Responde quem sabe Rev. Medicina Desportiva informa, 2013, 4 (3), pp. 7–8 A cintigrafia e o desporto Dr. José Manuel Pereira de Oliveira Médico Especialista em Medicina Nuclear, Diretor Clínico de HPP-MM, Porto Resumo / Abstract As técnicas de Medicina Nuclear desempenham um papel importante na avaliação de lesões provocadas na prática desportiva. A cintigrafia óssea com Tc-99m difosfonatos é um dos exames de Medicina Nuclear mais frequentemente realizados. Esta técnica é conhecida pela sua elevada sensibilidade e pela possibilidade de obtenção de imagens de corpo inteiro. As imagens tomográficas (SPECT) podem aumentar a sensibilidade, a especificidade e a localização de uma anomalia. O PET-CT com fluoreto-18 NaF é uma técnica que tem maior resolução espacial e sensibilidade e que tem vindo a ser cada vez mais utilizada na avaliação de lesões relacionadas com o desporto. Nuclear Medicine techniques play an important role in the management of sports-related stress injures. Bone scintigraphy with Tc-99m diphosphonates is one of the most frequently performed of all radionuclide procedures. This technique is known for its high sensitivity and for its ability for whole body imaging. SPECT imaging may improve sensitivity, specificity, and localization of an abnormality. PET-CT with Fluorine-18 NaF has higher spatial resolution and sensitivity and is becoming increasingly used in the evaluation of sports-related injury. Palavras-Chave / Keywords Cintigrafia, medicina nuclear, fratura de esforço, desporto. Scintigraphy, nuclear medicine, stress fracture, sports. Qual é o termo mais correto: cintigrafia ou cintilografia? É mais habitual empregar o termo cintigrafia. Como funciona a cintigrafia? De forma genérica, a cintigrafia é uma técnica de Medicina Nuclear. Esta especialidade médica usa substâncias radioativas (radiofármacos) no diagnóstico e no tratamento de doenças. Os radiofármacos consistem em pequenas moléculas radiomarcadas que após administrados, de um modo geral por via endovenosa, se localizam em órgãos, tecidos ou recetores celulares. Os radiofármacos emitem radiação caraterística que é detetada por instrumentos dedicados, como por exemplo a câmara gama quando são utilizados radioisótopos que decaem por emissão de fotão simples, ou a câmara PET quando são utilizados radioisótopos que decaem por emissão de positrões. Os procedimentos de Medicina Nuclear fornecem uma informação predominantemente funcional, pelo que frequentemente detetam anomalias antes das imagens anatómicas. A técnica diagnóstica de Medicina Nuclear mais utilizada em Medicina Desportiva é a cintigrafia óssea, que dá informações acerca do metabolismo osteoblástico. Em algumas situações clínicas o estudo habitual em três fases pode ser complementado com imagens de ampliação (“pinhole”) ou tomográficas (SPECT), estas últimas de particular interesse na avaliação da coluna vertebral. Desde há alguns anos é possível fazer aquisição de estudos cintigráficos em conjunto com imagens de TAC (SPECT/CT). Revista de Medicina Desportiva informa Maio 2013 · 7 Recentemente, os estudos de PET-CT com F-18 fluoreto de sódio (18F-NaF) têm sido introduzidos na prática clínica como uma alternativa à cintigrafia óssea. Têm como vantagem uma melhor resolução, maior sensibilidade e menor tempo para a aquisição de imagens. A experiência na avaliação de pacientes com lesões desportivas é ainda limitada, assim como a comparação com outras técnicas. … mas pode haver algum receio da atividade ionizante … Os estudos diagnósticos de Medicina Nuclear usam radiação ionizante, tal como os estudos com Rx. São procedimentos muito seguros atendendo a que nos estudos diagnósticos são administradas atividades baixas. Adicionalmente, os radiofármacos usados são na maioria dos casos eliminados rapidamente do organismo, para além de perderem com o tempo a sua atividade. De um modo geral, numa cintigrafia óssea a dose efetiva, e em termos comparativos, é ligeiramente superior à exposição média/ano da população a fontes naturais de radiação ionizante. Tem sido muito usada no diagnóstico de fraturas de esforço. Tem vantagem sobre a RMN? E as desvantagens? A cintigrafia óssea em três fases é a técnica de Medicina Nuclear apropriada para estudar pacientes com suspeita de fraturas de esforço. As referências da literatura apontam Figuras – PET-CT com fluoreto-18 (em cima) NaF – fratura de stress a nível da pars articularis de L5 (à esquerda). para valores sobreponíveis relativamente à sensibilidade e valores de especificidade ligeiramente inferiores em comparação com a RMN. Podem ser causas de falsos positivos a infeção e os tumores ósseos. A RMN tem as vantagens inerentes ao maior detalhe anatómico, para além 8 · Maio 2013 www.revdesportiva.pt de não submeter o paciente à exposição à radiação ionizante, enquanto a cintigrafia óssea permite facilmente realizar imagens de corpo inteiro, possibilitando a deteção de eventuais lesões adicionais. Após o diagnóstico da fratura de esforço com este método, tem interesse ou é possível monitorizar a fratura com a cintigrafia? A cintigrafia óssea não é uma técnica útil na monitorização precoce do tratamento de uma fratura. O radiofármaco usado na cintigrafia óssea (difosfonato marcado com tecnécio-99m) reflete as alterações na fisiologia óssea em reposta a um determinado estímulo. Os difosfonatos são captados predominantemente nos cristais de hidroxiapatite, em proporção à atividade osteoblástica, pelo que os estudos permanecem positivos, embora de um modo geral com menor intensidade de captação, durante um período de tempo considerável, podendo a resolução das alterações cintigráficas não acontecer até 4 a 6 meses após a lesão. Que outros diagnósticos são possíveis no desporto? Outras situações clínicas na prática desportiva que podem ser estudadas pelas técnicas de Medicina Nuclear incluem as periostites, as fraturas por avulsão, as lesões por sobrecarga e a necrose avascular. Sendo um exame que interessa a todo o corpo, é útil na avaliação de um atleta aquando da sua contratação? A cintigrafia óssea tem caraterísticas já anteriormente referidas – elevada sensibilidade na deteção de lesões ósseas e possibilidade de realizar estudos de corpo inteiro, que tornam esta técnica num método de eleição na avaliação osteoarticular de atletas no contexto referido. Figura – Cintigrafia óssea em três fases – periostite de ambas as tíbias Bibliografia 1. Lim R, Fahey FH, Drubach LA, et al. Early experience with 18F sodium fluoride bone PET in young patients with back pain. J Pediatr Orthop 2007;27: 277–282. 2. Grant FD, Fahey FH, Packard AB, et al. Skeletal PET with 18F-fluoride: applying new technology to an old tracer. J Nucl Med 2008;49: 68–78. 3. Weber DA, Makler PT Jr., Watson EE, et al. Radiation absorbed dose from technetium-99m-labeled bone imaging agents. Task Group of the Medical Internal Radiation Dose Committee, The Society of Nuclear Medicine. J Nucl Med. 1989;30:1117-1122. 4. Carpeggiani C, Landi P, Michelassi C, e tal. Trends of increasing medical radiation exposure in a population hospitalized for cardiovascular disease (1970–2009). PLoS One. 2012;7(11) 5. www.umich.edu/~radinfo/introduction/ risk.htm. 6. Patel DS, Roth M, Kapil N. Stress fractures: diagnosis, treatment, and prevention. Am Fam Physician. 2011 Jan 1;83(1):39-46. 7. 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