práticas pedagógicas nos anos iniciais do ensino fundamental

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PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO
FUNDAMENTAL: OLHARES E NOVOS OLHARES
Heloisa Toshie Irie Saito1 - UEM
Maria Angélica Olivo Francisco Lucas2 - UEM
Maria de Jesus Cano Miranda 3 - UEM
Regina de Jesus Chicarelle4 - UEM
Grupo de Trabalho - Didática: Teorias, Metodologias e Práticas
Agência Financiadora: não contou com financiamento
Resumo
O projeto de pesquisa "Olhares e novos olhares: analisando e redimensionando as práticas
educativas para as crianças pequenas", em desenvolvimento desde 2012, com término
previsto para outubro de 2015. Fundamenta-se em pressupostos da Teoria Histórico-Cultural,
a qual concebe o ensino como condição para o processo de humanização, devendo ser
adequadamente organizado para que o sujeito se aproprie de conceitos científicos, sendo
fundamental, para tanto, a existência de mediações entre o adulto e a criança por meio de
práticas pedagógicas intencionais, significativas e dinâmicas. Possui como premissa o
desenvolvimento de um trabalho colaborativo entre universidade e instituições públicas de
ensino do município de Maringá-PR. Agrega pesquisadores de diversas frentes: docentes
universitários, assessores da secretaria municipal de educação, acadêmicos de graduação e
alunos da pós-graduação. Pretende, a partir de uma pesquisa-ação, contribuir para o processo
formativo da equipe de pesquisa e dos professores das instituições de Educação Infantil e
Ensino Fundamental que dela participam. Justifica-se pela necessidade de realizar análises
cuidadosas e constantes do âmbito escolar para a condução de práticas pedagógicas eficazes,
tendo em vista uma formação humana emancipatória, assim como uma formação docente
inicial e continuada de qualidade. Quatro aspectos nortearam nossos olhares durante as
observações das práticas pedagógicas: planejamento; relações interpessoais no âmbito escolar;
ação docente nos encaminhamentos metodológicos e estrutura física das instituições. Tais
aspectos foram relatados em diários de campo nos quais os pesquisadores descreveram
minuciosamente suas percepções. Percebeu-se a necessidade de promover reflexões
constantes acerca de práticas pedagógicas que, muitas vezes, ficam naturalizadas com o
tempo, a fim de contribuir para a ampliação da formação docente. Além disso, constatou-se
1
Doutora em Educação – USP. Docente da Universidade Estadual de Maringá, Maringá, Paraná, Brasil. E-mail:
[email protected]
2
Doutora em Educação – USP. Docente da Universidade Estadual de Maringá, Maringá, Paraná, Brasil; E-mail:
[email protected]
3
Doutora em Educação – UNESP. Docente da Universidade Estadual de Maringá, Maringá, Paraná, Brasil; Email: [email protected]
4
Doutora em Educação – USP. Docente da Universidade Estadual de Maringá, Maringá, Paraná, Brasil; E-mail:
[email protected]
ISSN 2176-1396
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também que o projeto contribuiu para ampliar a formação dos diferentes profissionais
envolvidos na pesquisa.
Palavras-chave: Prática pedagógica. Formação de professores. Reflexão da prática
pedagógica.
Introdução
Este relato de experiência objetiva apresentar algumas etapas já desenvolvidas do
projeto de pesquisa “Olhares e novos olhares: analisando e redimensionando as práticas
educativas para crianças pequenas”, em andamento desde 2012, com o término previsto para
outubro deste ano, o qual possui como premissa o estabelecimento de um trabalho
colaborativo entre universidade e instituições públicas de ensino do município de Maringá.
Inicialmente, de forma breve, descreveremos o projeto de pesquisa, destacando seu
objetivo, justificativa, referencial teórico que embasa as análises e metodologia para que, na
sequência, possamos relatar diferentes ações já efetivadas durante a execução do mesmo. Em
seguida, apresentaremos alguns dados coletados a partir da observação da prática pedagógica.
Por fim, reafirmamos a necessidade de reflexão a partir da ação docente como forma
de enriquecer o debate acerca da prática pedagógica, possibilitando assim uma ressignificação
da mesma, contribuindo desse modo para a formação continuada de professores e para o
pleno desenvolvimento das crianças da educação infantil e dos anos iniciais do Ensino
Fundamental.
O projeto de pesquisa
O projeto de pesquisa “Olhares e novos olhares: analisando e redimensionando as
práticas educativas para crianças pequenas” objetiva contribuir para o processo de
profissionalização de professores nos moldes de formação continuada. Para isso, pensou-se
em momentos que possibilitassem reflexões acerca da ação docente, tendo em vista a
implementação de práticas pedagógicas inovadoras que sejam intencionais e sistematizadas,
visando o desenvolvimento das crianças, tendo os profissionais das escolas como parceiros da
pesquisa. Justifica-se pela necessidade de realizar leituras cuidadosas e constantes do âmbito
escolar para a condução de práticas pedagógicas eficazes, tendo em vista uma formação
humana emancipatória, assim como afirma Leontiev (1978, p. 284): “[...] criar um sistema de
educação que lhes assegure um desenvolvimento multilateral e harmonioso que dê a cada um
a possibilidade de participar enquanto criador em todas as manifestações da vida humana”.
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Respaldados em pressupostos da teoria histórico-cultural, defendemos que o ensino é
condição para o processo de humanização e que, portanto, deve ser adequadamente
organizado para que o sujeito se aproprie de conceitos científicos, sendo fundamental, para
tanto, a existência de mediações entre o adulto e a criança por meio de práticas pedagógicas
intencionais, significativas e dinâmicas (VIGOTSKII, 2001).
Acreditamos que a análise de práticas pedagógicas é essencial para a reflexão acerca
das propostas educacionais atuais, verificando a influência das determinações oficiais e o
comprometimento político e ideológico dessas práticas. Portanto, não foi possível, no decorrer
da pesquisa e nos escritos resultantes da mesma, desconsiderar a materialidade histórica que
sustenta a ação docente. Entende-se que as ações didáticas efetivadas no interior das
instituições escolares expressam uma determinada formação humana que contribui para a
manutenção da organização social, política e econômica vigente. O princípio que sustenta este
pensamento considera que “a produção das ideias, das representações e da consciência está, a
princípio, direta e intimamente ligada à atividade material e ao comércio material dos
homens; ela é a linguagem da vida real” (MARX; ENGELS, 1998, p. 18).
Fundamentados no pressuposto acima, reconhecemos que para entender a educação é
necessário considerar a materialidade histórica que lhe dá sustentação e que, por isso,
investigar uma particularidade deste todo (as práticas pedagógicas realizadas na Educação
Infantil e no 1º e 2º ano do Ensino Fundamental) significa compreender esse particular como
expressão de uma totalidade que o direciona.
Segundo Elliot (1998, p. 142), “[...] a tarefa do pesquisador acadêmico seria a de
estabelecer uma forma de pesquisa colaborativa que fosse transformadora da prática
curricular”. Almejando este encaminhamento, definimos pela metodologia da pesquisa-ação.
No entendimento de Gomes (2009, p. 86), neste tipo de pesquisa “há, da parte do pesquisador
e dos colaboradores, um esforço para produzir uma reflexão na prática, pois ambos os lados
trazem conhecimentos diferentes para o trabalho conjunto”.
Por esse motivo, a equipe desse projeto de pesquisa é constituída por docentes
universitários, assessores da secretaria municipal de educação, acadêmicos da graduação e da
pós-graduação. Todos participaram, durante o ano de 2012, de sessões de estudo realizadas
semanalmente. A partir do segundo semestre desse mesmo ano, estendendo-se até 2013,
realizamos, concomitantemente às sessões de estudo, a parte empírica da pesquisa, que
consistiu em observações quinzenais em turmas de educação infantil e de primeiros e
segundos anos do Ensino Fundamental em quatro instituições públicas de ensino de Maringá.
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Cada pesquisador observou as práticas pedagógicas implementadas em uma determinada
turma, a partir de quatro pontos, os quais constituíram-se em unidades de análise. São elas:
a) planejamento;
b) relações interpessoais no âmbito escolar;
c) ação docente nos encaminhamentos metodológicos;
d) estrutura física das instituições de ensino.
As observações foram registradas em diários de bordo, os quais foram transformados
em relatórios disponibilizados aos demais membros do projeto para discussão e análise.
Depois foram elaborados dois relatórios-sínteses: um constituído pelas análises referentes às
observações realizadas nas instituições de educação infantil e outro pelas dos anos iniciais do
Ensino Fundamental.
Apresentação e análise dos dados
Para esse relato de experiência, em função do limite espacial, optamos por apresentar
as reflexões oriundas dos relatórios produzidos a partir das observações realizadas nos
primeiros e segundos anos do Ensino Fundamental, tendo em vista as quatro unidades de
análise acima destacadas.
Planejamento
A respeito do planejamento foi possível observar situações diferentes nas duas
instituições de Ensino Fundamental participantes do projeto de pesquisa. Contudo, apesar de
distintas, tais situações conduziram-nos à mesma conclusão, cujas razões a seguir serão
esclarecidas.
Em uma das instituições, nenhuma das pesquisadoras conseguiu ter acesso aos
planejamentos e aos planos de aula das professoras das turmas de 1º e 2º ano cuja prática
pedagógica estava sendo observada. Inclusive, algumas professoras apresentavam certo
desconforto quando os planejamentos eram solicitados pelas pesquisadoras. Em alguns casos
percebia-se que as atividades realizadas em sala eram registradas em um caderno. Em outros,
justificava-se o não acesso do pesquisador ao planejamento em função da necessidade de
mudar o que havia previamente planejado devido a imprevistos, tais como: calor excessivo,
ventilador quebrado, ensaio para o dia das crianças, visita ao museu, entre outros.
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Julgamos que esta recusa possa ter três motivos: ou a professora tem consciência de
que seu planejamento diário não corresponde aos objetivos e conteúdos elencados no
planejamento bimestral; ou apenas nele registra os conteúdos a serem desenvolvidos, sem
indicar objetivos, metodologia e procedimentos didáticos; ou, em função de sua experiência
docente, não realizava o plano de aula, pautando-se em práticas enraizadas e naturalizadas.
Fazemos essa afirmação, porque observou-se que muitas atividades eram preparadas ou
selecionadas previamente, mas eram realizadas de forma aleatória, não havendo sequência
entre elas tendo em vista o processo de ensino e aprendizagem de um determinado conteúdo.
Na outra instituição, as pesquisadoras tiveram acesso, inclusive com cópia, somente
aos planejamentos bimestrais, nos quais constava a relação dos conteúdos que deveriam ser
trabalhados e as atividades que deveriam ser realizadas durante o período. Apenas uma teve
acesso ao planejamento diário de uma das professoras, mas tratava-se de listagem de ações
previstas para serem implementadas ao longo do dia, inclusive indicando as páginas dos livros
didáticos a serem resolvidas e constando as atividades impressas a serem coladas nos
cadernos das crianças. Eram planos com muitas atividades, parecendo haver uma preocupação
com o cumprimento do rol de conteúdos e atividades elencados no planejamento bimestral.
Contudo, apesar de não ter sido possível verificar o planejamento diário de outras
professoras dessa segunda instituição, as práticas pedagógicas observadas indicaram que,
provavelmente, se de fato ele existia, tratava-se também de sequências de atividades
desconexas, aparentemente sem objetivos previamente definidos e claros.
Observou-se que, em muitas situações, tais atividades, sejam elas originárias do livro
didático, escritas na lousa ou impressas, eram realizadas continuamente, uma após a outra, até
uma interrupção da aula, como o recreio ou o horário do almoço. Na realidade, em situações
observadas, verificou-se que as crianças resolviam sequências de exercícios, uns após os
outros, página após página, sem que a professora determinasse a priori, em função do
planejamento e do conteúdo que estava sendo desenvolvido, quais deveriam ser feitos.
Essas situações observadas em ambas instituições impossibilitaram a análise da
qualidade dos planejamentos e dos planos de aula. Porém, apesar de distintas, revelaram que
as atividades propostas, algumas com potencial em termos de promoção da aprendizagem,
tornavam-se repetitivas, fragmentadas, superficiais, mecânicas e sem significado para os
alunos. Essa forma de encaminhar a prática pedagógica, em muitas situações, deixava as
turmas mais agitadas e as crianças sem a atenção necessária para realizar as propostas, pois
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não as mobilizavam para os conteúdos ou conceitos em estudo, dificultando assim o processo
de desenvolvimento das mesmas.
Relações interpessoais no âmbito escolar
Dentre as relações estabelecidas no âmbito escolar, destacamos aqui as que envolvem
o professor e as crianças e as que dizem respeito às relações das crianças entre si.
Relações entre professor e as crianças
Intrigadas pela prática vivenciada no primeiro momento da investigação empírica,
classificamos as relações entre professor e alunos observadas marcadas por:
e) laços afetivos: algumas professoras se apresentavam calmas, pacientes e
prestativas. Estas chamavam atenção das crianças constantemente utilizando seus
nomes e fazendo elogios. Uma delas, inclusive, conversava bastante com seus
alunos, permitindo com que todos falassem e expusessem seus pontos de vista, o
que a aproximava muito das crianças. Outras eram ríspidas e mantinham uma
relação fria com as crianças, distanciando-se delas:
f)
acompanhamento das atividades realizadas: em alguns casos, apesar do
relacionamento entre professora e crianças ser cordial, nem sempre havia um
contato próximo aos alunos, sendo necessário, por vezes, que estes fossem até ela
(na mesa ou não) para tirar dúvidas e/ou mostrar-lhe o caderno. Em contrapartida,
outras passavam de carteira em carteira observando a realização das atividades
pelas crianças e estimulando-as a concluí-las;
g) indisciplina: em situações de indisciplina, algumas professoras tornavam-se mais
enérgicas, a ponto de: colocar alunos para fora da sala de aula; deixá-los sem
recreio; chamar membros da equipe pedagógica para solucionar o problema;
ameaçar contar o ocorrido aos pais e, até, desligar o ventilador como forma de
punição;
h) justificativa do fracasso: algumas professoras fizeram comentários com as
pesquisadoras a respeito de problemas dos alunos, sejam eles de cunho escolar ou
familiar, na presença da própria criança, permitindo que toda a turma a ouvisse.
Esta prática se repetia quando algum membro da equipe da escola vinha até a sala
de aula, como uma tentativa de expor/justificar ao outro as dificuldades
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encontradas no encaminhamento da prática pedagógica para com essas crianças e
o envolvimento das mesmas nas ações realizadas naquele ambiente.
Algumas das práticas acima descritas dificultavam e outras favoreciam a interação
entre professor e aluno, tendo em vista a mediação necessária para apropriação do
conhecimento, promovendo aprendizagem e desenvolvimento.
Relação entre criança/criança
Observou-se momentos de bom relacionamento entre as crianças e momentos de
disputas e de falta de cordialidade, com prevalência destas últimas situações.
Houve situações em que, ao correrem entre as carteiras, as crianças criavam obstáculos
colocando bolsas e mochilas e, até mesmo, estendendo o pé para que o colega caísse. Além
disso, elas ofendiam umas às outas e faziam acusações mútuas, mas nem sempre havia
intervenção da professora, mesmo quando solicitada pelas crianças. Situações como essas
ocorriam, principalmente quando não havia atividade a ser realizada ou quando essa não era
significativa a ponto de envolver os alunos em sua resolução.
Acerca das disputas, observou-se excessiva competição para “ser o primeiro” – da fila,
a atender a professora, a terminar as atividades – e para demonstrar “quem pode mais, sabe
mais, tem mais”. Essas situações provocavam agitação e comportamentos agressivos, não
promovendo interação entre elas, tendo em vista o desenvolvimento social e cognitivo.
Acreditamos que essa forma de as crianças se relacionarem esteja intimamente ligada
ao modo como a prática pedagógica era encaminhada, marcada pela descontinuidade, e ao
modo como as atividades eram orientadas, as quais não lhes provocavam interesse, conforme
exposto anteriormente.
Ação docente nos encaminhamentos metodológicos
A observação sistemática da prática pedagógica permitiu-nos refletir acerca de
importantes aspectos que envolvem a ação docente. Dentre eles, aqui destacamos: a qualidade
das atividades propostas e a mediação pedagógica.
Qualidade das atividades
Em todas as turmas observadas verificou-se o predomínio de atividades xerocadas de
livros didáticos ou impressas, as quais eram descontextualizadas, sem sequência, mecânicas,
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repetitivas e improvisadas. Geralmente consistiam em fotocópias de textos, cruzadinhas, caçapalavras, desenhos para pintar; atividades cuja resolução era breve, prescindindo da mediação
do professor. Situações de indisciplina eram vivenciadas nestes momentos, pois alguns as
concluíam rapidamente e outros nem se interessavam pelas mesmas.
Os momentos nos quais a professora solicitava às crianças que já haviam concluído a
atividade a escolher um livro de literatura para ler consistiam em situações repetidas
diariamente que transpareciam ser uma forma de preencher um tempo vago. Esses livros
ficavam ao fundo da sala, sobre uma carteira, contudo, como as crianças já os conheciam, pois
eram sempre os mesmos exemplares, não se interessavam por eles. A atividade de produção
de um jogo da memória foi outra situação que exemplifica a falta de organização. Para tanto,
precisaria previamente separar o material necessário: tesouras, cartolina, papel adesivo
transparente, envelopes, cola. Nada disso foi feito! À medida que os problemas surgiram
durante a produção do jogo, soluções eram encontradas, o que revelou improviso, gerou
indisciplina e tornou a atividade sem objetivo claro, não promovendo aprendizagem.
Em algumas turmas, observou-se que a realização de momentos de conversação com
as crianças eram frequentes e nessas situações, a oralidade era explorada pelas professoras aos
explicarem os conteúdos e as atividades a serem realizadas. As ações de registro nos
cadernos, decorrentes desses encaminhamentos, limitavam-se a escrita do cabeçalho, do título
da atividade, cópia dos textos fotocopiados, resoluções de questões, cruzadinhas e operações
matemáticas. Contudo, pouco tempo era deixado para as crianças pensarem, raciocinarem
sobre a atividade que estavam fazendo, sendo as respostas registradas na lousa muito
rapidamente. Assim, nessas situações, as crianças eram meras copiadoras das respostas
escritas pelas professoras no quadro.
Uma prática recorrente nas duas instituições consistia na realização do cabeçalho
composto pelo nome da escola, cidade, data, tempo, pauta do dia, contagem de meninos e
meninas, representação da quantidade de meninos e meninas por meio de desenhos, soma,
nomes das crianças que faltaram. Essa prática ocupava muito tempo, aproximadamente uma
hora. Por ser repetitiva, muitas crianças só participavam no início, outras, que já sabiam a
sequência, faziam-na primeiro que a professora, e outras não a registravam no caderno.
Questionamo-nos: qual valor desta prática, realizada dessa forma (e das demais anteriormente
relatadas), em termos de promoção da aprendizagem e desenvolvimento das crianças?
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Mediação pedagógica
Acerca da mediação pedagógica, dentre as práticas pedagógicas observadas,
destacaremos aqui as que envolvem a exposição de conteúdos escolares e a correção de
tarefas domiciliares.
Na maioria dos dias letivos observados pelas pesquisadoras, durante parte significativa
do tempo, as professoras ficavam à frente da sala para ministrar a aula, expondo o conteúdo,
chamando a atenção dos alunos e explicando as atividades. Contudo, como já dissemos
anteriormente, na condução da prática pedagógica, percebia-se ausência de um planejamento
prévio que possibilitasse a exploração do conteúdo escolar tendo em vista apropriação de
conceitos científicos, nem ao menos eram utilizados recursos didáticos para explorar o
conteúdo em estudo, dificultando a mediação do conhecimento, principal função do professor.
Em uma das instituições, em todas as salas de aula, nos dias letivos observados, havia
uma monitora auxiliando a professora regente. Sua dinâmica em sala ficava centrada na
correção e colagens de tarefas nos cadernos das crianças. A forma como tal função era
desempenhada, sozinha e ao fundo da sala, dificultava a sua interação com os alunos no
sentido de apontar-lhes o que erraram ou acertaram na resolução da tarefa e, nesse caso, como
deveriam fazer para obter a resposta correta. Também quando a professora realizava a
correção de tarefas, seja coletivamente (na lousa) ou individualmente (no caderno), a
preocupação não era verificar como os alunos fizeram a atividade, por que fizeram daquela
forma e se conseguiram atingir o objetivo da tarefa, revendo em casa o conteúdo explorado
em sala de aula em dias anteriores. Podemos fazer essa afirmação, pois, geralmente, ao
corrigir as tarefas colocava-se uma letra “c” grande em frente ao exercício resolvido
corretamente (seja na lousa ou no caderno) ou consertava-se o que havia sido feito de forma
errônea, sem chamar a atenção da criança para o fato. Aos demais, cabia-lhes fazer o mesmo:
colocar uma letra “c” se sua resposta fosse igual a registrada na lousa ou apagá-la e copiar a
correta.
De forma geral, havia pouca participação das crianças seja nos momentos de
exposição dos conteúdos, seja nas situações de correção das tarefas. Permitia-se que somente
alguns alunos interferissem nas explanações realizadas pela professora e poucos eram
chamados à lousa para resolver os exercícios propostos como tarefa. Além disso, raramente
estabelecia-se conexão entre o conteúdo das falas das crianças e os conteúdos escolares a
serem explorados, não permitindo ir além do conhecimento pautado no cotidiano.
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Estrutura física das instituições de ensino
Em termos gerais, podemos afirmar que as duas instituições de Ensino Fundamental
participantes do projeto de pesquisa eram grandes e tinham boa estrutura física, pois
contavam com biblioteca, salas administrativas (coordenação, direção, secretaria), espaços ao
ar livre, pátio cobertos, quadra poliesportiva, banheiros femininos e masculinos, sala para os
professores, cozinha, refeitório, lavanderia e muitas salas de aulas.
Uma das instituições, durante o ano de 2013, passou por uma grande reforma,
principalmente na parte administrativa, refeitório e quadra poliesportiva. Suas salas de aula
eram amplas, porém com pouca ventilação o que deixava tais espaços muito quentes. O pátio
coberto era pequeno considerando a quantidade de alunos dessa escola. Nele aconteciam os
intervalos no meio do período letivo. Havia um bebedouro grande sem instalações adequadas
para seu funcionamento, pois não escoava a água devidamente, molhava o piso do pátio,
ocasionando quedas. Por não haver atividades direcionadas, durante os intervalos, esse
ambiente tornava-se perigoso devido à agitação das crianças.
Na outra escola, o maior problema, em termos de estrutura física, eram as próprias
salas de aula por serem pequenas. Apesar de possuírem janelas grandes e dois ventiladores,
eram muito quentes devido ao pé direito ser baixo e a cobertura de fibrocimento, combinação
que as tornavam quase insalubres. Nelas havia mesa para o professor, armários, televisão,
aparelho de DVD e carteiras, as quais eram inapropriadas para uso de crianças com 5 a 7
anos, idade da maioria dos alunos que frequentavam o 1º e 2º anos. Anexo a cada sala
destinada aos anos iniciais do Ensino Fundamental havia um espaço externo, que se
revitalizado, poderia ser utilizado pelas crianças e professoras em atividades diversas, além de
aliviar o problema de temperatura dentro das salas de aula.
Nessa escola, o espaço destinado aos intervalos era grande, arborizado, com partes
cobertas e outras não. Além disso, havia uma disposição dos funcionários em colocar
brinquedos, jogos e livros em local onde os alunos pudessem ler e brincar. No entanto,
também pela falta de orientação, a maioria das crianças preferia correr pelo pátio da escola.
Apesar de as instituições contarem com grade espaço externo, incluindo pátio coberto
e descoberto, quadra poliesportiva, terem biblioteca e até laboratório de informática,
raramente esses espaços eram utilizados pelas professoras regentes para realização de
atividades pedagógicas, as quais concentravam-se dentro de sala de aula. As únicas atividades
que as crianças realizavam fora da sala de aula eram as aulas de educação física, de
25590
informática e as visitas semanais, somente pelos alunos do 1º ano, de uma das instituições, a
um parque pertencente a um centro de educação infantil situado ao lado de uma das escolas.
À guisa de conclusão
A partir dos dados expostos, ainda em análise pelo grupo de professores e acadêmicos
participantes do projeto de pesquisa "Olhares e novos olhares: analisando e redimensionando
as práticas educativas para as crianças pequenas", preliminarmente, concluímos que muitas
das práticas pedagógicas implementadas nas escolas não se constituíam em desafio para as
crianças, eram desprovidas de ludicidade, entendo-a como um importante aspecto promotor
de aprendizagem, de intencionalidade, no sentido de ter como referência o produto final de
sua ação perante as crianças, e de sistematicidade, compreendida como organização e
sequenciação necessárias para que os objetivos traçados fossem alcançados.
A partir das reflexões que a análise da prática pedagógica tem-nos possibilitado,
planejamos o momento de retornar às instituições as observações e análises feitas. Para tanto,
concluímos que a melhor alternativa seria realizar um curso de extensão no qual pudéssemos
explorar questões pertinentes ao aprimoramento da prática pedagógica, trazendo para o
universo da academia os professores e gestores das instituições parceiras.
Para finalizar, reafirmamos a necessidade de reflexão a partir da ação docente como
forma de enriquecer o debate acerca da prática pedagógica, possibilitando assim uma
ressignificação da mesma, contribuindo desse modo para a formação continuada de
professores e para o pleno desenvolvimento das crianças da educação infantil e dos anos
iniciais do Ensino Fundamental.
REFERÊNCIAS
ELLIOT, J. Recolocando a pesquisa-ação em seu lugar original e próprio. In: GERALDI, C.
M. G.; FIORENTINI, D.; PEREIRA, E. M. A. (orgs.). Cartografias do trabalho docente.
Campinas, SP: Mercado de Letras: Associação de Leitura do Brasil – ALB, 1998, p. 137-152.
GOMES, M. O. Formação de professores na educação infantil. São Paulo: Cortez, 2009.
LEONTIEV, A. O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Livros Horizonte, 1978.
MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A ideologia alemã. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
25591
VIGOTSKII, L. S. Aprendizagem e desenvolvimento intelectual na idade escolar. In:
VIGOTSKII, L. S.; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento e
aprendizagem. São Paulo: Ícone, 2001. p. 103-119.
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