52 Defesa Profissional (*) Nelson Louzada e Gabriel Carvalho O velho problema sobre pagamento em dobro das O Nelson Louzada primeiro documento que destaca este assunto, datado de 1989, é conhecido como Resolução Associação Médica Brasileira (AMB) – Comissão Nacional de Honorários Médicos (CNHM) nº 017. Nele encontramos respaldo para a cobrança em dobro de Honorários Médicos nos procedimentos que não sejam realizados em ambulatório. Diante desta posição, a Oftalmologia baseou-se para cobrar os respectivos honorários, que lhe é de direito, apenas para procedimentos considerados de médio e alto grau de complexidade, ou seja, aqueles que tinham seus portes anestésicos iguais ou superiores a 4. Estas medidas foram consideradas Normas de Reprodução Obrigatória em todas as Edições de Tabelas de Honorários Médicos, emitidas pelo órgão competente para tal - AMB. Para isso, em todos os Tópicos “Instruções Gerais” de suas respectivas edições (AMB 90/92/96...) havia, de forma expressa, a obrigatoriedade do pagamento dos honorários em dobro, nas hipóteses já elencadas. Até a atual Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos (CBHPM) edição 2010, diz textualmente em seu artigo 1.5, Das Instruções Gerais, página 17: Esta classificação constitui referência para acomodações hospitalares coletivas (enfermaria ou quartos com dois ou mais leitos). Ao longo do tempo, algumas Operadoras de Plano de Saúde optaram, de forma deliberada, por não pagar mais em dobro. No receio de perderem seus convênios muitos médicos acabaram se submetendo a esta lamentável e unilateral decisão, o que viria a enfraquecer todo o direito já adquirido com tanta luta e esforço. Ao surgirem a Cooperativa Estadual de Serviços Administrativos em Oftalmologia do Rio de Janeiro (COOESO-RJ), em 2001 e a Federação das Cooperativas Estaduais de Serviços Administrativos em Oftalmologia (FeCOOESO), em 2006, deparamo-nos com tal cenário, porém de forma ainda mais crônica. A primeira decisão tomada foi tentar reaver, nos moldes de uma aproximação amigável, a negociação destes pagamentos. No início, entre 2002 e 2004, muitos Planos de Saúde dificultaram as diversas tentativas, porém, após algumas reuniões, estes Jornal Oftalmológico Jota Zero | Março/Abril 2012 acabavam acatando e entendendo que se tratava de uma reivindicação plausível, diante de normas legais que não haviam sido revogadas. Entretanto, outras insistiam em não pagar, o que acabou gerando, em 2008, a abertura de Procedimento Administrativo junto ao Ministério Público Federal (MPF). Este entendeu que o “ato de comunicar a todos os oftalmologistas e serviços oftalmológicos, que as cirurgias oftalmológicas não devem ser realizadas em consultório ou ambulatório é medida capaz de orientar a atuação destes profissionais, alertando sobre o risco de as cirurgias não serem realizadas em centro cirúrgico, ainda que de curta permanência”. Traduzindo a partir de uma nova ótica, qualquer problema que surja em um processo cirúrgico realizado fora do ambiente adequado, será de responsabilidade exclusiva do médico profissional, o qual tem o dever de saber, ser este ambiente incompatível, com a prática de determinados procedimentos cirúrgicos. Cumpre salientar que, o entendimento trazido pelo ilustríssimo membro do Ministério Público Federal, Procurador da República José Soares, tem validade e eficácia em toda território nacional. Instada pelo MPF a se pronunciar sobre o tema, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) foi clara em afirmar que fica a cargo do Ministério da Saúde, dos Conselhos Profissionais e das sociedades de classe ditar as diretrizes da política de assistência à saúde. Não obstante, a FeCOOESO enviou em 2010, carta nº 007 à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), requerendo reunião que tratasse da falha de iniciativa de algumas operadoras em emitirem pareceres e entendimentos, diante de assuntos que são de exclusividade de órgãos de representação da Especialidade Médica. Após recebida a carta, e posterior reunião com representantes do CBO, FeCOOESO e SBO, a ANS se pronunciou, mediante o Ofício nº 3030/2010, trazendo a conclusão de que “a expressão cirurgia ambulatorial é inadequada, porque ambulatorial é o paciente. O porte de um procedimento cirúrgico será o mesmo, independente se realizado em um paciente interno ou em um paciente ambulatorial”. ...”A indicação do Defesa Profissional 53 cirurgias oftalmológicas procedimento e o local para realização do mesmo e para a permanência do paciente, são de competência do médico assistente” Em 2011, algumas operadoras ainda insistiam em autorizar para as cirurgias oftalmológicas, guias em SADT (Serviços Auxiliares de Diagnóstico e Tratamento), como se as cirurgias oftalmológicas fossem exames complementares, não admitindo que estas fossem emitidas em Day Clinic (Hospital Dia) /Curta Permanência. Tentam, desta forma, descaracterizar o procedimento para não pagar em dobro para os pacientes com direito a quarto particular. A situação gerou uma nova insatisfação nas entidades oftalmológicas, que por sua vez, protocolaram mais uma carta na sede da ANS – Carta CBO/FeCOOESO/SBO nº 001/2011, pautando novamente este assunto. Prontamente, a ANS, por meio de seu Ofício 80/2011, respondeu que, “o fato deste procedimento ter cobertura pelos planos ambulatoriais, não significa que a Agência de Saúde Suplementar – ANS endossa sua realização fora de centro cirúrgico.” De forma implícita, resta claro que as citadas cirurgias de porte superior ou igual a 4 não podem ser realizadas fora de centro cirúrgico, seja ele Day Clinic ou Hospital Geral, e que por sua vez, de acordo com o entendimento da AMB, terão seus honorários em dobro, quando o paciente tiver o direito de ser acomodado em quarto particular ou apartamento. A Resolução CFM Nº 1.886/2008 que dispõe sobre as "Normas Mínimas para o Funcionamento de consultórios médicos e dos complexos cirúrgicos para procedimentos com internação de curta permanência” esclarece perfeitamente a questão. A Exposição de Motivos, emitida pelo Conselheiro Relator do CFM Rafael Dias Marques Nogueira, que faz parte desta Resolução, deixa clara a posição do CBO/ FeCOOESO/SBO, endossada pelo CFM. A Resolução CFM 1.642/2002 resolve no Art. 1º - As empresas de seguro-saúde, de medicina de grupo, cooperativas de trabalho médico, empresas de autogestão ou outras que atuem sob a forma de prestação direta ou intermediação dos serviços médico-hospitalares devem seguir os seguintes princípios em seu relacionamento com os médicos e usuários: a) respeitar a autonomia do médico e do paciente em relação à escolha de métodos diagnósticos e terapêuticos; b) admitir a adoção de diretrizes ou protocolos médicos somente quando estes forem elaborados pelas sociedades brasileiras de especialidades, em conjunto com a Associação Médica Brasileira; Fundamentada na supracitada resolução o CBO, a FeCOOESO e a SBO emitiram o Parecer sobre Cirurgias Oftalmológicas definindo suas normas. Por óbvio que este ofício deve ser realizado pela Sociedade Médica de Especialidade, não pela operadora de plano de saúde. Os argumentos utilizados pelas operadoras que ainda insistem em descaracterizar as cirurgias oftalmológicas são débeis e se baseiam em afirmativas pueris como a não necessidade de pernoite e que são de curta duração. Devemos esta compreensão errônea ao grande avanço tecnológico experimentado pela Oftalmologia. Insólito seria hierarquizar as cirurgias baseando-se no número de dias de internação, perda de sangue, necessidade de anestesia geral ou quantidade de pontos dados. Não existe espaço para o retrocesso! Diante disto, não compete a nenhuma operadora de plano de saúde, dispor do ato de “querer ou não” se adequar a estas normas. Devem apenas se inserir e adequar-se às diretrizes existentes que amparam não só os pacientes, como os médicos oftalmologistas e toda a classe médica. Gabriel Carvalho (*) Nelson Louzada Coordenador da Comissão de Honorários Médicos do CBO e presidente da FeCOOESO Gabriel Carvalho Auxiliar administrativo jurídico da FeCOOESO Jornal Oftalmológico Jota Zero | Março/Abril 2012