UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ CENTRO DE EDUCAÇÃO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE CURSO DE PSICOLOGIA PATRÍCIA MADALOZZO TEIXEIRA DOENÇAS INFLAMATÓRIAS INTESTINAIS E REPERCUSSÕES EMOCIONAIS: um estudo exploratório Itajaí, (SC) 2006 1 PATRÍCIA MADALOZZO TEIXEIRA DOENÇAS INFLAMATÓRIAS INTESTINAIS E REPERCUSSÕES EMOCIONAIS: um estudo exploratório Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Psicologia da Universidade do Vale do Itajaí. Orientadora: Profª. Giovana Delvan Stühler Itajaí (SC), 2006 2 AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente a toda minha família por estar presente, me apoiando em todos os momentos. Em especial meu pai, que teve papel fundamental na realização desta monografia, o qual esta sempre do meu lado. A minha orientadora Profª. Giovana Delvan Stühler, por seu conhecimento, seu profissionalismo e compreensão que foram essências para a conclusão deste estudo. As minhas amigas, Karina, Cristiane, Leca e Mariana que mais uma vez foram muito especiais e me apoiaram em mais essa etapa da minha vida. As professoras que aceitaram participar da banca, Profª. Maria Celina Ribeiro Lenzi e Profª. Josiane Aparecida Ferrari de Almeida Prado, por suas contribuições e disponibilidade para o término deste estudo. Enfim, gostaria de agradecer a todos que de alguma forma contribuíram nessa caminhada. 3 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................05 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA..............................................................................08 2.1 Processo saúde-doença......................................................................................08 2.2 Doença inflamatória intestinal (DII) .....................................................................11 2.2.1 Classificação ....................................................................................................12 2.2.2 Etiopatogenia ...................................................................................................12 2.2.3 Quadro clínico ..................................................................................................12 2.2.4 Tratamento .......................................................................................................14 2.3 Repercussões psico-sociais dos portadores de DII.............................................16 3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS...............................................................21 3.1Trajetória da pesquisadora................................................................................... 21 3.2 Sujeitos da pesquisa ...........................................................................................22 3.3 Instrumento .........................................................................................................23 3.4 Coleta de dados ..................................................................................................23 3.5 Análise e discussão dos dados ...........................................................................24 3.6 Procedimentos éticos ..........................................................................................25 4 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ......................................26 4.1 Apresentação e interpretação dos dados ............................................................31 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................52 6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................56 7 ANEXOS ................................................................................................................60 8 APÊNDICES...........................................................................................................61 4 DOENÇAS INFLAMATÓRIAS INTESTINAIS E REPERCUSSÕES EMOCIONAIS: um estudo exploratório Acadêmica: Patrícia Madalozzo Teixeira Orientadora: Giovana Delvan Stühler Defesa: novembro de 2006 Resumo: A presente pesquisa teve como objetivo geral identificar as repercussões emocionais nos pacientes portadores de doenças inflamatórias intestinais (DIIs). Estas dividem-se principalmente em dois grupos: Retocolite Ulcerativa Inespecífica (RCUI) e Doença de Crohn (DC). Ambas caracterizam-se por processo inflamatório intestinal e têm como peculiaridade a cronicidade e ausência de cura até o presente momento. Sua etiopatogenia ainda é indefinida, embora considerada de caráter multifatorial. Participaram desse estudo, seis pacientes portadores de DIIs, sendo três pacientes diagnosticados com RCUI e outros três pacientes diagnosticados com DC. O instrumento utilizado para coleta de dados foi uma entrevista semi-estruturada. Na análise foram selecionadas noventa unidades de registro distribuídas em seis categorias: Os Sintomas, que contém as manifestações verbalizadas pelo indivíduo de um desconforto, informações essas que auxiliam na constatação da situação orgânica e psíquica; A Doença, que evidencia o conhecimento que os pacientes possuem acerca da DII; Os Antecedentes das Doenças que mostram o estilo de vida, costumes, atividades realizadas pelos pacientes antes do diagnóstico de DII; As Conseqüências das Doenças que demonstra as restrições e mudanças decorrentes dos DII(s) na vida de seus portadores; O Tratamento, que refletem acerca da sensação de impotência dos pacientes frente à doença, dos conhecimentos que possuem sobre medicações, exames, alimentação; Os Sentimentos, que expressam angustia, nervosismo, medo, ansiedade, entre outros, presentes ou não desde o momento que é identificado o diagnóstico de DII. As categorias: Os Sentimentos e As Conseqüências da Doença obtiveram um maior número de unidades de registro. Os resultados demonstraram que as repercussões emocionais podem influenciar o quadro clínico dos pacientes com DIIs; que há uma diversidade de emoções que abalam pacientes de DIIs, sendo a depressão a repercussão emocional que predominou entre os sujeitos entrevistados; assim como a importância da relação médico-paciente para o sucesso do tratamento. Palavras-chaves:doenças inflamatórias intestinais, repercussões emocionais, saúde. 5 1 INTRODUÇÃO Este trabalho é referente à conclusão do Curso de Psicologia da Universidade do Vale do Itajaí e teve como campo de investigação a análise específica de pacientes portadores de Doença Inflamatória Intestinal (DII), patologia de relevada importância na prática médica e cujo problema central reside na cronicidade e na ausência de tratamento curativo até o presente momento. Embora se dividam em patologias distintas constituídas em grupos e subgrupos, na presente pesquisa optou-se por fixar o estudo nas duas principais doenças inflamatórias intestinais crônicas: Retocolite Ulcerativa Inespecífica (RCUI) e Doença de Crohn (DC). Pois, durante o curso das DII(s), ambas provocam um estigma semelhante entre seus portadores, devido um grande abalo emocional na vida dos mesmos. A realização desta pesquisa surgiu pelo fato de que, além da pesquisadora pertencer a uma família de médicos, sempre mostrou interesse pela área da saúde. Assim, de longa data a mesma observa comentários sobre doenças, tratamentos referentes às Doenças Inflamatórias Intestinais (DIIs), suas manifestações e, principalmente, o sofrimento destes pacientes. Na seqüência, após tomar conhecimento mais técnico, e ter acesso à literatura médica, passou a desenvolver curiosidade sobre este inusitado universo do sofrimento humano. É sabido que as Doenças Inflamatórias Intestinais (DIIs) têm etiologia ainda indefinida, considerando-se como possivelmente multifatorial e secundária a causas genéticas, imunológicas e ambientais. No entanto percebe-se haver, com freqüência, 6 influência do estado emocional dos pacientes, na evolução da patologia (DAMIÃO, 2000). Clinicamente estes pacientes sofrem importantes distúrbios nutricionais, diarréias freqüentes e persistentes, dores, hipertermia, hemorragias, estenoses, fístulas, abscessos, fissuras e, ainda mais grave, risco de doença tumoral maligna (QUILICI, 2002). Acrescente-se, ao citado, a problemática social e de relacionamentos interpessoais causada pelo estigma do estado permanente de doença. Há que se considerar que ao lado de cuidados medicamentosos torna-se de vital importância uma adequada abordagem dos distúrbios da emocionalidade em toda sua gama de variáveis. A literatura demonstra de forma clara a importância do contexto psicológico no agravamento ou recidivas das crises inflamatórias. Trabalhos médicos evidenciaram que, diante de manifestações ansiosas pode ocorrer aumento da peristalse intestinal com conseqüente piora sintomática. Há suficientes comprovações cientificamente demonstradas da relação da psique e o soma. Sabese também que pessoas depressivas podem ter prejudicado seu sistema imunológico (JEAMMET et al., 2000). Observa-se que na maioria absoluta dos pacientes tratados há oferta de cuidados médicos, sejam medicamentosos ou cirúrgicos. Mas, é deficiente a atenção ao estado emocional dos mesmos. Ora, havendo tantas observações da influência do psiquismo na evolução da doença, com agravamentos, recidivas ou mesmo melhoras, justifica-se a proposta deste trabalho pela observação fática de casos clínicos que, se previamente identificados no âmbito emocional, certamente poderiam ter evolução clínica mais favorável. No exercício do atendimento médico observam-se pacientes cuja história emocional coincide com a eclosão da doença ou 7 influencia sua evolução. A realização desta pesquisa teve como objetivo identificar as repercussões emocionais nos pacientes portadores de Doenças Inflamatórias Intestinais, a qual será apresentada da seguinte forma: no capítulo referente à fundamentação teórica será abordado o processo saúde-doença, aspectos da classificação das DIIs, sua etiopatogenia, quadro clínico, seu tratamento, assim como as repercussões psicosociais dos portadores de DII. Em seguida, serão apresentados os procedimentos metodológicos, contendo características dos sujeitos, a descrição do instrumento utilizado, os procedimentos para coleta de dados e para análise e discussão dos mesmos. No capítulo referente à apresentação e discussão dos resultados, aparecerão as categorias encontradas e a discussão dos resultados fundamentados teoricamente. Concluindo então, as considerações finais buscando realizar a interpretação dos dados analisados. 8 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 Processo saúde-doença Inicialmente torna-se importante esclarecermos o conceito de saúde. O entendimento moderno de saúde engloba valores que extrapolam o plano psíquico e somático. É óbvia a compreensão dos pensadores gregos antigos de que, para terse um corpo bom é necessário também, e paralelamente, um devido equilíbrio da emocionalidade. O inverso adequa-se perfeitamente no âmbito deste raciocínio. No entanto, outros elementos fazem parte de um contexto maior indivisível para atingirse verdadeiro e pleno estado de sanidade. Etimologicamente saúde significa são, inteiro, salvo, palavras derivadas de saluus, solidus e soldus, originadas do latim. Para REZENDE (1989), a concepção de saúde busca em relação ao físico, a adaptação do homem ao ambiente, e a doença seria a desadaptação e o mal estar. Na área mental a adaptabilidade acaba sendo mais freqüentemente empregada, utilizando as expressões adaptação psíquica e maturidade psíquica, supondo o ajustamento aos modos desejáveis de vida. Na área social, buscar a saúde como adaptação é negar a criatividade e a existência de conflitos. Surgiu, por ocasião da VIII Conferência Nacional de Saúde no ano de 1986 conceito mais ampliado que passamos a descrever: “Saúde é o resultante das condições de educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso aos serviços de saúde” (MINAYO, 1992, p.10). Para REZENDE (1989, p.87), “saúde é uma postura humana ativa e dialética frente às permanentes situações conflituosas geradas pelos antagonismos entre o homem e o meio”. 9 Ora, se bem definido o conceito de saúde como estado derivado de múltiplos valores e necessidades essenciais tais como bem estar físico e emocional, moradia, emprego e renda justos, liberdade e tantos outros elementos indivisíveis, pode-se concluir que doença diz respeito ao estado derivado de qualquer contrariedade à coexistência destas múltiplas variáveis. O vocábulo doença deriva do latim como dolentia, tendo sentido de processo mórbido (PACIORNIK, 1969). Com o evoluir do tempo às pressões sociais, de classes, sociedades profissionais e representações políticas, houve progressiva inclusão social do homem, respaldada e amparada pelos tratados constitucionais. Cada ser humano está intimamente relacionado com a doença, quer ela seja vista como ameaça potencial, como realidade a ser vivida para si ou como sofrimento de um ser querido. A doença adquire necessariamente sentido na história da pessoa (JEAMMET et al., 2000). No âmbito social e cultural há duas grandes correntes: a primeira refere-se a uma concepção ontológica de doença que confere-lhe uma existência autônoma e a segunda que considera a doença como uma reação do organismo e do indivíduo na sua totalidade a uma perturbação de seu equilíbrio (JEAMMET et al., 2000). Secular é o conhecimento da psique e do soma. O ser humano é o conjunto de corpo e mente, indivisíveis e interreagentes. É fundamental distinguir alguns elementos conceituais. As manifestações psíquicas de algumas afecções orgânicas diferem do conceito restritivo de psicossomático. Alguns autores consideram alcoolismo, tabagismo, toximania, restrição alimentar voluntária e outras manifestações, como pertencentes às doenças tipicamente psicossomáticas, mas entendemos que são nada mais que conseqüências somáticas de algumas perturbações de condutas instintivas e de 10 comportamentos (JEAMMET et al., 2000). O conceito clássico de psicossomático, no entanto, difere deste entendimento, ou seja, trata-se de toda perturbação somática que comporta no seu determinismo um fator psicológico, contribuindo, portanto de forma essencial à gênese da doença (JEAMMET et al., 2000). Durante muitos anos a maioria dos autores considerava seriamente a possibilidade de haver forte influência na gênese da Doença Inflamatória Intestinal os conflitos da emocionalidade, entendendo, desta maneira, como sendo patologia caracteristicamente psicossomática. Modernamente, no entanto, novos estudos sinalizam em direção oposta, afastando a relação causal direta do psiquismo na gênese da doença, mas apenas, interferência no aspecto evolutivo deste distúrbio multifatorial. Os conflitos psicológicos podem, e mesmo costumam agravar sintomas, provocar recidivas ou, ao contrário, melhorar a situação anterior (ANDRADE, 2002). Todos os indicadores apontam para a importância do contexto emocional, dos conflitos psicológicos capazes de interferir na doença em atividade ou mesmo latente, mas nunca como fatores etiológicos primários. Finalizando, lembramos à importância dos elementos psicossociais. O sistema familiar funciona como um conjunto de leis que regem as trocas interpessoais, problemas e desejos de cada um dos membros que, diante de doença pode perder o equilíbrio. O sistema familiar pode ser suave e aberto ou rígido e fechado. O primeiro diante de alguma modificação, ou seja, frente ao adoecer, se adaptará à nova situação. Já o segundo sistema terá a nova situação como uma ameaça para seu equilíbrio tendo dois possíveis comportamentos: a rejeição do doente ou utilizando a 11 doença como parte integrante do sistema e necessária à sua manutenção (JEAMMET et al., 2000). A expressão da doença e sua aceitação pelo meio socio-profissional está diretamente ligada à estrutura da sociedade. Situações sociais, profissionais, econômicas e vida familiar conturbadas são fatores de desencadeamento de doenças e determinantes de necessidade assistencial médica. As mesmas relações comentadas no meio familiar podem ser encontradas no contexto social e profissional. 2.2 Doenças Inflamatórias Intestinais (DIIs) As Doenças Inflamatórias Intestinais há cerca de um século são descritas e sua patogenia permanece controversa. Embora se dividam em patologias distintas constituídas em grupos, sabe-se modernamente que apresentam-se em sub-grupos identificáveis, acometem predominantemente pacientes jovens e atingem todos os países. Sua principal característica é a cronicidade e ausência de cura com tratamentos atuais (QUILICI, 2002). Embora acometam a parede intestinal provocando severo processo inflamatório e conseqüências graves tais como diarréias severas, hemorragias, desnutrição, dores, cólicas, dificuldades alimentares, febre, estenoses, fístulas, ulcerações e outros transtornos desta topografia, podem causar manifestações extra-intestinais. O organismo pode ser afetado de maneira global, com lesão de múltiplos órgãos e sistemas (QUILICI, 2002). 12 2.2.1 Classificação Há duas principais doenças inflamatórias intestinais crônicas: Retocolite Ulcerativa Inespecífica (RCUI) e Doença de Crohn (DC). A RCUI caracteriza-se por severo processo inflamatório da mucosa do intestino grosso. Entende-se, como intestino grosso, o cólon, reto e canal anal. Invariavelmente os pacientes acometidos por esta patologia têm o reto como sede do processo e freqüentemente os segmentos proximais de extensão variável. Os planos muscular e seroso da parede do intestino são preservados (DANI et al., 1993). A DC, por sua vez, traduz grave inflamação do tubo digestivo, podendo acometer desde a boca até o canal anal. A grande distinção de ambas é que o Crohn provoca processo inflamatório transmural da parede intestinal, ou seja, atingindo todas as camadas da parede da víscera (CAMPOS, 2000). 2.2.2 Etiopatogenia Atualmente persistem dúvidas acerca da etiologia da DII. Contudo há consenso entre autores e pesquisadores de que o elemento causal é multifatorial: genético, imunológico e infeccioso (ambiental). Patogenicamente estes elementos determinantes induzem na mucosa intestinal respostas imunes anormais seja na ativação ou na regulação (SANTOS, 2004). 2.2.3 Quadro Clínico As manifestações clínicas da Doença Inflamatória Intestinal são polimorfas e dependem de múltiplos fatores. Inicialmente a topografia e gravidade do processo 13 inflamatório determinam manifestações sintomáticas. A Retocolite Ulcerativa Inespecífica (RCUI) sendo caracterizada por processo inflamatório da mucosa colo-retal, região em que ocorrem ulcerações, friabilidade, edema e hemorragias, apresenta variáveis clínicas tais como diarréias de difícil controle, cólicas e dores abdominais, hipertermia, emagrecimento, distúrbios nutricionais e temeroso aumento do risco de neoplasias malignas (QUILICI, 2002). Os pacientes apresentam-se aos serviços médicos astênicos, enfraquecidos, desidratados, com capacidade laborativa prejudicada e freqüentemente impedida. A diarréia costuma ser abundante muitas vezes sanguinolenta provocando importante desconforto e não raro necessitando atendimento hospitalar (QUILICI, 2002). Complicações sérias podem acontecer tais como, hemorragias volumosas comprometendo gravemente a volemia e precisando transfusões sanguíneas para manutenção da vida. Outra complicação temível é o Megacolon Tóxico, dilatação aguda e progressiva do intestino, com risco eminente de necrose e capaz de provocar toxemia e choque nos pacientes. Outro fator de risco que pode modificar evolução clínica destes pacientes é o advento de tumores malignos, tanto mais freqüentes quanto mais antiga a doença (DAMIÃO, 2000). A Doença de Crohn (DC), por sua vez, caracteriza-se por processo inflamatório transmural da parede das vísceras ocas, tendo como característica, lesões associadas, intercaladas por segmentos normais. Desde a cavidade oral até o canal anal pode haver comprometimento. Os sintomas assemelham-se aqueles da RCUI com algumas distinções a seguir relatadas: estenoses, ou seja, diminuição do calibre de forma anelar ou segmentar de partes da víscera, fístulas que são trajetos anormais de comunicação entre órgãos. Assim, pode haver fenômeno de fecalúria que é a perda de matéria fecal por via urinária. Se ocorrer uma fistulização do reto 14 ou mesmo intestino com o canal vaginal, pode haver o desconforto de perder fezes pela região genital. Não são raras as fístulas do reto com região glútea ou mesmo coxas. Pode ainda haver fístulas êntero-enterais1, êntero-cólicas2 ou êntero ou colocutâneas3 (DANI et al.,1993). Severas e múltiplas ulcerações podem ocorrer na via digestiva provocando tais como na RCUI. Por outro lado, se ocorrer área de estenose a manifestação clínica será de sub ou mesmo oclusão intestinal. Neste caso o paciente apresentará dor abdominal de forte intensidade, cólicas intensas, náuseas e vômitos, distensão abdominal e parada de flatos e evacuatória (QUILICI, 2002). Muito importante é a possibilidade de manifestações extra-intestinais das DII. São muito comuns comprometimentos de outros órgãos, regiões e sistemas. Tomemos como exemplo, paciente que procura atendimento médico com queixa de forte dor articular e febre. É possível tratar-se de artrite secundária a uma das Doenças Inflamatórias Intestinais, ou seja, grave quadro inflamatório de uma articulação dificultando a mobilização do membro. Doenças oftalmológicas, renais, hepáticas, cutâneas e outras podem surgir nos doentes deste grupo (DANI et al., 1993). 2.2.4 Tratamento Em princípio o tratamento deverá ser clínico. Os objetivos são: diminuir a atividade inflamatória da doença, compensar os desequilíbrios secundários, tratar 1 2 3 Fístula êntero-enteral: comunicação anômala de um segmento de intestino delgado com outro segmento do mesmo órgão (os líquidos de uma parte do intestino delgado drenam para outra sem conexão anatômica imediata). Fístula Êntero-cólica: comunicação anômala de um segmento de intestino delgado com outro segmento do Colon (os líquidos do intestino delgado drenam para o interior do Colon). Fístula êntero-cutânea: comunicação anômala de um segmento de intestino delgado com a pele (ocorre drenagem de matéria fecal através da pele). 15 infecções, melhorar o estado nutricional e buscar alívio dos abalos emocionais. Idealmente todas as medidas visam determinar remissão dos sintomas e possibilitar a manutenção desta remissão. O problema fica na dependência de elevado índice de recidivas em ambas as patologias, chegando a 60% de possibilidade (GOLIGHER, 1990). Existem variados esquemas medicamentosos no arsenal terapêutico. Compostos nutricionais, complexos vitamínicos, derivados salicilados, corticóides, imunomoduladores, todos indicados segundo critérios de gravidade da doença (DAMIÃO, 2000). Em casos específicos pode ser inevitável tratamento operatório. Se um determinado paciente não desobstruir sua área de estenose poderá submeter-se à enteroplastia4 ou mesmo ressecção segmentar. Outro exemplo de indicação cirúrgica diz respeito aos casos de abscessos anais e peri-anais (QUILICI, 2002). Na verdade há enorme variável de técnicas cirúrgicas para abordar pacientes com DII. Uma das cirurgias mais comprometedoras e graves é a Procto-Colectomia5 total pelo radicalismo do procedimento. É indicada em casos refratários às medidas medicamentosas, havendo persistente diarréia ou sangramento, bem como risco eminente de câncer. A principal conseqüência será a perda da continência evacuatória e colostomia6 definitiva (KEIGHLEY et al.,1999). Mais modernamente tem sido realizada técnica de Procto-Colectomia com Bolsa Ileal7. Esta possibilidade técnica permite confeccionar reservatório que se 4 5 6 7 Enteroplastia: manobra cirúrgica plástica executada no intestino delgado, reconstituindo o trânsito anteriormente obstruído. Procto-colectomia: operação cirúrgica que remove todo o colon e o reto. Colostomia: técnica operatória que abre na pele um segmento do colon. Indicada para desfuncionalizar áreas obstruídas ou com suturas intestinais frágeis. A colostomia pode ser temporária ou definitiva. Bola ileal: técnica cirúrgica que possibilita a constituição de um neo reto nas situações em que o paciente é submetido à procto-colectomia total. A bolsa ileal é um reservatório criado com segmento excluso de intestino delgado que substitui o reto amputado. 16 assemelha ao reto e manutenção do canal anal e seus esfincteres e, portanto, a desejada continência evacuatória. (QUILICI, 2002). 2.3 Repercussões psico-sociais dos portadores de DIIs Abre-se espaço para estudos investigativos em pacientes portadores de DIIs no universo de sua emocionalidade e meio circundante. Vários estudos buscam demonstrar as manifestações psicológicas nestes doentes peculiares, tentando compreender o universo de sua problemática e suas reações diante da dor e temores (DANI, 1993; COELHO, 1990; FOLKS et al., 2000; ANDRADE e MESQUITA, 2000). Durante anos, as Doenças Inflamatórias Intestinais, especialmente a RCUI, foram consideradas como doenças psicossomáticas, em que as características de personalidade, distúrbios psiquiátricos e fatores psicossociais teriam um importante papel etiológico. Mais recentemente, a importância destes fatores na gênese da doença tem sido muito questionada (ANDRADE E MESQUITA, 2000). Diante do severo fator de estresse destes pacientes, são freqüentes manifestações de ansiedade e depressão, inicialmente pelo conhecimento diagnóstico da patologia e suas repercussões físicas, seguido pelas dificuldades terapêuticas, bem como a inevitabilidade de gastos, o afastamento social e familiar, o impedimento laborativo e, finalmente, o considerável índice de recidivas, além da cronicidade habitual. De acordo com a teoria cognitivo-comportamental (TCC), as pessoas podem ser divididas em duas categorias na maneira como enfrentar as doenças: orientadas para o problema ou orientadas para a emoção. As primeiras, ao lidarem com 17 situações de doença, tenderão a buscar informações, procurarão trocar idéias com os médicos, amigos, grupos de auto-ajuda para alterarem suas concepções, seus hábitos e as características do ambiente em que vivem. Tudo isso com a finalidade de reassumirem o controle de suas vidas, tornando as conseqüências da doença mais toleráveis. As segundas estarão mais preocupadas em lidar com suas emoções, reduzindo-lhes o impacto. Terão mais dificuldades para se focalizar em alternativas cognitivas. Tais pacientes responderão mais emocionalmente, usarão mais mecanismos de defesa, sentirão mais desesperança, desamparo e depressão, necessitando de estratégias de apoio psicológico vinda da família, de amigos e da equipe assistencial (LAZARUS, 1976 apud BOTEGA, 2002). A RCUI tem sido objeto de muitos estudos psicossociais de personalidade, conflitos intrapsíquicos e de categoria de eventos da vida, possivelmente associados com o início, agravamento ou remissão da doença (FOLKS et al., 2000). Observa-se que vários dos processos metodológicos na literatura deixam dúvida quanto ao significado dos padrões psicológicos de personalidade e comportamento associados a esta doença. Muitos estudos têm observado a presença de personalidades compulsivas na figura dos pais, especialmente da mãe. Muitos pacientes são dependentes, imaturos, sendo descritos como infantis e regredidos (FOLKS et al., 2000; ANDRADE e MESQUITA, 2000). Há distinção nos padrões de manifestação emocional dos pacientes portadores de RCUI e DC. Os portadores de Retocolite Ulcerativa, embora grave e multiconsequente, podem ter a doença debelada e resolvida com tratamentos operatórios radicais, com prognóstco mais favorável. As cirurgias comportam importante morbidade e de complicações, mas, quando definitivas, eliminam os 18 segmentos sede da patologia (FOLKS et al., 2000). Os doentes acometidos por Doença de Crohn, ao contrário, são agredidos por doença implacável, recidivante e passível de acometer distintas regiões, jamais resolvida por qualquer técnica operatória. A remoção de segmentos doentes não impede recidiva de novos focos em outras regiões do organismo. Ambas têm caráter de cronicidade, mas procedimentos cirúrgicos múltiplos são mais freqüentes nos portadores de Doença de Crohn do que naqueles com RCUI. Isto provoca prevalência mais alta de doenças secundárias (FOLKS et al., 2000). Dois estudos controlados por Helzer et al; (1982, 1984) apud Folks e Kinney (2000) compararam ambas as patologias e concluíram que portadores de RCUI não apresentavam maior incidência de distúrbios graves emocionais do que aqueles do grupo controle. No entanto, pacientes com Crohn apresentaram expressiva prevalência de depressão do que os indivíduos-controle. Observaram ainda, não haver uma seqüência temporal consistente de envolvimento. Outro estudo desenvolvido por McKegney e colaboradores (1970) apud Folks e Kinney (2000) também investigou pacientes com DII e conclui-se não haver diferença significativa dos pontos de vista psicossocial, psicológico e comportamental. No entanto, foi observado maior índice de depressão naqueles pacientes com incapacidades físicas mais graves. Outra pesquisa desenvolvida por Andrews e colaboradores (1987) apud Folks e Kinney (2000), concluíram que pacientes portadores de Crohn apresentaram maior índice de distúrbios da emocionalidade do que aqueles com RCUI. Tarter e colaboradores (1987) apud Folks e Kinney (2000) chegaram às mesmas impressões do trabalho de Andrews. O Hospital das Clínicas da UNICAMP desenvolveu estudo com portadores de 19 RCUI observando índice de depressão de 29% nos mesmos. Infelizmente não comparam, neste trabalho, com os portadores de Doença de Crohn. Addolorato et al. (1997) apud Andrade e Mesquita (2000), estudaram um grupo de 43 pacientes com Crohn e 36 com RCUI. Concluíram os autores, que havia índice de ansiedade de 83% e depressão de 55% dos pacientes com doença em atividade. Naqueles pacientes em fase de remissão da doença, o percentual foi respectivamente de 21% e 14%. Aventam, estes autores, a possibilidade da influência dos distúrbios emocionais na patogênese da depressão. Há ainda que se considerar os efeitos deletérios dos corticóides longamente utilizados por estes pacientes, resultando em insônia, agitação, labilidade emocional e até psicose. É fundamental, no manejo deste grupo de pacientes, a compreensão dos conflitos sociais. Inicialmente o forte estigma da doença pode provocar conflitos no sistema familiar, havendo absorção saudável e harmônica do universo de seu ente ou atitudes de rejeição com conseqüente desarmonização da família. O meio social relaciona de forma semelhante com o núcleo familiar (JEAMMET et al., 2000). De acordo com a TCC é crucial o apoio social recebido pelo paciente. Apoio social é um constructo teórico com muitos componentes, diferenciando o apoio de fato disponível e a percepção que a pessoa faz em relação à adequação desse apoio. Uma rede do apoio social adequada pode repercutir na redução do estresse e, consequentemente, nos agravos à saúde (HENDERSON, 1990 apud BOTEGA, 2002). O aspecto físico por vezes comprometido, associado ao emagrecimento e odores desagradáveis gera insegurança e temores nestes pacientes. A ocorrência de abscessos e fístulas provoca dores e odores acentuados (QUILICI, 2002). A vida sexual deste grupo de pacientes pode ser drasticamente comprometida 20 quando houver acometimento ano-genital. Dores, fístulas com drenagem de secreções purulentas e odores desagradáveis provocam inseguranças e inibição nos doentes. Muitas vezes a atitude de repulsa, ou simples evitar do olhar, causa profundo abalo na emocionalidade das pessoas portadoras (DANI, 1993). 21 3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS A presente pesquisa está baseada numa perspectiva qualitativa, a qual possibilita a formação de questões para a pesquisa, usa a comunicação e observação, busca particularidades. Os elementos básicos da análise qualitativa são palavras e idéias que visam à descoberta, descrição compreensão e interpretação partilhada, onde o pesquisador participa do processo e o todo é mais do que as partes (TURATO, 2003). A metodologia qualitativa visa identificar o que os sujeitos têm a dizer sobre determinado assunto, o significado que dão ao mesmo. A descrição é realizada em termos não numéricos (GREENHALGH e TAYLOR, 1997 apud TURATO, 2003). Através da pesquisa qualitativa é possível coletar dados subjetivos além dos objetivos, possibilita investigar sentimentos, reações, crenças sobre assuntos que exigem uma maior aproximação do pesquisador com o participante (TURATO, 2003). 3.1 Trajetória da pesquisadora O interesse em investigar esse tema surgiu a partir da convivência da pesquisadora com familiares profissionais da área de gastroenterologia e coloproctologia, assim como com psicólogos responsáveis por tais pacientes. Por isso, a mesma teve a possibilidade de acompanhar esses pacientes portadores de DIIs e assim obteve interesse pelo assunto, pois percebeu a inquietação dos mesmos frente a problemática em questão. 22 Após, mantidos contatos com a equipe da Clínica Gastromed situada no município de Foz do Iguaçu, Paraná, obteve-se autorização para a realização do estudo (APÊNDICE 01). Tal local de coleta de dados justifica-se por ser esta a cidade de origem da pesquisadora, tendo fácil acesso aos pacientes portadores de DIIs. As entrevistas foram agendadas a partir de contato informal com cada paciente, os quais compareceram na clínica e mostraram-se muito à vontade para colaborar com o presente trabalho. Alguns participantes se dispuseram a fornecer maiores esclarecimentos sobre a sua doença e seu estado emocional e, para isso após as entrevistas, ofereceram seus e-mails e telefones. Porém, não houve necessidade de realizar nenhum contato posterior à coleta de dados. 3.2 Sujeitos da pesquisa Os sujeitos da presente pesquisa foram seis pacientes portadores de doença inflamatória intestinal (DII), consistindo em quatro mulheres e dois homens, sendo três pacientes diagnosticados com retocolite ulcerativa inespecífica (RCUI) e outros três pacientes diagnosticados com doença de Crohn (DC), conforme o quadro abaixo: Quadro 1- Identificação dos sujeitos da pesquisa Identificação Sexo Idade S1 S2 S3 S4 S5 S6 F F M F F M 30 anos 37 anos 39 anos 76 anos 37 anos 40 anos Diagnóstico D.C. D.C. RCUI D.C. RCUI RCUI Tempo de diagnóstico 13 anos 2 anos 10 anos 7 meses 10 anos 12 anos 23 3.3 Instrumento Para a coleta de dados foi utilizada uma entrevista semi-estruturada como uma técnica onde o entrevistador organiza um conjunto de questões, apoiada em teorias e hipóteses sobre o tema estudado (APÊNDICE 02). Tal técnica oferece liberdade e espontaneidade necessárias para o entrevistado falar livremente sobre assuntos que vão surgindo, enriquecendo a investigação. Assim, o entrevistado segue espontaneamente sua linha de pensamento e experiências a partir do foco principal colocado pelo entrevistador e participa da elaboração do conteúdo da pesquisa (MAZZOTTI, 1998; PÁDIA, 2000; TURATO, 2003; TRIVINOS, 1987). 3.4 Coleta de dados A pesquisadora teve acesso aos pacientes diagnosticados com DIIs na clínica Gastromed, através de contato com o médico e psicóloga, responsáveis por estes, esclarecendo devidamente sobre os objetivos da pesquisa e apresentando o termo de consentimento livre e esclarecido para que os participantes assinassem autorizando a entrevista (APÊNDICE 03). Após autorização foram agendadas as entrevistas, as quais foram realizadas individualmente em uma sala reservada para grupo de estudos e reuniões na clínica em questão. O resultado desta análise será encaminhado à psicóloga da clinica que fará a comunicação do mesmo aos participantes, bem como poderá fazer uso do material para o trabalho psicoterápico dos mesmos. 24 3.5 Análise e discussão dos dados Os dados obtidos na presente pesquisa foram analisados pelo método de análise de conteúdo proposto por Bardin (1977) apud Moraes (1999) e discutidos à luz de alguns pressupostos da Teoria Cognitiva Comportamental (TCC). A análise de conteúdo é uma metodologia usada para descrever e interpretar conteúdos de documentos e textos. Tal análise permite uma interpretação e compreensão das questões em um nível que supera a leitura comum (MORAES, 1999). Na análise de conteúdo são apresentados as seguintes operações: - Codificação: processo no qual os dados são transformados em categorias, possibilitando uma descrição das características gerais do material. Pode ser realizada a partir de recorte referente à escolha das unidades, enumeração de acordo às regras de contagem, classificação e agregação em relação à escolha das categorias (FRANCO, 1986; RODRIGUES e LEOPARDI, 1999). - Unidade de Registro: seleciona-se o elemento correspondente ao segmento de conteúdo a ser considerado como unidade de base. Pode ser um tema, uma palavra ou uma frase desde que exprima pensamento completo (FRANCO, 1986; RODRIGUES e LEOPARDI, 1999). - Categorização: refere-se à classificação, agrupamento de dados por semelhança ou analogia previamente estabelecidos ou definidos. Compreende o inventário, que consiste em isolar os elementos e a classificação que é a divisão dos elementos (FRANCO, 1986; RODRIGUES e LEOPARDI, 1999). A teoria cognitiva comportamental (TCC) que servirá de base para presente 25 pesquisa, constitui-se de técnicas comportamentais e cognitivas e fundamenta-se no pressuposto de que o afeto e o comportamento do indivíduo são determinados modo como ele estrutura seu mundo em termos cognitivos. Sendo assim, a imagem que o paciente faz da doença e de seu tratamento deve ser pesquisada em seus elementos concretos e subjetivos (PETRIE e cols., 1996 apud BOTEGA, 2002). 3.6 Procedimentos éticos A presente pesquisa está de acordo com a resolução 196/96 do conselho nacional de saúde, pois exigiu a anuência por escrito dos sujeitos da pesquisa ou seu representante legal, mediante explicação completa e pormenorizada sobre a natureza da pesquisa, benefícios previstos, potenciais riscos e incômodos que podem ocorrer em decorrência do estudo. Tal anuência é o termo de consentimento livre e esclarecido. 26 4 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS No presente capítulo será apresentado às percepções gerais sobre os sujeitos participantes da pesquisa, assim como a análise dos relatos apresentados e fundamentados com embasamento teórico por diversos autores. As categorias De posse das entrevistas transcritas e analisadas, selecionou-se noventa unidades de registro distribuídas em seis categorias. A seguir serão apresentadas as categorias e as unidades de registro pertencentes a cada uma delas, assim como a literatura necessária para a análise e discussão dos dados encontrados. 1ª Categoria – Os Sintomas Por sintoma entende-se uma forma de expressão manifestada pelo indivíduo diante de um desequilíbrio orgânico e/ou psíquico. As falas dos pacientes revelaram o caráter multifatorial referente a etiopatologia das DII(s). 2ª Categoria – A Doença Nesta categoria, as falas evidenciam o conhecimento que os pacientes possuem acerca da DII. Refere-se conhecimento como toda e qualquer informação que se tenha sobre um assunto em questão, é uma noção adquirida pelo estudo ou experiência (FERREIRA, 2004). 27 3ª Categoria – Os Antecedentes da Doença Esta categoria inclui as unidades de registro que mostram o estilo de vida, costumes, atividades realizadas pelos pacientes antes do diagnóstico de DII. 4ª Categoria – As Conseqüências da Doença Nesta categoria são expostas unidades de registro que evidenciam as restrições e mudanças decorrentes dos DII(s) na vida de seus portadores, pois estas complicações têm uma forte repercussão na história de vida das pessoas. 5º Categoria – O Tratamento As falas nesta categoria refletem acerca da sensação de impotência dos pacientes frente à doença, assim como demonstram a rigorosidade do tratamento a que são submetidos, os conhecimentos que possuem sobre medicações, exames, alimentação. 6ª Categoria – Os Sentimentos As falas referentes a esta categoria, expressam sentimentos, como angustia, nervosismo, medo, ansiedade, entre outros, presentes ou não desde o momento que passa a se conhecer o diagnóstico de DII. Nesta categoria serão apresentadas unidades de registro que mostram a relação entre as DII (s) e possíveis repercussões emocionais. A seguir será demonstrado um quadro referente à distribuição das unidades de registro nas categorias conforme o diagnóstico, sendo especificado a porcentagem encontrada em cada categoria a partir das entrevistas realizadas para presente pesquisa. 28 Quadro 2- Distribuição das Unidades de Registro nas Categorias conforme o Diagnóstico Categorias RCUI DC Porcentagem Os Sintomas 7 7 15,55% A Doença 5 5 11,11% Os Antecedentes da Doença 5 3 8.88% As Conseqüências da Doença 10 11 23,33% O Tratamento 10 7 18,88% Os Sentimentos 10 10 22,22% Pelo quadro acima podemos observar uma semelhança na distribuição das unidades de registro. Observa-se que durante o curso das DII(s), tanto a RCUI quanto a DC provocam um estigma semelhante entre seus portadores, pois ambas causam um grande abalo emocional na vida dos portadores, devido a todas as restrições e mudanças decorrentes das mesmas, sendo estas já citadas anteriormente. Observa-se que as categorias: As Conseqüências da Doença e Os Sentimentos foram as que mais se destacaram entre as demais discutidas na presente pesquisa. Tal fato demonstra o grande impacto emocional que as DII(s) provocam em seus pacientes. Os pacientes acometidos da DII(s) apresentam fortes manifestações de ansiedade e depressão, devido ao grande índice de estresse que os acompanha em todo o processo. Desde o conhecimento do diagnóstico da doença, seguida pelas mudanças inevitáveis em suas vidas, tais como: afastamento social, alterações nutricionais, dificuldades terapêuticas, conseqüências físicas, aumento de gastos, 29 seguido pela cronicidade destas patologias, entre outros. A partir desses dados é possível verificar a relação existente entre as DII(s) e as repercussões emocionais. Percebe-se que o indivíduo doente precisa mudar sua maneira de viver, suas relações, assim como seus pensamentos, pois tratando-se de uma doença crônica, esta acarreta embaraços socias, afetam a qualidade de vida do seu portador, interfere com seu trabalho, lazer e relacionamentos sociais e sexuais (ANDRADE E MESQUITA, 2000). 30 Quadro 3 - Mapa das categorias encontradas em portadores de DII(S). “Eu passava por vários períodos de estresse e ansiedade onde priorizava tudo, menos a mim mesma.” “Hoje vivo assim, com medo do que terei que enfrentar a cada dia.” Os Antecedentes da Doença As Conseqüências da Doença “Uma doença crônica que não tem cura” A Doença DOENÇAS INFLAMATÓRIAS INTESTINAIS (DIIs) Os Sintomas “O que está acontecendo comigo?” O Tratamento “com medicamentos é difícil, sem eles seria terrível.” Os Sentimentos “São muitos sentimentos, uma confusão” 31 4.1 Apresentação e interpretação dos dados 1ª Categoria – Os Sintomas “O que está acontecendo comigo?” Entende-se por sintomas a manifestação verbalizada pelo indivíduo de um desconforto, assim como manifestação sensitiva de uma disfunção, lesão ou patologia. Pelos seus sintomas, sinais e/ou exames diversos pode-se chegar ao conhecimento ou determinação de uma doença (FERREIRA, 2004). Nesta categoria, observou-se o caráter multifatorial das DII(s). Conforme as falas abaixo: “Descobri que meu pai estava traindo minha mãe...Fiquei muito revoltada, triste e fui direto contar para minha mãe, mas ela não acreditou em mim e pior, ficou brava comigo...Imediatamente eclodiu a Doença de Crohn, muito grave” (S1). Não se sabe com certeza a causa para essas doenças, mas verifica-se que fatores genéticos, infecciosos, imunológicos e psicológicos podem ter ligação com o surgimento dos sintomas. Na fala relatada acima se observa um caso onde a tensão emocional desencadeou a doença, pois o sujeito passou por um estresse e em seguida eclodiu a Doença de Crohn. Pesquisas revelam que fatores emocionais podem ser considerados precipitadores da doença, mesmo que não possam ser considerados agentes causadores. Estes devem ser vistos como fortes elementos contribuidores da melhor ou pior fase da doença (AIRES, 2006). 32 A pessoa cuja tensão acaba causando problemas digestivos é um exemplo típico de como a ansiedade e o estresse exarcebam problemas clínicos. O estresse entre tantos órgãos e sistemas que atua, também pode levar a ulceração do trato gastrintestinal, provocando sintomas como os DII(s) (AIRES, 2006). Nos relatos a seguir percebe-se um elemento causal diferente das falas citados anteriormente. “Comecei a ter crises de vomito e diarréia” (S2). “... Tive diarréia crônica, por mais de um mês, muito aquosa” (S2). “Fiquei internada um tempo no hospital porque as crises não passavam, fiz vários exames até que descobriram que eu tinha Crohn” (S2). “As crises se agravaram com problemas alimentares e infecção generalizada, fiquei muito tempo internada e quase morri” (S4). “Me sentia muito fraca” (S5). As DIIs apresentam manifestações clínicas dependentes de diferentes fatores. Os portadores geralmente procuram o médico enfraquecidos, pois a diarréia costuma ser abundante às vezes sanguinolenta. Fato que causa grande desconforto e assim pode necessitar de atendimento hospitalar (QUILICI, 2002). “Percebi um muco estranho nas fezes quando eu ia ao banheiro, depois surgiu pus no reto” (S3). “... depois de exames como colonoscopia, endoscopia e vários outros, foi comprovado o diagnóstico de RCUI” (S3). “Antes da doença em alguns dias sem motivo nenhum começava umas cólicas intermináveis. Pensava que era uma coisa da idade... “(S4). “Senti dores abdominais e anais com forte febre...” (S4). “Procurei um médico gastroenterologia que me pediu um batalhão de exames, entre eles o de colonoscopia e o resultado foi de Retocolite Ulcerativa Inespecífica” (S5). 33 “Há doze anos comecei a ter diarréia com sangue, muito grave” (S6). “... Tive uma febre que passou a ser mais constante e um emagrecimento exagerado” (S6). “Enfrentei uma maratona de médicos... Até que o que eu tinha era Retocolite Ulcerativa Inespecífica” (S6). Sabe-se que a fisiopatologia das DIIs não está estabelecida, compreendendo provavelmente fatores ambientais como agentes infecciosos e dietéticos, fatores imunológicos, fatores genéticos e fatores estressantes (ANDRADE e MESQUITA, 2000). O organismo pode ser acometido por inteiro nas DIIs, embora causem um processo inflamatório primário na parede do intestino e assim ter conseqüências como às citadas, anteriormente, alem de hemorragias, dores, cólicas, dificuldades alimentares, febre, fístulas, entre outros, podendo provocar, até mesmo, manifestações extra intestinais. Tais possibilidades dificultam o diagnóstico, pois muitas vezes são confundidos com problemas de outras áreas médicas (DANI et al., 1993). 2ª Categoria – A Doença “Uma doença crônica que não tem cura” As DIIs têm como principal característica a cronicidade e ausência de cura com tratamentos atuais. Embora acometa a parede intestinal provocando severo processo inflamatório e conseqüências graves, o organismo pode ser afetado de forma geral, com manifestações até mesmo extra intestinais (QUILICI, 2002). Segundo Zozoya apud Santos e Sebastiani (1996), a doença crônica é um estado que apresenta uma ou mais das características a seguir: que seja permanente; que deixe incapacidade residual, que produza alterações patológicas 34 não reversíveis, que requeira reabilitação ou que necessite períodos longos de observação, controle e cuidados, assim como quando os recursos terapêuticos existentes são insuficientes para assegurar a cura. As doenças crônicas podem dificultar o retorno do paciente ao mercado de trabalho, gerar problemas financeiros, comprometer a relação do paciente com seus familiares e diminuir o prazer de diferentes atividades (SMITH, NICASSIO e TAYLOR apud GUIMARÃES, 1999). A doença emerge como uma agressão abala a condição do ser humano e torna o futuro incerto. (SANTOS e SEBASTIAN, 1996). Ser sujeito de uma doença, de um infortúnio, para quem quer que seja, é um fato infinitamente injusto e que necessita de sentido, de compreensão a partir de uma cadeia de causas e efeitos, isto é, precisa ser explicado (SINDZINGRE, 1991, apud CREPALDI, 1999). Nesta categoria observa-se o conhecimento que os pacientes entrevistados possuem acerca da DII. A maioria revela que ao receberem o diagnóstico não sabiam do que se tratava, mas pesquisaram sobre o tema. Como aparece a seguir: “Eu não sabia do que se tratava...” (S5). “Comecei a pesquisar na Internet, converso muito com meu médico, procuro sempre outras pessoas que também sofrem dessa doença para trocar idéias e receitas” (S5). “Hoje, sei que é uma doença crônica que não tem cura...” (S5). “Pesquiso muito sobre esta doença” (S1). “Comprei livros, entro sempre na Internet e sou sócia da Associação Brasileira de Crohn” (S1). “Pesquisei bastante sobre essa doença” (S2). “Sempre converso muito com meu médico e junto da minha família procuramos nos informar através da Internet e lendo revistas sobre o assunto” (S2). 35 Uma preocupação fundamental do ser humano esta, a na tentativa de atribuição de sentido para a doença (CREPALDI, 1999). A partir do conhecimento apropriado sobre a doença, percebe-se uma melhora significativa no estado de saúde do paciente. Este tem direito irrestrito de ser informado a respeito da sua patologia, medicações prescritas, procedimentos necessários, riscos, contra-indicação e prognóstico. Tal direito encontra-se no código de Ética do Hospital Brasileiro e no Código de Ética Médica (CAMPOS, 1995). Outros pacientes expressaram certa insegurança quanto ao conhecimento referente de seu diagnóstico, como: “Pelo que sei é uma doença que causa infecção nos intestinos, não sei muita coisa” (S6). “Não sei muita coisa, sei que é uma inflamação que destrói todas as camadas do intestino” (S4). “Sei que é uma doença inflamatória do intestino e que não possui cura atualmente, somente um tratamento que faz com que o paciente viva melhor” (S3). “Parece que alguns casos pode melhorar com cirurgia” (S3). A falta de informações pode desencadear estado de ansiedade, medo, insegurança e angustia. Ao contrário, o individuo mais informado acaba realizando de forma mais adequada o tratamento (SANTOS e SEBASTIAN, 1996). Segundo Ferreira (2004), crônico é tudo aquilo que dura muito tempo. No caso das doenças são aquelas que têm longa duração. Sabendo que as DIIs são crônicas, o paciente vivência mudanças radicais em sua vida e não pode ficar alheio a estas doenças, pois estas apresentam sintomas que podem debilitar (SGANZERLA, 2003). 36 3ª Categoria – Os Antecedentes da Doença “eu passava por vários períodos de estresse e ansiedade onde priorizava tudo, menos a mim mesma”. O tipo da doença e a época da vida em que adoece têm muito haver com a história do individuo. A biologia de cada paciente explica as suas possibilidades de adoecer (PEREZ, 1992, apud DIAS, 1994). Nas falas a seguir verifica-se tal fato: “Minha vida antes da doença, antes de descobrir que tinha Crohn era mais voltada para o trabalho, eu passava por vários períodos de estresse e ansiedade onde priorizava tudo, menos a mim mesma” (S2). A ansiedade é definida como um estado de humor desconfortável, uma apreensão negativa em relação ao futuro, uma inquietação interna desagradável. Repetidos momentos de ansiedade indicam elevados níveis de estresse. Este pode causar distúrbios em todos os órgãos e sistemas. No trato gastrintestinal, múltiplas desordens são passíveis de acometimento: anomalias motoras, lesões da mucosa das vísceras ocas, alterações secretórias, ocorrências estas, capazes de agravar uma DII(ATKINSON et al., 2000). “Sempre tive uma vida muito estressante” (S5). O estresse, segundo Lazarus e Folkman (1984) apud Guimarães (2001), é uma relação entre a pessoa e o ambiente, avaliada por ela como exigente ou excedente a seus recursos pessoais de enfrentamento e ameaçadoras de seu bemestar. 37 “Minha vida antes? Eu podia comer muita coisa, hoje eu não posso, eu tinha menos problemas, apesar do estresse que sempre me acompanhou” (S5). “Antes era muito boa a minha vida, normal como qualquer outra pessoa. Meu estresse era no casamento, brigava muito com minha mulher. Por isso tive até uma relação fora do casamento” (S3). Percebe-se com os depoimentos anteriores a presença constante de estresse na vida de tais pacientes. Os aspectos psicológicos representam um fator importante nas DII(s). Pesquisas indicam que o estresse exerce efeito adverso diretamente sobre o trato gastrintestinal. O estresse é desencadeador de 75% dos ataques de RCUI, mas há fortes componentes emocionais, em outras ocasiões, que não desencadeiam um ataque da doença. Percebe-se que os fatores emocionais devem ser vistos como elementos com contribuidores e precipitadores da melhor ou pior fase da doença. (AIRES, 2006). Na doença de Crohn é a ansiedade, a emoção com maior influencia nos indícios científicos. Repetidos momentos de ansiedade indicam altos níveis de estresse. O estresse pode levar a ulceração do trato gastrintestinal provocando, como já citado anteriormente, sinais de DII (AIRES, 2006). O grau em que a pessoa experimenta sofrimento psicológico, ou má saúde após situação potencialmente estressante, é determinado pelas vulnerabilidades e virtudes biológicas e psicológicas que elas trazem para estas situações (ATKINSON et al., 2000). Um entrevistado relatou ser depressivo há algum tempo, como observamos a seguir: “... já sou depressiva há algum tempo” (S4). 38 Depressão é um transtorno de humor caracterizado por tristeza e abatimento, diminuição da motivação e interesse pela vida, pensamentos negativos e sintomas físicos como perturbação do sono, perda de apetite e fadiga. Sabe-se que a depressão não resolvida pode resultar em doença e constata-se sua presença em uma grande parcela de pacientes com doenças gastrintestinais (ATKINSON et al., 2000). Em outras entrevistas há relatos de vida aparentemente normal: “Antes da doença eu era mais otimista, não tinha medo do futuro, mas vivia sem grandes sonhos, expectativas. Eu achava que poderia conseguir tudo o que me depusesse ir atrás” (S1). “Eu nunca havia tido nenhum problema de saúde” (S1). “Trabalhava bastante, comia bem, vivia bem na medida do possível” (S6). 4ª Categoria – As Conseqüências da Doença: “Hoje vivo assim, com medo do que terei que enfrentar a cada dia”. As conseqüências da doença referem-se às mudanças ocorridas na vida dos pacientes decorrentes do DII. Tais conseqüências incluem desde mudanças nos hábitos de vida cotidiana, como alterações alimentares, alterações físicas, assim como mudanças na maneira de pensar e suas repercussões emocionais. Alguns pacientes relatam insegurança diante do futuro, pois dependem de como será a evolução de seu problema de saúde. O paciente passa a viver em função da doença. Tudo fica sem graça, vazio, o desânimo toma conta e assim inibe suas atividades (LIMA et al., apud SANTOS e 39 SEBASTIAN, 1996). “Com a doença veio à depressão primeiramente, tive anorexia nervosa e não queria mais nem sair de casa” (S1). “Atualmente devido aos medicamentos, as quantidades excessivas de medicações, assim como o excesso de evacuações, dor intensa, não consigo ter uma vida normal” (S3). É interessante ressaltar que tanto os comportamentos quanto os sentimentos a esses relacionados, apresentados pelos portadores de alguma doença, são provenientes do processo psicológico envolvido no adoecer, que abrange a reconstrução da identidade social desses indivíduos (GUIMARÃES, 1999). “Estou sempre angustiado, com medo, inseguro diante da possibilidade de piora” (S3). “Com a medicação me sinto muito sonolenta, tonteiras, muitas vezes a memória fica lenta” (S4). “Isso tudo me trouxe uma depressão” (S5). Ao tratar um paciente deprimido, nunca se deve desconsiderar a gravidade de sua perda, a limitação de sua capacidade de sentir prazer e a intensidade de sua tristeza, pois esse experimenta vibrações extremas de emoções desagradáveis. Sendo assim, os indivíduos deprimidos distorcem suas interpretações dos acontecimentos, de modo que eles mantêm visões negativas de si próprio, do ambiente e do futuro (BECK, 1997, BARLOW, 1999). “Minha vida se tornou uma batalha” (S5). “Eu desabei” (S5). “Hoje vivo assim, com medo do que terei que enfrentar a cada dia” (S3). 40 “Sou depressiva, dependente dos meus filhos” (S4). “Fico muito angustiada de ter que tomar remédios meu sonho é me livrar de tudo isso” (S5). A doença é muitas vezes percebida pelo paciente como sofrimento, limitação física, ataque à integridade e impedimento a realização das atividades normais, rotineiras, além de colocar o individuo numa condição de dependência a outras pessoas (JEAMMET et al., 2000). Segundo Angerami-Camon (1995), o desenvolvimento do quadro clínico de uma doença crônica torna seu portador alguém socialmente excluído da competitiva sociedade atual. Assim, o indivíduo acometido por uma enfermidade crônica, geralmente entra em desespero frente a sua nova realidade. O individuo precisa adaptar-se a novas rotinas, mas a experiência de ter que modificar alguns hábitos é particular, pois cada pessoa percebe e reage de uma maneira. Assim, percebe-se na presente pesquisa, que algumas pessoas têm menor dificuldade para lidar com as mudanças do que outros com o mesmo problema, como constatamos nas unidades de registro a seguir: “Hoje por causa ou graças à doença, mudei bastante o meu modo de vida’ (S2)”. “Houve também uma mudança na forma de pensar, passando a ser extremamente a paz de espírito e o equilíbrio” (S2). “Ironicamente tenho uma qualidade de vida que me faltava anteriormente” (S2). “Agora faço terapia. Tenho planos, o que não permitia ter e vivo uma vida normal como qualquer outra pessoa” (S1). “Estou revivendo anos que me restringi e hoje vejo que não precisava ter me poupado tanto” (S1) 41 Com base nos relatos acima, verifica-se que embora as DII(s) provoquem inúmeras restrições e cuidados aos seus portadores, é possível a adaptação dos mesmos a nova realidade. Em alguns relatos, os pacientes assumem uma posição de passividade, de conformismo diante do seu prognóstico como podemos conferir a seguir: “Esteticamente não estou no meu normal, mas tenho plena consciência que vai passar. Não se tem como fazer omelete sem quebrar os ovos” (S1). “Sei que me faz mal e procuro evitar para meu próprio bem” (S6). Segundo Stedeford apud Fongaro e Sebastiani (1998), a aceitação é uma avaliação realística da situação clínica, com a determinação de se ajustar da forma mais adequada possível. Dessa maneira, o indivíduo adquire uma postura ativa no decorrer do tratamento. “Agora sei o que tenho e vou me cuidar” (S4). “Hoje, para mim é levar uma vida normal, tive que fazer algumas restrições, mas consegui me adaptar dentro do possível” (S6). “Tive que por na cabeça que não posso cometer exageros com a alimentação” (S6). “Minha vida esta próxima do normal, apenas procuro tomar alguns cuidados” (S6). A adaptação do paciente ao estado clínico só será possível a partir da conscientização do mesmo acerca de sua doença, e da necessidade de tratamento permanente, com mudanças na alimentação e nos comportamentos. Sendo assim, é interessante que o paciente tivesse apoio psicológico, um clima favorável para falar de seus medos e perdas. Pois, tende conseqüentemente a ampliar a possibilidade 42 de melhoria na qualidade de vida (MACIEL, 2002). 5ª Categoria – O Tratamento “Com medicamentos é difícil, sem eles seria terrível”. O tratamento das DIIs tem como objetivo tratar infecções, diminuir a atividade inflamatória da doença, melhorar o estado nutricional, tentar aliviar os abalos emocionais, buscando uma melhor qualidade de vida sempre. Isto visando à remissão dos sintomas e a manutenção da mesma (GOLIGHER, 1990). A Organização Mundial da Saúde através do Grupo Qualidade de Vida definiu mesma como a percepção do indivíduo da sua posição na vida, no contexto do sistema cultural e de valores em que ele vive e em relação a seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações (FLECK , 2000). De acordo com a gravidade da doença é indicado um vasto arsenal terapêutico, como compostos nutricionais e corticóides, entre outros. Em casos específicos pode ser necessário o tratamento operatório, o qual é composto por diversas técnicas e cirúrgicas (QUILICI, 2002). Observa-se que durante o curso das DII(s), tanto a RCUI, quanto a DC provocam um estigma semelhante entre seus portadores durante o curso das DIIs. A partir da literatura verifica-se que tal fato se diferencia somente quando as DIIs evoluem para quadros extremos. Pois, em alguns casos restritos da RCUI, aqueles muito graves, os quais não respondem ao tratamento ou quando há sangramento ou diarréia em demasia, ou até mesmo risco de câncer, os pacientes têm a possibilidade de uma alternativa extrema que é uma operação cirúrgica conhecida como Procto-colectomia total com bolsa ileal. Esta compreende uma técnica que remove todo o cólon e o reto e a bolsa ileal realiza o papel de um reservatório que 43 possibilita a constituição de um novo reto, permitindo a continência evacuatória. Mas, esta técnica é indicada somente em situações extremas, pois embora atinja um bom resultado, é uma intervenção de elevada morbidade (KEIGHLEY et al., 1999). Porém, mesmo diante do grande risco que acompanha o radicalismo do procedimento descrito acima, esta é uma alternativa que possibilita certa diminuição do estigma que afeta os portadores de RCUI, pois estes quando atingem o sucesso cirúrgico, conseguem ter uma sobrevida melhor. Já em relação aos indivíduos acometidos por DC, isso não ocorre, pois estes em situações de extrema gravidade não podem ser beneficiados pela mesma intervenção. Isso se explica pela região anatômica que tais patologias acometem, sendo que a DC engloba todo o tubo digestivo, ou seja, da boca até o canal anal. Desta forma fica impossibilitada de realizar tal procedimento aumentando o estigma diante da imprevisibilidade da doença. Por ser um tratamento muito rigoroso o paciente passa por várias restrições, provocando sensação de impotência diante a doença. Como podemos observar nos relatos abaixo: “Sei que vou ter que fazer tratamento sempre” (S2). “Terei que fazer tratamento à vida toda, sempre buscando uma melhor qualidade de vida” (S3). A avaliação da qualidade de vida valoriza a perspectiva do paciente em relação a várias dimensões da sua existência, e não só em relação à intensidade dos sintomas da doença (FLECK, 2000). “Deve ser tratada, pois não há cura e pode levar a morte” (S4). 44 “Tenho que tomar remédios e me cuidar o tempo todo” (S6). “Estou me tratando há alguns anos e penso que se com medicamentos é difícil, sem eles seria terrível, bem pior” (S3). O problema de adesão ao tratamento é mais evidente nas doenças crônicas, pois a relação da doença com a possibilidade de tratamento tem forte impacto no estilo de vida do seu portador (KERBAUY, 2001). É importante para o paciente fazer o tratamento para que as crises não voltem, ou se isso acontecer, que os intervalos entre elas sejam mais prolongados. Pois esses indivíduos estão sempre em estado de alerta contra novas crises o tempo todo (SGANZERLA, 2003). Segundo Dattilio e Freeman (1994) apud Miyazaki et al. (1998), aplicação da terapia cognitiva comportamental é útil para intervenções em crises semelhantes. Envolvem contexto de apoio, informações sobre a doença, e o tratamento, desenvolvimento de estratégias de enfrentamento e relaxamento. Desta maneira é necessário compreender o impacto da doença crônica sobre o paciente, desenvolvendo estratégias que procurem aumentar sua qualidade de vida. A boa relação médico paciente tem provado ser um prenúncio de uma melhor evolução para os pacientes com DIIs, pois o sucesso do tratamento está diretamente ligado à qualidade da relação terapêutica. O portador de uma enfermidade crônica necessita de constantes cuidados exigidos pelo tratamento. Assim requer contato freqüente com seu médico, por isso, é fundamental que se estabeleça um bom relacionamento entre o profissional e paciente para que o tratamento seja realmente eficaz. Pois, faz com que o individuo sinta-se mais seguro (SANTOS e SEBASTIÃO, 1996). Segundo Meleiro (1999), a qualidade da relação médico-paciente depende da 45 estrutura psicológica de ambos. A relação deve ser adequada a cada paciente, variando também de acordo com as modificações que a doença provocar na situação vital do mesmo. As habilidades do paciente e do médico são importantes para estabelecer relacionamentos positivos e aliança para o tratamento. Esta aliança implica interação pós-social entre médico e paciente, acesso do profissional a um conjunto de informações sobre os modos de lidar com a doença e tomadas de decisão mútua sobre o manejo de dificuldades encontradas pelo paciente e sua família, para seguir o tratamento (MELEIRO, 1999). Nos relatos abaixo os pacientes expressaram essa importância da relação médico/paciente: “O meu tratamento é confiar no meu médico” (S1). “Eu confio no meu médico” (S5). “O negocio é fazer o que o médico mandar” (S6). “No meu tratamento tenho que ter paciência, coragem e confiança no meu médico” (S4). Um outro aspecto a ser observado refere-se aos efeitos psicológicos do uso de corticóides que vão desde insônia, agitação, habilidade emocional, aumento de peso entre outros, como fica evidente nas falas abaixo: “Sei que passei a tomar cortisona e essa medicação me incha muito. Perdi minhas roupas” (S5). “O tratamento que fui submetida é à base de corticóides, mas tive problemas por causa da ulcera” (S4). “Meu tratamento é a base de cortisona, foi bastante chocante” (S1). Devido à complexidade do tratamento dos DIIs e das possíveis complicações 46 clinicas, o paciente acaba demonstrando forte abalo emocional diante das diversas formas de intervenções, como observação nas falas a seguir: “Já usei há cinco meses, bolsa de colostemia”. É degradante, enlouquecedor’ (S1). “Sempre procurando um tratamento menos traumatizante e eficaz” (S1). “Faço acompanhamento psicológico também” (S1). De acordo com a teoria cognitiva comportamental, se analisarmos a doença e a saúde, vemos que existe o evento claro que é o diagnóstico confirmado. Assim avalia o que é possível fazer em um futuro próximo ou distante, de acordo com as descobertas científicas disponíveis. Em seguida observa como a pessoa percebe e descreve sintomas físicos em intensidade e interferência na vida, depois como a própria pessoa, e o ambiente relacional, reage diante das soluções possíveis, se reclamam, aceitam, encorajam ou rejeitam. Dessa forma, o psicólogo através de tarefas, questionamentos e observações, pode favorecer a eficácia de um tratamento (KERBAUY, 2001). “Fui submetida a uma cirurgia para retirada de um segmento do intestino delgado” (S2). “Há anos atrás passei por uma cirurgia que remove todo cólon e o reto, eu acho que é isso” (S6). De um modo geral o clinico deve se conscientizar de que esses pacientes necessitam de uma relação com seus médicos que valorize os transtornos afetivos emocionais. O acolhimento, a capacidade de escutar as angústias de tais pacientes, o esclarecimento e até saber encaminhá-los ao acompanhamento psicológico, no momento certo, pode facilita uma evolução mais satisfatória para estes enfermos 47 (ANDRADE e MESQUITA, 2000). 6ª Categoria- Os Sentimentos “São muitos sentimentos, uma confusão” Correspondem às repercussões emocionais relacionadas às DIIs. Sentir não é agir, a ação é resultado de uma escolha. Sentir é a interação do organismo sujeito com o ambiente. Para que se compreenda essa interação existe uma palavra chave: a comunicação (ANDRETTA, 2003). Skinner (1995) apud Andretta (2003) observa que, sensorialmente, sabemos o que estamos sentindo, pois existem contradições corporais ocorrendo. Sendo o sentimento um estado corporal, e um privado, ele adverte que não se trata de estímulos determinantes do comportamento, mas sim subprodutos das contingências de reforçamento. De acordo com a análise do comportamento, os sentimentos relatados e descritos, indicam o que tem ocorrido na história pessoal e o que a pessoa pode fazer, ou precisa apreender, além de como está à desorganização de seu comportamento após o diagnóstico. Muitas vezes o paciente se revolta até aceitar um diagnóstico e entra em processo de combate a doença (KERBAUY, 2001). “Meus sentimentos se misturam. Sinto insegurança, desconforto, medo, angustia um pouco deprimida, como se estivesse de mãos amarradas diante da própria vida” (S3). “Me sinto muito angustiada” (S4). “O primeiro e mais forte sentimento que surge é o medo” (S2). “A ansiedade também me acompanha” (S2). “Me sinto um pouco perdida e angustiada” (S5). “Fico muito ansiosa” (S5). 48 Segundo Folks et al., (2000), a tensão emocional pode influir no curso e na evolução das DIIs. A ansiedade é uma das manifestações mais freqüentes na emocionalidade das pessoas. Segundo Keller e Schoenfeld (1950) apud Kerbauy (2001), em uma situação de doença diagnosticada, mas nem sempre aceita, e com conseqüências claras para a programação da vida do indivíduo, este costuma usar uma linguagem carregada de palavras que descrevem emoção, e não ação. “São muitos sentimentos, uma confusão” (S5). “Eu sinto um forte estigma que tudo pode voltar” (S6). “Sinto uma certa angustia com cada sinal novo” (S6). “Fiquei muito revoltada, cheguei até não colaborar com o tratamento no inicio” (S5). “Às vezes choro, em outras vezes me conformo” (S5). Como podemos observar, nos relatos acima, os pacientes da DIIs enfrentam um índice elevado de estresse, inicialmente pelo diagnóstico da patologia e suas conseqüências físicas, seguidas pelas dificuldades terapêuticas, o índice de recidivas e ainda a cronicidade (QUILICI, 2002). A resposta mais comum a um extressor, é a ansiedade. Por ansiedade, entende-se a emoção desagradável caracterizada por palavras como preocupação, apreensão, tensão e medo. É uma das emoções mais perturbadoras que as pessoas podem sentir (ATKINSON et al, 2000). Percebe-se que o paciente com DII apresenta medo diante ao estigma da doença, assim como a ansiedade citada anteriormente. Porém medo e ansiedade não são sinônimos. O medo é um sentimento de inquietude, um sinal de alerta frente 49 uma ameaça conhecida, não conflituosa, A ansiedade é sentido diante de uma ameaça, tendência de esquiva e fuga, é uma resposta a situações percebidas como estressantes, ameaçadoras (ARNOLD, EYSENCK e MEILI, 1982, CABRERA e JR, 2002, KAPLAN, 1997, GUIMARÃES, 2001). A partir do surgimento de uma doença crônica, o paciente sofrerá uma série de perdas, levando-o a um esfacelamento total de sua vida, tanto física, orgânica, quanto social. Assim instala-se uma situação traumática na vida do paciente (MACIEL, 2002). De acordo com a teoria comportamental e cognitiva, a doença crônica envolve ameaças e mudança no estilo de vida, criando uma situação de estresse para seus pacientes. A adaptação à doença, e a forma que o paciente a enfrenta, dependem de vários fatores, como dor, mudanças na aparência e tipo de tratamento necessário (SERAFINO, 1994, apud MIYAZAKI et al., 1998). O sentimento se torna uma pista para a realização da análise funcional, indicando as condições que o afetaram, o comportamento presente e as condições que afetarão no futuro (ANDRETTA, 2003). A angustia é outro sentimento muito presente no paciente de DII. É uma sensação de mal estar intenso, desespero, diante de um perigo vago. Pelo qual a pessoa se sente impotente (SILLAMY, 1998). Os pacientes acometidos por DIIs são submetidos a indesejáveis mudanças, as quais podem provocar uma ameaça a sua identidade. Assim observa-se o isolamento social como uma das reações emocionais. A fala a seguir demonstra tal fato: “Me sinto limitada” ( S1). 50 “No começo eu não conseguia sair de casa, tinha medo de eclodir outra crise” (S1). “No inicio foi bastante chocante” (S1). “Fico com medo de ser surpreendida por uma nova crise” (S4). A partir de diversos estudos verificamos nas DII(s), que a cronicidade da doença, e o quadro clínico, acarretam conflitos sociais e freqüentemente afetam a qualidade de vida destes pacientes interferindo com seu trabalho, lazer e relacionamento sociais, e sexuais (ANDRADE e MESQUITA, 2000). As DIIs podem levar seus portadores a distúrbios emocionais e mesmo a depressão, fato que fica evidente nos relatos a seguir: “Com a doença veio à depressão primeiramente” (S1). “Sou muito depressiva” (S4). “No começo me deprimiu muito, fiquei mal” (S5). As queixas gastrintestinais fazem parte da constelação de sintomas somáticos presentes em grande parte dos pacientes com depressão. A influência dos distúrbios emocionais, sobre a função gastrintestinal, foi demonstrada inicialmente através da observação de pacientes com erosões e ulcerações gástricas e, posteriormente, através de estudos da psicofisiologia gastrintestinal. O sistema nervoso central, e o trato gastrintestinal, interagem de forma bidirecional. Da mesma maneira que as informações ambientais, e psicológicas, afetam o funcionamento do trato gastrintestinal, alterações nas condições gastrintestinais poderão afetar o SNC influenciando a percepção da dor, o humor e outras funções mentais (ANDRADE e MESQUITA, 2000). Observa-se também que é fundamental manter a esperança do paciente, pois 51 esse é um fator que favorece a recuperação, possibilitando prognóstico melhor ao mesmo (ABRÃO, 1987 apud CAMPOS, 1995). É possível verificar isto nas seguintes falas: “Mas ao mesmo tempo me sinto com uma enorme vontade de buscar uma nova maneira de conviver essa doença” (S3). “Com o tempo fui me conformando” (S5). 52 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Este estudo procurou identificar as repercussões emocionais nos pacientes portadores de Doenças Inflamatórias Intestinais e, ao final do mesmo, constatou-se que: • As repercussões emocionais podem influenciar o quadro clínico dos pacientes com DIIs. • A maioria das falas demonstrou insegurança diante da imprevisibilidade do seu prognóstico, pois os pacientes se sentem limitados, apresentam isolamento social decorrente das crises inesperadas, sendo assim transformam seu cotidiano numa batalha repleta de sofrimento. • Há entre os sujeitos estudados, maneiras diferentes de reagir frente às restrições impostas pelas DIIs. É válido destacar o relato de um paciente que demonstra, por mais incrível que possa parecer, que sua qualidade de vida melhorou após o diagnóstico de DII, pois, alterou toda sua forma de ver a vida, inclusive sua maneira de pensar. • Fatores emocionais podem ser considerados precipitadores da doença quando negativos, mas devem ser vistos também como fortes elementos contribuidores de melhora, quando positivos. • Cada indivíduo percebe e reage de diferentes maneiras, confirmando que pensamentos influenciam comportamentos e sentimentos das pessoas e, embora essas patologias provoquem muitas restrições na vida de seus 53 portadores, é possível haver adaptação à nova vida. • O caráter crônico e as dificuldades terapêuticas relacionadas às DIIs, causam aos pacientes um constante estresse emocional, pois eles necessitam adaptar-se a uma nova realidade, uma nova rotina. • Há uma diversidade de emoções que acometem os pacientes das patologias em questão. A ansiedade, angustia, medo, insegurança entre outras, estão presentes no dia a dia destes pacientes. • A depressão foi à repercussão emocional que predominou entre os sujeitos entrevistados. • Considerando que as DIIs têm caráter multifatorial, a análise dos dados demonstrou que há casos onde os antecedentes podem influenciar na eclosão da doença, pois a época da vida em que adoece tem muito a ver com a história do individuo. Um exemplo está no caso de um dos entrevistados onde a tensão emocional desencadeou a doença, pois o sujeito passou por um estresse e em seguida eclodiu a Doença de Crohn. • Os portadores são acometidos por um estigma extremamente elevado que acompanha todo processo de desenvolvimento da doença, desde o conhecimento do diagnóstico, seguido pelas modificações e restrições que os mesmos necessitam realizar em suas vidas, pelas dificuldades terapêuticas, além da cronicidade destas patologias. • O curso das DII(s), tanto a RCUI, quanto a DC provocam um estigma semelhante entre seus portadores durante o curso das DIIs. Neste estudo a semelhança na distribuição das unidades de registro encontradas, confirma 54 este fato. • O tratamento das DIIs visa uma melhor qualidade de vida dos pacientes tentando alcançar a remissão dos sintomas e possibilitar a sua manutenção. Nos relatos dos pacientes entrevistados, os mesmos demonstraram forte abalo emocional e dificuldades com o tratamento. • O indivíduo quando ciente do seu diagnóstico e tratamento conseguirá maiores chances de sucesso em seu quadro clínico, pois realiza de maneira mais adequada o seu tratamento. • Pacientes que não possuem as informações corretas demonstram certa insegurança diante a imprevisibilidade do seu problema. • A falta de informações pode desencadear estado de ansiedade, medo, insegurança e angustia e assim acaba atrapalhando o processo do tratamento. • A importância da relação médico-paciente é vista como garantia para o sucesso do tratamento, pois considerando que as DIIs são crônicas é necessário estar em constante contato com o médico. Dessa forma é fundamental que o indivíduo confie no seu médico para obter melhores resultados e sentir-se mais seguro. Diante dos dados analisados, e considerando que as DIIs apresentam fortes estigmas médicos e sociais, torna-se fácil concluir o quanto são vastas as possibilidades de repercussões psicológicas. Assim, arrisca-se concluir que os pacientes portadores de DIIs apresentam fortes abalos emocionais por seus aspectos limitantes e caráter incurável, afetando o indivíduo de forma social. 55 Negativas reações emocionais e clínicas são ainda habituais nos citados pacientes. Obvio, portanto, valorar-se o fato da influência maléfica, ou benéfica dos fatores psicológicos. Segundo Dattilio e Freeman (1994) apud Miyazaki et al. (1998), a aplicação da terapia cognitiva comportamental (TCC) é útil para intervenções em casos semelhantes. Envolvem contexto de apoio, informações sobre a doença, e o tratamento, desenvolvimento de estratégias de enfrentamento e relaxamento. Desta maneira é necessário compreender o impacto da doença crônica sobre o paciente, desenvolvendo estratégias que procurem aumentar sua qualidade de vida, assim como auxiliá-lo a identificar seus pensamentos, atitudes, crenças e comportamentos pouco adaptativos. Sendo assim, acredita-se na importância do trabalho do psicólogo junto aos pacientes de DIIs. Pois, um trabalho terapêutico tem como função básica à promoção de mudanças comportamentais que levam a diminuição do sofrimento, e ao aumento de contingências reforçadoras (VERMES E MEYER, 2001). Este profissional pode atuar visando à promoção do bem-estar psicológico da pessoa que está enfrentando a doença, compreendendo os mecanismos usados para tratá-la, contribuindo, dessa forma, para maior adesão ao tratamento e humanização do atendimento aos portadores. Porém, há ainda muitos caminhos a serem percorridos e, a partir das questões referentes a essa temática, a necessidade de outros estudos torna-se importante como forma de ampliar ainda mais o conhecimento que a Psicologia pode dar e também como forma de promover a troca de experiências com as demais áreas envolvidas. 56 6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AIRES, Cristina. O Papel do Psicoterapeuta no Tratamento de Doenças Inflamatórias Intestinais. Disponível em: < http: //sites.uol.com.br/gballone/psicossomática/intestinal.html>. Acesso em 24 de março de 2006. ANDRADE, Carlos Laganá de; MESQUITA, Maria Aparecida. Transtornos Gastrintestinais. In: FRÁGUAS JUNIOR, Renério; FIGUEIRÓ, João A. Bertuol. Depressão em medicina interna e em outras condições medicas: depressão secundarias. SP: Atheneu, 2000. ANDRETA, S. C. Alves. A Terapia Cognitiva Comportamental na Enfermaria de Cirurgia Geral. In: Neves Neto, Armando Ribeiro das, et al (ORG). 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Psicoterapias cognitivos-comportamentais: um diálogo com a psiquiatria. Porto Alegre: Artmed Editora, 2001. 60 7 ANEXOS 61 8 APÊNDICES 62 APÊNDICE 01 A Clínica Gastromed situada à Rua Engenheiro Rebouças, número 614 na cidade de Foz do Iguaçu está ciente de que serão realizadas entrevistas a fim de identificar as repercussões emocionais em pacientes portadores de doenças inflamatórias intestinais (DIIs). Os dados coletados poderão ser utilizados tanto para fins acadêmicos, como para publicação em eventos e/ou revistas científicas por professores idôneos no ensino de seus alunos do Curso de Psicologia da UNIVALI. Por serem voluntários não terão direito a nenhuma remuneração, e os dados referentes a estes profissionais serão mantidos em sigilo. Local:_______________________________________Data:_________________ Assinatura (de acordo):________________________ 63 APÊNDICE 02 Entrevista n _______________ DADOS DE IDENTIFICAÇÃO: - Sexo: - Idade: - Grau de instrução: - Profissão: - Estado civil: - Procedência - Diagnostico médico: ( ) Retocolite Ulcerativa Inespecifica ( ) Doença de Crohn ROTEIRO DE ENTREVISTA: 1 Há quanto tempo você possui este diagnóstico? 2 Qual o conhecimento que você possui desta doença? 3 Como é para você ser portador desta doença? 4 Fale a respeito de como era sua vida antes da doença e como é sua vida atualmente. 5 Qual seu conhecimento sobre o tratamento ao qual será submetido? 6 Quais os sentimentos que surgem frente ao tratamento indicado? 64 APÊNDICE 03 TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO Gostaria de convidá-lo (a) para participar de uma pesquisa cujo objetivo é identificar as repercussões emocionais em pacientes portadores de doenças inflamatórias intestinais (DII). Sua tarefa consistirá na participação em uma entrevista versando sobre tempo de diagnóstico, conhecimento sobre a doença e sobre o tratamento e aspectos da sua vida passada e atual. Quanto aos aspectos éticos, gostaria de informar que: a) seus dados pessoais serão mantidos em sigilo, sendo garantido seu anonimato; b) os resultados da pesquisa serão utilizados somente com finalidade acadêmica podendo vir a ser publicado em revistas especializadas, porém, como explicitado no item (a) seus dados pessoais serão mantidos no anonimato; c) não há respostas certas ou erradas, o que importa é sua opinião; d) a aceitação não implica que você estará obrigado a participar , podendo interromper sua participação a qualquer momento, mesmo que já tenha iniciado , bastando, para tanto, comunicar a pesquisadora; e) você não terá direito a remuneração por sua participação, ela é voluntária; f) durante a participação, se tiver alguma reclamação, do ponto de vista ético, você poderá contar com o responsável por esta pesquisa. g) os resultados da pesquisa serão repassados à psicóloga responsável pelo atendimento psicoterápico na clínica que o colocará a par dos mesmos. 65 IDENTIFICAÇÃO E CONSENTIMENTO Eu_________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ Declaro estar ciente dos propósitos da pesquisa e da maneira como será realizada e no que consiste minha participação. Diante dessas informações aceito participar da pesquisa. Assinatura:__________________________________________________________ RG:_______________ Pesquisadora responsável: Prof. Giovana Delvan Stühler Assinatura:_______________________________________ UNIVALI – CCS – Curso de Psicologia Rua Uruguai, 438 – bloco 25b – sala 401 F.(047)99284041 E-mail:[email protected]