relatos de pesquisa USO E ABUSO DE DROGAS ENTRE MULHERES IDOSAS EM INSTITUIÇÃO DE LONGA PERMANÊNCIA Luana Araújo dos Reis* Flávia Rocha Brito** Vanessa dos Santos Moreira*** Vânia dos Santos Moreira**** Aline Cristiane de Sousa Azevedo Aguiar***** RESUMO O presente artigo discute fatores que interferem no consumo, uso e abuso de drogas por mulheres idosas que vivem num contexto institucional. Os dados apresentados são resultantes de uma pesquisa qualitativa desenvolvida com 20 idosas que vivem numa instituição de longa permanência localizada em uma cidade no interior da Bahia. As informações foram coletadas através de entrevista semi-estruturada realizadas no período de outubro e novembro de 2010. Os dados coletados foram analisados descritivamente, a fim de filtrar a parte de interesse da avaliação através da análise de conteúdo de Bardin. A alta prevalência de sintomas depressivos e envolvimento com drogas denota que a história de vida marcada pela exclusão social das mulheres em estudo contribuiu para o desencadeamento da drogadição. Palavras-chave: Transtornos Relacionados ao Uso de Substâncias. Idoso. Institucionalização. *Enfermeira. Doutoranda em Enfermagem pela Universidade Federal da Bahia - UFBA. E-mail: [email protected] Endereço para correspondência: Av. Centenário, 33, APTO 304, CEP 40.155-150 Salvador, Bahia, Brasil. Telefone: (71) 9284-3044 **Enfermeira no Programa de Saúde da Família em Pau-a-pique, Bahia, Brasil. E-mail: [email protected] ***Enfermeira. Mestre em Enfermagem pela Universidade Federal da Bahia - UFBA. Salvador, Bahia, Brasil. E-mail: [email protected] ****Psicóloga. Residente em Saúde Mental pela UNEB. Salvador, Bahia, Brasil. E-mail: [email protected] *****Enfermeira. Doutoranda em Enfermagem pela Universidade Federal da Bahia - UFBA. E-mail: [email protected] 1 INTRODUÇÃO O envelhecimento (processo), a redução da capacidade de adaptação velhice (fase da vida) e o velho ou idoso homeostática constituem sobrecarga funcional do organismo. A um componentes cujos relacionados. situações de O velhice e o velho compreendem a última envelhecimento constitui um processo fase da vida, são caracterizadas pela natural, que se inicia com o nascimento e redução termina com a morte, caracterizado por calvície, 188 estão conjunto, perante da capacidade redução da funcional, capacidade de C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.6, n.2, p. 188-200, jul./dez. 2013 Luana A. Reis, Flávia R. Brito, Vanessa S. Moreira, Vânia S. Moreira, Aline C. S. A. Aguiar trabalho e resistência, dentre outros. margem da sociedade em condições de Agregam-se a esses fatores a perdas de extrema pobreza, onde são muitas vezes papéis obrigadas a possuírem as instituições sociais, psicológicas, solidão, motoras perdas e afetivas (PAPALÉO NETTO, 2006). asilares como (FERNANDES; No Brasil, o envelhecimento da seu único RAIZER; lar BRETAS, 2007). população tem sido gradual e contínuo, Sabe-se que a grande maioria sendo que o segmento idoso é o que mais dessas instituições não estão preparadas cresce no país. O número absoluto de para proporcionar a essas mulheres, idosos valores serviços individualizados que respeitem a elevados, constituindo-se na sexta maior personalidade, privacidade e modos de população idosa do mundo. Segundo o vida Relatório Nacional Brasileiro sobre o desvalorização Envelhecimento da População Brasileira, mulher idosa, por se acreditar que estas há se limitam a certas prioridades fisiológicas apresenta-se uma população maior com predominância feminina entre os da idosos diversificados. das (alimentação, Há uma necessidades vestuário, da moradia, gerando importantes repercussões na cuidados de saúde e higiene) remetendo demanda aos serviços de atenção a esse ao esquecimento das necessidades de público. nível social, afetivo e sexual (PIMENTEL, Tal fato vem acarretando uma 2001). série de conseqüências sociais, culturais, Assim, ao adentrar este universo econômicas, políticas e epidemiológicas, por uma escolha de terceiros (filhos, para as quais o país não está ainda companheiros) estas mulheres tendem a devidamente preparado, sendo que as externar repercussões mais marcantes são as isolamento, ocasionando por muitas vezes associadas das uma redução em sua alto estima. Todas não essas situações, dentre outros fatores apresentar renda e depender de seus direcionam as mulheres para o uso e o familiares (SCHOR; abuso de drogas, sejam elas lícitas ou vivem ilícitas no período da institucionalização. classes ARTES, as menos idosas favorecidas para sobreviver 2001). institucionalizadas oriundas Muitas ou por abandonadas à tristeza, indignação, revolta, Nessas instituições cerca de um quarto C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.6, n.2, p. 188-200, jul./dez. 2013 189 Uso e abuso de drogas entre mulheres idosas em instituição de longa permanência das idosas fazem medicamento uso de psiquiátrico algum e os descrever os principais fatores que dificultam o abandono do vício. benzodiazepínicos são os mais utilizados, A investigação do uso e abuso de muitas vezes sem necessidade e em drogas licitas e/ou ilícitas entre idosas doses elevadas acarretando assim para torna-se cada vez mais importante visto essas idosas prejuízos cognitivos, risco de que tal fato ainda é invisível para a quedas, dentre outros (FINGERHOOD, sociedade, 2000). gestores. Além do mais o uso e abuso de profissionais de saúde e Para o médico psiquiatra, Danilo drogas causa severos danos à qualidade Baltieri, mestre e doutor em Medicina pelo de vida dessas mulheres, o que resulta Departamento em custos elevados para a sociedade em de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade geral. de São Paulo, a busca pelas drogas entre mulheres idosas surge na tentativa delas 2 MATERIAIS E MÉTODOS lidarem com uma série de perdas do passado e/ou e Diante do problema que norteia físicos este estudo, foi adotada a abordagem diretamente relacionados a idade. Baltieri qualitativa por perceber que esta não se aponta ainda que para outras pessoas, o importa em medir a freqüência dos uso da droga se reflete na continuidade acontecimentos, mas importa-se com a de um padrão de consumo que se iniciou qualidade que os envolvem. Este estudo na infância, adolescência e/ou vida adulta ainda se caracteriza como descritivo, pois e que permanece na atualidade, sem uma o mesmo não se limita a observação de adequada atenção dos profissionais de fenômenos e sim busca a sua essência, saúde. tentando descrever a realidade que se sofrimentos lidar com psíquicos Tendo mostra perante nós, isto ocorre quando a mencionados, este estudo tem como pesquisadora investiga as causas de objetivos mais existência do fenômeno, tentando com utilizadas por mulheres idosas no contexto isso explicar como este se originou, quais institucional, fatores suas possíveis relações, suas mudanças associados ao uso dessas drogas e e entendendo as conseqüências que o conhecer vista e aspectos 190 em dores as verificar os drogas os C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.6, n.2, p. 188-200, jul./dez. 2013 Luana A. Reis, Flávia R. Brito, Vanessa S. Moreira, Vânia S. Moreira, Aline C. S. A. Aguiar mesmo poderá trazer a vida humana capacidade para responder de forma (TRIVIÑOS, 2006). coerente o instrumento de produção dos Nesta pesquisa foi utilizado como campo uma instituição de dados. Excluíram-se as idosas com alto longa grau de comprometimento mental e físico permanência localizada em uma cidade e as que não queriam participar da no interior da Bahia. A escolha se deu pesquisa. pelo fácil acesso e por já haver um vínculo Os dados empíricos foram entrevista semi- entre as pesquisadoras e a instituição. apreendidos Trata-se de uma instituição filantrópica, estruturada, por consistir em uma técnica não governamental com o objetivo de que abrigar idosos e idosas sem vínculo entrevistado e entrevistador e também a familiar ou sem condições de prover a captação própria subsistência, e ainda idosos e desejada, idosas abandonados pela família, de esclarecimentos modo a satisfazer as suas necessidades algumas questões não suficientemente de esclarecidas (RICHARDSON, 1999). moradia, alimentação, saúde e convivência social, regendo a vida dos pela permite o relacionamento imediata bem entre da informação como, correções, e adaptações de O roteiro da entrevista constou de mesmos por meio de normas específicas. algumas A instituição é dirigida por freiras da Igreja identificação Católica Apostólica Romana, que residem nome, idade, grau de escolaridade, tempo na permanecendo de institucionalização e três questões assim em tempo integral com os idosos e orientadoras as quais buscaram conhecer as idosas. as drogas mais utilizadas por essas própria instituição, No período da coleta de dados haviam 35 idosas institucionalizadas. Desse total foram selecionadas 20 idosas, seguindo os critérios de inclusão/exclusão perguntas das voltadas para entrevistadas, como mulheres, os fatores associados ao uso dessas drogas e as dificuldades para o abandono do vício. Considerando a resolução 196/96 estabelecidos: os critérios de inclusão do CNS foi foram concordância em participar da consentimento livre e esclarecido, o qual pesquisa e encontrar-se em bom estado informou o sujeito em estudo a respeito do de tema, riscos e benefícios da pesquisa saúde mental, demonstrando elaborado o termo de C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.6, n.2, p. 188-200, jul./dez. 2013 191 Uso e abuso de drogas entre mulheres idosas em instituição de longa permanência assegurando a ética na utilização das analfabeta (85%). Com relação ao estado informações coletadas. civil 55% delas afirmaram serem viúvas Os dados foram tratados adotando com tempo de permanência na instituição a técnica de Análise de Conteúdo (AC) de que varia de 2 a 14 anos, sendo que 40% Bardin Inicialmente têm menos de 5 anos vivendo na organizamos o material coletado por meio instituição, 40% tem de 5 a 10 anos da entrevista transcrevendo-as na íntegra; asiladas e 20% delas estão na instituição em leitura a mais de 10 anos. Achados como estes flutuante das informações coletadas. Após foram também encontrados em pesquisas essa primeira leitura nos direcionaremos realizadas com mulheres em instituição de para leituras de forma mais aprofundada longa do material coletado, com vista a registrar VIRTUOSO, 2004). (BARDIN, seguida realizamos impressões emitidas. 2009). sobre Por categorias fim uma permanência as mensagens foram elaboradas estado de saúde 45,5% das idosas abrangendo referiram como regular, enquanto 44,7% e temáticas Com relação a (TRIBESS; consideraram percepção boa e do características e elementos comuns ou 9,8% má, relacionados entre si. respectivamente. Resultado similar foi encontrado em pesquisa com o objetivo 3 RESULTADOS E DISCUSSÃO de descrever a situação de idosas institucionalizadas em asilo filantrópicos e Com o intuito de evidenciar as como elas percebem sua saúde de forma idosas informantes e contribuir para o qualitativa (TRIBESS; VIRTUOSO, 2004). tratamento dos dados, apresentaremos a Ainda quanto à realização de exames de caracterização mulheres, rotina (cuidado com a saúde), 87% das grau de entrevistadas tempo de enquanto o restante afirmou o oposto. A enfocando a escolaridade, dessas idade, estado o civil, permanência na instituição e a percepção seguir quanto ao estado de saúde. encontradas As entrevistadas apresentam relatam apresentaremos após realizá-los, as categorias análise das informações coletadas. maior distribuição na faixa etária de 60 a 79 192 anos (70%), sendo a maioria C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.6, n.2, p. 188-200, jul./dez. 2013 Luana A. Reis, Flávia R. Brito, Vanessa S. Moreira, Vânia S. Moreira, Aline C. S. A. Aguiar C1- DROGAS MAIS UTILIZADAS POR MULHERES IDOSAS INSTITUCIONALIZADAS. pesquisa. Ao analisarmos as falas das idosas extraímos que a maior parte delas já fizeram, fez e/ou continuam fazendo As drogas comumente utilizadas pelas idosas são: medicamentos uso desses Ah minha fiá teve uma época que eu tive que tomar esses remédios ai pra tal daquela doença, aquela...depressão. O doutor trouxe a amostra grátis pra mim, não sabe?! (ENTREVISTADA 3) em segundo lugar o cigarro com 32 %; e o álcool com 13% em terceiro lugar. É psicotrópicos sistema dos agir medicamentos principalmente nervoso central, no [...] Agora tô tomando um monte de compromidinho. É escuro, claro, grande, pequeno, de todo jeito doutora. Mas tem um que já me deixa sonolenta, as vezes parece que eu vou cair. (ENTREVISTADA 9) alterando temporiaremente ou não (a depender da dosagem, quantidade, forma de uso) a função cerebral, o humor, a consciencia, o [...] Olha já fiz uso sim de remédio para depressão, ansiedade e até usei benzodiazepínico. Mas agora me consultei com um médico novo, esse é bem melhor, tirou tudo porque eu to curada com a fé de Deus (ENTREVISTADA 5) comportamento e a percepção de quem faz uso destes medicamentos. Esses medicamentos são divididos antidepressivos, ansiolíticos segundo prescrição médica psicotrópicos em primeiro lugar com 55%; característica medicamentos em: (benzodiaestimulantes Percebe-se que nesta instituição psicomotores, antipsicóticos (neurolépti- essas idosas tem um acompanhamento cos) e potenciadores da cognição (RANG; profissional, o qual está atento para o DALE; RITTER, 2001). consumo dessas substâncias por essas zepínicos) e sedativos, Não é raro encontrar o uso dessas mulheres fato que se torna importante na substâncias por idosos institucionalizados, medida em que o uso descontrolado mais especificamente as mulheres. Em dessas substâncias podem causar danos uma pesquisa (TRIBESS; VIRTUOSO, irreversíveis para a saúde dessas idosas. 2004) constatou-se que das mulheres Ao tratarmos do uso de cigarro, idosas institucionalizadas grande parte este aparece em segundo lugar com 32% faziam e na escala do uso de drogas entre as Tal mulheres idosas, como podemos observar uso de ansiolíticos antidepressivos cotidianamente. achado não foi diferente em nossa a seguir C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.6, n.2, p. 188-200, jul./dez. 2013 193 Uso e abuso de drogas entre mulheres idosas em instituição de longa permanência as mulheres idosas nas décadas que As freras não gostam não doutora, mas eu fumo um cigarrinho de vez em quando (ENTREVISTADA 1) virão (FREITAS et al, 2002). Óia, eu fumo minha fiá, fumo a mais de 20 anos (ENTREVISTADA 17) agravar [...]Ah! Já não vivo mais sem meu cigarrinho de fumo, tem dia que é dois, tem dia que é três, vai depender de como eu tô no dia e se eu tenho fumo tambem. Aqui quem mais fuma são os véi, as véias até que não fuma muito. As vezes eu pego fumo com eles. (ENTREVISTADA 12) risco à saúde, sobretudo nas mulheres Vários estudos vem apontando a alta prevalência de idosos fumantes em instituições asilares, prevalência geral nos quais a de tabagismo encontrada em idosos institucionalizados, com idade de 60 anos ou mais, é de 23,0%, sendo de 25,8% nos homens e 18,7% nas mulheres (CARVALHO; foi nosso objetivo comparar o uso do cigarro entre os sexos feminino e masculino, os estados patológicos dos idosos, pois é prejudicial e fator de alto idosas no que tange a chance de desenvolverem câncer de mama, problemas circulatórios e osteoporose além de ser causador de diversas comorbidades e mortes prematuras e do desembolso altíssimo das instituições de saúde para com o tratamento dessas idosas e idosos que fumam (S. FILHO, 2010). Associado ou não ao uso de medicamentos psicotrópicos e ao cigarro, 13% das idosas entrevistas afirmaram fazer uso do álcool fora da instituição, GOMES; LOUREIRO, 2010). Não O hábito de fumar concorre para contudo, foi quando tem a oportunidade de sair para a casa de parentes, amigos, vizinhos, entre outros. percebido na instituição estudada uma maior prevalência do uso do cigarro entre idosos do sexo masculino. Esta menor prevalência entre o sexo feminino deve ser avaliada com cautela, já que atualmente entre as mulheres mais jovens tem havido um aumento deste hábito, o que conseqüentemente se refletirá entre 194 [...] ôh dotora se quando eu não morava nesse abrigo eu sempre tomava minha cachacinha antes do almoço com meu véi e não é agora que eu vou deixar de tomar. Eu fico chateada porque aqui as freras não deixam entrar aí toda vez que eu saio eu bebo, bebo mesmo. (ENTREVISTADA 2) [...] Uma jurubeba de vez em quando não faz mal. Eu não bebo pra ficar bêbada não menina, é só pra abri o apetite. (ENTREVISTADA 15) C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.6, n.2, p. 188-200, jul./dez. 2013 Luana A. Reis, Flávia R. Brito, Vanessa S. Moreira, Vânia S. Moreira, Aline C. S. A. Aguiar Eu bebo, eu fumo que é pra ver se os dias aqui passam mais rápido (ENTREVISTADA 4) Ah! Eu gosto mesmo é de uma cevejinha. Humm chega dá água na boca. Cê não gosta não dotora? Nunca mais bebi porque aqui dentro elas não deixa e ninguém nunca mais veio aqui mim levar pra sair (ENTREVISTADA 6) e os cânceres de fígado, esôfago, pulmão, faringe, boca e mama nas mulheres, são as causas mortis mais associadas ao consumo de álcool entre os idosos. Além disso, o consumo intenso de álcool entre as mulheres idosas pode aumentar em até duas vezes o risco de doenças coronarianas. O consumo de álcool entre os idosos constitui-se atualmente um problema de saúde pública tendo em vista o crescimento do consumo desta droga por esta população e os efeitos em sua saúde e qualidade de vida (CASTILLO et al., 2008). Diversos são os estudos que tentam explicar os motivos que conduziram os idosos ao uso do álcool. O desenvolvimento de sintomas depressivos pode conduzir o idoso a uma maior O abandono do vicio é dificultado por acreditarem que pelo longo tempo de uso e/ou abuso da droga tornaram-se imunes aos malefícios causados pela droga, principalmente no que tange ao uso do cigarro. Em segundo lugar, as idosas que possuem uma doença crônica, decorrente ou não do uso da droga, acreditam que pelo fato de já estar doente, não fará mais diferença se vier a largar a droga. suscetibilidade em envolver-se com este tipo de droga (GALLETI et al., 2008). No caso das idosas pesquisadas houve uma alta taxa de prevalência de depressão. Na proporção que C2- DEPRESSÃO COMO PROPICIADOR DO USO E ABUSO DE DROGAS. A depressão é o nome dado a um vai conjunto de alterações comportamentais, envelhecendo, o idoso tende a tolerar de emocionais forma reduzida o álcool o que implica no distúrbio do humor e perda ou diminuição aumento dos seus efeitos principalmente do interesse pela vida. Qualquer pessoa sobre o sistema nervoso central, no déficit pode em um momento da vida apresentar de funcionamento intelectual, cognitivo e sintomas depressivos, porém em idosos a no probabilidade comportamento de forma global e de é pensamento, maior por ser com um (FINGERHOOD, 2000). Traumas, cirrose C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.6, n.2, p. 188-200, jul./dez. 2013 195 Uso e abuso de drogas entre mulheres idosas em instituição de longa permanência vôo, me disgostei, (ENTREVISTADA 10) transtorno que está ligado a perdas e disgostei limitações (FREITAS et al, 2002). Vários identificados fatores como têm [...] Meus parentes é tudo bem, é tudo bem de vida, mas não me ajuda, minha família sempre é bem. Fica lá na fazenda, casa, meus filhos mora em entroncamento, diz que não tem casa pra me botar e manda eu voltar, não me da nada, não ajuda em nada (ENTREVISTADA 7) sido predisponentes à depressão na fase tardia da vida. Inclui-se entre elas fragilidade na saúde, notadamente por maior prevalência de [...]eu não tenho encosto, não to aposentada, a idade não deve, e vivo assim, atoa, um trabalho ninguém acha mais pra fazer. (ENTREVISTADA 8) doenças cerebrovasculares, infarto agudo do miocárdio, osteoartrose, doença pulmonar obstrutiva crônica e demência (FREITAS et al., 2002). Os sintomas da depressão são Sentimentos de frustração perante os anseios de vida não realizados e a própria história do sujeito marcada por perdas progressivas do companheiro, dos laços afetivos e da capacidade de trabalho, bem como o abandono, o isolamento social, a incapacidade de reengajamento na atividade produtiva, a aposentadoria que mina os recursos mínimos de sobrevivência, são fatores que comprometem a qualidade de vida e predispõem as mulheres idosas institucionalizadas ao desenvolvimento da depressão e conseqüentemente ao uso ou abuso de drogas (PACHECO, 2002). Esses fatores tornam-se notórios nas falas das idosas entrevistadas [...] Depois que o home morreu descontrolei, eu dei pra beber, dei pra fumar, fui serva de Deus por nove anos, depois fastei da igreja aí, tudo me tirou de tempo, fiquei banda 196 muito variados, indo desde as sensações de tristeza, passando pelos pensamentos negativos até as alterações da sensação corporal como dores e enjôos. Em pacientes idosos, além dos sintomas comuns, a depressão costuma ser acompanhada por queixas somáticas, hipocondria, sentimentos baixa de auto-estima, inutilidade, tendência autodepreciativa, alteração do sono e do apetite e pensamento recorrente de suicídio intensificados com o consumo de substancias psicotrópicas. Cabe lembrar que nos pacientes idosos usuários de drogas e deprimidos o risco de suicídio é duas vezes maior do que nos não deprimidos (PEARSON; BROWN, 2000). Mim sinto muito só, por causa que aqui não vejo meus parentes. (ENTREVISTADA 11) C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.6, n.2, p. 188-200, jul./dez. 2013 Luana A. Reis, Flávia R. Brito, Vanessa S. Moreira, Vânia S. Moreira, Aline C. S. A. Aguiar Sinto muita solidão, aqui não pode sair e tenho que ficar sozinho. (ENTREVISTADA 13) sintomas de depressão por se encontrar mim sinto triste por (ENTREVISTADA 14) uma mudança em seu estilo de vida, esta velha isolada do seu convívio social e por sofrer tendo tenho saudade da rua e de casa (ENTREVISTADA 20) tem uns dias só pensando na vida que eu levava quando era novo (ENTREVISTADA 16) No momento em que a idosa é em vista que horários de alimentação, lazer e interação sofreram enormes mudanças, o que, geralmente, resulta no uso e abuso de drogas lícitas ou ilícitas, isolamento e em perda de estímulos. levada a uma instituição asilar ela sente- Ao fazer o uso da droga, seja ela se abandonada e deixada para trás assim qual for, as crises de depressão tendem a ela tende a se questionar o porquê do aumentar. Somado a esse processo a abandono o que muitas vezes traz o própria institucionalização eleva o nível de isolamento estresse e consequentemente entre essas usuárias e aparecimento de sinais de depressão do potencializa a depressão após o consumo seu estado emocional. da droga (LIMA, 2007). Contudo, a ênfase Além disso a institucionalização gerada em torno dos riscos iminentes quase sempre torna-se algo traumático e decorrentes do consumo de drogas tem que acarreta inúmeros problemas, pois as ocultado a percepção de outros riscos, idosas dificilmente escolhem viver longe como o de suicídio no auge da depressão da família, na presença de pessoas comórbida (TOSCANO, 2003). estranhas e muitas vezes O isoladas, tratamento da depressão sentindo-se quase sempre abandonadas, concomitante as crises de dependência dependentes e inúteis, o que também deverá ser desenvolvido pode contribuir para o aparecimento de perspectivas: inicialmente sinais e sintomas de uma depressão. rompimento da dependência química e Ao analisar as falas, observamos em com duas o posteriormente o tratamento da depressão que 60% das entrevistadas apresentavam tendo sinais e sintomas de depressão. A idosa geralmente, é apenas um sintoma da institucionalizada dependência. Ao desintoxicar o corpo desenvolve sinais e haverá em vista uma que melhor esta doença, resposta C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.6, n.2, p. 188-200, jul./dez. 2013 ao 197 Uso e abuso de drogas entre mulheres idosas em instituição de longa permanência tratamento medicamentoso desta patologia (TOSCANO, 2003). de novas drogas, gerando normalmente uma interação entre essas substâncias Acreditamos que qualquer proposta terapêutica para estas mulheres deve que repercutirão de forma negativa para a saúde dessas mulheres. incluir entre os seus objetivos a melhora A estimativa da gravidade dos do estado clínico geral, o tratamento ou problemas estabilização de doenças crônicas pré- institucionalizadas, por meio de uma alta existentes e a reinserção social. prevalência de depressivos e 4 CONCLUSÃO de saúde sinais nas e envolvimento idosas sintomas com as drogas lícitas, denota que a história de vida marcada pela exclusão social É sabido que atingir a terceira contribuiu para o desencadeamento da idade é uma conquista para muitos, no drogadição, já que muitas dessas idosas entanto, com perdem o suporte dado pela família, sua dignidade tem sido um grande desafio. Ao identidade e a direção da vida, sentem-se findar este trabalho, observamos que inferiores diante da sociedade e da envelhecer no contexto de instituições de própria família, assumindo com isso, uma longa permanência pode desencadear e vida cheia de sentimentos de tristeza, ou exacerbar ou uso e/ou abuso de abandono, inferioridade, impotência, sem drogas entre mulheres idosas, tendo em perspectivas e objetivos, com ausência de vista que grande parte das idosas que futuro, tendo seu viver minimizado na responderam ao instrumento de pesquisa espera da morte. viver a melhor idade demonstrou a continuidade do uso da droga dentro da instituição e a inserção DRUG USE AND ABUSE IN ELDERLY WOMEN AT LONG-STAY INSTITUTIONS ABSTRACT This article discusses the factors interfering with the consumption, use and abuse of drugs by elderly women living in an institutional context. Data presented results from qualitative research carried out 198 C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.6, n.2, p. 188-200, jul./dez. 2013 Luana A. Reis, Flávia R. Brito, Vanessa S. Moreira, Vânia S. Moreira, Aline C. S. A. Aguiar on 20 elderly women living in a long-stay institution located in a town in the state of Bahia. Information was collected employing partially structured interviews held during the period of October to November 2010. Data collected was descriptively analyzed in order to filter out the part of interest for assessment using Bardin Thematic Content Analysis (TCA). The high prevalence of depressive symptoms and drug-involvement denotes that life history marked by social exclusion of the women in the study contributed to trigger drug addiction. Keywords: Substance-Related Disorders. Aged. Institutionalization. REFERÊNCIAS BARDIN, L. 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