GT3: Educação em Direitos Humanos e Processos de Democratização/Redemocratização REFLEXÕES SOBRE OS DIREITOS HUMANOS NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO POPULAR: INTROSPECÇÕES E SUBJETIVIDADES À LUZ DA EDUCAÇÃO EMOCIONAL Ludmila Lins Bezerra Faculdade Nossa Senhora de Lourdes – SINTEP [email protected] Fernanda Mendes Cabral A. Coelho Universidade Federal da Paraíba [email protected] RESUMO: Este trabalho apresenta algumas reflexões sobre os direitos humanos no contexto da educação popular, abordando especialmente as introspecções e subjetividades à luz da educação emocional. Toma por base a concepção freireana da Educação Popular em diálogo com as políticas públicas apresentadas no Plano Nacional de Educação em Direitos humanos – PNEDH. Em primeiro lugar analisa os pressupostos da educação popular em diálogo com a educação emocional e os direitos humanos. Em segundo, discute a educação emocional no contexto da educação popular. E por fim, aborda os direitos humanos e suas implicações na educação de jovens e adultos. Direitos Humanos, Educação Popular e Educação Emocional são considerados elementos que estão intimamente relacionados que corroboram diretamente para a democratização da cidadania e o respeito à dignidade humana Palavras-Chave: Direitos Humanos. Educação Popular. Educação de Jovens e Adultos A escola representa uma das maiores fontes de formação ideológica, política e de cidadania, assim, há a necessidade de construirmos uma cultura de paz, tolerância e respeito, de forma participativa e democrática. A Educação em Direitos Humanos – EDH visa orientar, promover e transformar o convívio social de forma a garantir o exercício pleno da cidadania democratizando/redemocratizando o espaço institucional escolar a partir de uma formação intelectual pautada na conscientização dos direitos e deveres de cidadania. Rompendo com padrões antidialógicos, preconceituosos, discriminatórios, repressores e conflituosos que geram violência e marginalizam indivíduos, desconsiderando o ser humano em sua integralidade. No Brasil, o Plano Nacional de Direitos Humanos – PNDH ressalta que a Educação em Diretos Humanos deve ser compreendida como: [...] um processo sistemático e multidimensional que orienta a formação do sujeito de direitos, articulando as seguintes dimensões: a) apreensão de conhecimentos historicamente construídos sobre direitos humanos e a sua relação com os contextos internacional, nacional e local; b) afirmação de valores, atitudes e práticas sociais que expressem a cultura dos direitos humanos em todos os espaços da sociedade; c) formação de uma consciência cidadã capaz de se fazer presente em níveis cognitivo, social, ético e político; [...] (BRASIL, PNDH, 2007, p. 17). Essas observações nos instigaram a pesquisar a construção de postura e práticas pedagógicas dialógicas que favoreçam a promoção de uma Educação Popular transformadora tendo como pilares centrais as propostas apresentadas no Plano Nacional de Educação em Direitos lançando olhares para os fundamentos da Educação Emocional como mediador nas relações interpessoais no contexto da Educação de Jovens e Adultos. Partimos do pressuposto de que a Educação Emocional, certamente, não pode ser vista como um caso meramente escolar, mas, sobretudo como uma concepção dialógica de conhecimento que abrange todas as dimensões sociais, psicológicas e afetivas do sujeito. Portanto, integra-se num processo de constante construção de conhecimento, gerado no ambiente familiar, passando pela escola, porém, seguindo por todas as etapas da vida em sociedade. No entanto, apesar de estar presente de modo constante na vida dos seres, a Educação Emocional não pode ser vista como uma solução de problemas imediatista, neste sentido, o principal objeto deste novo paradigma é o crescimento emocional e cognitivo do ser humano visando seu desenvolvimento global e assegurando a autoconfiança e autogovernança. A Educação Popular favorece a construção de uma sociedade mais justa, humanizada e democrática, e para que essa construção de fato aconteça é preciso repensar as bases da educação que informam e formam os próprios sujeitos que a compõem, levando-os a refletir sobre seus sentimentos e emoções. Dalai Lama (2000) afirma que o ser humano é responsável por tornar o mundo cada vez melhor, com base nas mudanças em seu próprio íntimo. É preciso educar os corações, ter autoconhecimento capaz de ser reconstruído permanentemente. Nesta perspectiva, pensar a Educação Popular remete à noção do protagonismo social, ressaltando valores estruturantes que constroem e constituem as bases da Educação em Direitos Humanos em suas várias dimensões. Partindo dessas premissas nossa pesquisa teve o objetivo de discutir as propostas da Educação Popular à luz dos Direitos Humanos destacando as contribuições da Educação Emocional como elemento fundamental para a formação crítica-social introspectiva e subjetiva do sujeito. Para tanto, o texto ressalta conceitos e identifica valores e atitudes que estruturam e constroem a subjetividade dos sujeitos nas relações sociais políticas com base nos princípios da concepção freireana da Educação Popular em diálogo com as políticas públicas apresentadas no Plano Nacional de Educação em Direitos humanos – PNEDH e das pressupostos teóricos e práticos da Educação Emocional no contexto da Educação de Jovens e Adultos Metodologicamente, caracteriza-se como uma pesquisa bibliográfica de abordagem qualitativa que parte de uma concepção dialógica de construção do conhecimento. As pesquisas que se utilizam da abordagem qualitativa possuem a facilidade de poder descrever a complexidade de uma determinada hipótese ou problema, analisar a interação de certas variáveis, compreender e classificar processos dinâmicos experimentados por grupos sociais, apresentar contribuições no processo de mudança, criação ou formação de opiniões de determinado grupo e permitir, em maior grau d profundidade, a interpretação das particularidades dos comportamentos ou atividades individuais (OLIVEIRA, 2003, p. 53). Como procedimentos, abordamos a revisão de literatura a partir das contribuições da Educação Popular, da Educação Emocional e dos documentos que legitimam a Educação em Direitos Humanos. As análises dos dados foram realizadas de forma transversal do diálogo entre teóricos da Educação Popular, Educação Emocional, e dos documentos que legitimam a Educação em Direitos Humanos. Nesse sentido, importa tratar os Direitos Humanos, Educação Popular e Educação Emocional como elementos que estão intimamente relacionados que corroboram diretamente para a democratização da cidadania e o respeito à dignidade humana. Para aprender é preciso atribuir significados, dar valor às relações humanas, empenhar-se na busca de respostas, e acima de tudo, doar-se ao novo, à aprendizagem de valores e de sentimentos que dignifiquem o ser humano em sua totalidade. PRESSUPOSTOS DA EDUCAÇÃO POPULAR EM DIÁLOGO COM A EDUCAÇÃO EMOCIONAL E OS DIREITOS HUMANOS O conceito da Educação Popular foi difundido em todo mundo, a partir das concepções Freireanas de educação junto à alfabetização de jovens e adultos. Suas práticas são pautadas no princípio da democratização e fomentadas a partir da experiência do sujeito, de seu conhecimento e vivência de mundo. Por isso, é importante que o educador tenha a sensibilidade e cautela para observar e valorizar o conhecimento popular, fazendo-o de base para estimular criação e o fortalecimento de um pensamento crítico, visando a transformação social e a politicidade da educação. Freire (1987, p. 20) nos questionou na Pedagogia do Oprimido: “quem melhor que os oprimidos, se encontrará preparado para entender o significado de uma sociedade opressora?” Ao questionar isso, ele nos leva a um ponto interessante a refletir: para haver uma transformação na Educação Popular, não bastam apenas teorias, princípios teóricos e intelectuais, a mudança precisa surgir de uma ação e essa ação precisa vir de dentro. Daí a importância da emocional idade no contexto das relações interpessoais estabelecidas no cotidiano escolar, sobretudo, junto aos jovens e adultos que já trazem ideologias e concepções de mundo construídas a partir de experiências vicárias de aprendizagem, consequentemente, reproduzem a estrutura social e política no qual estão enraizadas, estas estruturas emergem de situações de desigualdade, opressão e subtração de direitos constituídos, e é no cenário educacional que se torna possível a conscientização desta opressão, para que os indivíduos possam tomar posse dos direitos constitucionais garantindo sua cidadania. Valla (1986) aponta que para se promover uma educação verdadeiramente popular, é necessário refletir sobre algumas variáveis, tais como a conjuntura econômica, a organização social e a sensibilidade política e cultural dos cidadãos/ãs. Nesta perspectiva, a educação transformadora caracteriza-se pelo respeito à autonomia do sujeito, levando em consideração sua realidade, seu contexto e suas relações sociais. De acordo com Souza (1987, p.79) entende-se a Educação Popular “como uma prática mediadora no interior de determinadas relações sociais que, trabalhando os indivíduos, busca criar um homem coletivo, engajado na transformação dessas relações sociais que se tornaram destruidoras do próprio homem”. É necessário buscar uma educação problematizadora na intenção de mudança, que seja embasada numa condição política-ideológica transformadora, protagonizando o sujeito na caminhada para a libertação e conscientização. Vale ressaltar que para a mudança ser integral, é importante preocupar-se também com a dimensão afetiva e emocional. Segundo Freire (2000) Busca-se proporcionar aos indivíduos uma compreensão crítica que possibilite uma práxis transformadora da realidade social, política, cultural, numa expectativa utópica de uma sociedade igualitária, emancipadora. O exercício constante da ‘leitura do mundo’, emanando necessariamente a compreensão crítica da realidade, envolve, de um lado sua denúncia, de outro o anúncio do que ainda não existe (FREIRE, 2000, p. 21). A pedagogia da esperança é a busca da formação de uma nova sociedade, pautada na democracia e na liberdade, que alimenta uma autogestão onde cada indivíduo, na sua construção, tem seu papel e importância (FREIRE, 2013). O ser humano inventa a esperança como suporte para o enfrentamento da realidade. A partir do contexto histórico e socialmente construído, as pessoas vão formulando “saídas” para conseguir sobreviver e se conformar com suas condições de vida, ou seja, através da esperança, o ser humano projeta e viabiliza seus ideais. Porém, muitas vezes, esses ideais são aniquilados pelos ditadores/opressores. Para Freire, a esperança precisa ser fundamentada numa consciência crítica da realidade, numa constante busca de superação da opressão, o ser humano tem a capacidade de passar de uma consciência ingênua para uma consciência crítica que o leva à autonomia. Nesta perspectiva, a educação torna-se a porta de entrada para uma nova visão social de cidadania e autonomia. O conhecimento se multiplica pelo caminhar, não existe um limite, é um trabalhar intermitente em busca da qualidade do que se quer ter, portanto, pensar numa formação profissional exige além do compromisso com a transformação da sociedade, uma constante busca de informação e formação que de fato seja eficaz e coerente. Na sociedade contemporânea, a visão de normalidade é considerada contextual, porém, torna-se preponderante questionar essa noção de "normalidade", que dependendo do contexto sociocultural e das visões teóricas que ditam esses padrões de “normalidade” na sociedade contemporânea, as atitudes que poderiam ser consideradas “normais”, na verdade estão sendo incoerentes com o respeito e à democracia. A grandiosidade deste ato nos faz reconhecer a íntima relação de Freire com a prática que ele propõe o fato de admitir tal alienação, revela humildade e consciência crítica, a partir desse movimento introspectivo. Não podemos distanciar a práxis do conhecimento teórico, mas sim, embasar nosso trabalho justamente na fundamentação teórica que muitas vezes fica subjugada como algo que não se adapta ao real. Sobre isso, Freire aponta que: “Não há palavra verdadeira que não seja práxis. Daí, que dizer a palavra verdadeira seja transformar o mundo” (FREIRE, 1981, p.15). Freire libertou-se de correntes impostas culturalmente e teve a autonomia de transformar seu discurso e sua escrita. Essa atitude também mostra que aprendizado é contínuo, ninguém sabe tudo, pois apesar de toda a experiência e sabedoria, Freire não havia percebido essa questão, foi preciso uma intervenção externa, ou seja, um auxílio no sentido de provocar uma reflexão entre teoria e prática para que ele percebesse que reproduzia a discriminação de gênero em sua obra. Daí a importância de se discutir também o papel da escola na formação ideológica dos indivíduos. O trabalho pedagógico tem um alcance além do imediato. A formação do indivíduo é ao longo da vida, na escola também que se constroem as identidades, as ideologias, as culturas entre outros aspectos da vida. As perspectivas emergentes de educação corroboram com a formação de um indivíduo crítico, reflexivo e comprometido com o seu papel na sociedade. Visto dessa forma, a formação do humano depende da superação dos entraves que promovem exclusão social, ao invés de inclusão. Pensando nisso, Freire além de destacar a importância da linguagem na formação ideológica do indivíduo, ainda solicita e incentiva a mudança da linguagem machista nas editoras, contribuindo com a disseminação de uma prática equitativa: Agora, ao escrever esta Pedagogia da esperança, em que repenso a alma e o corpo da Pedagogia do oprimido, solicitarei das casas editoras que superem a sua linguagem machista. E não se diga que este é um problema menor porque na verdade, é um problema maior. [...] A discriminação da mulher, expressada e feita pelo discurso machista e encarnada em práticas concretas é uma forma colonial de tratá-la, incompatível, portanto, com qualquer posição progressista, de mulher ou de homem, pouco importa (FREIRE, 1981, p. 35). O compromisso com a cidadania requer uma prática pedagógica que de fato inclua os/as cidadãos/ãs de forma equânime e democrática. A sociedade se faz múltipla, como também são múltiplas as identidades, cada uma com seu valor, sua importância, suas peculiaridades. Finalmente, a Educação Popular ressalta o papel político da esperança, no sentido da transformação do mundo, como ideal de autonomia e libertação: A recusa à ideologia machista, que implica necessariamente a recriação da linguagem, faz arte do sonho possível em favor da mudança do mundo. Por isso mesmo, ao escrever ou falar uma linguagem não mais colonial eu o faço não para agradar a mulheres ou desagradar a homens, mas para ser coerente com minha opção por aquele mundo menos malvado de que falei antes. Da mesma forma como não escrevi o livro que ora revivo, para ser simpático aos oprimidos como indivíduos e como classe e simplesmente fustigar os opressores como indivíduos e como classe também. Escrevi o livro como tarefa política, que entendi dever cumprir (FREIRE, 1981, p. 35). A escola ao formar o cidadão/ã, pode introduzir, implícita ou explicitamente, valores distorcidos, discriminatórios e excludentes na sociedade, que, alienadamente os repetirá e manterá as várias formas de opressão que os indivíduos enfrentam ao longo da história. Por isso, a necessidade de formação de profissionais cada vez mais preparados e competentes para lhe dar com as situações singulares que surgem nos contextos educativos, principalmente, em contextos desiguais e discriminatórios. É importante pensar a escola que temos e a escola que queremos. Ressaltando a importância de Paulo Freire para a educação atual, como precursor de uma educação que tem como premissa a prática da liberdade e da autonomia, e segue rumo à esperança de uma educação melhor. Não há outro caminho senão o da prática de uma pedagogia humanizadora, em que a liderança revolucionaria, em lugar de se sobrepor aos oprimidos e continuar mantendo-se como quase “coisas”, com eles estabelece uma relação dialógica permanente. Como diria Freire (1981, p. 94): “Não há diálogo, porém, se não há um profundo amor ao mundo e aos homens.” Hoje, acredito que, ele acrescentaria neste trecho: “- e mulheres”, respeitando e sendo condizente com suas próprias concepções teóricas ideológicas e como forma de respeito às especificidades humanas. A Educação Popular pretende significar não apenas uma forma avançada de educação do povo, mas, um movimento pedagógico e popular que incorpora um papel político emancipatório e libertador. Propõe inicialmente uma teoria renovadora de relações entre homem, sociedade, cultura e educação. Realiza-se no domínio específico da educação com adultos das classes populares, em outras palavras, é um trabalho político de libertação popular, através da educação e dos efeitos de um trabalho conscientizador com sujeitos, grupos e movimentos de classes populares. De acordo com Brandão (1994, p. 48): O que dá sentido político à educação popular é sua capacidade de não só comprometer-se como uma dimensão pedagógica de produçãocirculação de saber necessário com os movimentos populares, mas a de reproduzir-se, ela própria, como um movimento pedagógico. Melhor ainda, como um movimento político de expressão pedagógica. Tudo isso junto permite acreditar que, mais do que um programa, a educação popular é uma presença. Porém, Torres (1987) afirma que, apesar da sua retórica radical, a Educação Popular tem um caráter reformista, paliativo na sua formulação, práxis e perspectiva histórica, excerto a educação popular como estratégia de luta. Torres (1987) destaca um dos maiores dilemas da Educação Popular que é o papel de trabalhar melhor para alcançar seus objetivos quando governos democráticoliberais estão no poder e direitos humanos básicos são respeitados, caso contrário, surgem inúmeras dificuldades em implementar uma abordagem antiautoritária direcionada e progressista. Portanto, o drama da Educação Popular é político. É refletido nas dificuldades de implementação e combinação de ações espontâneas com liderança, associando assuntos pedagógicos com temas políticos, num amálgama coerente em consonância com o processo geral de transformação da sociedade. Como educadores preocupados com a formação intelectual, social e cultural dos sujeitos, precisamos questionar: quais as contribuições que a Educação Emocional pode trazer para conscientizar o cidadão quanto aos Direitos Humanos? Como a afetividade pode contribuir para a formação crítica e reflexiva do sujeito diante dos desafios da sociedade atual? O que torna a educação verdadeiramente popular? Uma das hipóteses levantadas nessa pesquisa é de que na Educação é preciso fazer algumas considerações acerca das emoções, como uma grande possibilidade para melhorar a qualidade no processo de ensino e aprendizagem. Assim, precisamos deixar um pouco de lado a educação com resultados meramente técnicos e modificar a metodologia baseada na técnica e prática na educação afetiva, pois a partir da afetividade tem-se o fortalecimento da identidade potencializando a criatividade. É preciso conscientizar os educadores sobre a importância que se tem em possibilitar uma aprendizagem prazerosa, compartilhando experiências e criando novas abordagens a partir das experiências dos educandos/as, criando um vínculo afetivo. A pedagogia do oprimido, como pedagogia humana e libertadora, terá dois momentos distintos. O primeiro, em que os oprimidos vão desvelando o mundo da opressão e vão comprometendo-se na práxis, com a sua transformação; o segundo, em que, transformada a realidade opressora, esta pedagogia deixa de ser do oprimido e passa a ser a pedagogia dos homens em processo de permanente libertação (FREIRE, 1981, p. 44). A Educação em Direitos Humanos é baseada na necessidade de incluir Jovens e Adultos na sociedade atual, vislumbrando a realização dos seus direitos. Os processos educativos em Direitos Humanos despertam para uma atuação crítico-política, visando a conquista de uma vida digna. A proposta de uma educação problematizadora, humanizadora, libertadora emancipatória embasou toda a estrutura teórica dos estudos de Paulo Freire. Na obra Pedagogia da Esperança permanece a crença, a esperança, o respeito e a convicção da importância do papel da subjetividade na perspectiva de autonomia e libertação dos sujeitos. Enfim, não se pode falar de Educação Popular num contexto meramente pedagógico, limitando-a. Na realidade, trata-se de um processo muito mais multifacetado e amplo, uma verdadeira entrada ao contexto cultural e social. Daí, vale ressaltar que, para colocar em prática uma Educação Popular, é imprescindível a mudança de conceitos e paradigmas. A EDUCAÇÃO EMOCIONAL NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO POPULAR Uma das hipóteses levantadas nessa pesquisa é de que na Educação preciso fazer algumas considerações acerca das emoções, como uma grande possibilidade para melhorar a qualidade no processo de ensino e aprendizagem. Ou seja, precisamos deixar um pouco de lado a educação com resultados meramente técnicos, e modificar a metodologia baseada na técnica e prática na educação afetiva, pois a partir da afetividade tem-se o fortalecimento da identidade potencializando a criatividade. É preciso conscientizar os educadores sobre a importância que se tem em possibilitar uma aprendizagem prazerosa, compartilhando experiências e criando novas abordagens a partir das experiências dos alunos, criando um vínculo afetivo. Gonsalves (2015) nos traz que a emoção do amor remete para a imagem do homem relacional e, portanto, para uma vinculação solidária com o outro. Pode-se afirmar que o desenvolvimento emocional é um processo profundamente influenciado pelo meio, uma troca de emoções e vivências baseadas em sua formação pessoal. Ao falar em educação e afetividade, destacamos o psicólogo e professor chileno Rolando Toro, criador do Princípio Biocêntrico. Esse princípio considera a afetividade como fator promovedor da aprendizagem, aborda-se a inteligência afetiva como primordial para a educação contemporânea. Baseado no princípio Biocêntrico, foi criada a Educação Biocêntrica, que centra a aprendizagem na vida. Gonsalves (2009, p.35), afirma que a Educação Biocêntrica é um conceito educacional que favorece “cultivar a afetividade para superar toda discriminação social, racial ou religiosa”. Uma educação que é pautada na afetividade auxilia a possibilidade de promovermos uma Educação Popular com princípios transformadores e democráticos, de fato. Flores (2006, p.56) nos traz uma explicação quanto aos significados de afetividade e emoção: A afetividade abrange emoções, sentimentos e desejos. As emoções têm raízes instintivas e se expressam através de reações orgânicas e modificações fisiológicas perceptíveis no sistema neurovegetativo. A afetividade pode ser evocada a partir das emoções vividas e sentimentos cultivados. Não se expressa, necessariamente, por alterações corporais evidentes. A afetividade e a emoção são inerentes, assim, o processo de aprendizagem se torna mais significativo quando é permitida a expressão das emoções e das ideias. Gonsalves (2015) propõe uma metodologia construtivista e humanista, a qual denominou de Vivência Emocional Libertadora - VEL, a autora explica que a VEL é um processo de transformação pessoal por si mesmo, já que é um processo que só se realiza mediante a aprendizagem de novas formas de agir, de lidar com a própria emocionalidade. A proposta que apresentamos corresponde à possibilidade de vivenciar a emoção para o próprio bem-estar: é preciso sentir, aceitar e compreender o que ela está informando, para aprender a vivenciá-la saudavelmente (GONSALVES, 2015, p. 18). A VEL auxilia o desenvolvimento do autoconhecimento, e a elevação da autoestima, contribuindo e preparando o sujeito para enfrentar novos desafios. A partir desse autoconhecimento firmado, há uma amplitude tratando-se de diálogo. Freire (2002) nos aponta que a partir das relações do homem com a realidade, resultantes de estar com ela e de estar nela, pelos atos de criação, recriação e decisão, vai ele, dinamizando o seu mundo. Vai dominando a realidade. Vai humanizando. A emoção, portanto, é um novo elemento que ganhou dimensões significativas na evolução social, ou seja, o afeto não é apenas um laço entre integrantes da família, mas um laço que une as pessoas em geral. As dificuldades de educar em DH estão ligadas às adversidades de contexto histórico e sociais de exclusão que impossibilitam uma cidadania democrática a justiça social, através de uma educação popular libertadora que dialogue com a emocionalidade do sujeito é possível estabelecer novas formas de ampliação do conhecimento no contexto da Educação principalmente voltada à jovens e adultos. Nas sociedades contemporâneas, a escola é local de estruturação de concepções de mundo e de consciência social, de circulação e de consolidação de valores, de promoção da diversidade cultural, da formação para a cidadania, de constituição de sujeitos sociais e de desenvolvimento de práticas pedagógicas que respeitem o indivíduo, suas culturas, crenças, concepções e posicionamentos políticos e ideológicos, neste sentido, a escola surge como espaço disseminador dessa nova reestruturação paradigmática e epistemológica da Educação em Direitos Humanos. OS DIREITOS HUMANOS E SUAS IMPLICAÇÕES NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS Vivemos num país repleto de grandes diversidades culturais, porém, historicamente marcado por preconceitos e discriminações. Os 400 anos de escravidão, por exemplo, atualmente ainda engendram formas de preconceito, discriminação e exclusão social, grande parte da população negra continua sofrendo absurdas e inacreditáveis discriminações. Outro registro historicamente marcado por discriminações e preconceitos é a segregação feminina, as mulheres carregam o peso do sexismo desde o nascimento até às escolhas profissionais. Os altos índices de violência contra a mulher indicam que este não é um problema do passado, mas um problema atual que aterroriza e marginaliza a mulher na sociedade. (CARVALHO, 2008). O homossexual é outra categoria social que sofre discriminação e violência, constantemente ouvimos ou vemos casos de homossexuais assumidos sendo assassinados ou agredidos por pessoas homofóbicas. A intolerância religiosa é outro fenômeno que tem assolado guerras e verdadeiros massacres ao longo da história, marcada pela falta de respeito, ausência de tolerância às diferenças, ausência de liberdade e pluralidade religiosa. Problemas que envolvem os preconceitos sejam étnico, racial, gênero, cultural, religioso, entre tantos outros, ainda se fazem presente no cenário da sociedade atual, são situações de violências reais que aumentam a cada dia. Para controlar tal situação é preciso que todas as instâncias da sociedade estejam integradas e envolvidas na defesa dos DH como princípios da dignidade humana. A escola representa uma das maiores fontes de formação ideológica, política e de cidadania, assim, urge a necessidade de construirmos uma cultura de paz, tolerância e respeito, de forma participativa e democrática. A Educação em Direitos Humanos – EDH visa orientar, promover e transformar as concepções preconceituosas e discriminatórias em concepções respeitosas, que consideram a importância das diferenças no convívio social, além de conscientizar as pessoas que o conflito, só gera violência e marginaliza indivíduos e desconsidera o ser humano em sua integralidade. A concretização da educação em direitos humanos nas escolas tornase factível na medida em que este espaço possa estimular, propor, apoiar e elaborar propostas de natureza artístico-culturais que visem ao combate de toda a forma de preconceito, de intolerância e descriminação no espaço escolar (DIAS, 2007. p.156). Inclusive é no espaço escolar que se busca educar para o respeito e a tolerância, este é um compromisso dos/as educadoras, portanto, “[...] qualquer descriminação é imoral e lutar contra ela é um dever por mais que se reconheça a força dos condicionamentos a enfrentar.” (FREIRE, 1996.p.60) No Brasil, o Plano Nacional de Direitos Humanos – PNDH, ressalta que a Educação em Diretos Humanos deve ser: [...] compreendida como um processo sistemático e multidimensional que orienta a formação do sujeito de direitos, articulando as seguintes dimensões: a) apreensão de conhecimentos historicamente construídos sobre direitos humanos e a sua relação com os contextos internacional, nacional e local; b) afirmação de valores, atitudes e práticas sociais que expressem a cultura dos direitos humanos em todos os espaços da sociedade; c) formação de uma consciência cidadã capaz de se fazer presente em níveis cognitivo, social, ético e político; d) desenvolvimento de processos metodológicos participativos e de construção coletiva, utilizando linguagens e materiais didáticos contextualizados; e) fortalecimento de práticas individuais e sociais que gerem ações e instrumentos em favor da promoção, da proteção e da defesa dos direitos humanos, bem como da reparação das violações (BRASIL, PNDH, 2007, p. 17). Nesse sentido, podemos destacar que a escola é um espaço privilegiado, uma vez que é possível compartilhar experiências e conhecimentos históricos, numa relação educador/a e educando/a despertando assim, reflexões que rompam com os antigos métodos, onde o/a educando/a é visto/a como um ser vazio que precisa ser preenchido com todo o conhecimento configurando uma educação bancária no sentido Freiriano. (1996). A Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma modalidade de ensino que deve ser pensada de forma diferente das outras modalidades educacionais. São sujeitos que, nas últimas décadas, tiveram o acesso garantido às políticas educacionais, mas não tiveram a possibilidade da permanência, isso devido a vários fatores econômicos, sociais e culturais que interferem direta ou indiretamente no processo acadêmico e educacional. O Educador deve ter uma compreensão que os educandos da EJA possuem suas próprias visões de mundo, sobretudo um entendimento e um saber produzido nas culturas e nas relações sociais que ele estabelece no mundo em que vive. Neste sentido, Freire (1996, p.05) afirma que o educando. [...] problematiza e toca o educador, aponta para a dimensão estética de sua prática que, por isso mesmo, pode ser movida pelo desejo e vivida com alegria, sem abrir mão do sonho, do rigor, da seriedade e da simplicidade inerente ao saber da competência. Paulo Freire (2002) propõe que a EJA aconteça na prática do cotidiano e na acumulação de saberes dos educadores, neste contexto, o fortalecimento da autoestima dos educandos da EJA deve ser uma meta dos educadores de jovens e adultos, para promover a formação de sujeitos críticos, capazes de empregar critérios e métodos determinados em sua leitura do mundo e em sua ação sobre ele. Aí entra as contribuições da educação Emocional, os jovens e adultos não encontram na escola apenas um espaço de educação formal, mas também de socialização. CONSIDERAÇÕES FINAIS O compromisso da Educação em/para os Direitos Humanos no contexto da Educação de Jovens e Adultos vai além do ato de ensinar, envolve aspectos ideológicos, formadores de opinião, construtores de cidadania, nesta perspectiva, as concepções de ensino devem estar pautadas em métodos e abordagens que considerem as características, as subjetividades e os contextos em que os educandos estão inseridos. Nesta perspectiva, ressaltam-se as concepções de escola, ensino e aprendizagem; relação educador/a-educando/a, igualdade e equidade em direitos e condições sociais entre homens e mulheres e a importância da conscientização política e da autonomia a partir dos pressupostos e concepções de cidadania e educação em Paulo Freire (1979, 1987, 1992, 1996, 1975, 2002), bem como, suas colocações sobre a formação da consciência crítica nos indivíduos para o exercício pleno da cidadania. O papel/função social da escola é preparar e proporcionar um ensino de qualidade que respeite as diferenças e individualidades da comunidade escolar, fazendo com que o educando se torne cada vez mais crítico e consciente dos seus direitos de cidadania e de integralidade moral e política. A Formação dos profissionais da EJA muitas vezes está relacionada à ausência de uma formação específica nos cursos de graduação. Trabalhar com jovens e adultos se exige bastante, além de uma formação adequada ao nível superior, como uma formação continuada, com cursos e capacitações para se trabalhar com os mesmos, ser educador da EJA não é para qualquer profissional da educação. Precisa-se ter um perfil adequado porque a metodologia tem de ser diferenciada, como a relação professor e aluno. A Educação Popular visa promover a autonomia e libertação do sujeito e a educação Emocional traz a perspectiva da introspecção e da compreensão do outro através do reconhecimento das emoções e sentimentos que permeiam as relações humanas, neste conjunto, as propostas de educação em/para os Direitos humanos amplia a dimensão do contexto educacional dando novos significados à relação educando-educador, uma relação autêntica de diálogos que provavelmente refletirá na construção de sujeitos conscientes de seus direitos democráticos e do exercício pleno à cidadania. Impossível pensar uma educação popular contemporânea sem trazer à tona as contribuições significativas de Paulo Freire, que pulsa no centro das concepções da Educação Popular, como uma prática educacional emancipatória, dialógica, libertadora, conscientizadora. Assim, como afirma Gadotti (1994), a principal abordagem da concepção educacional neoliberal é a negação do sonho e da utopia, todavia, a Educação em/para Direitos humanos é a “educação para outros mundos possíveis”, ou seja, é, sobretudo, uma educação que proporciona ao sujeito sonhar e ter esperança, a esperança de uma sociedade justa, igualitária, inclusiva e democraticamente cidadã. REFERÊNCIAS BRASIL. Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos. Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Ministério da Educação, Ministério da Justiça, UNESCO, 2007. FREIRE, Paulo. Pedagogia da Indignação: Cartas Pedagógicas e outros escritos. São Paulo, UNESP, 2000. _______. 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