Tema 1 - Política Fiscal Menção Honrosa Alíquotas Efetivas dos Impostos sobre o Consumo e a Renda dos Fatores: uma estimação em frequência trimestral para o Brasil. Autores: C Y N T I A F R E I T A S A Z E V E D O , representante A N G E L O M AR S I G L I A F A S O L O XX PRÊMIO DO TESOURO NACIONAL – 2015 TEMA 1. POLÍTICA FISCAL ALÍQUOTAS EFETIVAS DOS IMPOSTOS SOBRE O CONSUMO E A RENDA DOS FATORES: UMA ESTIMAÇÃO EM FREQUÊNCIA TRIMESTRAL PARA O BRASIL AGOSTO / 2015 RESUMO Esse artigo estima séries de tempo para as alíquotas efetivas dos impostos sobre o consumo e sobre os fatores de produção no Brasil, seguindo a ideia de Mendoza et al (1994). O procedimento utilizado para gerar estimativas trimestrais da base tributária, usando microdados de pesquisas populacionais, e das receitas tributárias parece apropriado, apesar de sua simplicidade, visto que as séries de tempo da carga tributária e das alíquotas efetivas estão em linha com a experiência histórica brasileira na política fiscal. A carga tributária estimada identifica uma tendência positiva ao longo do tempo, apesar da interrupção parcial após a crise internacional de 2008. O artigo fornece também evidências preliminares sobre as propriedades das alíquotas efetivas dos impostos computadas e sua relação com o ciclo de negócios. Palavras-chave: Política fiscal; Alíquotas efetivas dos impostos; Imposto sobre o consumo; Imposto sobre a renda dos fatores. ABSTRACT This paper estimates time series of effective tax rates for consumption and factor incomes for Brazil, following the spirit of Mendoza et al (1994). The procedure to generate quarterly estimates of the tax base, using microdata from populational surveys, and the tax revenues seems to be appropriate, despite its simplicity, as the time series of the tax burden and the effective tax rates are in line with the historical Brazilian experience on .fiscal policy. The estimated tax burden identifies a positive trend over time, despite the partial interruption after the international crisis in 2008. The paper also provides preliminary evidence on the properties of the computed effective tax rates and their relation with the business cycles. Keywords: Fiscal policy; Effective tax rates; Consumption tax; Factor income taxes LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Impostos Municipais – Distribuição pelo tamanho da população e Diferença SISTN-FINBRA Ponderada ....................................................................................... 34 Figura 2 – Carga Tributária - Dados Anuais e Trimestrais x Orair et al (2013).......... 36 Figura 3 – Carga Tributária por Classe de Imposto ................................................... 38 Figura 4 – Impostos Líquidos – Dados Trimestrais e Anuais x Tabela de Recursos e Usos .......................................................................................................................... 41 Figura 5 – Renda do Trabalho Estimada: Contas Nacionais e Valores em Alta Frequência ................................................................................................................ 50 Figura 6 – Alíquotas Efetivas dos Impostos – Dados Trimestrais x Dados Anuais ... 52 Figura 7 – Correlação das Alíquotas Efetivas com o PIB .......................................... 55 Figura 8 – Participação da População e Faixas do Imposto de Renda ..................... 63 Figura 9 – Funções Impulso Resposta do Imposto sobre a Renda do Trabalho ....... 64 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Classificação dos Impostos e Contribuições ........................................... 20 Tabela 2 – Alíquotas Efetivas Médias ....................................................................... 23 Tabela 3 – Dados das Receitas com Impostos em Frequência Mensal .................... 28 Tabela 4 – Comparação dos Dados Anuais do Finbra com os Dados Anualizados do SISTN ........................................................................................................................ 32 Tabela 5 – Dados dos Componentes da Base Tributária .......................................... 42 Tabela 6 – Comparação dos Dados Anuais com os Dados do SISTN Anualizados . 44 Tabela 7 – Salário Médio - Censo e PME ................................................................. 48 Tabela 8 – Salário Médio – Todos os Trabalhos – PNAD ......................................... 49 Tabela 9 – Correlações com o Ciclo de Negócios..................................................... 55 Tabela 10 - Causalidade de Granger: Impostos e o ciclo de negócios ..................... 57 Tabela 11 – Impacto Sobre as Alíquotas Efetivas de Mudanças de Políticas ........... 59 Tabela 12 – Correlações – Receitas com a Base Tributária e o Ciclo de Negócios.. 66 LISTA DE ABREVIATURAS Cide CSLL Cofins CPMF CPSS FGTS ICMS II IOF IPI IPTU IPVA IRPF IRPJ IRRF/Capital IRRF/Trabalho IRRF/Remessas IRRF/Outros ISS ITBI ITCD ITR OCDE PASEP PIS PME PNAD RGPS RREO SISTN SE Sistema S Contribuição sobre Intervenção no Domínio Econômico Contribuição Social sobre o Lucro Líquido Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social Contribuição Provisória sobre Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira Contribuição para o Plano de Seguridade Social do Servidor Fundo de Garantia por Tempo de Serviço Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços Imposto sobre Importação Imposto sobre Operações Financeiras Imposto sobre Produtos Industrializados Imposto Predial e Territorial Urbano Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores Imposto sobre a Renda da Pessoa Física Imposto de Renda de Pessoas Jurídicas Imposto de Renda Retido na Fonte - rendimento do capital Imposto de Renda Retido na Fonte - rendimento do trabalho Imposto de Renda Retido na Fonte - rendimento de remessas para o exterior Imposto de Renda Retido na Fonte - outros rendimentos Imposto Sobre Serviços de Qualquer natureza Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis Inter-Vivos Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação Imposto Territorial Rural Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público Programa de Integração Social Pesquisa Mensal de Emprego Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contribuição para o Regime Geral de Previdência Social Relatório Resumido de Execução Orçamentária Sistema de Coleta de Dados dos Entes da Federação Salário Educação Contribuições para o Sistema S SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 1 2 LITERATURA ...................................................................................................... 5 3 CÁLCULO DAS ALÍQUOTAS EFETIVAS DOS IMPOSTOS ............................ 10 3.1 ALÍQUOTAS EFETIVAS DOS IMPOSTOS EM EQUILÍBRIO GERAL ........... 10 3.2 ALÍQUOTA EFETIVA DO IMPOSTO SOBRE O CONSUMO ......................... 13 3.3 ALÍQUOTA EFETIVA DO IMPOSTO SOBRE A RENDA ............................... 14 3.4 ALÍQUOTAS EFETIVAS DOS IMPOSTOS SOBRE A RENDA DO TRABALHO E DO CAPITAL.......................................................................................................... 15 3.5 ALÍQUOTAS EFETIVAS DOS IMPOSTOS EM FREQUÊNCIA TRIMESTRAL 17 4 ALÍQUOTAS DOS IMPOSTOS EM FREQUÊNCIA ANUAL ............................. 19 5 ALÍQUOTAS DOS IMPOSTOS EM FREQUÊNCIA TRIMESTRAL................... 27 5.1 FONTE DE DADOS DA ARRECADAÇÃO DOS IMPOSTOS ......................... 27 5.1.1 Construção dos Dados dos Governos Regionais Usando o SISTN ........ 29 5.1.2 Séries das Receitas dos Impostos .......................................................... 37 5.2 FONTES DE DADOS DA BASE TRIBUTÁRIA ............................................... 40 5.2.1 Construção da Série de Remuneração dos Servidores Públicos ............ 41 5.2.2 Construção das Séries da Renda Sobre o Trabalho e o Capital ............. 43 5.2.3 Sumário dos Dados da Base Tributária ................................................... 51 5.3 6 ALÍQUOTAS EFETIVAS DOS IMPOSTOS – DADOS TRIMESTRAIS........... 51 ANÁLISE EMPÍRICA ......................................................................................... 54 6.1 ALÍQUOTAS EFETIVAS E O CICLO DE NEGÓCIOS.................................... 54 6.2 EFEITOS DIRETOS DA POLÍTICA TRIBUTÁRIA SOBRE AS ALÍQUOTAS EFETIVAS ................................................................................................................. 57 6.3 7 EFEITOS INDIRETOS SOBRE AS ALÍQUOTAS EFETIVAS ......................... 60 CONCLUSÃO .................................................................................................... 67 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 69 APÊNDICE A – SÉRIES DE TEMPO ANUAIS DAS ALÍQUOTAS DOS IMPOSTOS DISTORCIVOS: 1999-2009 ...................................................................................... 71 APÊNDICE B – SÉRIES DE TEMPO TRIMESTRAIS DAS ALÍQUOTAS DOS IMPOSTOS DISTORCIVOS: 1999T1-2014T4 .......................................................... 72 APÊNDICE C – AJUSTE DOS DADOS DO SISTN.................................................. 74 1 INTRODUÇÃO O objetivo principal deste trabalho é construir séries de tempo trimestrais das alíquotas efetivas dos impostos sobre o consumo, a renda do trabalho e a renda do capital no Brasil. Uma medida apropriada das alíquotas dos impostos é central para a construção de modelos macroeconômicos que visam avaliar os impactos da política fiscal. Como apontado por Mendoza et al (1994), “essas alíquotas dos impostos são necessárias tanto para desenvolver aplicações quantitativas da teoria, quanto para ajudar a transformar a teoria em instrumento de política” (tradução nossa). No entanto, calcular essas alíquotas, especialmente em alta frequência, tem se mostrado uma tarefa desafiadora. Em economias emergentes, onde a qualidade e a disponibilidade das informações sobre a arrecadação de impostos e a base tributária são em geral questionáveis, o número de hipóteses fortes necessárias para fazer inferências sobre as alíquotas dos impostos pode tornar o exercício inútil. No Brasil, particularmente, há dois tipos de problemas associados com o cálculo das alíquotas dos impostos e seu uso como instrumento de política. O primeiro problema, associado com o cômputo da base tributária, é resultado da ausência de atualizações constantes dos dados das Contas Nacionais necessários para manter as estimativas das alíquotas úteis para exercícios de política. As Contas Nacionais do Brasil fornecem estimativas da renda do trabalho e do capital na frequência anual com defasagens muito longas. Quando da elaboração deste trabalho, a última informação disponibilizada pelo IBGE datava de 2009. Portanto, a construção de estimativas das alíquotas efetivas dos impostos, em um a frequência maior que a anual, requer hipóteses adicionais para substituir a informação disponível para as rendas do trabalho e do capital baseadas nas Contas Nacionais. 1 O segundo problema é relacionado com as informações sobre a política fiscal no Brasil – mais especificamente, com dados dos governos regionais (estados e municípios). Os dados das receitas e despesas do Governo Federal estão disponíveis em frequência mensal, com pequena defasagem. Para os municípios, no entanto, informações adicionais de fontes oficiais estão disponíveis apenas em frequência anual, em grande parte a partir de um banco de dados publicado pela Secretaria do Tesouro Nacional chamado FINBRA. Além disso, em termos de arrecadação tributária, um estudo anual publicado pela Secretaria da Receita Federal estima a carga tributária total da economia brasileira no ano fiscal anterior. A construção de uma estimativa em tempo real das alíquotas efetivas dos impostos no Brasil demanda o acesso à informação sobre arrecadação tributária e contribuições dos servidores públicos para o sistema de previdência de fontes além das autoridades oficiais responsáveis pela condução da política fiscal no país. Esse artigo propõe soluções para esses problemas, tentando superar as questões apresentadas acima, usando fontes alternativas de informação e fornecendo uma metodologia detalhada para calcular alíquotas efetivas no Brasil. Para resolver os problemas associados com as informações dos governos regionais, foi construído um sistema capaz de fazer o download, ler e compilar informações de relatórios que os governos regionais são obrigados a submeter bimestralmente a um banco de dados de acesso público, mantido pela Caixa Econômica Federal, em conjunto com a Secretaria do Tesouro Nacional. Cada relatório é submetido em um formulário padrão, convertido em formato pdf para ser disponibilizado para consulta pública. Para isso, o sistema computacional precisa ser capaz de: 1) Fazer o download dos relatórios bimestrais em formato pdf, para cada unidade de governo regional; 2) converter os relatórios para um formato do qual outro software seja capaz de extrair as 2 informações; 3) compilar, com o apoio de outras ferramentas computacionais, um banco de dados agregado com cada variável a ser usada nos exercícios propostos. A ideia de usar esse tipo de sistema para calcular as receitas tributárias de municípios não é nova: Orair et al (2013), em um esforço paralelo ao desenvolvimento desse trabalho, construíram um sistema similar para obter estimativas mensais da carga tributária total aplicada à economia brasileira. Um passo adicional foi dado no presente trabalho, usando o sistema, e o mesmo conjunto de relatórios, para coletar também informações sobre as despesas dos governos regionais com pessoal e encargos sociais, assim como sobre as contribuições dos servidores públicos para o sistema de previdência. Foi usada também uma abordagem mais simples para estimar hiatos de informação dos municípios, usando os dados do FINBRA para corrigi-los. Para construir séries trimestrais das rendas do trabalho e do capital, ao invés de basear-se nos dados das Contas Nacionais, foram usados microdados de três pesquisas populacionais disponíveis em diferentes frequências. Essas pesquisas fornecem informações sobre emprego e salários médios, usadas para calcular a remuneração agregada do trabalho na economia. O uso de dados de três diferentes pesquisas demandou uma avaliação detalhada do perfil da distribuição da renda do trabalho ao longo do tempo. Essa informação é considerada ao construir as séries de tempo da renda do trabalho total da economia brasileira. Este trabalho fornece valores anuais das alíquotas efetivas dos impostos para o Brasil, de 1999 a 2009, baseados nas informações da Secretaria do Tesouro Nacional, Secretaria da Receita Federal e das Contas Nacionais. Ele detalha também a metodologia utilizada para construir o conjunto de dados trimestrais usando os relatórios fornecidos pelos governos regionais e as pesquisas populacionais. Sob um conjunto de hipóteses adicionais, dada a quantidade de informações disponíveis 3 coletadas, foi possível construir séries trimestrais da arrecadação dos impostos e da base tributária de 1999 a 2014. A comparação das alíquotas anuais, com as alíquotas acumuladas em quatro trimestres, calculadas a partir do dados em alta frequência, apresenta algumas discrepâncias, principalmente devido à qualidade dos dados fornecidos pelos governos regionais. As diferenças entre os dados anuais e os de alta frequência afetam principalmente a composição entre impostos sobre a renda do trabalho e do capital, apesar de preservar a dinâmica ao longo do tempo para ambas as alíquotas efetivas. Dado o conjunto final de dados das alíquotas efetivas médias dos impostos, o trabalho também fornece uma análise preliminar das fontes de flutuação dessas alíquotas. Mudanças nas alíquotas efetivas médias dos impostos são associadas tanto com mudanças na política tributária, quanto com mudanças no estado geral da economia. O artigo é organizado da seguinte maneira. A próxima seção discute a literatura sobre o cálculo de alíquotas efetivas de impostos, com foco especial em esforços anteriores documentados para economia brasileira. A Seção 3 descreve a metodologia para o cálculo das alíquotas efetivas médias dos impostos para o Brasil, seguindo o trabalho de Mendoza et al (1994) e Lledó (2005), apresentando também as hipóteses adicionais necessárias para passar de estimativas anuais para trimestrais. A Seções 4 e 5 aplicam a metodologia descrita para calcular as alíquotas efetivas nas frequências anual e trimestral, respectivamente, apresentando todos os ajuste adicionais necessários aos dados coletados – especialmente em termos da base de dados trimestral das receitas de impostos e contribuições e da base tributária. Uma análise empírica das séries trimestrais das alíquotas efetivas dos impostos é apresentada na Seção 6. A Seção 7 conclui o trabalho. 4 2 LITERATURA A principal referência no cálculo de alíquotas efetivas de impostos é o trabalho de Mendoza et al (1994). A abordagem proposta neste trabalho permite estimar alíquotas efetivas médias dos impostos sobre o consumo e sobre a renda dos fatores consistentes com as distorções dos impostos enfrentadas por um agente representativo em um arcabouço de equilíbrio geral. Uma das vantagens do método apresentado é que não exige um tratamento rigoroso da legislação tributária. É um método simples que requer apenas dados das Contas Nacionais e estatísticas da arrecadação tributária, permitindo comparações entre países. Eles apontam para três objetivos atingidos pela abordagem proposta: (i) considera o efeito líquido de regras existentes relacionadas à créditos, isenções e deduções; (ii) separa impostos sobre a renda do trabalho de impostos sobre a renda do capital; e, (iii) incorpora os efeitos de impostos não declarados como receitas do imposto sobre a renda individual, como contribuições para seguridade social e impostos sobre a propriedade, à taxação sobre a renda dos fatores. Dado o objetivo dos autores, trata-se de uma metodologia apropriada para calcular as alíquotas efetivas médias dos impostos, capturando os efeitos de mudanças em deduções, créditos e uma caracterização geral dos efeitos de feedback da reação dos agentes econômicos sobre os impostos. No entanto, essa metodologia não permite mensurar movimentos importantes dos impostos com impactos macroeconômicos significativos, como mudanças nas alíquotas marginais dos impostos, como destacam Carey e Rabesona (2003). As alíquotas efetivas médias dos impostos podem também ser sensíveis a outras questões, como o planejamento tributário e a taxação internacional dos fluxos de capitais. Os trabalhos de Mendoza et al (1994) e Carey e Rabesona (2003) focam no uso de dados da OCDE, em geral disponíveis para longos períodos de tempo, com 5 informações detalhadas e bom controle de qualidade dos dados, permitindo comparações razoavelmente apropriadas entre países. Como mencionado na introdução, dados de economias emergentes normalmente apresentam problemas que podem comprometer a estimativa dessas alíquotas de impostos 1. Para o Brasil, especificamente, há uma literatura crescente de avaliação dos impactos de políticas fiscais e reformas tributárias. Em geral, esses estudos aplicam alguma medida das alíquotas efetivas dos impostos para calibrar modelos ou realizar análises econométricas. Dados os problemas listados aqui e na introdução – a saber, a ausência de dados precisos e atualizados de variáveis fiscais para longos períodos de tempo, em maior frequência e com menor defasagem; a falta de detalhes e de informações com atualizações regulares das Contas Nacionais com respeito aos rendimentos do trabalho e do capital para a economia brasileira – os poucos estudos que calculam alíquotas efetivas dos impostos para o Brasil usam apenas dados anuais. Um exemplo de estudo que usa estimativas das alíquotas efetivas dos impostos para o Brasil é o trabalho de Araújo e Ferreira (1999), avaliando os efeitos alocativos e os impactos de bem-estar de uma reforma tributária. Os autores usam um modelo neoclássico calibrado com informações das alíquotas dos impostos baseadas nas receitas tributária de 1995. Cavalcanti e Silva (2010) usam um modelo de gerações superpostas (OLG) para estudar o impacto de reformas tributárias sobre o PIB, acumulação de capital e bem-estar. Simulações estimam os efeitos de medidas de 1 Volkerink, Sturm e de Hann (2002) notam que mesmo o uso de dados da OCDE pode ser falho. Eles calculam as alíquotas efetivas dos impostos para um grupo de países da OCDE usando dados de fontes nacionais locais e encontram discrepâncias significativas nos resultados comparados com Mendoza et al (1994). 6 isenções tributárias sobre o trabalho e o capital, compensadas com aumento do imposto sobre a renda individual. Eles calculam alíquotas dos impostos baseadas nos dados das Contas Nacionais para o ano de 2004. Umas das primeiras tentativas de aplicar a metodologia de Mendoza et al (1994) para o Brasil foi feita por Araújo Neto e Sousa (2001) para estudar os co-movimentos entre os agregados macroeconômicos e as alíquotas efetivas médias dos impostos. Eles fazem uma boa correspondência entre os códigos padrão da OECD para as receitas dos impostos usadas por Mendoza et al (1994) e as diferentes fontes de receitas dos impostos no Brasil. Os autores foram capazes de calcular alíquotas médias dos impostos sobre o consumo, trabalho e capital usando dados das receitas tributárias e da Contas Nacionais de 1975 a 1999. Eles encontram, no entanto, problemas de falhas do conjunto de dados, apesar de ainda assim serem capazes de fornecer uma série de tempo relativamente longa. Lledó (2005) construiu um modelo de equilíbrio geral dinâmico para analisar os efeitos macroeconômicos e redistributivos de substituir impostos sobre lucros e operações financeiras por um imposto sobre o consumo. Ele usa um modelo OLG calibrado com dados de 2002, calculando alíquotas efetivas dos impostos baseadas na abordagem de Mendoza et al (1994), modificada para incorporar os detalhes da economia brasileira e aspectos do modelo OLG. Ferreira e Pereira (2010) seguem o procedimento apresentado por Lledó (2005) para calibrar um modelo RBC simples para analisar o impacto de uma reforma tributária na economia brasileira. Eles assumem, a partir das condições de primeira ordem do modelo, que a base tributária é proporcional a mudanças no produto agregado, uma vez que as participações do capital e do trabalho são determinadas por um único parâmetro da função de produção. 7 Enquanto os dois últimos trabalhos calibram modelos usando informações de apenas um ano, Pereira (2009) calcula alíquotas efetivas dos impostos sobre o consumo, renda individual, renda do trabalho e do capital de 2001 a 2005. O autor segue a metodologia apresentada por Mendoza et al (1994), adaptada para características específicas da economia brasileira, de forma a construir o conjunto de dados usado para calibrar um modelo para analisar o impacto de políticas fiscais sobre o ciclo de negócios. Finalmente, outras alternativas para calcular alíquotas efetivas dos impostos são baseadas em uma combinação de tabelas de insumo-produto e microdados, usando informações desagregadas para analisar a desigualdade da carga tributária na economia. Embora não evitem a hipótese de um pass-through completo dos impostos para os consumidores, estudos baseados em dados desagregados fornecem informações úteis sobre as alíquotas marginais dos impostos. Para o Brasil, Siqueira et al (2001) usam informações da Tabela de Insumo-Produto de 1995 para calcular a alíquota efetiva do imposto sobre consumo, desagregando informações de setores econômicos e da incidência de impostos sobre componentes da demanda. Mais recentemente, Nogueira et al (2013) usa microdados de duas pesquisas populacionais para simular um modelo que estima a desigualdade da carga tributária sobre a renda do trabalho para a economia brasileira em 2009. O modelo em Nogueira et al (2013) agrega informações não apenas de dados das pesquisas, mas também sobre a legislação brasileira referente às alíquotas dos impostos. A ideia de usar informações da legislação como argumento central em propostas de modelagem foi adotada em Carvalho e Valli (2011) na calibração de um modelo DSGE para economia brasileira. A literatura citada até aqui trabalhou apenas com dados anuais das receitas tributárias e das Contas Nacionais. Pelo que é conhecido, a primeira tentativa de 8 construir um conjunto de dados de receitas tributárias em alta frequência para o Brasil foi feita por Orair et al (2013). Os autores estimam a carga tributária brasileira em frequência mensal de 2002 a 2012. A estimação das informações sobre arrecadação tributária dos governos regionais é bastante precisa, principalmente devido ao esforço feito para construir um complexo modelo de espaço de estados para estimar uma série em alta frequência baseada em informações de baixa frequência disponíveis. A compilação do conjunto de dados das receitas tributárias dos governos regionais é análoga à feita neste trabalho, com o desenvolvimento de um sistema capaz de ler inúmeros relatórios a partir de arquivos pdf. Como apontado anteriormente, o foco principal de Orair et al (2013) é a evolução da carga tributária; o presente trabalho, por outro lado, combina as informações das receitas tributárias em alta frequência, com inferências sobre a base tributária para calcular as alíquotas efetivas do impostos em frequência trimestral. 9 3 CÁLCULO DAS ALÍQUOTAS EFETIVAS DOS IMPOSTOS Essa seção detalha a metodologia empregada para calcular as alíquotas efetivas dos impostos para o Brasil, tanto na frequência anual, quanto trimestral. O trabalho segue de perto a apresentação de Lledó (2005), que adaptou a metodologia básica de Mendoza et al (1994) para o Brasil, e discute o cálculo das alíquotas efetivas para o país. Essa seção começa fornecendo o contexto da forma como as alíquotas efetivas são computadas neste trabalho, com possíveis aplicações em um arcabouço de equilíbrio geral. Ela segue com detalhes sobre as definições das alíquotas dos impostos sobre consumo, rendas do trabalho e do capital, seguida da apresentação dos ajustes realizados no trabalho com dados trimestrais, com as adaptações necessárias pra as especificidades do sistema tributário brasileiro. Uma descrição completa dos conjuntos de dados, conjuntamente com uma discussão sobre a separação apropriada dos impostos em cada classe, são apresentadas na próxima seção. 3.1 ALÍQUOTAS EFETIVAS DOS IMPOSTOS EM EQUILÍBRIO GERAL Essa subseção relaciona as alíquotas efetivas médias dos impostos calculadas nesse trabalho com um arcabouço geral de modelos dinâmicos de equilíbrio geral. O objetivo é fornecer um contexto da incidência dos impostos em modelos teóricos, enquanto também descreve algumas dificuldades ao trabalhar com dados brasileiros. Apesar da sua relevância, o arcabouço de equilíbrio geral apresentado aqui não inclui nenhuma forma de heterogeneidade das famílias ou das firmas. Alguns tópicos relacionados com a heterogeneidade dos agentes, como o efeito da distribuição da renda do trabalho, são discutidos na Seção 6. Uma descrição geral da restrição orçamentária de uma família representativa inclui, do lado das despesas, o gasto total com bens de consumo c t , investimento 10 em bens de capital i t e aquisição de dívida do governo bt . Do lado das receitas, ela inclui os juros recebidos sobre a dívida do governo adquirida anteriormente rt bt 1 , retornos dos fatores de produção ( w t ht e rtk k t , como retornos do trabalho e aluguel do capital, respectivamente) e o lucro das firmas t (todas as variáveis em termos nominais). Os gastos com bens de consumo incluem as despesas com impostos incidentes exclusivamente sobre esses bens e pagos pelas famílias, c,h . As rendas sobre o capital bruto e o trabalho são líquidas dos impostos pagos pelas famílias - k,h e l,h , respectivamente. De forma a considerar os impostos incidentes sobre a renda individual, que não pode ser separada em termos de capital e trabalho, a restrição orçamentária também inclui uma alíquota de imposto adicional , y cobrada igualmente sobre os retornos dos fatores de produção das famílias2. 1 c c,h t it bt rt bt 1 1 l ,h y wt ht 1 k,h y rtk kt t (1) Do lado das firmas, os lucros são gerados pelas receitas com a venda do produto, menos os pagamentos ao trabalho e ao capital usados durante o processo de produção. O produto y t é consumido pelas famílias c t e pelo governo g t , ou usado como bem de investimento i t . Similar à equação descrevendo a restrição orçamentária das famílias, há impostos incidentes sobre o produto vendido como bem 2 Se o modelo não inclui impostos sobre a renda individual, pode-se usar efetiva do imposto sobre a renda do trabalho e k ,h renda do capital incidentes sobre as famílias. 11 y l ,h y como a alíquota como a alíquota efetiva do imposto sobre a de consumo3, c,f , sobre a folha de salários, l ,f , e sobre o capital arrendado , k,f , que são pagos pela firma t 1 c,f ct gt it 1 l ,f wt ht 1 k ,f rtk kt (2) y t c t g t i t w t ht rtk k t (3) No exemplo analítico descrito acima, as receitas do imposto sobre a renda individual são dadas por4: Ty y w t ht rtk k t De modo similar, as receitas dos impostos sobre o consumo, a renda do trabalho e a renda do capital são calculadas usando as receitas totais arrecadadas das famílias e das firmas: TC c,h c,f ct gt Tl l ,h l ,f w t ht Tk k ,h k ,f rtk k t Uma vez que as informações sobre as receitas dos impostos estejam disponíveis, as alíquotas efetivas dos impostos sobre o consumo c , a renda individual y , a renda do trabalho l e a renda do capital k são calculadas usando as definições de suas respectivas bases tributárias: c TC ct g t y Ty l w t ht rt k t k Tl w t ht k Tk rtk k t As equações acima destacam duas características importantes do cálculo das alíquotas efetivas dos impostos. Primeiro, o cálculo das alíquotas agregadas não depende se o imposto incide sobre as famílias ou as firmas, dado que, em equilíbrio 3 Nesse exemplo, sem perda de generalidade, assume-se que os bens demandados para investimento não são taxados pelo governo. 4 A título de notação, defina também x T x como as receitas totais dos impostos sobre o agregado x. Defina como a alíquota efetiva do imposto sobre o agregado x. 12 geral, impostos incidentes sobre as firmas também afetam as decisões das famílias, através das decisões de preços e produção das firmas, ou através dos lucros transferidos para as famílias. Apenas dois elementos de informação são necessários para calcular essas alíquotas – receitas e bases tributárias – e essas informações não dependem do agente da economia sobre o qual incide o imposto. Segundo, medidas desagregadas das alíquotas efetivas dos impostos são condicionadas pelo conjunto de informações sobre as receitas tributárias. Para o Brasil, como mostram as Seções 4 e 5, informações dos impostos sobre a renda do trabalho permitem uma aproximação razoável das alíquotas efetivas incidentes sobre as firmas e as famílias, l,h e l ,f . Infelizmente, a mesma desagregação não é possível para os impostos sobre o consumo e a renda do capital. Idealmente, se os dados sobre as receitas dos impostos e a base tributária estivessem prontamente disponíveis, seria trivial calcular as alíquotas efetivas médias dos impostos para uma economia simples como a descrita acima. O principal desafio aqui é construir esses dois conjuntos de informação, especialmente em alta frequência, para os quais informações detalhadas são escassas. Os ajustes aplicados aos dados brasileiros para calcular as alíquotas efetivas dos impostos tanto na frequência anual, quanto na trimestral, são discutidos no resto dessa seção. 3.2 ALÍQUOTA EFETIVA DO IMPOSTO SOBRE O CONSUMO A alíquota efetiva média do imposto sobre bens de consumo é dada por: c TC C G GW Tc (4) onde T c representa as receitas totais dos impostos sobre bens de consumo e serviços, assim como impostos especiais sobre o consumo. C e G são as informações das Contas Nacionais para o consumo privado e gastos do governo, respectivamente. 13 GW é a remuneração dos servidores públicos. De forma a obter o valor do consumo pré-imposto, que é a definição da base tributária, as receitas dos impostos sobre o consumo são deduzidas do denominador, dados que as Contas Nacionais brasileiras medem os gastos com consumo aos preços pós-imposto. A título de comparação, Pereira (2009) não inclui o consumo do governo na base tributária. Aqui, como em Mendoza et al (1994), os gastos do governo são incluídos, líquidos da remuneração dos servidores públicos (G – GW), visto que as estatísticas das receitas dos impostos incluem apenas os impostos pagos pelo governo na aquisição de bens e serviços de não fatores. 3.3 ALÍQUOTA EFETIVA DO IMPOSTO SOBRE A RENDA O principal desafio associado com a definição dos impostos sobre as rendas do trabalho e do capital é a identificação da carga tributária sobre essas rendas. O problema, apontado por Mendoza et al (1994), e também observado para os dados brasileiros, é que as fontes de informação normalmente não fornecem uma separação clara da incidência do imposto sobre a renda individual. De forma a contornar essa dificuldade, Mendoza et al (1994) assumem que sobre todas as fontes de renda das famílias, provenientes da oferta de trabalho e do aluguel do capital, deve incidir a mesma alíquota, quando taxadas diretamente. No arcabouço de Mendoza et al (1994), a alíquota do imposto sobre a renda individual é calculada como um primeiro passo para obter as alíquotas dos impostos sobre as rendas do trabalho e do capital. No segundo passo, um parâmetro exógeno, definindo a participação constante do trabalho na função de produção, é usado para separar as receitas do imposto e a base tributária para cada fator de produção. Lledó (2005) aponta que essa atribuição assume um tratamento simétrico do imposto entre as rendas do trabalho e capital. Como em Lledó (2005), a equação (1) permite que 14 uma alíquota efetiva do imposto sobre a renda individual coexista com alíquotas separadas para os impostos sobre as rendas do capital e do trabalho. A alíquota efetiva do imposto sobre a renda individual total é então dada por: y Ty W RMB EOB (5) onde T y é a receita total arrecadada pelo imposto sobre a renda individual. O denominador é definido como a renda doméstica líquida, que é a soma da remuneração dos empregados (W), a renda mista bruta5 (RMB) e o excedente operacional bruto (EOB), obtidos das Contas Nacionais. A soma W RMB EOB corresponde à renda das famílias recebida pela oferta de trabalho e aluguel do capital, w h rtk k t . 3.4 ALÍQUOTAS EFETIVAS DOS IMPOSTOS SOBRE A RENDA DO TRABALHO E t t DO CAPITAL Uma vez que os impostos sobre a renda sejam apropriadamente classificados com base em sua incidência, o último passo para o cálculo das alíquotas efetivas é usar as informações das Contas Nacionais para separar a renda das famílias em oferta de trabalho w t ht e aluguel do capital rtk kt . Mendoza et al (1994) define a remuneração dos empregados, W, como renda do trabalho, e a soma da renda mista bruta e o excedente operacional bruto, RMB + EOB, como renda do capital. Por outro lado, Lledó (2005) considera a renda mista bruta, RMB, como parte da compensação pelo trabalho, argumentando que a maior parte dessa renda é gerada por pequenas unidades produtivas não constituídas em empresas (médicos, advogados, etc.). 5 A Renda Mista Bruta é a compensação recebida pelos proprietários de unidades produtivas não constituídas em empresas (autônomos), que não pode ser identificada separadamente entre capital e trabalho. 15 Pereira (2009) assume que a distribuição de renda segue a participação do capital e do trabalho em uma função de produção Cobb-Douglas (participação do capital definida aqui como ). Essas participações são também usadas para distribuir a renda pré-imposto da economia, definindo a base tributária para o imposto sobre o trabalho como 1 W RMB EOB , e para o imposto sobre o capital como W RMB EOB . Esse método tem a vantagem de evitar hipóteses adicionais sobre a distribuição da renda. No entanto, o procedimento usual de calibrar o parâmetro já estabelece restrições para a fonte da renda mista bruta, RMB. Ao mesmo tempo, como apontado anteriormente, a estipulação de um único valor para impõe que as participações das rendas do trabalho e do capital sejam constantes ao longo do tempo. Seguindo Lledó (2005) e Considera e Pessoa (2011), assume-se que a remuneração do trabalho w t ht é igual à remuneração dos empregados, mais a renda mista bruta, W + RMB, enquanto a renda do capital rtk kt é dada pelo excedente operacional bruto (EOB). Uma vez que as bases tributárias estejam definidas apropriadamente, a alíquota do imposto sobre a renda do trabalho é dada por: l Tl W RMB (6) onde Tl é a receita total arrecadada por impostos sobre a renda do trabalho e contribuições para a seguridade social. De forma análoga, a alíquota do imposto sobre a renda do capital é dada por: k Tk EOB (7) onde Tk é a receita total obtida por impostos sobre a renda do capital, especialmente impostos sobre a renda das empresas, propriedades e transações financeiras. 16 3.5 ALÍQUOTAS EFETIVAS DOS IMPOSTOS EM FREQUÊNCIA TRIMESTRAL O cálculo das alíquotas efetivas dos impostos em frequência trimestral não segue diretamente do arcabouço descrito acima. Embora o conjunto de dados sobre arrecadação tributária construído na Seção 5.1 contenha as mesmas informações dos dados anuais (Tc, Ty, Tl e Tk), passos adicionais são necessários para construir uma série de tempo trimestral das bases tributárias usadas nas equações (5), (6) e (7). A alíquota do imposto sobre o consumo ainda é dada pela equação (4), visto que todos os componentes da base tributária estão disponíveis em frequência trimestral. No Brasil, as Contas Nacionais fornecem dados sobre a renda total dos fatores apenas na frequência anual. Para contornar esse problema, nota-se primeiramente que, usando a ótica da renda das Contas Nacionais, o produto interno bruto da economia (Y), descontado dos impostos líquidos de subsídios sobre a produção e a importação (ILS), é dado pela renda total recebida pelos residentes sobre o trabalho w t ht e o capital rtk kt : Y ILS wt ht rt k k t W RMB EOB (8) De forma a construir o denominador da equação (5), o lado esquerdo da equação (8) é aproximado pela diferença entre o produto interno bruto (PIB) e um conjunto de impostos classificados em Orair et al (2013), nas Contas Nacionais, como impostos sobre a produção6, disponíveis em frequência trimestral. Em Pereira (2009), esse denominador é definido como a diferença entre o PIB e o total das receitas dos impostos sobre o consumo, Y – Tc. Embora uma parcela significativa dos chamados “impostos sobre a produção” seja classificada como impostos sobre o consumo, o 6 A ausência de informações trimestrais das Contas Nacionais levou à decisão de ignorar o valor dos subsídios à produção. Deve-se reconhecer que esse procedimento pode não ser o mais apropriado, visto que os subsídios representam, em média, 1,8% do PIB no período analisado. 17 procedimento de Pereira (2009) ignora que alguns outros impostos sobre a renda do trabalho também são significantes na composição dos “impostos líquidos” nas Contas Nacionais7. Sob essa hipótese, a alíquota efetiva trimestral do imposto sobre a renda individual é dada por: y Ty Y ILS (9) A renda total do trabalho pré-imposto w t ht é definida nas Contas Nacionais como a soma da remuneração bruta recebida pela força de trabalho, WI, e a fração das contribuições para seguridade social paga pelas firmas, FC: w t ht WI FC (10) A Seção 5.2.2 descreve o procedimento baseado em pesquisas populacionais usado para construir uma série trimestral para WI. Ela também mostra as principais fontes de informações usadas para construir uma série para FC, usando apenas as contribuições pagas pelos empregadores ao sistema de seguridade social. A alíquota efetiva trimestral do imposto sobre a renda do trabalho é então definida por: l Tl WI FC (11) A renda do capital é calculada como subproduto da estimativa da renda do trabalho pré-imposto, de acordo com a equação (8): rt k k t Y ILS WI FC (12) resultando na alíquota efetiva trimestral do imposto sobre a renda do capital dada por: k Tk Y ILS WI FC 7 (13) A composição da aproximação dos “impostos líquidos” usada neste trabalho e as diferenças de classificação dos impostos em relação a outros trabalhos são discutidas na Seção 4. 18 4 ALÍQUOTAS DOS IMPOSTOS EM FREQUÊNCIA ANUAL Essa seção calcula as alíquotas efetivas dos impostos na frequência anual usando os dados da arrecadação a partir dos relatórios da carga tributária da economia brasileira, disponibilizados pela Secretaria da Receita Federal8. Os dados das receitas tributárias são apresentados apenas na frequência anual e cobrem o período 1999 a 2013. Impostos e contribuições usados para construir o conjunto de dados nessa seção são exatamente os mesmos com informações disponíveis na frequência trimestral. Sob o critério de usar exatamente o mesmo conjunto de impostos e contribuições nas duas frequências, o conjunto de dados final cobre, na média, 96,83% da receita total dos impostos nesse período. Comparado com o conjunto de dados em frequência trimestral, a maior diferença é em relação ao conceito de receitas dos impostos: dados mensais da arrecadação usados para construir o conjunto de dados trimestrais, mostram as receitas brutas dos impostos; por outro lado, as relatórios anuais da Secretaria da Receita Federal apresentam as receitas líquidas dos impostos, definida como a receita bruta menos as restituições. Os efeitos de usar as receitas líquidas ou brutas dos impostos são discutidos na Seção 5.1. Há ainda algumas diferenças relacionadas com a arrecadação dos impostos municipais e em termos de agregação dos impostos estaduais e federais a partir das séries mensais. A classificação dos impostos usada nesse estudo é baseada no mapeamento a partir das Contas Nacionais apresentado por Orair et al (2013). Os autores desenvolvem uma correspondência entre as classificação recomendada pelo FMI no Manual de Estatísticas de Finanças Públicas, estruturado em termos da base de 8 Relatórios denominados “Carga Tributária no Brasil”, disponíveis em: http://www.receita.fazenda.gov.br/historico/esttributarios/Estatisticas/default.htm 19 incidência dos impostos, e a classificação usada no Sistema de Contas Nacionais, desenvolvido pelas Nações Unidas. A Tabela 1 apresenta a classificação utilizada e destaca as diferenças com a literatura, especificamente com os trabalhos de Pereira (2009) e Lledó (2005). A última coluna da Tabela 1 mostra a participação média de cada conjunto de impostos no total das receitas tributárias no período 1999-2013. Tabela 1 – Classificação dos Impostos e Contribuições Presente Pereira Lledó % Receita Imposto Estudo (2009) (2005) Total* ICMS, IPI, II and ISS Cide Cofins, IOF IRPF IRRF/Remessas e IRRF/Outros PIS / PASEP FGTS, RGPS, CPSS (Federal, Estadual e Municipal) IRRF/Trabalho Salário Educação e Sistema S IRPJ, CSLL IRRF/Capital ITCMD ITR, IPVA, CPMF, IPTU and ITBI Consumo Consumo Consumo Consumo Capital Renda -Renda 29,20% 0,70% 12,60% 1,10% Renda -- -- 1,60% Trabalho Capital Renda 2,90% Trabalho 24,10% Trabalho -- -- 4,90% Trabalho Capital Trabalho 1,60% Capital Capital Capital -Capital --- 9,40% 2,80% 0,10% Capital Capital Renda 5,70% Fonte: Elaboração Própria * Participação média do conjunto de impostos no total das receitas tributárias no período 1999-2013. Há uma concordância completa da classificação em quase dois terços das receitas tributárias totais. Considerando as discrepâncias do um terço restante, algumas questões devem ser destacadas. Primeiro, em relação à classificação do PIS/PASEP, da Cofins e do IOF, para os quais não há nenhuma concordância na classificação utilizada neste trabalho e nos outros dois. Visto que esses três impostos representam, em média, quase 16% das receitas totais dos impostos no período, sua classificação tem um impacto importante nas alíquotas efetivas calculadas, como será discutido a seguir. 20 Com respeito ao PIS/PASEP, na verdade tratam-se de contribuições para a seguridade social feitas pelas firmas em nome de seus empregados. Então, mesmo que essas contribuições afetem diretamente o lucro das firmas, da perspectiva das Contas Nacionais, elas constituem parte da renda do trabalho pré-imposto. No caso da Cofins, embora seja uma contribuição bastante similar ao PIS/PASEP a ausência de uma ligação direta entre a arrecadação da contribuição e a transferência para atividades de seguridade social pode ser a razão pela qual Orair et al (2013) a classificam como imposto sobre produtos. A base tributária da Cofins é estritamente relacionada com as receitas das firmas e não há um retorno direto aos empregados, embora o nome sugira que seja uma contribuição para atividades de seguridade social. Finalmente, o IOF é um imposto que afeta um número significativo de transações financeiras. Apesar de seu impacto na alocação de capital, os efeitos do IOF são mais fortemente notados no uso de meios de pagamento e seus efeitos sobre o consumo. Como consequência, Orair et al (2013) definem o IOF como imposto sobre produtos, ao invés de ser um imposto afetando a produção. Ainda em relação à classificação dos impostos, enquanto Pereira (2009) define as contribuições para o Sistema S e o Salário Educação como impostos sobre a renda do capital, esse trabalho segue Lledó (2005) e classifica essas contribuições como impostos sobre a renda do trabalho, visto que ambos são baseados na folha de pagamentos das firmas. A segunda discrepância em relação à literatura é relacionada com as fontes de dados: Esse trabalho usa dados desagregados dos Impostos de Renda Retidos na Fonte (IRRF), disponibilizados pela Secretaria da Receita Federal e publicados pelo Ipeadata. Com essa informação, é possível separar as receitas dos impostos em 21 termos de incidência sobre a renda do trabalho e do capital, deixando impostos sobre remessas para o exterior e sobre outros rendimentos sob a classe de impostos sobre a renda individual. Pereira (2009) usa apenas os números agregados do IRRF, o classificando inteiramente como imposto sobre a renda individual. Lledó (2005) não menciona a inclusão do IRRF na sua classificação dos impostos. A maior parte dos dados usados para construir as bases tributárias são obtidos das Contas Nacionais, disponíveis no banco de dados do IBGE. Os dados do Produto Interno Bruto (Y), consumo privado (C) e gastos do governo (G) são obtidos das contas das despesas, enquanto a remuneração dos empregados (W), renda mista bruta (RMB) e o excedente operacional bruto (EOB) são obtidos da Tabela de Recursos e Usos. Infelizmente, a ausência de dados atualizados para renda dos fatores nas Contas Nacionais, durante a elaboração deste trabalho, limita a análise ao período 1999 a 2009. A série de remuneração dos servidores públicos (GW) foi construída a partir de dados das despesas com pessoal e encargos sociais nos três níveis de governo (Federal, Estadual e Municipal) obtidos no Ipeadata. A Tabela 2 apresenta as alíquotas efetivas médias dos impostos em frequência anual. Para comparação, a tabela também inclui os valores apresentados por Pereira (2009) e Lledó (2005), combinados com uma análise de amostra parcial para cada artigo: alíquotas efetivas são recalculadas usando o conjunto de dados desse trabalho, mas com as classificações e os períodos usados pelos demais autores. O ajuste dos conjuntos de dados fecha o hiato das estimativas em termos das diferentes metodologias, enquanto o ajuste do período considera a dinâmica das alíquotas do impostos. 22 Tabela 2 – Alíquotas Efetivas Médias Amostra Pereira Amostra Llédo Completa: (2009): Parcial: (2005): 1999-2009 2001-2005 2001-2005 2002 τc τy τl τk 25,30% 15,90% 1,00% -- Amostra Parcial: 2002 17,00% 16,80% 16,30% 4,10% 13,40% 8,50% 21,00% 17,60% 14,70% 8,00% 5,90% 17,70% 34,50% 30,20% 9,50% 8,80% Fonte: Elaboração Própria Dos resultados da Tabela 2, observa-se que a alíquota efetiva dos impostos sobre o consumo c é bem maior no presente estudo (25,3%), refletindo principalmente a classificação do IOF e da Cofins como impostos sobre o consumo. Esses dois impostos têm um impacto significativo em termos de alíquotas efetivas, visto que eles representam, em média, 12,6% do total das receitas dos impostos. Sob as classificações de Pereira (2009) e Lledó (2005), para o mesmo período, as alíquotas efetivas dos impostos sobre o consumo com os dados desse estudo se aproximam dos valores apresentados nos trabalhos deles. A maior parte das diferenças observadas nos impostos sobre a renda individual y refletem as hipóteses distintas sobre a classificação dos impostos, visto que a base tributária é exatamente a mesma nos três estudos. Mais especificamente, Pereira (2009) não apresenta o valor final da alíquota do imposto sobre a renda individual. No entanto, usando o conjunto de dados construído, nota-se que o valor estimado para essa alíquota cresce consideravelmente (de 1,0% para 4,1%) ao definir as receitas totais do IRRF nessa categoria9. Lledó (2005) obtém a alíquota mais alta para o imposto sobre a renda individual, dado que um conjunto significativo de impostos é incluído nessa classe, como a Confins, PIS/PASEP e a CPMF, 9 Na Tabela 1, o IRRF sobre o trabalho e o capital agregados correspondem a aproximadamente 7,5% do total das receitas dos impostos. 23 representando, em média, 21,3% do total das receitas tributárias. Infelizmente, mesmo após o ajuste para a classificação de Lledó (2005), ainda há uma diferença em termos de alíquota efetiva dos impostos sobre a renda individual (8,5% versus 13,4% pelas estimativas). Parte significativa dessa diferença parece estar relacionada com os valores em termos das receitas tributárias totais10. Comparando as alíquotas efetivas dos impostos sobre a renda do trabalho l e do capital k , as discrepâncias entre as os valores obtidos e os outros dois estudos são significativas. O modelo de Lledó (2005) apresenta uma alíquota separada referente às contribuições para a seguridade social, resultando em uma alíquota menor para o imposto sobre a renda do trabalho. Na média, a arrecadação do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) contribui para 15,9% das receitas totais dos impostos no período. Outra diferença é relacionada com o grande grupo de impostos classificados como impostos sobre a renda do capital nesse estudo e como renda individual no trabalho dele. Mesmo após ajustar os dados para a classificação de Lledó (2005), os resultados da análise de amostra parcial são ligeiramente menores devido às discrepâncias nas estimativas da base tributária: Lledó (2005) apresenta um valor muito alto para EOB/Y em 2002, comparado com os valores obtidos. A comparação com o trabalho de Pereira (2009) é um pouco mais difícil, dado que o autor não apresenta o imposto sobre a renda individual como uma categoria no modelo teórico, separada dos impostos sobre a renda do trabalho e do capital. Ele adota a metodologia de Mendoza et al (1994) de usar o imposto sobre a renda individual como um primeiro passo para calcular as alíquotas dos impostos sobre a 10 Mais especificamente, os valores da carga tributária do imposto de renda da pessoa física (IRPF), reportados por Lledó (2005) na Tabela A-1, não correspondem aos obtidos para esse estudo, sugerindo que o autor tenha incluído nesse valor os impostos de renda retidos na fonte (IRRF). 24 renda dos fatores. O procedimento usa as participações do capital e do trabalho em uma função de produção Cobb-Douglas, como definido na Seção 3.4, para calcular a renda pré-imposto na economia. A fração da receita do imposto sobre a renda individual é adicionada às receitas dos impostos alocadas em cada classe específica. Essa metodologia gera alíquotas efetivas maiores, dado que o uso de um parâmetro constante para a participação do capital na base tributária e nas receitas dos impostos sobre a renda individual implicam: l y 1 W RMB EOB Tl Tl y 1 W RMB EOB 1 W RMB EOB k y W RMB EOB Tk Tk y W RMB EOB W RMB EOB Outra fonte de discordância com Pereira (2009) relaciona-se com as diferenças na classificação dos impostos. Primeiramente, o conjunto específico de impostos anteriormente discutido em Lledó (2005), classificados como impostos sobre a renda individual (IOF, Cofins e PIS/PASEP), são classificados como impostos sobre a renda do capital. Pereira (2009) também classifica as contribuições para o Sistema S e o Salário Educação sob a mesma categoria. Definindo todos esses impostos e contribuições como impostos sobre a renda do capital obviamente resulta em maiores estimativas para sua alíquota. No entanto, após ajustar os dados obtidos para a classificação e a metodologia usados por Pereira (2009) para calcular as alíquotas, a diferença entre a estimativa obtida e os números apresentados pelo autor são pequenas, em grande parte como consequência da definição da base tributária. Da análise acima, torna-se claro que o cálculo das alíquotas efetivas dos impostos são muito sensíveis aos critérios adotados para a classificação dos impostos. Nesse trabalho, a classificação é baseada em estudos anteriores onde as estatísticas fiscais estão em acordo com o Sistema de Contas Nacionais. Esse critério permite o 25 desenvolvimento futuro de um arcabouço coerente para a análise de políticas fiscais, dado que os instrumentos de política (nesse caso, os impostos) terão uma ligação clara, descrita nas Contas Nacionais, com os agregados macroeconômicos. Na próxima seção, é apresentada a principal contribuição desse trabalho, que é a estimação das alíquotas efetivas dos impostos em frequência trimestral. 26 5 ALÍQUOTAS DOS IMPOSTOS EM FREQUÊNCIA TRIMESTRAL O objetivo principal dessa seção é construir séries de tempo das alíquotas efetivas dos impostos sobre o consumo, a renda individual e as rendas do capital e do trabalho, todas em frequência trimestral. Embora a maior parte das informações das receitas dos impostos e contribuições na esfera federal esteja disponível em frequência mensal, o maior desafio para construção das séries das alíquotas dos impostos em alta frequência esteve relacionado com a obtenção das informações sobre impostos municipais e as contribuições para o sistema de seguridade social dos servidores públicos dos governos regionais. Em termos da base tributária, dados das despesas nas Contas Nacionais estão disponíveis na frequência trimestral, mas a Tabela de Recursos e Usos fornece somente informações em frequência anual e com bastante defasagem. Como consequência, essa seção também fornece os detalhes do procedimento adotado para estimar a remuneração do capital e do trabalho, assim como as despesas com pessoal e encargos sociais do governos regionais. 5.1 FONTE DE DADOS DA ARRECADAÇÃO DOS IMPOSTOS A Tabela 3 apresenta o conjunto de dados das receitas com a arrecadação de impostos e contribuições considerados nesse trabalho, em frequência mensal, com as respectivas classificações, jurisdições, fontes dos dados e períodos. A última coluna da Tabela 3 mostra a participação média das receitas de cada conjunto de impostos e contribuições no total das receitas classificadas. Novamente, a título de referência, esse conjunto de dados representa 96,83% do total das receitas tributárias do país. A maior parte dos dados de impostos e contribuições federais e estaduais estão disponíveis no Ipeadata com pouquíssima defasagem. A série das contribuições para 27 Tabela 3 – Dados das Receitas com Impostos em Frequência Mensal Imposto Fonte dos Dados Intervalo dos Dados % Receita Total* Classe Jurisdição IPI, Imports, Cide, Cofins e IOF τc Federal Ipeadata 1999.01 - 2014.12 19,30% ICMS τc Estadual Ipeadata 1999.01 - 2014.12 22,60% ISS τc Municipal SISTN Finbra 2006.01 - 2014.12 1999 - 2014 2,30% IRPF, IRRF/Remessas e IRRF/Outros τy Federal Ipeadata 1999.01 - 2014.12 2,90% FGTS τl Federal website FGTS 1999.01 - 2014.12 5,10% IRRF/Trabalho e PIS / PASEP τl Federal Ipeadata 1999.01 - 2014.12 8,10% Sistema "S" e SE τl Federal BCB 1999.01 - 2014.12 1,50% RGPS e CPSS/Federal τl Federal Anexo RTN 1999.01 - 2014.12 18,10% CPSS/Estadual Estadual SISTN 2006.01 - 2014.12 0,60% Municipal SISTN 2006.01 - 2014.12 0,20% Federal Ipeadata 1999.01 - 2014.12 10,30% Federal Ipeadata 1999.01 - 2014.12 2,90% Federal Ipeadata 1999.01 - 2012.03 2,30% IPVA e ITCD τl τl τk τk τk τk Estadual Ipeadata 1999.01 - 2014.12 1,80% IPTU e ITBI τk Municipal SISTN Finbra 2006.01 - 2014.12 1999 - 2014 1,80% CPSS/Municipal IRPJ, CSLL ITR e IRRF/Capital CPMF Fonte: Elaboração Própria * Participação média do conjunto de impostos no total das receitas tributárias no período 1999-2014 o FGTS foi obtida a partir do site do FGTS11. Os dados do Salário Educação e das contribuições para o Sistema S foram obtidas do banco de dados de séries temporais do Banco Central12. Os dados das contribuições para o RGPS e contribuições para o sistema de seguridade social dos servidores públicos federais (CPSS/Federal) são obtidas do Relatório Mensal do Tesouro Nacional13. 11 http://www.fgts.gov.br 12 http://www.bcb.gov.br/?serietemp A série utilizada chama-se “Previdência social (Fluxos) – Despesas – Transferência a terceiros” cujo número de identificação é 2286. Essas são contribuições que o INSS coleta e transfere para as respectivas entidades. 13 www.tesouro.fazenda.gov.br/resultado-do-tesouro-nacional 28 A maior parte dos problemas relacionados com a construção do conjunto de dados de impostos e contribuições reside na obtenção das informações dos impostos municipais (IPTU, ITBI e ISS) e as contribuições dos servidores públicos estaduais e municipais para a seguridade social – CPSS/Estados e CPSS/Municípios. A próxima subseção discute: (i) os detalhes do procedimento usado para reconciliar os poucos bancos de dados públicos disponíveis sobre as receitas e despesas dos governos regionais; (ii) o conjunto de dados finais das receitas tributárias na frequência trimestral. 5.1.1 Construção dos Dados dos Governos Regionais Usando o SISTN Todos os anos, a Secretaria do Tesouro Nacional publica um grande banco de dados, chamado FINBRA14, com informações sobre o balanço anual dos governos municipais. Os municípios são obrigados a enviar informações detalhadas e estão sujeitos à sanções para o financiamento de dívidas no mercado financeiro no caso de não cumprimento15. Esse banco de dados consolidado pelo Tesouro Nacional fornece informações detalhadas sobre a arrecadação de impostos, mas infelizmente não tem informações sobre as contribuições para a seguridade social dos servidores. Uma das principais fontes de informações para o FINBRA é um sistema chamado SISTN (Sistema de Coleta de Dados Contábeis dos Entes da Federação), criado em 2000 e com informações detalhadas a partir de 2006. Os municípios são obrigados por lei a enviar relatórios periódicos para esse sistema, no qual eles são disponibilizados para consulta pública16. 14 Disponível em http://www.tesouro.fazenda.gov.br/en/contas-anuais 15 A obrigação de enviar esses relatórios ao governo federal é descrita nas seções II, III e IV da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101, de 04 de Maio de 2000). 16 Disponível em https://www.contaspublicas.caixa.gov.br/sistncon_internet/index.jsp 29 Um dos relatórios submetidos por estados e municípios no SISTN é de particular importância para esse estudo: o relatório bimestral simplificado chamado RREO (Relatório Resumido de Execução Orçamentária) que fornece detalhes dos principais impostos e contribuições coletadas pelos governos regionais. Embora os RREOs sejam submetidos bimestralmente, as informações de impostos e contribuições são apresentadas em frequência mensal para os últimos 12 meses. RREOs também fornecem dados sobre as contribuições dos servidores públicos para o sistema de seguridade social, em frequência mensal, e sobre as despesas com pessoal e encargos sociais em frequência bimestral17. Infelizmente, não é possível extrair do SISTN um relatório único com informações consolidadas ao longo do tempo ou para as entidades dos governos regionais. Para trabalhar com o SISTN foi necessário construir um sistema capaz de fazer o download dos relatórios no formato pdf para cada entidade de governo regional individualmente, para cada bimestre; converter os arquivos pdf em um formato que pudesse ler e processar as informações contidas nos relatórios; e compilar o conjunto final de dados, resumindo as informações de todos os relatórios. Esse processo demandou um esforço computacional significativo, no qual três rotinas de VBA foram desenvolvidas para executar as duas primeiras tarefas. A primeira rotina foi construída para fazer o download do arquivo pdf correspondente para cada relatório, para os 17 Detalhes sobre o tratamento das informações bimestrais das despesas com pessoal e encargos sociais são discutidos na Subseção 5.2.1. 30 5568 municípios, 27 estados e o Distrito Federal18, de 2006 a 201419. A segunda rotina lê todos os arquivos pdf e converte as informações para arquivos txt. A terceira rotina lê os arquivos txt e extrai a informação das receitas dos impostos, gastos do governo com pessoal e encargos sociais e as contribuições para o sistema de seguridade social dos servidores públicos para construir um banco de dados agregado. Com o objetivo de avaliar a qualidade dos dados das receitas dos impostos municipais (IPTU, ITBI e ISS) coletadas do SISTN, a Tabela 4 apresenta os dados do SISTN anualizados entre 2006 e 2014 e os valores reportados para cada ano no FINBRA. Ela também mostra o número de municípios, para os quais há informação no FINBRA e que também submeteram um relatório válido20 no SISTN. A cobertura da base de dados FINBRA (na média 94,8%, 34,1% e 96,5% para o IPTU, ITBI e ISS, respectivamente) é maior do que a cobertura observada no SISTN (na média, 71,1%, 71,8% e 72,7% para o IPTU, ITBI e ISS, respectivamente). Em termos do número de municípios que reportaram informações, ambos os bancos de dados mostram uma redução da taxa de participação ao longo dos anos, com uma queda mais acentuada no SISTN. 18 O Distrito Federal é uma entidade de governo regional de caráter especial. Sua organização em termos de arrecadação de impostos é similar a um estado sem municípios: o Governo do Distrito Federal (GDF) arrecada todos os impostos que são arrecadados pelos demais estados e também impostos municipais como IPTU, ITBI e ISS. O GDF inclui todas as receitas dos impostos em seus RREOs. A consistência desses dados foi checada com as informações do balanço anual do GDF, visto que seus dados anuais não estão disponíveis no FINBRA. 19 Total de 210.665 relatórios para municípios e 1.447 relatórios para estados e Distrito Federal. 20 Aqui, um RREO é considerado um relatório válido para análise se há pelo menos uma entrada diferente de zero para algum dos impostos para qualquer mês do ano. Se o município reporta apenas zeros como arrecadação tributária ao longo de todo um ano, o relatório é considerado inválido / não disponível. 31 Tabela 4 – Comparação dos Dados Anuais do Finbra com os Dados Anualizados do SISTN 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 IPTU (R$ milhões) FINBRA # municípios %FINBRA SISTN # municípios % SISTN AJUSTADO 10.872,3 5268 94,6% 10.759,5 4213 75,7% 10.912,6 11.907,8 5359 96,2% 11.580,3 4185 75,1% 11.914,5 12.725,2 4947 88,8% 12.691,6 4135 74,3% 12.824,8 14.177,5 16.362,7 5382 5401 96,6% 97,0% 15.198,2 16.198,8 4107 4058 73,7% 72,9% 14.186,5 16.384,9 ITBI (R$ milhões) 18.378,3 5271 94,6% 18.134,8 3979 71,4% 18.413,1 20.245,6 5089 91,4% 20.890,5 3906 70,1% 20.322,8 22.631,2 5185 93,1% 21.948,4 3637 65,3% 22.753,5 24.133,5 4288 77,0% 23.089,7 2821 50,7% 25.120,5 FINBRA # municípios %FINBRA SISTN # municípios % SISTN AJUSTADO 2.451,7 5249 94,3% 2.531,1 4522 81,2% 2.468,0 3.203,4 5315 95,4% 3.131,2 4128 74,1% 3.226,6 3.966,4 4907 88,1% 3.942,6 4079 73,2% 4.012,4 4.167,5 5.569,8 5356 5354 96,2% 96,1% 4.103,5 5.446,1 4037 4002 72,5% 71,9% 4.178,6 5.576,2 ISS (R$ milhões) 6.865,5 5212 93,6% 6.699,3 3894 69,9% 6.882,1 7.886,0 5020 90,1% 7.911,5 3831 68,8% 8.030,7 9.335,7 5190 93,2% 9.105,4 3646 65,5% 9.457,7 9.437,2 4282 76,9% 8.488,6 2863 51,4% 9.865,7 FINBRA # municípios %FINBRA SISTN # municípios % SISTN 16.868,5 5422 97,4% 17.178,4 4638 83,3% 19.749,4 5513 99,0% 19.045,6 4201 75,4% 23.403,3 5050 90,7% 23.005,7 4149 74,5% 26.086,7 5487 98,5% 25.225,3 4099 73,6% 31.335,3 5470 98,2% 30.326,7 4049 72,7% 36.532,4 5339 95,9% 35.248,6 3941 70,8% 42.204,7 5161 92,7% 41.360,3 3909 70,2% 45.835,6 5323 95,6% 44.313,1 3691 66,3% 47.754,1 4391 78,8% 43.508,6 2899 52,1% AJUSTADO 17.070,3 19.753,0 23.682,3 26.134,2 31.367,6 36.458,3 42.539,2 46.216,4 50.181,3 Fonte: Elaboração própria 32 O declínio no número de municípios reportando informações no SISTN e no FINBRA não corresponde a um declínio da razão dos impostos agregados no SISTN em relação ao impostos reportados no FINBRA. Isso significa que, mesmo com um declínio significativo no número de cidades submetendo os relatórios ao SISTN, em relação àquelas apresentando as informações no FINBRA, a perda em termos de arrecadação agregada dos impostos não parece ser significativa. A principal razão para isso é a distribuição desigual da arrecadação dos impostos entre os municípios, com um pequeno número de grandes cidades (em termos populacionais) gerando uma grande fração da arrecadação total do tributo. A Figura 1 resume a informação sobre a distribuição dos impostos baseada no tamanho da população dos municípios e a precisão dos dados do SISTN, comparados com os dados do FINBRA. A primeira linha de gráficos na Figura 1 mostra que, na média, os municípios com ao menos 100.000 habitantes – 299 cidades – arrecadam 86% do total das receitas do IPTU e do ISS e 80% das receitas totais do ITBI. Indo adiante, os municípios com ao menos 50.000 habitantes – 638 cidades – arrecadam, em média, 92% do total das receitas do IPTU, 91% do ISS e 87% do ITBI. A segunda linha de gráficos da Figura 1 mostra que, apesar da distribuição desigual da arrecadação dos impostos entre as cidades, os dados parecem ter boa qualidade, visto que a discrepância entre as informações do SISTN e do FINBRA, ponderadas pela participação da cidade na arrecadação total do imposto, é muito pequena. Mais de 90% do valor acumulado no ano dos impostos do SISTN têm um erro entre zero e 5%, comparado com a informação do FINBRA. Em uma perspectiva mais restrita, entre 2006 e 2007, mais de 80% da arrecadação dos impostos tem um erro inferior a 0,01%. A fração da arrecadação de impostos com hiatos inferiores a 33 Figura 1 – Impostos Municipais – Distribuição pelo tamanho da população e Diferença SISTNFINBRA Ponderada Fonte: Elaboração própria 0,01% entre o FINBRA e o SISTN tem diminuído ao longo do tempo, mas ainda permanece acima de 30% para 2014. A Tabela 4 inclui ainda uma linha adicional para cada imposto, apresentando o valor ajustado das receitas totais do imposto. As receitas ajustadas medem a arrecadação do tributo agregada para um dado ano, após levar em consideração a diferença entre os agregados reportados no SISTN e no FINBRA para cada município. 34 A ideia principal desse ajuste é distribuir, para cada município, a diferença entre o dado anual do FINBRA, assumido como uma estimativa mais precisa das receitas, e os dados do SISTN acumulados por doze meses, usando a arrecadação média do imposto em cada mês do ano para fazer essa distribuição. Os detalhes do procedimento para realizar esse ajuste são apresentados no Apêndice C. O conjunto de dados finais é comparado na Figura 2 com os valores apresentados em Orair et al (2013). Os autores construíram um sistema computacional similar para coletar os dados do SISTN e calcularam a carga tributária da economia brasileira em frequência mensal para o período 2002-2012. A principal diferença entre Orair et al (2013) e o procedimento aqui descrito até agora é relacionado ao tratamento aplicado às receitas dos impostos dos governos regionais. Os autores usam desagregação temporal e previsão contemporânea através de modelos econométricos de espaço de estados para estimar as séries relevantes. Apesar da ausência de técnicas econométricas avançadas, a série de tempo final da carga tributária agregada calculada nesse estudo não é muito diferente da publicada por Orair et al (2013). Na média, as estimativas da carga tributária total (receita tributária total como proporção do PIB) está 0,55p.p. abaixo da estimativa obtida por eles para o período entre 2002 e 201221. As principais diferenças entre as estimativas anuais e trimestrais apresentadas aqui e os valores encontrados por Orair et al (2013) relacionam-se com o período anterior a 2006, para o qual não há informações disponíveis no SISTN para completar 21 Em Março/2015, o Sistema de Contas Nacionais passou por uma revisão importante. As estimativas apresentadas nesse trabalho usam os números revisados. No entanto, na Figura 2, de forma a tornar as estimativas comparáveis com as apresentadas por Orair et al (2013), os números do PIB não revisados foram usados para calcular a série da carga tributária, tanto na frequência anual, quanto trimestral. 35 Figura 2 – Carga Tributária - Dados Anuais e Trimestrais x Orair et al (2013) Fonte: Orair et al (2013), Receita Federal (Dados Anuais) e fontes descritas na Tabela 3 (Dados Trimestrais) as informações ausentes no FINBRA. Note que, para o período entre 2002 e 2006, quando apenas os dados anuais são comparáveis a Orair et al (2013), a carga tributária total é muito similar, tanto em termos de nível quanto de dinâmica. Após 2006, com os ajustes das receitas usando os dados do SISTN e a disponibilidade das informações de contribuições para seguridade social, o conjunto de dados trimestrais acompanha melhor os resultados de Orair et al (2013). Além dos dados das receitas dos impostos municipais, os RREOs coletados do SISTN também fornecem informações sobre as contribuições dos servidores públicos estaduais e municipais para a seguridade social (CPSS/ Estados e CPSS/Municípios). Infelizmente, pelo que se tem conhecimento, não há um banco de dados com dados anuais desagregados por estados e municípios, similar ao FINBRA, disponível para checar a precisão dos relatórios. A única fonte de informação da CPSS/Estados e CPSS/Municípios são os valores agregados anuais publicados pela Secretaria do Tesouro Nacional e a Secretaria da Receita Federal. Dado essa limitação, o ajuste feito nos dados das receitas dos impostos usando a informação do FINBRA não foi 36 repetido para as contribuições dos servidores públicos para a seguridade social. Mesmo sem o ajuste, no entanto, a comparação dos valores anuais do Tesouro Nacional com os valores do SISTN mostra uma pequena diferença entre as duas séries de tempo. Notadamente, o hiato observado entre as contribuições municipais é bem menor do que o obtido para os estados. Outro problema com as informações da CPSS é a ausência de informação para a CPSS/Estados e a CPSS/Municípios no período anterior a 2006. O curto período de tempo com informações disponíveis em frequência mensal após 2006, combinado com a ausência de fontes de dados alternativas para checar a precisão do procedimento, sugere que não seria uma boa estratégia distribuir os dados anuais agregados ao longo dos meses. Os efeitos da ausência de informação em alta frequência para essas duas variáveis são discutidos a seguir. 5.1.2 Séries das Receitas dos Impostos Dado o procedimento descrito acima para coletar as informações de diferentes bancos de dados, foi possível construir séries de tempo mensais das receitas com a arrecadação de impostos e contribuições para cada classe de tributo (Tc, Ty, Tl e Tk). A Figura 3 compara a carga tributária total para cada classe de imposto, como razão do PIB, usando os dados anuais e trimestrais. As séries da carga tributária com os dados anualizados, acumulados por 4 trimestres, não estão muito longe das séries com os dados em frequência anual. De fato, usando os dados trimestrais, os impostos sobre o consumo, a renda individual e a renda do capital estão consistentemente acima das estimativas anuais, com uma diferença estável separando as séries de tempo em diferentes frequências. Essa diferença entre as séries anuais e anualizadas é consequência de dois fatores: primeiro, como brevemente discutido acima, o uso de 37 Figura 3 – Carga Tributária por Classe de Imposto Fonte: Elaboração própria receitas dos impostos líquidos nos relatórios da Secretaria de Receita Federal, ao invés das receitas brutas dos impostos como publicado nos relatórios mensais; segundo, o ajuste dos dados do SISTN com as informações do FINBRA, que em geral resultou em agregados estimados das receitas do impostos municipais ligeiramente maiores, como mostrado na Tabela 4. As diferenças mais importantes entre as estimativas anuais e trimestrais estão relacionadas com as estimativas das receitas dos impostos sobre a renda do trabalho para o período 1999 a 2006. Essa distância é consequência da ausência de dados da CPSS/Estados e CPSS/Municípios em frequência mensal para esse período, além de algumas discrepâncias nas informações mensais das contribuições para o Sistema S. O impacto médio das informações ausentes desses tributos, principalmente das duas 38 CPSS, apesar de representarem uma pequena parcela das receitas tributárias totais22, sobre a carga tributária total é estimada em 0,7p.p. do PIB. A Figura 3 aponta para um aumento da carga tributária total para a economia brasileira nos últimos 16 anos, baseado no aumento das receitas dos impostos obtidos de todas as fontes. A carga tributária total aumentou em torno de 6p.p. do PIB entre 1999 e 2014, principalmente concentrada nos impostos sobre a renda do trabalho (3,1p.p. do PIB) e sobre o consumo (2,0p.p. do PIB). Após a crise financeira de 2008, a carga diminuiu para todas as classes de impostos, devido à adoção de medidas de política fiscal expansionistas, baseadas em cortes seletivos de alíquotas de impostos, combinadas com uma redução natural da arrecadação tributária em função da atividade econômica mais lenta, resultando em uma redução temporária da carga tributária como proporção do PIB. Os impostos sobre o consumo observaram um queda significativa logo após a crise, mas já retornaram ao nível pré-crise. Em uma escala menor, essa redução temporária também foi observada nas cargas dos impostos sobre a renda individual e sobre a renda do trabalho, com uma rápida recuperação de suas tendências ascendentes. O mesmo não ocorreu com a carga do imposto sobre a renda do capital. Ela cresceu cerca de 2,3p.p. do PIB até 2007, seguido de uma redução significativa e persistente após a crise. O início da crise, no entanto, coincide com a extinção da CPMF em 2008. A carga desse imposto isoladamente representava, em média, 1,3p.p. do PIB entre 1999 e 2007. Uma avaliação da carga tributária sobre a renda do capital, excluindo a CPMF da análise, mostra seu retorno ao nível pré-crise em 2014. 22 CPSS/Estados e CPSS/Municípios representam, em média, 1,4% e 0,4% das receitas totais dos impostos, respectivamente, de acordo com a Tabela 3. 39 5.2 FONTES DE DADOS DA BASE TRIBUTÁRIA Duas fontes principais foram utilizadas para obter a base tributária em frequência trimestral, dadas as definições apresentadas nas equações (4), (9), (11) e (12). Primeiro, para calcular a base de incidência dos impostos sobre o consumo, assim como no caso das alíquotas efetivas na frequência anual, a principal fonte foram as Contas Nacionais. Depois, para calcular a renda dos fatores, foram usadas pesquisas populacionais para fazer inferências sobre a renda do trabalho total. Além de descrever os detalhes dessas duas fontes, essa seção apresenta primeiro o cálculo da remuneração dos servidores públicos em frequência trimestral. Depois, os detalhes do uso das pesquisas populacionais para estimar as rendas do trabalho e do capital são discutidos. Da perspectiva das Contas Nacionais, além das informações do PIB, consumo privado e gastos do governo, é necessário construir uma estimativa do valor adicionado a custo de fatores. Como no caso das rendas do trabalho e do capital, estimativas oficiais para o valor adicionado a custo de fatores só estão disponíveis na frequência anual e sem atualizações constantes. Pela definição apresentada na equação (8), o valor adicionado a custo de fatores é calculado pela diferença entre a renda doméstica bruta e a estimativa dos “impostos líquidos sobre a produção”. Enquanto estimativas da renda doméstica bruta estão disponíveis na frequência trimestral, é construída uma aproximação dos “impostos líquidos”, baseada na definição de Orair et al (2013), como a soma das receitas do IPI, ICMS, ISS, CIDE, II, IOF, Cofins, Salário Educação e contribuições para o Sistema S. A Figura 4 compara essa aproximação com a informação dos “impostos sobre a produção” fornecida pela Tabela de Recursos e Usos, ambas medidas como proporção do PIB. As estimativas obtidas com os dados trimestrais são, na média, 0,7p.p. abaixo das apresentadas na 40 Figura 4 – Impostos Líquidos – Dados Trimestrais e Anuais x Tabela de Recursos e Usos Fonte: IBGE (Tabela de Recursos e Usos) e elaboração própria (dados trimestrais e anuais) Tabela de Recursos e Usos, mostrando boa precisão, mesmo com todos os problemas reportados anteriormente para construção do conjunto de dados em frequência trimestral. Após gerar uma estimativa da renda total dos fatores, W + RMB + EOB, usando o produto doméstico bruto descontado dos impostos líquidos, Y ILS , as próximas duas seções apresentam o procedimento para construir as séries de tempo para as remunerações dos servidores públicos, GW, e as rendas do capital e do trabalho. A Tabela 5 resume as fontes de dados utilizadas na construção das séries da base tributária. 5.2.1 Construção da Série de Remuneração dos Servidores Públicos Para construir as séries de tempo trimestrais das remunerações dos servidores públicos (GW na equação (4)), foram usadas informações do SISTN para estimar os valores para os governos regionais. Os bancos de dados da Secretaria do Tesouro 41 Tabela 5 – Dados dos Componentes da Base Tributária Componente Y, C, G Pessoal e Encargos Sociais Governo Federal Pessoal e Encargos Sociais Governos Estaduais Frequência Fonte dos Dados Intervalo dos Dados Trimestral IBGE 1999.T1 - 2014.T4 Mensal Ipeadata 1999.01 - 2014.12 Pessoal e Encargos Sociais Governos Municipais Bimestral Anual Bimestral Anual 2006.B1 - 2014.B6 1999 - 2013 2006.B1 - 2014.B6 1999 - 2014 Renda do Trabalho e Capital Mensal SISTN Tesouro Nacional SISTN FINBRA PME, PNAD e Censo (IBGE) 1999.01 - 2014.12 Fonte: Elaboração Própria Nacional fornecem informações anuais agregadas sobre as despesas com pessoal e encargos sociais para as três esferas de governo. As informações para o Governo Federal estão disponíveis em frequência mensal no Ipeadata. No entanto, dados em alta frequência para estados e municípios não estão disponíveis diretamente – justificando o uso do SISTN. O procedimento para coletar os dados do SISTN é o mesmo descrito na Seção 5.1.1, com uma observação associada à frequência dos dados: cada RREO tem apenas informações sobre as despesas com pessoal e encargos sociais para o bimestre ao qual se refere. RREOs não fornecem uma série mensal para os doze meses anteriores, como é o caso para as receitas dos impostos e contribuições para a seguridade social dos servidores públicos. Para o municípios, dados anuais do FINBRA foram usados para ajustar as séries, como no caso dos impostos municipais. O mesmo ajuste foi feito para as séries dos estados, comparando os dados anuais fornecidos pela Secretaria do Tesouro Nacional no Relatório de Execução Orçamentária dos Estados23. Detalhes desse ajuste, também relacionados com a geração de séries de tempo trimestrais usando dados bimestrais, são discutidos no 23 https://www.tesouro.fazenda.gov.br/execucao-orcamentaria-dos-estados 42 Apêndice C. A Tabela 6 apresenta um resumo das informações obtidas no SISTN e a comparação com os dados anuais. 5.2.2 Construção das Séries da Renda Sobre o Trabalho e o Capital As Contas Nacionais no Brasil não fornecem informações trimestrais sobre as rendas do trabalho e do capital24. Como mencionado na Subseção 3.5, para calcular alíquotas médias dos impostos sobre a renda dos fatores na frequência trimestral, informações das pesquisas populacionais brasileiras foram usadas para construir uma aproximação da massa salarial ( WI FC , definida na equação (10)). De acordo com a equação (12), a renda do capital é calculada como o resíduo do valor adicionado a custo de fatores, Y ILS , e a renda do trabalho total. A renda do trabalho total é definida como a soma das remunerações da força de trabalho (WI) e as contribuições dos empregadores para o sistema de seguridade social (FC)25. A informação sobre a contribuição dos empregadores para o sistema de seguridade social está disponível em frequência mensal, após algumas hipóteses sobre as contribuições dos governos regionais. Portanto, a principal questão é a estimativa da remuneração da força de trabalho para o Brasil em alta frequência. O procedimento adotado para construir a série da remuneração do trabalho é baseado em dois passos: primeiro, estimar a população ocupada total no Brasil, usando informações da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) e da Pesquisa Mensal de Emprego (PME); em seguida, calcular uma aproximação dos 24 Até o momento, a última informação relativa à distribuição da renda entre trabalho e capital nas Contas Nacionais está disponível na frequência anual e atualizada até 2009. 25 Ver IBGE (2009), página 67. 43 Tabela 6 – Comparação dos Dados Anuais com os Dados do SISTN Anualizados Despesas com Pessoal e Encargos Sociais - Estados (R$ Milhões) Tesouro SISTN SISTN / Tesouro Ajustado 2006 124.592,1 124.100,1 99,6% 124.592,1 2007 141.192,0 131.282,9 93,0% 141.192,0 2008 159.408,4 139.662,7 87,6% 159.408,4 2009 172.128,8 145.091,8 84,3% 172.128,8 2010 197.557,3 164.601,4 83,3% 197.557,3 2011 226.181,8 196.630,3 86,9% 226.181,8 2012 265.332,7 224.394,7 84,6% 265.332,7 2013 319.397,9 272.656,4 85,4% 319.397,9 2014 NA 305.362,0 305.362,0 Despesas com Pessoal e Encargos Sociais - Municípios (R$ Milhões) Finbra # Municipalities (% of total) 2006 77.882,9 5422 97,4% 2007 90.488,4 5521 99,2% 2008 101.323,3 5049 90,7% 2009 118.104,9 5426 97,4% 2010 134.819,3 5417 97,3% 2011 155.809,3 5317 95,5% 2012 177.005,2 5150 92,5% 2013 199.409,1 5094 91,5% 2014 203.419,8 4328 77,7% SISTN # Municipalities (% of total) 77.168,9 4382 78,7% 79.179,2 4331 77,8% 90.925,3 4254 76,4% 101.678,5 4192 75,3% 113.975,4 4103 73,7% 129.039,4 4030 72,4% 141.288,5 3940 70,8% 161.403,7 3732 67,0% 158.791,4 3247 58,3% SISTN / Finbra Ajustado 99,1% 78.439,5 87,5% 90.550,1 89,7% 104.556,2 86,1% 120.442,6 84,5% 136.784,5 82,8% 157.518,8 79,8% 179.866,2 80,9% 204.834,8 78,1% 220.506,1 Fonte: Elaboração Própria 44 salários médios no Brasil, após obter informações de três pesquisas (PNAD, PME e Censo populacional). A combinação dessas três pesquisas para obter uma estimativa da renda total do trabalho no Brasil é necessária por causa da cobertura amostral e da frequência de cada uma delas. Em frequência mensal, a PME fornece dados de emprego e salários para seis regiões metropolitanas26, representando 25% da população brasileira total. A PNAD fornece informações sobre emprego e salários numa amostragem de todo o país, mas em frequência anual. Além disso, para os anos censitários (2000 e 2010 no período analisado), a PNAD não é disponibilizada 27. Os dados do Censo populacional também contornam um problema de estimação dos salários médios no Brasil. Na literatura, Gomes, Bugarin e Ellery (2008) comparam dados da PNAD com os dados anuais da renda do trabalho apresentados nas Contas Nacionais. Eles estimam a renda total do trabalho usando dados da PNAD e sugerem que, entre 1992 e 1998, a renda agregada do trabalho foi, de fato, 26% maior do que a apresentada nas Contas Nacionais. Os dados do Censo fornecem maior cobertura quando comparados com os da PNAD, permitindo correções na medida dos salários médios quando a distribuição de renda é bastante viesada, como discutido a seguir. Seguindo com a estimativa da população total empregada no Brasil, assumese que a dinâmica de curto prazo da população empregada nas regiões metropolitanas cobertas pela PME seja a mesma dinâmica para todo o país28. A série 26 Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre. 27 Microdados da PME, PNAD e Censo são obtidos do site do IBGE. 28 Houve uma mudança metodológica na definição de trabalho, entre outras questões, na PME em 2002. Para o período entre 1999 e 2002, o número de pessoas empregadas é simplesmente uma 45 de tempo da população empregada é ajustada duas vezes: primeiro, pela diferença de definição da população empregada entre a PNAD e a PME; segundo, pela fração da população empregada nas regiões cobertas pela PME no total da população empregada no Brasil. Para o primeiro ajuste, a razão média entre 1999 e 2013 da população empregada na PME sobre a população empregada na PNAD é estimada em 0,94. Essa razão é bastante estável ao longo do tempo, especialmente após 2002. Para o segundo ajuste, a fração média entre a população empregada nas regiões metropolitanas da PME e da PNAD é estimada em 0,246. Essas duas razões são aplicadas uniformemente sobre a série da população empregada da PME descrita acima. Para a estimativa trimestral dos salários médios no Brasil, assume-se novamente que a dinâmica de curto prazo dos salários para todo o país é a mesma descrita pelos dados da PME29. Começando com os dados da PME, três ajustes foram realizados: (i) para o período entre 1999 e 2002, ajuste dos dados da antiga PME para o valor médio dos salários de todos dos trabalhos, ao invés dos salários do trabalho principal; (ii) estimativa do hiato médio entre os salários da PME e os valores reportados no Censo para a mesma área geográfica, de forma a corrigir o nível dos salários para as diferenças de distribuição de renda; (iii) estimativa dos salários para retropolação da nova definição de população empregada, usando as mudanças percentuais da população empregada na antiga metodologia da pesquisa. 29 Como o interesse é na renda total do trabalho, salários aqui são definidos como “salários efetivamente recebidos pelas famílias” em cada mês. No entanto, para poder comparar a mesma variável entre as pesquisas, as razões apresentadas a seguir são relacionadas com “salários normalmente recebidos pelas famílias”. Essa é a medida de renda pesquisada na PNAD e no Censo, e é diferente da medida anterior porque não inclui bônus e outras compensações temporárias das famílias. 46 o Brasil, levando em consideração o hiato entre as regiões metropolitanas pesquisadas pela PME e o país todo. Esses três passos são detalhados a seguir. Em termos do primeiro ajuste, os dados da PME entre 1999 e 2002 não incluem informações dos salários para todas as ocupações das famílias. Ao invés disso, os dados disponíveis referem-se apenas aos salários da ocupação principal. Usando os dados da PNAD entre 1999 e 2013, restritos para cobrir apenas as regiões metropolitanas da PME, o hiato médio entre a renda de todos os trabalhos e a renda do trabalho principal é estimado em 3,1%. Esse fator multiplica os salários para o período 1999-2002, como uma estimativa do salário médio para todas as ocupações da família. Para o segundo ajuste, a Tabela 7 compara os ganhos médios da PME e dos Censos de 2000 e 2010, calculados para as mesmas regiões metropolitanas da PME, no mês de referência do Censo30. Há uma discrepância significativa nos salários médios, provavelmente relacionada com a grande desigualdade de renda no Brasil e a dificuldade de pesquisas menores em capturar informações precisas dos níveis de renda mais altos31. Uma avaliação dos microdados da pesquisa mostra que o hiato entre a renda estimada da PME e do Censo, no mesmo percentil, é normalmente crescente ao aproximar-se do topo da distribuição. Portanto, na mediana, o hiato entre a renda reportada no Censo versus a renda reportada na PME atinge 6%. No 90° 30 Note, novamente, que a PME começou a apresentar os dados dos salários médios para todos os trabalhos da família somente em 2002. 31 Infelizmente, pesquisas sobre a distribuição de renda usando dados de declarações de renda ainda são bastante preliminares para o Brasil. Os resultados mostram que mesmo os dados do Censo podem subestimar significativamente a renda total do trabalho: Medeiros, Souza e Castro (2014) estimam que o topo 1% da população em termos de renda recebe a fração de 25% da renda total da economia; no Censo de 2010, esse número é estimado em 20%. 47 Tabela 7 – Salário Médio - Censo e PME Valor (em R$) PME - Jul/2000 - Trabalho Principal Censo 2010 - Trabalho Principal PME - Jul/2010 - Trabalho Principal Censo 2010 - Trabalho Principal PME - Jul/2010 - Todos Trabalhos Censo 2010 - Todos Trabalhos Média 723,91 860,22 1.452,50 1.615,84 1.484,45 1.681,33 Gap 18,8% 11,2% 13,0% 14,4% Fonte: Elaboração Própria percentil, o mesmo hiato é estimado em 17%; no 99° percentil, o hiato atinge 30%; e assim por diante. Dado esse fato, a primeira transformação aplicada aos dados dos salários médios da PME é o ajuste pelo gap médio entre os salários reportados no Censo e na PME. Para o terceiro ajuste, uma característica importante da distribuição da renda do trabalho no Brasil é relacionada ao crescimento dos salários nas regiões metropolitanas versus o crescimento dos salários nas demais regiões. Há um hiato decrescente entre os salários fora das regiões metropolitanas pesquisadas pela PME e os salários no resto do país, de acordo com os dados da PNAD. A Tabela 8 mostra a razão entre os salários médios nas regiões metropolitanas da PME, sobre os salário no Brasil de 1999 a 2013. A diferença entre os salários das regiões metropolitanas pesquisadas pela PME e todo o país diminui de 53,7% em 1999 para 35,5% em 201332. Para ajustar para essa tendência, o hiato estimado apresentado na Tabela 8 é interpolado linearmente ao longo dos anos e aplicado aos salários estimados após os dois procedimentos descritos acima. O conjunto de ajustes incorporados acima para estimar os salários para o Brasil mostra que, usando apenas os dados da PNAD para corrigir as estimativas dos 32 Essa tendência também é significante se os dados são restritos apenas ao salário médio da ocupação principal das famílias ou comparando aos dados dos Censos de 2000 e 2010. 48 Tabela 8 – Salário Médio – Todos os Trabalhos – PNAD Áreas da PME (em R$) 1999 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2011 2012 2013 Média 691,60 779,43 820,26 875,03 902,96 1.013,17 1.095,32 1.171,95 1.251,00 1.350,28 1.672,71 1.844,53 2.069,42 Brasil (em R$) 449,83 525,07 560,54 610,54 644,72 704,50 782,09 850,73 936,37 1.005,96 1.239,50 1.389,40 1.526,70 Gap 53,7% 48,4% 46,3% 43,3% 40,1% 43,8% 40,1% 37,8% 33,6% 34,2% 35,0% 32,8% 35,5% 40,4% Fonte: Elaboração Própria salários médios para os efeitos das caudas da distribuição, pode não ser suficiente, dado que a série de tempo estimada encontra-se sistematicamente acima dos valores médios reportados pela PNAD. Os resultados aqui apresentados, de fato, sugerem que a subestimação da renda do trabalho agregada encontrada em Gomes, Bugarin e Ellery (2005) pode ser ainda mais significante do que o reportado pelos autores. O passo final para calcular a renda do trabalho total consiste em adicionar estimativas das contribuições totais dos empregadores sobre as remunerações estimadas acima, como descrito na metodologia do IBGE para a renda do trabalho nas Contas Nacionais. A participação dos empregadores nas contribuições incidentes sobre a renda do trabalho é baseada nas informações para o FGTS, PIS/PASEP, Salário Educação, Sistema S, RGPS e CPSS. Enquanto as quatro primeiras contribuições são pagas inteiramente pelos empregadores, foi necessário coletar informações da participação dos empregadores nas arrecadações totais do RGPS e da CPSS. Usando relatórios do INSS, foi possível identificar a contribuição dos empregadores para o RGPS. Em termos da CPSS, foi possível coletar informações ao nível do governo federal para a participação do empregador para as contribuições. 49 Para simplificar, assume-se que ao nível dos governos regionais, a participação dos empregadores para a CPSS é a mesma observada a nível federal. A Figura 5 mostra a trajetória estimada para a renda do trabalho, acumulada doze meses. Compara-se os resultados com a métrica usual adotada para estimar a renda do trabalho total: usando apenas a remuneração dos empregados (W) e a usando a soma da remuneração dos empregados e a renda mista bruta (W + RMB). Enquanto a primeira medida é adotada em Mendoza et al (1994), a segunda medida é proposta por Considera e Pessoa (2011). A metodologia adotada nesse trabalho foca apenas nas definições da renda do trabalho usadas nas Contas Nacionais e em informações disponíveis nos microdados das pesquisas populacionais. A estimativa da renda do trabalho obtida encontra-se bem próxima da proposta por Considera e Pessoa (2011). Figura 5 – Renda do Trabalho Estimada: Contas Nacionais e Valores em Alta Frequência Fonte: Elaboração própria 50 5.2.3 Sumário dos Dados da Base Tributária Para construir a base tributária para a estimativa das alíquotas efetivas foi necessário coletar informações correspondentes às variáveis nas equações das seções 3.2 e 3.4. Para resumir, o procedimento para calcular as bases tributárias foi o seguinte: Para a base tributária do consumo, dados das Contas Nacionais e as estimativas trimestrais das receitas dos impostos sobre o consumo e da remuneração dos servidores públicos, apresentadas nas seções 5.1 e 5.2.1, respectivamente, foram usadas para calcular C + G – GW – Tc. A base do imposto sobre a renda individual é dada pelo valor da renda total pré-impostos, Y – ILS , calculada na frequência trimestral. Para os impostos sobre a renda do trabalho, foram estimados os salários recebidos pelas famílias usando as pesquisas populacionais, WI, e, seguindo o procedimento das Contas Nacionais, foram incluídas as receitas das contribuições cobradas dos empregadores, FC. Ambas as séries foram calculadas usando dados mensais e convertidas para frequência trimestral. Finalmente, para os impostos sobre a renda do capital, a base tributária é expressa como a diferença entre o total pré-imposto do valor adicionado a custo de fatores e a estimativa da renda do trabalho, computada na frequência trimestral: KI = Y – ILS – WI – FC. 5.3 ALÍQUOTAS EFETIVAS DOS IMPOSTOS – DADOS TRIMESTRAIS As alíquotas efetivas dos impostos são, finalmente, calculadas após a obtenção das informações das receitas dos impostos e das respectivas bases tributárias. O único procedimento adicional adotado para suavizar a dinâmica das alíquotas dos impostos foi a remoção dos componentes sazonais. 51 A Figura 6 mostra as séries de tempo trimestrais dessazonalizadas para as alíquotas efetivas dos impostos c , y , l e k , junto com as alíquotas computadas na frequência anual33. Em geral, as séries trimestrais não estão muito distantes das alíquotas anuais, mesmo considerando as discrepâncias em relação às bases tributárias e algumas receitas dos impostos nas duas frequências. Como esperado, a maior parte das diferenças é observada nas alíquotas dos impostos sobre as rendas do trabalho e do capital, para os quais os problemas na coleta de informações sobre as receitas e a base foram mais evidentes. Figura 6 – Alíquotas Efetivas dos Impostos – Dados Trimestrais x Dados Anuais Fonte: Elaboração própria 33 Os Apêndices A e B apresentam as séries para cada alíquota efetiva discutida, nas frequências anual e trimestral, respectivamente. Adicionalmente, as tabelas incluem também uma série para a alíquota efetiva do imposto sobre a renda geral, assumindo que não é possível discriminar a fonte de renda. Usando a notação da Seção 3.1, a série de tempo assume um modelo no qual os períodos. 52 y l k em todos Em termos dos resultados, as séries confirmam a ideia geral de um aumento das alíquotas efetivas dos impostos para economia brasileira nos últimos 16 anos. Essa tendência foi parcialmente interrompida após a crise financeira em 2008. No entanto, no final da amostra, a tendência parece ter recuperado sua trajetória, principalmente para os impostos sobre a renda individual e sobre a renda do capital. É interessante notar ainda que o período da crise também é caracterizado por uma quebra da tendência da alíquota dos impostos sobre a renda do trabalho, mas não um movimento descendente, como observado para os impostos sobre a renda individual, o consumo e a renda do capital. 53 6 ANÁLISE EMPÍRICA O objetivo dessa seção é apresentar resultados preliminares sobre a relação entre as alíquotas efetivas dos impostos calculadas na seção anterior e algumas regularidades do ciclo de negócios. Ela também explora como mudanças na política fiscal afetam diretamente (através de mudanças nas alíquotas de impostos específicos) e indiretamente (através de atualizações anuais das faixas de rendimentos do imposto de renda, por exemplo) a trajetória estimada das alíquotas agregadas dos impostos. 6.1 ALÍQUOTAS EFETIVAS E O CICLO DE NEGÓCIOS A Tabela 9 resume algumas correlações básicas entre as alíquotas de impostos efetivas médias e o ciclo de negócios. A maioria das correlações contemporâneas significativas têm o sinal esperado, principalmente aquelas relacionando consumo e investimento com os impostos. Em particular, a correlação negativa entre os impostos sobre consumo, renda do trabalho e renda do capital, com a participação do consumo no PIB, sugere uma forte substituição entre consumo e lazer no curto prazo, como previsto em modelos RBC simples. As correlações da participação dos gastos do governo no PIB com todas as alíquotas dos impostos são significativas, embora a correlação negativa com o imposto sobre a renda do capital pareça contra intuitiva. Em termos de robustez, o sinal das correlações, assim como a significância em alguns casos, calculados com os dados filtrados através de uma tendência linear são, em sua maioria, os mesmos que os obtidos com um filtro HP. A Figura 7 explora as correlações das alíquotas efetivas dos impostos em um arcabouço dinâmico, associando o PIB dessazonalizado por três métodos com valores defasados e futuros das alíquotas efetivas. Deve-se notar primeiramente que os 54 Tabela 9 – Correlações com o Ciclo de Negócios τc τy τl Correlação - Dados Dessazonalidos PIB 0,033* 0,146* 0,035 Consumo -0,430* 0,215* -0,136 Investimento -0,239* 0,195* -0,103 Gastos do Governo -0,195* 0,083* 0,062 Correlação - Participação no PIB Consumo -0,692* -0,186* -0,586* Investimento -0,087* 0,127* 0,069* Gastos do Governo 0,330* 0,478* 0,490* Balança Comercial 0,321* -0,398* -0,031* τk -0,291* -0,597* -0,557* -0,307* -0,334* -0,030* 0,263* 0,560* Fonte: Elaboração Própria (*) Significante a 5%. Figura 7 – Correlação das Alíquotas Efetivas com o PIB Fonte: Elaboração própria processos de dessazonalização alternativos, em geral, não alteram o padrão das correlações com o PIB ao longo do tempo, apontando assim para a robustez dos resultados. Em segundo lugar, correlações negativas do PIB com valores passados das alíquotas dos impostos sobre consumo e renda do capital parecem ser significativas, apesar da mudança das defasagens condicional ao procedimento de filtragem. O terceiro ponto é que a trajetória recente do imposto sobre a renda do 55 trabalho parece ser independente do ciclo de negócios, não sendo significante tanto em termos de defasagens, quanto de valores futuros. Finalmente, para fornecer um teste mais formal da influência dos impostos sobre o ciclo de negócios, a Tabela 10 resume os resultados de um conjunto de quatro modelos VAR estimados para testar a causalidade de Granger entre as alíquotas efetivas dos impostos e o ciclo de negócios. Cada VAR inclui um dos impostos, além dos valores dessazonalizados do produto, gastos com consumo e investimento e gastos do governo como variáveis endógenas, além de uma variável dummy igual a 1 a partir do primeiro trimestre de 2009, a fim de controlar para mudanças de política após a crise. Devido ao grande número de variáveis incluídas, o critério de informação de Schwartz selecionou sempre a inclusão de apenas uma defasagem no VAR. A tabela mostra os resultados, em termos de p-valor, da causalidade dos impostos para o ciclo de negócios (colunas 3 e 4) e do ciclo de negócios para os impostos (colunas 5 e 6). As colunas rotuladas “sinal” mostram a direção da causalidade, simulada das funções de impulso resposta de cada VAR. Os resultados da Tabela 10 mostram que o impacto dos impostos sobre o ciclo de negócios apontam para a direção esperada, com um aumento das alíquotas dos impostos reduzindo a atividade econômica. Os impostos sobre o consumo e a renda individual mostraram-se os mais relacionados com o ciclo de negócios, enquanto os impostos sobre a renda do trabalho não mostraram nenhum impacto direto significante. Em relação ao imposto sobre a renda do trabalho, especificamente, vale notar que sua dinâmica pode ser influenciada por outros fatores, não exatamente relacionados com a atividade econômica, como descrito na subseção 6.3. Também, embora seja tentador discutir multiplicadores fiscais a partir das funções de impulso 56 Tabela 10 - Causalidade de Granger: Impostos e o ciclo de negócios Causalidade de Granger: Dos Impostos (p-valor) τc τy τl τk Sinal Causalidade de Granger: Para os Impostos (p-valor) Sinal Produto Consumo Investimento Governo Produto Consumo Investimento Governo Produto Consumo Investimento Governo Produto 0,1123 0,0422* 0,2172 0,0022* 0,0326* 0,2383 0,0477* 0,0635 0,4896 0,5129 0,4524 0,8316 0,2420 negativo negativo negativo negativo - 0,0184* 0,2728 0,2477 0,8757 0,0283* 0,8614 0,2807 0,6651 0,1078 0,3048 0,4418 0,0164* 0,2463 positivo positivo positivo - Consumo 0,1935 - 0,9047 - Investimento 0,3106 - 0,1451 - Governo 0,0037* negativo 0,7542 - Fonte: Elaboração própria resposta dos impostos para o ciclo de negócios, deve-se reconhecer que o VAR desenhado para tal tarefa requer muito mais estrutura do que a que foi adotada aqui. De uma perspectiva de causalidade reversa, há alguns sinais bastante pequenos de uma relação em que o ciclo de negócios afeta as alíquotas dos impostos. Apenas impostos sobre o consumo e a renda individual parecem ser afetados pelo produto, enquanto o teste estatístico captura uma relação entre os gastos do governo e os impostos sobre o trabalho. O sinal da causalidade, derivado das funções de impulso resposta, mostra que um aumento na atividade econômica tende a resultar em um aumento da alíquota efetiva dos impostos no futuro. 6.2 EFEITOS DIRETOS DA POLÍTICA TRIBUTÁRIA SOBRE AS ALÍQUOTAS EFETIVAS Essa seção relaciona algumas mudanças importantes das alíquotas de impostos brasileiros em períodos recentes com as medidas das alíquotas efetivas propostas 57 neste trabalho. A Tabela 11 lista treze episódios de mudanças nas alíquotas de impostos específicos, incluindo a criação e a extinção de impostos e contribuições no sistema tributário. De uma perspectiva cronológica, a maioria das mudanças ocorreram em 2008. Este ano, em particular, inclui a mudança de alíquotas em resposta à crise financeira, mas também uma alteração significativa no sistema tributário, no início do ano, como consequência do fim da CPMF. A perda de receitas foi parcialmente compensada pelo aumento das alíquotas de outros impostos. Os treze episódios listados focam em mudanças dos impostos sobre o consumo e a renda do capital. A lista não inclui mudanças de política relacionadas com a renda do trabalho ou com a renda individual porque, na maioria das vezes, elas não ocorreram através de mudanças nas alíquotas dos impostos, mas focaram em questões mais amplas relacionadas à base tributária, como a atualização das faixas de rendimentos do imposto de renda. Enquanto as três primeiras colunas da Tabela 11 descrevem a mudança da política, a quarta coluna destaca o primeiro período após a mudança da política em que as receitas dos impostos foram mais afetadas. A quinta e a sexta colunas apresentam uma medida do impacto da mudança da política na economia, mostrando a variação das receitas no primeiro período após a mudança da política, como proporção do PIB e da respectiva base tributária. As duas colunas finais comparam a variação da alíquota média do imposto do episódio específico com a medida agregada da alíquota do imposto. Por exemplo, no primeiro episódio apresentado, o estabelecimento de uma alíquota de 0,38% para a CPMF representou, no terceiro trimestre de 1999, um crescimento da receitas de 1,11p.p. do PIB, ou quase 3p.p. como proporção da base tributária dos impostos sobre a 58 Tabela 11 – Impacto Sobre as Alíquotas Efetivas de Mudanças de Políticas Mudança de Política Período ΔTi / PIB ΔTi / Base Δ(Ti / Base) Δτ Ano Imposto 1999 τk CPMF: Alíquota = 0.38% (06/1999) 1999T3 1,11% 2,96% 2,96% 3,56% 2000 τk CPMF: Alíquota = 0.30% (06/2000) 2000T3 -0,22% -0,63% -0,85% -1,10% 2001 τk CPMF: Alíquota = 0.38% (03/1999) 2001T2 0,34% 0,94% 0,97% 2,40% 2002 τk IRPJ: Imposto sobre planos previdenciários (Medida Provisória 2222, 04/2001) 2002T1 1,03% 2,67% 2,55% 2,74% 2002 τc Implementação da CIDE 2002T1 0,46% 0,84% 0,84% 0,53% 2003 τk CSLL: Alíquota = 32% (Lei 10.684, 05/2003) 2003T2 0,27% 0,68% 0,54% 0,89% 2004 τc Cofins: incidente sobre produtos importados e serviços (05/2004) 2004T2 0,76% 1,49% 1,29% 1,53% 2008 τk Extinção CPMF 2008T1 -0,98% -2,58% -2,81% -4,13% 2008 τc 2008T1 0,34% 0,67% 0,65% 1,54% 2008 τk 2008T2 0,36% 0,95% 0,83% 0,42% 2008 τc 2008T2 -0,07% -0,13% -0,15% -0,11% 2008 τc 2008T4 -0,05% -0,09% -0,06% 0,10% 2008 τc 2009T1 -0,29% -0,52% -0,70% -4,86% IOF: Aumento da alíquota sobre operações de crédito e câmbio (Decreto 6339, 01/2008) CSLL: Aumento da alíquota de instituições financeiras = 15% (Medida Provisória 413, 01/2008) CIDE: redução da alíquota sobre combustíveis IOF: Redução da alíquota sobre operações de crédito e câmbio (Decretos 6566, 6613, 6655, 6691) IPI: redução das alíquotas sobre veículos (Decreto 6687, 12/2008) Fonte: Elaboração Própria 59 renda do capital. O estabelecimento de uma nova alíquota para CPMF representou aproximadamente 83% da variação total da alíquota do imposto sobre o capital em 1999T3 (2,96 / 3,56 ≈ 0,83). O primeiro resultado extraído de uma visão geral da Tabela 11 é que mudanças políticas das alíquotas dos impostos possuem uma boa correspondência com as mudanças das alíquotas efetivas médias dos impostos, ao menos no impacto. Em apenas dois casos a mudança no imposto específico apresenta sinal contrário ao apresentado pela mudança na alíquota do imposto agregado: o aumento da CSLL sobre instituições financeiras em 2008, quando a alíquota do imposto sobre a renda do capital caiu 0,42%, devido à extinção da CPMF e a redução das alíquotas do IRPJ; e a redução na alíquota do IOF sobre algumas transações financeiras, quando o imposto sobre o consumo cresceu 0,10%. Excluindo esses dois episódios, mudanças políticas das alíquotas de impostos foram responsáveis, em média, por 79,6% da mudança na alíquota efetiva do imposto para a categoria. Deve-se notar ainda que a correspondência parece boa tanto para grandes mudanças das alíquotas (em termos de geração de grandes receitas em proporção ao PIB), quanto para pequenos movimentos das mesmas. 6.3 EFEITOS INDIRETOS SOBRE AS ALÍQUOTAS EFETIVAS Essa seção descreve duas fontes indiretas de mudanças nas medidas das alíquotas efetivas médias dos impostos que não estão relacionadas com variações observadas na política tributária: primeiro, essa seção explora os efeitos das revisões anuais das faixas de rendimento do imposto de renda quando a distribuição da renda do trabalho está variando ao longo do tempo; em seguida, é apresentada uma avaliação do comportamento cíclico das receitas dos impostos, fornecendo uma ideia 60 das distorções para a medida das alíquotas efetivas dos impostos geradas pelo status do ciclo de negócios. Os dois exercícios complementam-se, em certa medida, já que avaliam mudanças indiretas nas alíquotas efetivas médias dos impostos tanto de uma perspectiva de cross-section – i.e., quando a heterogeneidade dos agentes na economia é uma das principais fontes de flutuação – quanto de séries de tempo – especialmente no último caso, quando o estado da economia é a principal fonte de mudanças nas alíquotas efetivas. A fim de analisar os efeitos da heterogeneidade de renda sobre a medida de alíquotas efetivas, considere o caso das revisões das faixas de rendimento para as declarações anuais de imposto de renda. Esse exercício é particularmente importante visto que o Brasil apresentou recentemente crescimentos significativos dos salários reais ao longo do tempo, combinados com a redução da desigualdade da renda do trabalho. Para um exemplo de como essa atualização das faixas de rendimento pode afetar as alíquotas efetivas médias do imposto sobre o trabalho, considere o caso de uma família cuja renda esteja muito próxima de alcançar o limite inferior da primeira faixa de rendimentos sobre a qual o imposto de renda é cobrado. Assumindo que o governo decida não atualizar as faixas de rendimento usadas no ano anterior, se essa família tiver qualquer ganho extra de renda no ano fiscal anterior, ela precisará fazer a declaração e pagar os impostos sobre sua renda total. Isso implica em um aumento maior nas receitas totais do imposto, comparado com o crescimento da base tributária, visto que a família não pagava impostos no ano anterior. Então, considerando o cômputo das alíquotas efetivas médias do imposto, atualizações das faixas de renda não acompanhadas por mudanças na renda real podem gerar um componente prócíclico na série de tempo. Um aumento geral no número de famílias que pagam 61 imposto sobre a renda do trabalho pode justificar a tendência crescente das alíquotas observadas na Figura 6. Na verdade, Orair (2014) relaciona o crescimento das receitas do IRRF-Trabalho entre 2004 e 2009 em diferentes setores da economia com o crescimento da participação do trabalho formal nesses setores. De uma perspectiva agregada, a Figura 8 mostra a proporção da população empregada com renda do trabalho ao menos igual ao limite inferior da primeira faixa de rendimentos sobre a qual incide o imposto, e a proporção da população empregada que recebe uma renda ao menos igual ao limite inferior que define a faixa de rendimentos mais alta, ambas como proporção da população total com ao menos 10 anos de idade34. A figura mostra uma clara tendência ascendente da proporção da população com rendimentos ao menos iguais ao limite inferior da primeira faixa de incidência do imposto sobre a renda do trabalho, de 7% em 2002T1, para 17,25% em 2014T4. Por outro lado, há uma quebra clara em 2009 do número de pessoas com rendimentos na faixa mais alta do imposto de renda: naquele ano, a Secretaria da Receita Federal criou duas faixas de renda adicionais, mudando o limite de rendimentos da faixa mais alta. A proporção da população empregada pagando imposto nessa faixa mais alta flutua entre 2,7% a 4,4% da população total na amostra. Para avaliar os efeitos de mudanças na proporção da população empregada pagando imposto sobre a renda do trabalho foi estimado um modelo VAR, relacionando a alíquota efetiva do imposto sobre a renda do trabalho, as duas proporções descritas acima e a fração da população trabalhando no setor formal como 34 As séries de tempo mostram os valores ajustados para sazonalidade ao final de cada trimestre. As séries de tempo apresentam apenas os valores usando a nova metodologia da PME, visto que o hiato entre os números da população empregada da antiga metodologia e da nova poderiam causar problemas na análise de séries de tempo proposta abaixo. 62 Figura 8 – Participação da População e Faixas do Imposto de Renda Fonte: Elaboração própria proporção do total da população empregada. O numerador é definido como o total da população empregada no setor privado formal. O VAR de 4 variáveis, estimado com uma defasagem baseada em critérios de informação, também inclui como variáveis exógenas duas defasagens do hiato do produto baseado no filtro HP e duas variáveis dummy: a primeira é igual a 1 após 2006, ajustando para a quebra no conjunto de informações observada naquele ano; a segunda é igual a 1 após 2009, controlando para a mudança no número de faixas de rendimento do imposto sobre a renda. Assumindo um ordenamento do VAR em que a proporção da população empregada no setor formal não é afetada contemporaneamente pelas outras três variáveis – a “variável mais exógena” do sistema – e a alíquota do imposto sobre a renda do trabalho é contemporaneamente afetada por todas as outras variáveis – a “variável mais endógena” – na decomposição da matriz de Choleski, a Figura 9 mostra as funções impulso resposta do imposto sobre a renda do trabalho após um choque 63 Figura 9 – Funções Impulso Resposta do Imposto sobre a Renda do Trabalho Modelo VAR (1) Fonte: Elaboração própria exógeno nas proporções da população35. As linhas pontilhadas mostram o intervalo de confiança de 95% para cada função impulso resposta. Surpreendentemente, o primeiro gráfico mostra que um crescimento do número de trabalhadores no setor formal não é significante para explicar mudanças na alíquota do imposto. Uma possível explicação para esse resultado é que um aumento da participação de trabalhadores no setor formal ocorreu predominantemente para os trabalhadores de renda mais baixa – i.e., aqueles com rendimento abaixo do limite inferior da primeira faixa de rendimentos que contribui para o imposto de renda. Esse resultado é robusto a medidas alternativas de trabalho no setor formal, como a proporção da população empregada com documentação de trabalho válida, ou a fração da população empregada no setor formal privado como proporção do total de trabalhadores no setor privado. 35 Os resultados não são afetados pela decomposição de Choleski, dado que IRFs generalizadas geram aproximadamente os mesmos resultados. 64 A medida da alíquota do imposto sobre a renda do trabalho não apresenta mudanças significativas com um aumento da fração da população com renda ao menos igual ao limite inferior da faixa de rendimentos mais alta. Por outro lado, as alíquotas do imposto sobre o trabalho apresentam um aumento significativo com mudanças na fração da população com renda acima do limite inferior da faixa de rendimentos mais baixa. Nesse caso, como mostra o terceiro gráfico da Figura 9, um aumento de 1p.p. na fração da população declarando renda ao menos igual ao mínimo estabelecido pela menor faixa de rendimentos, resulta em um impacto grande e persistente na alíquota do imposto sobre o trabalho, com um aumento de 0,4 p.p. após 6 a 8 trimestres. Outra forma de avaliar fontes indiretas de flutuações nas alíquotas dos impostos é relacionar suas receitas com a atividade econômica na frequência do ciclo de negócios. Se a base e a arrecadação tributárias são perfeitamente correlacionadas, qualquer comportamento cíclico observado da alíquota efetiva média dos impostos deve ser uma consequência da política tributária e não um sub-produto das flutuações econômicas. A Tabela 12 mostra a correlação amostral das receitas dos impostos com flutuações da base tributária produto e consumo. Todas as variáveis são medidas em termos reais, usando o IPCA como deflator, ajustadas para sazonalidade e com o valor em log filtrado por uma tendência linear. Na amostra, as receitas do imposto sobre a renda individual e sobre a renda do trabalho movimentam-se em conjunto com flutuações de suas próprias bases, como mostrado na primeira linha de resultados da Tabela 12. A arrecadação tributária dos impostos sobre o consumo, a renda individual e a renda do trabalho apresentam uma correlação positiva significante com flutuações do produto e do consumo, enquanto as receitas do imposto sobre a renda do capital são notadamente contra cíclicas. 65 Tabela 12 – Correlações – Receitas com a Base Tributária e o Ciclo de Negócios Receitas Tributárias Consumo Base Tributária Consumo Produto 0,11* 0,39* 0,60* Renda do Trabalho 0,76* 0,74* 0,85* Renda do Capital 0,20* -0,60* -0,30* Renda Individual 0,61* 0,63* 0,62* Fonte: Elaboração Própria (*) Significante a 5%. As receitas do imposto sobre o consumo não apresentam correlação significativa com sua própria base tributária na frequência do ciclo de negócios. No entanto, a forte correlação positiva com o consumo e o produto sugere que a ausência de correlação significativa entre as receitas e a base tributária é uma consequência da adição de outros componentes à base tributária. Mais especificamente, a correlação entre as receitas do imposto sobre o consumo e a soma do consumo das famílias e do governo (0,35) é positiva e significante na amostra, sugerindo que os gastos com os salários dos servidores públicos seria responsável por quebrar a significância da correlação. 66 7 CONCLUSÃO Esse artigo estimou séries de tempo das alíquotas efetivas dos impostos sobre o consumo e a renda dos fatores para o Brasil, seguindo a metodologia de Mendoza et al (1994) e Lledó (2005), usando um grande número de bases de dados para adquirir informações das receitas dos impostos e de suas respectivas bases tributárias em frequência trimestral. O procedimento para gerar as aproximações trimestrais parece ser efetivo, apesar de sua simplicidade, visto que as aproximações anualizadas das estimativas trimestrais permaneceram bem próximas aos conjuntos de dados anuais normalmente usados para construir tais estimativas. A série de tempo da carga tributária e das alíquotas efetivas dos impostos também parecem em linha com a experiência histórica da política fiscal brasileira. A carga tributária estimada identifica corretamente uma tendência crescente ao longo do tempo, apesar da interrupção parcial após a crise internacional de 2008. Uma boa pergunta após o exercício de calcular tais alíquotas efetivas dos impostos é a capacidade do conjunto de dados aqui apresentado de ser regularmente atualizado, de forma a fornecer análises oportunas para ações de políticas. Um problema natural de se trabalhar com dados do SISTN e do FINBRA é o longo tempo que leva para os municípios submeterem os relatórios e o administrador do sistema torná-los disponíveis. O Tesouro Nacional normalmente disponibiliza os arquivos do FINBRA no último trimestre do ano seguinte. Para uma aplicação em tempo real desse conjunto de dados, seria necessário utilizar fontes alternativas para coletar os dados dos governos regionais, ou usar modelos auxiliares estimados para fornecer previsões de curto prazo das receitas tributárias. Mesmo com essas dificuldades, esse conjunto de dados pode ser usado em vários exercícios de análise da política fiscal. Por exemplo, pode-se usar as séries das 67 alíquotas dos impostos para estimar regras fiscais ou para uma calibração ou estimação mais precisa de modelos de equilíbrio geral que buscam estudar os efeitos de medidas fiscais. Esses temas permanecem como sugestão para pesquisas futuras. 68 REFERÊNCIAS ARAÚJO, C. H. e FERREIRA, P. C. Reforma tributária, efeitos alocativos e impactos de bem-estar. Revista Brasileira de Economia, 53(2):133.166, 1999. ARAÚJO NETO, V. B. e SOUSA, M. C. S. Tributação da renda e do consumo no brasil: Uma abordagem macroeconômica. Anais do 29° Encontro Nacional de Economia (ANPEC), 2001. 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Empirica, 29(3):209.224, 2002. 70 APÊNDICE A – SÉRIES DE TEMPO ANUAIS DAS ALÍQUOTAS DOS IMPOSTOS DISTORCIVOS: 1999-2009 Consumo 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 21,06 23,58 24,65 25,37 24,30 26,84 26,15 25,40 25,99 28,00 24,25 Renda Individual 0,94 0,94 0,98 1,02 0,92 0,91 0,95 1,00 1,13 1,16 1,12 Trabalho Capital Renda Geral 18,41 19,11 19,59 20,02 20,48 21,64 22,20 22,49 22,18 22,51 22,40 14,33 15,42 16,19 19,14 17,90 17,24 18,98 19,07 20,67 18,15 17,26 17,76 18,59 19,23 20,68 20,34 20,69 21,81 22,09 22,70 21,94 21,51 71 APÊNDICE B – SÉRIES DE TEMPO TRIMESTRAIS DAS ALÍQUOTAS DOS IMPOSTOS DISTORCIVOS: 1999T1-2014T4 Consumo 1999T1 1999T2 1999T3 1999T4 2000T1 2000T2 2000T3 2000T4 2001T1 2001T2 2001T3 2001T4 2002T1 2002T2 2002T3 2002T4 2003T1 2003T2 2003T3 2003T4 2004T1 2004T2 2004T3 2004T4 2005T1 2005T2 2005T3 2005T4 2006T1 2006T2 2006T3 2006T4 2007T1 2007T2 2007T3 2007T4 2008T1 2008T2 2008T3 2008T4 17,54 19,36 20,25 20,12 23,71 22,27 23,07 23,96 24,33 25,30 24,83 23,35 24,27 24,46 26,37 26,92 25,04 23,88 23,47 25,74 26,52 28,13 27,53 26,70 27,60 27,40 26,93 26,36 26,50 26,22 26,20 26,34 25,85 25,92 26,89 26,87 28,55 28,33 28,62 28,41 Renda Individual 0,98 0,88 0,95 0,92 0,92 0,97 0,92 0,92 0,93 1,01 1,02 0,95 1,10 0,89 1,07 1,07 1,06 0,88 0,84 0,94 0,93 0,91 0,86 0,91 0,90 0,99 1,02 0,86 0,90 1,04 1,02 0,98 1,06 1,09 1,14 1,26 1,20 1,10 1,16 1,17 Trabalho Capital Renda Geral 18,90 18,45 18,57 18,43 18,51 18,35 18,07 18,53 18,96 19,52 19,28 20,43 19,38 18,98 19,35 19,28 19,57 20,05 20,67 21,54 21,43 21,62 21,28 21,65 22,02 22,36 22,43 22,57 23,49 23,71 24,03 23,96 23,45 24,07 24,53 23,79 24,41 23,87 23,80 23,44 13,30 10,06 13,55 13,43 15,54 14,79 13,99 15,04 13,62 15,90 15,60 14,86 17,42 16,48 19,30 18,54 16,06 16,97 14,74 16,10 16,14 14,78 15,93 15,42 16,55 17,29 16,75 17,78 16,40 18,29 17,07 16,05 16,57 17,44 17,79 19,86 16,33 15,79 16,41 15,99 17,30 15,48 17,39 17,07 18,20 17,70 17,43 17,98 17,43 18,85 18,85 18,86 19,75 18,56 20,47 19,91 19,06 19,28 18,64 19,82 19,87 19,14 19,60 19,57 20,37 20,85 20,71 20,99 21,02 22,22 21,72 21,14 21,27 21,98 22,41 22,96 21,83 21,25 21,57 21,29 72 Consumo 2009T1 2009T2 2009T3 2009T4 2010T1 2010T2 2010T3 2010T4 2011T1 2011T2 2011T3 2011T4 2012T1 2012T2 2012T3 2012T4 2013T1 2013T2 2013T3 2013T4 2014T1 2014T2 2014T3 2014T4 24,11 23,79 23,94 26,24 26,21 26,79 26,58 26,44 28,55 26,42 27,49 26,89 26,69 26,50 25,65 25,60 26,14 26,36 26,42 26,09 25,77 27,53 24,16 27,79 Renda Individual 1,23 1,02 1,12 1,14 0,98 1,09 1,02 1,08 1,16 1,15 1,15 1,11 1,12 1,19 1,17 1,19 1,17 1,20 1,20 1,25 1,25 1,21 1,24 1,13 Trabalho Capital Renda Geral 23,72 23,87 23,46 24,27 24,05 24,11 23,97 24,82 24,99 24,70 25,10 24,80 24,94 24,67 24,38 24,03 24,48 25,49 25,24 25,35 25,23 25,33 25,23 25,09 16,43 15,07 14,01 14,67 13,32 13,69 13,91 13,53 14,05 14,14 16,16 14,44 15,31 14,66 14,31 14,82 15,31 14,38 14,33 14,73 14,33 15,90 15,23 15,13 21,68 20,96 20,32 20,85 19,97 20,40 20,37 20,67 20,97 20,82 22,02 21,17 21,75 21,42 21,17 21,32 21,62 21,63 21,62 21,84 21,54 22,44 22,12 22,03 73 APÊNDICE C – AJUSTE DOS DADOS DO SISTN Com o objetivo de ajustar o conjunto de dados do SISTN para as diferenças em relação aos dados do FINBRA, foram usadas as séries mensais das receitas de cada imposto obtidas no SISTN, chamadas SISTN _ X I ,J ,K , onde X IPTU, ISS, ITBI , , ,5569, em cada mês para cada município e para o Distrito Federal I 1 J 1 , ,12 para cada ano K 2006,,2014. O primeiro passo do ajuste foi calcular um fator médio individual, representando a participação das receitas de cada mês, no total das receitas do ano. Por exemplo, o fator médio individual do imposto X em Janeiro, para o município I, é dado por: 2014 SISTN _ X Fator _ X I ,Jan K 2006 2014 12 I ,Jan ,K SISTN _ XI,J ,K (B.1) K 2006 J 1 O fator médio individual foi calculado para cada município, em cada mês, usando apenas os municípios para os quais havia informação para todos os 12 meses de um determinado ano. Também foi calculada um fator médio agregado para todos os municípios, que foi usado para distribuir os dados daqueles municípios para os quais havia dados no FINBRA, mas não havia dados mensais suficientes para calcular os fatores mensais individuais dos respectivos municípios. Então, por exemplo, o fator médio agregado para o mês de Janeiro é dado por: 5569 Fator _ X Avg ,Jan 2014 SISTN _ X I 1 K 2006 5569 2014 12 I ,Jan ,K SISTN _ XI,J ,K (B.2) I 1 K 2006 J 1 Analogamente, foi então calculado esse fator médio agregado da arrecadação de impostos para cada mês. Para as observações dos municípios para os quais há 74 dados disponíveis tanto no SISTN quanto no FINBRA, obtém-se uma receita do imposto ajustada, X I ,J ,K , distribuindo a diferença entre o dado anual do FINBRA FINBRA _ X I ,K e os dados do SISTN acumulados em doze meses 12 SISTN _ XI ,J ,K . Para os municípios cujos fatores médios mensais foram J 1 calculados, a receita ajustada é dada por: XI ,J ,K SISTN _ XI ,J ,K 12 Fator _ XI ,J FINBRA _ XI ,K SISTN _ XI ,J ,K J 1 (B.3) Nos casos em que, para um dado ano, não há informações do SISTN, para um determinado município, mas há dados do FINBRA, se foi possível computar um fator médio individual para o referido município, a observação anual do FINBRA é distribuída de acordo com os respectivos fatores: X I ,J ,K Fator _ X I ,J FINBRA _ X I ,K (B.4) No caso em que não foi possível calcular o fator médio individual para o município, foi usado o fator médio agregado para distribuir os dados do FINBRA: XI ,J ,K Fator _ X Avg ,J FINBRA_ XI ,K (B.5) Finalmente, no último caso, se as informações da arrecadação não estão disponíveis no FINBRA para um dado município, em um determinado ano, mas há dados no SISTN, estes são mantidos no conjunto dos dados ajustados. O hiato observado na Tabela 4 entre a linha com os dados do FINBRA e os valore ajustados para cada imposto é a consequência dessa manutenção dos dados do SISTN para os municípios com dados ausentes no FINBRA. Os fatores individuais e agregados também foram usados para construir uma extensão da série de dados trimestrais, incorporando informações entre os anos de 1999 e 2005. Para calcular uma aproximação mensal da arrecadação de impostos, 75 que posteriormente foi agregada em séries trimestrais, foram usados, para cada município, os dados anuais disponíveis no FINBRA, distribuídos ao longo do ano usando os fatores apropriados, de acordo com as equações (B.4) e (B.5). Portanto, para o período 1999-2005, a arrecadação tributária acumulada em doze meses obtida pela aproximação usando os fatores coincide exatamente com os dados fornecidos pelo FINBRA. Usando esse procedimento, obtém-se então séries mensais que vão de Janeiro/1995 a Dezembro/2014, para os três impostos municipais, que foram em seguida convertidas em séries trimestrais. Esse procedimento também foi utilizado para ajustar os dados das despesas com pessoal e encargos sociais dos estados e municípios, fornecidas em frequência bimestral no SISTN, com os dados anuais do FINBRA (para os municípios) e do Relatório de Execução Orçamentária dos Estados disponibilizado pelo Tesouro Nacional. A restrição do uso de dados bimestrais exigiu uma hipótese simplificadora adicional para construção das séries trimestrais. Assume-se que o valor das remunerações dos servidores públicos em bimestres que contém informações de meses pertencentes a diferentes trimestres (B2 = Março + Abril e B5 = Setembro + Outubro) é igualmente dividida entre os dois meses. Portanto, a informação para o segundo (quinto) bimestre foi dividida ao meio entre o primeiro (terceiro) e o segundo (quarto) trimestres. A figura abaixo ilustra o procedimento: T1 B1 Jan Fev T2 B2 Mar Abr T1 = B1 + 1/2 x B2 T3 B3 Mai Jun B4 Jul Ago T2 = 1/2 x B2 + B3 T4 B5 Set Out T3 = B4 + 1/2 x B5 76 B6 Nov Dez T4 = 1/2 x B5 + B6