P032 40 Anestesia em criança com Long-Chain 3-HydroxyacylCoA Dehydrogenase Deficieny (LCHAD) D Leitão, G Durães, P Ramos Hospital S. João Resumo Introdução: A LCHAD é uma doença congénita rara, de transmissão autossómica recessiva, que resulta da deficiência da enzima 3-hydroxyacyl-CoA dehydrogenase existente na mitocôndria, responsável pela primeira etapa da β-oxidação dos ácidos gordos. Este defeito afecta o catabolismo dos ácidos gordos de cadeia longa, principal fonte de energia durante o jejum e situações de stress, conduzindo à utilização preferencial do glicogénio com consequentes crises de hipoglicemia e acumulação crónica de gorduras nos órgãos onde a β -oxidação é mais intensa (fígado, músculo, coração) provocando instalação progressiva de insuficiência hepática, cardíaca e hipotonia muscular1,2. Caso Clínico: Criança do sexo masculino, 12 anos, com diagnóstico de LCHAD desde os 4 anos de idade, com desenvolvimento psicomotor normal e clinicamente estável. Admitida no Serviço de Urgência, com o diagnóstico de isquemia do membro inferior por provável trombose da artéria femoral, proposto para tromboembolectomia. Do estudo pré-operatório, o ecocardiograma transtorácico revelou insuficiência ventricular esquerda moderada, com hipocinésia global e imagem suspeita de trombo na base do ventrículo esquerdo. Como antecedentes anestésicos, referência a provável alergia medicamentosa ao propofol. Durante o período de jejum, foi assegurado o aporte de glicose através de perfusão endovenosa de soro glicosado. Efectuou medicação pré-anestésica com midazolam. Para o per-operatório, foi calculada a fluidoterapia de manutenção e reposição das perdas, com administração de glicose a 5% em H2O e NaCl 0.9%. A indução anestésica foi realizada com O2, etomidato e fentanil. Introduzida máscara laringea nº 3, sem intercorrências. A anestesia foi mantida com O2, N 2 O e sevoflurano (fracção inspirada 1-1.5%). O procedimento cirúrgico durou cerca de 45 min, sem recuperação da ventilação espontânea. No intra-operatório, foi dada particular atenção à monitorização da glicemia (>100 mg/dl) e temperatura corporal. A recuperação da Revista SPA ‘ vol. 16 ‘ nº 1 ‘ Fevereiro 2007 ventilação espontânea ocorreu cerca de 30 min após término da cirurgia. No pós-operatório imediato, a criança foi admitida na Unidade de Cuidados Intermédios de Pediatria, onde permaneceu 2 dias, para vigilância cardio-respiratória e metabólica, monitorização dos níveis de glicose, controlo da hipocoagulação e manutenção da normotermia. Permaneceu internado durante 27 dias, tendo tido alta clinicamente estável após reavaliação das funções cardíaca, hepática e renal. Discussão: Dado o risco aumentado de coma hipoglicemico hipocetónico, deu-se particular atenção à monitorização da glicemia, temperatura corporal e acidose metabólica. O lactato de Ringer não foi utilizado, atendendo ao ácido láctico na sua composição. Evitou-se o uso de relaxantes musculares despolarizantes pelo risco de hipertermia maligna, fármacos de metabolização e/ou excreção hepática pelo risco de acumulação e fármacos com excipientes lipídicos. Os relaxantes musculares não despolarizantes não foram utilizados, uma vez que o procedimento cirúrgico não o exigia e por outro lado, pela imprevisibilidade da duração de acção destes fármacos neste contexto clínico. Optouse pela manutenção anestésica com agentes inalatórios, pois estão descritos como seguros3. Durante o pós-operatório imediato o doente manteve-se monitorizado, pelo elevado risco de agravamento da hipotonia muscular e consequente desenvolvimento de insuficiência respiratória. Apesar do controlo rigoroso do stress, dor e temperatura, é importante ter a consciência de que a deterioração clínica pode ocorrer devido ao processo inflamatório como resposta ao trauma, cirurgia ou infecção. Bibliografia: 1. Treem W. Hypoglycemia, hypotonia and cardiomyopathy: the envolving clinical picture of long chain acyl-CoA dehydrogenase deficiency. Pediatrics 1991(87); 328-333. 2. Murray G. Oxidation of Fatty Acids: Ketogenesis. Harper’s Biochemistry 23rd Ed 220-230. 3. Cohen B. Anesthesia and mitochondrial cytophaties. United Mitochondrial Disease Foundation, em http:/www.emdnmitonet.co.uk/.