Souvent considéré comme la terre du métissage, le Brésil a toujours

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Proposta EDP Pensamento Geográfico.
Céline Raimbert
Doutoranda em Geografia
IHEAL / CREDA – Université de Paris III Sorbonne Nouvelle
Para uma geografia dos quilombos : as contribuições da geografia nos estudos quilombolas.
Muitas vezes considerado como a terra da mestiçagem, o Brasil mostra a amplidão da sua riqueza e
da sua diversidade cultural (Freyre, 1993; Ribeiro, 1995, entre outros). E é verdade que esse país –
continente apresenta-se como o lugar do encontro e dos intercâmbios entre o Branco, o Índio e o
Negro. Entretanto, apesar da dita democracia racial e da ideologia da miscigenação (anos 1930),
seria realmente razoável falar de relações harmoniosas entre essas três grandes figuras do Brasil?
Indubitavelmente não. Índios e Negros, no âmbito da construção mítica de um passado mestiço,
ficam invisíveis e por um longo período relegados à classe das minorias étnicas. Foi somente nos
anos 1980 com volta da democracia que as políticas brasileiras começam a se preocupar com essas
populações. Nesse sentido, seguindo a tendência das políticas multiculturais, a Constituição de 1988
(artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias) representa um momento decisivo
para a política social brasileira. Outorgam-se aos descendentes de escravos fugidos (quilombolas)
direitos específicos. Assim, até pouco relegados a um tempo histórico, os quilombos, cujo exemplo
mais famoso fica a República de Palmares, tornam-se um elemento fundamental da sociedade
brasileira contemporânea. Apesar do reconhecimento oficial da existência de comunidades
remanscentes de quilombos desde 1988, foi apenas em 1995 quando foi titulada a primeira terra
quilombola (Rio das Rães, Bahia, Jean-François Véran, 2003). Com efeito, as comunidades
quilombolas são o fruto da aquisição de um estatuto oficial próprio, em outros termos o fruto de
uma categorização específica por parte do Estado. Assim as comunidades negras tornam-se
quilombolas (certificação e em seguida titularização) só após a elaboração de um diagnóstico
extremamente detalhado (RTID, Relatório Técnico de Identificação e Delimitação do
Território). A realização deste diagnóstico é da responsabilidade do INCRA, o quem pode
solicitar a colaboração de outras instituições, nomeadamente universitárias. A esse respeito, muitas
vezes os atores institucionais pedem a ajuda dos antropólogos, historiadores e mesmo dos juristas.
Existem assim numerosas monografias sobre o assunto, feitas por pesquisadores brasileiros. Estes
laudos antropológicos, históricos e/ou jurídicos (por exemplo Edna Castro, Rosa Acevedo Marin,
1999). Podemos ver então pesquisa científica e avaliação misturar-se: as comunidades quilombolas
constituem uma categoria da prática institucional e, ao mesmo tempo, um objeto científico
(Véronique Boyer, 2010). A atualidade dos quilombos é muito rica dos dois pontos de vista: o da
política e o da pesquisa acadêmica. As pesquisas no Brasil e no exterior são cada vez mais
numerosas mas ficam, na maioria dos casos, restritas aos campos das disciplinas supracitadas. Os
antropólogos (Alfred Wagner de Almeida, José Mauricio Arrutti, Ilka Boaventura Leite, Eliane
O’Dwyer, Véronique Boyer), sociólogos (Edna Castro, Jean-François Véran), historiadores (Rosa
Acevedo Marin, Edison Carneiro) e juristas (Girolamo Domenico Treccani) cortam-se a parte do
leão. Neste contexto, quid da geografia? Existem alguns geógrafos especialistas desse assunto,
nomeadamente Rafael Sánzio Araújo dos Anjos, mas ficam uma minoria no paisagem das pesquisas
relativas aos quilombolas. Conseqüentemente, como podemos considerar e pensar duma maneira
nova o lugar da geografia e dos geógrafos nos estudos relativos aos quilombolas? O território,
Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3
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elemento central dos quilombos e dos quilombolas, nunca é ausente das análises propostas pelos
acadêmicos aqui mencionados. Mas, nesses casos, o território é mais um objeto do que um sujeito
de pesquisa. Então, a geografia poderia permitir oferecer novas perspectivas aos estudos e
avaliações sobre quilombos brasileiros, colocando o território no coração da análise, mais do que na
periferia de outras temáticas tais como a etnicidade, a identidade, a ancestralidade ou os ritos,
tradições e saberes de qualquer tipo. Por isso, quereríamos põe a questão da contribuição da
geografia e da originalidade do olhar geográfico nas pesquisas sobre os quilombos do Brasil.
Trata-se de interrogar-se sobre as práticas geográficas, suas especificidades e suas potencialidades
de inovação num domínio já bem identificado. Refletir nas interações frutuosas que poderiam
concretizar-se entre a geografia e os estudos quilombolas constituí um campo novo que já foi objeto
de alguns inícios de reflexões por parte de jovens pesquisadores (Lourdes de Fátima Bezerra Carril,
2006 ; Maria Albenize Farias Malcher, n/d). Propomo-nós aqui aprofundizar essas ligações. Com
efeito, o papel da geografia não pode e não deve limitar-se à simples colecta de dados G.P.S. e ao
mapeamento dos espaços quilombolas. Como evocamos anteriormente, as questões territoriais se
revelam essenciais. A importância do papel do território aparece muito nitidamente no enunciado do
artigo 68: “Aos Remanescentes das Comunidades dos Quilombos que estejam ocupando suas
terras é reconhecida à propriedade definitiva, devendo o Estado, emitir-lhes os respectivos títulos”.
A titularização de uma comunidade quilombola consiste, antes de tudo, na apropriação de um
território particular e claramente delimitado. A análise dos quilombos pela abordagem geográfica e
territorial permite também dar uma perspicácia suplementar a domínios de predilecção da
antropologia ou da sociologia. A metodologia da geografia social (Guy Di Méo) assim como da
geografia cultural (Armand Frémont, Jean Gallais, Joël Bonnemaison) pode revelar-se muito
interessante e útil. As noções de territorialidade, de identidade territorial (Rogério Haesbaert) o de
geosímbolo (Joël Bonnemaison) podem dar esclarecimentos indispensáveis a uma melhor apreensão
do que representa(m) o(s) território(s) para as populações quilombolas. O território revela-se
profundamente polimórfico ; os territórios políticos, culturais, econômicos sobrepoêm-se sem
juntar-se perfeitamente, se agenciam e se modelam segundo estratégias socioculturais muito
arraigadas e poderosas. Para dar um marco mais empírico a essas questões teóricas, ilustraeamos
nossa fala apoiando-nos sobre pesquisas realizadas em 2008/2009 para nossa dissertação de
mestrado (Comunidade e Territórios. O caso da vila quilombola do Abacatal, Belém do Pará,
defendida no junho de 2009 na Université de Paris III – Sorbonne Nouvelle) dedicada ao estudo da
comunidade quilombola do Abacatal e às interações e reciprocidades entre as noções e as
realidades da comunidade e dos seus territórios. Desse modo, vamos apontar cómo a análise dos
territórios e das representações terrtoriais permitem realçar mecanismos sociais e identitários
profundos. As contibuições da geografia podem assim estar consideradas não apenas no domínio
da pesquisa, mas também ao nível das demarcações oficiais das terras quilombolas, reafirmando,
nessa ocasião, a fertilidad do diálogo das abordagens disciplinares.
Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3
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