Percepções de Estudantes de Graduação acerca da diversidade sexual em uma Universidade Comunitária Josilaine Antunes Pereira – Universidade do Planalto Catarinense (UNIPLAC) – Brasil Geraldo Augusto Locks – Universidade do Planalto Catarinense (UNIPLAC) - Brasil Mareli Eliane Graupe – Universidade do Planalto Catarinense (UNIPLAC) - Brasil Este trabalho analisa as percepções de estudantes vinculados a doze cursos de graduação, e que participam do curso PROESDE, no qual se desenvolve um módulo temático Educação, Gênero e Diversidade Sexual. As categorias orientadoras deste estudo são: Gênero, Sexo e Identidade Sexual. Os principais referenciais teóricos são Grossi, Louro, Auad e Butler. Para a coleta de dados utilizou-se a aplicação de um questionário endereçado aos estudantes. Os dados demonstram que há uma ambiguidade nas respostas em relação a diversidade sexual; por um lado os estudantes aceitam e respeitam as diferentes identidades sexuais e de gênero e, por outro lado, ainda revelam uma visão essencialista, naturalizada e heteronormativa. Outrossim, espera-se que esta reflexão problematize conceitos reificados e fortaleça práticas sociais que visem a construção da equidade de gênero, a manifestação da diversidade sexual como um direito humano no contexto de uma sociedade plural, cidadã, inclusiva e democrática. Palavras-chave: diversidade sexual, gênero, educação, PROESDE, estudantes. 1. Contexto do objeto de investigação O Curso de Extensão em Educação Superior para o Desenvolvimento Regional (PROESDE) da Universidade do Planalto Catarinense consiste em um conjunto de atividades de ensino, pesquisa e extensão voltadas à articulação da melhoria do ensino de graduação ao processo de desenvolvimento social e econômico da área de atuação da Universidade. O objetivo do curso é possibilitar maior inserção das Instituições de Ensino Superior na promoção do desenvolvimento regional através da formação de profissionais com visão sistêmica e empreendedora, capazes de planejar, implantar, gerir e avaliar projetos de desenvolvimento regional sustentável. A iniciativa vem do Setor de Ensino Superior da Secretaria de Estado da Educação tendo como parceiros as Secretarias de Desenvolvimento Regionais (SDRs) e as Gerências Regionais de Educação (GEREDs) localizadas nos municípios de Lages e São Joaquim. A Universidade tem a função primordial de articular os parceiros e executar o curso em regime especial ao longo de duzentas horas de atividades distribuídos nos dois semestres do ano letivo. O curso é organizado por módulos temáticos sendo definidos a partir das lacunas de formação de profissionais, sobretudo, na formação de agentes de desenvolvimento. Desenvolvimento Regional; Cidadania e Políticas Públicas; Educação Ambiental, Estudos Socioantropológicos: cultural regional e relações de gênero; Planejamento Estratégico Participativo, Economia Solidária, são algumas temáticas privilegiadas no chamado tempo-universidade. O PROESDE existe na UNIPLAC desde 2009. A temática de Estudos socioantropológicos: cultura regional e relações de gênero, passou a ser trabalhada a partir de 2013. A justificativa de inclusão deste módulo originou-se do fato do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação (PPGE) da UNIPLAC ter certificado um Grupo de Pesquisa em “Gênero, Educação e Cidadania na América Latina” (GECAL), registrado no Diretório Nacional de Grupos de Pesquisa do CNPq com pesquisas e publicações neste campo; e pelo fato de que a cidade de Lages detém o décimo sétimo lugar em violência de gênero no país e o primeiro do estado de Santa Catarina. As professoras do respectivo módulo do PROESDE, são pesquisadoras do GECAL, portanto, apresentavam naquele momento o maior interesse em conhecer a percepção dos estudantes de graduação acerca da diversidade sexual. A partir de 2004 temas como Direitos Humanos, Educação das Relações ÉtnicoRaciais, Educação, Gênero e Diversidade Sexual, são constituintes do Projeto de Desenvolvimento Institucional, Projetos Pedagógicos de Cursos, Currículos e disciplinas previstos nas Diretrizes Curriculares Nacionais ou em Resoluções do Ministério da Educação no Brasil. O PROESDE é um curso de extensão com 200 horas, de caráter complementar oferecido concomitantemente à graduação, congrega estudantes dos cursos de Direito, Serviço Social, Engenharia de Produção, Engenharia Civil, Engenharia Elétrica Enfermagem, Psicologia, Sistema de Informação, Ciências Contábeis, Administração, Biomedicina e Fisioterapia. A relevância da referida temática no PROESDE está relacionada à formação social e a cultura regional que tem seu ethos constituído no longo período do desenvolvimento da pecuária extensiva tendo por base a estrutura fundiária latifundista (1766-1940). Padrões de dominação/submissão forjaram e permearam relações sociais, econômicas e políticas da sociedade regional. A sociedade do Planalto Catarinense assentou-se sobre a matriz cultural do patriarcado. Como observa Castells, Caracteriza-se pela autoridade, imposta institucionalmente, do homem sobre a mulher e filhos no âmbito familiar. Para que essa autoridade possa ser exercida, é necessário que o patriarcalismo permeie toda a organização da sociedade, da produção e do consumo a política, à legislação e à cultura (CASTELLS, 2013, P. 169). Este autor demonstra que os relacionamentos interpessoais, as personalidades, também são marcadas pela dominação e violência que tem origem na cultura e instituições do patriarcado. Ele está enraizado na estrutura familiar e na reprodução sociobiológica da espécie, contextualizados histórica e culturalmente. Portanto, na perspectiva de Castells, a família patriarcal é a base do patriarcalismo. Convém anotar que os comportamentos, valores, princípios, visões de mundo, até mesmo a moral desta sociedade tem sua base no ethos patriarcal. Facilmente, a tipificação e a naturalização das relações sociais são naturalizadas, essencializadas, exigindo constante vigilância na busca de processos de contestação e mudança dessa realidade. Vale aqui a assertiva antropológica, que sustenta um dos princípios metodológicos da pesquisa social “familiarizar-se com o estranho e estranhar o familiar” (VELHO, 2004). Um dos fatos mais familiares, mas nem sempre reconhecidos pelos sujeitos, reside na vida social marcada pelos valores, normas e padrões erigidos sob a estrutura do patriarcalismo. Daí a importância da pesquisa, do conhecimento capaz de permitir aos sujeitos avançarem para além das aparências atingindo a essência dos fenômenos que se apresentam na sua pseudoconcreticidade, ou seja, fetichizados, num contexto de claro-escuro, de engano. Esta é a condição para se transitar do real vivido para o real desejado, onde se busca tecer relações humanas inclusivas, equitativas, democráticas e cidadãs. O foco desse estudo foi estudantes de graduação participantes do curso de extensão do PROESDE descrito acima; buscou-se conhecer as percepções dos estudantes acerca de gênero, sexo e diversidade sexual na Universidade Comunitária do Planalto Catarinense. 2. Procedimentos metodológicos Trata-se de uma pesquisa de caráter qualitativo, especialmente porque esse tipo de pesquisa nos permite um entendimento específico da relação do tema e o método. Existe uma relação de interdependência nas diferentes etapas do processo de pesquisa. Segundo Flick, a pesquisa qualitativa não se refere apenas ao emprego de técnica e de habilidade aos métodos, mas inclui também uma atitude de pesquisa específica. Essa atitude está associada à primazia do tema sobre os métodos, à orientação do processo de pesquisa e à atitude com quem os pesquisadores deverão alcançar seus ‘objetivos’. Além da curiosidade, da abertura e da flexibilidade na manipulação dos métodos, essa atitude é também atribuída, em parte, a certo grau de reflexão sobre o tema, à apropriabilidade da questão e dos métodos de pesquisa, bem como às percepções e os pontos cegos do próprio pesquisador (2009, p.36). Antes da realização da pesquisa os estudantes participaram do módulo Educação, Gênero e Diversidade Sexual no qual constatamos que era primeira vez que eles tiveram oportunidade de se familiarizarem com tais conceitos. A primeira fonte de dados para análise foi no campo empírico constituído pelos estudantes que compõem a turma do PROESDE da Universidade do Planalto Catarinense, do ano letivo de 2013. Utilizamos a pesquisa bibliográfica para dialogar com o campo do conhecimento e desenvolver a análise e sistematização dos dados. Foi organizado e aplicado quarenta e um questionários abertos aos estudantes presentes no módulo. Podemos identificar o seguinte perfil dos estudantes: Dos quarenta e um estudantes, treze se auto identificaram como homens e vinte e oito, mulheres. Onze questionários foram respondidos por estudantes de dezoito e dezenove anos. Vinte e seis foram respondidos por estudantes de vinte a vinte e nove anos. Finalmente, quatro questionários obteve-se a resposta de estudantes na faixa etária de trinta a trinta e nove anos. Do ponto de vista da denominação religiosa, vinte e sete se disseram católicos; seis evangélicos; um espírita; um se disse agnóstico; dois protestantes; e, três sem religião. Dado a diversidade dos cursos de graduação de origem dos estudantes, o questionário revelou os seguintes: Direito (oito estudantes); Engenharia de Produção (doze estudantes); Serviço Social (quatro estudantes); Enfermagem (um estudante); Odontologia (dois estudantes); Administração (dois estudantes); Biomedicina (um estudante); Fisioterapia (um estudante); Ciências Contábeis (um estudante); Sistema de Informações (um estudante); Engenharia Civil (três estudantes); não revelaram o seu Curso (dois estudantes); O perfil acima demonstra a constituição do curso de extensão PROESDE, a origem diversa dos estudantes da graduação, possibilitando diferentes olhares pela multidisciplinariedade, campos do conhecimentos diversificados, mas agora com o foco numa temática comum que foi trabalhada apenas no curso de extensão e não nos cursos regulares de graduação, pois a UNIPLAC ainda não incluiu no seu currículo oficial a temática de gênero, sexo e diversidade sexual. Quando perguntados sobre “Você acha que homens e mulheres possuem os mesmos direitos na sociedade?” Dezenove estudantes responderam: “Não. Existe muito preconceito. Exemplo, engenharia não é serviço para mulher”. “Falta trabalho, excluem as mulheres por sua ‘fragilidade´. Porém, dizem, há uma evolução em relação aos direitos. Muito machismo. A mulher é muito desvalorizada. Fomos criados em uma cultura em que o homem tem mais direitos que as mulheres, porém nas últimas décadas as mulheres têm conquistado maior espaço na sociedade”. Diante da mesma questão, dezesseis estudantes, afirmaram “Sim. Direitos relacionados ao ser humano e não mais ao homem ou mulher. Empregos, cargos públicos e outras posições na sociedade são ocupados por homens e mulheres. Todos têm os mesmos direitos. Legalmente sim, se for olhar para as leis, mas culturalmente ainda há uma certa diferença no tratamento às mulheres”. Afirmam, todavia, os estudantes deste conjunto que “a ideia da desigualdade é ultrapassada, é motivo apenas para favorecimento. As mulheres já estão enquadradas na sociedade no mesmo nível do homem, já conquistaram até a presidência da república. Mas, se não fosse o feminismo, não existiria a igualdade que existe hoje”, concluem. Enquanto que, nove estudantes afirmaram sinteticamente que “existe diferença somente no trabalho. Elas são criadas para serem boas donas de casa”. Neste contexto é importante lembrarmos que esses estudantes primeiramente realizaram o módulo que objetivava uma sensibilização referente a temática de gênero, direitos iguais para homens e mulheres, pois a cidade de Lages é conhecida pelo seu machismo, patriarcalismo e o alto índice de violências de gênero. Gênero são as construções sociais e culturais sobre o que consideramos mais apropriado para homens e mulheres na nossa sociedade. Segundo Grossi gênero serve, portanto, para determinar tudo que é social, cultural e historicamente determinado. No entanto, como veremos, nenhum indivíduo existe sem relações sociais, isto desde que se nasce. Portanto, sempre que estamos referindo-nos ao sexo, já estamos agindo de acordo com o gênero associado ao sexo daquele indivíduo com o qual estamos interagindo (2010, p. 5). A universidade, o currículo formal e o oculto são fatores determinantes na construção das diferenças e das identidades de gênero e sexuais das pessoas. O currículo é "todo um sistema de comportamento e de valores (...) todo o tipo de aprendizagens e de ausências que os alunos obtêm como consequência de estarem sendo escolarizados", toda e qualquer "experiência vivida pelo aluno" (SACRISTÁN, 1995, p. 86 e p. 88). Portanto, também é importante problematizar a ideia de que a universidade normatiza, "fabrica" sujeitos, reproduz preconceitos, estereótipos e estimula valores sexistas, racistas e heterossexuais na constituição de sujeitos, mas, por outro lado, ela deve apontar espaços e possibilidades para a desconstrução de fobias, ideias preconceituosas e práticas de discriminação em relação à sujeitos que são considerados como “diferentes”, pois ser diferente não significa ser anormal, como é o caso desse curso de extensão que proporcionou uma sensibilização dos estudantes referente a temática de gênero, sexo e diversidade sexual. Estudar gênero significa contemplar o aspecto relacional entre as mulheres e os homens, entremeado por relações de poder, não sendo possível a compreensão de nenhum dos dois em um estudo que os considere totalmente separados. Gênero é um conjunto de expressões sobre aquilo que se pensa do masculino e do feminino. Em outras palavras, a sociedade constrói significados, símbolos, características, para definir cada um dos sexos, no decorrer dos séculos que fazem a sua história. A essa construção social dá-se o nome de relações de gênero. Resultante da forma de percepção de gênero masculino e feminino pela sociedade criam-se perspectivas específicas para homens e para mulheres. (GRAUPE, 2009, p.32). Gênero é entendido como uma categoria relacional que permite a organização social das diferenças entre os sexos. As questões de gênero não se referem, essencialmente, a um ou outro sexo, mas às relações que são construídas entre eles, imbricadas às relações de poder. É pertinente questionar o que se tem percebido como diferenças entre homens e mulheres. Essas diferenças não são “naturais”, nem “essenciais”, mas construídas por um conjunto de elementos, entre os quais estão as “verdades” que as escolas, as igrejas, as famílias e tantos outras instituições da sociedade ensinam. Tais “verdades” podem ser questionadas e desconstruídas. No entanto, questionar e desconstruir não significa destruir tudo aquilo que já foi edificado sobre os sexos. “O mais importante é lembrar que ser diferente não é ser desigual” (AUAD, 2003, p. 59.). Com a incorporação do gênero como categoria analítica, tem-se procurado demonstrar que os comportamentos ou valores que são aceitos em uma sociedade, num determinado momento histórico, podem ser rejeitados em outros períodos. Assim, destacar as diferenças a partir do reconhecimento de que a realidade histórica é social e culturalmente constituída tornou-se um pressuposto para entender essa categoria, permitindo perceber a existência de processos históricos diferentes e simultâneos, bem como abrir um leque de possibilidades de focos de análise. Enfim, foi possível constatar que mesmo após a discussão do conceito de gênero os estudantes ainda possuem diferentes percepções sobre a situação de homens e mulheres na nossa sociedade local, ou seja, não há um pensamento unívoco na visão dos estudantes em relação aos direitos de homens e mulheres. Contudo, as opiniões indicam a persistência de uma contradição. De um ponto de vista, os estudantes constatam uma relação assimétrica no acesso aos direitos humanos, onde os homens têm mais direitos do que as mulheres, atribuído ao fenômeno do machismo, em nossa reflexão, apontamos para o fenômeno do patriarcalismo, de onde deriva a dominação masculina. Mas, de outro lado, as mulheres avançaram na conquista de espaços e de direitos, devendo-se aos movimentos feministas. São percepções que, podemos inferir, identificam-se com os diferentes e variados estudos realizados neste campo do conhecimento. É importante ainda ressaltar que homens e mulheres possuem os mesmo direitos e deveres em termos de direitos constitucionais, mas na prática ainda existe preconceitos e discriminações em relação às mulheres na sociedade contemporânea, e que ainda há muitas diferenças entre mulheres ricas, pobres, brancas, indígenas, negras, analfabetas e escolarizadas, etc. Além da discussão sobre gênero, sexo foi trabalhada a temática da diversidade sexual com os estudantes do curso de extensão. A pergunta “O que você entende por diversidade sexual?” Os estudantes responderam: “O direito de escolha de gênero”. “Entendendo pela opção sexual de cada indivíduo. Maneira com que a pessoa supre sua necessidade sexual”. “Livre escolha pela opção sexual de cada um”. “Toda forma que o ser humano tem de se expressar, agir e pensar”. “São as variações de identidade sexual com que as pessoas se caracterizam hoje, suas escolhas de gênero”. “São as várias faces que um indivíduo pode ter ou assumir diante da sociedade, por, exemplo, transgênero, homo, heterossexual”. “São os vários tipos de sexo existentes”. “Que independe de existir o sexo feminino e masculino, existe os bissexuais, os transexuais e outros”. “Diversidade Sexual sãos os diversos tipos de sexualidade que uma pessoa tem”. “Que estamos nos referindo a todos os relacionamentos entre os sexos”. “É a opção de sexo que cada ser humano opta por ter, seja gay, lésbica, transexual, travesti”. “Entendo que no mundo de hoje a diversidade é um ser diferente do ouro com opiniões, discursos e estilos de vida”. “liberdade de escolha do gênero para parceiro sexual, sendo ele hétero, homo, bi, transexual”. “Diversidade sexual é a escolha da opção sexual de cada pessoa, pois pode ter mais de uma opção de feminino e masculino, o certo é respeitar e compreender a opção de cada um”. “São vários relacionamentos, várias escolhas sexuais”. “São as diversas condições de sexualidade”. “Não entendo do assunto, pois não me aprofundei no assunto”. “É o direito de cada um escolher a sexualidade que se identifica”. “É a diversidade de orientação sexual, a diversidade de gênero”. “Seria o respeito e a compreensão de que há pessoas diferentes com outra opção sexual, além de apenas masculino e feminino’. “A sexualidade que diverge do comum”. A temática da sexualidade é entendida como uma construção histórica e cultural que articula comportamentos, linguagens, crenças, desejos, posturas sobre os corpos e as maneiras sobre como as pessoas vivem os seus prazeres. Segundo Grossi, “a sexualidade – isto é, as práticas eróticas humanas – é também culturalmente determinada” (GROSSI, 2010, p.5). A manifestação da sexualidade está presente em todo tempo e espaço nas relações sociais, e durante a realização do módulo do curso, foi possível observar que muitos participantes ainda confundem identidade sexual com identidade de gênero. A identidade de gênero é a forma como a pessoa se sente em relação ao seu corpo e a identidade sexual se refere ao modo como a pessoa vive e expressa a sua sexualidade, suas emoções seus desejos. Suas identidades sexuais se constituem, pois, através das formas como vivem sua sexualidade, com parceiros/as do mesmo sexo, do sexo oposto, de ambos os sexos ou sem parceiros/as. Por outro lado, os sujeitos também se identificam social e historicamente, como masculinos ou femininos e assim constroem sua identidade de gênero. (LOURO, 1997, p. 26). Alguns participantes da pesquisa ainda não se apropriaram dos conceitos trabalhados, pois reproduziram a expressão opção sexual, que é ultimamente criticada pelos estudiosos da diversidade sexual. Usa-se a terminologia orientação sexual ou identidade sexual para se referir a atração sexual. Também, há um grupo que que rejeita o termo orientação sexual porque pode indicar a perspectiva de que a sexualidade poderia ser orientada por outra pessoa, isto, é que alguém poderia orientar a outra a ter certa sexualidade, portanto, neste texto usamos identidade sexual. Percebe-se a relevância dessas discussões no contexto da educação superior, bem como a importância de implementações de políticas educacionais para combater os padrões hegemônicos de sexualidade, pois foi possível constatar que após a discussão da temática da diversidade sexual os estudantes, demostraram respeito aos homossexuais, bissexuais e transexuais, ou pelo menos, tentaram reproduzir os nossos discursos. Porém, partimos do pressuposto que ainda muitos estudantes possuem preconceitos cristalizados em relação à diversidade sexual, mas que na elaboração das respostas para o nosso questionário, assumiram uma postura politicamente correta, pois tiveram uma formação sobre esse tema. É importante considerar que o espaço empírico dessa pesquisa é permeado por uma cultura machista, sexista e patriarcal e com altos índices de violências contra mulheres, homossexuais e transexuais, mas que nos últimos dois anos há iniciativas de grupos de pesquisa como o Grupo de Pesquisa Gênero, Educação e Cidadania na América Latina (GECAL/UNIPLAC) e da Frente Parlamentar Pelo Fim da Violência Contra a Mulher (Câmara de Vereadores de Lages). Para compreender melhor esse pressuposto da cristalização da heteronormatividade na constituição dos sujeitos, podemos recorrer a Judith Butler e Guacira Lopes Louro. A heteronormatividade é a matriz heterossexual imposta aos indivíduos da sociedade, e que não é natural, mas sim “imaginária” – já que nem sempre ela acontece, como nos casos de homossexualidade e de transgêneros (BUTLER, 2003, p. 239). A heteronormatividade compulsória é uma reiteração do sexo enquanto aparato biológico, indicando determinado gênero que por sua vez este indica o desejo ou induz ao mesmo, assim essa lógica induz a uma continuidade, uma norma binária entre a identificação do macho e da fêmea – corpo – determinando o gênero do sujeito que conseqüentemente leva ao desejo do sexo/gênero oposto (LOURO, 2004, 81). Ou seja, as práticas sexuais ditas não normais colocam em xeque a estabilidade do gênero na definição do que é ou não "normal" . Frente à pergunta “Você possui amigos/as ou conhecidos/as que são gays, lésbicas, ou transexuais? Como você os trata ou trataria?” “Não tenho amigos gays, mas conheço algumas pessoas que são. Não tenho preconceito, trato eles igualmente”. “Sim, tenho um casal de amigos. O tratamento é normal como se fosse um casal de héteros”. “Sim, tenho amigos e conhecidos. Trato eles naturalmente da mesma forma dos héteros sexuais”. “Sim, como eu trato qualquer outra pessoa”. “Trato como trato os heterossexuais, são pessoas como nós”. “Possuo amigos e os trato como pessoas comuns, como homens ou mulheres”. “Trato como trato todas as outras pessoas que conheço”. “Trato super bem. Ela é um ser humano como eu, educada, sabe respeitar, mais infelizmente ainda sofre preconceito”. “Sim, tenho amigos e são pessoas de grande caráter e garra, trato de forma igual”. “Não tenho”. “Possuo e trato da maneira mais normal possível, pois cada um escolhe sua maneira de ser”. “Sim, amigos normais”. “Sim, trato normal, sem diferenças”. Sim, normal pois somos todos iguais”. “Não tenho, mas não trataria com indiferença, pois é uma opção de cada um”. “Possuo e os trato normalmente, pois eles são “gente” como a gente”. “ Aqui, igualmente as respostas apresentam uma posição comum. Os estudantes, primeiramente, afirmam ter amigos não heterossexuais, portanto, convivem com a diversidade sexual. Segundo, diante deste fenômeno, mostram-se respeitosos, estabelecem relações ou vínculos afetivos, embora uma minoria diga não concordar, mas respeitam as diferentes expressões ou modos de viver a sexualidade. 3. Considerações É possível observar nas respostas dos estudantes que, ainda sem a devida clareza dos conceitos como “gênero”, “sexo”, “identidade sexual’, “identidade de gênero”, as respostas apontam para uma abertura para a diversidade sexual, o respeito às diferenças, à convivência social e plural. Embora não dito, parece haver rechaços às visões de mundo ou comportamentos preconceituosos, refém de dogmas e da heteronormatividade imposta pelo padrão hegemônico na sociedade brasileira e regional. Neste sentido, os estudantes surpreendem e demonstram acompanhar os movimentos da sociedade contemporânea como, por exemplo, aqueles que sustentam a defesa dos direitos humanos e as liberdades de escolhas conforme as exigências de uma sociedade democrática. Outrossim, espera-se que esta reflexão problematize conceitos reificados e fortaleça práticas sociais que visem a construção da equidade de gênero, a livre manifestação da diversidade sexual como um direito humano no contexto de uma sociedade plural, cidadã, inclusiva e democrática. Convém enfatizar que a temática de gênero, diversidade sexual foi trabalhada no curso de extensão na universidade tendo como objetivo intensificar a curricularização de temas transversais previstos em Diretrizes Nacionais, mas que nem sempre são considerados nas disciplinas e ementas. Referências AUAD, Daniela. Feminismo: que história é essa? Rio de Janeiro: DP&A, 2003, p. 59. BUTLER, J. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Editora Civilização. Brasileira, 2010. CASTELLS, Manuel. O poder da Identidade. A era da informação: economia, sociedade e cultura. São Paulo: Paz e Terra, 2013. v. 2. FLICK, Uwe. Desenho da pesquisa qualitativa. Porto Alegre: Artmed, 2009. GRAUPE, M. E. . Gênero e Magistério: Discursos e Práticas sociais. 1. ed. Rio de Janeiro/Brasília: Usina de Letras, 2009. 161p . GROSSI, Miriam. Identidade de Gênero e Subjetividade, Antropologia em Primeira Mão. Florianópolis, PPGAS-UFSC, 2010. (Versão Atualizada) LOURO, Guacira Lopes. Um corpo estranho: ensaios sobre sexualidade e teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica, 2004. LOURO. Guacira Lopes. Gênero sexualidade e educação: Uma perspectiva pós estruturalista. 14 ed.Petrópolis, RJ: Vozes, 2012. VELHO, Gilberto. Individualismo e cultura: Notas para uma antropologia da sociedade contemporânea. Rio de Janeiro: Zahar, 2004. SACRISTÁN, J. Gimeno. Currículo e Diversidade Cultural. In: Silva, Tomaz Tadeu da & Moreira, Antonio Flavio (Orgs.). Territórios Contestados – o currículo e os novos mapas políticos e culturais. Petrópolis, RJ: Vozes, p. 82-113, 1995.