Obtenção de Característica de Histerese de Transformadores de

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Anais do XIX Congresso Brasileiro de Automática, CBA 2012.
OBTENÇÃO DE CARACTERÍSTICA DE HISTERESE DE TRANSFORMADORES
DE CORRENTE PARA PROTEÇÃO
Tiago B Gomes∗, Cesar C Carvalho∗, Jose L S Neto∗, Marcelo M Werneck∗
∗
Departamento de Engenharia Elétrica, Escola Politécnica, Universidade Federal do Rio de Janeiro
Rio de Janeiro, Brasil
Emails: [email protected], [email protected],
[email protected], [email protected]
Abstract— The numerical modeling of Current Transformers (CT) is required to make simulations that helps
on the complex task of dimensioning the CT and its load. Such modeling is related to the hysteresis curve and
the core saturation. This paper presents an electronic circuit designed to obtain this curve and also results from
the simulation of CT in adverse conditions.
Keywords—
Current Transformer, Hysteresis, Saturation
Resumo— A modelagem numérica de Transformadores de Corrente (TC) é importante para efetuar simulações
que ajudam na complexa tarefa de seu dimensionamento e de suas cargas. Tal modelagem baseia-se na curva
de histerese e saturação do núcleo. Este artigo apresenta um circuito eletrônico projetado para obtenção de tal
curva e resultados obtidos após efetuar simulações com o TC em condições adversas.
Palavras-chave—
1
Transformador de Corrente, Histerese, Saturação
Introdução
O dimensionamento de Transformadores de Corrente (TC) para proteção apresenta pontos crı́ticos quando leva-se em conta o aparecimento de
um nı́vel médio devido às correntes de faltas assimétricas que causam um aumento no fluxo de
até (1 + X
R ) vezes, onde X e R referem-se a reatância e resistência até o ponto onde ocorreu a
falta (IEEE Guide for the Application of Current
Transformers Used for Protective Relaying Purposes, 1996). Outro fator a ser considerado é a possibilidade de existência de magnetismo residual no
núcleo, causado pela própria atuação da proteção.
A dissipação de tal fluxo remanescente ocorre de
forma lenta enquanto o TC está em operação e,
desta forma, há um aumento na probabilidade de
saturação do núcleo e aparecimento de correntes
distorcidas no secundário.
A norma anteriormente citada (IEEE Guide
for the Application of Current Transformers Used
for Protective Relaying Purposes, 1996) sugere que
para evitar a saturação quando em carga puramente resistiva, com correntes assimétricas e considerando uma quantidade toleravel de fluxo remanescente, a tensão de saturação deve obedecer
à seguinte condição:
Is × Zs (1 +
Vx>
1−ϕ
X
R)
(1)
onde o fator 1 + X
R foi discutido anteriormente e ϕ
é o montante de fluxo remanescente considerado.
O termo Is é a corrente primária dividida pelo número de espiras e Zs é a carga total secundária.
Tal requisito geralmente leva a TCs de tamanhos
impraticáveis e, portanto, a execução de simulações digitais auxiliam na definição de parâmetros
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e compromissos de desempenho durante o dimensionamento do equipamento.
Para execução da simulação podem ser usados
modelos de transformadores com histerese em programas de simulações de transitórios eletromagnéticos. No presente trabalho, optou-se por utilizar
o “SimPowerSystem Blockset” disponı́vel para Simulink/Matlab. A caracterização de tais modelos
se dá através de ensaios em bancada do TC com
a finalidade de obter uma curva de histerese para
variações de corrente em baixa frequência (considerada corrente contı́nua). Estes modelos definem
uma relação de fluxo magnético e corrente de magnetização, útil em condições transitórias quando
geralmente ocorre o aparecimento de harmônicos.
Desta forma se definem como as principais caracterı́sticas da curva (Casoria et al., 2003):
• laços de histereses assimétricos interiores ao
laço principal são criados por uma corrente
de magnetização,
• as curvas de tais laços são dependentes apenas dos ultimos dois pontos de reversão, e
• cada curva tende a retornar ao penúltimo
ponto de reversão.
O procedimento de ensaio consiste na injeção de
uma corrente controlada no secundário e a medição da tensão de excitação do mesmo, enquanto se
mantém o primário em aberto. O fluxo, em unidade Volts × segundo1 , pode ser obtido pela integração da tensão medida e, desta forma, obtém-se
uma curva de Fluxo x Corrente. É necessária,
1 Neste artigo será convencionado o uso da unidade
Volts × Segundo para expressar o fluxo, uma vez que:
∂B
v = N ∂φ
= N
∂t
A ∂t
N
v∂t = A ∂B → V olts × Segundo = T esla × N
A
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portanto, a definição de um circuito de potência e
controle para injetar tal corrente no primário.
2
2.1
Desenvolvimento do Circuito
Topologia
A topologia simplificada em blocos do sistema está
apresentada na Figura 1, onde estão representados
os 4 blocos principais: o TC - objeto de estudo, o
circuito de potência (Amplificador) - responsável
por gerar a corrente necessária para alimentar o
secundário do TC, a malha de realimentação para
controle da excitação (Aquisição e Controle) e um
resistor Shunt (R). Além disto, estão representadas as medidas usadas para coleta dos dados e
parâmetros usados para o controle: a tensão induzida no secundário, a tensão em cima do shunt
e a corrente circulando no secundário. Na prática,
esta ultima corrente é obtida indiretamente a partir do valor do resistor shunt e da tensão em que
está submetido.
Figura 2: Laço de Histerese a 60Hz.
O cálculo do fluxo máximo em Teslas pode ser
feito pela expressão:
φmax =
V.smax
NA
(2)
onde:
• N é o número de espiras,
• A é a área da seção do núcleo.
Para o TC em questão, N = 60 e A = 0.00405m2 ,
calcula-se assim φmax = 1.67T , valor tı́pı́co para
TC. Para uma tensão de alimentação senoidal, o
fluxo máximo é obtido em um semi-ciclo, conforme
ilustra a Figura 3.
Figura 1: Topologia do Circuito.
2.2
Definição do Amplificador de Potência
Para efetuar a avaliação do laço de histerese de
forma completa, o amplificador deve ser capaz de
saturar o núcleo do transformador em vazio. Além
disto, a tensão de saı́da deve ter formato senoidal
efetuando um ciclo completo de histerese. Porém,
a frequência desta tensão deve ser muito menor
que os 60Hz da rede, caracterizando assim apenas
as perdas pelo efeito da magnetização, já que perdas por correntes parasitas podem ser desprezadas. A amplitude de tensão necessária para saturar o núcleo do TC pode ser estimada pelo fluxo
máximo no transformador. Foi efetuado um ensaio a 60Hz e alimentação 100Vrms no tap de um
TC 300:5, obtendo-se como resultado aproximandamente 0.4V.S de fluxo de saturação, conforme
pode ser observado na Figura 2.
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Figura 3: Fluxo×Tensão em meio ciclo senoidal.
Para cálculo da tensão Vp a ser fornecida pelo
amplificador à 1 Hz, pode-se fazer:
Z π
0.4 = 0.5
Vp senθdθ
(3)
0
Vp
≈
0.5V
(4)
A corrente máxima tambem pode ser estimada a
partir da Figura 2, sendo estipulada em 3 A para
garantir uma margem de segurança. O circuito de
potência deve ser capaz de fornencer, então, uma
senoide de amplitude 0.5 V e corrente máxima 3 A
a uma frequência de 1 Hz, sendo que tal valor de
tensão é apenas uma estimativa e será revisado
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Anais do XIX Congresso Brasileiro de Automática, CBA 2012.
adiante. A frequência de 1 Hz pode ser considerada bem menor frente à frequência de 60 Hz da
rede conforme, discutido anteriormente. Um aspecto crı́tico no circuito de potência é a baixa impedância CC do transformador (fração de ohms).
Para contornar tal problema, uma resistência de
1 Ω foi adicionada em série ao enrolamento secundário, conforme ilustrado na Figura 1. Este
resistor servirá também para medida indireta da
corrente de excitação.
2.3
Formas de excitação e alimentação
A introdução do resistor shunt traz como consequência a necessidade de uma maior tensão de
alimentação. Além disto, no caso de uma excitação em tensão, haverá uma queda de tensão distorcida em tal resistor e, portanto, a tensão induzida
nos terminais do TC não será puramente senoidal, possuindo correntes harmônicas que acarretarão perdas por correntes parasitas. Uma excitação
em corrente soluciona tal problema, uma vez que a
tensão induzida no TC será igual à tensão gerada
pelo circuito de potência menos a queda no shunt,
desde que a queda no cobre e na dispersão sejam
deprezı́veis. Conforme discutido anteriormente, a
derivada do fluxo será proporcional à tensão induzida e, portanto, quando o fluxo estiver na região de cruzamento por zero, valores de tensão
bem maiores do que os calculados anteriormente
serão produzidos. Assim, o teto de alimentação
deve estar bem acima dos 0.5 V. Foi definida então a utilização de baterias de 12 V para formar
uma fonte simétrica de ±12 V. Tal escolha também evita a contaminação do circuito com ruı́do
de 60 Hz proveniente de uma fonte CC conectada
à rede elétrica.
2.4
Figura 4: Circuito de proteção das entradas A/D.
tanto foi necessária a criação de um circuito para
se ter uma saı́da bipolar entre ±5 V, conforme
ilustra a Figura 5.
Figura 5: Circuito de interface para amplificador de
potência.
O amplificador de potência selecionado para
tais condições de uso foi o LM675. Seu ganho
foi projetado para 21 V/V (Figura 6). Um filtro
passivo de primeira ordem com corte em aproximadamente 50Hz e ganho DC 0.4 foi adicionado
na interface entre o circuito conformador e o amplificador de potência. Tal circuito inclui também
o resistor shunt e conectores para o secundário do
TC.
Aquisição e Controle
O controle da corrente de excitação é realizado por
software utilizando um modelo em tempo real implementado no Matlab/Simulink. Para aquisição
dos sinais pertinentes (tensão no shunt e tensão
de saı́da do amplificador de potência) e para sinal
de controle do circuito de potência, foi utilizada a
placa de Aquisição PCI-1711 da Advantech. Circuitos de proteção e conformização de sinal foram
desenvolvidos para interface entre as partes de potência e instrumentação. A Figura 4 apresenta o
circuito usado para proteção dos conversores A/D
da placa PCI-1711. Este circuito é usado tanto no
canal para leitura de tensão do shunt quanto no
de tensão de saı́da do amplificador de potência.
O objetivo do circuito é a limitação do sinal de
saı́da entre ±9 V, dentro da faixa aceitável pelos
conversores. Além disto, um ganho de aproximadamente 0.45 é dado ao sinal de entrada. Todos
os operacionais são alimentados com ±9 V.
As saı́das analógicas disponı́veis na placa PCI1711 são apenas unipolares, entre 0 e 10V. Por-
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Figura 6: Circuito de potência.
A Figura 7 apresenta o esquema montado no
Simulink. Pode-se verificar que uma das entradas analógicas representa a tensão E (a menos de
um pequeno offset de 0.004) e é diretamente integrada, obtendo-se o fluxo no núcleo do TC. A
outra entrada é a tensão referente à leitura da corrente no resistor Shunt. A partir dela um sinal de
erro para a referência senoidal é calculado e ali-
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menta um controlador PID. Um offset de 5 V é
adicionado à saida deste bloco e então transferida
para a saı́da analógica da placa PCI1711.
Figura 10: Tensão induzida nos terminais do TC.
Figura 7: Circuito de controle.
3
3.1
onda apresentadas nas Figuras 11, 12 e 13. Para
este caso as tensões aparecem distorcidas, efeito
da saturação do núcleo do TC.
Resultados
Ensaio em Malha Aberta
Abrindo a malha de realimentação e forçando uma
referência de 0.6 V com frequência 0.5 Hz (Figura
8) é possı́vel verificar que o comportamento do
circuito ocorre como esperado: uma distorção na
corrente e a tensão induzida nos terminais do TC
não tem formato senoidal (Figuras 10 e 9).
Figura 11: Corrente de excitação.
Figura 8: Tensão de alimentação.
Figura 12: Tensão de saı́da do amplificador de potência.
3.3
Figura 9: Corrente de excitação.
3.2
Ensaio em Malha Fechada
Com a malha de realimentação fechada e uma refêrencia senoidal para a corrente de 0.5 Ap com
uma frequência de 0.5 Hz obteve-se as formas de
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Obtenção do Fluxo
Para verificação do fluxo, foi realizado um ensaio
com uma corrente de excitação de 1.1 Ap com
frequência 1/3 Hz. A tensão induzida obtida é
mostrada na Figura 14 e a Figura 15 mostra a integral de tal sinal para obter o fluxo. Pode-se verificar que o fluxo não está como esperado, pois durante o momento de saturação da tensão induzida
(i.e Vind = 0) o fluxo não permaneceu constante,
em tal região o fluxo apresenta um crescimento
positivo ou negativo praticamente constante. Este
erro ocorre devido às componentes resistivas não
consideradas (resistência do cobre e tolerância do
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Anais do XIX Congresso Brasileiro de Automática, CBA 2012.
Figura 13: Tensão induzida nos terminais do TC.
Figura 16: Fluxo obtido após correção.
resistor shunt). Para solucionar tal problema, um
valor constante de 0.004, determinado empiricamente, foi adicionado ao diagrama de blocos do
simulink, obtendo uma curva satisfatória (Figura
16).
perda se relaciona à área limitada pelo laço de histerese em baixa frequência, porém o modelo usado
para simulação não efetua tais cálculos usando a
curva de histerese. Tal valor, juntamente com os
outros parametros coletados foram configurados
no Hysteresis Design Tool do Matlab/Simulink.
A Figura 17 apresenta a curva experimental e a
curva estimada pelo modelo.
Figura 14: Tensão induzida nos terminais do TC.
Figura 17: Comparação da curva de histerese experimental e curva estimada.
3.5
Figura 15: Fluxo obtido pela integração de Vind .
3.4
Modelagem
Após realização dos ensaios, as seguintes caracterı́sticas da curva de histerese foram coletadas: corrente de excitação, tensão terminal do amplificador, tensão induzida no secundário do TC (obtida
indiretamente por software calculando a diferença
da queda no shunt da tensão terminal do amplificador). Além destes paramêtros, é necessário estimar a perda no núcleo (dimensão de Ohms). Tal
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Simulações
Parâmetros de casos reais, onde a saturação do núcleo impediu a atuação do TC, foram usados para
efetuar as simulações. Tais parâmetros foram estimados a partir de faltas ocorridas em linhas de
distribuição da LIGHT, sendo dois casos simulados representativos. Na execução das simulações
adotou-se a pior condição para o instante da falha: a onda de tensão cruzava o zero, gerando o
maior fluxo possı́vel. No primeiro caso, a corrente
de falta foi de 8000 A com relação X/R=2.95Ω/Ω.
Em uma tensão de 13.8kV φ − φ a impedância de
curto equivale a 0.31+j0.95 Ω (ângulo 72o ). A
carga máxima secundária existente foi estimada
em 30% da carga padrão. As Figuras 18 e 19 ilustram os resultados da simulação para as correntes
primária e secundária (Figura 18) e fluxo (Figura
19). É possı́vel perceber a presença da saturação e
o efeito desta na corrente secundária. No segundo
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Figura 18: Corrente primária e secundária simuladas.
Figura 21: Fluxo simulado.
consideravelmente a constante de tempo do transitório de curto. As Figuras 22 e 23 mostram as
correntes primária e secundária (Figura 22) e fluxo
(Figura 23) para tal caso. É possı́vel perceber claramente uma saturação muito mais intensa que no
caso anterior.
Figura 19: Fluxo simulado.
caso a corrente de falta foi de 3577A com relação
X/R=2.125Ω/Ω. Em uma tensão de 13.8kV φ − φ
a impedância de curto equivale a 0.984+j2.0154
Ω (ângulo 64.8o ). Para este caso foi considerado
um magnetismo residual de 75% na pior direção.
As Figuras 20 e 21 ilustram os resultados da simulação para as correntes primária e secundária
(Figura 20) e fluxo (Figura 21). Novamente é possı́vel perceber a presença da saturação e o efeito
desta na corrente secundária. Um ponto impor-
Figura 22: Corrente primária e secundária simuladas.
Figura 23: Fluxo simulado.
Figura 20: Corrente primária e secundária simuladas.
tante a ressaltar é a grande influência da impedância de curto nos resultados da simulação: um
erro de apenas 10% no valor da reatância ocasiona
um erro maior que 300% na resistência alterando
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4
Conclusão
O dimensionamento de Transformadores de Corrente para Proteção, quando considerados parâmetros como saturação e faltas assimétricas,
torna-se uma tarefa complexa e que geralmente
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leva a tamanhos impraticáveis. Nestes casos, o dimensionamento através de simulações para avaliar
tais efeitos passa a ser útil. O sistema desenvolvido possibilita a obtenção do modelo de histerese
do transformador que pode ser usado em tais simulações para avaliar o comportamento do mesmo
frente às condições adversas de operação. Assim,
é possı́vel obter um dimensionamento otimizado
do TC, bem como da sua carga.
Referências
Casoria, S., Sybille, G. and Brunelle, P. (2003).
Hysteresis modeling in the matlabpower system blockset, Math. Comput. Simul. 63(35): 237–248.
IEEE Guide for the Application of Current Transformers Used for Protective Relaying Purposes (1996). IEEE Std C37.110-1996 pp. i –59.
ISBN: 978-85-8001-069-5
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