APROVAÇÃO A monografia sob o título: COMPARAÇÃO ENTRE HEPARINA NÃO FRACIONADA E HEPARINA DE BAIXO PESO MOLECULAR PARA O TRATAMENTO DA TROMBOSE VENOSA PROFUNDA, elaborada por Fábio Ribeiro de Moraes, e aprovada pelos avaliadores, foi aceita pela Comissão de Residência Médica do Hospital do Servidor Público Municipal, com requisito parcial para a Conclusão da Residência Médica em Cirurgia Vascular. _____________________________ _____________________________ _____________________________ 3 AGRADECIMENTOS Agradeço inicialmente aos meus pais pela educação e caráter, os quais foram essenciais para a minha formação. Sou grato ao Dr. Milton Alves das Neves Júnior pela confiança depositada em mim, pela sua paciência em corrigir diversas vezes a monografia e, sobretudo, pelos seus ensinamentos, imprescindíveis para a realização da mesma. Agradeço a equipe da cirurgia vascular deste hospital por serem fundamentais no meu desenvolvimento e do orgulho em ser residente desta clínica. Por isso, dedico esse trabalho ao Dr. Alexandre Petnys, Dra. Maria Lúcia, Dra. Neiva Jacques, Dr. Edgar Rabboni e Dr. Francisco Queda. E, por fim, agradeço aos meus amigos da residência de cirurgia geral pela ajuda e dedicação na coleta de dados, fundamentais para o êxito dessa pesquisa. 4 RESUMO INTRODUÇÃO: A trombose venosa profunda (TVP) é uma doença comum que acomete tanto em pacientes hígidos como internados. Seu tratamento visa impedir a progressão do trombo e assim diminuir as taxas de complicações. A heparina não fracionada (HNF) tem sido considerada padrão para o tratamento do tromboembolismo venoso. No entanto, diversos trabalhos demonstram que a heparina de baixo peso molecular (HBPM) é tão segura e eficaz quanto a HNF, dispensa o controle laboratorial, tem resposta anticoagulante mais previsível, pode ser usada ambulatorialmente e apresenta meia vida plasmática maior e melhor biodisponibilidade. OBJETIVO: Avaliar as taxas de complicações de pacientes internados com trombose venosa tratados com HNF e HBPM. MATERIAIS E MÉTODOS: Estudo prospectivo, distribuído aleatoriamente, com todos os pacientes internados no Serviço de Cirurgia Vascular Hospital do Servidor Público Municipal entre Junho de 2010 a Junho de 2011, com diagnóstico de TVP sem contra-indicação para anticoagulação. Os pacientes foram alocados em dois grupos (HBPM x HNF) e avaliaram-se as taxas de complicações e óbitos dos tratamentos. Análise estatística utilizada foi o teste exato de Fisher e Mann-Whitney. RESULTADOS: Foram estudados 47 pacientes (24-HBPM e 23-HNF) com idade média de 55 anos e o tempo médio de internação foi 5,8 dias-HBPM e 7,8 dias-HNF (p=0,13). Taxa de complicação global foi de 12,7%, sendo no grupo HNF: Sangramento maior (4,3%), TEV recorrente (8,6%) e plaquetopenia (8,6%); e no grupo HBPM: Sangramento menor (4,1%) (p=0,08). Taxa de óbitos foi de 4,2% (2 casos), 5 todos no grupo da HNF (Hemorragia digestiva e TEP) (p=0,23). CONCLUSÃO: A HBPM apresenta menores taxas de complicações e óbitos que HNF em números absolutos, entretanto não houve diferença estatística entre ambos os grupos. 6 ABSTRACT INTRODUCTION: The deep vein thrombosis (DVT) is a common disease that affects both health and hospitalized patients. Its treatment aims to prevent from the thrombus progression and thus decrease the complications rates. The Unfractionated Heparin (UH) has been considered the standard treatment for venous thromboembolism. However, many studies shows that the Low Molecular Weight Heparin (LMWH) is as safe and effective as the UH, dispenses the laboratory control, has a more predictable anticoagulant response, can be used in the ambulatory and presents a longer plasmatic halflife and better bioavailability. OBJECTIVE: Assess the complications rates of the inpatients with deep vein thrombosis treated with UH and LMWH. MATERIALS AND METHODS: Prospective study, randomly distributed, with all inpatients of Vascular Surgery of the Hospital do Servidor Público Municipal of São Paulo between June of 2010 and June of 2011, with the diagnosis of DVT, without contraindication for anticoagulation. The patients were allocated in two groups (UH x LMWH) and the rates of complications and death were evaluated. The statistical analyses used were Fisher exact test and Mann-Whitney. Results: 47 patients were analyzed (24-LMWH and 23- UH) with average age of 55 years old and the average length of stay was 5,8 days-LMWH and 7,8 days-UH (p=0,13). The rate of global complications was 12,7%, UH group: major bleeding (4,3%), recurrent vein thromboembolism (8,6%), thrombocytopenia (8,6%) and LMWH group: minor bleeding (4,1%) (p=0,08). The rate of death was 4,2% (2 cases), all in the UH group (gastrointestinal 7 bleeding and pulmonary thromboembolism) (p=0,23). CONCLUSION: The LMWH shows lower rates of complications and death than the UH in absolute numbers, however there was no statistic difference between both groups. 8 ABREVIATURAS TEV: Tromboembolismo venoso. TEP: Tromboembolia pulmonar. TVP: Trombose venosa profunda. EP: Embolia pulmonar. SPT: Síndrome pós-trombótica. IVC: Insuficiência venosa crônica. HNF: Heparina não fracionada. HBPM: Heparina de baixo peso molecular. AVC: Acidente vascular cerebral. SAF: Síndrome antifosfolipídica. US: Ultra-som. DD: D-dímero. TTPA: Tempo Tromboplastina Parcial Ativada. TIH: Trombocitopenia induzida por heparina. TP: Tempo de Protrombina. INR: International Normatization Rate. rt-PA: Ativador Tecidual Recombinante do Plasminogênio. HSPM: Hospital do Servidor Público Municipal. SBACV: Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular. TSA: Tromboflebite superficial ascendente. PSA: Antígeno prostático específico. 9 ÍNDICE INTRODUÇÃO.................................................................................11 1.EPIDEMIOLOGIA...........................................................................................12 2.ETIOPATOGENIA...........................................................................................14 3.FATORES DE RISCO.....................................................................................16 4.DIAGNÓSTICO CLÍNICO...............................................................................23 5.ÍNDICE DE PREDIÇÃO CLÍNICA...................................................................24 6.DIAGNÓSTICO POR IMAGEM......................................................................26 7.TRATAMENTO...............................................................................................29 8.FILTRO DE VEIA CAVA.................................................................................34 9.JUSTIFICATIVA..............................................................................................35 OBJETIVOS.....................................................................................36 MATERIAIS E MÉTODOS...............................................................37 RESULTADOS.................................................................................42 DISCUSSÃO....................................................................................48 CONCLUSÃO..................................................................................58 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...............................................59 ANEXOS..........................................................................................66 10 INTRODUÇÃO O termo tromboembolismo venoso (TEV) abrange doenças como trombose venosa profunda (TVP) e o tromboembolismo pulmonar (TEP), ambas freqüentes tanto em pacientes internados, como previamente hígidos1. A TVP caracteriza-se pela formação aguda de trombos em veias do sistema profundo, causa obstrução parcial ou total e ocorre em 20% dos pacientes hospitalizados2. Embolia pulmonar (EP) é uma conseqüência da fase aguda da TVP, associada à alta probabilidade de complicações graves e muitas vezes fatais3. TEP é a principal causa de óbitos evitáveis em leitos hospitalares, perfazendo 10% destas mortes4. Nos EUA é estimado 200 mil casos novos de TEV por anos5. A síndrome pós-trombótica (SPT) é uma evolução crônica da TVP, decorrente do dano progressivo e permanente do sistema valvular venoso durante o lento processo de lise de coágulos. Tal síndrome resulta em conseqüências graves como insuficiência venosa crônica (IVC) e é responsável por longo período de afastamento de trabalho, inúmeros casos de incapacitação física e altos custos socioeconômicos2,3. Durante duas décadas, a prevenção da TEV tem sido largamente aceita como uma estratégia efetiva, com boa relação custo benefício6. Atualmente, no Brasil, o protocolo de profilaxia de TVP da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular é utilizado tanto no processo de classificação de risco quanto 11 na definição do tipo de profilaxia7. Porém, apesar dos protocolos sobre prevenção da TVP estarem à disposição de todos os profissionais médicos, publicações recentes indicam que a adoção de medidas profiláticas em hospitais gerais, ainda é insatisfatória8. O tratamento para a trombose venosa visa prevenir embolia pulmonar, a trombose recorrente e evitar a SPT. Além disso, o custo é um fator a ser avaliado para determinar o tratamento ideal9. A heparina não fracionada (HNF) ainda é considerada, por alguns autores, tratamento padrão para TVP. Entretanto, devido a necessidade de permanecer o paciente internado e a restrição na sua mobilidade, o uso da heparina de baixo peso molecular (HBPM) está crescendo cada vez mais9. Muitos ensaios clínicos têm avaliado a eficácia, segurança e conveniência, utilizando a melhoria nos escores da venografia e resultados clínicos em relação a sangramentos, recorrências tromboembólicas e taxas de mortalidade1,10. 1. EPIDEMIOLOGIA A trombose venosa profunda dos membros inferiores é a terceira doença cardiovascular mais freqüente nos EUA. Estimam-se em torno de 170.000 casos novos de TVP e TEP por ano e 90.000 casos de recidivas no mesmo período e resulta em pelo menos 13.000 mortes a cada ano11. Isto equivale a 0,8 casos por 100.000 habitantes, quase 1% da população americana3. Fowkes et al., em 2003, estimaram que a incidência mundial de TVP é de 0,5 casos por 1.000 habitantes/ano12. 12 No âmbito intra-hospitalar, a TVP acomete 84 casos por 100.000 enfermos a cada ano e é a causa mais comum de morbimortalidade em pacientes cirúrgicos, correspondendo de 20 a 30% dos óbitos, nos estudos em necropsias11. Também é responsável por 300.000 a 600.000 hospitalizações/ano2. No Brasil, assim como em outros países da America Latina, as pesquisas sobre a epidemiologia da TEV são escassas13. Maffei et al., em um trabalho com necropsias no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu, encontraram presença de TEP em 19,1% e esta foi responsável pelo óbito em 3,7%13. O mesmo autor, com base em diagnóstico clínico e confirmação flebográfica, descreveu uma incidência de 0,4 caso de TVP por mil habitantes/ano, proporção que foi recentemente refeita para 0,6 por mil habitantes/ano14. Amaury et al., em um levantamento de 13.500 necropsias realizadas no Hospital da Santa Casa de São Paulo, verificaram uma prevalência de 6% de TEP, das quais 4,4% eram a causa do óbito14. Bok et al., após analisar os resultados de 5.261 necropsias, relataram que a EP foi encontrada em 10,3% dos pacientes e foi principal causa da morte em 4,2% dos casos. Concluíram também que a taxa de TEP sem suspeita clínica antes do óbito foi de 84%, sendo que 40% apresentaram embolia pulmonar fatal15. Em outro estudo conduzido em nosso país, foram realizadas 767 necropsias entre 1985 e 1995, quando se identificou tromboembolismo venoso em 3,9% dos casos; destes, em 83% o TEV não havia sido previamente diagnosticado ou considerado. Isso mostra o quanto é difícil realizar o diagnóstico dessa doença16. 13 Ainda no Brasil, o número de internações no Sistema Único de Saúde por TEV foi de 74.335 entre janeiro de 1995 a dezembro de 1996, sendo 54,55% por TVP e 45,45% por TEP5. Mais da metade dos pacientes com TVP desenvolvem insuficiência venosa crônica, que pode ter conseqüências debilitantes e representa um grande peso em termos de produtividade e no uso do serviço de saúde. A prevalência de úlcera de perna é de 300 por 100.000 pessoas e a trombose venosa é responsável por 25% destas. O preço estimado devido a IVC nos EUA por ano é de três bilhões de dólares, com perda de dois milhões de dias trabalhados por ano5. Dados do Ministério da Previdência Social, no informe em 1984, mostraram que a IVC é a 14⁰ causa de afastamento temporário de trabalho17. 2. ETIOPATOGENIA Virchow, em 1856, estabeleceu a relação TVP com TEP e definiu três fatores que isolados ou combinados poderiam resultar em trombose: lesão da parede vascular, estase sanguínea e hipercoagulabilidade5. Depois de 150 anos, a tríade permanece verdadeira e o conhecimento do papel de cada um desses fatores possibilita a compreensão do fenômeno trombótico, propiciando o diagnóstico e a identificação de indivíduos com maior risco, e assim, auxilia no manejo racional desses elementos3. A diminuição do fluxo sanguíneo leva ao aumento da quantidade de sangue nas veias, dilatando-as passivamente. Consequentemente, há uma redução da velocidade do fluxo, ocasionando um turbilhonamento e acúmulo 14 local de hemácias, plaquetas e leucócitos. Esse depósito celular é estabilizado por uma rede de fibrina que prende tais elementos, culminando com a formação do trombo2. Existem poucos relatos que a estase sanguínea como fator isolado seja importante para formar trombose venosa, entretanto, quando associada a alterações da coagulação, resulta num estímulo trombogênico muito efetivo5. O endotélio normal é uma superfície não-trombogênica sobre a qual, não adere plaquetas, nem ocorre ativação de proteínas coagulantes. No entanto, quando há lesão, ocorre uma exposição do subendotélio, favorecendo a agregação de plaquetas e glóbulos brancos e resultando na ativação dos mecanismos de coagulação2. A hipercoagulabilidade está presente quando há aumento de fatores de coagulação e redução dos fatores inibitórios. Isto pode ocorrer em determinados estados fisiológicos, patológicos e terapêuticos, como na gravidez, câncer, trombofilia e uso de medicamentos esteróides e quimioterápicos2. A trombose venosa aguda pode evoluir de formas distintas, ocorrendo a lise do trombo por mecanismo fibrinolíticos do próprio organismo, desobstruindo o vaso ou fragmentando o coágulo, com possível migração pela corrente venosa em direção ao pulmão e coração. Pode resultar também na sua estabilização, retração da veia e oclusão do vaso. Posteriormente, há desenvolvimento de circulação colateral ou recanalização da veia com destruição das válvulas, tornado-a insuficiente, prejudicando o retorno venoso (Síndrome pós-trombótica)2. (Figura 1) 15 Figura 1 - Síndrome pós-trombótica. 3. FATORES DE RISCO TVP é uma doença multifatorial e mais de um fator de risco deve estar presente para que a trombose ocorra, sendo que quanto mais jovem, mais fatores são necessários14. 3.1. IDADE Idade avançada é um fator de risco independente de TVP, mesmo após o ajuste de outros fatores. A trombose é mais comum após os 40 anos, havendo um aumento exponencial com a idade, com incidência de TVP para crianças menores que 14 anos de 0,006 por mil, estatística que aumenta para 0,7 por mil, em adultos com idade superior a 40 anos5. 16 Esse fato pode ser explicado devido à diminuição da resistência da parede venosa, dilatando-a, com conseqüente, redução da velocidade do fluxo sanguíneo. Outro fator a ser considerado, é a menor atividade fibrinolítica encontrado em pacientes acima de 65 anos, além do sedentarismo e da maior taxa de IVC14. 3.2. IMOBILIDADE A TVP é significativamente maior em pacientes acamados por três ou mais dias, sobretudo acima de 65 anos, chegando a 80% de incidência no período acima de uma semana14. Pacientes com diagnóstico de acidente vascular cerebral (AVC) tem um risco de trombose de 4 a 9% mais alto no membro paralisado, quando comparado ao contralateral. Isto é devido a perda da função de bomba muscular exercida pela panturrilha, resultando na estase venosa dos membros inferiores5. 3.3. TROMBOEMBOLISMO VENOSO PRÉVIO Ocorrência prévia de trombose aumenta de 3 a 4 vezes o risco de TVP em pacientes submetidos a cirurgia, sendo que se a historia incluir TEP, este risco pode atingir 100%. O risco de novos episódios de TEV é alta e quase um terço dos pacientes experimentam um evento recorrente no prazo de 8 anos. O endotélio venoso lesado anteriormente propicia condições de retrombose quando submetido a novas situações de risco18. 17 3.4. OBESIDADE Nem todos os autores estabelecem uma relação entre obesidade e TVP. Entretanto, diversos trabalhos relatam que este risco aumenta quando associados a outros como: idade e cirurgia de médio e grande porte. Há pesquisas que a obesidade está relacionada a diminuição da atividade fibrinolítica5. 3.5. CIRURGIA Sem medidas profiláticas, pacientes submetidos a cirurgia de grande porte, como abdominal e pélvica, tem um risco aproximado de 10 a 30% de TVP proximal, de 40 a 80% na panturrilha e 1% de TEP fatal5. As situações cirúrgicas que mais de associam a TEV são a artroplastia de joelho e quadril e, como esse risco pode perdurar no pós-operatório, é importante a profilaxia mesmo após a alta5. Além da cirurgia, o tipo de anestesia exerce também influência no risco de TVP, sendo superior nos pacientes submetidos a anestesia geral quando comparadas a anestesia peridural e raquidiana14. 3.6. TRAUMA TVP e TEP continuam a ser importantes fatores de morbidade e mortalidade no trauma. Mesmo sendo uma complicação comum no trauma, a taxa de TEV não está bem estabelecida. Todavia, sabe-se que sua prevalência é mais alta nos politraumatizados, quando comparados aos pacientes com trauma em um único setor5. 18 3.7. GRAVIDEZ E PUERPÉRIO TEV é um importante causa de morbidade e mortalidade durante a gestação, com incidência estimada de 69 casos por 100.000 mulheres/ano19. Gravidez aumenta em 10 vezes o risco de TEV quando comparadas a mulheres não-grávidas, sendo que a época de maior risco é no pós-parto. Isto decorre da liberação de tromboplastina tecidual no momento da separação placentária. A estase venosa ocorrida pela compressão uterina e alterações na hemostasia são fatores responsáveis pela formação da TVP19. Este risco é maior após cesárea do que parto normal, podendo haver recorrência da TVP em 4 a 15% nas gestações posteriores5. 3.8. ANTICONCEPCIONAIS E REPOSIÇÃO HORMONAL O anticoncepcional oral é um fator de risco independente para a trombose, elevando de 3 a 6 vezes a possibilidade de TVP. Isso se deve ao estrogênio que aumenta os níveis de fatores de coagulação (II, VII, IX, X), reduz os níveis de antitrombina, resistência secundária a proteína C, depleção do ativador do plasminogênio das paredes vasculares e aumenta os níveis de complexos solúveis de fibrina no plasma, além de provocar alterações na viscosidade sanguínea20. Também devido ao estrogênio, a terapia de reposição hormonal, usada em mulheres pós-menopausa ou pós-ooforectomia, aumenta o risco de TVP de 2 a 3 vezes, principalmente no primeiro ano de uso20. 19 3.9. CÂNCER A presença de neoplasia maligna é responsável por 20% dos casos de TEV na população. Esse índice aumenta cerca de 4 a 6 vezes quando são tratados com quimioterapia. Drogas, como tamoxifeno, diminuem os inibidores fisiológicos da coagulação, como proteína C e S e de antitrombina21. Alguns tumores produzem ou induzem a formação de fatores prócoagulante, como fator tissular e fator X. Também já foi descrita a diminuição da atividade fibrinolítica presente nesses pacientes, além da infiltração ou compressão tumoral, reduzindo o fluxo, ocasionando estase sanguínea21. As neoplasias mais associadas a TVP são mama, cólon e pulmão, entretanto, quando ajustados para prevalência da doença, os tumores sólidos são mais freqüentes, incluindo pâncreas, ovário e próstata14. Cerca de 10% dos pacientes com TVP considerados idiopáticos tem o diagnóstico de câncer nos 5 a 10 anos seguintes a trombose, sendo que 75% desse diagnóstico é feito no primeiro ano após a trombose. Isso demonstra a importância de pesquisa de neoplasias malignas em pacientes com TVP, principalmente, os de causa indeterminada21. 3.10. VARIZES A presença de varizes por si só não representa um fator de risco independente para TVP. Porém, quando associados a outros riscos, pode ter importância na ocorrência da trombose5. 20 A tromboflebite de veias superficiais, principalmente na região de coxa proximal, tem seu risco conhecido, devido à possibilidade de progressão para o sistema venoso profundo22. 3.11. TROMBOFILIAS Trombofilia é definida como uma predisposição aumentada, genética ou adquirida, para a ocorrência do tromboembolismo. Seu diagnóstico pode fornecer a base para definição de critérios prognósticos e estratégias terapêuticas individualizadas em pacientes com TEV23. O Fator V Leiden, descoberto em 1993, é a causa mais comum de trombofilia hereditária nos países do hemisfério norte, presente em 2% da população brasileira e em 20% dos pacientes com TEV. É caracterizada pela resposta anticoagulante diminuída à proteína C ativada, aumentando o risco de TEV nos pacientes em homozigose em até 80 vezes5. A síndrome antifosfolipídica (SAF) caracteriza-se pela presença de autoanticorpos que ocasionam trombose tanto venosa, quanto arterial. Além de se manifestar com abortos repetitivos, a SAF pode apresentar TEV de membros inferiores em 30 a 55% dos pacientes23. A homocisteína é um aminoácido derivado da metionina e seus níveis plasmáticos elevados são considerados um fator de risco independente nas tromboses venosas e arteriais. A hiper-homocisteinemia, superior a 18,5 µM, é encontrada em 7% da população e em cerca de 10% dos pacientes com TEV23. 21 Outras causas de trombofilias de origem genética, caracterizada pela deficiência de anticoagulantes naturais e associada ao tromboembolismo são: deficiência de proteína C, S e antitrombina III23. 3.12. CARDIOPATIAS Pacientes com insuficiência cardíaca congestiva e infarto agudo do miocárdio (IAM) tem risco 2 a 3 vezes maior de TEV do que em indivíduos sem cardiopatias. Isso de deve ao aumento da pressão venosa central, à diminuição da velocidade do fluxo sanguíneo e da hipóxia tecidual8. A gravidade da doença também influencia, já que os doentes cardiopatas internados em unidade de terapia intensiva apresentam um risco para TVP cerca de três vezes maior, quando comparadas aos pacientes na enfermaria8. 3.13. OUTRAS DOENÇAS ASSOCIADAS A Policitemia Vera, pelo aumento da viscosidade sanguínea, e o Lúpus Eritematoso Sistêmico podem levar a tromboses venosas recorrentes, tanto superficiais como profundas8. Há pesquisas que viagens superiores a 10 horas estariam relacionada ao aumento da incidência de TVP. Entretanto, esses dados não encontraram respaldo científico para comprova-los5. Trabalhos recentes indicam que a taxa de trombose venosa é maior nos grupos sanguíneos tipo A e menor no grupo O. No entanto, ainda não se tem uma explicação para tal fato5. 22 4. DIAGNÓSTICO CLÍNICO O diagnóstico clínico da TVP é impreciso, visto que, apenas 20 a 40% dos pacientes com sintomas sugestivos têm a doença confirmada por exames objetivos. Por outro lado, 15 a 50% dos casos de TVP não apresentam quadro clínico inicial característico19. O sintoma mais comum de trombose dos membros inferiores é a dor (86,9%), causada pela distensão da própria veia, pelo processo inflamatório vascular e pelo edema muscular que se expande no interior da fáscia, pressionando as terminações nervosas. Quanto mais extensa é a trombose, mais intensa é a dor11. Outra queixa importante é o aparecimento do edema devido a pressão hidrostática. Verifica-se também o sinal do cacifo (depressão causada pela compressão digital), além do aumento superior a 3 cm na circunferência quando comparada a perna contra-lateral8. (Figura 2) Figura 2 - Edema em membro inferior. 23 São também relatados sintomas como mal estar, taquicardia, febre, porém, com menos freqüência8. Ao exame físico, nota-se a dor a palpação muscular (Sinal de Moses) e no trajeto venoso, que embora tardios, são freqüentes (63,3%). Outro achado é a dilatação das veias superficiais, conhecido como Sinal de Pratt, secundário ao desvio do fluxo venoso11. Sinal de Homans consiste na dor na região da panturrilha durante a dorsoflexão do pé. Embora seja comum (61,7%), está sendo abandonado por ocasionar dor e até pelo risco de embolia pulmonar5. Existem dois quadros clínicos que indicam gravidade: flegmasia Alba Dolens e Cerúlea. Flegmasia Alba Dolens é encontrada nas tromboses do segmento femoroilíaco, caracterizada por dor e edema intenso, associado a palidez pela presença de vasoespasmo. Já a Flegmasia Cerúlea Dolens é referente a trombose do segmento femoroilíaco, das veias poplíteas e colaterais. Esse quadro parece ser uma evolução da Alba, tornado o membro cianótico, frio e tenso, associado a dor excruciante devido a trombose arterial. Nesta fase os pulsos distais estão ausentes em 83% dos indivíduos, a gangrena pode ocorrer em 55% dos casos e há formação de bolhas serohemorrágicas. A mortalidade da Flegmasia Cerúlea é de 32%14. 5. ÍNDICE DE PREDIÇÃO CLÍNICA Em 1995, Wells et al., propuseram um modelo clínico para predição de TVP, que se mostrou adequado para determinar a ocorrência da doença. 24 Demonstraram que combinar a clínica com os resultados dos exames auxiliares diagnósticos não-invasivos (Ultra-som) é clinicamente útil24. Mais recentemente, em 2003, Wells e cols., modificaram o modelo com a finalidade de aperfeiçoá-lo e simplificá-lo. Foram incluídos fatores de risco, antecedente de TVP e os pacientes foram classificados quanto a probabilidade de apresentarem TVP em dois grupos: TVP não-provável, se o escore for inferior a 2 e TVP provável, se for igual ou superior a 224. (tabela 1) Tabela 1: Modelo de predição clínica proposto por Wells et al 24. CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS ESCORE Câncer em atividade 1 Paresia ou paralisia 1 Imobilização > 3 dias ou cirurgia maior (até 4 dias) 1 Aumento da sensibilidade ao longo das veias do sistema 1 venoso profundo Edema em todo membro 1 Edema na panturrilha > 3 cm em relação a perna normal 1 Edema depressível maior na perna afetada 1 Veias colaterais superficiais 1 Diagnóstico diferencial provável (celulite, cisto de Baker, -2 linfedema) 25 6. DIAGNÓSTICO POR IMAGEM 6.1. ULTRA-SOM DOPPLER Nos últimos anos, o Ultra-som (US) firmou-se como método de escolha para confirmação diagnóstica da TVP. É um teste examinador dependente e há a necessidade de se desenvolverem habilidades para sua execução, para promover uma imagem bidimensional das estruturas anatômicas, através do uso das ondas de alta freqüência, emitidas por um transdutor14. O teste de compressibilidade venosa é o critério mais confiável para a verificação da TVP em fase aguda, de modo que a não-compressibilidade apresenta uma sensibilidade de 96% e especificidade de 98% para o diagnóstico de trombose11. (Figura 3) Figura 3 - Ultra-sonografia da veia femoral comum direita (VFCD), mostrando a não-compressibilidade. 26 Em 1970, foi desenvolvido o mapeamento dúplex ou Eco-doppler, o qual, incorpora ao US, o doppler de ondas pulsáteis, permitindo uma avaliação simultânea da imagem do vaso e as características do fluxo. Em 1980, surgiu a codificação do fluxo em cores (Eco-doppler Colorido), melhorando o diagnóstico da TVP, principalmente em veias distais14. (Figura 4) Figura 4 - US Doppler colorido evidenciando a ausência de fluxo na veia femoral superficial direita (VFSD) e fluxo na artéria femoral superficial direita (AFSD). VSM: Veia safena magna. 6.2. PLETISMOGRAFIA POR IMPEDÂNCIA É um método indireto, pois não há visualização do trombo. Com a medida do grau de estenose, pode ser útil para o seguimento dos pacientes sintomáticos, que tiveram resultado inicial negativo e para avaliar uma possível extensão da TVP para veias proximais. Entretanto, com o advento do Ecodoppler tem sido cada vez menos utilizado11. 27 6.3. ANGIOTOMOGRAFIA E ANGIORRESSONÂNCIA São métodos pouco utilizados devido ao custo e transporte. Todavia, possuem alta sensibilidade e especificidade para o diagnóstico de trombose de veias centrais como: ilíaca, cava e suas tributárias11. 6.4. FLEBOGRAFIA É um procedimento invasivo, considerado como “padrão ouro” para o diagnóstico da trombose, com uso bastante limitado. Apresenta contraindicações, como: gravidez, pacientes alérgicos e nefropatas. Atualmente, sua indicação se restringe aos casos que o US foi inconclusivo ou não pode ser realizado14. 6.5. TESTES SANGUÍNEOS O D-dímero (DD) é um produto gerado pela degradação da matriz de fibrina em trombos frescos. Visto que o DD está presente em qualquer situação onde há formação e degradação de fibrina, ele não é um marcador específico para TVP, podendo estar presente em diversas situações como cirurgia recente, trauma, câncer e sepsis. No entanto, ele é bastante sensível e tem se mostrado útil como um teste coadjuvante no diagnóstico de exclusão11. Em associação ao US, o teste D-dímero é um método eficiente de diagnóstico, com menos de 1% de falsos negativos14. 28 7. TRATAMENTO O tratamento da TVP dos membros inferiores tem como propósito aliviar os sintomas agudos da doença, evitar recidiva, a ocorrência de embolia pulmonar e da insuficiência venosa25. 7.1. ANTICOAGULANTE Não tem a finalidade de destruir o trombo. É importante na profilaxia secundária, com objetivo de impedir a progressão da trombose e assim diminuir as complicações futuras, como síndrome pós-trombótica, além de evitar a formação de sua cauda, que ocasionaria a embolia pulmonar14. 7.1.1. HEPARINA NÃO FRACIONADA A heparina não fracionada age inibindo principalmente a trombina (Fator IIa) na fase inicial da cascata de coagulação e deve ser tão logo iniciada com uma dose “em bolus” de 80 UI/kg de peso, juntamente com a infusão contínua de 18 UI/kg/h no soro glicosado a 5%18. Essa dosagem é corrigida pelo tempo de tromboplastina parcial ativada (TTPA), determinado 6 a 12 horas após o início do tratamento, em seguida diariamente, mantendo o mesmo entre 1,5 a 2,5 vezes o tempo normal14. Nos casos de flegmasia cerúlea há indicação de iniciar uma dose elevada de heparina (10.000UI em bolus), mantendo posteriormente um TTPA entre 2 a 3 vezes, se houver boa resposta clínica26. 29 7.1.2. HEPARINA DE BAIXO PESO MOLECULAR A heparina de baixo peso molecular é isolada a partir da heparina convencional. Age principalmente na inibição do Fator X ativado na fase de propagação ou ampliação da cascata de coagulação do sangue18. Os trabalhos publicados desde 1990, comparando os dois tipos de heparina, mostraram que a HNF é igual ou superior a HBPM, quanto à incidência de recorrência de trombose, de hemorragia e mortalidade14. HBPM apresenta maior biodisponibilidade, uso da dose corrigida apenas pelo peso, sem necessidade de controle laboratorial, menores índices de complicações, como trombocitopenia e osteoporose, levando muitos autores a sugerir seu uso preferencialmente à HNF no tratamento da TVP18. Mais recentemente, diferentes estudos demonstraram a possibilidade do tratamento da trombose com HBPM, de forma domiciliar, fato que é mais econômico do que o tratamento intra-hospitalar26,27. Tanto a heparina não fracionada quanto a de baixo peso não atravessam a barreira placentária, sendo dessa forma o tratamento de escolha em mulheres grávidas18. No Brasil, a mais utilizada é a Enoxaparina que deve ser administrada de forma terapêutica na dose de 1 mg/kg 12/12horas5. Na última década surgiram novos anticoagulantes no mercado com administração oral, os quais têm apresentado resultados promissores na prevenção do tromboembolismo venoso. Alguns medicamentos, como rivaroxabana e dabigatrana, já foram aprovado pela Food and Drug 30 Administration para uso em profilaxia da trombose venosa após cirurgia ortopédica maior (quadril e joelho) na Europa, Canadá e Brasil28. 7.1.3. COMPLICAÇÕES DA HEPARINOTERAPIA Hemorragia: O tratamento com heparina apresenta risco de sangramento, com incidência que varia de 0 a 13% dos casos. É uma complicação doserelacionada, sendo mais comum em mulheres, pacientes com doenças graves, em uso de antiplaquetários, alcoólatras, insuficiência renal, idosos, cirurgia recente e trombocitopenia18. Podem ser desde equimoses e hematúria microscópica até mais graves como hemorragia retroperitoneal e intracraniana, com maior incidência em torno do sétimo dia de tratamento14. Nas hemorragias discretas, a suspensão temporária da heparina é suficiente para interromper o processo. Já nas graves, além da retirada, é preciso reverter com Sulfato de Protamina na proporção de 1,0 mg para cada 100UI de heparina. Doses elevadas de protamina estão relacionadas a sangramento por interação com plaquetas, a hipotensão e bradicardia, sendo necessária a sua infusão diluída e lenta. Sabe-se que a protamina tem efeito neutralizante apenas parcial na enoxaparina18. Trombocitopenia: A plaquetopenia induzida pela heparina é definida pela queda de 50% da contagem inicial ou < 100.000 plaquetas29. 31 Existem 2 tipos de trombocitopenia induzida por heparina (TIH): Tipo I caracterizada por ser precoce (2 a 3 dias), benigna e não estar relacionada a fenômenos trombóticos. Já a do tipo II é secundária à formação de imunocomplexos (Fator 4 plaquetário), normalmente ocorre entre 5⁰ e o 10⁰ dia de heparinoterapia e está associada a eventos trombóticos arteriais e venosos. Sua mortalidade é secundária a AVC e IAM e pode chegar a 30%14. Há relatos que a TIH é mais comum nos pacientes tratados com HNF (1 a 6%), do que com HBPM (0 a 0,9%)29. O tratamento da trombocitopenia consiste na suspensão imediata da heparina e anticoagulação plena com danaparoid, lepirudina ou argatroban, não comercializados no Brasil. Deve-se evitar o uso da HBPM devido a reação cruzada29. 7.2. ANTAGONISTAS DA VITAMINA K Dentre os antagonistas da vitamina K existentes no Brasil, a Varfarina Sódica é a mais utilizada pelos cirurgiões vasculares. Age inibindo os fatores pró-coagulantes dependentes da vitamina K: II, VII, IX e X. Também bloqueia os inibidores da coagulação como Proteína C e S, levando a um estado de hipercoagulabilidade na fase inicial. Devido a isso, é importante manter a heparina por pelo menos cinco dias e suspende-la quando o INR atingir uma faixa entre 2,0 e 3,0 por dois dias consecutivos30. O controle laboratorial é imprescindível para que não ocorra sangramento ou risco de recorrência da trombose. Deve ser avaliado pelo Tempo de Protrombina (TP) ou pelo International Normatization Rate (INR)30. 32 O tratamento para pacientes internados pode ser iniciado com 10 mg de varfarina durante dois dias, seguidos de 5 mg diários, ajustando a dose a partir do 3⁰ dia, pelo TP, de maneira a manter o INR entre 2 e 330. Apresenta como complicação mais comum o sangramento, sendo recomendada somente a suspensão nos casos mais discretos, até a administração de vitamina K endovenosa e plasma fresco, nas hemorragias mais graves. Outra complicação grave são as lesões necróticas na pele e subcutâneo, atingindo membros e mamas, sendo atribuída a deficiência de Proteína C e S30. Não existe consenso sobre a duração do tratamento. No entanto, é preconizado por muitos autores, nos casos de fatores transitórios desencadeantes, manter por três meses, nos casos idiopáticos, por 6 a 12 meses e nos pacientes com câncer ou com trombofilias estender a terapia por toda vida14,30. 7.3. OUTROS TRATAMENTOS A utilização de agentes fibrinolíticos para a lise rápida e efetiva do trombo vem sendo utilizada como terapia alternativa, com finalidade de melhorar os sintomas e prevenir as sequelas pós-trombóticas. A Uroquinase e o Ativador Tecidual Recombinante do Plasminogênio (rt-PA) têm se apresentado como drogas seguras, com poucas reações alérgicas e de efeito mais previsível. Apesar dos resultados menos promissores, a Estreptoquinase continua sendo aplicada devido à facilidade de obtenção e baixo custo. Esse tratamento é indicado, em geral, nos casos de TVP do segmento iliacofemoral ou nos casos de Flegmasia Cerúlea Dolens. Os melhores resultados são 33 obtidos através da administração por cateter, em até 14 dias do início da clínica26. A trombectomia venosa pode ser realizada com objetivo curativo, visando a retirada do trombo e preventiva, impedindo que os fragmentos atinjam a árvore arterial pulmonar. A maioria dos autores indica a cirurgia nos casos de Flegmasia Cerúlea Dolens, devido a possibilidade de gangrena do membro e mais relativamente nos casos de TVP extensa aguda, em até 5 dias ou nos casos de trombos flutuantes no US26. 8. FILTRO DE VEIA CAVA Os filtros de veia cava têm como propósito básico impedir a passagem de êmbolos, sem ocluir totalmente o vaso. Devem ser colocados na veia cava inferior, abaixo das renais, na tentativa de minimizar as complicações. Podem ser implantados via jugular ou femoral26. (Figura 5). Figura 5 – Filtro de veia cava implantado abaixo das veias renais. 34 As indicações absolutas são: TEV com contra-indicação a terapia anticoagulante, TEP recorrente na vigência da anticoagulação correta, complicações hemorrágicas durante o tratamento com anticoagulante, TVP extensa (veia cava inferior) e após embolectomia pulmonar por embolia maciça26. Embolia pulmonar séptica ou crônica, em pacientes com hipertensão pulmonar; tratamento de TEV em gestantes e pacientes oncológicos e trombo iliofemoral extenso são classificados como indicações relativas26. 9. JUSTIFICATIVA Tromboembolismo venoso é uma doença comum, tratável e que está associado a uma alta mortalidade31. O tratamento padrão utilizado por muitos profissionais de saúde consiste no uso da heparina não fracionada associada ao anticoagulante oral32. Recentemente, diversos estudos retratam que a HBPM possui vantagens sobre a HNF10,25,33. Baseado nesses dados, nosso trabalho visa comparar as taxas de complicações das duas formas de heparinização e estabelecer a melhor terapia para os pacientes portadores de trombose venosa profunda dos membros inferiores em tratamento hospitalar. 35 OBJETIVOS PRIMÁRIO: - Avaliar as taxas de complicações de pacientes internados com trombose venosa profunda de membros inferiores tratados com heparina não fracionada e com heparina de baixo peso molecular. SECUNDÁRIO: - Estabelecer os principais fatores de risco para TVP encontrados nos pacientes no Hospital do Servidor Público Municipal. - Estabelecer a taxa de utilização da profilaxia para TVP em pacientes internados no nosso serviço. 36 MATERIAIS E MÉTODOS 1. CRITÉRIOS DE INCLUSÃO Foram avaliados pacientes internados no Hospital Servidor Público Municipal (HSPM), a partir de Junho de 2010 até Junho de 2011, através de dados coletados da ficha de trombose venosa do serviço de Cirurgia Vascular do HSPM (anexo 1). Este protocolo foi preenchido para todos os pacientes internados com esse diagnóstico, registrando-se, assim, dados do paciente, fatores de risco, tratamento instituído e evolução do paciente. Os pacientes com suspeita clínica de trombose venosa profunda foram submetidos ao Ultra-som Doppler colorido para o diagnóstico definitivo. Somente para os casos confirmados e com indicação de internação para tratamento foi preenchido o protocolo e, consequentemente, candidatos a inclusão na pesquisa. Todos os pacientes que satisfazessem os critérios de inclusão poderiam ser inscritos no estudo, desde que concordassem em ter os resultados de seu tratamento utilizados para pesquisa, preservando seu anonimato e assinassem o consentimento informado (anexo 2). 2. CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO Os critérios de exclusão utilizados nesse estudo foram: pacientes com contra-indicação para anticoagulação, instabilidade hemodinâmica, expectativa de vida inferior a três meses, baixa adesão, sangramento ativo, insuficiência renal e/ou hepática grave. 37 3. DISTRIBUIÇÃO DOS GRUPOS Após o diagnóstico confirmado de TVP, os pacientes foram alocados em dois regimes de tratamento: heparina não fracionada e heparina de baixo peso molecular. A distribuição foi realizada de acordo com a disponibilidade da medicação em nosso serviço, as necessidades específicas de cada paciente e de modo que os grupos fossem semelhantes. Os pacientes internados foram agrupados em alto, médio e baixo risco para TVP, de acordo com as Normas de Orientação Clínica da Sociedade Brasileira de Cirurgia e Angiologia Vascular (SBACV)7 (tabela 2 e 3). Segundo orientações destas normas, foi avaliada a taxa da profilaxia nos doentes clínicos e cirúrgicos. 4. REGIME DE TRATAMENTO Pacientes submetidos a HNF foram admnistrados inicialmente em bolus de 80 UI/kg por via intravenosa, a seguir com 18 UI/kg/h intravenosa, sob bomba de infusão contínua, três vezes ao dia, ajustado pelo tempo de tromboplastina parcial. O primeiro TTPA foi após 6 horas da infusão e a seguir diariamente, visando um alvo de 1,5 a 2,5 vezes o valor normal (50-90 segundos), correspondendo a niveis plasmáticos de anti-fator Xa entre 0,350,70 U/ml. Pacientes submetidos a HBPM receberam enoxaparina, em uma dosagem de 1 mg/kg, duas vezes ao dia, sem controle laboratorial. 38 Tabela 2: Avaliação de risco e profilaxia para pacientes clínicos. Riscos Baixo Paciente Profilaxia Qualquer paciente. Movimentação no leito e deambulação precoce. Moderado Pacientes > 65 anos, acamados por 5.000UI de HNF 2x ao dia; doença clínica, sem outros FR. HBPM em dose menor 1x ao dia. Alto Qualquer doença associada a TEV 5.000UI de HNF 3x ao dia; prévia, trombofilia, IAM, pacientes em UTI. AVC, HBPM em dose maior 1x ao dia. Adaptado de Diretrizes para Prevenção, Diagnóstico e Tratamento da Trombose Venosa 7 Profunda, 2001 . FR: fatores de risco; TEV: tromboembolismo venoso; IAM: infarto agudo do miocárdio; AVC: acidente vascular cerebral; UTI: unidade de terapia intensiva, Tabela 3: Avaliação de risco e profilaxia para pacientes cirúrgicos. Riscos Baixo Paciente Profilaxia Pacientes < 40 anos, sem FR. Movimentação no leito e deambulação precoce. Moderado Cirurgia de pacientes entre 40 a 60 5.000UI de HNF 2x ao dia; anos sem FR ou < 40 anos em uso de HBPM em dose menor 1x estrógenos. ao dia.Risco de hemorragia: meias anti-trombóticas. Alto Pacientes > 60 anos, 40 a 60 anos com 5.000UI de HNF 3x ao dia; FR: história prévia de TEV, grandes HBPM em dose maior 1x ao amputações, cirurgias ortopédicas dia. Risco de hemorragia: maiores, portadores de neoplasias, compressão trombofilia, traumas múltiplos. pneumática intermitente. Adaptado de Diretrizes para Prevenção, Diagnóstico e Tratamento da Trombose Venosa 7 Profunda, 2001 . FR: Fator de risco; TEV: Tromboembolismo venoso. 39 Em ambos os grupos, foram iniciados anticoagulante oral (Varfarina Sódica), concomitante às heparinas, na dosagem de 10 mg/d nos dois primeiros dias e a seguir por 5 mg/d, com a dose ajustada para atingir um INR de 2,0 a 3,0. Heparina foi interrompida quando o INR foi maior que 2,0 em dois dias consecutivos e os pacientes haviam recebido a droga em estudo há pelo menos cinco dias. 5. ACOMPANHAMENTO Durante o tratamento inicial com heparina, os pacientes foram examinados diariamente em busca de sinais e sintomas de tromboembolismo recorrente, sangramento e ocorrência de trombocitopenia induzida pela heparina. Sangramento maior foi definido como clinicamente evidente ou associado a uma queda no nível de hemoglobina de pelo menos 2 g/dL ou a necessidade de transfusão de duas ou mais unidades de glóbulos vermelhos ou se fosse intracraniana ou retroperitoneal ou em que se justifica a interrupção permanente do tratamento. Sangramento menor foi caracterizado por epistaxe, hematúria ou hematoma. Trombocitopenia foi definida como uma queda de plaquetas abaixo de 100.000/µL e/ou uma queda superior a 50% abaixo do valor basal. 40 6. MÉTODO ESTATÍSTICO Para o estudo estatístico foi utilizado o programa BioEstat 5.0 para os cálculos. As variáveis qualitativas foram comparadas através do teste exato de Fisher e as quantitativas através do teste de Mann-Whitney. Considerou-se diferença estatisticamente significativa quando p < 0,05. 41 RESULTADOS Durante o período do estudo, 49 casos de trombose venosa profunda de membros inferiores, confirmados com US Doppler, foram internados no serviço de angiologia e cirurgia vascular do HSPM. Dois pacientes foram excluídos: um AVC hemorrágico e uma hemorragia digestiva baixa (contra-indicação a anticoagulação). Total de 47 pacientes foram incluídos no estudo: HBPM (24 pacientes) X HNF (23 pacientes). (tabela 4) Dezesseis pacientes eram do sexo feminino (59,5%) e o membro inferior mais acometido foi o esquerdo (59,5%). Os sintomas mais comuns foram: edema (78%) e dor (65%) e a região mais atingida foi a infra-patelar (89,3%). (tabela 5) Em relação à localização, a veia femoral superficial e poplítea estiveram envolvidas em 82,9% e 78,7%, respectivamente. Os fatores de risco encontrados neste estudo estão presentes no gráfico 1. Cerca de 23,4% dos doentes apresentaram episódio prévio de TVP. Uma paciente apresentou trombose venosa durante a gestação, na 28⁰ semana. Cinco indivíduos (10,6%) eram portadores de câncer, sendo que as neoplasias mais comuns foram: ginecológicas (60%) e gastrointestinais (40%). 42 Seis doentes apresentaram tromboflebite de veia safena magna e parva e tiveram o diagnóstico de TVP após um rastreamento com US Doppler. Quatro pacientes (8,5%) não possuíam causas evidentes de trombose e foram classificados como indeterminado. Tabela 4: Características dos grupos. HBPM HNF p 24 23 - 55,4 ± 16 anos 55,3 ± 15 anos 0,47 Idade > 40 anos 21 17 0,21 Sexo feminino 16 12 0,23 IMC > 30 06 06 0,59 5,7 ± 6 dias 5,8 ± 5 dias 0,46 MIE 14 14 0,54 Veias proximais 06 15 0,04* n Média Idade Tempo de sintomas HNF: Heparina não fracionada; HBPM: Heparina de Baixo Peso Molecular; IMC: Índice de Massa Corpórea; MIE: Membro Inferior Esquerdo; Veias proximais: Acometimento da veia femoral comum e/ou veias ilíacas. 43 Tabela 5: Clínica apresentada pelo paciente na internação. Sinal / Sintoma HBPM HNF Assintomático - 01 Dor 12 19 Edema 18 19 Hiperemia 05 03 - 01 Embolia Pulmonar HNF: Heparina não fracionada; HBPM: Heparina de baixo peso molecular. Gráfico 1: Principais fatores de risco encontrados. HNF: Heparina não fracionada; HBPM: Heparina de baixo peso molecular; ICC: Insuficiência cardíaca congestiva; IAM: Infarto agudo do miocárdio; TVP: Trombose venosa profunda. PROFILAXIA Dos 47 pacientes, 23 estavam internados no momento do diagnóstico. Todos tinham indicação de profilaxia tanto medicamentosa, quanto por métodos físicos (tabela 6). Destes apenas 17,3% (4 doentes) a faziam. 44 Tabela 6: Classificação dos riscos. Risco Clínicos Cirúrgicos Baixo - - Moderado 08 - Alto 05 10 TERAPIA ANTICOAGULANTE A média do tempo de internação foi de 7,8 ± 5,9 dias para o grupo da HNF e 5,8 ± 3,0 dias para o grupo da HBPM, sem diferença estatística significativa (p=0,13). (Gráfico 2) Gráfico 2: Tempo de internação. HNF: Heparina não fracionada; HBPM: Heparina de baixo peso molecular. 45 Em ambos os grupos a Varfarina Sódica foi iniciado no primeiro dia de tratamento. SANGRAMENTO A taxa de complicação geral encontrada neste estudo foi de 12,7% (6 pacientes), sendo cinco no grupo da HNF e um da HBPM (p=0,08). (tabela 7) Durante a internação, um paciente (4,3%) do grupo da HNF apresentou quadro de hemorragia digestiva baixa. A terapia anticoagulante foi suspensa e foi implantado filtro de veia cava. Entretanto, durante a evolução a paciente foi a óbito. Não houve episódio de sangramento maior no grupo da HBPM. No entanto, um paciente (4,1%) apresentou hematoma no local do trauma, resolvido sem a necessidade da retirada da anticoagulação. Dois pacientes (8,6%) do grupo da HNF apresentaram trombocitopenia, resolvida durante a evolução, sem que ocorresse a suspensão do tratamento. Um dos pacientes permaneceu internado durante 30 dias. Não houve queda de plaquetas no grupo da HBPM. EVENTOS TROMBOEMBÓLICOS RECORRENTES Dois pacientes (8,6%) do grupo da HNF evoluíram durante a internação com embolia pulmonar, confirmados com tomografia computadorizada. Um paciente evoluiu a óbito e o outro foi implantado filtro de veia cava. Não houve eventos no grupo da HBPM. 46 MORTALIDADE A taxa de mortalidade presente neste estudo foi de 4,2% (2 pacientes), todos do grupo da HNF, secundário a tromboembolismo pulmonar e hemorragia digestiva. Todos eram portador de TVP proximal (acometimento da veia femoral comum e/ou veias ilíacas). Não houve óbitos no grupo da HBPM (p=0,23). Tabela 7: Complicações. HBPM HNF Sangramento maior - 01 Sangramento menor 01 - Plaquetopenia - 02 TEV recorrente - 02 Óbitos - 02 TEV: tromboembolismo venoso; HBPM: Heparina de baixo peso molecular; HNF: Heparina não fracionada. 47 DISCUSSÃO O tromboembolismo venoso aumenta significativamente a morbidade e a mortalidade tanto em pacientes hospitalizados, quanto em tratamento domiciliar1. O Consenso Europeu para prevenção da doença tromboembólica relata 160 casos de TVP e 60 casos de EP fatal por ano, para cada grupo de 100.000 habitantes nos países ocidentais17. Isso demonstra que é uma doença comum e que a gravidade de suas complicações, como embolia, faz com que a TVP mereça uma cuidadosa atenção de todos os profissionais de saúde. A maioria dos casos de TEV parece estar associada a situações clínicas de risco bem definidas. Por muitas décadas, as observações clínicas e epidemiológicas realizadas por autores, em diferentes partes do mundo, permitiram identificar uma série desses fatores e de doenças que precediam ou acompanhavam os quadros de trombose venosa34. A média de idade encontrada neste estudo foi comparável ao trabalho realizado por Linares et al., com 415 pacientes brasileiros com TVP21. Entretanto, Merli e cols., num estudo com 900 pacientes americanos e europeus, relataram média de idade de 60 anos1. Isso pode ser devido à expectativa de vida alta encontrada nesses continentes. A idade acima de 40 anos foi o fator de risco mais prevalente em nosso trabalho, o mesmo foi verificado nos estudos Caifara et al.8, Pereira et al.34 e Vallano et al35. 48 Prandoni e cols., num ensaio clínico com 720 pacientes com trombose, relataram uma superioridade do sexo feminino, perfazendo 55% dos casos36, dado semelhante a nossa pesquisa. Este fato deve-se que as mulheres apresentam mais fatores de risco independentes, como: uso de anticoncepcional oral, terapia de reposição hormonal, gravidez e puerpério. O segundo fator de risco mais apresentado foi de imobilização por mais de três semanas. Koopman et al., após analisar 400 pacientes com TVP, descreveram uma taxa semelhante de pacientes com imobilização prolongada (25%)9. Ambos estudos demonstram que estes pacientes são portadores de dois ou mais fatores predisponentes para trombose, principalmente a obesidade, dificultando ainda mais a deambulação. Tromboembolismo venoso prévio é um fator de risco independente de trombose venosa profunda5. Prandoni e cols., em outro estudo com 355 pacientes com TVP sintomática, mostraram incidência cumulativa com recorrência de 17,5% após 2 anos, 24,6 % após 5 anos e 30,3% após 8 anos37. Por vezes a história prévia de TVP, vem associada a outras doenças, por exemplo, câncer e trombofilias37. Dos pacientes que tiveram mais de um episódio de trombose em nosso trabalho, 18% eram sabidamente portadores de trombofilias, como deficiência do fator V Leiden e hiperhomocisteinemia. Outro fator predisponente bastante conhecido é a gestação. Silveira relata que existe um risco de 6 a 10 vezes maior de ocorrência de tromboembolismo venoso na gravidez e que a TVP incide em 1 a 2 casos por 1.000 gestações. Descreve ainda que depois da toxemia gravídica, a embolia pulmonar é a causa mais comum de mortalidade maternal, sendo que o risco é 49 superior no terceiro trimestre, especialmente no puerpério38. Apenas uma paciente desenvolveu TVP no final da gestação, foi tratada com heparina de baixo peso molecular, não havendo complicações. A tromboflebite superficial ascendente (TSA) de membros inferiores é uma doença comum, na qual, ocorre trombose da veia, acompanhada de reação inflamatória da parede venosa e dos tecidos vizinhos. Pode ocorrer associada a estado primário de hipercoagulabilidade, a doenças sistêmicas já evidentes ou em curso (neoplasias, colagenoses e hemofilias), a varizes e como complicação de terapia intravenosa22. Sobreira, num estudo com 60 pacientes com TSA de veia safena magna e parva, estabeleceu uma prevalência de 50% de TEV (21,67% de TVP e 28,33% de TEP)22. Em nossa pesquisa foi encontrado uma alta taxa de TVP em pacientes com tromboflebite de veias superficiais. Isso demonstra a importância de realizar US Doppler do sistema venoso profundo em todos os pacientes com TSA. Linares et al., num estudo prospectivo, estabeleceram uma taxa de 13,9% de neoplasia em pacientes portadores de trombose, destas 27% envolveram o trato gastrointestinal e 17% o sistema ginecológico21. Isso corrobora com os resultados do nosso trabalho que encontrou valores semelhantes tanto na incidência de câncer, quanto nas localizações mais comuns. Dados da literatura demonstram que até 25% dos casos de TVP não há uma causa clínica evidente, denominada de trombose idiopática23. Neves Jr et al., em 2008, analisando o perfil de pacientes com TVP no HSPM, demonstraram uma taxa de trombose indeterminada de 20,86%39. 50 Posteriormente, foi introduzido um rastreamento detalhado, em todos os casos de TVP na admissão, com raio X de tórax, antígeno prostático específico (PSA), US de abdome total, pesquisa de sangue oculto e marcadores tumorais. Isso resultou na redução dos índices de TVP sem causa aparente, demonstrado em nosso estudo. As identificações desses fatores para o desenvolvimento de TVP e uma avaliação criteriosa dos riscos e benefícios dos métodos profiláticos disponíveis são as bases para o uso apropriado da profilaxia da doença em estudo40. Mesmo descrita como eficaz, segura e custo-efetiva, a profilaxia é pouco utilizada, tanto por médicos clínicos, quanto por cirurgiões, mesmo sabendo que a TEV é a causa mais comum de mortalidade hospitalar passível de prevenção6. Pereira et al., relataram um dado curioso: apesar dos médicos clínicos terem prescrito mais e de forma mais correta a profilaxia para a TVP, os cirurgiões demonstraram possuir um melhor conhecimento teórico do tema, ainda que não a empreguem na prática diária de forma satisfatória34. Em nosso estudo as medidas de prevenção foram subutilizadas, tanto medicamentosas como por métodos físicos, dados semelhantes aos encontrados na literatura. Garcia et al., avaliando 239 pacientes com fatores de risco para TVP, mostraram que 77% da amostra não estava recebendo profilaxia medicamentosa e após entrevistar 300 médicos, verificaram que apenas 15,6% tinham uma boa informação sobre trombose e que a razão para não utilizar a profilaxia seria a falta de informação (34%), falta de conhecimento médico (18,4%), medo de sangramento (8,3%) e falta de meios profiláticos (7,5%)6. Caiafa et al., descreveram que no grupo considerado de alto risco, 52,9% dos pacientes não receberam profilaxia ou receberam profilaxia de 51 forma inadequada, seja por omissão, duração inadequada ou escolha incorreta do método8. O mesmo foi verificado em outro estudo realizado em um hospitalescola de Maceió, Alagoas, que evidenciou que apenas 23% dos pacientes clínicos analisados receberam a profilaxia de forma adequada3. Pitta et al., em outro estudo com 246 enfermos mostraram que a freqüência da utilização de profilaxia para TVP foi 33%, sendo 17% através de métodos físicos e 26% farmacológicos, concluindo o resultado como muito inferior à freqüência desejada para a utilização de métodos preventivos para o TEV40. A implementação de medidas profiláticas para trombose venosa na rotina hospitalar pode ser desafiadora, devido ao fato que estes pacientes geralmente são idosos, com múltiplas comorbidades e recebem medicações que pode interagir com os métodos preventivos40. Isso pode ser explicado pelo precário conhecimento dos profissionais de saúde sobre o tema34. Dessa forma, novas estratégias, como programas de educação continuada e conscientização, devem ser desenvolvidas, estimuladas e aplicadas, esperando-se, assim, uma melhora nos índices de utilização da profilaxia nos pacientes internados. Com o uso da terapia anticoagulante, pacientes com TEV podem ter uma sobrevida maior41. A terapia com HNF se tornou amplamente aceita no início dos anos 1960, enquanto HBPM foi usada mais freqüentemente no final de 1980. Clinicamente, a HBPM e HNF são os anticoagulantes mais comuns utilizados para o TEV agudo atualmente41. A enoxaparina parece simplificar o tratamento da TVP, pois pode ser administrada por via subcutânea, duas vezes ao dia, sem a necessidade de monitorização laboratorial ou ajuste de dose na maioria dos casos10. 52 Diversos autores relatam que a superioridade da HBPM é decorrente da menor ligação a plaquetas, proteínas plasmáticas e macrófagos, resultando numa biodisponibilidade, próxima de 100%. Além disso, a inibição do fator Xa é duas vezes maior na enoxaparina, gerando um efeito mais previsível19,25. Em nosso estudo houve menor tempo de internação para os pacientes tratatos com HBPM, corroborando com os dados da lieratura. Levine et al., descreveram uma média no grupo da HBPM de 1,1 dias, enquanto os que receberam HNF tiveram 6,5 dias27, estes dados são ratificados por Koopman e cols., os quais, notaram uma redução de 67% no tempo de hospitalização9. Este fato é devido a possibilidade de tratamento ambulatorial aos pacientes da HBPM, que além de estimular a deambulação, reduz os custos hospitalares. Outro aspecto relevante é o gasto do tratamento. Em 1997, houve 122.000 internações hospitalares nos EUA com diagnóstico de TVP, um custo nacional na faixa de 1,5 bilhões de dólares42. Spyropoulos et al., comparando pacientes portadores de TVP tratados ambulatorialmente com HBPM e internado com HNF, relataram um custo inferior aos tratados com enoxaparina (US$9.347 x US$11.930), com uma diferença de 2.583 dólares por internação42. Rodger e cols., mostraram uma economia líquida de 55 dólares por paciente internado, tratado com HBPM43. Isso demonstra que além de ser mais viável e segura, a enoxaparina tem um custo favorável tanto em pacientes tratados ambulatorialmente ou internado. A taxa de sangramento maior presente em nosso estudo foi superior no grupo da HNF, dado equivalente ao encontrado por Koopman et al., que relataram também um alto índice de óbitos (50%) nestes indivíduos9. 53 Harenberg e cols., num estudo randomizado, multicêntrico, com 1.758 pacientes com TVP proximal, também demonstraram semelhante percentagem de hemorragia (3,5%) no grupo da HNF, atribuindo à dificuldade em controlar o TTPA25. Dois estudos também multicêntricos, randomizados e controlados, comparando três regimes de tratamento (HNF; HBPM 1 x ao dia; HBPM 2 x ao dia), apresentaram índices de sangramento equivalentes nos três grupos e concluíram que a posologia da HBPM não tem influência nas complicações1,44. Kearon et al., Prandoni et al. e Bernardi et al., administraram HNF por via subcutânea (SC) comparando-a com enoxaparina para a terapia da TVP e encontraram valores similares em relação a sangramento maior, concluindo que a HBPM é tão eficaz quanto a HNF por via SC36,45,46. Chen e cols., abordaram o tratamento somente em pacientes com TEP e evidenciaram ocorrência de hemorragia inferior no grupo da HBPM (3,5% x 5,3%)41. A taxa desta complicação apresentada em nosso trabalho foi superior à média relatada na literatura (3,8%)31e isso pode ser devido ao número pequeno da amostra. Entretanto, notamos uma segurança maior na administração nos pacientes que receberam a HBPM tanto na trombose venosa, quanto na embolia pulmonar, apesar de não encontrarmos significância estatística nesses dados. Verificamos também uma baixa taxa de sangramento menor em nosso estudo. Esses dados são confirmados por três autores, os quais demonstraram que esta complicação é pouco prevalente e não há diferenças significativas na ocorrência em pacientes tratados com HNF e HBPM9,10,27. Martel et al., demonstraram, após uma metanalise com 15 artigos, um risco absoluto de indução a trombocitopenia maior nos pacientes que 54 receberam a HNF (2,6% x 0,2%), atribuindo a menor afinidade da HBPM ao anticorpo Fator 4 plaquetário29. Prandoni e cols., relataram taxas semelhantes em ambos os grupos, fato reportado em outros estudos1,9,27 e definiu o tempo de internação como um importante fator de risco para determinar a TIH36. Notamos em nossa pesquisa uma taxa de plaquetopenia superior no grupo da HNF, associada ao aumento do tempo de hospitalização, ratificando os dados da literatura. A prevenção do tromboembolismo recorrente é um dos principais objetivos do tratamento da trombose. A enoxaparina é a única droga licenciada nos EUA para o tratamento ambulatorial da TVP e em combinação com a varfarina sódica reduz em até 26% a reinternação por TEV recorrente18. Gould et al., em uma metanálise com 11 artigos, relataram que a HBPM é mais efetiva do que a heparina convencional na prevenção de novos episódios de TEV10. O mesmo foi demonstrado por Simonneau e cols., que testaram a eficácia, realizando venografia na admissão e após 10 dias e concluíram que no grupo da HBPM houve uma melhora na regressão do trombo (43% x 23%), fator determinante para prevenção de tromboembolismo recorrente33. No estudo realizado por Harenberg et al., o índice de novos episódios de TEV foi superior no grupo da HNF (5.1% x 3,1%)25. Levine et al. e Koopman et al., também relataram dados semelhantes, observando uma diferença absoluta de 1,4% e 1.7%, respectivamente, em favor da HBPM9,27. Assim como na taxa de sangramento, Merli e cols., e Breddin e cols., também verificaram que a posologia da HBPM aplicada no tratamento da TVP, não influencia na ocorrência de TEV recorrente1,44. Prandoni et al., relataram que os fatores de risco para o desenvolvimento de novos episódios de trombose são TVP 55 proximal e portadores de câncer, observação consistente com outros estudos1,47, relatando a necessidade de melhorar a terapia, sobretudo nos pacientes portadores de neoplasias36. Ratificando os dados da literatura, nosso estudo apresentou uma baixa taxa de TEV recorrente (embolia pulmonar sintomática), ambos no grupo da HNF, sendo que um era portador de câncer de cólon e todos apresentavam veias proximais comprometidas. Nossa taxa de óbito foi semelhante à encontrada por Levine et al. (5,6%)27. Uma metanalise realizada por Gould et al., demonstrou que em pacientes com TVP proximal a mortalidade foi menos comum no grupo da HBPM, com redução da mortalidade de 29%10. Em nossa pesquisa foi observada uma maior prevalência de trombose de veias proximais no grupo da HNF, com significância estatística, isto pode ter influenciado na alta taxa de óbitos desta terapia. Harenberg e cols., descreveram também um índice menor em pacientes que receberam enoxaparina tanto durante a internação (2,1% x 3,6%), quanto ao longo de 6 meses (6,3% x 10,3%)25. A mortalidade encontrada em nosso trabalho foi durante a internação. Dois trabalhos mostraram que esta redução foi maior nos pacientes portadores de neoplasias, entretanto, não houve explicação para tal fato10,32. Isto não foi encontrado em nossos dados, pois um paciente era portador de câncer de cólon. Outros três estudos relataram que as causas de óbitos mais freqüentes em pacientes submetidos a anticoagulação foram: TEP, hemorragia e doença coronariana9,36,45, ratificando os nossos resultados (TEP e hemorragia digestiva). As principais limitações presentes neste estudo foram o pequeno número da amostra e a dificuldade em randomizar os dois grupos. Isso pode 56 ter feito com que os dados não alcançassem significância estatística. Desta forma torna-se necessário novos ensaios clínicos para estabelecer, com maior segurança, os riscos de ambas as formas de heparinização. 57 CONCLUSÃO A HBPM apresentou menores taxas de complicações e de óbitos, demonstrando uma segurança maior no tratamento da TVP em relação à HNF. Entretanto, não houve diferença estatística entre os grupos. Os principais fatores de risco para trombose em nosso hospital foram: idade acima de 40 anos, pacientes com imobilização por um período superior a três semanas e história prévia de TVP. A profilaxia para TVP em nosso serviço foi subutilizada, sendo empregada em apenas 17,3% dos pacientes internados com indicação para a mesma. 58 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Merli G, Spiro TE, Olsson CG. 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Nome:__________________________________________ IMC: _______ RH:_______________ Idade:_____________ Sexo: __________________ A) Clínica do Paciente: 1) Edema 2) Dor 3) Febre 4) Hiperemia 6) Embolia Pulmonar 7) Assintomático TEMPO DE SINTOMAS:_____ dias. B) Região comprometida: 1) Pé e/ou tornozelo 2) Perna 3) Coxa D) Veias comprometidas: 1) Veias de perna 2) Poplítea 3) Femoral superficial 4) Femoral profunda 5) Femoral Comum 6) Ilíaca E) Uso de profilaxia: 1) Nenhuma 2)Meia elástica 3) HNF 3) HBPM 4)Outros_______________ F) Causa da TVP (Solicitar PSA, Rx Tórax, US abdome, Sangue oculto, Marcadores Tumorais): Especificar 1) Cirurgia 2) Paciente Acamado 3) Neoplasia 4) TVP Prévia 5) Tabagismo 6) ACO 7) TRH 8) Doenças Hematológicas 9) Gestação 10) Puerpério 11) Varizes 14) Doenças Reumatológicas 15) IRC 12) HF 16) Trauma 13) Cardiopatias 17) Indeterminado 18) Outros_______________ G) Tratamento instituído: 1) HNF 2) HBPM H) Filtro de Veia Cava:__________ I) Complicações: 1) EP 2) Sangramento 3) Plaquetopenia 5) Outros:___________ J) Tempo de internação: _____ dias. 66 ANEXO 2: Termo de Consentimento. HOSPITAL DO SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL Termo de Consentimento Livre e Esclarecido O (A) senhor (a) está sendo convidado (a) a participar como voluntário do estudo “Comparação entre heparina não fracionada e heparina de Baixo peso molecular para o tratamento da trombose venosa profunda” após ser esclarecido (a) sobre as informações a seguir e caso aceite fazer parte deste estudo, assine ao final deste documento que está em duas vias. Uma delas é sua e a outra é do pesquisador responsável. 1) a divulgação desse estudo visa analisar a resposta ao tratamento realizado, seus benefícios e riscos e poderá resultar em benefício para outros doentes portadores de doença semelhante; a) Benefícios: - Impedir embolia pulmonar. - Evitar síndrome pós-trombótica (úlcera venosa e edema). - Evitar insuficiência venosa crônica (varizes). b) Riscos: - Queda de plaquetas (plaquetopenia). - Queda de cabelo. - Osteoporose. - Reações alérgicas. - Sangramento retroperitoneal e abdominal. - Sangramento intracraniano sob risco de lesões neurológicas graves (paralisia). - Sangramento digestivo c) Em caso de ocorrência de complicações, a equipe de enfermagem estará orientada a contatar imediatamente a equipe de cirurgia vascular e serão adotadas as seguintes medidas: - Plaquetopenia (queda no número de plaquetas): Suspensão do medicamento, avaliação do hematologista e reposição de plaquetas nos casos graves com sangramentos; - Queda de cabelos: suspensão da droga e acompanhamento clínico; - Osteoporose: suspensão do medicamento, reposição de cálcio e vitamina D, avaliação clínica especializada e acompanhamento clínico; 67 - Reação alérgica: suspensão da medicação e utilização de medicações anti-alérgicas, além de acompanhamento clínico. - Suspeita de sangramento retroperitoneal e abdominal: será submetido à tomografia abdominal para confirmação diagnóstica, suspensão da medicação, reposição de fatores de coagulação com plasma fresco, acompanhamento clínico nos casos leves e tratamento cirúrgico nos casos de sangramento persistente. - Sangramento digestivo: suspensão da medicação, reposição de fatores de coagulação com plasma fresco, será submetido à endoscopia e colonoscopia para complementação diagnóstica e possível tratamento, acompanhamento clínico (bloqueadores de bomba de prótons, reposição volêmica e/ou concentrado de hemácias) nos casos leves e até tratamento cirúrgico nos casos de sangramentos intensos e persistentes. - Sangramento intracraniano: será submetido à tomografia craniana para confirmação diagnóstica, suspensão da medicação, reposição de fatores de coagulação com plasma fresco, avaliação da equipe especializada da neurocirurgia e até tratamento cirúrgico nos casos graves. - Em todos os casos de sangramento, após a suspensão da medicação, será implantado filtro de veia cava para prevenção da embolia pulmonar. 2) o trabalho não tratará de vida pessoal do (a) senhor (a); 3) o (s) pesquisador (es) estará (ão) à sua disposição, a qualquer momento, para discutir as dúvidas que o (a) senhor(a) possa ter a respeito deste estudo e sua participação: 4) o (a) senhor (a) não terá seu nome identificado no trabalho; 5) o (a) senhor (a) e seus responsáveis não receberão nenhum pagamento pela divulgação do trabalho; 6) o (a) senhor (a) ou responsável a qualquer momento poderá cancelar a divulgação do estudo, que deverá ser notificada por escrito ao pesquisador pelo sujeito da pesquisa ou por seu responsável, sem penalização alguma e sem prejuízo à assistência prestada; 7) o estudo deverá receber a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa - CEP do Hospital do Servidor Público Municipal, antes de qualquer tipo de divulgação; Eu, ______________________________________________ (nome em letra de forma) autorizo a divulgação de informações a respeito da doença e de seu tratamento para exclusiva finalidade educacional e científica, bem como a utilização da respectiva documentação médica, incluindo filmes e fotografias, para as mesmas finalidades. São Paulo, ____ de _________de 20__ -------------------------------------------------Assinatura do paciente/responsável 68