Julho de 2016 Diretor Técnico Responsável: Dr. Thomaz Rodrigues Porto da Cruz CRM 1.869 BOLETIM MÉDICO Diagnóstico das Doenças Intestinais Inflamatórias Diarreia contínua, algumas vezes com sangue, dor abdominal, cansaço e perda de peso podem ser sinais de uma Doença Inflamatória Intestinal (DII), como Doença de Crohn (DC) e Retocolite Ulcerativa (RCU) - doenças, que nos casos mais graves, podem levar à incapacitação física e à necessidade de cirurgia. A DC e a RCU são doenças crônicas de etiologia desconhecida que compartilham de muitas características epidemiológicas, clínicas e terapêuticas. Diversos fatores têm sido citados no desenvolvimento das DII, mas o que se conhece de concreto sobre a gênese destas doenças é que existe certamente um distúrbio na regulação da imunidade da mucosa, que é responsável pelo surgimento de um processo inflamatório. O principal fator de risco comprovado para ambas as DII é uma história familiar positiva. Existe uma discreta predominância da DC nas mulheres, ao passo que na RCU o risco é igual entre os sexos. As DII são mais comuns na população branca. São descritos dois picos de incidência: entre 15-30 anos e entre 55-65 anos. O diagnóstico das DII é estabelecido após uma avaliação conjunta do quadro clínico, em concordância com evidências endoscópicas, laboratoriais, radiográficas e achados histopatológicos. Anatomopatologia Retocolite Ulcerativa: • Caracterizada pelo surgimento idiopático de lesões inflamatórias, ascendentes e uniformes, pela mucosa do cólon; • Aspecto macroscópico da mucosa varia desde o normal até grandes alterações (desaparecimento do 1 Julho de 2016 padrão vascular típico do cólon; hiperemia, edema mucosa friável, erosões, ulcerações e exsudação de muco, pus ou sangue; formação de pseudopólipos; mucosa pálida, atrófica, com aspecto tubular); • Nos casos graves, pode haver comprometimento da submucosa e muscular, por contiguidade, havendo risco de megacólon tóxico e perfuração espontânea; • Nos casos de longa evolução, são comuns alterações da musculatura colônica (perda das haustrações, espessamento da musculatura lisa com aspecto de “cano de chumbo”). Pode ocorrer displasia epitelial, que tem uma forte associação com o desenvolvimento de neoplasia maligna do cólon. delgado, ou sobre aglomerados linfoides no cólon); • Os aglomerados linfoides são comuns em todas as camadas da mucosa, submucosa e serosa; • Granulomas não caseosos, semelhantes aos da sarcoidose, podem ser encontrados (o que não ocorre na RCU); • Invasão da serosa por tecido adiposo (fat wrapping); • Do ponto de vista macroscópico, a porção distal do íleo e o cólon ascendente são os mais comprometidos (ileocolite); • Um terço dos pacientes com DC tem doença perianal (fístulas, fissuras, abscessos). Quadro Clínico Doença de Crohn • Caracteriza-se por um acometimento descontínuo e focal, tanto macroscópica quanto microscopicamente. Diversos locais ao mesmo tempo, separados por trecho de mucosa normal; • Pode acometer qualquer parte do sistema digestivo, desde a boca até o ânus; • As alterações patológicas inflamatórias são tipicamente transmurais, o que explica a formação de estenoses e fístulas para o mesentério e órgãos contíguos; • Geralmente se inicia com a formação de úlceras aftoides (pequenas ulcerações da mucosa que se desenvolvem sobre as Placas de Peyer, no intestino 2 Retocolite Ulcerativa: Os pacientes apresentam, caracteristicamente, diarreia com sangue, muco e, eventualmente, pus. Tenesmo, puxo (tenesmo acompanhado de fortes contrações dolorosas da região anal e perianal) e dor abdominal podem estar presentes e, nos casos mais graves, pode haver sinais de resposta inflamatória sistêmica (febre, taquicardia, hipotensão). Doença de Crohn: A região ileal e ileocecal são as mais acometidas e a doença se manifesta com diarreia, emagrecimento, dor abdominal, febre, náuseas/vômitos. Caso a DC comprometa outras áreas do trato digestivo, os sintomas ocorrerão de acordo com a(s) área(s) afetada(s). Por exemplo, se a DC comprometer o cólon, do ponto de vista clínico, o paciente poderá BOLETIM MÉDICO exibir os mesmos sintomas de um portador de RCU. Alguns pacientes portadores de DC podem apresentar complicações, como estenoses de segmentos intestinais (causando sintomas de suboclusão ou obstrução) ou fístulas (geralmente na região anal e perianal e, menos frequentemente, para a pele da região abdominal, bexiga, vagina e entre alças intestinais). Manifestações extraintestinais podem ocorrer em cerca de 30% dos indivíduos portadores de DII e incluem artralgia/artrite, aftas orais, eritema nodoso, pioderma gangrenoso, episclerite, uveíte, sacroiliíte, espondilite anquilosante e colangite esclerosante primária, entre outras. Essas complicações extraintestinais, eventualmente, podem preceder as manifestações digestivas, o que retarda o diagnóstico. Além disso, podem estar relacionadas ou não com a atividade da DII. Pacientes com DII também apresentam maior risco de desenvolver fenômenos tromboembólicos. Diagnóstico: O diagnóstico das DII se baseia na análise de manifestações clínicas sugestivas, exames laboratoriais, radiológicos, endoscópicos e anatomopatológicos compatíveis. Os exames complementares auxiliam no diagnóstico, estadiamento, prognóstico, monitorização da resposta ao tratamento e nas possíveis complicações das DII. Exames complementares - DII Hemograma, provas de atividade inflamatória (PCR, alfa-1-glicoproteína ácida, VHS), eletrólitos, vitaminas e sais minerais (perfil de ferro, zinco, magnésio, ácido fólico, vit B12, vit D). Laboratoriais Marcadores sorológicos, particularmente o pANCA (anticorpo contra estruturas citoplasmáticas do neutrófilo, padrão perinuclear) na RCU e o ASCA (anti-Saccharomyces cerevisiae) na DC. Embora apresentem baixa acurácia para o diagnóstico das DII e não devam ser solicitados de rotina, podem ajudar nos casos em que há dificuldade em diferenciar as duas doenças. A análise das fezes deve incluir exame parasitológico, cultura e pesquisa para toxinas A e B do clostridium difficile, já que esta bactéria frequentemente está presente em pacientes com DII. Dosagem fecal de Calprotectina* e Lactoferrina tem sido empregada e apresenta boa correlação com atividade endoscópica e histológica, sendo um exame importante tanto no diagnóstico quanto no acompanhamento dos pacientes. Radiológicos Enterografia por Tomografia Computadorizada ou por Ressonância Nuclear Magnética; Trânsito Intestinal e Enema Opaco (esses dois últimos cada vez menos utilizados). Endoscópico Endoscopia Digestiva Alta; Enteroscopia; Cápsula Endoscópica e Colonoscopia. Biópsias Endoscópicas O exame anatomopatológico auxilia, principalmente, na exclusão de outras causas de inflamação no intestino. 3 BOLETIM MÉDICO *A Calprotectina fecal é um marcador simples, rápido, sensível, específico, acessível e não invasivo para a detecção e acompanhamento da DII. Trata-se de uma proteína que se encontra no organismo amplamente distribuída, transportadora de cálcio e zinco, pertencente à família S100 e derivada predominantemente de neutrófilos. A Calprotectina é uma proteína anti-microbiana liberada pelos neutrófilos polimorfonucleares no intestino frente a uma exposição da mucosa à uma inflamação. Está presente nas fezes em concentração mais alta comparada aos seus níveis de plasma (aproximadamente cerca de 6 vezes). A quantificação dos níveis de Calprotectina nas fezes é um exame útil para diferenciar pacientes com Doenças Intestinais Inflamatórias de pacientes com Síndrome do Intestino Irritável (SII). Pacientes com DII apresentam concentração significativamente elevada de Calprotectina nas fezes, enquanto pacientes com SII apresentam concentrações normais. Resultados de Caprotectina acima de 200 μg/g de fezes indicam doença inflamatória intestinal em atividade e apontam a necessidade de realização de testes adicionais como colonoscopia. As concentrações de Calprotectina nas fezes se correlacionam com a atividade da DII, sendo útil no acompanhamento dos pacientes, pois o teste é um bom preditor de recidivas. Referências 1. Cecil Medicina Interna, 23ª edição 2- Harrison – Medicina Interna – 17ª Edição – 2008 3- Antonio Carlos Lopes – Tratado de Clínica Médica – 1ª Edição – 2006 4- Federação Brasileira de Gastroenterologia Dra. Mª Betânia Moura Senna – Cremeb 9684 BA – 20/07/2016 4 4 SAC: 71 3338-8555 www.laboratorioleme.com.br 3