filosofia do direito - Turma de Direito FMU Sala 104

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FILOSOFIA DO DIREITO
HISTÓRIA DO CONCEITO DE DIREITO
O conceito de Direito é intelectual, cultural e, portanto, criado pelo homem e sujeito à evolução,
o que ocorre a todo tempo.
Infelizmente, não há documentação suficiente para se determinar como pensavam civilizações
anteriores aos gregos e romanos. Por isso, inicia-se o estudo do Direito da civilização grecoromana em diante, por volta do séc. VI a.C.
Porém, desde os Dez Mandamentos, especialmente na cultura hebraica, tem-se por base um
texto que deve determinar regras de convivência numa certa sociedade.
Pouco a pouco, a ideia de Direito natural foi sendo expulsa, gradativamente, do conceito de
Direito, de modo que se reduz esse conceito ao Direito positivo.
1 JUSNATURALISMO OU ESCOLAS DE DIREITO NATURAL
O jusnaturalismo não é uma teoria homogênea desde o início, tendo evoluído de acordo com o
momento histórico.
Nenhum jusnaturalista renegava o Direito positivo no conceito de Direito, apenas acresce o
Direito natural.
O estudo de Frans de Waal, que mostram a exigência do tratamento com justiça entre os
símios, tem trazido à balha a discussão acerca da possível existência de um Direito natural
inerente ao ser humano.
1.1 Jusnaturalismo antigo ou greco-romano
Para os gregos e os romanos, o Direito tinha um conceito dualista, isto é, composto por
normas criadas pelos homens(leis [produto de uma criação de normas por governantes],
costumes [hábitos que ganhavam grande grau de adesão] e eventuais decisões judiciais
[paradigmas para o comportamento das pessoas da comunidade]) e um elemento de Direito
natural.
Assim, quando se fala em jusnaturalismo, entende-se que o Direito é formado por regras
criadas artificialmente pelos homens e que, via de consequência, podem ser substituídas, e, ao
seu lado, um Direito natural.
Comparativamente, para os gregos e romanos, o Direito natural sobrepunha-se ao Direito
positivo.
Os gregos compreendiam a natureza como algo dotado de uma estrutura com ordem natural.
O cosmos possuía uma ordem natural, ou seja, pré-disposição de como as coisas deveriam,
posto que detinha uma harmonia intrínsecas, definindo como as coisas são. Em virtude dessa
suposta ordem natural, Aristóteles defendeu a escrivão e Platão, a separação de classes.
Assim, para os gregos, o Direito natural era extraído da observação do cosmos, que desde
sempre existiu e poderia ser observado por qualquer um.
O processo judicial greco-romano não pressupunha a existência de um sistema jurídico préexistente e que forneceria suporte ao deslinde da questão posta, mas, sim, a partir do emprego
da retórica (argumentos de parte a parte), invocando o Direito natural.
O Direito natural, tal como visto pela cultura greco-latina, vai dando espaço ao jusnaturalismo
cristão, à medida em que a cultura cristã se desenvolve.
1.2 Jusnaturalismo medieval ou cristão
Ainda que se conserve a ideia dualista do conceito de Direito, suprime-se, porém, a ordem
natural harmônica greco-romana, substituindo-na pela Palavra de Deus insculpida na Bíblia.
Assim, o justo natural é aquilo que está dito na Bíblia, pois foi expresso por Deus.
Nesse momento, o Direito natural não era acessível a todos, mas tão-somente aos padres da
Igreja Católica, os quais sabiam interpretar a Palavra de Deus.
1.3 Jusnaturalismo moderno ou racional
A parir do renascimento, com o desenvolvimento das ciências naturais e os questionamentos
dos dogmas religiosos, a concepção cristã enfraqueceu. Nesse momento, a humanidade não
desprezou o direito natural, mas trouxe um conceito racional sobre a natureza humana.
Essa concepção de jusnaturalismo era muito menos metafísica que as anteriores, lembrado-se
que por metafísica se entende, basicamente, por aquilo que está além da natureza. Nesse
sentido, o direito natural é sempre metafísico – cosmos, Deus ou natureza humana
transcendental.
Como resultado do descrédito no direito natural, que foi suprimido do conceito de direito, temse um conceito moderno de direito que contempla somente o direito positivo.
2 CRISE NO JUSNATURALISMO
A crise do jusnaturalismo, com o descrédito do direito natural, teve vários fundamentos.
2.1 Fundamento epistemológico
A primeira crise se deu pela forma como se definia o que era justo ou injusto. A religião foi
questionada, a ciência passou a demonstrar empiricamente dados da natureza e isso gerou
divergências.
Ocorre que não se pode afirmar qual das proposições está correta, se a da religião ou a da
ciência, pois verdades morais, base do justo, não podem ser demonstradas empiricamente.
Aqui houve uma crise de legitimidade do jusnaturalismo. Quantos jusnaturalismos existem? O
jusnaturalismo, que visava um justo universal, acabava por ser diferente em cada local. A
consequência disso foi a imprestabilidade do direito natural como fonte do direito.
2.2 Fundamento multicultural
A Europa era a cristandade. Com o fim da Igreja Católica e o surgimento dos países emergiu a
disposição de várias culturas, cada um com seus princípios e valores de justiça. Os alemães
priorizavam a ordem, enquanto os ingleses a liberdade e os franceses a igualdade. Se existem
muitas culturas, cada uma com a sua concepção do que é justo e moral, como se pode dizer
que há um direito natural que se sobrepõe a elas e existe em todo o mundo?
3 DIREITO POSITIVO
A crise do jusnaturalismo expulsou o direito natural do conceito de direito, permanecendo
somente o direito positivo, formando um conceito unitário de direito.
Utiliza-se o termo direito positivo, em que pese este não seja o mais adequado, pois o direito
positivo é aquele legislado e na época não havia Poder Legislativo. Assim, há divergências
também no que tange ao que é o direito positivo.
Já no final do Século XIX se chegou à Teoria Positivista, que reduz o direito ao direito criado
pelo homem, impondo um positivismo legalista, ou seja, o direito é lei e só. Isso, porém, não se
estendeu a todo o mundo, mas somente na Europa e na América Latina, excluindo a Inglaterra
e os EUA.
Nessa época, com a codificação do direito, chegou-se ao auge do positivismo jurídico. Foi
nesse momento que Kelsen escreveu a Teoria Pura do Direito, reforçando o positivismo,
dizendo que não há juízes de valores universais.
Para o positivismo jurídico não há uma relação entre direito e justiça, entre direito e moral,
sendo direito somente aquele criado pelos homens. Esse direito criado pelos homens vale e se
impõe independentemente do seu conteúdo, mesmo sendo injusto, não cabendo aos juízes ou
cientistas da lei impor juízos de valores que contrariem as normas positivas.
Essa redução do direito ao que é criado pela autoridade pode ser muito boa, mas se viu
grandes problemas na história da humanidade, como a Alemanha nazista de Hitler. Assim,
percebeu-se que essa total separação entre direito e moral não era possível de permanecer,
impondo-se a descoberta de uma forma de os dois voltarem a conviver.
Essa aproximação se deu através da positivação de valores morais universais como direito
humanos em todos os países. Essa é a razão pela qual o direito constitucional é tão importante
e possui caráter quase universal, sendo as leis supremas de cada Estado.
Essa onde de aproximação entre direito e justiça vem cada vez mais ganhando adeptos, com
vista a se tornar hegemônica, havendo uma tendência universal de adoção dessa conjunção.
HANS KELSEN
1 RELATO BIOGRÁFICO
Hans Kelsen é um jurista judeu austríaco nascido em Praga (antigo império austro-húngaro),
filho de um comerciante muito pobre, que se muda para Viena ainda jovem.
Kelsen é um homem que faz a sua formação em Direito e, desde cedo, opta por se especializar
em duas áreas: Direito Constitucional e Teoria Geral (de certo forma, Filosofia do Direito).
Kelsen era judeu, mas qualquer projeto de ascensão social era impossibilitado pelo
antissemitismo. Kelsen, a despeito de ser judeu “de nascimento”, adotou como estratégia
ascensional uma conversão ao cristianismo. Mas tudo indica que ele era, efetivamente, ateu.
Kelsen, com o estopim da I Guerra Mundial, torna-se assessor jurídico do Ministério da Guerra,
aproximando-se e ganhando a confiança do Ministro da Pasta.
Kelsen foi o grande expoente do Positivismo jurídico, apesar de esta corrente jusfilosófica já se
encontrar em declínio, não estado terminal.
Finda a guerra, a Áustria decide virar uma república, escolhendo Hans Kelsen como redator de
sua Constituição, na qual ele inovou criando o sistema de controle concentrado de
constitucionalidade. Ato contínuo, é convida a se tornar juiz do Tribunal Constitucional, cuja
criação foi de sua sugestão.
Em 1929, renuncia ao cargo de Juiz do Tribunal Constitucional. Em 1930, é convidado a ser
professor na Universidade de Colônia. Em 1933, com a carreira minada por Carl Schimitt, é
convidado a lecionar na Universidade de Genebra, onde permaneceu até 1935, quando se
mudou para Praga, a fim de lecionar na Universidade de Praga, que lhe assegurava o direito à
aposentação. Em 1940, migra para os Estados Unidos, sem dominar o idioma, com toda sua
família. Mesmo sendo o jurista mais conhecido do mundo, não tinha patrimônio algum. Nos
Estados Unidos, deu aula na Universidade de Harvard, onde não se acertou, já que sua
doutrina era demasiado europeia, fazendo com que ele retornasse ao continente europeu, em
1945 para ministrar aulas de Ciência Política em Berkeley.
2 PROJETO TEÓRICO-FILOSÓFICO
O projeto teórico-filosófico de Kelsen é bem resumido pelo título do seu principal trabalho
a Teoria Pura do Direito, que já indica qual é o seu núcleo. Trata-se de uma teoria pura, não
um direito puro.
O projeto de Kelsen é desenvolver uma ciência do Direito, não uma prática. Por isso, seu
projeto visa ao desenvolvimento de uma autonomia pura do Direito.
Para Kelsen, o Direito tem de ser analisado como um objeto científico, tal qual um químico
analisa um elemento em laboratório; ou um biológo, um chimpanzé num zoológico. Isto é, para
Kelsen, o Direito deveria ser descrito avalorativamente, desconsiderando os valores de quem
analisa, aos moldes do que fazem os demais cientistas.
Para Kelsen, o Direito é norma, que é ato de vontade do soberano de um
Estado, empiricamente observável. O Direito é um conjunto dessas normas. Portanto, o Direito,
sendo apenas um conjunto de normas criadas a partir de um ato de vontade, pode ser
analisado avalorativamente.
Kelsen não batia apenas no jusnaturalismo, mas também o fazia em relação ao realismo
jurídico, que entendia o Direito como sendo as decisões judiciais, independentemente de
valores ou normas. De toda forma, a sua maior preocupação era a desconstrução do
jusnaturalismo, cuja rejeição se dava pelo fato de este ser baseado somente num juízo
axiológico, o que é, necessariamente, subjetivo. Ou seja, Kelsen é um cético, pois, nesse caso,
ele dizia que o juiz, ao interpretar a norma, estaria projetando suas preferências individuais ao
caso em apreço, fazendo um juízo de valores.
Desse modo, se o teórico quer descrever o Direito como um objeto científico, deve ele isolar as
normas jurídicas em relação aos valores.
A teoria pura do Direito se fundaria numa contrução sem nenhum juízo valorativo, visando a ser
aplicável em todo e qualquer lugar, existindo somente um Direito. A teoria visa a criar um
conceito de Direito, independentemente do seu conteúdo, que é influenciado pelas preferências
do soberano. Assim, o Direito se submete a qualquer forma de resolver conflitos ideológicos,
mas será Direito, pois o Direito admite qualquer conteúdo.
Para Kelsen, o Direito é um plano criado pelos humanos para organizar a vida em sociedade,
sem qualquer relação com a justiça.
3 COMENTÁRIOS AO TEXTO
RAZÃO TEÓRICA - é uma razão que conhece as coisas; conhece conceitos para explicar as
coisas, os astros, o mundo animal.
RAZÃO PRÁTICA - é a razão que governa a ação humana; que determina como agir.
A Teoria do Conhecimento, de Kant, tenta explicar os limites da razão para conhecer as coisas.
Isto é um problema da modernidade: até onde a razão pode ir? Como ela conheça as coisas?
Kant, então, tenta desenvolver uma estratégia: as coisas só podem ser conhecidas, que estão
“lá fora”, através do sentido, não através da razão.
A questão é: o que existe lá fora e eu só posso conhecer pela razão só pode ser formulado por
ela. Isto é umaepistemologia.
A crítica de Kelsen é que não se pode usar a Teoria do Conhecimento (especificamente
o imperativo categórico) para definir como as pessoas devem se comportar, já que não existe
uma máxima universal, pois ela é formal, vazia e não fornece informação algum, na medida em
que se pode universalizar quase tudo.
No texto, Kelsen vai afirmar que o jusnaturalismo é uma teoria dualista do Direito e assim o é
porque compõe o Direito com direito natural e positivo. Para tanto, ele analisa diversas teorias
e concepções específicas do jusnaturalismo.
O que é interessante é que o jusnaturalismo, por ser uma teoria dualista, exige uma definição
da relação entre o direito natural e o direito positivo, podendo haver relações diferentes –
relação fraca, onde o direito natural serve apenas como fonte de interpretação do direito
positivo; relação moderada, onde o direito natural é fonte de direito quando o direito positivo
contém lacunas; relação forte, em que o direito natural é condição de validade do direito
positivo, ou seja, o direito positivo somente será válido se for justo, conforme o direito natural.
Rejeitando o direito natural, Kelsen sustenta uma teoria monista do direito onde há somente o
direito positivo, qualquer que seja o seu conteúdo. Portanto, o direito é direito ainda que seja
injusto.
1.
L. A. HART (1907-1992)
Judeu, como Kelsen, morreu em Oxford. Inicialmente, estudou Letras Clássicas em Oxford
(línguas estrangeiras, literatura greco-romana, filosofia), não fez faculdade de Direito. Dele
esperava-se que lecionasse Filosofia, mas se dedicou ao Direito, ingressando num escritório
de advocacia, passou no BAR (Exame de Ordem local), atuando, desde então, como advogado
tributarista.
Ajudou a Inglaterra e resistiu à II Guerra Mundial, trabalhando com tradução de escuta
telefônica, uma vez que dominava o alemão, momento em que voltou a conviver com seus
colegas e professores da Faculdade de Letras Clássicas (posto que eles dominavam a língua
alemã, sendo, portanto, úteis à tradução), decidindo pelo abandono da carreira jurídica e
iniciando a lecionar Filosofia.
Com o óbito do professor titular da cadeira de Filosofia do Direito, em 1952, assume essa
cátedra, começando uma verdadeira revolução: trouxe para dentro do Direito a Filosofia
Analítica da Linguagem, mais associada ao campo do jusnaturalismo. Em 1961, lança um livro
que se tornou um sucesso editorial enorme: O Conceito de Direito, que se tratava de um livro
para alunos.
Tal sucesso se deve à qualidade do livro e à estratégia de lançamento do livro: visitava várias
localidades, observando as potencialidades dos estudantes dessas localidades, escolheu,
então, alguns pupilos para se doutorarem em Oxford. Após os seus estudos, eles retornavam
às suas origens como Hartianos, fazendo com que Oxford se tornasse uma referência da
Universidade em Filosofia do Direito.
De outra banda, o professor Hart teve uma vida pessoal difícil, não tanto quanto Kelsen, já que
viveu sempre na Inglaterra e era financeiramente bem sucedido. O maior transtorno da vida de
Hart foi o seu homossexualismo contido.
1 TEORIA DE DIREITO DE HART - O CONCEITO DE DIREITO
Hart, para definir o Direito, adota um método de sociologia descritiva, isto é, como o Direito é
considerado na prática das sociedades contemporâneas, partindo não de uma análise ideal do
que deveria ser o Direito.
Para Hart, o conceito de Direito depende de uma análise das sociedades modernas, o que faz
com que se perceba que o Direito é um sistema de normas, que definem os comportamentos
humanos. De fato, em qualquer sociedade o Direito é um sistema de normas, estando estas
associadas ao poder de aplicar sanções àqueles que as desobedecem.
Hart vai dizer que, numa sociedade muito primitiva, que encontrou num processo de dissolução
(guerra civil), sempre vai existir um sistema de normas primárias. A partir de um certo
desenvolvimento, todas as sociedades precisam introduzir normas secundárias, ainda que as
normas primárias estejam funcionando corretamente, isto porque as mais diversas mudanças
sociais ensejarão novas disposições, carecendo de se estatuir quem e como poderão ser
criadas as normas,quem e como serão julgadas as violações ao Direito.
1.1 Direito como sistema de normas
1.1.1 Normas primárias
Normas primárias são aquelas que dispõe sobre o que é permitido e proibido, bem como
direitos fundamentais, isto é, regulam o comportamento dos humanos.
1.1.2 Normas secundárias
1.1.2.1 De legislação
Normas secundárias de legislação são aquelas que, não regulando o comportamento de
pessoas, dispõem sobre a criação e mudança das normas primárias.
1.1.2.2 De julgamento
Normas secundárias de julgamento são aquelas que definem quem julga e como são
julgadas as pessoas que, com o seu comportamento, violam as normas primárias.
1.1.2.3 De reconhecimento
É necessário que se defina o que é norma jurídica, que são aquelas do Direito Positivo (posto
pelos homens). Mas quais são as normas jurídicas consideradas postas pelo homem?
Kelsen responde essa questão com a Teoria da Norma Fundamental, no respeito às normas
constitucionais. Porém, Hart não se satisfaz com essa definição kelseniana, inclusive porque,
sendo britânico, não compreende o que é Constituição formal e um sistema normativo
escalonado, o que se estende à Common Law como um todo.
Assim, Hart trata da norma de reconhecimento, que não é escrita e que varia de sociedade
para sociedade: a brasileira, por exemplo, é “são normas do sistema jurídico brasileiro todas
aquelas criadas de acordo com os vaticínios da Constituição Federal”.
Com isso, Hart está dizendo que todos os sistemas jurídicos têm norma de reconhecimento,
cada qual a seu modo. Isto é, na regra de reconhecimento não há nenhum elemento ideal,
depende da prática efetiva da sociedade que se quer analisar. É esta a razão pela qual Hart é
considerado um positivista, pois se trata de um conceito que dá plena autonomia ao Direito em
relação à moral.
Exemplo: em 1979 o CN editou a lei da anistia, que anistiava todas as pessoas que tivessem
praticado crimes políticos durante o regime militar e os agentes de Estado que tivessem
praticado crimes conexos (tortura, homicídios, etc.) Em 1985 foi feita uma EC afirmando a
anistia da lei. Em 2010 o STF julgou a ADPF nº 153 que questionou a inconstitucionalidade da
lei da anistia, julgando improcedente a ação. Tal julgamento gerou impactos porque pouco
tempo depois o Tribunal Internacional condenou o Brasil pelo homicídio de jovens que se
reuniram no Araguaia para afrontar a ditadura, dizendo que a lei da anistia violava os
compromissos internacionais do Brasil. O Ministro Eros Grau, ao julgar o caso, conclui que a lei
da anistia não violava a Constituição de 67/69, porque ela não vedada a anistia e a CF de 88
também não veda a concessão de anistia, embora preveja normais mais rígidas para a tortura.
Assim, dentro de uma lógica interna do sistema jurídica a lei da anistia não era inválida por ser
inconstitucional. Ainda, se tal lei causava desconforto moral ela foi a única forma de se retornar
à democracia, sendo compreensíveis as razões de sua criação. O Ministro se dá por satisfeito
em verificar a validade da lei somente com um contraste de normas. Porém, é possível se dizer
que um acordo entre militares no poder com civis sem alternativa é juridicamente aceitável?
Isso irá depender do conceito de direito adotado, que irá alterar os julgamentos dos processos.
A polêmica de Hart com Dworkin se estabelece na medida em que Hart diz que as normas
jurídicas, porque são expressas com linguagem, com muita frequência são claras e não deixam
dúvidas com relação ao texto normativo. Entretanto, as normas não são sempre claras, pois a
linguagem não consegue deixa de ter uma textura a Berta e por isso as normas têm zonas de
penumbra em que os comandos normativos são indeterminados. Hart diz que a pesar de os
sistemas jurídicos serem compostos de normas claras, frequentemente sofrem de três defeitos:
lacunas (falta), antinomias (contradição) e normas indeterminadas (ausência de clareza) e por
isso não são perfeitos. Quando acontecem esses defeitos jurídicos o juiz tem poder
discricionário para decidir como quiser, isto é o juiz decide de acordo com seus valores morais,
ideologias políticas, cálculos econômicos e etc.
Dworkin diz que isso é um absurdo, porque não há sentido em criar uma teoria do direito e
reconhecer que quando o direito possuir defeitos o juiz poderá decidir como quiser, eliminando
a certeza e a segurança jurídica do sistema, pois confere ao juiz o poder de legislar, o que é
inconsistente com um conceito positivista de direito. É aqui que Dworkin desenvolve a teoria
dos princípios, que diz que no caso dos defeitos o juiz deve procurar um princípio existente no
sistema e aplicá-lo no caso. Nesse ponto, Hart sustentava que os princípios não diziam nada,
sendo que na aplicação do princípio o juiz irá dar a ele o conteúdo que ele quisesse.
2 A TEXTURA ABERTA DAS NORMAS JURÍDICAS E O PODER DISCRICIONÁRIO DOS
JUÍZES
O sistema jurídico é composto por normas jurídicas, cujas linguagens são abertas (comandos
normativos indeterminados), apresentando, portanto, zonas de penumbra (normas
indeterminadas ou que contêm indeterminações – exemplo: no que consiste a dignidade da
pessoa humana?). Isso é um dado da realidade jurídica provocado pela textura aberta da
linguagem humana, que é um elemento inescapável da formação do direito. Essas zonas de
penumbra é que dão flexibilidade ao sistema e permite que ele evolua e se modifique.
Entretanto, nas hipóteses de indeterminação que o juiz faz não é determinado pelo direito, que
não diz o que deve ser feito, tendo o juiz a discricionariedade judicial. Assim, segundo Hart o
juiz não pode exatamente o que quiser, devendo observar os melhores critérios de moral, de
política ou de economia. Na verdade, o que realmente ocorre nos casos de indeterminação ou
de ausência de normas, o que há é a discricionariedade judicial. É nesse ponto que há o forte
ataque de Dworkin, porque uma teoria positivista nestes moldes não faz sentido porque não
entrega aos seus usuários aquilo que prometeu, que é a segurança jurídica, a certeza. Nos
sistemas jurídicos modernos (brasileiro), repletos de princípios indeterminados, o número de
casos em que os juízes decidem discricionariamente (STF) tornaria essa teoria quase inútil
para explicar o direito. Hart aceita essa crítica, mas diz que sua teoria é inescapável, pois ela
retrata a realidade dos sistemas jurídicos (exemplo: qual é o critério jurídico que diz que se
deve sacrificar a liberdade de expressão em face da intimidade e não o contrário?). Assim, Hart
desenvolveu sua teoria buscando retratar como o direito é de fato e não como deveria ser.
A teoria de Hart é uma teoria positivista que transforma o juiz em legislador, tratando-se de
uma tese sobre o poder discricionário do juiz.
Com relação ao voto do Min. Celso de Mello, este se utilizou da teoria do Dworkin ao utilizar de
um método interpretativo do sistema jurídico, a fim de evitar a discricionariedade judicial.
3 O POSITIVISMO MODERADO
O outro ponto importante pé o conceito de positivismo jurídico moderado. Hart, pressionado por
Dworkin, diz que concorda com ele – os sistemas jurídicos contem princípios morais além das
regras. A teoria do direito de Hart sustenta que o conceito de direito é baseado nos fatos
sociais, que provocam as leis, as decisões judiciais (controle de constitucionalidade
concentrado) e os costumes sociais e isso é o direito, reduzindo o direito a fatos sociais que
impõe o direito positivo. Dworkin diz que além dos fatos sociais os sistemas jurídicos são
compostos de princípios morais e de justiça que existem porque são certos e justos e que por
isso estão no sistema jurídico. Em resposta, Hart diz que concorda com os princípios,
entretanto diz que os princípios morais, se incluídos num sistema jurídico, são exclusivamente
aqueles que decorrem de fatos sociais, estando em leis, decisões judiciais ou em costumes, ou
seja, sua teoria defende um positivismo jurídico moderado/inclusivo, admitindo que existem
princípios morais, mas apenas aqueles previstos na CF, nas leis e nas decisões vinculantes,
previstos no ordenamento jurídico positivo. Note-se que isso explica o direito brasileiro.
Diferentemente, Kelsen não se preocupou em tratar desses aspectos, uma vez que não buscou
em sua teoria respostas aos positivistas modernos, como Dworkin. O positivismo jurídico
moderado, então, diz que não há conexão necessária entre direito e moral, sendo que ela
depende do fato social.
Hart diz eu o papel do direito é coordenar as ações das pessoas que vivem em grupo, tanto é
que ele diz que a coerção não é um elemento conceitual do direito, mas sim que ele deve dizer
como as pessoas devem se comportar, sem que seja necessária a coerção, contrariamente a
outros pensadores, como é o caso de Kelsen. Hart não avalia o direito, mas somente descreve
o que ele é, não excluindo que possa haver uma teoria avaliativa do direito para dizer que um
direito é bom ou não, mas ele se utiliza do método descritivo que permite sua aplicação em
todos os lugares para dizer o que é o direito brasileiro, o direito alemão e etc.
Para Hart, a regra do reconhecimento, que identifica o que é direito em cada sistema jurídico,
somente pode conter fatos sociais.
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