1 A AGRICULTURA COMO CONDIÇÃO DE VIDA PARA OS QUILOMBOLAS DO DISTRITO DE TIJUAÇU / SENHOR DO BONFIM – BA Monyque Santana dos Santos UPE - Universidade de Pernambuco - Campus Petrolina [email protected] Raimunda Áurea Dias de Sousa Orientadora – UPE/Campus Petrolina [email protected] INTRODUÇÃO As comunidades quilombolas, cada vez mais, lutam por seus territórios e quando conquistam tornam-se um espaço de transformações, lutas e resistência. Tais mudanças vêm ocorrendo desde a certa “libertação”, até os dias de hoje, diante de vários problemas vividos por esses negros, reflexo de um mundo capitalista, muitos sofrem e resistem a essa exclusão. Assim, é notório que, a luta para ser reconhecido como quilombola, é incessante e longa, pois há grandes etapas para percorrem, não apenas pelos documentos exigidos, mais pela visão do mundo sobre as classes quilombolas, como também em todas as classes excluídas em nosso país. Logo, nas pequenas palavras de Marx confirma: À igualdade “logicamente impossível” das classes, opõe a sua abolição “historicamente necessária”. (2006, pg. 244). O grande objetivo dessa pesquisa é refletir sobre as classes desprivilegiadas como exemplo a classe quilombola, pois sofrem nesse mundo capitalista, que usufrui e conduz a exploração dos mesmos, mediante a grande desigualdade social visível em nosso país. Sendo assim, a Comunidade Quilombola de Tijuaçu, apesar da luta pelo seu auto-reconhecimento já concretizada, falta muito para tornar-se “livre” e aceitos. Pois, muitos sofrem com as desigualdades sociais e raciais, e pela exploração da mão de obra. Valendo ressaltar que não vivem da “exploração escrava” como há tempos atrás, mais da luta por um trabalho digno que possam sustentar suas famílias, como exemplo a agricultura de subsistência produzida na comunidade e vendida nas cidades, produzindo: milho, feijão, melancia, abóbora entre outros. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 1 2 Visando uma melhor análise, recorreu-se a fontes bibliográficas sobre a temática em questão com o propósito de entender a situação quilombola na Comunidade de Tijuaçu. Valeu-se ainda, de entrevistas com os sujeitos envolvidos a fim de vivenciar a realidade dos mesmos. Utilizou-se como categoria geográfica território, por entender que ele é conquistado a partir da relação de poder entre os que querem viver e o Estado capitalista que os explora. Dentro dessa perspectiva, só o método dialética é capaz de analisar a realidade como ela é, tendo como entendimento o local dentro da totalidade dos fatos. Dessa forma, o trabalho aborda a agricultura como condição de vida na Comunidade Quilombola de Tijuaçu, no Distrito de Senhor do Bonfim-Ba, dentro de um contexto geral da luta dos negros no nosso país, por uma vida sem exclusão e com direito e deveres iguais a todos. Portanto, o conhecimento geográfico foi e é imprescindível para entender a exploração, a luta, e a resistência, dessas classes excluídas, exposta pelo capitalismo. SER QUILOMBOLA – A LUTA PARA SER RECONHECIDO COMO SUJEITO No Brasil, a escravidão teve início com a produção de açúcar na primeira metade do século XVI, e para isso, eram utilizados os negros da África. O transporte desses para o Brasil foi feito em porões dos navios negreiros, amontoados, em condições desumanas onde muitos morriam antes de chegar ao País, sendo seus corpos lançados ao mar. Assim, os escravos eram vendidos e comercializados. Caso tentasse a fuga, seriam punidos, podendo chegar à morte. Logo, as origens da escravidão tinham três vertentes: os perdedores de guerras, a escravidão por dívida e por nascimento. Assim, afirma Gonçalves: Os escravos perdedores de guerras tinham duas opções: morrer ou viver nessa condição. Pela convivência viver como escravo seria vantagem diante da possibilidade de perder a vida, justificando a grande desigualdade social. A escravidão por divida se justificava pela incompetência daqueles que não tinham condições de administrar seus negócios domésticos; assim era vantagem alienar seu corpo e sua vida para alguém que tivesse mais competência e alem do mais garantir o básico para a sobrevivência. Quanto à escravidão natural, para os submetidos a esta condição não havia opção, para o filho de escravo só restava depositar a culpa a natureza que lhe havia determinado esse destino. (2008, p. 70). Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 2 3 Os negros também reagiam contra a escravidão. Eram comuns as revoltas nas fazendas de onde grupos de escravos fugiam, formando nas florestas os famosos quilombos, que eram comunidades bem organizadas, onde os integrantes viviam em liberdade, através de uma organização comunitária aos moldes do que existia na África. Com essa “liberdade”, poderiam praticar sua cultura, falar sua língua e exercer seus rituais religiosos. Logo, para compreendermos essa dita “libertação”, entende-se que os negros, cada vez mais, procuraram a luta pela sobrevivência, através da formação de grupos quilombolas por todo o Brasil. A exploração da força de trabalho escrava era uma das causas desse refúgio. Partindo disso, Oliveira afirma (1999, p. 15) Entre as várias formas que os negros tinham para lutar contra o sistema de opressão, uma das mais significativas foi à formação de quilombos. Os quilombos eram lugares de resistência negra. As pessoas que moravam nos quilombos se chamavam quilombolas. Os quilombos eram um sistema comunitário de vida na floresta para onde iam os negras que conseguiam fugir da escravidão. Às vezes eram cinco, seis casas apenas. Outras vezes chegavam a formar verdadeiras cidades. Estes quilombos eram sempre perseguidos pelos exércitos dos fazendeiros. Com o capitalismo brasileiro nascente, surgiu a falsa libertação, em 1888, com a Lei Áurea. Antes disso a Lei de Terras (1850) serviu para legalizar as terras dos latifundiários que as teriam recebido da Coroa Portuguesa assim como os que não tinham registro poderiam regularizar, mas as pessoas as quais não tinham terra teriam que comprá-las. Logo, libertaram os escravos, mas escravizaram as terras, pois, sem o acesso a essas terras, a escravidão não deixou de existir, só mudou de forma. É por isso que Gorgen (2004, p.21), afirma que: Quando o capitalismo brasileiro nascente obrigou-se à farsa da libertação dos escravos, criou antes a Lei de Terras (1850). Legalizando seus latifúndios recebidos da coroa e fecharam as portas do acesso a terra para quem viesse depois. Libertaram os escravos, mas escravizaram a terra. É importante citar que, no Brasil, a escravidão trouxe uma consequência para nossa contemporaneidade, pois o racismo e o preconceito ainda persistem em existir por parte de Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 3 4 muitos. Os negros lutaram e lutam pela dignidade e liberdade de expressar sua opinião e, até mesmo, fazer parte dessa sociedade injusta e desse sistema de opressão. Com a formação dos quilombos, há uma grande dificuldade de se provar suas origens, pois, na sociedade brasileira, que é muito arraigada na concentração de propriedade, lastimavelmente ainda existam preconceitos contra os negros. Com isso, os movimentos vêm de encontro para acabar com essa mentalidade “dominante” que considera apenas quem tem dinheiro. Assim, no Art. 1º, da Constituição 68: As ações e atividades voltadas para o alcance dos objetivos da Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais deverão ocorrer de forma intersetorial, integrada, coordenada, sistemática e observar os seguintes princípios: O reconhecimento, a valorização e o respeito à diversidade socioambiental e cultural dos povos e comunidades tradicionais, levando-se em conta, dentre outros aspectos, os recortes etnia, raça, gênero, idade, religiosidade, ancestralidade, orientação sexual e atividades laborais, entre outros, bem como a relação desses em cada comunidade ou povo, de modo a não desrespeitar, subsumir ou negligenciar as diferenças dos mesmos grupos, comunidades ou povos ou, ainda, instaurar ou reforçar qualquer relação de desigualdade. (Decreto n°6.040, de 7/02/2007). Com isso, o Estado garantiu a propriedade da terra aos ocupantes remanescentes dos quilombos (artigo 68 da Constituição, 2007), estabeleceu que "aos remanescentes das comunidades dos quilombos, que estejam ocupando suas terras, seja reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos". Logo, há um processo ideológico, racial e cultural, para a aprovação do mesmo. Assim, o reconhecimento desses quilombos é intimamente ligado à identidade do povo, preservação cultural, unificando a ideologia que buscam os negros. A respeito das questões culturais das comunidades quilombolas, pelo seu reconhecimento e valorização, Moura afirma: “É preciso que, desde cedo brasileiros saibam que os africanos que aqui chegaram eram homens e mulheres livres nas suas terras e tinham conhecimento do seu manuseio.” (2009). Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 4 5 Referente à estrutura social, econômica e cultural dos quilombos, percebe-se que é muito precária, pois a maioria dos quilombos busca a liberação em terras, pois muitos as perdem para grileiros e latifundiários (opressores). O governo considera a terra assegurada aos quilombolas uma forma de reparar a injustiça histórica cometida à população negra no Brasil, aliando dignidade social à prevenção da herança material e imaterial brasileiro. Como, no nosso país, há um desprivilegio à classe minoritária, os quilombos sofrem e lutam pelo seu reconhecimento, e sabe-se que não é só a terra que essa minoria reivindica, mas também a condição de sobrevivência, de trabalho e de lazer, que vem contra a propriedade capitalista, onde a terra é produto de mercadoria e lucro. Dessa forma, os quilombos têm “conquistado” o seu território, não alcançando sozinhos, mas coletivamente; a conquista é feita pela luta à dignidade, ao respeito, à propriedade e à liberdade. A luta pela terra e pelo direito de plantar, colher, estudar e ao livre arbítrio. Com isso, estão inseridas aos movimentos sociais onde buscam a liberdade, conquista territorial e a democracia, tentando extinguir essa visão de uma classe esquecida e “extinta” pelos poderes políticos, apesar de não existir essa separação entre o político e econômico. VIVER NO CAMPO – A AGRICULTURA É A CONDIÇÃO A luta de mais de 500 anos dos descendentes de escravos no Brasil evidencia que a luta pela terra não é nova. Trabalhadores da terra e escravizados - os quilombolas- ajudaram a construir a história do Brasil, pois negavam o modelo econômico centrado no período colonial, o regime de doação de sesmarias (1534), e com a criação da Lei de Terras (1850). Atualmente, a realidade não difere do período colonial, pois os frequentes conflitos com fazendeiros e grandes empresas multinacionais estão causando um desgaste para os remanescentes de escravos que vivem no Brasil. Diante disso, os problemas sociais no campo do Brasil, não é exclusividade desse momento histórico, mas vêm desde a escravidão dos índios pela Coroa Portuguesa, quando se apropriou das terras dos mesmos,. Por isso: Uma vez tomada a decisão de colonizar o território, a Coroa Portuguesa muda radicalmente a sua relação com os povos indígenas. A guerra e extermínio estão entre as primeiras Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 5 6 medidas para expulsar os nativos de grandes extensões de terra e para submetê-los à escravidão. GENARRI (2008, p. 15). Com o passar do tempo, grandes lutas foram se formando e acontecendo os grupos de movimentos sociais no século XX que foram se intensificando, e grandes conflitos por terras foram se concretizando, pois a terra para o homem do campo é mais que terra, é a condição de trabalho. A terra e o fruto para esses povos são como condição de existência, de trabalho e de lazer; sendo o campo um espaço fundamental para a sobrevivência. Assim, afirma Shanin: “O campesinato é o modo de vida” (2008, p. 37). Logo, essa combinação terra e trabalho trazem em si a grande condição para vida do camponês, índio e do negro (quilombolas), ou seja, para aqueles que, sem a terra, não há nenhuma possibilidade de reprodução familiar. Assim, apesar do trabalho no campo ser extremamente “duro”, depende muito da diversidade cultural e produtiva própria da vida camponesa, sendo a melhor maneira de lidar com a biodiversidade. Por isso, os camponeses são os melhores guardiões da mãe natureza na arte necessária de produzir alimentos para sustentar a humanidade. Eles sobrevivem, longe do capital; a agricultura cresce mais saudável, sendo o alimento, de fato, do povo brasileiro. A agricultura camponesa não é só um jeito de produzir no campo, é caracterizada pela força do trabalho familiar, da subsistência, da coletividade, do modo de viver, vida comunitária, não assalariada, diversidade na produção, autoconsumo, pequena propriedade, e nunca do trabalho assalariado, nem da produção de mercadoria e da força do trabalho operário e explorador que impõe o capital. Logo, Gorgem afirma características da Agricultura Camponesa: a) Pequenas áreas de terra; b) Produção de subsistência para o autoconsumo familiar; c) Produção diversificada, policultivos, grande variedades de criação de animais; d)Trabalho familiar, mão de obra própria, autônoma; e)Produção voltada ao mercado interno; f) Controle da tecnologia utilizada, desde a seleção e conservação das sementes e mudas, ao controle das doenças. (2004, p. 20) Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 6 7 Viver no campo é muito mais que terra; é meio de vida, de sobrevivência, de ser o que é. É viver à base da agricultura, e crescer ajudando a família, e trabalhar coletivamente. É respeitar seu tempo. Segundo Shanin: Eles são (camponês), também, donos de seu próprio trabalho e assim são capazes de escolher sua própria maneira de descansar, o que é importante. Se olharmos para um camponês real, não o camponês abstrato, quando ele está trabalhando, veremos que ele é capaz de sentar-se à sombra de uma arvore numa hora quente do dia e comer um pouco da comida que trouxe de casa, saboreá-la ou ate tirar uma soneca.Então, quando o calor diminui, ele retoma o trabalho, e ai ele trabalha realmente pra valer e termina o que tem que ser feito, só Deus sabe quando. Essa é uma peculiaridade do trabalho camponês, é o trabalho de um homem que é dono do seu próprio trabalho e pode decidir como utiliza-lo. (2008, p.38) A terra como propriedade tem um valor econômico. Assim há vários conflitos, entre latifundiários e camponeses, pois é nela que o latifúndio planta sua monocultura, trabalha “assalariadamente” e escraviza a mão de obra. Assim, como tudo no capital se transforma em mercadoria, infelizmente, essa terra passa por grandes transformações, adquirindo valor, onde essa pode ser comercializada. Harvey (1990) apud Silva (2004, p. 45): No campo, um instrumento fundamental da produção é a terra. Nas análises feitas no Brasil a respeito da expansão capitalista no campo, com umas poucas exceções, a terra é erroneamente considerada capital. Afinal de contas, ela é comprada com dinheiro e é utilizada como instrumento para explorar a força de trabalho do trabalhador. Ela opera, portanto como capital. No entanto o capital é produto do trabalho assalariado. Já a terra não é produto nem do trabalho assalariado nem de nenhuma outra forma de trabalho. É um bem natural, finito, que não pode ser criado pelo trabalho. Como o capital se apropria do trabalho, a terra também será apropriada, tornando uma mercadoria. O campo para os quilombolas é de suma importância para a produção e para subsistência de toda a família, que vive do fruto do trabalho no campo – agricultura, pecuária, artesanato. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 7 8 Agricultura camponesa contradiz aqueles que afirmam que, no campo, não há mais camponeses. Vivemos um processo continuado de afirmação e de tentativas de varrê-la do mapa, tais sujeitos (camponeses), mostram que sua existência, resistência e sua luta permanente fazem com que sempre exista, pois é por meio dela que sobrevivemos. No momento histórico em que vivemos, ela está sob pressão do mercado capitalista que força as migrações constantes, pois a terra de negócio é para produção, para exploração do trabalho e é para o latifúndio todo investimento do Estado. Diante dessa realidade, o camponês é expropriado. Assim, surgem vários movimentos como: Movimento Camponês, Movimento sem Terra, os Quilombolas entre outros, que encontram na luta pela terra, a luta pela vida e pela existência. Agricultura camponesa e o modo de vida camponês são, ao mesmo tempo, um patrimônio histórico da sociedade humana, um processo da construção coletiva e uma utopia de vida para uma parte da sociedade. ANALISANDO A REALIDADE DOS QUILOMBOLAS – NO DISTRITO DE TIJUAÇU / SENHOR DO BONFIM – BA É importante compreender quem são, como surgiram, de onde vieram, como sobrevivem, onde se localizam os grupos quilombolas e, em especial, estudar e analisar a organização dos quilombos, dando ênfase à realidade dos mesmos, através do modo de produção do cultivo agrícola na comunidade camponesa de quilombolas do Tijuaçu localizado a 23 km do centro de Senhor do Bonfim, às margens da Rodovia Lomanto Junior, em direção a Salvador. Sendo um distrito de Senhor do Bonfim, Tijuaçu está localizado ao norte do estado da Bahia, na região dominada de Piemonte da Diamantina. Situado no semiárido, encontra-se a 450 metros acima do mar. É um território conquistado através do esforço de cada cidadão da região, com uma área de aproximadamente 2.277,9370; limitando-se ao norte da Fazenda Santana e atravessando o Mulato e Ricocho; ao sul com Fazenda Alegre, a leste com a Fazenda Forja e Várzea da Pedra; e a oeste, com a Fazenda Curral Derrubado. Comprova-se que a economia dos grupos de quilombos está ameaçada, pois já se naturalizou a miséria no Brasil. Assim: Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 8 9 Hoje, há uma economia enfraquecida, predominando a pequena produção, nas roças, onde dependem da chuva, se cultivam milho, melancia, maxixe, batata-doce, abóbora, umbu, feijão de arranca, feijão de corda, andu, mandioca e palma. (MACHADO, 2004, p. 35). Portanto, fica claro que boa parte da população de Tijuaçu vive do campo, onde há uma agricultura de subsistência. Partindo do entendimento da relação contraditória imposta pelas ações do capitalismo, que tenta ocultar o modo de vida a exclusão social do camponês na atualidade, os quais têm prevalecido e contribuído no processo produtivo da agricultura brasileira, Gorgem, afirma que: “A agricultura camponesa resistiu e cresceu, integrada a população pobre do país, produzindo os alimentos básicos que vão a sua casa.”(2004, pg 21) É importante analisar que, por localizar-se em uma região do semiárido, apresenta uma grande deficiência de água, havendo chuvas só no período de fevereiro a abril. Tem aproximadamente 4.990 habitantes. Resalta-se que na comunidade quilombola, há: a) difícil convivência com os “brancos”, por esses terem perdidos suas terras para alguns fazendeiros; b) o parentesco entre os quilombolas; c) a grande resistência à discriminação; d) os aspectos sócioculturais, as suas origens, os aspectos educacionais, a agricultura como condição de subsistência (agricultura camponesa), com uma pequena produção de policultura no campo, pois dependem das chuvas e do cultivo para alimentação dos quilombos. As lutas dos negros ocorriam das várias formas. Nesse particular, Machado (2004, pg.18) registrou que: a) Quando já não tinham nada para comer e a terra seca não produzia nada, tendo a terra como única propriedade de valor, as pessoas negras de Tijuaçu a trocavam por comida para si, para sua família, indo em busca de trabalho no Sul, onde chovia; quando a morte estava colhendo as vidas por causa da fome, ninguém pensava no futuro, mas na sobrevivência imediata. b) Partindo com a família para o Sul, alguns faziam um trato com os fazendeiros que, depois de voltarem, deveriam de voltar às suas terras. Infelizmente, muitas vezes regressando, depois quando a chuva caía, encontravam as suas terras cercadas, roubadas, apropriadas, guardadas pelas pessoas armadas a serviços de novos donos. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 9 10 c) Vendo a um fazendeiro um pedaço da terra, este entrava com seus homens e cercava uma área muito maior da terra do que esta, que lhe foi vendida. Aproveitava-se da ignorância do povo e quanto à lei, esta só funcionava a serviço do mais forte e mais rico, então, ninguém podia reclamar algo. Diante disso, os conflitos sociais no campo, no Brasil, não são exclusividade da atualidade, mas, desde o século XVI, onde os índios eram atraídos pelas mercadorias , e suas terras ocupadas, essa era um instrumento de guerra e luta, pois há uma relação entre índios e a terra, como há entre os quilombolas, os sem-terra e outros, havendo uma batalha dolorosa, sangrenta e mortal. Hoje, assim como os demais movimentos sociais lutam pelas terras, os quilombos cada vez mais conquistam seus territórios, mediante a luta pela terra de trabalho a partir das lutas pela suas terras de volta, mas nem sempre isso ocorre. Alguns vivem em terras de amigos vizinhos e familiares, pois há entre ele um laço de dignidade e fraternidade pela sua raça. Logo, a terra para os quilombolas não é apenas vista como um meio de produção, venda, luxo ou acumulação, mas ter sua independência ou mesmo sua “liberdade”, sendo em comunidades bem organizadas, onde os integrantes vivem com liberdade, através de uma organização comunitária, podendo praticar sua cultura, falar sua língua e exercer seus rituais religiosos, plantar, colher e sobreviver. A agricultura entre eles é escassa, pouco se colhe, devido à seca, mas muitos que conseguem utilizam desses alimentos para sobreviver e o pouco que sobra é vendida na cidade de Senhor do Bonfim, produzindo, assim, uma policultura, como o cultivo do milho, feijão-de-corda, feijão-de-arranca, feijão-andu, mandioca, palma e outros alimentos da agricultura camponesa que, de fato, alimentam o povo brasileiro. Gorgem argumenta: Apesar do abandono, da falta de apoio e da ausência de polícas publicas do estado, da repressão da negação da Reforma Agrária, foi a agricultura camponesa que alimentou de fato o povo brasileiro durante toda a sua história. (2004, pg. 23). Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 10 11 Dessa forma, os quilombos têm conquistado o seu território, não alcançando sozinhos, mas com toda a população; a conquista é feita pela luta à dignidade, ao respeito, à propriedade e à liberdade. Com isso estão inseridas aos movimentos sociais onde buscam a liberdade, a conquista territorial e a democracia, tentando extinguir essa visão de uma classe esquecida e “extinta” pelos poderes políticos, apesar de não existir essa separação entre o político e econômico. “O político e o econômico submetendo o social, as relações sociais de modo geral”. (DAMIANI, 2002, p. 18). A condição alimentar das famílias negras quilombolas de Tijuaçu, em Senhor do Bonfim-Ba, é bem precária, contando com os alimentos retirados da lavoura, no caso da produção apresenta alguns prejuízos ocasionados pela má distribuição de chuvas e o solo seco, tendo influências diretamente na alimentação do pequeno produtor. Nesse caso, a carência em nutrientes e diversificação na qualidade da alimentação é bem precária em relação à jornada de trabalho enfrentada pelos negros camponeses no trabalho desgastante da lavoura, que demanda grande disposição para garantir rentabilidade no desenvolvimento das atividades no campo. A colheita é realizada de forma manual, contando com a participação de toda a família, para a realização do transporte da produção, que é feito por animais, através do auxílio de carroça ou de caminhões trazidos por atravessadores, comerciantes conhecidos como intermediários que compram a pequena produção, como o cultivo do milho, feijão-de-corda, feijão-de-arranca, feijão-andu, mandioca, palma, e outros da comunidade para comercializar nos centros urbanos. Assim, evidencia-se que o processo de diferenciação social não se realiza de forma homogênea e que, nem sempre, promove a proletarização dos agricultores. Muitos negros do quilombo de Tijuaçu foram vitimados pela expropriação, pois os “brancos” tomavam suas terras, normalmente aproveitando a penúria pela qual esses passavam por causa da seca, da falta de água e da comida, encontrando, na forma da posse, a maneira de entrar na terra. A posse abriu, portanto, uma possibilidade de os agricultores quilombolas conquistarem a autonomia do seu trabalho. Foi por meio dela e pela luta a liberdade que os negros conseguiram ocupar o território no distrito de Senhor do Bonfim, conseguindo em 1998, a aprovação e o reconhecimento territorial da comunidade Negra Rural de Tijuaçu. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 11 12 Desse modo, as contradições que existem no mundo, onde o capitalismo impõe a desigualdade social, econômica e política são muitas. O importante é enquanto estudante de Geografia, entender que o espaço agrário brasileiro é cheio de conflitos e que, para ser respeitado diante de um sistema perverso, é preciso muita luta contrária ao atual modelo econômico. REFERÊNCIAS BENEDITO, Mouzar. Luiz Gama: O libertador de escravos e sua mãe libertária, Luiza Mahin. São Paulo: Expressão Popular, 2006. BRASIL. Constituição da República Federativa. 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