Universidade de Coimbra Faculdade de Medicina Imagiologia - Medicina Nuclear Texto de Apoio Prof. J M Pedroso de Lima Colaboração de Dra Paula Lapa e Dra Ana Sofia Semedo Aula nº 4 Objectivos: Conhecer sucintamente as principais técnicas e métodos com aplicação clínica na área da endocrinologia: cintigrafia tiroideia, cintigrafia de corpo inteiro com Iodo-131, cintigrafia das paratiroides. Conhecer sucintamente as principais técnicas e métodos com aplicação terapêutica em situações de: hipertiroidismo, cancro da tiroide, tratamento paliativo de dores ósseas, ... . Conhecer sucintamente outras aplicações clínicas da medicina nuclear (em gastroenterologia, neurologia, ... ) 2.6. Medicina nuclear em endocrinologia Uma das primeiras áreas de intervenção da medicina nuclear foi a das doenças da tiroide. Utilizando isótopos radioactivos do Iodo (Iodo-131, Iodo-123 ou Iodo-127) a medicina nuclear tem a possibilidade de intervir na área do diagnóstico (usando técnicas in vivo e in vitro) e da terapêutica do hipertiroidismo e do cancro da tiroide. A caracterização funcional dos nódulos tiroideus bem como a detecção e tratamento de metástases de carcinomas bem diferenciados (folicular e papilar) são exemplos da sua utilidade neste campo. Indicam-se a seguir, sumariamente, algumas das técnicas mais utilizadas com essa finalidade. 2.6.1. Cintigrafia da tiróide com 99mTc Os estudos cintigráficos da tiróide, como a grande maioria dos exames em Medicina nuclear, são estudos pouco invasivos e com metodologia simples. O pertecnetato de 99mTc é um dos radiofármacos mais frequentemente utilizados em Medicina nuclear diagnóstica, pelas características muito favoráveis de dosimetria e pela qualidade das imagens obtidas. Este radiofármaco é captado pelas células foliculares da tiróide mas não sofre organificação. A cintigrafia da tiróide com pertecnetato de 99mTc permite avaliar a presença de alterações morfofuncionais da tiróide. O exame permite identificar a presença de nódulos e avaliá-los quanto à sua capacidade funcional, classificando-os em nódulos “frios” ou hipofixantes, “quentes” ou hiperfixantes e 1 “mornos” ou isofixantes, complementando o estudo morfológico fornecido pela ecografia. Os nódulos da tiróide são bastante frequentes, existindo em cerca de 50% da população com idade superior a 50 anos. Geralmente são múltiplos e de dimensões reduzidas, predominando no sexo feminino e aumentando de frequência com a idade. Na sua maioria são de natureza benigna e comportamse cintigraficamente como áreas hipofixantes. Sabe-se, no entanto, que a probabilidade de um nódulo hipofuncionante ser de natureza maligna é maior, particularmente se se tratar de um nódulo único/dominante num indivíduo jovem, sobretudo se do sexo masculino. Contudo, a cintigrafia da tiróide não permite excluir malignidade em nódulos “quentes”, nem distinguir benignidade em nódulos “frios”. A cintigrafia com 99mTc (pertecnetato) desempenha ainda um importante papel no diagnóstico das causas de tirotoxicose, na identificação de tecido tiroideu ectópico, no estudo do bócio difuso, do bócio multinodular e do nódulo autónomo. 2.6.2. Cintigrafia da tiróide com 131I O 131I é um radiofármaco com biocinética semelhante ao iodo estável. É captado pelas células foliculares da tiróide sob a forma de iodeto, sendo transformado, por oxidação, em iodo (orgânico), fundamental para a síntese de hormonas tiroideias. Já no lúmen folicular é incorporado nos resíduos tirosil da molécula de tiroglobulina, formando a monoiodotirosina e a diiodotirosina, precursores das hormonas iodadas da tiróide. A cintigrafia da tiróide com 131I é de grande utilidade no estudo de doentes com hipertiroidismo, designadamente por doença de Graves-Basedow, bócio multinodular tóxico e nódulo autónomo. Este exame permite não só a obtenção da imagem morfofuncional da tiróide mas também a determinação da percentagem de captação glandular do radiofármaco, parâmetro necessário 2 para o cálculo da actividade terapêutica de 131I a administrar (a qual depende da estimativa da massa glandular e da percentagem de fixação glandular do radiofármaco às 24 horas). A cintigrafia da tiróide com 131I faculta ainda informações importantes na caracterização funcional da patologia nodular identificada na cintigrafia com 99mTc, como nódulos isofixantes (“mornos”) e hiperfixantes (“quentes”) e na pesquisa de tecido tiroideu ectópico e de bócio mergulhante. 2.6.3. Cintigrafia corporal com 131I Os doentes com o diagnóstico de carcinoma diferenciado da tiróide sujeitos a tiroidectomia total apresentam habitualmente no seu protocolo de seguimento a realização de cintigrafia corporal com 131I, sempre que possível antes do início da terapêutica hormonal de substituição. Este estudo tem por finalidade identificar a presença de tecido tiroideu residual após cirurgia, avaliar a sua extensão e pesquisar eventuais metástases. Após terapêutica ablativa com 131I a cintigrafia é novamente efectuada 6 a 8 meses depois, passando a realizar-se periodicamente de acordo com a situação clínica do doente, para controlo da evolução da doença. Estes exames de controlo têm por objectivo a detecção de possíveis recidivas ou metástases, devendo ser efectuados e valorizados conjuntamente com outros parâmetros, designadamente níveis de TSH, de tiroglobulina, de anticorpos antitiroglobulina e teste de interferência, se indicado. 2.6.4. Cintigrafia das paratiróides A paratormona, produzida nas glândulas paratiróides, desempenha um papel fulcral no controlo do metabolismo do cálcio. O hiperparatiroidismo conduz a hipercalcémia que, nas formas mais severas, acaba por tornar-se sintomática. A forma secundária é devida a patologias que cursam com 3 hipocalcémia, designadamente insuficiência renal crónica, osteomalácia e síndromes de malabsorção. O hiperparatiroidismo primário está associado, em 80% dos casos, a adenomas solitários, em 15% a hiperplasia e, em 5%, a carcinoma. A sua terapêutica é cirúrgica, sendo essencial a correcta identificação de tecido paratiroideu anómalo para ressecção, atendendo a que a reintervenção é de difícil execução técnica e está associada a um aumento da mortalidade. Os métodos de radiodiagnóstico, denominadamente a ecografia, a tomografia computorizada e a ressonância magnética têm um papel limitado, pelo que é de grande utilidade o contributo prestado pela medicina nuclear. O 99mTc-sestaMIBI (metoxiisobutirilisonitrilo) apresenta uma biocinética com diferentes velocidades de washout da tiróide e das paratiróides, o que permite a obtenção de imagens iniciais (10-15 minutos) correspondentes à fase tiroideia e mais tardias (2-3 horas) correspondentes à fase paratiroideia. Uma alternativa válida ao 99mTc-sestaMIBI é a 99mTc-Tetrofosmina, com resultados similares em vários estudos publicados. 4 2.7. Medicina Nuclear Terapêutica 3. Outras Aplicações A medicina nuclear tem importante papel no diagnóstico, avaliação ou tratamento de muitas outras situações clínicas. No âmbito da gastrenterologia são geralmente valorizadas as informações fornecidas pelas técnicas radioisotópicas usadas para estudo do trânsito esofágico, do esvaziamento gástrico, e na detecção de mucosa gástrica 5 ectópica ou de hemorragia intestinal. Outra aplicação importante consiste na avaliação da actividade inflamatória em situações de doença de Chron e de colite ulcerosa (usando leucócitos-Tc99m). A cintigrafia hepato-biliar utiliza radiofármacos (derivados do ácido iminodiacético marcados com Tc99m) selectivamente captados pelos hepatócitos e eliminados por via biliar e tem sido usada, com elevados valores de sensibilidade e especificidade, no diagnóstico de colecistite aguda. Outras situações em que pode ser útil são a detecção de derrames biliares (v.g. após cirurgia das vias biliares), a exclusão de atrésia das vias biliares em 6 recém nascidos e a avaliação de obstruções biliares. A angiocintigrafia hepática usa como agente radioactivo eritrócitos-Tc99m e possibilita a identificação de hemangiomas hepáticos com valores elevados de acuidade diagnóstica. A neurologia nuclear utiliza diversas técnicas, sendo as de uso mais generalizado as que permitem a avaliação do estado da perfusão cerebral através da administração de radiofármacos lipofílicos com capacidade para atravessar a barreira hemato-encefálica. Estas substâncias são captadas pelas células cerebrais de modo proporcional à intensidade da sua perfusão e podem contribuir de modo importante para o diagnóstico de doenças do foro cerebro-vascular, de demências e de epilepsia. 7 4. Perspectivas futuras O desenvolvimento da medicina nuclear tem-se habitualmente processado, ao longo do tempo, em função dos avanços registados nos equipamentos de detecção e de tratamento de dados bem como na investigação de novos radiofármacos para diagnóstico e tratamento. Patient History (MS 599) Patient History (MS 599) 37 year old female, Villoglandular Carcinoma of uterine cervix 37 year old female, Villoglandular Carcinoma of uterine cervix Evaluation before treatment planning. Evaluation before treatment planning. Imaging Procedure Imaging Procedure Transmission emission tomography after the injection of Transmission emission tomography after the injection of 7 mCi F-18 FDG of the chest, abdomen and pelvis (chest study shown). 7 mCi F-18 FDG of the chest, abdomen and pelvis (chest study shown). Findings Findings Uptake in left supraclavicular region. Uptake in left supraclavicular region. Combined procedure shows uptake to be located in cervical muscles. Combined procedure shows uptake to be located in cervical muscles. Clinical Impact Clinical Impact The Functional Anatomical Mapping Advantage The Functional Anatomical Mapping Advantage Differential diagnosis of F-18 FDG uptake. Exclusion of Differential diagnosis of F-18 FDG uptake. Exclusion of involvement of lymph nodes. Findings on F-18 FDG due to physiologic uptake in tense cervical involvement of lymph nodes. Findings on F-18 FDG due to physiologic uptake in tense cervical muscles. muscles. Images courtesy of Rambam Medical Center, Haifa, Israel. Images courtesy of Rambam Medical Center, Haifa, Israel. O actual interesse na aplicação clínica da tomografia por emissão de positrões irá ser, certamente, o mais importante factor no desenvolvimento, a curto prazo, da medicina nuclear. No entanto, têm-se verificado também avanços importantes em outras vertentes dos quais são exemplos a investigação de novas possibilidades em terapêutica metabólica e o aparecimento de novos equipamentos para diagnóstico que tiram vantagem da fusão, num único registo, de diferentes tipos de imagens funcionais (obtidas em camara gama) e morfológicas (tomografia computorizada). Referências: 1. Imagiologia Básica – Texto e Atlas. João Martins Pisco. LIDEL Setembro 2003 2. Medicina Nuclear (2 ed.) James H. Thrall e Harvey Ziessman. Guanabara Koogan. 2001 3. www.nucmedlinks.com 8