Correlação Anatomoclínica

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Arq Bras Cardiol
volume 74, (nº 6), 2000
Correlação
anatomoclínica
Correlação
Anatomoclínica
Correlação Anatomoclínica
Caso 3/2000 - Insuficiência cardíaca direita em homem de 37 anos, por tador de lúpus
eritematoso sistêmico - (Instituto do Coração do Hospital das Clínicas - FMUSP - São Paulo)
Paciente do sexo masculino, com 37 anos, procurou
atendimento médico por dispnéia mesmo no repouso e
edema de membros inferiores e febre.
Há cinco anos, após período de febre e artralgias, foi
feito o diagnóstico de lúpus eritematoso sistêmico e desde
então fazia uso, em formulação especial, de 100mg de cloroquina, 6mg de deflazocort, 130mg de benzobromarona, 30mg
de indometacina, 35mg de furosemida e 20mg de famotidina.
Há dois anos apareceu dispnéia aos esforços, inicialmente aos grandes, depois aos médios e, há um ano, edema
de membros inferiores e tosse seca noturna, não acompanhada de dispnéia de decúbito. Fazia uso, desde essa época, de 0,25mg de digoxina, 40mg furosemida, 5mg de enalapril e 200mg de teofilina.
O exame físico (16/4/97) revelou pulso de 80bpm, pressão arterial 170x130mmHg em membro superior direito e
180x120mmHg em membro inferior direito; o exame dos pulmões foi normal, o exame do coração revelou hiperfonese de
segunda bulha em área pulmonar, o fígado foi palpado a 2cm
do rebordo costal direito e edema +/4+ em membros inferiores. Os exames laboratoriais são apresentados na tabela I.
O eletrocardiograma (24/4/97) revelou ritmo sinusal,
freqüência de 87bpm, amplitude de onda P de 0,3mV, SÂP
+80º para frente, SÂQRS +120º para trás, sobrecarga atrial e
ventricular direitas (fig. 1).
O ecocardiograma (24/4/97) revelou espessura aumentada de septo interventricular e parede posterior do ventrículo esquerdo, diâmetros de ventrículo esquerdo normais,
fração de ejeção de ventrículo esquerdo normal, sem alteração segmentar de contratilidade. O diâmetro da aorta foi de
35mm e do átrio esquerdo 36mm e o ventrículo direito estava
dilatado e hipocinético com pressão sistólica avaliada por
Doppler em 110mmHg. Havia insuficiência mitral discreta e
tricúspide moderada e discreto derrame pericárdico.
Alguns dias depois (7/5/97) procurou atendimento
médico por piora do edema. O exame físico revelou pulso de
78bpm, pressão arterial 140x100mmHg, o exame dos pulmões foi normal, o exame do coração revelou hiperfonese de
segunda bulha em área pulmonar, não havia alteração no
abdome e edema +++/4+ em membros inferiores. Foi aumentada a dose de furosemida para 160mg/dia.
Em 9/5/97 procurou novo atendimento por agrava-
Editor: Alfredo José Mansur
Editores Associados: Desiderio Favarato e Vera Demarchi Aiello
mento da dispnéia e aparecimento de tosse e febre (37,8ºC).
O exame físico (9/5/97) revelou paciente em regular estado
geral, freqüência de pulso de 108bpm, pressão arterial inaudível. O exame dos pulmões foi normal, o exame do coração
não demonstrou anormalidades, havia ascite e edema ++++/
4+ em membros inferiores. Os exames laboratoriais encontram-se na tabela I.
O eletrocardiograma (9/5/97) demonstrou alterações
semelhantes ao eletrocardiograma de abril/97, exceto por redução generalizada de voltagem das ondas (fig. 2).
A radiografia de tórax revelou hipotransparência de
bordas irregulares em base direita, compatível com processo
pneumônico alveolar.
Com o uso de dobutamina, a pressão arterial ficou
“pinçada” em 106mmHg.
Foi feito o diagnóstico de choque misto: cardiogênico
e séptico, com foco de origem pulmonar e iniciado o uso de
2g de ceftriaxone e 1g de vancomicina diários. Além de dobutamina, nitroprussiato de sódio e 40mg de furosemida endovenosos.
O paciente continuou em choque e apresentou parada
cardiorrespiratória em assistolia e faleceu na manhã do dia
seguinte (10/5/97).
Discussão
Aspectos clínicos - Trata-se de homem jovem, com
diagnóstico confirmado de lúpus eritematoso sistêmico há
cerca de cinco anos. Apesar do relato de febre e artralgias na
época do diagnóstico, não temos dados de sorologias naquela ocasião, mas, objetivamente, com evidências de comprometimento renal, pericárdico e articular, o que preencheria
três dos critérios da American Rheumatism Association, utilizados para a classificação do lúpus eritematoso sistêmico 1.
É importante salientar que a presença de quatro ou mais dos
onze critérios descritos não é necessário para o diagnóstico
da doença. Outrossim, os critérios têm sido propostos para
a classificação e inclusão em estudos clínicos.
A história de dois anos de dispnéia progressiva associada a edema de membros inferiores, sem ortopnéia e com
pulmões livres de ruídos adventícios à ausculta, sugerem a
presença de insuficiência cardíaca direita. A presença de hiperfonese de B2, sem terceira bulha e os sinais de hipertensão pulmonar e sobrecarga de ventrículo direito observados ao ecocardiograma e eletrocardiograma denotam hipertensão pulmonar e cor pulmonale como complicações da
doença sistêmica apresentada pelo paciente.
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Fig. 1 - Eletrocardiograma - Sobrecarga de câmaras direitas.
Fig. 2 - Eletrocardiograma - Sobrecarga de câmaras direitas e redução generalizada de
voltagem das ondas.
Tabela I - Exames laboratoriais
23/4/1997
Hemoglobina (g/dL)
17,5
Hematócrito (%)
53
VCM µm³
90
CHCM g/dL
33
Leucócitos/mm³
8.800
Metamielócitos (%)
0
Bastões (%)
9
Segmentados (%)
77
Linfócitos (%)
9
Monócitos (%)
5
Plaquetas/mm³
218.000
Tempo de protrombina (s)
12,4 (11,4)
INR
1,2
TTPA (s)
28,2 (27)
Glicose (mg/dL)
105
Uréia (mg/dL)
56
Creatinina (mg/dL)
1,4
Colesterol (mg/dL)
216
Triglicérides (mg/dL)
116
Sódio (mEq/L)
136
Potássio (mEq/L)
3,8
Cálcio (mEq/L)
4,5
Magnésio (mEq/L)
1,4
Fósforo mg/dL
4,1
ALT (U/L)
12
AST (U/L)
15
Amilase (U/L)
71
Fosfatase alcalina (U/L)
295
Ácido úrico (mg/dL)
8,1
Mucoproteínas
6,2
(em % tirosina) (mg/dL)
Proteínas totais (g/dL)
6
Albumina (g/dL)
3
Alfa-1 globulina (g/dL)
0,3
Alfa 2 globulina (g/dL)
0,8
Beta globulina (g/dL)
0,8
Gama globulina (g/dL)
1,1
Protoparasitológico de fezes Negativo
Urinálise
Densidade
1021
PH
6,0
Proteínas g/L
3,68
Leucócitos/mL
46.000
Eritrócitos/mL
15.000
Cilindros hialinos/mL
7.480
Cilindros granulosos finos/mL 220
9/5/97
10/5/97
17,5
54
90
32
8.000
0
48
47
4
1
171.000
17
52
90
33
6.400
3
37
48
8
4
122.000
16,7 (12,2)
1,95
33,8 (28)
102
91
2,9
84
2,4
134
3,5
A hipertensão pulmonar não é das complicações mais
freqüentes no lúpus eritematoso sistêmico. Séries mais recentes têm demonstrado aumento na incidência de hipertensão pulmonar, variando de 5 a 14% 2. Entre as doenças reu522
máticas, é mais freqüente na esclerodermia e na doença mista do tecido conjuntivo. Mesmo assumindo o diagnóstico
de lúpus eritematoso sistêmico, a presença de dados clínicos, como artrite erosiva (sugestiva de artrite reumatóide),
comprometimento de pele (esclerodermia), ou músculos
(polimiosite) e anticorpo anti-RNP, falariam mais a favor de
doença mista do tecido conjuntivo, como causa da hipertensão pulmonar. Embora a hipertensão pulmonar não seja
uma complicação freqüente como decorrência direta do
lúpus, acomete mais as mulheres jovens e, em geral, está associada ao fenômeno de Raynaud, aos anticorpos anti-ribonucleoproteínas, à nefrite e ao anticoagulante lúpico 3. A
pesquisa de anticoagulante lúpico e anticardiolipina é importante, pois ambos estão associados à síndrome do anticorpo antifosfolípide, uma das principais causas de hipertensão pulmonar no lúpus eritematoso sistêmico. Estes anticorpos podem interagir com os reagentes utilizados na determinação do tempo de tromboplastina ativada, aumentando-o falsamente apesar de diátese trombótica. Neste paciente, apesar da discreta alteração do tempo de tromboplastina
ativada, a dosagem dos anticorpos seria importante na avaliação. A despeito das considerações etiológicas da hipertensão pulmonar (se associada a fenômenos tromboembólicos, vasculite ou vasoconstrição generalizada) a sua apresentação clínica no lúpus eritematoso sistêmico é indistinguível da hipertensão pulmonar primária. Mais importante
ainda é a implicação prognóstica deste achado, que prediz
sobrevida média de dois anos após o seu diagnóstico 3.
A evolução deste paciente, com piora da dispnéia e do
edema, sugere progressão do cor pulmonale (o que é compatível com a história natural da doença). Além disso, foram
evidenciados hipertensão arterial sistêmica com hipertrofia
ventricular esquerda e derrame pericárdico. Na descompensação da insuficiência cardíaca não houve sinais clínicos de
tamponamento cardíaco, como pulso paradoxal ou hipofonese de bulhas. A redução de voltagem detectada no eletrocardiograma pode estar associada a edema, miocardiopatia
difusa ou tamponamento cardíaco; contra este último diagnóstico não foi observada alternância elétrica no eletrocardiograma.
As complicações cardíacas do lúpus eritematoso sistêmico são importantes causas de morbimortalidade, tanto na era
pré, como pós-corticosteróide 4. De fato, o paciente apresentou,
além de complicações de câmaras direitas, derrame pericárdico,
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que na avaliação ecocardiográfica de abril/97 era discreto. Na
evolução clínica não houve evidências de tamponamento
pericárdico, porém, como já mencionado, é possível que o derrame viesse aumentando no decorrer da doença. A pericardite
é a manifestação cardíaca mais comum no lúpus eritematoso
sistêmico. Pode se apresentar sintomática, com dor torácica,
febre, atrito pericárdico ou assintomática, apenas com derrame
pericárdico revelado por ecocardiograma ou comprometimento
pericárdico, em achado de necropsia. A depender dos critérios
utilizados nos estudos clínicos ecocardiográficos ou de autópsia, a pericardite em pacientes é encontrada de 40% a 100% dos
casos 5,6. Apesar de freqüente, a pericardite raramente tem significado clínico maior. Tamponamento cardíaco acontece em
menos de 1% dos casos 5 e, ocasionalmente, nos casos já tratados com corticosteróides, pode se complicar com pericardite
infecciosa.
Não observamos neste paciente comprometimento
valvar relacionado diretamente ao lúpus eritematoso sistêmico. A insuficiência tricúspide moderada parece estar associada à hipertensão pulmonar. O comprometimento de
válvulas esquerdas, evento descrito primeiramente por
Libman e Sacks, em 1927, pode levar a insuficiências mitral e
aórtica e, menos comumente, a estenoses valvares. Também conhecida como endocardite verrucosa, este tipo de
comprometimento era encontrado em até 50% dos casos de
autópsia na era pré-corticosteróide 7. Esse padrão de acometimento tem diminuído em freqüência e gravidade com o
advento da corticoterapia 8.
Observamos ainda no caso apresentado, hipertensão
arterial e hipertrofia ventricular esquerda. Muito embora a
hipertensão arterial sistêmica não pareça ter influenciado de
maneira importante evolução final da doença, é causa importante de morbimortalidade no lúpus eritematoso sistêmico. A
corticoterapia tem sido apontada como causa do aumento na
incidência de hipertensão arterial sistêmica, hipercolesterolemia e, possivelmente, doença arterial coronariana 7.
Como evento final do paciente, houve evidências de
infecção respiratória complicada com instabilidade hemodinâmica. Foi iniciado suporte hemodinâmico com drogas
vasoativas e antibioticoterapia. Embora não tenha sido
usada monitorização hemodinâmica invasiva, houve suspeita diagnóstica de choque misto. O paciente já apresentava limitação funcional acentuada devido à hipertensão arterial pulmonar. Embora a disfunção miocárdica adicional possa ocorrer como conseqüência de miocardite lúpica, isquemia miocárdica ou miocardiopatia da septicemia. A miocardite lúpica não é causa freqüente de insuficiência cardíaca
ou choque cardiogênico, sendo diagnosticada clinicamente em 10% dos casos 9. A isquemia miocárdica pode ser
conseqüência de aterosclerose ou comprometimento inflamatório das artérias coronárias. Não foram descritas alterações eletrocardiográficas ou enzimáticas que sugerissem
essa complicação nesse paciente, porém não seria surpresa
encontrarmos obstruções das coronárias à autópsia, ainda
que sem relação direta com a causa mortis.
Por último, é preciso lembrar que infecções, juntamente com as complicações cardiovasculares e renais, são a
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principal causa de óbito no lúpus eritematoso sistêmico.
Neste caso, a infecção respiratória teve papel primordial no
desenvolvimento de choque séptico refratário às medidas
tomadas e no óbito.
(Dr. Alessandro Alves Fagundes)
Hipóteses diagnósticas - Lúpus eritematoso sistêmico,
hipertensão pulmonar e, no evento final, choque séptico
secundário à infecção respiratória.
Necropsia
Na autópsia foram encontrados 250ml de derrame pericárdico e cerca de 1000ml de líquido ascítico, ambos de coloração amarelo-citrina. O pericárdio tinha espessura e aspecto normal. O coração pesou 500g, apresentando discreta hipertrofia de ventrículos direito e esquerdo e dilatação de
ventrículo direito (fig. 3). As valvas cardíacas não apresentavam alterações. Na análise histológica das coronárias,
notou-se discreto espessamento fibrointimal em terço proximal da artéria interventricular anterior.
D
E
Fig. 3 - Corte transversal do coração: observa-se dilatação e hipertrofia de ventrículo
direito. D- ventrículo direito; E- ventrículo esquerdo.
Fig. 4 - Fotomicroscopia do pulmão: observam-se intensa congestão e hipertrofia
vascular (setas) (hematoxilina-eosina, 4X).
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O pulmão direito pesou 350g e o esquerdo 300g. Ambos apresentaram ao exame histológico alterações vasculares compatíveis com hipertensão pulmonar grave, grau IV
de Heath-Edwards (figs. 4 e 5) e discreta hemorragia alveolar em bases.
Os rins estavam aumentados de volume e pesavam
250g cada. No exame histológico foram observadas glomerulonefrite membranosa difusa e nefrite intersticial. No rim
direito também foi encontrado um adenoma medular de 3mm
de diâmetro.
O baço encontrava-se discretamente aumentado, pesando 250g, e com espessamento fibroso da cápsula.
O fígado pesou 1850g e revelou congestão passiva
crônica.
Para a melhor avaliação do comprometimento pelo lúpus eritematoso sistêmico, foi feita a pesquisa de imunoglobulinas, fibrinogênio e complemento pela técnica de imunofluorescência em fragmentos de pele, pulmão, rim e coração.
Havia deposição de imunoglobulinas (IgM, IgG, IgA), complemento e fibrinogênio na parede de vasos pulmonares e
nos glomérulos renais. Nos rins também foram encontrados
depósitos de IgA nos túbulos e de fibrinogênio no interstício e na parede de vasos. O exame de imunofluorescência
foi negativo para todos esse marcadores, tanto no fragmento de pele como no de coração. Os achados da imunofluorescência confirmaram lúpus eritematoso em atividade comprometendo pulmões e rins. Morfologicamente, esse comprometimento caracterizou-se pela hipertensão pulmonar e
pela glomerulonefrite membranosa difusa, respectivamente.
Não foi encontrada na autópsia nenhuma alteração
sugestiva de processo infeccioso.
(Dra. Patrícia Maluf Cury)
Diagnósticos anatomopatológicos - Lúpus eritematoso sistêmico em atividade; hipertensão pulmonar grau IV
secundária ao lúpus; cor pulmonale; choque cardiogênico
(evento final).
Fig. 5 - Fotomicroscopia do pulmão: observa-se lesão plexiforme vascular, caracterizando a hipertensão pulmonar grau IV de Heath-Edwards (seta) (hematoxilinaeosina, 10X).
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Comentários
É rara a descompensação cardíaca secundária à hipertensão pulmonar por lúpus em pacientes do sexo masculino. O lúpus eritematoso sistêmico é doença auto-imune rara e muito mais freqüente em mulheres, numa proporção 9:1 em relação aos homens. A hipertensão pulmonar
secundária ao lúpus é evento mais raro ainda, ocorrendo
em cerca de 2% dos pacientes com a doença 10. A etiopatogenia da hipertensão pulmonar no lúpus é ainda muito discutida 4,11, mas parece não ter relação com a gravidade da
doença. Alguns dos mecanismos propostos são: 1) perda
de vasos pulmonares por doença intersticial; 2) afilamento
dos vasos por vasculite ou tromboembolismo; 3) vasoconstrição. O papel dos anticorpos antifosfolípides pode
ser importante, tanto por levarem ao estado de hipercoagulação e à trombose, como por diminuição da formação
da prostaciclina endotelial, ocasionando aumento da
vasorreatividade 4. Essas alterações vasculares também
podem ocorrer nas coronárias, principalmente tromboembolismos e espessamento fibroso intimal. Isso poderia
justificar o maior comprometimento coronariano em pacientes lúpicos, quando comparados a pacientes com o mesmo número de fatores de risco tradicionais para doença
coronariana 12. O comprometimento cardíaco no lúpus
eritematoso sistêmico pode ser generalizado, embora nem
sempre diagnosticado clinicamente 4. Além das coronárias,
o acometimento pode ser do pericárdio, miocárdio, endocárdio e das valvas cardíacas. A pericardite é o achado
mais freqüente, associada com derrame pericárdico, mas
nem sempre causando manifestações clínicas. O mesmo
foi observado com o eletrocardiograma, que apresenta
alterações em cerca de 50% dos pacientes lúpicos. A mais
freqüente é a taquicardia sinusal, seguida de alterações
não específicas no segmento ST-T. A endocardite lúpica,
não infecciosa, de Liebman-Sacks, era um achado muito
comum em autópsias de pacientes lúpicos na era pré-corticoterapia e mais rara nos dias de hoje. Em contrapartida, a
corticoterapia contribuiria para a aceleração da aterosclerose nesses pacientes, assim como a hipertensão secundária ao envolvimento renal.
Neste paciente foi encontrado pericardite com derrame pericárdico e discreta alteração em coronárias. O eletrocardiograma revelou apenas sobrecarga direita, secundária
ao comprometimento pulmonar. A aterosclerose encontrada
era leve, acometendo principalmente a porção abdominal da
aorta. Portanto, as alterações cardíacas observadas aqui
não podem ser atribuídas ao lúpus eritematoso sistêmico,
exclusivamente, ainda mais com o exame de imunofluorescência negativo no coração. A pericardite e o derrame pericárdico poderiam ser secundários à insuficiência cardíaca
direita, e as discretas alterações vasculares poderiam ser
próprias da idade.
(Dra. Patrícia Maluf Cury)
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