Curso de Medicina Veterinária Revisão e Relato de Caso NEOPLASIAS DA VESÍCULA URINÁRIA EM CÃES URINARY BLADDER NEOPLASM IN DOGS 1 2 Vandelucia Lima de Freitas , Diogo Ramos Leal 1 Aluna do Curso de Medicina Veterinária 2 Professor Mestre do Curso de Medicina Veterinária Resumo O carcinoma de células de transição é uma patologia neoplásica maligna que acomete o epitélio de revestimento da vesícula urina, ocorre com maior frequência em animais idosos em fêmeas, apesar da baixa incidência tem grande importância na clínica de pequenos devido às dificuldades no sucesso de tratamento, ao prognóstico reservado e ao curto tempo de sobrevida dos animais acometidos. Os principais sinais clínicos são hematúria, poliúria, incontinência urinária que pode evoluir para obstrução das vias urinárias levando a um quadro de hidronefrose e outras complicações sistêmicas. O diagnóstico é baseado nos sinais clínicos, exames de imagem, citológico ou histológico. As formas de tratamento dependem do quadro clínico e estágio da doença. O objetivo deste trabalho foi realizar uma breve revisão bibliográfica das neoplasias de vesícula urinária de cães e relatar o caso de uma cadela atendida na Clínica Veterinária Pró Saúde em março de 2016. Palavras-Chave: neoplasia; vesícula urinária; carcinoma de células de transição; cães. Abstract The transitional cell carcinoma is a malignant neoplastic disease that affects the epithelium of the urinary bladder, it ussualy affects older animals and females, despite the low incidence is very important in small clinical due to difficulties in treatment success, the bad prognosis and short survival time of affected animals. The main clinical signs are haematuria , polyuria , urinary incontinence that can lead to obstruction of the urinary tract leading to hydronephrosis framework and other systemic complications. Diagnosis is made on clinical symptoms and the results of the imaging analysis, cytology or histology. Treatment depends on the clinical status and disease stage. The aim of this study was to brief literature review of the urinary bladder neoplasms in dogs and report the case of a bitch attended in Pro Health Veterinary Clinic in March, 2016. Keywords: neoplasm; urinary bladder; transitional cell carcinoma; dogs Contato: 1 – [email protected]; 2 - [email protected]. Introdução A profissão médico veterinária está em ascensão, principalmente no que diz respeito à área de atendimento clínico e cirúrgico de animais de companhia devido à crescente valorização do bem-estar dos animais. A relação cada vez mais próxima dos seres humanos e animais, estes, considerados por muitos proprietários como membros da família, contribui para o crescimento da importância da profissão. Atualmente, o câncer é a principal causa de óbito de cães. Provavelmente a alta prevalência das doenças malignas na espécie canina esteja correlacionada à maior longevidade desses animais. Isso se dá devido à prevenção de doenças infectocontagiosas realizada através dos esquemas vacinais, aos avanços tecnológicos, permitindo maior precisão diagnóstica e terapêutica, o ao fornecimento de dietas e rações balanceadas, que contribuem com o aumento no tempo de vida desses animais. (TRISTÃO et al., 2013). A procura por atendimento médico veterinário tem variadas causas e dentre elas estão as neoplasias de vesícula urinária. A vesícula urinária é o local mais comum do trato urinário canino para neoplasias, no entanto menos de 1% de todos os tumores em cães ocorrem nesse órgão. (MORRIS & DOBSON, 2007). Os tumores de vesícula urinária compreendem cerca de 1 a 2% das neoplasias malignas em cães, dentre os quais carcinoma de células de transição (CCT) são os mais frequentes (NISHIYA, 2009; GIEG et al., 2008). Segundo Moraillon et al., (2013), os tumores de vesícula são mais frequentes que tumores renais no cão, e raros em gatos, quase sempre são da linhagem epitelial (carcinomas), raramente sarcomas, o mais frequente é o carcinoma de células transicionais (CCT). Fêmeas idosas são acometidas duas vezes mais (MORRIS & DOBSON, 2007; INKELMANN et al., 2011). Algumas raças têm especial predisposição a este tipo de câncer, principalmente Scottish terrier, Colley, Shetland, Beagle e outros terriers. Carcinoma de células escamosas e adenocarcinomas podem surgir em decorrência de metaplasia do epitélio da vesícula urinária, mas são muito menos comuns (MORRIS & DOBSON, 2007; MACPHAIL, 2014). Os tumores epiteliais podem ser solitários ou múltiplos, com crescimento papilares ou não papilares, infiltrativos ou não. Tumores mesenquimais de bexiga são principalmente derivados de tecido fibroso ou musculo liso, incluem, leiomioma, hemangioma e fibroma, são localmente invasivos e menos prováveis de sofrerem metástases (MORRIS & DOBSON, 2007). O objetivo desse trabalho é fazer uma breve revisão bibliográfica das patologias neoplásicas que acometem a vesícula urinária de cães, com ênfase no tumor de células transicionais e relatar o caso de tumor de células transicionais em cadela idosa que foi submetida a tratamento cirúrgico e medicamentoso evidenciando a importância das neoplasias que acometem a vesícula urinária de cães. A Vesícula Urinária A vesícula urinária é um órgão oco, formado por musculatura lisa, conhecida como músculo detrusor. O revestimento epitelial celular da vesícula urinária acomoda-se para alterações de tamanho, e é conhecido como epitélio transicional (REECE, 2015), que se distende com entrada de urina, a parede contém feixes de músculos liso posicionados longitudinal, oblíqua e concentricamente (COLVILLE e BASSERT, 2010). O colo é a continuação caudal da vesícula urinária para a uretra, sua musculatura lisa esta misturada com uma considerável quantidade de tecido elástico e funciona como um esfíncter interno (REECE, 2015). Histologicamente a vesícula urinária é um ureter expandido recoberto por epitélio transicional pseudoestratificado, com 3 a 14 células de espessura, dependendo da espécie e do grau de distensão. A parede é composta de camadas musculares longitudinais externas e internas e uma camada muscular circular central proeminente e, externamente serosa (ZACHARY & McGAVIN, 2013). A vesícula urinária está dividida no trígono, que a conecta à uretra e ao corpo e recebe suprimento sanguíneo das artérias vesicais cranial e caudal. A inervação simpática provém dos nervos hipogástricos, enquanto a inervação parassimpática se dá via nervo pélvico. (MACPHAIL, 2014). O esvaziamento da vesícula urinária consiste na micção, e se dá devido aos reflexos nos centros de controle na medula espinhal sacral e tronco encefálico. Os receptores na parede da vesícula urinária são estirados durante o seu preenchimento com urina. O centro reflexo do tronco encefálico, evita a contração da vesícula urinária e o relaxamento do esfíncter externo. O preenchimento normal realiza-se e o córtex cerebral é excitado quando a vesícula urinária esta suficiente preenchida. O esvaziamento completo é garantido por outro reflexo tronco encefálico ativados pelos receptores de fluxo na uretra. (REECE, 2015). Neoplasias da Vesícula Urinária Carcinoma de células transicionais são tumores malignos que surgem de um tipo de célula transicional do epitélio estratificado e que, normalmente, acomete a vesícula urinária (MACPHAIL, 2014). O carcinoma de células de transição (CCT) é geralmente invasivo, localmente infiltrante na parede da vesícula, se estende em tecidos adjacentes e órgãos regionais como gordura pélvica, próstata ou útero, vagina ou reto. Disseminação peritoneal, metástase em linfonodos ilíacos internos e sublombares, pulmão, fígado, baço e ossos pélvicos. O CTT é geralmente papilar, protraindo-se dentro do lúmen, de base ampla, embora placa espessa infiltrante ou nódulo ulcerado possam ocorrer (MORRIS & DOBSON, 2007). A exposição prévia a alguns produtos herbicidas utilizados em jardinagem á base de ciclofosfamida aumenta o risco de carcinoma de células de transição (GIEG et al., 2008). O tempo de contato prolongado entre os químicos carcinogênicos na urina armazenada na vesícula urinaria e as células uroepiteliais é a provável causa da neoplasia (MORRIS & DOBSON, 2007; MACPHAIL, 2014). Os rabdomiossarcomas são tumores malignos originados da musculatura estriada esquelética e são classificados em quatro categorias de acordo com as características histológicas: embrionária, botrióide, alveolar e pleomórfica. Ocorre mais frequentemente na vesícula urinaria de raças de grande porte com menos de dois anos de idade (NISHIYA, 2009). Segundo Morris e Dobson (2007), é um tumor mioblástico, raro, que às vezes, ocorre na parede da vesícula urinária, cresce na região do trígono, com frequência multilobulado e pode ocluir os orifícios uretéricos, tem tendência para recidiva local após cirurgia e metástases distantes. Outros tumores malignos da vesícula urinária incluem carcinoma de células escamosas, adenocarcinomas, fibrossarcomas, leiomios- sarcoma, neurofibrossarcoma, hemangiossarcoma. Os fibromas, leiomiomas, hemangiomas, rabdomiomas, mixomas e neurofibromas são tumores vesicais benignos (MACPHAIL, 2014). Sinais Clínicos e Diagnóstico Os sinais aparentes das neoplasias de vesícula urinária são geralmente hematúria micro e macroscópica, disúria, polaciúria, incontinência urinária ou obstrução e retenção de urina (MORAILLON et al., 2013). Segundo Gieg et al. (2008), os animais podem não revelar qualquer sinal clinico no estágio inicial da doença ou pode, ainda, haver obstrução de uretra ou ureter resultando em uremia, devido cerca de dois terços dos tumores da vesícula urinária envolverem a região do trígono vesical. MacPhail, (2014) descreve que pode ocorrer incontinência devido a obstrução parcial, poliúria, polidipsia, dispnéia, dor, fraqueza e claudicação que pode ocorrer devido a metástases ósseas ou osteopatia hipertrófica. Os achados mais comuns nos exames físicos incluem massa abdominal caudal ou uretral, prostatomegalia, distensão vesical, dor, fraqueza e linfoadenopatia. Suspeita-se de neoplasia de vesícula urinária em cães mais velhos que apresentam hematúria ou ITU (infecção do trato urinário) crônica ou recidivante. Durante o exame físico, caso seja grande, o tumor de vesícula urinária pode ser palpado. O exame retal é imprescindível em todos os cães com sintomas de doença do trato urinário, pois a infiltração do tecido tumoral na uretra pode ser palpável (GIEG et al., 2008). As massas uretrais em fêmeas devem ser palpadas retalmente ou por exame digital da vagina (MACPHAIL, 2014). Em aproximadamente um terço dos casos há presença de células tumorais no exame de sedimento de urina após centrifugação (sedimentoscopia). Segundo MacPhail (2014), há a possibilidade de confundir células neoplásicas e displásicas, células transicionais atípicas são comuns em animais com cistite. O diagnóstico pode ser concluído através de ultrassonografia e visualização dos tumores vesicais, frequentemente situados nas proximidades do trígono vesical (MORAILLON et al., 2013). Segundo Morris e Dobson (2007), a urinálise completa e o exame citológico servem para distinguir entre cistite e neoplasia pois a presença de células tumorais pleomórficas no exame citológico diferencia as duas condições. Segundo Tristão et al., (2013), o exame citológico pode ser útil, contudo, o diagnóstico definitivo requer biópsia, tanto para estabelecimento do tipo de neoplasia como para o diferencial nos casos de pseudotumores vesicais. Outros métodos diagnósticos incluem a cistoscopia, biopsia por cistoscopia ou por via cirúrgica. As punções ecoguiadas são desaconselháveis, pois podem favorecer migração das células tumorais (MORAILLON et al 2013; MACPHAIL, 2014). Gieg et al., (2008) afirma que a biopsia realizada através da laparotomia é a melhor opção caso acredite-se que seja possível a ressecção ou o desbaste da massa tumoral. Em trabalho realizado no período de outubro de 2002 a março de 2004, Froes et al., (2007) avaliou nove cães com sinais sugestivos de CCT e demonstrou a eficácia da ultrassonografia como primeira técnica de diagnóstico por imagem indicada para pacientes que apresentam hematúria e disúria. Tratamento Segundo Gieg et al., (2008) o prognóstico a longo prazo é desfavorável para a maioria dos animais. A excisão cirúrgica é o tratamento de escolha para tumores benignos e malignos não extensivos que não envolvem o trígono vesical. Macphail (2014) descreve que em caso de cistectomia parcial os ureteres podem ser implantados no ápice da vesícula urinária, mas pode ocorrer incontinência urinária quando o trígono for removido. E de modo similar a implantação de ureteres em local distante como o cólon após cistectomia completa causa pielonefrite ou incontinência. O tratamento cirúrgico é geralmente paliativo devido ao comprometimento do trígono vesical e uretra e a exérese cirúrgica completa é frequentemente impedida pelo fato do CCT ser infiltrativo em cães (ROSSETTO et al., 2009; MORRIS & DOBSON, 2007). Segundo MacPhail (2014), os tumores uretrais que envolvem o comprimento total da uretra ou o trígono vesical geralmente não são operáveis. O uso do piroxican, antiinflamatório não esteroidal, no tratamento medicamentoso como coadjuvante aos quimioterápicos, tem efeito antineoplásico ou preventivo da neoplasia e é usado em alguns protocolos. Tal uso baseia-se em relatos de sua atividade para tratar ou suprimir algumas neoplasias incluindo o carcinoma de células de transição, o carcinoma espinocelular e o adenocarcinoma mamário. A dose recomendada é de 0,3 mg/kg/dia por via oral (PAPICH, 2012). Hanson e Maddison (2010), relataram que aproximadamente 20% dos casos em cães podem alcançar remissão completa ou parcial com a terapia com piroxican. O mecanismo exato da atividade antitumoral do piroxican é desconhecido, no entanto, acreditase que a inibição da ciclo-oxigenase (COX 2), que, é altamente expressada em células do CCT ocorra com a ação de fármacos antiimflamatórios não esteroidais (MACPHAIL, 2014). ® A associação com misoprostol (Cytotec ) 12mg/kg/dia por via oral dividido em duas doses, que é um análogo sintético da prostaglandina, é eficaz na redução da probabilidade de ocorrência de ulceração gástrica (MORAILLON et al., 2013; HANSON e MADDISON, 2010). O piroxican também pode ser utilizado em associação com antineoplásicos como a mitoxantrona e a carboplatina (RAPOSO et al., 2014; ALLSATD et al., 2015). Papich, (2012), descreve que devido aos efeitos colaterais da droga em cães, deve-se considerar um intervalo de administração a cada 48 horas. Os efeitos colaterais são principalmente toxicidade gástrica, úlceras e também toxicidade renal, especialmente em animais propensos à desidratação ou com função renal comprometida. Gieg et al. (2008) descreve que o carcinoma de células de transição não responde bem à maioria dos quimioterápicos. Pesquisas estão sendo desenvolvidas com aplicação intravesical de quimioterápicos (RAPOSO et al., 2014) e outros agentes Segundo Andrade et al., (2004) o uso de braquiterapia como tratamento coadjuvante à ressecção cirúrgica em cadela com diagnóstico de CCT se mostrou efetivo no manejo da enfermidade. O prognóstico para animais diagnosticados com CCT é reservado, a média de sobrevida relatada não é superior a um ano, independentemente da modalidade de tratamento. A quimioterapia pode permitir uma sobrevida por períodos significativamente mais longos do que aqueles submetidos à cirurgia (MACPHAIL, 2014). Rossetto et al., (2009) descreveu tratamento cirúrgico de exérese radical de tumor de células de transição em cadela idosa, sem tratamento coadjuvante, o animal viveu por mais de dois anos. Valsecchi et al., (2005) também relatou tratamento semelhante em cão macho idoso que teve sobrevida após tratamento cirúrgico de mais de 1,6 anos. Em trabalho realizado por Knapp et al., (1994), em 56 animais com diagnostico de CCT a terapia com uso do piroxicam foi eficaz e teve uma taxa de redução de 17,6%, e mesmo os animais que não responderam à medicação tiveram melhora na qualidade de vida e comportamento mais alertam de acordo com os autores. Relato de caso No dia 02 de março de 2016 foi atendida na Clínica Veterinária Pró Saúde uma cadela da raça poodle, 14 anos, peso corporal 3,7 Kg, não castrada. A queixa principal era hematúria, apatia, perda de peso. A cadela tinha histórico de tumor mamário e mastectomia lateral direita, com laudo histológico de adenocarcinoma e cardiopatia não tratada. Ao exame clìnico o animal apresentava estado de caquexia evidente, temperatura retal sem alteração, e sopro cardíaco à auscultação. Foram realizados exames sanguíneos, hemograma e bioquímicos que revelaram uma leucocitose de 20.400/mm³, sem alterações nos demais parâmetros sanguíneos e bioquímicos. Ao exame ultrassonográfico observou-se a vesícula urinária com repleção adequada, paredes espessas, irregular e conteúdo anecogênico. Foi descrita a presença de formação hiperplásica medindo cerca de 3,2 cm x 1,4 cm sugestivo de neoplasia vesical (Figura 1), demais órgãos abdominais sem alterações. Após os resultados dos exames laboratoriais e de imagem, foi indicada a celiotomia exploratória e cistotomia para avaliação da vesícula urinária. Figura 1 – Imagem ultrassonográfica da vesícula urinária da cadela atendida na Clínica Veterinária Pró Saúde, demonstrando espessamento parietal irregular com aspecto de massa exofílica (Fonte: Laudo Ultrassonográfico cedido pelo médico veterinário Emanuel Fernandes). O procedimento foi realizado no dia 09/03/16. A indução anestésica foi feita com fentanil (2,0 µg/Kg), propofol (6 mg/kg) e em seguida manteve-se em plano anestésico com isoflurano inalatório. A incisão cirúrgica abdominal foi mediana infraumbilical. Ao explorar a cavidade, foram observados os ovários hiperplásicos e a presença de conteúdo líquido em corpo uterino, procedeu-se a ováriosalpingohisterectomia (OSH). Logo após a OSH a vesícula urinária foi exposta e isolada com compressas cirúrgicas. Realizada cistotomia e observação de massa em região de trígono vesical, com aspecto vegetante, exofílica, infiltrante na parede vesical (Figura 2). A neoformação foi resseccionada e desbastada, mas sem condições de cistectomia e excisão de margens de segurança, foi realizada lavagem com solução fisiológica, cistorrafia e celiorrafia. A paciente apresentou recuperação anestésica satisfatória (Figura 3). O animal não apresentou melhora no quadro clínico, a proprietária optou por realizar eutanásia diante do quadro desfavorável do animal, o procedimento foi realizado no dia 1º de abril de 2016. Discussão Figura 2 – Exposição da mucosa durante a exploração da vesícula urinária. Observação de parte da formação resseccionada na ponta do tubo de sucção (Fonte: Arquivo pessoal). O presente trabalho descreveu a ocorrência de tumor de células transicionais em cadela, que apesar de ser incomum, com a ocorrência de 1% a 2% como relata Nyshia (2009), acomete principalmente animais idosos e de sexo feminino (MORRIS E DOBSON, 2007), conforme o presente relato. O protocolo usado no tratamento foi de acordo com alguns autores que referem ser paliativo devido à tumoração ter natureza maligna, comprometer o trígono vesical e geralmente recidivante. Decidiu-se pelo tratamento coadjuvante à cirurgia, com uso de antiinflamatório não esteroidal piroxican, que possui efeito antineoplásico de acordo com Hanson e Maddson (2010). Figura 3 – Imagem da paciente (Mel) logo após o procedimento cirúrgico e recuperação anestésica (Fonte: Arquivo Pessoal). O material foi acondicionado em recipiente com formol a 10% e enviado para análise histológica. Ao exame macroscópico foi observado fragmento de tecido epitelial neoplásico em arranjo papiliforme em permeio a focos de hemorragia. No exame histológico foi observado pleoformismo, anisocariose, núcleo evidente, relação núcleo citoplasma elevada e inúmeras figuras de mitose, muitas atípicas. Concluiu-se, portanto, carcinoma de células de transição. O animal recebeu alta médica no dia 10/03/16 às 16 horas e continuou o tratamento com uso de norfloxacina (22 mg/kg), amoxacilina com clavulanato (20 mg/kg), vitamina C (1 mL/dia) e condromax pet (1.200 mg/dia). Foi encaminhado à oncologista que prescreveu piroxican (0,3 mg/kg) a cada 48 horas. A paciente retornou no dia 30/03 apresentando quadro de vômito, desidratação, apatia e emagrecimento. Realizado exames sanguíneos, o hemograma apresentou normalização da leucocitose anterior (9.500/mm³) e bioquímico de creatinina de 8,10 mg/dL revelando um quadro de insuficiência renal. A cadela foi internada e recebeu tratamento medicamentoso, foram prescritos infusão venosa com solução fisiológica a 0,9% (500ml), bioxan (20 mL), glicose a 50% (10 mL), potássio 10% (15 mL) e plasil (30mg) solução infundida à 15 gotas/minuto. Ranitidina (1 mg/kg) via SC, sucralfilme (1,5 mL) por via oral, metronidazol (20 mg/kg) EV, ondansetrona (0,1mg/kg) EV. Apesar de muito utilizado, o anti-inflamatório provoca efeitos colaterais e alguns animais não respondem bem ao tratamento como foi o caso do animal relatado e afirmado por (PAPICH, 2012). O animal apresentou lesões renais e gástricas, após 20 dias do início de tratamento com piroxican, semelhante aos descritos por Knapp (1994). A revisão bibliográfica das doenças neoplásicas de vesícula urinária sugere que animais idosos, principalmente as fêmeas com quadro de hematúria, polaciúria e incontinência urinária devem ser examinados e submetidos à exames eficazes no diagnóstico de CCT. A escolha do protocolo de tratamento deve ser de acordo com o grau de comprometimento do órgão afetado e do estágio tumoral. Tratamentos conservadores se mostraram mais eficazes dando ao animal um prazo maior de vida. O prognóstico da doença é em geral desfavorável. Conclusão A grande incidência das patologias neoplásicas em cães se dá devido à longevidade dos animais, que é alcançada por mérito do avanço das práticas de medicina veterinária na área de assistência aos animais de companhia. Animais com queixas de distúrbios do sistema urinário e relatos de hematúria, polaciúria devem ser examinados com maior atenção, pois o tratamento é mais eficaz quando o CCT é diagnosticado precocemente. O protocolo de tratamento é diverso e deve ser realizado levando-se em consideração o estágio da doença, as condições gerais do paciente e a experiência do cirurgião. O prognóstico é reservado e o tempo de sobrevida geralmente é curto. No caso relatado o animal não respondeu ao tratamento coadjuvante com antiinflamatório, apresentou disfunção renal e gástrica aguda e foi submetida à eutanásia. De acordo com a literatura revisada, a complexidade do histórico dessa patologia e o pouco tempo que o animal consegue sobreviver, na maioria dos casos relatados, os melhores resultados foram observados nos animais submetidos ao tratamento conservador com o uso de antineoplásicos e quimioterápicos. É importante destacar a importância de uma minuciosa avaliação do paciente, levando em consideração a particularidade de cada caso e a escolha do melhor protocolo de tratamento. O exame histopatológico deve ser realizado antes de qualquer intervenção cirúrgica para remoção do tumor. Agradecimentos: Agradeço à Deus por estar presente em minha vida e me fortalecer em todos os momentos À minha família por me apoiar Ao Mestre Diogo por me orientar de forma extraordinária e única. À Clínica Veterinária Pró Saúde e aos veterinários Dr. Emanuel Fernandes e Dr. Luíz Fernando. Ao corpo docente do curso de Medicina Veterinária das Faculdades Icesp Promove de Aguas Claras. Sou grata à vida por me proporcionar viver esse momento realizado. Referências 1. Allstadt SD , Rodriguez CO Jr , Boostrom B , Rebhun RB , Skorupski KA . Randomized phase III trial of piroxicam in combination with mitoxantrone or carboplatin for first-line treatment of urogenital tract transitional cell carcinoma in dogs. J Vet Intern Med; 2015, 29: (1):261–267. 2. Andrade AI, Laranjeira MG, Eugênio FR, Bastos R, Lins BT, Ciarlini IRP. Tratamento de carcinoma de células transicionais em cão tratado por cistectomia parcial associada com betaterapia com estrôncio-90. Bras. J. Vet. anim. Sci. 2004;41(supl):141 3. Broom DM, Molento CFM. Bem Estar Animal: Conceito e questões relacionadas. Archives of Veterinary Science. 2004;9(2):1-11. 4. Colville T, Bassert JM. 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