ARTIGO 18- TEMA: DEVER DE TODOS Comentário de

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ARTIGO 18- TEMA: DEVER DE TODOS
Comentário de João Benedito de Azevedo Marques
Secretário de Assuntos Penitenciários/São Paulo
O dispositivo acima reproduz princípios constantes da Declaração Universal
dos Direitos da Criança, das Regras Mínimas da ONU para a Administração da
Justiça de Menores e da Convenção sobre os Direitos da Criança, sendo que
não constava, expressamente, do antigo Código de Menores (Lei 6.697/79),
que, entretanto, tinha uma regra interpretativa protetora de caráter geral,
representada pelo art. 5°, que dispunha "Na aplicação desta Lei a proteção aos
interesses do menor sobrelevará qualquer outro bem ou interesse
juridicamente tutelado".
E forçoso reconhecer, contudo, que a regra do art. 18 é específica, repetindo a
norma do art. 227 da CF, que reconheceu um direito à dignidade da criança e
do adolescente e veio a preencher uma lacuna, protegendo o menor de
"qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou
constrangedor", sendo, por isso, um notável avanço, pois demonstra
claramente a preocupação do legislador quanto à necessidade de se defender
o status dignitatis do menor.
Este direito à dignidade é expresso em vários dispositivos da nova lei, tais
como os arts. 22, 53, 208, 232, 233, 240 e 241, entre outros (estas normas, de
caráter sancionador ou não, visam sempre à proteção da pessoa da criança e
do adolescente).
O desrespeito ao direito à dignidade da criança e do adolescente poderá dar
margem a ações civis públicas, que serão propostas pelo Ministério Público,
que tem a incumbência de zelar por estes direitos (art. 201, VIII), ou aos crimes
previstos no Estatuto.
A sociedade brasileira, ao longo do tempo, nunca respeitou o direito à
dignidade de milhões de crianças e adolescentes marginalizados, que são
discriminados, social e economicamente, desde a gestação, passando pela
infância e adolescência, continuando pela idade adulta e terminando, muitas
vezes, na morte violenta ou decorrente de subnutrição.
Toda esta situação leva-nos a afirmar que o menor, antes de ser infrator ou
abandonado, é vítima de uma sociedade de consumo, hipócrita, desumana e
cruel.
Por isso, é preciso que os dispositivos constitucionais e os princípios protetores
da nova lei sejam traduzidos numa nova sociedade, em que se respeite a
dignidade da pessoa. E, para esta luta, importante papel caberá, sem dúvida,
ao Ministério Público.
Esta é a razão pela qual há necessidade de se investir na criança e no
adolescente, como bem lembra Veillard Cybulski, quando diz: "... a proteção do
adolescente que é infrator, inadaptado ou em perigo moral representa um
investimento análogo ao investimento com a educação. O capital fundamental
de uma nação é a população adolescente, da qual depende a sua
sobrevivência e prosperidade. Uma juventude sadia, instruída e bem educada,
preparada para a idade adulta e integrada na vida da nação, é um investimento
preferencial" (International Review of Crirlf,inal Policy, 1966).
Entre nós, o grande mestre Jason Albergaria ensina que: "... o investimento na
educação da criança e do adolescente é de alta rentabilidade a longo prazo,
porque determinará a promoção humana da criança e do adolescente e,
consequentemente, o progresso ou avanço ético da própria sociedade"
(Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente).
É importante salientar que é dever de todos velar pela dignidade da criança e
do adolescente. Esta função não se limita aos pais e aos responsáveis legais,
estendendo-se a qualquer pessoa que tenha conhecimento de algum abuso ou
desrespeito à dignidade da criança e do adolescente, devendo comunicá-la ao
Ministério Público, que tem a obrigação legal de propor as medidas judiciais e
extrajudiciais necessárias.
A intenção do legislador foi, na verdade, corresponsabilizar toda a sociedade
por este direito da criança e do adolescente quando usou a expressão "é dever
de todos...".
O respeito a este direito está vinculado à sobrevivência do regime democrático.
A Democracia é uma forma de governo de participação e igualdade de direitos
e é incompatível com a miséria absoluta, que ofende o status dignitatis da
criança brasileira.
Se não houver mudanças sensíveis no atual quadro social e econômico,
estaremos sendo coautores de um verdadeiro genocídio praticado contra
milhões de menores marginalizados, submetidos diariamente a tratamento
desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor, nas ruas, nas
escolas, no trabalho e nas famílias.
O princípio contido na norma é programático, vela pela dignidade da criança e
do adolescente, impedindo, por isso, qualquer tratamento antiético, nas formas
discriminadas no art. 18, e implica a construção de um novo País.
A norma legal existe e sua aplicação depende da mobilização de toda a
sociedade, da vontade política do governo e da atuação do Ministério Público,
incumbido de zelar pelo efetivo cumprimento da mesma junto à Justiça da
Infância e da Juventude.
Este texto faz parte do livro Estatuto da Criança e do Adolescente
Comentado, coordenado por Munir Cury
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