IED II / Segunda Avaliação 2º semestre de 2008 Professor Alexandre Veronese Manuela Martins de Sousa Bibliografia obrigatória: HART, H. L. A. Visita a Kelsen. Lua Nova, CEDEC, São Paulo, n. 64, p. 153-178, 2005. KELSEN, H. Teoria geral do direito e do Estado. São Paulo: Martins Fontes, 2000. p. 71-106. 1. É possível considerar que a noção de pureza de Kelsen torna seu ponto de vista teórico tão infenso ao diálogo com outras considerações da vida social que arrisca produzir uma teoria do direito irreal? Legitime tal ponto de vista com argumentos tomados de H. L. A. Hart? (3,0) Kelsen constrói uma ciência do direito autônoma, separada da moral, da justiça e demais considerações da vida social. Seu objetivo era obter assim um conhecimento preciso do Direito, esvaziado de qualquer elemento externo como aspectos psicológicos, filosóficos, sociológicos, políticos ou éticos que estejam a ele conectados. Dessa forma, Kelsen define a norma – objeto da ciência jurídica – distinguindo o mundo do “dever ser” do mundo do “ser”. A estrutura da norma seria: se A, deve ser B, se alguém comete um crime, deve ser-lhe aplicada uma sanção. Cabe lembrar que a teoria pura do Direito não pretende ser a única ciência do Direito possível ou legítima, o Direito pode ser objeto de diversas ciências, mas a diferença é que a teoria pura demanda ser exclusiva como ciência normativa do Direito. Nesse sentido, a orientação geral da sua Teoria Pura do Direito e da Teoria Analítica do Direito são as mesmas, ambas ocupam-se da análise ou da elucidação do significado do Direito positivo, até porque nenhuma destas disciplinas ocupa-se da apreciação política ou moral do Direito, nem da descrição ou explicação sociológica do Direito ou do fenômeno legal. Para kelsen a diferença está no fato da Teoria Pura ser mais 1 consistente e, por isso, evitar certos erros cometidos, por exemplo, por Austin na análise dos direitos e deveres e da relação entre Direito e Estado. Hart, por sua vez, não adere a tese positivista de que as regras jurídicas são a única fonte do Direito, afinal o direito também é produto da sociedade, que é sustentada em condutas morais. Dito isso, percebemos que a pureza exacerbada de Kelsen ao persistir que as definições jurídicas devem somente basear-se na própria norma jurídica, evitando o uso de elemento morais, econômicos, culturais, políticos e ideológicos produz uma Teoria do Direito que apesar de “pura” é irreal. 2. O que siginifica delito para Hans Kelsen? (2,0). Por que H. L. A. Hart objeta o ponto de vista kelseniano? (2,0) Segundo Kelsen, o conceito de delito definido simplesmente como uma conduta socialmente indesejável é um conceito moral ou político, em síntese, metajurídico, mas não jurídico. A partir de uma perspectiva puramente jurídica o delito é, em geral, a conduta do indivíduo contra o qual é dirigida a sanção, como conseqüência do seu comportamento. Assim, para Kelsen uma definição jurídica de delito deve basear-se inteiramente na norma jurídica. Nesse sentido, o delito é definido como comportamento do indivíduo contra quem é dirigida a sanção, como conseqüência de sua conduta, pressupõe – ainda que não faça referência ao fato – que a sanção é dirigida contra o individuo cuja conduta o legislador considera nociva à sociedade e que, por tanto, ele tem a intenção de opor-se através da sanção. Para Hart a concepção de Kelsen é restritiva, pois ao expor que a definição jurídica de delito deve estar “totalmente baseada na norma jurídica” e ao considerar que sua própria definição de delito cumpre esta exigência, deixa muita coisa por explicar e introduz confusões em alguns pontos. De acordo com Hart, uma das confusões gerada por tal definição pode ser exemplificada com o seguinte caso: sanções podem tomar a forma de pagamento compulsório em dinheiro, como multas; mas impostos também assumem essa forma. Ambos são casos de delito? Pode-se argumentar que a multa é uma punição para uma atividade condenada oficialmente (por conseguinte é um delito) e o imposto não é, quer dizer, para solucionar o problema teríamos que 2 “pisar fora da definição jurídica de delito”, uma vez que esta não inclui referências a fatos sociais. 3. Qual o problema indicado por Kelsen para aduzir a invalidade de duas proposições normativas ao mesmo tempo? (1,5). Por que Hart não aceita a visão dele? (1,5) Suponhamos um conflito entre uma norma de Direito Positivo e uma norma moral. Kelsen argumentaria que não pode existir uma relação entre Direito e Moral, tal qual uma regra válida de direito esteja em conflito com uma regra moral válida porque “duas normas contraditórias não podem ser ambas válidas”. Destarte, normas válidas não podem existir uma ao lado da outra e estar em conflito, Kelsen fundamenta esta argumentação em dois pontos: Primeiramente, de acordo com as próprias palavras de Kelsen, “O jurista ignora a moral como um sistema de normas válidas, assim como o moralista ignora o Direito Positivo como sendo tal sistema. (...). E não existe nenhum terceiro ponto de vista”. Hart, por outro lado, contra-argumenta afirmando que nenhum ser humano é somente um jurista ou somente um moralista, alguém pode pensar sobre normas tanto jurídicas como morais e considerando seus significados como normas, chegar a conclusão de que elas estão em conflito. Em um segundo ponto Kelsen mostra que uma proposição segundo a qual uma regra legal válida e um princípio moral estão em conflito consistiria, por si mesma, uma impossibilidade lógica. Para ele isto seria o mesmo que afirmar tanto “A deve ser” como “A não deve ser”, ou melhor, seria o equivalente a afirmar que “A é” e “A não é”, uma contradição em termos e, por conseguinte, logicamente impossível. Mais uma vez, Hart objeta o ponto de vista kelseniano mostrando que “A deve ser” e “A não deve ser” são contrários, mas não contraditórios. Um significado aceitável para “A deve ser feito” é que “existem boas razões para fazer A”. Assim, “A deve juridicamente ser feito e A não deve moralmente ser feito” é equivalente a “Existem boas razões jurídicas para fazer A e boas razões morais para não fazer”. Como é logicamente impossível para uma pessoa fazer tanto A como não A ao mesmo tempo, isso expressa um conflito, todavia não afirma qualquer coisa contraditória ou logicamente impossível. 3