caso: Paciente feminina, 70 anos, viúva, trabalhadora de serviços
gerais, natural de Minas Gerais e procedente de São Paulo. Atendida no ProntoSocorro do Hospital São Paulo com queixa de piora da dispneia há 24 horas,
apresentando história de fraqueza progressiva em membros inferiores há 13 meses, que progrediu para cintura pélvica após 30 dias, acarretando impossibilidade de deambulação. Após seis meses, iniciou fraqueza de membros superiores,
que progrediu para cintura escapular e musculatura cervical, impossibilitando a
sustentação da cabeça. Há quatro meses iniciou disfagia inicialmente para líquidos, progredindo para sólidos há dois meses. Há uma semana iniciou quadro de
dispneia e tosse produtiva, com piora há um dia.
Exame físico inicial apresentava-se com tetraparesia flácida simétrica de
predromínio proximal e hiporreflexa. Exames laboratoriais tinham elevação
de creatinofosfoquinase (CPK) (1.063 U/L), marcadores neoplásicos negativos (alfafetoproteína: 2,4 mg/ml; Ca 19-9: 41 U/ml; Ca 125: 18,70 U/ml.
Eletroneuromiografia evidenciou miopatia grave com sinais de inflamação.
Biópsia muscular apresentava infiltrado inflamatório intersticial, com imagens
de necrose e reação macrofágica (Figuras 1 e 2). Ressalta-se que este infiltrado
apresenta a particularidade de comprometer o tecido fibroadiposo perimisial
e epimisial. A paciente evoluiu com piora clínica, a despeito da introdução de
pulsoterapia com metilprednisolona e prednisona 1 mg/kg/dia, e para óbito
Diagn Tratamento. 2011;16(4):195-205.
Figura 1. Duas imagens de histologia do mesmo caso, com
coloração por hematoxilina eosina, evidenciando processo
inflamatório intersticial, necrose, macrofagia e profliferação
fibrosa com involução gordurosa (125 X 250).
200
Figura 2. Coloração de Gomori demonstra processo
inflamatório intersticial, necrose, macrofagia e profliferação
fibrosa com involução gordurosa (125 X 250).
Figura 1. Paciente com hipertrofia de membros inferiores.
Síndrome de hiperexcitabilidade no nervo periférico
Daniella Dias Arçari, Alzira Alves de Siqueira Carvalho
Setor de Neurologia – Ambulatório Neuromuscular - Faculdade de Medicina do ABC
Paciente de 36 anos, natural de São José do Rio Preto (SP), procedente do
Japão, foi atendido no serviço de Neuromuscular da Faculdade de Medicina
do ABC, com queixa principal de dor muscular generalizada. Há cinco anos,
iniciou quadro de dor muscular nos membros superiores, com piora ao realizar
exercícios, limitando os movimentos. Após meses, passou a sentir as mesmas
dores nos membros inferiores, associadas à hipertrofia das panturrilhas. Sentia
a “carne tremer”, principalmente as coxas. Após um ano do início dos sintomas,
passou a apresentar dificuldade para correr e subir escadas, as pernas ficavam
enrijecidas e, após alguns segundos, conseguia retornar o movimento. Negava
comorbidades, tabagismo e etilismo, e tinha pais e irmãos saudáveis.
Ao exame físico geral, apresentava-se corado, hidratado, acianótico e anictérico. O aparelho cardiovascular tinha ritmo cardíaco regular, em dois tempos, e
bulhas normofonéticas. O aparelho respiratório apresentava murmúrio vesicular
presente sem ruídos adventícios, extremidades sem edema e bem prefundidas.
Outros exames: hemoglobina: 15,3 mg/dL, leucócitos: 4400, transaminase glutâmico-oxalacético: 20 U/L (< 32 U/L), transaminase glutâmico pirúvica:
60 U/L (< 31 U/L), creatinofosfoquinase: 184 U/L (< 180 U/L). TSH (hormônio estimulante da tireoide) e T4L (T4 livre): normais. Tomografia computadorizada de tórax, abdômen e pelve mostraram-se sem alterações.
Ao exame neurológico, apresentava-se vigil, orientado no tempo e no espaço, sem alteração da fala ou linguagem. A inspeção demonstrou: hipertrofia
de membros inferiores (Figura 1), fenômenos neuromiotônicos em mãos, fasciculações nos quatro membros. Força muscular apresentava-se como grau V
nos quatro membros. Os reflexos tendinosos estavam hipoativos globalmente.
Havia reflexo cutâneo plantar em flexão bilateral. As sensibilidades superficial
e profunda estavam preservadas, assim como a coordenação, o equilíbrio e a
marcha. Nervos cranianos: preservados.
Foi realizada eletroneuromiografia, que evidenciou alterações compatíveis com
atividade elétrica contínua (descargas neuromiotônicas) e mioquimias (Figura 2).
Diante do diagnóstico de síndrome de hiperexcitabilidade do nervo periférico, foi pesquisada a presença do anticorpo VGKC (anti-voltage-gated potassium channel antibodies), em busca da etiologia da síndrome. O resultado do
anticorpo foi de 243 pmol/L (valor normal: até 100 pmol/L), confirmando o
diagnóstico de síndrome de hiperexcitabilidade do nervo periférico ou síndrome de Isaacs de etiologia autoimune.
O paciente recebeu tratamento com imunoglobulina humana 0,4 g/kg/dia.
Após o primeiro ciclo, apresentou melhora dos fenômenos neuromiotônicos
em mãos. Após a administração da imunoglobulina, foi dosado novamente anticorpo antiVGKC, com resultado negativo. Atualmente, retornou para o Japão
e recebe carbamazepina, 200 mg/dia, com bom controle dos sintomas.
Figura 2. Eletromiografia: A – descargas mioquímicas e
neuromiotônicas no músculo tibial anterior. B – descargas
neuromiotônicas no músculo abdutor do quinto dedo.
Diagn Tratamento. 2011;16(4):195-205.
201
Doença de Niemann-Pick tipo C
Lorena Broseghini Barcelos, Marcelo Marinho de Figueiredo,
Maria Regina Regis Silva, José Luiz Pedroso, Orlando Barsottini
Paciente de 30 anos, natural e procedente de São Paulo, do lar, segundo
grau completo, apresenta como queixa principal alteração para andar há 14
anos. A mãe relata que a paciente, aos 16 anos, iniciou quadro de dificuldade
para deambular. Familiares perceberam fala embolada e lenta há nove anos,
evoluindo com alteração cognitiva, raciocínio mais lento, dificuldade na memória e apatia, com piora progressiva e lenta até o momento. Nos últimos anos,
progrediu com disfagia para sólidos e lentidão dos movimentos. Como antecedentes pessoais, a paciente apresenta nódulo mamário benigno e depressão. Faz
uso de carbamazepina, 200 mg, de 12/12 horas. Na história familiar, constam
pais consanguíneos, primos de primeiro grau.
Ao exame físico, apresenta-se com bom estado geral, corada, hidratada, afebril, acianótica, anictérica. Aparelho cardiovascular com bulhas normofonéticas,
dois tempos, ritmo cardíaco regular, sem sopros, frequência cardíaca: 70 bpm,
pressão arterial: 120/80 mmHg. Aparelho respiratório com murmúrio vesicular
fisiológico sem ruídos adventícios, eupneica. O abdome estava flácido, indolor,
com peristalse presente, sem massas palpáveis. Os membros inferiores sem edema, com pulsos periféricos presentes. A paciente estava vigil, parcialmente orientada no tempo e orientada no espaço, com disartria grave, marcha atáxica, força
muscular grau V global, reflexos osteotendíneos 3+ em membros superiores e 4+
nos inferiores, reflexo cutâneo-plantar sem resposta bilateral. Na coordenação,
evidenciava-se dismetria e disdiadococinesia bilateral. A sensibilidade estava normal. A paciente tinha postura distônica presente nos quatro membros. Oftalmoparesia do olhar vertical estava presente e fundo de olho normal.
As hipóteses diagnósticas sindrômicas levantadas foram: síndrome cerebelar,
síndrome de oftalmoparesia vertical, síndrome distônica, síndrome de déficit cognitivo leve e síndrome piramidal de liberação. Outras hipóteses diagnósticas foram
ataxias recessivas: ataxia com apraxia óculo-motora tipos 1 e 2, ataxia de Friedreich,
abetalipoproteinemia e ataxia com deficiência de vitamina E. Possíveis doenças mitocondriais: deficiência de CoQ10, síndrome de Leigh, MERRF (Myoclonic Epilepsy with Ragged Red Fibers), NARP (Neuropathy, Ataxia, and Retinitis Pigmentosa)
e síndrome de Kearns-Sayre. Entre as doenças lisossomiais: doença de NiemannPick, xantomatose cerebrotendínea, gangliosidoses e sialidoses.
A ressonância magnética de crânio e medula cervical revelou sinais de discopatia degenerativa incipiente em coluna cervical, sem protrusões ou extrusões
discais expressos. Não se identificaram sinais de atrofia ou alteração de sinal no
parênquima encefálico ou medula espinhal cervical. Havia ausência de realces
anômalos definidos. Eletroneuromiografia e eletroencefalograma estavam normais. A biópsia de medula óssea mostrou numerosos macrófagos volumosos
com citoplasma de aspecto xantomatosos. O aspecto morfológico era compatível com doença de Niemann-Pick (Figura 1). Ao mielograma, a medula óssea
mostrava leve hemodiluição, displasia leve da série vermelha e macrófagos com
grânulos azuis e depósito compatível com a doença de Niemann-Pick C.
O diagnóstico final foi de doença de Niemann-Pick tipo C.
Figura 1. Biópsia de medula óssea, visualizando-se macrófagos
volumosos com citoplasma de aspecto xantomatoso.
Diagn Tratamento. 2011;16(4):195-205.
Acompanhamento de pacientes com esclerose
múltipla com imunomodulador suspenso
Vitor Breseghello Cavenaghi, Vitor Serafim de Faria,
Guilherme Sciascia do Olival, Rodrigo Barbosa Tomaz,
Charles Peter Tilbery
Centro de Atendimento e Tratamento da Esclerose Múltipla, Faculdade de Ciências Médicas
da Santa Casa de São Paulo.
Esclerose múltipla (EM) é uma doença desmielinizante do sistema
nervoso central. As drogas de primeira linha, modificadoras da história
natural da doença, são os interferons-beta e o acetato de glatiramer. Em
alguns pacientes, a resposta terapêutica é eficaz, o que permite, eventualmente, propor a sua suspensão. Vale ressaltar que essa conduta deve ser
criteriosa e tomada em conjunto com o paciente. Neste trabalho, objetivamos demonstrar a evolução de pacientes com EM, sem crises há mais de
cinco anos e estáveis radiologicamente, que tiveram imunomoduladores
suspensos.
Foram selecionados 31 pacientes portadores de EM remitente-recorrente que fizeram uso contínuo de imunomoduladores, por no mínimo cinco
anos, e tiveram o imunomodulador suspenso pois estavam sem surtos durante esse período, e com a imagem de ressonância nuclear magnética (RNM)
estável. Foram avaliadas diversas características clínicas e o aspecto da RNM
realizadas anualmente.
Foram 93,5% pacientes do sexo feminino e 6,5% do sexo masculino.
A análise dos dados revelou a idade média de início do tratamento como
de 39 anos. Os pacientes tiveram em média 2,5 surtos prévios ao tratamento, sendo 59% surtos sensitivos, 13% surtos motores e 28% surtos
com acometimento de nervos cranianos. O intervalo entre o diagnóstico e
início do tratamento foi em média de 4,7 anos, e os pacientes utilizaram
entre 5 e 12 anos de imunomodulador, em média de 5,6 anos. O escore
da EDSS (Escala Expandida do Estado de Incapacidade), ao início do tratamento, era em média de 1,3 e, no momento da suspensão, de 1,7. Os
pacientes estão sendo observados entre um e cinco anos após a suspensão
do tratamento, com média de dois anos, e apenas dois (6%) deles tiveram
novo surto. Destes pacientes, três (9%) apresentaram piora da RNM no
acompanhamento anual.
Conforme estudos, aproximadamente 70% dos pacientes com EM
respondem ao uso de imunomoduladores. Porém, essas medicações não
visam eliminar os surtos, mas apenas reduzir a frequência destes e, assim,
tentar evitar o acúmulo de incapacidades neurológicas que a doença pode
causar. A avaliação de atividade da doença e resposta terapêutica muitas
vezes é difícil pela ausência de biomarcadores, e os principais parâmetros
utilizados são clínicos e imagenológicos. Apesar de os consensos recomendarem o uso continuado da terapia imunomoduladora, atualmente é
incerto por quanto tempo o tratamento deve ser mantido para a aquisição
de benefício máximo, já que os períodos dos estudos clínicos tendem a
ser mais curtos do que o período de uso clínico das medicações. Deve-se
lembrar que, frequentemente, essas drogas têm efeitos adversos que podem ser toleráveis, o que não contraindica o uso delas, mas continuam
causando desconforto ao paciente. Além disso, essas drogas são injetáveis,
o que soma desconforto no uso continuado dessas medicações – a exceção
é o fingolimode, droga recentemente aprovada pelo FDA (Food and Drug
Administration) para uso como primeira linha de tratamento para EM
de uso via oral.
Alguns estudos demonstram que o principal impacto da terapia imunomoduladora ocorre nos pacientes com altas taxas de surto de EM. Dentro desse contexto, é lógico considerar a suspensão dessas drogas para
pacientes com boa evolução da doença que estejam sem surtos clínicos
há pelo menos cinco anos e estáveis nas imagens de RNM de crânio. Essa
decisão compreende riscos que devem ser compreendidos e assumidos de
forma compartilhada com o paciente, além do compromisso de retorno à
medicação no caso de piora clínica ou imagenológica.
A maioria dos pacientes selecionados para a suspensão do uso de
imunomoduladores, com os critérios utilizados, apresentou boa evolução
clínica.
202
Liga Acadêmica de Neurociências da Universidade
Federal de Santa Maria – Neuroliga (UFSM)
Cintia Junia Masson, Fabrício Diniz Dutra, Caroline Mayara
Kavalco, Adriana Maria de Almeida, Ana Lucia Cervi Prado, Luciano
Hartmann
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Santa Maria (RS)
A Neuroliga da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) foi criada
em 2007 como um projeto de extensão e pesquisa que buscava adicionar
conhecimento às áreas de neurociências básicas e clínicas. A ideia partiu
de acadêmicos da medicina que buscavam complementar sua formação. A
partir do ano de 2010, a Neuroliga (UFSM) foi reestruturada, tornandose o grupo mais coeso e participativo, agrupando outros cursos da saúde,
como fisioterapia e psicologia. Atualmente, a Neuroliga (UFSM) conta com
a participação de profissionais e/ou acadêmicos dos cursos de medicina (subáreas de neurologia, psiquiatria, pneumologia, neuropediatria, neurocirurgia
e anestesiologia), fisioterapia, educação física, farmácia e bioquímica, psicologia e terapia ocupacional. A Neuroliga (UFSM) é composta por 32 membros, divididos em 12 departamentos, sendo cada departamento orientado
por no mínimo dois profissionais, com tutoria de um profissional para cada
acadêmico. A orientação da Neuroliga (UFSM) se dá por um coordenador
geral e um vice-coordenador, professores ou funcionários, e uma diretoria
executiva composta por presidente, vice-presidente, secretário e tesoureiro,
todos acadêmicos.
As áreas das neurociências básicas e clínicas abordadas são dor, memória,
neurofisiologia e neurofarmacologia, sono, reabilitação neurológica, transtornos mentais e emoções, epilepsias, neurologia vascular, neuropediatria, neuroanatomia e neurocirurgia, doenças neurodegenerativas e desmielinizantes e
neuroimagem.
A Neuroliga (UFSM) tem como objetivos gerais mobilizar e orientar alunos interessados em estudar as neurociências básicas e clínicas nos âmbitos
da pesquisa, ensino e extensão, e na qualificação do atendimento inicial ao
paciente com doença neurológica e/ou transtorno mental. Além disso, busca
contribuir na formação do acadêmico independentemente de vínculo direto
ou indireto às neurociências na futura atuação profissional. Os objetivos específicos são formular projetos de pesquisa e extensão junto às Unidades Básicas
de Saúde, Estratégia de Saúde da Família, casas de repouso e escolas; contribuir
na pesquisa médica na avaliação inicial do paciente com afecção do sistema
nervoso central grave, por meio de desenvolvimento de protocolos, rotinas e
projetos de pesquisa; manter intercâmbio científico e associativo com outras
ligas da UFSM e com ligas acadêmicas de neurociências de outras instituições.
Além disso, objetiva realizar eventos relacionados ao estudo das neurociências,
como palestras, congressos, encontros e cursos.
O trabalho científico da Neuroliga (UFSM) é organizado em reuniões semanais dentro de cada departamento, nas quais se discutem temas relacionados
ao assunto e se realizam projetos de pesquisa na área de abrangência. A cada
15 dias, são realizados encontros gerais organizados por até três departamentos,
com a escolha de um tema a ser debatido por todos os membros e orientadores
da Neuroliga (UFSM), além de convidados. Para discussão de pautas relacionadas ao funcionamento e organização geral da Neuroliga (UFSM), são realizadas
reuniões administrativas, nas quais diretoria e membros decidem o que será realizado a curto e longo prazos pelo grupo, bem como a resolução de problemas.
Na área de extensão, a Neuroliga (UFSM) realiza anualmente o Curso
de Metodologia em Pesquisa e a Jornada de Neurociências da UFSM, na qual
participam palestrantes nacionais e internacionais. Tendo como um de seus
carros-chefes, a Neuroliga (UFSM) organiza a Semana de Combate ao acidente
vascular encefálico (AVE) no período de 23 a 29 de outubro (Dia Mundial de
Combate ao AVE), que utiliza a mídia rádio-televisiva e realiza ações junto à
comunidade para promoção da saúde e prevenção do AVE.
No campo da pesquisa, a Neuroliga (UFSM) conta com pesquisadores
de renome internacional, tendo como área de destaque a Neurofarmacologia e as Epilepsias, pesquisando, entretanto, em todas as áreas abrangidas
pelos departamentos. Também no estudo do AVE, temos o projeto AVE
MS-SIECV-SITS-HUSM, baseado no projeto iniciado pelo Instituto Karolinska – Suécia, que consiste em uma iniciativa internacional para estudo da
prevalência e incidência de AVE em diversos países, e também a forma de
apresentação e fatores de risco associados. Esse projeto foi organizado, financiado e implantado no Hospital Universitário de Santa Maria (HUSM) pela
Neuroliga (UFSM) através de seus membros e orientadores. Além do objetivo
epidemiológico, existe a meta terapêutica de implantação do tratamento de
AVE isquêmico com ativador do plasminogênio tissular recombinante (rtPA) nos pacientes atendidos pelo HUSM.
A Neuroliga-UFSM tem como propostas aumentar a efetividade da atenção primária da população de Santa Maria relacionada à neurologia e psiquiatria, qualificar profissionais da saúde no atendimento de AVE e implementar
no HUSM o tratamento com a rt-PA em pacientes com AVE-isquêmico, promover eventos relacionados às neurociências de maior abrangência acadêmica
local e regional, contribuir com a prevenção e promoção da saúde da população
através de palestras e cursos a serem ministrados em escolas, postos de saúde e
instituições que fazem atendimento imediato de urgências e emergências neurológicas e psiquiátricas.
Cefaleia de curta duração, unilateral, neuralgiforme
com hiperemia conjuntival e lacrimejamento
(SUNCT). Relato de caso
Roger Neves Mathias, Alberto Luiz Cunha da Costa
Departamento de Neurologia, Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp)
Objetivos: Descrever um caso de síndrome de cefaleia neuralgiforme unilateral e refratária ao tratamento, classificada como SUNCT.
Método: Paciente de 59 anos, parda, encaminhada para avaliação em novembro de 2010. Apresentava há quatro anos episódios diários de dores incapacitantes, praticamente contínuos, localizados na região fronto-temporal e periorbitária direita, em pontadas. Frequentemente despertava com a dor, que era
exacerbada durante escovação dos dentes e mastigação, associada à hiperemia
conjuntival e rinorreia serosa à direita. Durante as crises, apresentava náuseas,
fono e fotofobia. Referia um episódio semelhante há oito anos com duração
de sete dias. Permaneceu assintomática por quatro anos até o início do quadro atual. Foi submetida a vários esquemas de tratamento medicamentoso sem
controle satisfatório da dor, incluindo carbamazepina 800 mg/dia, propranolol
80 mg/dia, ácido valproico 750 mg/dia, amitriptilina 50 mg/dia, pregabalina
150 mg/dia, indometacina 100 mg/dia, tenoxican 40 mg/dia, dipirona 2 g/dia
e diclofenaco 150 mg/dia. Há seis meses, após paralisia facial periférica à direita,
experimentou uma piora intensa da dor. O exame neurológico mostra paralisia facial periférica direita e hiperemia conjuntival com rinorreia clara à direita.
Exame cefaliátrico normal. Tomografia de crânio com e sem contraste normal e
ressonância magnética demonstra leve espessamento inflamatório das mucosas
dos seios frontal, maxilar, esfenoidal, etmoidal à direita. Exames laboratoriais
foram normais, exceto discreta elevação da velocidade de hemossedimentação e
proteína C reativa. Está em uso de fenitoína 300 mg/dia e medicação sintomática, com redução marcante da intensidade, persistindo com crises diárias.
Conclusão: Síndrome de dor unilateral de curta duração foi descrita recentemente e se tornou conhecida após a publicação da classificação internacional das cefaleias. É uma entidade rara, com resposta variável ao tratamento
farmacológico. Fenitoína pode ser uma alternativa de baixo custo para esta
condição.
Liga de Neurociências da Faculdade de Ciências Médicas
da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)
Areta Cavalcanti Ferreira, Bruno Yukio Kubota, Mateus Paquesse
Pellegrino, Walquíria Cavalari D´Avanzo, Fabio Coltro Neto, Ivan
Bazan, Li Li Min, Paula Teixeira Fernandes
A Liga de Neurociências da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) nasceu em 2005 com a fusão das Ligas de Neurologia e de Neurocirurgia, as quais foram fundadas em 2000 e 1998, respectivamente. É composta
por seis coordenadores e 58 ligantes. Desde a sua fundação, tem como objetivos
principais a realização de pesquisa, o ensino e a extensão nas áreas de abrangência das Neurociências.
A importância de a Liga realizar pesquisas está em ampliar o campo de
conhecimento, fornecer dados epidemiológicos de doenças neurológicas e, sobretudo, desafiar os ligantes a explorar, aprofundar e questionar, construindo
e atualizando seu próprio conhecimento. Neste contexto, a Liga está desenvolvendo, neste ano de 2011, oito projetos de pesquisa nas áreas de Neurologia e
Neurocirurgia com 24 acadêmicos ligantes.
Outro pilar fundamental para a Liga é o ensino. Um assunto amplo e complexo como Neurociências dificilmente consegue ser transmitido de maneira
Diagn Tratamento. 2011;16(4):195-205.
203
integral nos cursos médicos, dada a limitação de carga horária. Por isso, a Liga
oferece aulas teóricas semanais ministradas por docentes e residentes, visando
aprofundar o conhecimento de alunos com interesse no tema. O ensino também é desenvolvido através do acompanhamento dos ambulatórios e dos plantões de emergências neurológicas e neurocirúrgicas no Hospital das Clínicas da
Unicamp. Nestas ocasiões, os alunos podem aprender e discutir, na prática, os
assuntos abordados nas aulas teóricas com professores e residentes.
Já a extensão comunitária visa, sobretudo, informar e conscientizar a comunidade sobre doenças neurológicas, promovendo a troca mútua de conhecimentos e de experiências entre os ligantes participantes do projeto e a sociedade. Com isso, os acadêmicos podem exercer seu dever social de multiplicar o
conhecimento adquirido durante sua formação no ensino superior. Atualmente, a Liga está desenvolvendo o projeto “Conscientização do Acidente Vascular
Cerebral entre estudantes do Ensino Fundamental e Médio de escolas públicas
do município de Campinas” o qual foi contemplado com apoio financeiro, obtido mediante aprovação no “Programa Adote-me Transfor-ME” da Faculdade
de Ciências Médicas da Unicamp e no “4o Edital para projetos de extensão
comunitária” da Pró-Reitoria de Extensão da Unicamp.
A Liga, desde sua fundação, também se dedica à organização e à participação em eventos acadêmicos e de divulgação na área de Neurociências. Auxilia na
organização do “Simpósio de AVC-Campinas”, da “Jornada de Neurociências
da Unicamp”, da campanha “Dia Mundial de Combate ao AVC” e, por meio
de uma parceria com a ASPE (Assistência à Saúde de Pacientes com Epilepsia),
também auxilia na realização da “Semana Nacional de Epilepsia”.
Sabendo da importância da troca de experiências e da integração entre as
Ligas de Neurologia e Neurocirurgia, a Liga de Neurociências da Unicamp idealizou e está organizando o Primeiro Encontro Nacional das Ligas de Neurociências
do Brasil, que ocorrerá nos dias 5 e 6 de novembro de 2011 na Faculdade de
Ciências Médicas da Unicamp. O evento já tem a confirmação das Ligas de Neurologia e Neurocirurgia das escolas de Medicina mais renomadas do país.
Apesar do grande empenho dos acadêmicos coordenadores, a Liga enfrenta
alguns desafios e obstáculos. Um de seus maiores desafios é de manter sua continuidade, uma vez que seus participantes e coordenadores estão em constante
troca: alguns se formam e outros novos ingressam. Uma das soluções encontradas recentemente para manter a continuidade dos projetos e objetivos da
Liga foi a de treinar novos coordenadores a cada ano, repassando os projetos e
princípios norteadores da Liga.
Outro grande desafio é conseguir a adesão e participação de novos acadêmicos. Uma solução para esse problema, encontrada este ano, foi a de realizar
o Curso Introdutório para Ingresso na Liga, o qual teve ampla divulgação na
faculdade. Nesse curso, a Liga apresentou suas atividades e despertou o interesse de muitos alunos, os quais se tornaram ligantes e começaram a participar de
forma efetiva das atividades da Liga.
A proposta da Liga de Neurociências da Unicamp para não permitir que o
Encontro das Ligas seja um evento isolado e para estreitar ainda mais os laços
entre elas é de desenvolver pesquisas multicêntricas com as demais Ligas de
Neurologia do Estado de São Paulo. Desse modo, poderíamos obter dados mais
diversificados, com um retrato mais fidedigno do nosso país, o que enriqueceria
muito as pesquisas na área. Além disso, a Liga gostaria de propor também a
realização de projetos de extensão multicêntricos e simultâneos, comparando
resultados e discutindo formas de atingir melhores resultados.
A Liga de Neurociências da Unicamp espera, então, poder participar do
Encontro de Ligas de Neurologia no VIII Congresso Paulista de Neurologia
para explicar detalhadamente seu trabalho e, em especial, para trocar experiências, informações e propostas com as demais Ligas do Estado de São Paulo,
enriquecendo assim sua atividade.
Projeto – Liga de Neurologia da Faculdade de
Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo
Ana Beatriz Ayroza Galvão Ribeiro Gomes, Gabriela Suemi Shimizu,
Mauro Henrique Júnior, Elisabeth de Albuquerque Cavalcanti
Callegaro, Vinicius Andreoli Schoeps, Fernando Morelli Calixto,
Mariana Monteiro Saldanha Altenfelder Santos, Ada Pellegrinelli,
Guilherme de Souza Cabral Muzy, Marcel Simis, Rubens José
Gagliardi
Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo
A fim de aprofundar os estudos na área de Neurologia Clínica, acadêmicos da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo fundaram,
em 2009, a Liga de Neurologia. Sob a coordenação do Prof. Dr. Rubens José
Gagliardi, e orientação do Dr. Marcel Simis, em seu primeiro ano de atuação,
Diagn Tratamento. 2011;16(4):195-205.
a Liga manteve aulas quinzenais sobre tópicos como “Pesquisa Clínica” (Prof.
Dr. Rubens Gagliardi), “Queixa de Memória no Idoso” (Prof. Dr. Paulo Bertolucci), ”Reabilitação Neurológica” (Dra. Vera Lúcia dos Santos Alves), “Punção
do Líquor – Aula Prática” (Dr. Álvaro Martins) e “Propedêutica dos Nervos
Cranianos” (Dr. Marcel Simis), abordando tópicos como propedêutica neurológica, neurologia clínica, pesquisa científica e estimulando a realização de
pesquisa por acadêmicos dentro da Disciplina de Neurologia. Foram iniciados
trabalhos sobre assuntos como: acidente vascular cerebral (AVC), distúrbios do
sono, cefaleia, epilepsia, demência e neuroestimulação. Além disso, em janeiro
e fevereiro de 2011, dois membros da Liga tiveram a oportunidade de realizar
intercâmbio acadêmico em um laboratório da Harvard Medical School através
de sua atuação na Liga.
A Liga de Neurologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa
de São Paulo visa estimular o interesse acadêmico pela área clínica, expandir
e aprimorar o conhecimento de seus membros na área de Neurologia e incentivar a pesquisa através da realização de trabalhos científicos na Disciplina de
Neurologia.
A Liga mantém-se como uma das ligas acadêmicas com maior número de
membros na Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Além
dos alunos do Curso de Medicina, há muitos membros dos cursos de Enfermagem, de Fonoaudiologia, bem como fisioterapeutas, fonoaudiólogos e também
residentes da Neurologia da Faculdade.
Além das aulas teóricas de neurologia clínica e propedêutica neurológica,
em 2011 realizaremos aulas práticas com a presença do paciente em questão,
sendo realizados, em adição à anamnese, o exame físico, com posterior discussão de seu caso. Para isso, contaremos com a ajuda de professores e residentes
da Neurologia. Acreditamos que essas experiências enriqueçam a formação
médico-acadêmica dos membros da Liga. Além disso, realizaremos, no Dia
Mundial do AVC, uma campanha, o “Mutirão do AVC”, no qual pretendemos
promover o conhecimento acerca da doença, dos fatores de risco que contribuem para a sua ocorrência, de meios para a sua identificação e das condutas
a serem seguidas na sua vigência. Pretendemos, ainda, continuar a manter um
vínculo da Liga com centros de pesquisa no exterior, oferecendo a certos alunos
a oportunidade de conhecerem de perto métodos de pesquisa e avanços tecnológicos que medeiam o ensino em outros países.
Influência do diabetes e da hipertensão arterial na
agregação plaquetária por ácido acetilsalicílico,
na prevenção secundária do acidente vascular
cerebral isquêmico
Aron Augusto Jorge, Henrique Alkalay Helber, Helvécio de Resende
Urbano Neto, Guilherme Sciascia do Olival, Lina Thomas, Rubens
José Gagliardi
Ambulatório de Doenças Cerebrovasculares da Santa Casa de São Paulo
A antiagregação plaquetária é a principal terapia para prevenção secundária do acidente vascular cerebral isquêmico (AVCi). A curva de agregação
plaquetária (CAP) possibilita avaliar laboratorialmente a eficácia da agregação.
Têm sido citados fatores de risco como hipertensão arterial (HA) e diabetes,
que podem influenciar a resistência à antiagregação. O objetivo deste trabalho
é analisar eventual influência da HA e do diabetes na antiagregação com ácido
acetilsalicílico (AAS) em diferentes doses.
Este estudo observacional transversal retrospectivo foi realizado com doentes com AVCi regularmente medicados com AAS, acompanhados com a CAP.
Foram selecionados 195 pacientes com AVCi prévio, destes, 127 hipertensos
hipoagregados e 45 diabéticos hipoagregados. O paciente foi considerado hipoagregado quando a reação com ADP/adrenalina estava inferior a 70%. Foram
comparados subgrupos de doentes com doses 100, 200 e 300 mg/dia de AAS.
Do total, 165 pacientes estavam hipoagregados, sendo 127 hipertensos e 38 normotensos. Entre os hipertensos, 23 hipoagregaram com dose de
100 mg/dia, 71 com 200 mg/dia e 33 com 300 mg/dia. Entre os normotensos
8, 20 e 10 pacientes hipoagregaram, respectivamente, com essas doses. Entre os
diabéticos, 45 estavam hipoagregados, sendo 11 com dose 100 mg/dia, 25 com
200 mg/dia e 9 com 300 mg/dia. Entre os 120 pacientes não diabéticos, 20, 66
e 34 hipoagregaram, respectivamente, nos subgrupos.
Em relação à hipertensão, não notamos influência da dose para a eficácia
da antiagregação (P = 0,91). Entre os diabéticos, a casuística mostra tendência
de menor hipoagregação com 300 mg/dia AAS (P = 0,38). É importante ressaltar que a amostragem de diabéticos foi pequena, sendo necessário mais estudos
para ratificar este resultado.
204
Fístula dural artério-venosa na apresentação da
trombose venosa cerebral
Vanessa Albuquerque Paschoal Aviz Bastos, Keila Narimatsu, Guilherme
Brasileiro de Aguiar, Mário Luiz Marques Conti, Rubens José Gagliardi
Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo
Mulher de 40 anos, do lar, natural de São Miguel (RN), procedente de São
Paulo, casada, apresentou-se tendo como queixa principal, desmaio. Foi admitida e encaminhada de outro serviço com história de rebaixamento do nível
de consciência há um dia, acompanhado de cefaleia holocraniana em aperto,
intensidade 9/10, refratária a analgesia, que piorava ao decúbito e aos esforços
físicos. Foi relatado zumbido à direita; turvação visual.
Como antecedentes pessoais, referia diabetes mellitus, hipotireoidismo,
trombose de seio sagital superior há 17 meses, associado ao uso de anticoncepcionais orais.
Nada digno de nota havia como antecedentes familiares.
Ao exame físico, mostrava bom estado geral, afebril, acianótica, eupneica,
normocorada, com pressão arterial de 110 X 70 mmHg. Auscultas cardíaca e
pulmonar sem alterações; abdome sem alterações.
O exame neurológico mostrou que estava vigil, orientada no tempo e
espaço. Fala e linguagem sem alterações. Força muscular grau V nos quatro
membros. Sensibilidade superficial e profunda sem alterações. Reflexos osteotendíneos normoativos globalmente. Reflexos cutâneo-plantares em flexão bilateralmente. Equilíbrio, coordenação e marcha sem alterações. Pupilas isocóricas
fotoreagentes. Movimentação ocular extrínseca sem alterações. Fundo de olho
com edema de papila bilateral. Nervos cranianos V, VII, IX, X, XI e XII sem
alterações. Sem sinais meningorradiculares.
As hipóteses diagnósticas foram de acidente vascular cerebral (AVC) hemorrágico, secundário a trombose de seio venoso; hipotireoidismo, diabetes
melittus e pseudotumor cerebral.
Foram solicitados tomografia de crânio, ressonância magnética (RM) de
encéfalo com angiografia e angiografia de vasos intracranianos.
Foi realizada embolização de fístula dural. Anticoagulação foi iniciada após
a correção da fístula. A paciente está assintomática há cinco meses desde a correção da fístula dural.
A trombose venosa cerebral (TVC) é uma doença cerebrovascular pouco
diagnosticada, com potencial de complicações graves, que atinge predominantemente indivíduos jovens e de meia-idade. O quadro clínico e de morbimortalidade é variável: cefaleia, edema de papila, déficit visual, crises convulsivas
parciais e generalizadas, déficit neurológico focal, confusão mental, alteração do
nível de consciência e coma, quemose, dor facial, paresia de nervo craniano.
Há duas teorias que explicam o desenvolvimento da TVC: a primeira se
refere a um aumento da pressão venosa, o que reduz a pressão de perfusão
nos capilares venosos, aumentando o volume de sangue, não sendo suportado
pela rede de colaterais, havendo então quebra de barreira, desenvolvendo-se
edema vasogênico. O segundo mecanismo ocorre pela oclusão dos seios durais,
resultando em diminuição na absorção do fluido cerebroespinhal, elevando a
pressão intracraniana (PIC).
O risco de desenvolver TVC depende do perfil genético individual. Na
presença de condições protrombóticas, como mutação do fator V de Leiden,
mutação do gene da protrombina, deficiência de antitrombina III, deficiência
de proteína C, deficiência de proteína S, anticorpo anticardiolipina, anticorpo
lúpico, fator reumatoide, anticorpo antifosfolípide, alguns pacientes têm risco
aumentado de apresentar TVC quando expostos a trauma craniano, punção
lombar, colocação de cateter jugular, gravidez, cirurgias, infecções, uso de anticoncepcionais, tabagismo e drogas. A paciente deste relato não apresentou alterações nas provas de trombofilias e teve a TVC relacionada ao uso de anticoncepcional no primeiro evento. Os fatores de risco associados com TVC podem
variar ao longo da vida. Em mulheres jovens, o fator de risco mais associado é
realmente o uso de contraceptivo oral.
O diagnóstico deve reunir dados clínicos e de neuroimagem; a angioRM
venosa assim como a angiografia cerebral convencional podem ser limitadas por
variações anatômicas como: a variabilidade do número e localização das veias
corticais, hipoplasia da parte anterior do seio sagital superior, duplicação do
seio sagital superior e hipoplasia ou aplasia dos seios transversos, dificultando
o diagnóstico de TVC.
A angiografia intra-arterial é recomendável, principalmente quando o
diagnóstico de TVC é incerto, como nos casos raros de comprometimento cortical isolado. O diagnóstico angiográfico é representado pela interrupção súbita
de fluxo de uma veia cortical rodeada por colaterais dilatadas e tortuosas (veias
saca-rolhas) ou pelo enchimento de uma veia cortical que não era evidente em
um estudo angiográfico anterior durante a fase aguda da TVC.
Entretanto, a evolução pode contemplar temporariamente complicações.
Na fase aguda, destacam-se a hemorragia subaracnoide, e na fase crônica, a
fístula dural arteriovenosa, epilepsia secundária e recorrência, mas são potencialmente tratáveis. No caso descrito, chama atenção que a fístula dural arteriovenosa ocorreu na apresentação da recorrência de TVC.
Ferro e Canhão (em 2008) descreveram a fístula dural arteriovenosa na
TVC como condição infrequente que ocorreu em menos de 1% dos pacientes
avaliados em estudo de coorte prospectivo internacional sobre trombose de
veias cerebrais e de seio venoso dural (ISCVT) com 624 adultos. Isto corrobora
com os nossos dados de que o caso configura-se como um desafio diagnóstico.
Figura 1. Ressonância de encéfalo: AXIAL/FLAIR - fístula
dural na topografia de seio transverso esquerdo, sangramento
de provável origem arterial e com inundação ventricular.
Angiografia: oclusão dos seios sigmoide e transverso à
esquerda, falhas de enchimento do seio sagital superior.
Figura 2. Angiografia: a seta indica a fístula dural junto
ao seio transverso esquerdo, associada a refluxo para as
veias corticais. Embolização subtotal com ONYX 18 de
malformação arteriovenosa dural para compartimento
venoso adjacente ao seio transverso esquerdo.
Seguimento clínico dos pacientes com estenose
carotídea acima de 60% durante cinco anos
Vivian Dias Baptista Gagliardi, Vanessa Albuquerque Paschoal Aviz
Bastos, Rubens José Gagliardi
Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo
Introdução: A estenose carotídea é uma importante causa de acidente vascular cerebral (AVC) e ataque isquêmico transitório (AIT), e está relacionada
a maior taxa de mortalidade em homens e mulheres idosos. Sua patogenia está
relacionada principalmente à aterosclerose; pode haver embolismo do material trombótico, ou baixo fluxo devido à estenose com compensação colateral
inadequada, que resultam no evento isquêmico final. A avaliação diagnóstica
Diagn Tratamento. 2011;16(4):195-205.
205
da doença carotídea envolve ultrassonografia (USG) Doppler, angioressonância
magnética e angiografia digital, que possuem bons índices de sensibilidade e
especificidade para a realização do diagnóstico. Existem duas estratégias principais no tratamento da doença carotídea aterosclerótica: terapêutica clínica e
cirúrgica ou intervencionista. A primeira consiste na tentativa de estabilização
da placa e interrupção de seu crescimento, por meio do uso de medicações
específicas e controle dos fatores de risco. A segunda estratégia relaciona-se à
eliminação ou redução da estenose carotídea por meio de endarterectomia carotídea ou angioplastia carotídea com stent.
Objetivos: Verificar a evolução dos pacientes com estenose carotídea maior
do que 60%, num acompanhamento de até cinco anos; comparar a evolução
entre pacientes com tratamento clínico ou intervenção; sugerir novos critérios
de escolha de conduta nesses doentes.
Métodos: Estudo observacional transversal, baseado em dados secundários. Revisão de 1002 prontuários de pacientes atendidos no período de 20022011 no Ambulatório de Doenças Cerebrovasculares da Irmandade da Santa
Casa de São Paulo. Selecionados 82 pacientes com AVC que apresentavam
estenose carotídea superior a 60% em seguimento por cinco anos; estenose
determinada por USG com Doppler das carótidas ou por angiografia digital;
computados os fatores de risco e o tratamento efetuado.
Casuística: Observou-se que houve equivalência entre os sexos, representados por 56% (45) de homens e 44% (36) de mulheres. A distribuição etária
da nossa amostra foi: abaixo de 30 anos 2%, 30 a 49 anos 5%, 50 a 65 anos
27%, acima de 65 anos 66%.
Resultados: Na avaliação inicial através do ultrassom Doppler de carótidas, foram identificados 34% (28) com estenose carotídea entre 50-69%, 29%
(24) estenose superior a 70% e 28% (23) com oclusão carotídea. No grupo
avaliado, 49% foram submetidos à angiografia cerebral, destacando-se em 29%
(13) estenose de 50-69%, 42% (19) estenose superior a 70% e em 29% (13)
oclusão carotídea. Foram submetidos à intervenção 33% da amostra, sendo
que predominou a angioplastia por stent, correspondendo a 79%. Na evolução,
observamos que 51% mantiveram-se estáveis, 12% apresentaram melhora clí-
Diagn Tratamento. 2011;16(4):195-205.
nica, 5% estavam assintomáticos e somente 4% apresentaram intercorrências
durante o período avaliado.
Discussão: Nossos resultados corroboram os dados da literatura de que,
quando a estenose for superior a 70% em pacientes sintomáticos, a endarterectomia mostra-se melhor do que o tratamento clínico (grau de recomendação 1A).
Por outro lado, em pacientes assintomáticos, a endarterectomia é benéfica em casos selecionados, em que há estenose de 60% a 99% da carótida. Seu benefício não
é tão grande quanto aquele observado em pacientes sintomáticos e sua evidência
é maior em homens. Sua eficácia foi comprovada por três grandes estudos clínicos: Veterans Affairs Cooperative Study Group (VA Trial), Asymptomatic Carotid
Atherosclerosis Study (ACAS), e o Asymptomatic Carotid Surgery Trial (ACST),
que demonstraram menor risco de AVC em pacientes submetidos à endarterectomia quando comparados a grupos controle que somente fizeram uso de aspirina.
Essa redução do risco começa a ser observada após dois anos da endarterectomia;
no período perioperatório, a morbidade parece ser maior do que a redução do risco
que segue o procedimento. A angioplastia carotídea com stent não é recomendada
em pacientes com estenose carotídea assintomática, com estenose menor do que
70%. O grupo avaliado neste estudo apresentou boa resposta ao tratamento clínico, sendo identificadas poucas intercorrências, o que vem sendo observado na
atualidade com a melhora do tratamento clínico. Questiona-se a possibilidade de
o clínico ser mais eficaz que o tratamento cirúrgico e/ou intervencionista. Uma
revisão sistemática de dados de 11 estudos prospectivos demonstrou que a taxa
anual de AVCs em pacientes assintomáticos com estenose carotídea maior que
50% submetidos a tratamento clínico foi menor do que aquela demonstrada pelos
grandes trials de endarterectomia (VA, ACAS e ACST).
Conclusão: A evolução dos pacientes em seguimento ambulatorial não
submetidos à intervenção invasiva não foi inferior aos demais. Resultados iniciais apenas para panorama geral comparativo dos grupos. A estratificação dos
fatores de risco, sua correção e a terapêutica instituída estão em estudo. São
necessários estudos clínicos comparando os resultados dos novos tratamentos
clínicos com procedimentos intervencionistas em pacientes com estenose carotídea superior a 60%.
Instruções aos autores
Indexação e escopo
A Revista Diagnóstico & Tratamento (ISSN 1413-9979) tem por objetivo oferecer
atualização médica, baseada nas melhores evidências disponíveis, em artigos escritos
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clínicos, estudos coorte, estudos caso-controle, revisões sistemáticas, estudos transversais, avaliações econômicas), relatos de caso, revisões narrativas da literatura (artigos
de atualização) e cartas ao editor, que devem enquadrar-se nas normas editoriais dos
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Após o recebimento do manuscrito pelo setor de Publicações Científicas, os autores
receberão um número de protocolo que servirá para manter o bom entendimento entre
os autores e o setor. Em seguida, o artigo será lido pelo editor, que verificará se está de
acordo com a política e o interesse da revista. Em caso afirmativo, o setor de Publicações
Científicas vai verificar se o texto cumpre as normas de publicação expressas nestas Instruções para Autores. Se o texto estiver incompleto ou se não estiver organizado como
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autores do trabalho. Cada manuscrito será avaliado por dois revisores: um especialista
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as discordâncias serão resolvidas pelos editores.
Os autores então receberão a avaliação e será solicitado que resolvam os problemas
apontados. Uma vez que o setor de Publicações Científicas receba o texto novamente,
o artigo será enviado ao editor científico e revisor de provas, que identificará problemas
na construção de frases, ortografia, gramática, referências bibliográficas e outros. Os
autores deverão providenciar todas as informações e correções solicitadas e deverão
marcar , no texto, todos os pontos em que realizaram modificações, utilizando cores
diferentes ou sistemas eletrônicos de marcação de alterações, de maneira que elas
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Figuras, para que os autores aprovem. Nenhum artigo é publicado sem este último
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seres humanos (individual ou coletivamente, direta ou indireta ou indiretamente,
total ou parcialmente, incluindo o gerenciamento de informações e materiais) devem
ser acompanhados de uma cópia da autorização do Comitê de Ética em Pesquisa da
instituição onde o experimento foi realizado.
Todo artigo submetido deve cumprir os padrões editoriais estabelecidos na Convenção
de Vancouver (Requerimentos Uniformes para Manuscritos Submetidos a Revistas
Biomédicas),1 e as diretrizes de qualidade para relatórios de estudos clínicos,2 revisões
sistemáticas (com ou sem metanálises)3 e estudos observacionais.4 O estilo conhecido
como “estilo Vancouver” deve ser usado não somente quanto ao formato de referências,
mas para todo o texto. Os editores recomendam que os autores se familiarizem com
esse estilo acessando www.icmje.org.
Para a classificação dos níveis de evidência e graus de recomendação de evidências,
a Revista Diagnóstico e Tratamento adota a nova classificação elaborada pelo Centro
de Medicina Baseada em Evidências de Oxford (Centre for Evidence-Based Medicine
- CEBM) e disponível em http://www.cebm.net/mod_product/design/files/CEBMLevels-of-Evidence-2.pdf Abreviações não devem ser empregadas, mesmo as que são
de uso comum. Drogas ou medicações devem ser citadas usando-se os nomes genéricos,
evitando-se a menção desnecessária a marcas ou nomes comerciais. Qualquer produto
citado no capítulo de Métodos, tal como equipamento diagnóstico, testes, reagentes,
instrumentos, utensílios, próteses, órteses e dispositivos intraoperatórios devem ser
descritos juntamente como o nome do fabricante e o local (cidade e país) de produção
entre parênteses. Medicamentos administrados devem ser descritos pelo nome genérico
(não a marca), seguidos da dosagem e posologia.
Para qualquer tipo de estudo, todas as afirmações no texto que não sejam resultado
da pesquisa apresentada para publicação à revista Diagnóstico & Tratamento, mas sim
dados de outras pesquisas já publicadas em outros locais, devem ser acompanhadas de
citações da literatura pertinente.
Os relatos de caso e as revisões narrativas deverão conter uma busca sistematizada
(atenção: o que é diferente de uma revisão sistemática) do assunto apresentado, realizada
nas principais bases de dados (Cochrane Library, Embase, Lilacs, PubMed, outras bases
específicas do tema).
Bolsas, apoios e qualquer suporte financeiro a estudos devem ser mencionados
separadamente na última página. Agradecimentos, se necessário, devem ser colocados
após as referências bibliográficas.
A Diagnóstico & Tratamento apóia as políticas para registro de ensaios clínicos da
Organização Mundial da Saúde (OMS) e do International Committee of Medical
Journal Editors (ICMJE), reconhecendo a importância dessas iniciativas para o registro e
divulgação internacional de informação sobre estudos clínicos, em acesso aberto. Sendo
assim, somente serão aceitos para publicação, a partir de 2007, os artigos de pesquisa
clínicas que tenham recebido um número de identificação em um dos Registros de
Ensaios Clínicos validados pelos critérios estabelecidos pela OMS e ICMJE, cujos
endereços estão disponíveis no site do ICMJE (http://www.icmje.org/). O número
de identificação deverá ser registrado ao final do resumo.
FORMATO
Primeira página (capa)
A primeira página deve conter:
1) classificação do artigo (original, revisão narrativa da literatura, relato de caso e
carta ao editor);
2) o título do artigo, que deverá ser conciso, mas informativo;
3) o nome de cada autor (não abreviar), sua titulação acadêmica mais alta e a
instituição onde trabalha;
4) o local onde o trabalho foi desenvolvido;
Segunda página
Artigos originais: a segunda página, neste caso, deve conter um resumo5 (máximo
de 250 palavras) estruturado da seguinte forma:
1) contexto e objetivo;
2) desenho e local (onde o estudo se desenvolveu);
3) métodos (descritos em detalhes);
4) resultados;
5) Discussão;
6) conclusões.
Relatos de caso: devem conter um resumo5 (máximo de 250 palavras) estruturado
da seguinte forma:
1) contexto;
2) descrição do caso;
3) discussão;
4) conclusões.
Revisão da narrativa da literatura: deve conter um resumo (máximo de 250 palavras)
com formato livre.
O resumo deve conter cinco palavras-chave, que devem ser escolhidas a partir dos
Descritores em Ciências da Saúde (DeCS), desenvolvidos pela Bireme, que estão
disponíveis na internet (http://decs.bvs.br/).6
Referências
As referências bibliográficas (no estilo “Vancouver”, como indicado pelo Comitê
Internacional de Editores de Revistas Biomédicas, ICMJE) devem ser dispostas na parte
final do artigo e numeradas de acordo com a ordem de citação. Referências citadas nas
legendas de Tabelas e Figuras devem manter a sequência com as referências citadas no
texto. Todos os autores devem ser citados se houver menos de seis; se houver mais de seis
autores, os primeiros três devem ser citados seguidos de “et al.” Para livros, a cidade de
publicação e o nome da editora são indispensáveis. Para textos publicados na internet,
a fonte localizadora completa (URL) ou endereço completo é necessário (não apenas
a página principal ou link), de maneira que, copiando o endereço completo em seus
programas para navegação na internet, os leitores possam ser levados diretamente ao
documento citado, e não a um site geral. A seguir estão dispostos alguns exemplos dos
tipos mais comuns de referências:
Artigo em periódico
• Lahita R, Kluger J, Drayer DE, Koffler D, Reidenberg MM. Antibodies to nuclear
Diagn Tratamento. 2011;16(4):206-7.
Instruções aos autores
antigens in patients treated with procainamide or acetylprocainamide. N Engl J
Med. 1979;301(25):1382-5.
Livro
• Styne DM, Brook CGD. Current concepts in pediatric endocrinology. New York:
Elsevier; 1987.
Capítulo de livro
• Reppert SM. Circadian rhythms: basic aspects and pediatric implications. In: Styne
DM, Brook CGD, editors. Current concepts in pediatric endocrinology. New York:
Elsevier; 1987. p. 91-125.
Texto na internet
• World Health Organization. WHO calls for protection of women and girls from
tobacco. Disponível em: http://www.who.int/mediacentre/news/releases/2010/
women_tobacco_20100528/en/index.html. Acessado em 2010 (8 jun).
Dissertações e teses
• Neves SRB. Distribuição da proteína IMPACT em encéfalos de camundongos,
ratos e saguis. [tese]. São Paulo: Faculdade de Medicina da Universidade Federal de
São Paulo; 2009.
Última página
A última página deve conter:
1) a data e o local do evento no qual o artigo foi apresentado, se aplicável, como
congressos ou defesas de dissertações ou teses;
2) fontes de apoio na forma de suporte financeiro, equipamentos ou drogas e número
do protocolo;
3) descrição de qualquer conflito de interesse por parte dos autores;
4) endereço completo, e-mail e telefone do autor a ser contatado quanto à publicação
na revista.
Figuras e tabelas
As imagens devem ter boa resolução (mínimo de 300 DPI) e ser gravadas em formato
“.jpg” ou “.tif”. Imagens não devem ser incluídas em documentos do Microsoft PowerPoint. Se as fotografias forem inseridas num documento Microsoft Word, as imagens
também devem ser enviadas separadamente. Gráficos devem ser preparados com o
Microsoft Excel (não devem ser enviados como imagem) e devem ser acompanhados
das tabelas de dados a partir dos quais foram gerados. O número de ilustrações não
deve exceder o número total de páginas menos um.
Todas as figuras e tabelas devem conter legendas ou títulos que descrevam precisamente seu conteúdo e o contexto ou amostra a partir da qual a informação foi obtida
(por exemplo, quais foram os resultados apresentados e qual foi o tipo de amostra e
local). A legenda ou título devem ser curtos, mas compreensíveis independentemente
da leitura do artigo.
O MANUSCRITO
# Relatos de caso devem conter Introdução, Descrição do Caso, Discussão (contendo a busca sistematizada sobre o tema) e Conclusão.
# Artigos originais e revisões narrativas devem ser estruturados de maneira que
contenham as seguintes partes: Introdução, Objetivo, Método, Resultados, Discussão e Conclusão. A Revista publica revisões narrativas desde que contenham busca
sistematizada da literatura. O texto não deve exceder 2.200 palavras (excluindo
tabelas, figuras e referências), da introdução até o final da conclusão. A estrutura do
documento deve seguir o formato abaixo:
1. Introdução: as razões para que o estudo fosse realizado devem ser explicitadas,
descrevendo-se o atual estado da arte do assunto. Deve ser descrito o contexto, o que
se sabe a respeito. Aqui não devem ser inseridos resultados ou conclusões do estudo.
No último parágrafo, deve ser especificada a principal questão do estudo e a principal
hipótese, se houver. Não se deve fazer discussões sobre a literatura na introdução; a
seção de introdução deve ser curta.
2. Objetivo: deve ser descrito o principal objetivo do estudo, brevemente. Hipóteses
pré-estabelecidas devem ser descritas claramente. De preferência deve-se estruturar
a pergunta do estudo no formato “PICO”, onde P é a população ou problema, I
é intervenção ou fator de risco, C é o grupo controle e O vem de “outcome”, ou
desfecho.
3. Métodos
3.1. Tipo de estudo: deve-se descrever o desenho do estudo, adequado para responder a pergunta, e especificando, se apropriado, o tipo de randomização, cegamento,
padrões de testes diagnósticos e a direção temporal (se retrospectivo ou prospectivo).
Por exemplo: “estudo clínico randomizado”, “estudo clínico duplo-cego controlado
por placebo”, “estudo de acurácia”, “relato de caso”
3.2. Local: deve ser indicado o local onde o estudo foi desenvolvido, o tipo de
instituição: se primária ou terciária, se hospital público ou privado. Deve-se evitar
o nome da instituição onde o estudo foi desenvolvido (para cegamento do texto
para revisão): apenas o tipo de instituição deve ficar claro. Por exemplo: hospital
universitário público.
3.3. Amostra, participantes ou pacientes: devem ser descritos os critérios de elegibilidade para os participantes (de inclusão e exclusão), as fontes e os procedimentos
Diagn Tratamento. 2011;16(4):206-7.
de seleção ou recrutamento. Em estudos de caso-controle, a lógica de distribuição de
casos como casos e controles como controles deve ser descrita, assim como a forma
de pareamento. O número de participantes no início e no final do estudo (após
exclusões) deve ficar claro.
3.4. Tamanho de amostra e análise estatística: descrever o cálculo do tamanho da
amostra, a análise estatística planejada, os testes utilizados e o nível de significância,
e também qualquer análise post hoc. Descrever os métodos usados para o controle
de variáveis e fatores de confusão, como se lidou com dados faltantes (“missing
data”) e como se lidou com casos cujo acompanhamento foi perdido (“loss from
follow-up”).
3.5. Randomização: descrever qual foi o método usado para implementação da
alocação de sequência aleatória (por exemplo, “envelopes selados contendo sequências
aleatórias de números gerados por computador”). Adicionalmente, descrever quem
gerou a sequência aleatória, quem alocou participantes nos grupos (no caso de estudos
controlados) e quem os recrutou.
3.6. Procedimentos de intervenção, teste diagnóstico ou exposição: descrever
quais as principais características da intervenção, incluindo o método, o período e
a duração de sua administração ou de coleta de dados. Descrever as diferenças nas
intervenções administradas a cada grupo (se a pesquisa é controlada).
3.7. Principais medidas, variáveis e desfecho: descrever o método de medida do
principal resultado, da maneira pela qual foi planejado antes da coleta de dados.
Afirmar quais são os desfechos primário e secundário esperados. Para cada variável
de interesse, detalhar os métodos de avaliação. Se a hipótese do estudo foi formulada
durante ou após a coleta de dados (não antes), isso deve ser declarado. Descrever os
métodos utilizados para melhorar a qualidade das medidas (por exemplo, múltiplos
observadores, treinamento etc.). Explicar como se lidou com as variáveis quantitativas na análise.
4. Resultados: descrever os principais achados. Se possível, estes devem conter os
intervalos de confiança de 95% e o exato nível de significância estatística. Para estudos
comparativos, o intervalo de confiança para as diferenças deve ser afirmado.
4.1. Fluxo de participantes: descreva o fluxo dos participantes em cada fase do estudo
(inclusões e exclusões), o período de acompanhamento e o número de participantes
que concluiu o estudo (ou com acompanhamento perdido). Considerar usar um
fluxograma. Se houver análise do tipo “intenção de tratar”, esta deve ser descrita.
4.2. Desvios: se houve qualquer desvio do protocolo, fora do que foi inicialmente
planejado, ele deve ser descrito, assim como as razões para o acontecimento.
4.3. Efeitos adversos: devem ser descritos quaisquer efeitos ou eventos adversos
ou complicações.
5. Discussão: deve seguir a sequência: começar com um resumo dos objetivos e das
conclusões mais relevantes; comparar métodos e resultados com a literatura; enfatizar
os pontos fortes da metodologia aplicada; explicar possíveis pontos fracos e vieses;
incluir implicações para a prática clínica e implicações para pesquisas futuras.
6. Conclusões: especificar apenas as conclusões que podem ser sustentadas, junto
com a significância clínica (evitando excessiva generalização). Tirar conclusões baseadas
nos objetivos e hipóteses do estudo. A mesma ênfase deve ser dada a estudos com
resultados negativos ou positivos.
CARTAS AO EDITOR
É uma parte da revista destinada à recepção de comentários e críticas e/ou sugestões
sobre assuntos abordados na revista ou outros que mereçam destaque. Tem formato
livre e não segue as recomendações anteriores destinadas aos artigos originais, relatos
de casos e revisão da literatura.
Documentos citados
1. International Committee of Medical Journal Editors. Uniform requirements
for manuscripts submitted to biomedical journals. Disponível em: http://www.icmje.
org/urm_main.html. Acessado em 2010 (7 jun).
2. CONSORT Transparent Reporting of Trials. Welcome to the CONSORT
statement website. Disponível em: http://www.consort-statement.org. Acessado
em 2010 (7 jun).
3. Moher D, Cook DJ, Eastwood S, Olkin I, Rennie D, Stroup DF. Improving the
quality of reports of meta-analyses of randomised controlled trials: the QUOROM
statement. Quality of Reporting of Meta-analyses. Lancet. 1999;354(9193):1896900.
4. STROBE Statement Strengthening the reporting of observational studies in epidemiology. Checklist on items that should be included in reports of
observational studies. Disponível em:: http://www.strobe-statement.org/index.
php?eID=tx_nawsecuredl&u=0&file=fileadmin/Strobe/uploads/checklists/STROBE_checklist_v4_combined.pdf&t=1257007091&hash=7713ea8f7f2662b288689
b3dab40c1cb. Acessado em 2010 (7 jun).
5. Haynes RB, Mulrow CD, Huth EJ, Altman DG, Gardner MJ. More informative
abstracts revisited. Ann Intern Med. 1990;113(1):69-76.
6. BVS Biblioteca Virtual em Saúde. Descritores em Ciências da Saúde. Disponível
em:: http://decs.bvs.br/. Acessado em 2010 (7 jun).
RDT v16n4_capa.indd 3
21.12.11 11:05:52
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