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04/07/2012
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Pai do Plano Real cobra reformas
Sinopses
Um dos formuladores do programa econômico que acabou com a hiperinflação no Brasil, Edmar
Bacha defende ampla reforma no setor público para o país crescer de forma sustentável
Sinopses(1997 2008)
"É preciso reformar o setor público"
Quem somos
Um dos pais do Plano Real, o economista Edmar Bacha lamenta que o governo não tenha dado
continuidade às reformas, essenciais para o país crescer de forma sustentável
ROSANA HESSEL
>> entrevista Edmar Bacha
Primeiro brasileiro a concluir o doutorado em economia na prestigiosa Universidade Yale, o
economista Edmar Bacha é considerado um dos pais do Plano Real, lançado em 1994, no
governo Itamar Franco. Bacha coordenou o Departamento de Economia da Pontifícia
Universidade Católica do Rio (PUC-Rio), de onde saiu a equipe que desenvolveu o programa.
"Desde 1982, discutíamos alternativas para a estabilização. Em 1993, estávamos prontos para
colocar as ideias em prática", conta.
Bacha ganhou notoriedade ao escrever, nos anos 1970, a fábula da "Belíndia", em que dizia que
o regime militar estava criando um país dividido entre os que moravam em condições similares
às da Bélgica e aqueles que tinham padrão de vida da Índia. Nos anos 1980, no governo José
Sarney (1985-1990), participou do Plano Cruzado e presidiu o Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE). Com Fernando Henrique Cardoso, comandou o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) por cerca de um ano. Atualmente, integra o
think thank fluminense Casa das Garças.
Para Bacha, um dos erros na execução do Plano Real foi o país não ter dado continuidade às
reformas necessárias. Entre os acertos, destaca o fato de o país ter se livrado do estigma de
que nada aqui dava certo. Ele recorda a histórica frase "Le Brésil n"est pas un pays sérieux",
atribuída ao ex-presidente francês Charles de Gaulle (1959-1969): "Nenhum candidato a De
Gaulle pode hoje dizer que o Brasil não é um país sério", afirma. A seguir a entrevista concedida
ao Correio:
O Plano Real chega à maioridade. Mas, apesar dos avanços dos
últimos 18 anos, o Brasil ainda não consegue crescer de modo
sustentável sem enfrentar o fantasma da inflação. Onde o país falhou?
É uma falha relativa. Comparado com nosso próprio passado, não há falha alguma. Comparado
com o resto do mundo depois de 2008, também não há qualquer falha. Falhamos ao não
realizar plenamente o potencial de crescimento do país. Faltou determinação de continuar as
reformas econômicas, a partir da crise do mensalão, em 2005. Sem reformas, a produtividade
estancou e o investimento não cresceu.
É possível pensar em um Plano Real II, agora com o intuito de fazer
as reformas abandonadas e ampliar a infraestrutura? O que é preciso
para obter a unidade que levou ao Real em julho de 1994?
Pensar é possível e desejável. O que falta é a decisão política. Em 1994, havia a consciência de
que, ou estabilizávamos a economia ou cairíamos num buraco sem fim. Agora falta o consenso
de que é preciso reformar o setor público para termos crescimento sustentável. Mas já há um
começo, tanto na comissão comandada por Gerdau (Jorge Gerdau Johannpeter, presidente do
Comitê de Gestão e Competitividade da Presidência), quanto na recente comissão parlamentar
para a reforma do setor público.
para a reforma do setor público.
A que o senhor atribui o sucesso do real? Por que o país
fracassou tantas vezes até conseguir derrotar a hiperinflação?
Foi um aprendizado penoso. Os militares resolveram conviver com a inflação e aperfeiçoaram a
indexação. Aí houve a crise da dívida externa. Depois os percalços da redemocratização,
culminando com o trauma do Plano Collor. Naquela altura, ninguém aguentava mais a
superinflação. Na PUC-Rio, vínhamos desde 1982 discutindo alternativas para a estabilização.
Em 1993, estávamos prontos para colocar as ideias em prática. Então, Itamar Franco nomeou
Fernando Henrique como ministro plenipotenciário e o resto foi história.
Se o Plano Real fosse elaborado hoje, o que teria de diferente?
Haveria um processo total de desindexação da economia?
Em vez do câmbio fixo já se adotaria logo o sistema de taxas flutuantes?
O projeto original previa a desindexação total. Mas a negociação no Congresso exigiu a
manutenção de alguma indexação residual. Além disso, o ajuste fiscal foi menos forte do que o
necessário, pois não foi possível aprovar as reformas constitucionais. Tudo o que se conseguiu
foi o Fundo Social de Emergência (hoje chamado de Desvinculação das Receitas da União). Com
isso, o câmbio teve que fazer o papel de âncora, ao lado nas altas taxas de juros. Se fôssemos
começar de novo, seria preciso mudar a história, fazendo a revisão constitucional em 1995 e
não em 1993. Com um reforma constitucional, seria possível adotar mais cedo o regime de
câmbio flutuante e baixar as taxas de juros.
Nos últimos anos, o crescimento do Brasil foi baseado no consumo das famílias.
Esse modelo está esgotado? Por que ainda resistimos tanto a adotar um choque de
investimentos? As taxas de juros estão no menor patamar da história, mas as empresas se
recusam a ampliar a produção.
Não sei se é inteiramente verdadeira essa afirmação. A taxa de investimento em preços
constantes aumentou continuamente de 2005 até 2011 (exceto em 2009, por causa da crise
externa). O Brasil ainda investe pouco, mas muito mais do que investia em 2005. Agora, há
uma crise séria na economia mundial que desalenta o setor privado. Por outro lado, o
investimento público está paralisado. E há uma enorme resistência no governo a fazer o óbvio:
transferir para o setor privado a responsabilidade por investimentos que não consegue fazer na
infraestrutura — em portos, aeroportos, estradas, energia, etc. É preciso é superar essa
paralisia e oferecer alternativas de investimento para o setor privado.
O Brasil enfrentou muitas crises internacionais ao longo de quase duas décadas.
Caiu de joelhos na maioria das vezes por causa da fragilidade das contas externas.
Com o mundo em recessão, os preços das commodities tendem a desabar. Há riscos
de uma nova tempestade no balanço de pagamentos?
O volume de reservas internacionais é suficiente para enfrentar problemas que possam se
manifestar na área externa. Também não há perspectiva de o preço das commodities desabar.
Afinal, a limitação dos recursos naturais é o problema central do planeta quando se olha o
futuro.
Como o senhor avalia a política macroeconômica do
governo Dilma? Ela está sendo bem conduzida?
Quais são os principais pontos positivos e negativos?
De positivo, estar aproveitando a crise mundial para reduzir os juros. De negativo, não
conseguir superar a paralisia de investimentos em infraestrutura.
O governo adotou um viés intervencionista na economia. Essa presença maior do
Estado no setor produtivo pode pôr a perder conquistas do Real?
Tão ruim como o intervencionismo é o protecionismo. Com isso estão tentando evitar o
processo schumpeteriano de criação destrutiva, que é a base da prosperidade no capitalismo.
Com essa política absurda de conteúdo nacional, continuaremos a produzir carroças e não
vamos chegar ao pré-sal.
O Brasil ganhou voz no mundo e hoje é ator influente na política global.
Em que a estabilidade econômica contribuiu para isso? Essa relevância veio para ficar?
O Plano Real só tem 18 anos. Daqui a 32 anos poderemos fazer essa avaliação, se a
estabilidade interna, que é a base da relevância externa, veio para ficar. Mas nenhum candidato
a De Gaulle vai poder hoje dizer que o Brasil não é um país sério, como disse o general francês
na década de 1960. Mérito da redemocratização, do real e da continuidade de políticas
econômicas e sociais desde então.
Qual é maior legado do Plano Real e o que ainda precisa ser feito para aperfeiçoá-lo?
O maior mérito é ter mudado a cara do Brasil. Antes, éramos uma nau sem rumo, hoje somos
uma economia emergente. Para aperfeiçoar, é preciso voltar às reformas.
adicionada no sistema em: 04/07/2012 04:59
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