Dependência de Substâncias Psicoativas

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Dependência de Substâncias Psicoativas
AUTORES
Melissa Garcia Tamelini
Especialista em Psiquiatria pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de
São Paulo (HC-FMUSP)
Susan Meire Mondoni
Especialista em Psiquiatria pelo Hospital da s Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de
São Paulo (HC-FMUSP)
Mestrado em Psicologia Clínica pelo Instituto de Psicologia da USP
INTRODUÇÃO E DEFINIÇÕES
A trajetória humana sempre esteve associada ao uso de substâncias psicoativas.
Muitas delas já tiveram seu uso indiscriminado e, inclusive, incentivado por
profissionais de saúde. Drogas como o tabaco e a cocaína eram vistas como
potencializadores cognitivos; o ácido lisérgico era tido como um estimulante da
criatividade. Foi somente a partir da década de 1960 que os malefícios e o potencial
para desenvolver uso abusivo e dependência foram definitivamente reconhecidos.
Desde então, seu uso tem sido desaconselhado e inclusive pr oibido na maioria dos
países.
Apesar disso, o número de novas drogas e de “usuários -problema” tem crescido
espantosamente. Nas últimas décadas, a questão tornou -se prioritária no âmbito de
saúde pública. Além do aumento no consumo, tal destaque é embasado pela maior
precocidade no início deste uso e pela abrangência e impacto das complicações
clínicas e sociais associadas. Entretanto, em detrimento deste destaque, ainda
observamos largas deficiências no conhecimento geral sobre o assunto e na
abordagem destes indivíduos pelos profissionais de saúde.
Substâncias psicoativas são aquelas que alteram o psiquismo. Diversas dessas
drogas possuem potencial de abuso, ou seja, são passíveis da autoadministração
repetida e consequente ocorrência de fenômenos, como us o nocivo (padrão de uso de
substâncias psicoativas que está causando dano à saúde física ou mental), tolerância
(necessidade de doses crescentes da substância para atingir o efeito desejado),
abstinência, compulsão para o consumo e a dependência (síndrome composta de
fenômenos fisiológicos, comportamentais e cognitivos no qual o uso de uma
substância torna-se prioritário para o indivíduo em relação a outros comportamentos
que antes tinham maior importância).
As substâncias psicoativas são divididas em três grupos:
1. Drogas psicoanalépticas ou estimulantes do SNC (cocaína,
anfetamina, nicotina, cafeína etc.).
2. Drogas psicolépticas ou depressoras do SNC ( álcool,
benzodiazepínicos, barbitúricos, opioides, solventes etc.
3. Drogas psicodislépticas ou alucinógenas (cannabis, LSD, fungos
alucinógenos, anticolinérgicos etc.).
Os limites são pouco nítidos entre o uso recreativo, o abuso e a dependência de
substâncias psicoativas. Postula-se que sejam fenômenos que ocorram em um
continuum e que alguns parâmetros orientem a transição de um estágio para o outro
(tais como o impacto funcional, as consequências e restrições d ecorrentes do
consumo da substância, assim como o desenvolvimento de mecanismos fisiológicos
de adaptação à presença da substância, como tolerância e abstinência).
O abuso ou uso nocivo seria um momento intermediário entre o uso recreativo
(de baixo risco, não sendo caracterizado como um problema médico) e a dependência.
Já há prejuízo decorrente do consumo da substância, mas ainda há algum controle do
indivíduo quanto à quantidade consumida e à duração dos efeitos.
A dependência de substâncias psicoativas é uma síndrome cujo elemento
central é um desejo intenso de consumir a substância. Dois pontos devem ser
observados:
1. Os critérios diagnósticos não divergem de acordo com a substância
usada.
2. É vista como um fenômeno global, cuja prioridade é o aspecto
qualitativo e não quantitativo do consumo (não há divisão entre
dependência física e psicológica) ( Tabela 1).
Tabela 1: Critérios diagnósticos da CID -10 para a síndrome de dependência de
substâncias psicoativas
Um diagnóstico definitivo de dependência dev e ser estabelecido apenas quando
3 ou mais dos seguintes fatores foram experimentados ou exibidos em algum
momento durante o ano anterior:
Um forte desejo ou senso de compulsão para consumir a substância
Dificuldades de controlar o comportamento de uso d a substância quanto ao seu início,
final ou níveis de uso
Um estado de abstinência fisiológica quando o uso da substância é interrompido ou
reduzido, conforme evidenciado pela síndrome de abstinência característica da
substância ou pelo uso da mesma substância a fim de evitar ou aliviar os sintomas de
abstinência
Evidência de tolerância, de modo que doses crescentes da substância psicoativa são
necessárias para obter efeit os originalmente produzidos por doses menores
Desinteresse progressivo por atividades ou prazeres alternativos em favor do uso de
substância psicoativa; aumento do tempo necessário para obter ou usar a substância
ou para se recuperar de seus efeitos
Persistência no uso da substância a despeito de evidências claras de consequências
danosas
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
Quanto à etiologia e à fisiopatologia do abuso e da dependência de substâncias
psicoativas, não há respostas satisfatórias e definitivas. D iversas hipóteses buscam
contemplar a motivação envolvida no consumo e na dependência a determinadas
substâncias, fenômeno provavelmente multifatorial. Uma teoria de destaque neste
campo é a do sistema de recompensa, o qual supostamente comanda as
necessidades essenciais à sobrevivência do indivíduo e da espécie. Assim, atividades
estimulantes ativam o circuito da recompensa (circuito córtico -límbico), liberando
neurotransmissores responsáveis por uma sensação de bem -estar e prazer (sobretudo
dopamina e glutamato) e, consequentemente, desejo por repetir a experiência.
Postula-se que, na dependência química, ocorra uma alteração nesta aprendizagem: a
adição a drogas aumenta a libe ração de dopamina e promove uma
“superaprendizagem” no sistema de recompensa. Isso eleva os níveis de glutamato e
promove o comportamento de busca ativa da droga, para re -equilibrar o sistema de
recompensa. Esta “superaprendizagem” é memorizada pelo sistem a, o que
teoricamente faz um indivíduo dependente ser sempre dependente. Outros circuitos
neuronais e neurotransmissores também podem estar envolvidos na mediação
fisiológica do consumo de drogas. Uma compreensão global ainda parece estar longe
de ser obtida.
ACHADOS CLÍNICOS
Uso e Intoxicação
A intoxicação, segundo o DSM -IV, é a síndrome reversível e específica devido à
ingestão de uma substância, composta de alterações comportamentais, psicológicas
ou fisiológicas clinicamente significativas e mal -adaptativas (efeito da substância sobre
o sistema nervoso central).
Álcool
O álcool é a substância psicoativa usada mais larga e precocemente (a primeira
experiência tipicamente ocorre na adolescência) na vida. Trata -se de um depressor do
sistema nervoso central (SNC), cujo mecanismo de ação neurofisiológico ainda não
está totalmente esclarecido. Em pequenas quantidades, provoca sensação de bem estar, expansividade, relaxamento e desinibição comportamental, além de
comprometimento da coordenação motora. A prog ressão do consumo de álcool causa
comprometimento da atenção e da capacidade de julgamento, humor eufórico, irritado
ou deprimido e labilidade afetiva. Os achados característicos incluem hálito alcoólico,
fala embriagada, hiperemia conjuntival, ataxia e ou tras alterações de coordenação.
Com doses ainda mais elevadas, há lentificação psicomotora, sonolência e diminuição
progressiva do nível de consciência, inclusive com possibilidade de coma. Pode levar
à morte, por depressão respiratória ou aspiração de con teúdo gástrico, em
intoxicações muito severas. De forma geral, a gravidade dos sintomas da intoxicação
mantém relação direta com a alcoolemia. Pode haver amnésia posterior para os
eventos ocorridos durante a intoxicação. A resolução é espontânea e geralmen te
ocorre em um período de até 12 horas após a interrupção do consumo (o organismo
metaboliza cerca de 0,015 mg% de álcool/hora).
O tratamento da intoxicação inclui o asseguramento do término do consumo de
álcool, a monitoração dos sinais vitais e o tratam ento de suporte. Pode-se prescrever
tiamina 100 mg EV ou IM, seguidos de 300 mg VO por 6 dias (prevenção da síndrome
de Wernicke-Korsakoff, complicação que ocorre em alcoolistas severos). Deve -se
evitar a administração indiscriminada de glicose, exceto em casos de hipoglicemia.
Quando necessário, utilizar somente após a prescrição de tiamina.
A intoxicação idiossincrática é a marcante alteração comportamental,
acompanhada de agitação psicomotora e agressividade, com duração e remissão
rápidas (poucas horas), que ocorre após o uso de pequena dose de álcool, a qual não
intoxicaria a maioria dos indivíduos. É muito frequente que os eventos ocorridos
durante o episódio não sejam recordados pelo indivíduo (amnésia lacunar). Possíveis
fatores de risco são: presença de lesão cerebral, patologias crônicas debilitantes
preexistentes e idade avançada. O diagnóstico diferencial deve ser feito com outras
causas de intoxicação (por álcool não-idiossincrática, cocaína e benzodiazepínicos),
crises epilépticas, delirium tremens, quadros dissociativos, quadros orgânicos e outros
quadros psiquiátricos agudos.
No tratamento destes quadros, deve -se manter o paciente em observação clínica
(geralmente por algumas horas, devido ao risco de auto ou heteroagressividade) e
contenção física, caso seja necessário. Pode -se administrar antipsicóticos (como
haloperidol 5 mg IM) para controle da agitação psicomotora.
Benzodiazepínicos
Os benzodiazepínicos incluem uma grande variedade de medicações,
largamente prescritas, que se diferenciam sobretudo pela meia -vida. Possuem uma
ação depressora reversível sobre o SNC, atuando primariamente sobre os receptores
do complexo GABA (ácido gama -aminobutírico) tipo A.
Provocam graus variáveis de sedação, sonolência e relaxamento muscular, além
de comprometimento cognitivo e do desempenho psicomotor. Possuem ação
anticonvulsivante e induzem tolerância e dependência física.
A intoxicação por essas substâncias é marcada pela excessiva sedação, ataxia,
confusão e estupor e, em alguns casos, alterações comportamentais e agressividade.
Pode ser uma síndrome semelhante à da intoxicação alcoóli ca e a intoxicação
concomitante de ambas as
cardiorrespiratórias e morte.
substâncias
aumenta
o
risco
de
alterações
O tratamento consiste em medidas de suporte geral. No caso de ingestão aguda
ou intencional, pode-se indicar lavagem gástrica com carvão ati vado, desde que logo
nas primeiras horas após. No tratamento de casos dramáticos, em ambiente
hospitalar, deve-se usar um antagonista de benzodiazepínicos, como flumazenil 0,2
mg EV a cada 30 segundos até resposta do paciente. Evitar doses maiores que 3
mg/hora.
Maconha
A maconha é a droga ilícita mais usada no mundo. É extraída de uma planta
chamada Cannabis sativa e o principal composto psicoativo é o delta -9-tetrahidrocanabiol (THC), cujo mecanismo de ação ainda não é totalmente conhecido. A
droga conhecida como haxixe possui concentração de THC cerca de 10 vezes
superior a da maconha e ambas as substâncias, no geral, são fumadas, mas podem
ser ingeridas.
Os efeitos da maconha iniciam -se logo após ser fumada e duram cerca de 2 a 5
horas. Certo prejuízo das habilidades motoras pode permanecer por até 12 horas. Os
efeitos psíquicos são variáveis, por vezes dependentes da expectativa do usuário, e
incluem um efeito euforizante, relaxament o, diminuição da ansiedade, alterações da
percepção temporal e espacial, aumento da percepção das cores, sons, textura e
paladar, além de aumento do apetite. Também ocorre hiperemia conjuntival e
midríase, leve taquicardia, boca seca, tremores de mãos, alt eração da coordenação
motora, da atenção e da memória e diminuição da força muscular. Pode haver
ansiedade, reações agudas tipo pânico, experiências de despersonalização e
desrealização, além de ideias autorreferentes e alucinações. Em doses mais elevadas,
pode ocorrer hipotensão ortostática. Não é frequente a presença de pacientes com
intoxicação por maconha em serviços de emergência. No geral, não há necessidade
de medidas farmacológicas (antipsicóticos e benzodiazepíncos, em baixas doses),
bastando o reasseguramento do paciente e o esclarecimento da natureza dos
sintomas.
Estimulantes
Os estimulantes do SNC incluem cocaína, anfetamina e substâncias
anfetaminoides (usadas como anorexígenos), entre outros.
O principal efeito da cocaína é o bloqueio da r ecaptação de dopamina e de
outras monoaminas, como noradrenalina e serotonina, levando ao acúmulo destes
neurotransmissores na fenda sináptica. Pode ser usada por via intranasal, endovenosa
e fumada (crack: cocaína, em sua forma de base livre, misturada a diversos solventes
e de efeito muito potente), e é altamente aditiva. O uso da cocaína provoca sensação
de euforia, excitação e bem -estar, aumento da vigília, desinibição e aceleração das
funções cognitivas. Os efeitos psíquicos são acompanhados por taquic ardia, aumento
da temperatura corpórea, aumento da frequência respiratória, sudorese, tremores
leves de extremidades, espasmos musculares, tiques e midríase. Tais efeitos têm
curta duração (de 30 a 60 minutos), acarretando a administração repetida da droga .
As anfetaminas típicas (dextroanfetamina, metanfetamina e metilfenidato) e
drogas anfetaminérgicas (anfepramona, femproporex, dietilpropiona) aumentam a
liberação de neurotransmissor es das terminações nervosas, como dopamina,
noradrenalina e serotonina. São substâncias muito prescritas no Brasil e que
frequentemente estão em formulações para redução de peso. Produzem sensação de
euforia, aumento da disposição e do estado de vigília, i nibem o apetite e geram
hiperatividade autonômica.
A intoxicação por estimulantes produz taquicardia, hipertensão, aumento da
temperatura corpórea, midríase, tremor de extremidades e vasoconstrição, calafrios,
náuseas e/ou vômitos. Os efeitos psíquicos mai s comuns são humor eufórico ou
irritado, hipervigilância, ansiedade, medo, tensão, comprometimento da capacidade de
julgamento, comportamentos estereotipados e agitação psicomotora (retardo
psicomotor é bem menos frequente). Pode haver também ideias autorr eferentes e de
conteúdo persecutório, alucinações, crises de pânico e heteroagressividade. O uso de
altas doses de cocaína ( overdose) pode levar a eventos potencialmente fatais, como
crises convulsivas, delirium, depressão respiratória, acidentes vasculare s cerebrais,
alterações cardiovasculares ( angina pectoris, arritmias, infarto agudo do miocárdio),
entre outros. O tratamento é fundamentalmente sintomático, visando a manutenção
das funções vitais básicas até que ocorra a eliminação da droga. Devem -se monitorar
os sinais vitais, com atenção especial a medidas de temperatura corpórea e glicemia.
Pode-se usar betabloqueadores (sintomas adrenérgicos muito intensos),
benzodiazepínicos (disforia, ansiedade e convulsões) e antipsicóticos (agitação
psicomotora e sintomas psicóticos).
Nicotina
A nicotina é a substância psicoativa do tabaco. É também um estimulante do
SNC, com grande poder de causar dependência. Os efeitos incluem melhora das
capacidades cognitivas, como atenção, humor e relaxamento. Também causa efeitos
adversos agudos como náusea e/ou vômitos, aumento da salivação, diarreia, tontura,
cefaleia, além de sinais de hiperatividade autonômica em pacientes não -habituados. A
intoxicação aguda por nicotina não traz risco de vida para os usuários.
A importância do tabagismo deve-se principalmente ao seu caráter crônico e
decorrente potencial de aumento expressivo nas taxas de mortalidade por causas
médicas gerais.
Opioides
Os opioides podem ser naturais (morfina, codeína), semissintéticos (heroína) ou
sintéticos (meperidina, metadona, fentanil etc.) derivados do ópio. São utilizados
principalmente por via oral, mas também podem ser administrados por via
endovenosa, inalados ou fumados ( a heroína costuma ser usada por via endovenosa).
O principal sítio de ação são receptores opioides específicos no SNC, e seus efeitos
incluem analgesia, euforia, alterações de humor, bradipneia, bradicardia, obstipação
intestinal, miose, tremor, sonolência e confusão mental. O desenvolvimento de
tolerância é bastante rápido, configurando -se como substâncias altamente aditivas.
Os sintomas de intoxicação incluem sedação e apatia, disforia ou irritabilidade,
agitação ou retardo psicomotor, fala arrastada, co mprometimento de memória e
atenção, depressão respiratória, cianose, miose (pupilas em “ponta de alfinete”),
bradicardia, hipotermia, hipotensão, edema pulmonar, arritmias cardíacas e
convulsões. Trata-se de uma emergência médica, já que pode haver morte e m
decorrência da depressão respiratória ou ainda do edema pulmonar e/ou cerebral
(depressão cardíaca e do SNC). O diagnóstico de intoxicação por opioides deve ser
sempre considerado na presença da tríade rebaixamento do nível de consciência,
miose e depressão respiratória.
O tratamento da intoxicação por opioides engloba medidas gerais e de suporte,
especialmente os cuidados com a depressão respiratória, e o uso de antagonistas de
opioides para os casos de overdose: naloxona 0,8 mg EV. Permanecendo sem
resposta por 15 minutos, administrar 1,6 mg EV. Se continuar sem resposta por mais
15 minutos, administrar 3,2 mg EV.
Como regra geral, observa-se uma resposta clínica, com reversão da depressão
respiratória, midríase e melhora do nível de consciência em pouc os minutos. A
naloxona possui meia-vida curta e pode haver reaparecimento dos sintomas em 4 a 5
horas. Deve-se reconsiderar o diagnóstico de intoxicação nos casos em que esse
padrão de melhora não é observado. Recomenda -se cautela quanto ao risco de
desencadeamento de uma crise severa de abstinência por opioides após a
administração de naloxona.
Evitar o uso de diuréticos para o tratamento do edema pulmonar, uma vez que
este decorre do extravasamento dos capilares pulmonares, e não da sobrecarga de
fluidos.
Solventes (Inalantes)
Os solventes são depressores do SNC e contêm substâncias químicas voláteis
aditivas em sua formulação (como tolueno, benzeno, tricloetano, acetona e
hidrocarbonetos alogenados). Incluem colas de sapateiro, propulsores de aerossóis,
tintas, vernizes, esmaltes e removedores, no geral drogas de fácil acesso, inaladas
principalmente por crianças e adolescentes de baixa renda. Embora ocorra tolerância,
os sintomas de abstinência em geral são pouco intensos. Os efeitos dos inalantes têm
início após alguns minutos e, em geral, são intensos e efêmeros, incluindo hiperemia
de conjuntivas, diplopia, fotofobia, zumbido, irritação de mucosas, fala pastosa,
vertigem e alterações de marcha. Os efeitos psíquicos são euforia, excitação, risos
imotivados e desinibição (efeitos passageiros, pois são substâncias depressoras do
SNC), sensação de flutuação corpórea e ilusões sensoriais. Em doses mais elevadas,
pode haver ansiedade, medo, alucinações visuais e auditivas e distorções corpóreas.
O uso de doses maiores de inalantes provoca apatia, alteração comportamental
(apatia, agressividade etc.), alucinações intensas, náuseas e/ou vômitos, dores
torácicas e musculares, anorexia, nistagmo, diplopia, reflexos deprimidos e ataxia.
Pode haver convulsões, depr essão respiratória e cardíaca, arritmias e rebaixamento
do nível de consciência; há risco de morte súbita. Pode haver amnésia para os
eventos ocorridos durante o período de intoxicação intensa. O tratamento é feito com
medidas de suporte geral, já que não há medidas específicas.
Alucinógenos
Os alucinógenos são substâncias naturais ou sintéticas que induzem alterações
sensoperceptivas, como alucinações e ilusões, além de perda do contato com a
realidade e delírios, sem que ocorra estimulação ou depressão do SNC. Incluem a
psilocibina (extraída de alguns cogumelos), a dimetiltriptilina, a mescalina e a
ayuhuasca (ingerida no ritual do Santo Daime ou Culto da União Vegetal e outras
seitas). O alucinógeno sintético mais conhecido é a dietilamina do ácido lisé rgico
(LSD). Algumas outras substâncias, em geral em altas doses, também são passíveis
de induzir efeitos alucinógenos, como os anticolinérgicos (p. ex., biperideno).
O início de ação dos alucinógenos ocorre em cerca de 60 minutos, atinge o auge
em 2 a 4 horas e tem duração média de 8 a 12 horas. Os efeitos dependem da
sensibilidade individual à droga, do estado psíquico e das condições ambientais nas
quais se deram o uso, resultando em experiências agradáveis ou desagradáveis (bad
trip). Os efeitos relatados variam de intensificação da percepção de cores, sons,
odores e paladares, alteração da percepção têmporo -espacial e da imagem corpórea,
alucinações (visuais são as mais frequentes), alterações qualitativas e quantitativas
das emoções, estados de exalta ção e misticismo até ansiedade, angústia, medo e
pânico. Também pode haver ideias delirantes agudas, habitualmente com conteúdo
grandioso ou persecutório. Quanto aos efeitos físicos, são habitualmente restritos,
como leve taquicardia e midríase. Em doses e levadas, pode haver sintomas
psicóticos, ansiosos e depressivos intensos, acompanhados de efeitos
simpaticomiméticos. Há relatos de mortes e também de uma síndrome similar à
síndrome neuroléptica maligna. O tratamento das intoxicações por alucinógenos é fe ito
por meio de medidas de suporte, tranquilização verbal, observação e proteção do
indivíduo e uso de benzodiazepínicos e antipsicóticos em casos de sintomatologia
exacerbada.
Pode ocorrer tolerância, que surge e desaparece em poucos dias; não há
dependência física e a dependência psicológica é rara.
Club Drugs
São substâncias sintéticas, usadas principalmente a partir da década de 1990,
por jovens em festas, discotecas e raves. Guardam entre si características culturais
ligadas ao seu consumo e não são semelhantes quanto às propriedades
farmacológicas. As consequências, ao longo prazo, destas substâncias não estão
plenamente estabelecidas. É frequente o uso concomitante de mais de uma club drugs
e também com álcool, maconha, LSD etc.
1. MDMA (Ecstasy)
Anfetamina sintética com propriedades estimulantes, usada sob a forma de
pílulas. O principal mecanismo de ação é no sistema serotoninérgico e os efeitos se
iniciam cerca de 30 minutos após a ingestão, com o aparecimento de sensação de
intenso prazer (rush ou flash) e aumento da percepção sensorial. A seguir, há uma
fase de platô, com duração de 3 a 4 horas, cujos pr incipais efeitos são psicológicos,
como alteração da percepção temporal, diminuição da agressividade e do cansaço,
alterações na percepção visual, mudança de discurso e aumento da consciência das
emoções, necessidade de aumentar a interação pessoal com pro fundo sentimento de
empatia e sensação de profunda conexão com o mundo. Comumente ocorre agitação
psicomotora. Entre os efeitos adversos, destacam -se anorexia, trismo, bruxismo,
sudorese, nistagmo, tiques e cefaleia. Em alguns usuários, a sensação de eufor ia
inicial pode ceder espaço para o humor depressivo, ansiedade, letargia, insônia e um
profundo desinteresse pela vida, que podem persistir por vários dias.
As complicações agudas, potencialmente fatais, incluem hipertermia
(reconhecida como a complicaçã o que oferece maior risco), delirium, nistagmo, crises
hipertensivas, precordialgias, arritmias cardíacas, hepatites tóxicas, convulsões,
rabdomiólise e coma. Pode ocorrer síndrome serotoninérgica ou síndrome
neuroléptica maligna, facilitadas por condições associadas (estados de desidratação,
excesso de atividade física e alta temperatura ambiente). As consequências tardias
decorrentes do consumo esporádico ou crônico não estão totalmente esclarecidas,
mas especula-se que possa haver lesões em vias serotoni nérgicas cerebrais e
alterações de humor (muitas vezes de difícil tratamento) e cognitivas.
2. Ketamina (Special K)
É uma substância derivada da PCP (fenciclidina), usada principalme nte como
anestésico veterinário, cujo mecanismo de ação não é totalmente compreendido. Os
efeitos iniciam-se na primeira hora após o uso, têm duração média de 6 a 8 horas e
incluem uma sensação de exteriorização ou dissociação do próprio corpo, euforia,
intensificação de cores e sons, distorção do sentido de identidade, analgesia e
amnésia. Pode haver náuseas e vômitos, diarreia, dormência, fala arrastada,
deterioração do controle motor, hipotermia e depressão respiratória. Em altas doses,
pode haver convulsões e morte (1 g da substância pode ser letal). Em casos de
overdose, pode ser necessária a introdução de medidas de suporte geral em serviços
de pronto-socorro. Parece induzir tolerância, mas não produz dependência física.
3. GHB (Ecstasy líquido)
É a sigla referente ao gama -hidroxibutirato, cujo mecanismo de ação também
não é bem estabelecido. Seus efeitos se iniciam 20 minutos após a ingestão e duram
por mais de 24 horas. Há uma sensação de bem -estar, euforia, desinibição e
relaxamento e uma praze rosa sensação de desconexão com o corpo. Alguns
indivíduos podem ter náuseas, vômitos, cefaleia e incapacidade de se movimentar
apesar de estar consciente (indivíduo não responde aos estímulos por cerca de 3
horas). Há um atraso na percepção sensorial e no tempo de reação. Doses elevadas
podem causar ataxia, dificuldade de coordenação, letargia, depressão respiratória,
coma e morte. O uso concomitante com o álcool pode provocar efeito sinérgico,
aumentando o risco de complicações fatais. Pode haver sintomas de abstinência em
usuários crônicos da substância, como dificuldade para dormir, aumento da fadiga,
agitação, que provavelmente pode ser tratada de maneira similar à abstinência de
álcool, apesar de não haver estudos definitivos. Os riscos do uso prolonga do ainda
não são totalmente conhecidos.
Síndrome de Abstinência
A abstinência, segundo o DSM -IV, é caracterizada como uma síndrome
específica (sinais e sintomas característicos) à determinada substância, que surge
devido à interrupção ou à redução no con sumo da mesma (em geral, após uso
prolongado e/ou em altas doses), causando sofrimento e impacto clinicamente
significativos em diversas áreas no funcionamento global do indivíduo.
Álcool
O início dos sintomas ocorre até 48 horas após a diminuição ou a i nterrupção do
consumo de álcool e tem duração de 5 a 7 dias. O sintoma mais característico é o
tremor, que pode vir acompanhado de hiperatividade autonômica (taquicardia,
hipertensão arterial, sudorese, hipotensão ortostática e febre menor que 38°C),
náuseas e/ou vômitos, fraqueza, insônia, ansiedade, irritabilidade, alterações
perceptivas (alucinações e ilusões), cefaleias e outros. Pode haver crises convulsivas,
caracteristicamente do tipo tônico -clônicas generalizadas, em qualquer momento da
síndrome de abstinência (pico em 24 horas após o início). Tais crises ocorrem em
cerca de 3% dos casos, geralmente são autolimitadas e não requerem tratamento
anticonvulsivante contínuo. O diagnóstico diferencial deve ser feito com TCE,
hematoma subdural, infecções, e ncefalopatia hepática, cetoacidose diabética,
hipoglicemia, alterações hidroeletrolíticas, tremor essencial, abstinência de
benzodiazepínicos, intoxicação por estimulantes e outras.
O delirium tremens é a forma grave da abstinência por álcool, evolução de cerca
de 5% dos casos. Geralmente se inicia após 72 horas de abstinência, mas pode
ocorrer sem nenhum prenúncio. O aspecto essencial é o rebaixamento do nível de
consciência (delirium), manifesto por comprometimento da atenção, desorientação
têmporo-espacial e alterações de memória. A confusão mental acontece em um
contexto de tremores grosseiros e sintomas intensos de hiperatividade autonômica.
Frequentemente há alterações sensoperceptivas, como alucinações visuais
(classicamente são pequenos insetos ou an imais), auditivas ou táteis, ideias delirantes
e agitação psicomotora. Pode ocorrer também inversão do ciclo sono -vigília. Trata-se
de uma urgência médica, já que a mortalidade associada a este quadro pode chegar a
15%, caso o tratamento adequado não seja instituído precocemente. O tratamento
segue as mesmas diretrizes da síndrome de abstinência leve -moderada, entretanto a
internação hospitalar é obrigatória e doses maiores de benzodiazepínicos geralmente
são necessárias, inclusive por via endovenosa em alg uns casos. Via de regra, sugere se monitoração contínua em UTI para oferecer suporte adequado.
Tabela 2: síndrome de abstinência pelo álcool
Gravidade
Sinais e sintomas
Tempo
médio
abstinência
Leve
Tremores, irritabilidade, ansiedade, insônia,
náuseas e/ou vômitos
6 a 8 horas
Moderada
Intensificação
dos
sintomas
acima,
hiperatividade
autonômica,
alterações
sensoperceptivas, convulsão
12 a 24 horas
Grave
(delirium
tremens)
Delirium, agravamento dos sintomas acima
(tremores
grosseiros,
hiperatividade
autonômica
marcante,
distorções
perceptivas intensas e níveis flutuantes de
atividade psicomotora)
72 horas
de
Apesar de haver remissão espontânea da síndrome de abstinência, recomenda se o tratamento adequado, visando ao alívio dos sintomas e à prevenção de
complicações, como o delirium tremens. A droga de escolha para o tratamento da
síndrome de abstinência são os benzodiazepínicos, preferencialmente de meia -vida
prolongada (diazepam 10 a 20 mg VO repetidos a cada hora até sedação leve; em
caso de insuficiência hepática, usar lorazepam 4 a 6 mg VO repetidamente, se
necessário). Recomenda-se a retirada gradual da medicação ao longo de 1 semana
(cerca de 10 a 20% da dose inicial a cada 2 dias). Deve -se evitar a administração
profilática e o uso de doses exce ssivas, com consequente sedação demasiada.
Também pode ser utilizado haloperidol (p. ex., 5 mg IM) no caso de agitação
psicomotora intensa ou alucinações.
Frequentemente, estes pacientes, alcoolistas crônicos, apresentam deficiências
vitamínicas e nutricionais. Recomenda-se sobretudo a administração de tiamina (100
mg IM e depois 300 mg VO por 7 dias), para evitar o surgimento da síndrome de
Wernicke-Korsakoff.
Caso ocorram crises convulsivas no ato do atendimento, deve -se adminstrar
diazepam 10 mg EV e, se não houver melhora, fenitoína 15 mg/kg EV; evitar
hidantalização indiscriminada. O paciente que apresentou convulsão deve ser mantido
em observação (cerca de 1/3 destes pacientes desenvolvem delirium tremens).
Benzodiazepínicos
Os sintomas de abstinência por benzodiazepínicos iniciam -se após interrupção
ou diminuição das doses habituais e tanto o início como a duração e a gravidade da
síndrome dependem da meia -vida da substância, da quantidade e do tempo médio
utilizado. De forma geral, a abstinência ten de a ser mais grave para substâncias de
meia-vida curta e há ansiedade, disforia, inquietação, dificuldade de concentração e
memória, além de insônia e pesadelos. Observam -se também tremores, sudorese,
palpitações, hipotensão, letargia, anorexia, sintomas gripais, intolerância a luz, cefaleia
e náuseas e/ou vômitos. Pode haver contrações musculares, hiper -reflexia e também
convulsões e rebaixamento do nível de consciência. Pode remitir espontaneamente,
mas é possível que ansiedade e alterações de sono perma neçam por até 6 meses.
Recomenda-se a retirada gradual das doses utilizadas, para evitar a abstinência ou o
risco de convulsões e podem -se substituir compostos de meia -vida curta e
intermediária por de meia-vida longa. Postula-se a redução de 1/4 da dose p or
semana, sendo que a retirada da metade final da dose inicial pode necessitar de mais
tempo. A carbamazepina pode ser útil no alívio dos sintomas de abstinência, nas
doses de 400 a 800 mg/dia, mantida por 10 a 14 dias para os benzodiazepínicos de
meia vida-curta e de 4 a 8 semanas para os de meia -vida prolongada.
Maconha
Não há uma síndrome de abstinência amplamente aceita para a maconha.
Estimulantes
Os sintomas de abstinência por estimulantes são principalmente psíquicos e
incluem disforia, ansiedade, irritabilidade, fadiga, apatia, alterações de sono, aumento
do apetite e retardo psicomotor (ocasionalmente há agitação psicomotora).
Geralmente esses indivíduos apresentam desejo intenso e poderoso de usar a
substância (craving ou fissura). Para usuários de quantias pequenas de cocaína, a
síndrome de abstinência geralmente dura menos de 24 horas, mas pode persistir por
semanas quando o uso é mais intenso. Os sintomas de abstinência para as
anfetaminas são similares e podem atingir 87% dos usuários, mas há algumas
peculiaridades como a ocorrência de hipersonia intensa, pesadelos, sintomas
depressivos graves e ocasionalmente sintomas psicóticos. A duração da síndrome de
abstinência geralmente é de até 1 semana, mas o quadro depressivo pode persistir
por período prolongado.
O tratamento da abstinência de estimulantes é basicamente sintomático. Não há
medida farmacológica específica conhecida para a supressão dos sintomas de
abstinência e fissura, e podem ser usados benzodiazepínicos para alívio da disforia,
antidepressivos para síndromes depressivas prolongadas. A bromocriptina (agonista
dopaminérgico) pode trazer alívio para alguns sintomas agudos da abstinência por
cocaína (dose de 2,5 mg por 5 a 7 dias).
Nicotina
Os sintomas da abstinência iniciam -se poucas horas após o consumo do último
cigarro, com pico em 24 a 48 horas e duração de semanas até meses. A
sintomatologia inclui desejo intenso de fumar, humor disfórico ou irritado, ansiedade,
dificuldade de concentração, inquietação, diminuição do desempenh o motor e tensão.
Também ocorre sonolência (e dificuldades paradoxais para dormir), diminuição da
pressão sanguínea e da frequência cardíaca, aumento do apetite e ganho de peso. A
ocorrência de sintomas de abstinência pode ser decisiva para a recaída.
O manejo da síndrome de abstinência é feito como parte integrante do
tratamento da dependência de nicotina. Recomenda -se a utilização de medidas
cognitivo-comportamentais, como estratégias motivacionais e de psicoeducação. As
estratégias farmacológicas mais us adas são a terapia de reposição de nicotina feita
por adesivos (adesivo de nicotina de 14 e 21 mg, dependendo da quantidade de
cigarros/dia; em geral, para indivíduos que fumam 1 maço de cigarros por dia, a
concentração indicada é de 14 mg por um período d e 6 a 8 semanas) e goma de
mascar (2 mg por tablete; a dosagem é de cerca de 10 a 15 tabletes/dia, que devem
ser trocados periodicamente, após 1 a 2 horas de uso, durante 8 a 12 semanas).
Também são utilizados antidepressivos, principalmente a bupropiona ( dose média de
300 mg/dia), mas também a nortriptilina (dose média de 75 mg/dia) por cerca de 7 a
12 semanas. A vareniclina (Champix ®) é um agonista parcial seletivo dos receptores
nicotínicos alfa-4-beta-2, que bloqueia a ação da nicotina, diminuindo a fis sura por
consumir a substância. É prescrito por 12 semanas, em uma dosagem média de 2 mg
diários.
Opioides
A síndrome de abstinência por opioides pode ocorrer pela interrupção do seu
consumo ou pela administração de um antagonista (neste caso, os sintoma s podem
ter início segundos após a administração por via endovenosa, com pico em uma hora).
Os sintomas da abstinência começam em geral de 4 a 12 horas depois da última dose
e os achados mais frequentes são desejo intenso de usar a substância, humor
disfórico, irritabilidade, lacrimejamento, coriza, bocejos, sudorese, insônia, midríase,
fraqueza, tremores, náuseas e/ou vômitos, cólicas abdominais, diarreia profusa,
calafrios, rubor, cãibras, piloereção (pele anserina), desregulação da temperatura,
incluindo hipo ou hipertermia, e hipertensão. A duração da síndrome de abstinência
guarda relação com a meia -vida da substância; para usuários de heroína pode durar
até 15 dias.
Há descrição de uma síndrome de abstinência protaída, que pode durar vários
meses, caracterizada por “fissura” pelo consumo da substância, hipotensão,
bradicardia, insônia, anergia e inapetência.
O tratamento da abstinência de opioides é usualmente realizado em regime
hospitalar e, caso ocorra taquicardia, hipertensão arterial, taquipneia, n áuseas,
vômitos e cólicas abdominais nas primeiras 24 horas, torna -se imprescindível o uso de
medidas farmacológicas. Pode -se utilizar terapia de substituição com metadona (10
mg VO repetidos a cada 60 minutos até alívio dos sintomas; sugere -se a repetição da
dose caso ainda estejam presentes dois ou mais dos critérios objetivos – Tabela 3). A
dose de estabilização usualmente é menor do que 50 mg/dia. Após estipulação da
dose diária, esta deve ser mantida por 2 dias, dividida em duas tomadas. Retirada
gradual em 7 a 10 dias, já que há potencial para dependência desta substância.
Diminuem-se 2 a 3 mg/dia até alcançar 30 mg/dia e depois retira -se de 1 a 2 mg/dia.
Tabela 3: Critérios objetivos de abstinência por opioides
Aumento da frequência cardíaca em 10 b pm acima do basal ou acima de 90 (se não
há história prévia de taquicardia)
Aumento da pressão sistólica 10 mmHg acima do basal ou acima de 160 X 95 (se não
há história prévia de hipertensão arterial sistêmica)
Midríase
Piloereção, sudorese, rinorreia ou lacrimejamento
A prescrição de benzodiazepínicos pode ser ajudar no alívio das dores
musculares, das alterações de sono e da inquietação. Também pode -se utilizar
clonidina (alfa-2-agonista), associada à metadona (dose de 0,3 mg a 1,2 mg/dia,
divididos em 3 tomadas diárias), visando o controle dos sintomas noradrenérgicos,
além de outros sintomáticos.
Solventes (Inalantes)
Há controvérsia quanto à existência de síndrome de abstinência para os
solventes.
Alucinógenos
Não há uma síndrome de abstinên cia relatada para esse grupo.
PRINCIPAIS COMPLICAÇÕES CLÍNICAS E PSIQUIÁTRICAS
Álcool
Transtorno Psicótico Induzido por Álcool
Alucinações (alucinose alcoólica) ou ideias delirantes, frequentemente
persecutórias e pouco estruturadas. As alucinações são a uditivas ou visuais,
habitualmente vívidas, e ocorrem na ausência de rebaixamento do nível de
consciência. A alucinose alcoólica em geral se inicia após períodos de variações da
média de consumo de álcool, com duração curta, apesar de poder haver cronifica ção
(sintomas presentes por mais de 6 meses). O tratamento é feito com drogas
antipsicóticas.
Síndrome de Wernicke-Korsakoff
A encefalopatia de Wernicke é causada pela deficiência de vitaminas do
complexo B, particularmente tiamina, um co -fator importante na utilização de glicose.
Caracteriza-se pela tríade clássica: confusão mental, ataxia cerebelar e alterações
oculares (oftalmoplegia bilateral e nistagmo, principalmente). Pode ocorrer na forma
incompleta ou associada a outras manifestações neurológicas . Trata-se de um quadro
agudo, que pode ser desencadeado pela administração de glicose, previamente à de
tiamina, em indivíduos com deficiência nutricional. O tratamento é feito com a
administração de tiamina (100 mg IM ou EV, repetidos até controle das al terações
oculares e manutenção com cerca de 300 mg diários por 7 a 14 dias) e complexo B. A
hipomagnesemia é uma das causas de não -resposta ao tratamento; assim, pode -se
administrar sulfato de magnésio (1 a 2 mL em solução de 50% IM). Com a instituição
da terapêutica adequada, há remissão completa dos sintomas, mas, do contrário, há
risco de evolução para a forma crônica, conhecida com síndrome de Korsakoff.
A síndrome de Korsakoff é marcada pela alteração proeminente de memória
anterógrada e retrógrada, s em rebaixamento do nível de consciência. Pode haver
confabulações, preenchendo as lacunas mnésticas, e alterações comportamentais,
como apatia, inércia e perda de insight. O tratamento é feito com tiamina (300 mg VO
diários por 3 a 12 meses), complexo B e eventualmente clonidina (0,3 mg 2 vezes/dia,
associada a melhora discreta da memória recente), mas a resposta ao tratamento é
satisfatória em apenas 20% dos casos
Demência Persistente Induzida por Álcool
Quadro demencial causado pelo uso crônico e prolo ngado de álcool,
provavelmente com contribuição de outros fatores, como carências nutricionais,
traumas e outros comprometimentos neurológicos secundários a alterações
sistêmicas. O diagnóstico requer período de abstinência maior que 3 semanas e
exclusão de outras causas demenciais. Não há um tratamento específico, mas é
importante a abstinência de álcool.
Síndrome Fetal pelo Uso do Álcool
Síndrome do recém-nascido devido ao consumo de álcool durante a gestação.
Os achados incluem retardo mental (leve a m oderado), baixo peso e diversas
malformações faciais, cardíacas e de membros. É importante salientar que não há
quantidades seguras para consumo de álcool durante a gestação.
Complicações Psiquiátricas
O álcool pode induzir transtornos de humor, ansiosos , de sono e disfunções
sexuais, havendo nestes casos uma correlação temporal entre o uso de álcool e tais
manifestações psiquiátricas. O tratamento é indicado de acordo com o tipo de
sintomatologia predominante no quadro.
Patologias Clínicas Associadas a o Uso de Álcool
Há complicações clínicas decorrentes do uso de álcool em praticamente todo o
organismo, além das anteriormente listadas.
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Neurológicas: degeneração cerebelar, polineuropatia periférica,
neuropatia óptica, pelagra, atrofia cerebral.
Gastrintestinais: esofagite, gastrite ou úlcera, pancreatite, síndrome
de má-absorção, esteatose hepática, hepatite alcoólica, cirrose,
insuficiência hepática, carcinoma hepatocelular.
Cardiovasculares: hipertensão arterial, arritimias, síndromes
coronarianas, miocardiopatia, insuficiência cardíaca (beri -beri).
Metabólicas
e
nutricionais:
desnutrição,
hiperuricemia,
hiperlipidemia, hipoglicemia, deterioração da síntese de proteínas,
desequilíbrio hidroeletrolítico, deficiências vitamínicas e de
oligoelementos.
Endócrinas: aumento da liberação de ACTH, de glicocorticoides ou
de catecolaminas, inibição da síntese de testosterona
(hipogonadismo masculino), inibição da liberação de ADH,
osteopenia.
Sistema imunológico: aumento da predisposição a infecções
(multifatorial).
Sistema hematopoiético: anemia, macrocitose, leucopenia,
paquetopenia.
Benzodiazepínicos
O consumo de benzodiazepínicos está associado a alterações comportamentais,
sintomas depressivos, quadros amnésicos e quadros psicóticos. Pode haver também
surgimento e agravamento de transtornos do sono. Além disso, o uso destas
substâncias está implicado em risco de quedas, fraturas e de acidentes em geral.
Alguns indivíduos (particularmente idosos, crianças e portadores de retardo
mental) podem apresentar uma reação paradoxal aos benzodiazepínicos,
caracterizada por agitação psicomotora, excitação, agressividade e desinibição
comportamental.
Maconha
O uso prolongado de maconha está associado a maior suscetibilidade a
infecções e danos respiratórios e a altera ções reprodutivas, como diminuição da
produção de espermatozoides e irregularidades no ciclo menstrual.
Além disso, pode haver prejuízos cognitivos (atenção, aprendizado e memória
de fixação) e postula-se a existência de uma “síndrome amotivacional”, cara cterizada
por apatia, dificuldade de concentração e déficit de motivação e interesse para as
atividades cotidianas.
A maconha também pode contribuir para a piora de quadros psicóticos
preexistentes, além de constituir um fator de risco para o desencadeame nto de
esquizofrenia, em indivíduos suscetíveis. Sintomatologia de humor também pode
ocorrer em usuários crônicos.
Estimulantes
O consumo de estimulantes está associado a quadros depressivos e disfóricos
prolongados, além do desencadeamento de fases de m ania. Também pode haver
quadros psicóticos, com ideias de cunho persecutório e alucinações, particularmente
comuns em usuários de crack, cocaína por via endovenosa e anfetaminas. O uso
crônico dos estimulantes relaciona -se com alterações de sono e disfunçõ es sexuais.
As complicações clínicas pelo uso crônico dependem do tipo de substância
usada e da via preferencial de administração. As principais complicações são:
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complicações potencialmente fatais: arritmias, angina pectoris,
infarto agudo do miocárdio, AVC e AIT, convulsões tônico -clônicas
generalizadas;
aumento do risco de infecções como tromboflebites, abscessos,
endocardites bacterianas, bacteriemias, infecções pulmonares,
HIV, hepatite B, hepatite C, tétano etc.;
o uso intranasal pode levar a conges tão nasal, ulcerações e
sangramento da mucosa, além de necrose isquêmica e
perfurações do septo nasal;
outras: transtornos do movimento (distonias, acatisias, discinesia);
alterações hepáticas (aumento de transaminases); rabdomiólise;
isquemias gastrintestinais; disfunções sexuais; alterações
obstétricas (abortos espontâneos, baixo peso e alterações
cognitivas no RN).
Nicotina
O tabagismo associa-se à ampla morbimortalidade, incluindo a doença pulmonar
obstrutiva crônica (DPOC), câncer de pulmão e segmen tos de cabeça e pescoço,
coronariopatias, doença vascular periférica, entre outras (vide capítulos específicos).
Opioides
O uso crônico de opioides está associado a diversas infecções, alterações
gastrintestinais, alterações hormonais e diversas outras. Aproximadamente 75% dos
recém-nascidos de mães dependentes de opioides podem apresentar uma síndrome
de abstinência. A abstinência é frequentemente grave e pode levar a aborto ou morte
fetal.
Os opioides também se relacionam a alterações de humor e de sono , disfunção
sexual e quadros psicóticos.
Solventes (Inalantes)
O uso crônico de solventes pode causar neuropatia periférica, depressão ou até
aplasia da medula óssea, ataxia, prejuízo de memória, arritmias cardíacas, hepatites
tóxicas, insuficiência rena l crônica, miastenia, pneumonites químicas, tosse,
broncoespasmo, alterações gastrintestinais (dores abdominais, diarreia). A maioria
dessas complicações é de caráter transitório, remitindo com a instituição de medidas
de suporte e abstinência. Porém, algu mas outras alterações neurológicas, como
neuropatia e déficits cognitivos, tendem a ser irreversíveis.
Também pode haver quadros psicóticos, quadros de humor e quadros ansiosos.
Alucinógenos
O transtorno perceptual persistente por alucinógenos é caracter izado pela volta
espontânea de sintomas alucinatórios da experiência induzida pelo alucinógeno,
semanas ou meses após o uso da droga ( flashback). A maioria dos episódios tem
duração curta (segundos até minutos), com alucinações geométricas, alucinações
auditivas, lampejos de cores, rastros de imagens de objetos em movimentos, pós imagens positivas de halos, macropsia, micropsia, expansão da sensação de tempo,
sintomas físicos ou revivência de emoções, geralmente sem prejuízo da crítica a
respeito de tais vivências. O tratamento deve ser sintomático, mas habitualmente a
resposta terapêutica é pobre.
Pode haver quadros de humor e quadros ansiosos, frequentemente ataques de
pânico.
EXAMES COMPLEMENTARES
O diagnóstico da dependência de substâncias psicoativas é predominantemente
clínico. Um exame físico rigoroso é fundamental para a suspeita da maioria das
condições clínicas associadas e detecção de indícios de complicações e cronicidade.
A solicitação de exames complementares também visa mapear tais complicaç ões,
assim como auxiliar no diagnóstico diferencial das situações que podem ocorrer na
sala de emergência e também na detecção de co -morbidades.
No atendimento de emergência dos dependentes químicos, a propedêutica
armada tem como objetivo prover uma aval iação clínica global do paciente,
contemplando a hipótese diagnóstica principal e seus diagnósticos diferenciais. Na
assistência ambulatorial desses pacientes, a inserção em um programa específico de
atenção à dependência química é utilizada para mapear po ssíveis complicações, por
exemplo, infecciosas.
O resultado da avaliação laboratorial do paciente pode guiar decisões
terapêuticas, influenciando no manejo das síndromes associadas. A Tabela 4
apresenta diretrizes gerais para possível solicitação de exame s complementares.
Tabela 4: Avaliação geral do doente
Hemograma completo
Exames de coagulação
Enzimas hepáticas, enzimas canaliculares e função hepática
Amilase
Perfil lipídico
Glicemia
Função renal
Eletrólitos (Na, K, Ca, Mg)
Proteína total e frações
Gasometria
Avaliação de complicações clínicas e diagnóstico diferencial (de acordo com a
substância)
Sorologias: hepatites virais, HIV, sífilis
Radiografia de tórax
Eletrocardiografia
Urina tipo 1 e urocultura
Hemoculturas
Líquido cefalorraquidiano (LCR)
Exames de Neuroimagem
Tomografia de crânio (TC) ou ressonância magnética (RNM): são úteis para a
diferenciação entre quadros de intoxicação ou abstinência e de lesões intracranianas
focais (hemorragias, lesões isquêmicas etc.). Deve -se considerar a solicitação de TC
de crânio em casos de alterações neurológicas focais e rebaixamento de nível de
consciência.
Dosagem Sérica de Tóxicos
Não costuma ser solicitada rotineiramente. Pode ser extremamente útil em
contextos médico-legais e ocupacionais. As análises podem ser feitas a partir de
amostras de sangue, urina ou cabelo. Como regra geral, a análise de urina e cabelo
permite a detecção de substâncias como maconha e cocaína por períodos mais
prolongados após o último uso. Quanto ao álcool, por ser uma substância de rápida
metabolização, só pode ser detectado em períodos de poucas horas após o uso (em
geral, até o máximo de 12 horas) ( Tabela 5).
Tabela 5: Exame toxicológico
Droga
Tempo de detecção na urina
benzodiazepínicos
Cerca de 30 dias
maconha
1 a 3 dias para uso eventual; cerca de 30 dias para usuários
crônicos
cocaína
1 a 3 dias
anfetaminas
2 a 4 dias
Heroína
1 a 3 dias
Metadona
2 a 4 dias
TRATAMENTO
O tratamento global da dependência de substâncias químicas pode ocorrer em
alguns momentos específicos.
Intoxicação
em geral, os quadros de intoxicação são atendidos em serviços de emergência,
frequentemente em decorrência de complicações clínicas, como rebaixamento do nível
de consciência, convulsões e agitação psicomotora. As co ndutas devem ser tomadas
de acordo com o quadro clínico à admissão do paciente. Frequentemente não
dispomos de informações como a identificação exata da(s) droga(s) utilizada(s), assim
como a quantidade usada e o grau de tolerância prévia. As medidas espec íficas já
foram descritas para cada substância. Deve -se sempre atentar para a possibilidade de
uso concomitante de mais de uma substância psicoativa.
Síndrome de Abstinência
No manejo das síndromes de abstinência, devemos priorizar o alívio dos
sintomas e a prevenção de complicações inerentes à abstinência da substância em
questão. Quando necessárias, medidas farmacológicas específicas devem ser
adotadas, conforme descritas anteriormente para cada substância.
O tratamento da síndrome de dependência, em geral, pode ser realizado
ambulatorialmente ou em regime de internação hospitalar. Algumas possíveis
indicações de internação hospitalar estão apontadas a seguir:
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rebaixamento do nível de consciência;
crises convulsivas;
sintomas depressivos severos ou p ersistentes, especialmente com
risco de suicídio;
sintomas psicóticos severos ou persistentes;
comorbidades psiquiátricas (p. ex., esquizofrenia, transtorno afetivo
bipolar, depressão melancólica, transtornos ansiosos graves etc.);
comorbidades clínicas se veras (p. ex., AVC, hepatopatia,
cardiopatias, infecções, doenças respiratórias etc.);
antecedente de síndrome de abstinência severa ( delirium tremens,
crises convulsivas);
falha de tratamento ambulatorial;
falta de motivação para qualquer forma de tratame nto;
ausência de suporte familiar ou social;
idosos;
risco de vida (comportamento auto -destrutivo, dívidas com
traficantes etc.).
Prevenção de Recaídas
As técnicas de prevenção de recaída e a entrevista motivacional são medidas
cognitivo-comportamentais bastante utilizadas. Na prevenção de recaída, o objetivo é
o desenvolvimento de modificações do estilo de vida e de estratégias que ajudem a
evitar que aconteça a recaída. Os estágios da “prontidão” para a mudança (pré contemplação, contemplação, determina ção, ação e manutenção), descritos mais
extensivamente na entrevista motivacional (Prochaska e DiClemente, 1982), podem
ser úteis na abordagem destes pacientes.
Tratamento das Complicações Clínicas e Psiquiátricas Associadas
Algumas substâncias como a m aconha, os inalantes e os alucinógenos não
requerem medidas farmacológicas específicas no tratamento da síndrome de
dependência. O emprego de medicações restringe -se, nestes casos, ao tratamento de
sintomas focais associados, como sintomas depressivos ou a nsiosos. Para as
complicações clínicas e psiquiátricas decorrentes da dependência das substâncias
psicoativas de maneira geral, o tratamento segue as orientações que foram sendo
apontadas ao longo do texto, posto que cada droga traz um tipo específico de
complicação, seja ele físico ou psíquico.
O tratamento da síndrome de dependência pode ser montado a partir de
técnicas comportamentais, abordagens psicoterapêuticas e também medidas
farmacológicas. Alguns pacientes também se beneficiam de programas de auto ajuda,
como os Alcoólicos Anônimos (AA).
O tratamento farmacológico da síndrome de dependência inclui substâncias que
diminuem o desejo de usar a substância, bloqueiam os efeitos provocados por ela ou
geram reações desagradáveis quando do seu consumo. Em g eral, o uso destas
medicações se faz por período prolongado. As indicações devem levar em
consideração a presença de complicações físicas e psiquiátricas, a presença de
comorbidades, o perfil de efeitos colaterais e contra -indicações das mesmas. As
medicações mais comumente utilizadas para cada droga são descritas a seguir.
Álcool
1. Dissulfiram: inibe a enzima aldeído -desidrogenase (ALDH) e
impede a metabolização do álcool, gerando reações adversas
(mal-estar geral, rubor facial, cefaleia, náusea e/ou vômi tos,
taquicardia, visão turva, hipotensão, tontura, sonolência) quando
do uso concomitante ao álcool. Embora bastante desagradável,
este quadro raramente é fatal. A dose média é de 250 mg/dia e o
paciente deve estar ciente de sua ingestão.
2. Naltrexona: é um antagonista de receptores opioides (dose de 50
mg/dia); diminui a vontade de beber.
3. Topiramato: é um anticonvulsivante (dose média 300 mg/dia) que
também atua diminuindo a vontade de beber.
4. Outros (inibidores seletivos da recaptação de serotonina,
carbamazepina, oxcarbamazepina etc.): apresentam pequena
eficácia no tratamento da dependência de álcool e são indicados
para o tratamento de possíveis comorbidades associadas.
Benzodiazepínicos
Não há medidas farmacológicas específicas. Algumas considerações p ara a
retirada dos benzodiazepínicos devem ser feitas: quando a dependência não é severa,
pode-se retirar abruptamente a medicação. Entretanto, nos casos de dependência
severa, preconiza-se a suspensão gradativa e a substituição por compostos de meia vida mais longa, como o diazepam ou o clonazepam. Pode -se diminuir um comprimido
a cada semana (após a estabilização da dose usada, retira -se o equivalente a uma
unidade farmacológica da dose diária a cada semana).
Estimulantes

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Topiramato: estudos demonstram sua eficácia na redução do
craving, da recaída.
Lamotrigina e gabapentina: eficazes também na redução do
craving, da recaída, além de serem indicados quando da presença
de sintomas depressivos ou maniformes associados.
Outros anticonvulsivantes (como a car bamazepina).
Antidepressivos (inibidores seletivos da recaptação de serotonina).
Opioides


Metadona: é utilizada também na prevenção de recaída. Sua
prescrição deve ser bastante criteriosa e restrita a profissionais e
serviços especializados. Geralmente é utilizada em casos de
dependência física severa e/ou com risco de morte.
Naltrexona: necessita de um período de abstinência de opioide
maior que 10 dias para ser utilizado. Parece reduzir o reforço
positivo associado ao consumo de opioides; estudos utiliz ando a
naltrexona nestas situações têm demonstrado, entretanto, baixa
adesão dos pacientes ao tratamento.
USO DE DROGAS ENTRE CRIANÇAS E ADOLESCENTES
A experimentação de substâncias ilícitas é um fenômeno da juventude. A maioria
das pessoas que utilizaram algum tipo de substância ao menos uma vez na vida, o
fizeram nessa fase.
Independentemente da população estudada, as drogas mais consumidas são
álcool e tabaco. Estudos brasileiros demonstram que 65% dos estudantes do ensino
fundamental II e médio fizer am uso de álcool pelo menos uma vez na vida. Nos EUA,
estes índices chegam a 90% e são semelhantes aos índices encontrados no Brasil
para menores em situação de rua.
A experimentação, por si só, não constitui um comportamento patológico do
adolescente. Ela está incluída numa atitude global de busca por novas experiências
que lhe façam sentido, na construção de uma identidade. Entretanto, alguns fatores de
risco estão associados à manutenção deste uso:


a curiosidade natural do adolescente é um dos fatores de risco
mais importantes, posto ser o que o move para experimentar a
substância, estando assim sob risco de desenvolver dependência;
o fácil acesso às drogas e as oportunidades de uso;
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
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


ser do sexo masculino (meninos experimentam mais do que as
meninas);
influência de modismos;
condições familiares, tanto pelo aspecto genético (filhos de pais
dependentes apresentam 4 vezes mais chance de o serem
também) quanto pelos aspectos ambientais, fortemente
correlacionados com o início do uso;
uso de drogas por pais e/ou amigos;
relacionamento ruim com os pais;
fatores internos do adolescente, como insatisfação e não realização em suas atividades, insegurança, baixa autoestima e
sintomas depressivos;
baixo desempenho escolar.
O uso de drogas afeta diretamente o de senvolvimento da criança e do
adolescente, principalmente com relação às funções cognitivas, capacidade de
julgamento, humor e os relacionamentos interpessoais. Quanto mais precoce o início
do uso, maiores as deficiências nestas áreas.
Quando comparamos populações de adolescentes e adultos que procuraram
tratamento para dependência de drogas, vemos que os adolescentes, em geral,
começam o consumo de substâncias mais precocemente que os adultos, e também
iniciam o tratamento com menor tempo de uso. Apresenta m maior prevalência de
abuso de múltiplas substâncias e, com muito menor frequência, apresentam sintomas
físicos de abstinência.
Com relação ao tratamento, deve -se sempre proceder a uma avaliação clínica,
neurológica e psíquica do adolescente, pesquisando -se condições associadas ou
decorrentes do uso de drogas. Estas condições devem receber tratamento específico.
A minuciosa análise dos fatores de risco pode ajudar no planejamento terapêutico.
Nunca devemos esquecer que o adolescente ainda está em processo de
desenvolvimento e qualquer tratamento proposto deve respeitar esta condição. Um
dos principais pontos do tratamento de adolescentes dependentes de drogas é auxiliá los a se manterem abstinentes. Para isso, é necessário o envolvimento da família, que
funciona como um limite externo concreto, inviabilizando o acesso do adolescente às
drogas.
Abordagens psicoterápicas, individual ou em grupo, devem ser propostas.
Parece haver uma maior adesão dos adolescentes à psicoterapia em grupo. A família
também deve ser encaminhada para atendimento psicológico, para que sejam
identificados os pontos de fragilidade em acolher o adolescente usuário de drogas.
O uso de medicações está indicado para duas situações: tratamento de
sintomas-alvo e/ou comorbidades (antidepres sivos para sintomas depressivos ou
depressão associada, benzodiazepínicos para sintomas ansiosos etc.) e na
abordagem inicial dos sintomas de abstinência (em geral, utiliza -se benzodiazepínicos
de ação prolongada por curto período, já que a abstinência, qu ando presente, é
bastante rápida).
TÓPICOS IMPORTANTES



O consumo de substâncias psicoativas é um sério problema de
saúde pública mundial. Seu uso deve sempre ser investigado por
todos profissionais de saúde. Os quadros de intoxicação e
abstinência devem ser reconhecidos e tratados adequadamente,
visando ao alívio dos sintomas e prevenção de complicações.
Quando do diagnóstico de dependência química, o paciente deve
ser avaliado cuidadosamente para a detecção de complicações e
co-morbidades associadas. Par a o tratamento das síndromes de
dependência de substâncias psicoativas, a combinação de técnicas
de psicoterapia e medidas farmacológicas parece ser a estratégia
mais efetiva.
A população de adolescentes é especialmente vulnerável à
experimentação de droga s. Esta, por si só, não constitui
comportamento patológico, mas alguns fatores de risco podem
induzir à manutenção do uso. Qualquer medida terapêutica
instituída para esta faixa etária deve respeitar a questão do
desenvolvimento, que ainda não está complet o nestes pacientes, e
viabilizar a inclusão da família no tratamento.
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