Uma doença lenta e insidiosa

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ROSAN A2
Uma doença lenta e insidiosa
Revista Pesquisa Médica - 20/08/07
Pesquisadores testam métodos de diagnóstico
precoce,
por
imagem,
e
procedimentos
cirúrgicos inovadores para combater a evolução
dos sintomas do Parkinson
Descrita há mais de 190 anos pelo médico
britânico James Parkinson, a doença que destrói
os neurônios dopaminérgicos, localizados na
substância negra do cérebro, e compromete o
circuito neuronal responsável pela atividade
motora contabiliza cerca de 400 mil casos,
apenas no Brasil. Só perde em incidência para o
Alzheimer,
no
grupo
das
doenças
neurodegenerativas
que
mais
afetam
os
brasileiros. O envelhecimento da população deve
acentuar esse quadro. O cenário é sombrio,
também, no resto do mundo e movimenta a
pesquisa de novas técnicas de diagnóstico e
tratamento. Não faltam recursos para a
investigação em países desenvolvidos como os
Estados Unidos, onde os cientistas se valem de procedimentos cirúrgicos de
"estimulação cerebral profunda" e testam drogas desenvolvidas para outras
doenças, como a pioglitasona, utilizada em diabetes. Pesquisadores brasileiros
participam das investigações, com novos métodos de diagnóstico por
neuroimagem que poderão antecipar o advento da doença em alguns anos. A
doença de Parkinson não é específi ca dos idosos. A idade média de início é 55
anos, mas pode aparecer antes dos 40 anos. Sem causa definida, é
considerada uma doença primária e idiopática. Entre os fatores de risco para o
seu desenvolvimento, são considerados, atualmente, a idade avançada, o sexo
masculino, que tem uma vez e meia mais risco do que o feminino de
desenvolver a doença e a história de familiares afetados, que aumenta o risco
em 2,3 a 3,7 vezes. A exposição a herbicidas, como o MPTP, e a substâncias
tóxicas, como o mercúrio e o manganês, podem induzir o parkinsonismo
secundário. O tabaco, grande vilão para o desenvolvimento de diversas
doenças, tem um efeito protetor, no caso da doença de Parkinson, pela
associação da ação da nicotina.
A doença se instala de forma lenta e insidiosa a partir da perda dos neurônios
dopaminérgicos da substância negra do cérebro. "Uma pessoa normal perde
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de 0,6% a 0,8% desses neurônios ao ano, normalmente, enquanto a que
apresenta a doença perde cerca de 13% ao ano", observa o Dr. Ming Chi,
radiologista e
médico nuclear da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). A redução nas
concentrações da dopamina e as alterações funcionais nos circuitos neuronais
decorrentes dela repercutem na atividade motora muito além do conhecido
tremor. Com o passar do tempo, o doente de Parkinson tem dificuldade para
andar, falar
e urinar, sofre perdas cognitivas e de autonomia, a exemplo da demência,
além de enfrentar doenças psiquiátricas, especialmente depressão.
Fatores genéticos conhecidos
O conhecimento da biologia molecular iluminou a
investigação de mutações que levariam à doença de
Parkinson. Estudos demonstram que 10% a 15%
dos pacientes têm parentes de primeiro ou segundo
grau afetados1. A primeira mutação genética
encontrada entre famílias italianas e gregas e
descrita em 1997 foi uma mutação dominante e
autossômica.
Isto significa que basta uma cópia do gene para o
desenvolvimento da doença. A mutação alterava a
No quadrante superior
codificação da proteína alfa-sinucleína. Trata-se de
esquerdo
uma pequena proteína, constituída por 140
a tatografia (Fiber
aminoácidos, que parece participar de funções
Tracking) aponta a
relação do eletrodo
sinápticas, incluindo a transmissão e a síntese da
com o alvo (núcleo
dopamina. Em 1998, foi descrita uma segunda
subtalâmico). As outras
mutação, encontrada principalmente entre indivíduos
imagens mostram a
mesma relação na
com menos de 40 anos. Tratava-se, na verdade, de
ressonância
diversas mutações em um mesmo gene codificador
magnética
da proteína denominada parkin, que faz a ligação
com a ubiquitina - a proteína que se une às
moléculas que serão degradadas. Metade dos casos de Parkinson em jovens
adultos, o parkinsonismo juvenil como é chamado, apresenta essas mutações.
Outras descobertas, feitas em 2002, apontam mutações nos genes
denominados DJ-1, com herança autossômica recessiva; no gene UCHL1,
relacionado com o Parkinson familiar; e nos genes PINK-1 e LRRK2, que
produzem alterações no metabolismo celular levando à morte neuronal na
substância negra.
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Os candidatos ao diagnóstico
Pacientes que apresentam tremores em repouso, bradicinesia, rigidez,
instabilidade postural e boa resposta ao L-dopa são fortes candidatos ao
diagnóstico da doença, que hoje é baseado, praticamente, no exame clínico.
Ele deve incluir anamnese, exame neurológico e verificação da resposta ao
tratamento
farmacológico. Exames de imagem de rotina são utilizados
principalmente para a exclusão de outras afecções. A ressonância magnética
pode ser útil para detectar degenerações e atrofias que acometem o sistema
nervoso central. Mas os pesquisadores vêm desenvolvendo métodos de
imagem mais sensíveis para a doença de Parkinson. É o caso dos
"radiotraçadores para neuroimagem de transportador de dopamina",
desenvolvidos pelo médico e pesquisador Dr. Ming Chi e seus colegas. As
pesquisas, inéditas no Brasil, estão em andamento no Instituto Israelita de
Ensino e Pesquisa (IIEP) vinculado ao Hospital Albert Einstein, e mais
recentemente na Unifesp.
O método de investigação, de acordo com o Dr. Ming Chi, é baseado na
utilização de um composto radioativo, denominado TRODAT-1, que se liga aos
transportadores de dopamina (TDA). Os radiotraçadores são derivados de
compostos que têm afinidade com o TDA, como a cocaína e o metilfenidato.
Eles possibilitam mensurar a quantidade desses transportadores em humanos
através da tomografia por emissão de pósitron único (single photon emission
computed tomography - SPECT) ou da tomografia por emissão de pósitrons
(positron emission tomography - PET).
O
transportador
dopaminérgico
modula
a
concentração sináptica de dopamina no cérebro. Na
doença de Parkinson, observa-se a redução na
densidade desses transportadores em razão da
perda dos terminais dopaminérgicos. A diminuição
da densidade de TDA ocorre antes mesmo do início
dos sintomas e é evidenciada pela queda de 40% a 60% na atividade
dopaminérgica, de captação de traçadores de TDA, quando do aparecimento
dos primeiros sintomas. Com a evolução da doença, os níveis de captação
diminuem em até 90%. Por esse motivo, a avaliação da concentração de TDA
tem se mostrado um parâmetro útil tanto no diagnóstico precoce da doença de
Parkinson quanto no diagnóstico diferencial, em relação a outras doenças. O
método ainda não está disponível para uso clínico. Apenas em alguns países,
como Taiwan, que é fabricante e fornecedor do TRODAT-1, ele vem sendo
aplicado na clínica. Nos Estados Unidos, o uso do TRODAT-1 espera aprovação
da Food and Drug Administration (FDA), a agência norte-americana que regula
o comércio de medicamentos e alimentos.
Medicamentos e tratamentos cirúrgicos
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O tratamento da doença de Parkinson envolve
drogas que mimetizam a ação da dopamina ou
estimulam a sua produção no cérebro ou inibem sua
decomposição.
A escolha dos medicamentos
depende das condições de cada paciente. A idade,
ossintomas predominantes e o estágio da doença
são alguns dos fatores que o médico deve levar em
conta na hora de escolher a terapia farmacológica.
Mas é usual a combinação da levodopa e da
carbidopa para controlar os sintomas do Parkinson.
Existem
outras
opções
de
tratamento
não
medicamentosas, como a cirurgia. Um tratamento cirúrgico utilizado
atualmente é a palidotomia, procedimento que produz lesão do globo pálido
interno, hiperativo na doença de Parkinson. A
Clique aqui para ampliar
palidotomia pode atenuar as discinesias e reduzir a intensidade dos
movimentos involuntários. De acordo com o Dr. Antonio Afonso de Salles,
neurocirurgião da Universidade da Califórnia (UCLA), em Los Angeles, o
tratamento cirúrgico mais moderno envolve a estimulação cerebral profunda,
ou deep brain stimulation (DBS). Um eletrodo é introduzido no cérebro através
de técnicas estereotáxicas, em localidades como o globo pálido e o núcleo
subtalâmico. Esse eletrodo é ligado a uma espécie de marca-passo que envia
estímulos elétricos, melhorando alguns sintomas da doença de Parkinson. "Ela
deve ser utilizada quando a medicação falha", diz ele. "A DBS pode retroceder
os sintomas da doença em 5 a 10 anos, em pacientes que apresentam
discinesias e vão ficando cada vez mais rígidos, ou experimentam alucinações
devido à ação da levodopa", diz o Dr. De Salles.
No laboratório da UCLA, o professor De Salles e seus colegas estão
pesquisando novas técnicas para a cura do Parkinson. Uma delas emprega a
"Estamos tentando curar a doença modificando as células na região da
substância negra com uma dose moderada de radiação", comenta o
pesquisador. Os resultados iniciais dessas pesquisas foram publicados no
Journal of Neurosurgery. Outro experimento da equipe da UCLA envolve a
utilização da droga pioglitasona, usada em diabetes. Testada em macacos, a
substância produziu um efeito antiinfl amatório, que protegeu os neurônios da
substância negra contra a oxidação.
Recentemente, pesquisadores do Weill Medical College, da Universidade de
Cornell em Nova York, promoveram melhoras na função motora, a exemplo
dos tremores, de 12 pacientes após submetê-los à terapia gênica. Para isso foi
adicionado ao núcleo subtalâmico o gene codifi cador do GAD (ácido glutâmico
descarboxilase), que aumenta as concentrações do neurotransmissor GABA,
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responsável por diminuir a atividade dos neurônios hiperativos presentes na
doença de Parkinson. O transporte do gene GAD foi realizado com a utilização
de vírus chamados adenoassociados.Os pesquisadores acreditam que a boa
resposta e tolerância à terapia gênica deve oferecer uma nova opção de
tratamento do Parkinson e de outras doenças neurodegenerativas.
A terapia com células-tronco é mais uma linha de pesquisa na qual
pesquisadores no mundo todo depositam esperanças para curar o Parkinson. O
propósito é implantar células-tronco embrionárias ou adultas no paciente e
guiá-las para que se diferenciem em neurônios dopaminérgicos na região da
substância negra. Trata-se da investigação mais popular no momento,
propagandeada em campanhas pelo ator Michael Jay Fox, que começou a
apresentar cedo os sintomas do Parkinson e hoje lidera uma das maiores
fundações financiadoras da pesquisa da cura da doença. Ainda há muitas
questões sem respostas para se chegar lá, mas os resultados das pesquisas
em desenvolvimento são encorajadores.
Referência
1. De Salles AA, Melega WP, Lacan G et al. Radiosurgery performed with the
aid of a 3-mm collimator in the subthalamic nucleus and substantia nigra of
the vervet monkey. J Neurosurg 2001; 95: 990-7.
http://www.revistapesquisamedica.com.br/PORTAL/textos.asp?codigo=10874
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